III CIRCUITO REGIONAL DE PERFORMANCE BODEARTE CORPOS AUSENTES
APRESENTAÇÃO Fragmento ausente de corpo presente presentificando a ausência de incentivo pra firmar a presença da vontade afirmar existência do desejo de produzir linguagem assim meta: linguagem como foto como fato per.formato aberto pra [re]unir expandir instigar agregar os perform.atos Estamos ausentes? Quem presentifica nossas ausências? O exercício da resistência como uma ação micropolítica. Ao invés de identidades formatadas, nosso maior desafio é termos que constantemente transvalorar, transformar, reinventar nossos lugares de composição, abrir fendas na couraça do instituído e traçar um território EstÉtico de potência nômade. Ausência. O vazio do Outro nos acomete. Privação. Falta. Onde está você? A falta que o corpo faz. A falta que faz ao corpo o corpo presente para o encontro. Na ausência o corpo se faz. Onde está o Outro da Performance? No Público? Ou privado? Na ausência do Outro o corpo faz. E produz outros modos de fazer. Façamos. Façamos. Fazer performance como quem questiona: O que está ausente? Segredos? Erros, sujeiras amorais ou só percepção de mundo? Vontade-desejo exibicionista e forte, somos resistentes-na-performance: política, heroica ou erótica... Queremos toda ausência ao mesmo tempo: teus medos, segredos e taras vertidas em políticaseróticasgozantes...
Conseguimos nós performar sem estar? Nosso corpo ausente, presente está n'algum lugar. N'algum lugar, em algum lugar, em lugar algum. Sua presença/ausência no espaço, por vezes quebra barreiras, cria novos espaços, reterritorializa, e por outras, se configura pelo aguçar da sua imaginação. Não estamos aqui como um todo, mas onde fica esse lugar em que é como todo? Não fica, esse fragmento de nossa ausência é apenas parte do incompleto ato de estar vivo e em processo. Um fio se desgarra da manta das verdades unilateriais. O que é que sobra de um fio que escapa? O rastro? Como comparecência da ausência, aquilo que fica ou sobra do que desapareceu ou passou. Sem começo nem fim, ele mesmo. No nada. No aqui. No entre. No vão. Um suspiro do berro, um pó da sujeira, uma folha do quintal. Que linguagem falam as coisas sem visibilidade? Será que não ver pode ser não ouvir? Estará a performance criptografada em corpos invisíveis aos olhos brasilis? A performance é linguagem as avessas: é dobra, fissura, linhas de língua, línguas de fuga. Lugar de produção desejante por si só, assume o processo como coisa em si, deslocando o olhar da retina do mercado, assumindo um movimento contracapitalístico. E se hoje estamos nessa situação de negação perante editais público-privados, espaços de arte, galerias, museus, se hoje nos sentimos amarrados a continuar a caminhada com o mínimo de dignidade econômica para realização de nossos projetos, é porque ainda precisamos escavar muitos buracos, abrir outros canais, novas formas de sustentabilidade e, claro, esgarçando a precariedade de nosso modo de vida operante, descartável, numa indústria da estéticacosmética.
Mostra-se salutar que hoje nossa tarefa ainda é a subversão dos modos de vida. E sim, performance é ação política. Avistar um outro caminho para a existência; estender a presença para distâncias remotas; trabalhar a poesia como o "texto" da performance; transitar constantemente na fronteira, nas fronteiras; tocar um instrumento como um ator; fazer do olhar uma profusão de caminhos; fazer arte dando aula; escrever como ação; Fazer performance é uma suspensão do cotidiano dentro dele, ou tornar essa suspensão um cotidiano. Um outro modo de existir. É pensar o enquanto, "ir indo", é deriva de processo e não produção de produtos. Contentar-se com o que passa, com o rastro. Explorar o devir das coisas, experimentar os corpos do(a)s passantes. Como a performance é multilinguagem, tudo potencializa. Já ampla, se expande ainda mais, pois age num ato sem fronteiras da criatividade do performer. Assim, o foco no corpo não precisa do corpo, ele pode estar ausente, como no nosso caso, e ainda assim ser performance. Mesmo ausente o corpo há uma presença sutil para que a obra possa existir, a presença que afirma “não estou”, “não estamos”. A arte da presença é também a arte da ausência. Pode um corpo ausente se tornar Performance? Pode. Pode e deve. A ausência se mostra como resistência cultural a opressão da falsa presença negociada em mercados de editais e políticas públicas. A arte da ausência é também a arte da presença. Há nessa ausência também retirância, no corpo que se retira, que se move, que trans-vê na ausência da chuva tudo o que dorme numa superfície aparentemente vazia, parafraseando
Manoel de Barros. Ao retirar os corpos da performance, será que ainda resta alguma presença? E hoje, vislumbramos que mente e corpo não estão separados, a não ser por conceitos, teorias e principalmente por um aprendizado forte que permeia profundamente nossa cultura. Palavras ditas, palavras faladas, palavras escritas. Mas nunca palavra em corpo. Ou mais, palavras em corpo, vistas como se assim não fossem. Se o corpo está ausente, obviamente a performance está ausente. Mas utilizando a fotografia dilatamos o tempo presente. O momento da performance é dilatado indefinidamente no tempo – é muito diferente do que seria se fosse apenas um registro de uma performance ao vivo. Não é somente fotografia, nem permanece registro, é uma fresta, uma brecha, um encontro fantasmático de tantas ausências, de tantos bodes de prato vazio na performance arte brasileira. O fato de nós não estarmos presentes, ou seja, estarmos ausentes no momento que o público estará nos vendo é uma das questões que nosso corpo escolheu performar nesse encontro. O fato é o fato, palavra usada para definir coletivo de bodes. O fato é que há performance sendo feita no Brasil todos os dias. Se a performance tem como base ontológica o corpo presente, a ação viva, esse BodeArte procura fazer uma reversão, propondo uma performance de corpos que estão declaradamente ausentes. Declarar ausência para investigar outros modos de ser e sobreviver nas paisagens das artes brasileiras. Um pico de visibilidade para as ausências da performance, o III Circuito Regional de Performance BodeArte (Corpos Ausentes) parte da re-união de 100 performers brasileiros que agora batalham com seus corpos em
diferentes contextos atravessados por esse estranho ser que não cabe em não estar, esse estranho estar que não cabe em não ser. Arquitetura de duna móvel, como as que cercam a cidade do Natal, somos monte imenso, difícil de não se notar, mas somos também poeira fina que flutua no vento, e se move nômade pelas casas, ruas, corpos, passando pelas por todas as brechas, poros, buracos, fechaduras, aberturas, rasuras, do que existe, do que pode existir. Ausências presentes em Natal, mas também presenças ausentes em Natal, e por isso espalhadas por todo o Brasil e além dele. Somos os bodes, os corpos que furam a precariedade e tristeza para performar as potências alegres desse Circuito fantasmático, zumbi, vivo e morto, vivos e mortos, vidas e mortes. Att. Perfod. Embod. Adriana Ayub (PE), André Bezerra (RN), Andrea Aparecida (SP), Carolina Moya (SP), Chrystine Silva (RN), Coletivo PataPalo (SP), Gilmara Oliveira (MG), Lilian Soarez (SP), Lucio Agra (SP), Marcelle Louzada (CE), Nina Caetano (MG), Raisa Inocêncio (RJ;CE), Yuri Tripodi (BA).
Esses são os patrocinadores/performers/agitadores/incentivadores/ amores/fazedores/corporificadores/investidores do III Circuito Regional de Performance BodeArte (Corpos Ausentes).
Adriana Ayub Alexandre Lucas Amor Experimental Andreia Aparecida Angelo Luz Artur Matuck Bárbara Ahouagi Biagio Pecorelli Christina Fornaciari Cláudia Oliveira Claudia Paim Coletivo Ambulante Coletivo ES3 Coletivo Filé de Peixe Coletivo Madeirista Coletivo PataPalo Coletivo Quando Coisa Corpos Informáticos Descompan(h)ia Demo_lições Artísticas iLTDAs Elen Gruber Fabio di Ojuara Felipe Cidade Fernando Lopes Fernando Ribeiro Filipe Porto Flávia Naves Folle Zmário Gilmara Oliveira Grasiele Sousa
Grupo de Interação MilaSan (GIM) Grupo Empresa Grupo Totem Guto Lacaz Hugo Houayek Ingrid Azulejo Jean Sartief Joanna Barros João Vilnei Joesér Alvarez Jota Cavalcante Jota Mombaça Joto Gomo Júnior Pimenta Jurandir Juca Karen Tribess Karlene Bianca Kysy Fischer Lilian Soarez e Carolina Moya Lucía Naser Lucio Agra Maíra Vaz Valente Mamutte Marcela Antunes
Marcelle Louzada Marcelo D'Avilla Marcelo Gandhi Márcia Azevedo Maria Claudia Vargas Maria Eugênia Matricardi Maria Rosa Marinho Menezes Mary Vaz Naiana Magalhães
Naira Ciotti Nina Caetano OSSO Otávio Donasci OutroLuiz Pam Guimarães PerformAtiva Priscilla Davanzo Qoletivo Raísa Inocencio Ramanery Raphael Couto Recy Freire Renan Marcondes Ricardo Alvarenga Rogério Nunes Marques Ronaldo Záphas PELE – Performance Laboratório de Estudos Rubiane Maia Sandra Bonomini Semyramys Monastier Sofia Bauchwitz Suelen Pessoa T. Angel Tales Frey Paulo Aureliano da Mata Cia. Excessos Tatiana Duarte Tauana M. Tete-a-teta Thaise Nardim Transitório 35 Ungulo
Victor de La Rocque Vinicius Cortez Washington Hemmes – projeto cadaFalso Wellington Junior – Tutunho Wilma Farias Wolder Wallace Yuri Tripodi
A exposição Corpos Ausentes do III Circuito Regional de Performance BodeArte ficará aberta entre dezembro de 2013 e janeiro de 2014 na Pinacoteca do Estado do Rio Grande do Norte com trabalhos de todos os performers acima citados. Nas redes sociais do Circuito também é possível acompanhar imagens e outros materiais disponíveis que (per)formam essa edição do Circuito.
CONVOCATÓRIA No ano de 2012 após a segunda edição nacional do Circuito BodeArte, nós, do Coletivo ES3, nos encontrávamos muito alegres pelo excelente desenvolvimento e cumprimento de tudo aquilo que prometera o evento, a rede, o contato na ocasião. O Circuito havia ultrapassado o número de mais de cem participantes, somando as duas edições, muitos diálogos foram traçados e parcerias criadas entre performers. Livros vendidos, discussões realizadas, fórum discutido, palestras realizadas, performances durante três turnos do dia, por seis dias, na cidade do Natal. Tudo isso, desde 2011, foi realizado com investimentos pessoais e através de algumas parcerias feitas para que o evento acontecesse. Ao final do segundo BodeArte iniciávamos o pagamento de nossas dívidas trazidas pelo Circuito, os membros do coletivo somavam dívidas que chegavam à casa do milhar com empréstimos bancários e isso seria pago em extensas parcelas até o ano de 2013. Todavia, o acontecido não nos deixava desanimados, embora endividados. Diante da dimensão que o Circuito BodeArte tomara em dois anos, e ao crescimento intenso aguardado para o ano de 2013, investimos uma grande carga de tempo, e com esforço e colaboração nosso e de vários parceiros (queridos bodes), construímos um belo projeto a ser inscrito na Lei Câmara Cascudo de Incentivo à Cultura, criada pelo governo há 13 anos para projetos culturais do Rio Grande do Norte.
O projeto foi o primeiro a ser aprovado pela lei no campo da performance arte no estado, e recebeu liberação dos avaliadores para captar mais de trezentos mil reais voltados para investimento em sua terceira edição, que além de performances, palestras, oficinas, fórum, livros, catálogo, box de DVDs, convidado internacional, organizaria o primeiro congresso voltado inteiramente voltado à pesquisa em performance arte no Rio Grande do Norte. Sete meses se seguiram, dois produtores formados e conhecidos na cidade apresentaram o projeto a diversas empresas, nós organizamos diversos materiais, demonstrativos, projetos de venda, plano de mídia, apresentações de slides sobre performance arte, gráficos e tabelas de público e participação nas edições anteriores do BodeArte. Um “não” após o outro as portas foram se fechando, alguns mais receptivos a ouvir sobre o projeto, outros nem dispostos a ver o que tinha além da sua capa. Esse bode resistente, re-insistente e re-existente, que nós do ES3 havíamos nutrido junto com tantos performer pelo Brasil era cercado pela precariedade do seu cenário em escala cada vez maior. Ao recebermos a resposta da última empresa com capacidade de financiar o projeto, responsável por 60% dos patrocínios financeiros via lei de incentivo no estado, emitimos uma nota via rede social para todos os que acompanharam essa batalha. Diante do interesse corrente em uma nova edição por parte dos performers que já haviam participado, e de dezenas de novos coletivos de performance e performers individuais que nos questionavam sobre abertura de inscrições para o BodeArte em 2013, assumimos que não teríamos condições financeiras de realizar o Circuito esse ano. As condições financeiras e mesmo o investimento de tempo que toma produzir o BodeArte não nos eram possíveis.
Outro projeto foi ainda escrito e enviado à Funarte, no edital de 2013 da Rede Nacional Funarte de Artes Visuais. A mesma negativa se seguiu, e o Circuito BodeArte novamente seguia sua retirância em busca da chuva de outra possibilidade de se realizar. Hoje, falamos do alto do mês de setembro de 2013, num mês e ano em que festivais de performance reconhecidos como o Perpendicular, não conseguiram financiamento para sua realização, num ano em que projetos de performance foram recusados em grande escala na Rede Nacional Funarte de Artes Visuais para 2014, como o Festival Performatus. No mesmo ano em que se lança o edital cultural da copa com investimento de 18,8 milhões de reais, comemos barro na performance para matar a fome e a sede. Decidimos então que esse bode não sumiria, não iria dormir para passar à fome, deveríamos realizá-lo, levantar seu grito, chamar seu fato, e fazê-lo ecoar por todo o Brasil novamente. Decidimos investir nosso décimo terceiro salário como professores no município de Natal, para mostrar para aqueles que acham que a performance arte está bem servida, que estamos aqui, em nosso deserto, em nossa cuia seca, ainda permanecemos. Manifesto, manifestado, vândalo vandalizado, sem violência, com violência, e violentado, decidimos abrir inscrições para o Circuito BodeArte no ano de 2013, não para receber performances e performers em Natal, e criar a rede, o circuito desse encontro. Abrimos inscrições para receber em Natal o encontro da ausência de todas essas performances pelo Brasil. O III Circuito Regional de Performance BodeArte, com o subtítulo de “Corpo Ausente”, recebe em 2013 apenas inscrições de registros fotográficos de performances. Uma foto por performer ou
coletivo, para lotar uma sala de exposição de ausências desses bodes da performance pelo Brasil. Em poucas linhas a proposta é essa: reunir nossa ausência nos investimentos, nas perspectivas de financiamento, nas câmaras setoriais de setores reconhecidos pelo Ministério da Cultura, nos diversos recantos dos quais foram ausentadas as performances, os performers e a performance arte, e criar a partir dela um ponto de visibilidade, um pico de ausências como ação de performance.
COLETIVO ES3 (André Bezerra e Chrystine Silva) Produção BodeArte
AGRADECIMENTOS À todos os mais de 100 participantes, performers e bodes desse III Circuito Regional de Performance BodeArte (Corpos Ausentes); A todos os 90 participantes das duas edições anteriores; Aos queridos Superbodes que nos movimentam para não deixar esse Bode parar com suas conversas, escritos, carinhos e exemplos, Naira Ciotti, Lucio Agra, Grasiele Sousa, Amor Experimental (Rodrigo Munhoz) e Associação BrP, Paulo Aureliano da Mata, Tales Frey e todo o projeto Performatus; Wagner Rossi Campos e Perpendicular, Fernando Ribeiro, Tissa Valverde e o p.Arte, Corpos Informáticos e Performance Corpo Política, OSSOs e MOLAs; Aos irmanados na história desse Coletivo tão Es3: Yuri Kotke, Janaina Spode, Márcia Braga, Guiga, Juliana Lima, Tulio Pinto, Gustavo Wanderley, Edson Silva, Lenilton Teixeira, Pam Guimarães, Charlene Sadd, Mary Vaz, Ricardo Alvarenga, Zmário, Wellington Junior; A todos que já disponibilizaram e acolheram com sua visão casa e condições para a existência do BodeArte, Grupo de Teatro Facetas Mutretas e Outras Histórias, IFRN e Nara Pessoa, Sossego da Ladeira e Mathieu Duvignaud (Pinacoteca do Estado); A todos os «nãos» dos que nos preferem invisíveis, é a sua tirania e nosso amor reunido que faz a chama desse Circuito crescer.