Depois de um verão quente, onde o número de incêndios e a área florestal ardida foi muito discutida e já esquecida, os portugueses preparam-se, agora, para um inverno cheio de incertezas sobre a fonte de energia a utilizar para aquecer as suas casas.
Os preços, apesar de mostrarem alguma tendência de estabilização, continuam elevados, principalmente para a capacidade da maioria das carteiras portuguesas.
A valorização da biomassa florestal excedentária, um dos poucos recursos endógenos de fácil conversão em energia útil e que Portugal vai possuindo em quantidade, deveria ser o ponto de partida quando, nesta altura, tanto se fala da necessidade de reduzir o consumo de energia, principalmente daquela que é importada. Certamente, se assim fosse, teríamos parte de muitos problemas resolvidos - diminuição do risco de incêndio, disponibilidade em quantidade e em qualidade de uma fonte de energia de fácil utilização e que seria produzida dentro das nossas fronteiras, criação de emprego em regiões despovoadas, entre outras.
Um pouco por todo país, foram, nos últimos anos, surgindo fábricas de pellets que pensam, principalmente na exportação. Mais de metade da produção nacional de pellets tem sido exportada para países europeus (Dinamarca e Inglaterra, entre outros países) para que estes possam produzir eletricidade. São países que facilmente passaram a usar pellets de origem florestal para substituição do carvão, fazendo face ao aumento dos preços da eletricidade e do gás natural.
E até aqui tudo bem. Tudo parece correr bem para Portugal, pois o volume das exportações vai aumentando.
O problema surge quando os portugueses quiseram, no final deste verão, adquirir pellets para suportar as temperaturas baixas do inverno que se avizinha. De facto, depararam-se com aumentos na ordem dos 300% em relação ao valor a que os pellets eram comercializados em 2021. E não é por falta de alertas: basta estar
minimamente atento às redes sociais ou à publicidade em torno dos pellets nas grandes superfícies comerciais. As leis do mercado não estão a resolver o problema e torna-se importante que, rapidamente, o governo ponha um travão na escalada dos preços da biomassa.
Com o mote do lucro rápido, tendo em conta a procura extraordinária de pellets na Europa, e com a dificuldade que muitas vezes existe na recolha de biomassa de forma rápida, existem denuncias de várias associações sobre a utilização de troncos de madeira (a legislação limita a biomassa florestal aos sobrantes da floresta).
É certo que, apesar da escalada de preços, o preço da energia obtida a partir da biomassa florestal continua a ser mais interessante do que aquela que é obtida a partir da eletricidade ou do gás natural. Mas, na verdade, não é esta a questão. Trata-se da necessidade de regular todo um novo mercado, pagando-se o preço justo, de modo tanto a proteger os produtores, os consumidores e, também, o ambiente. Em relação a este último, tenho verificado, para além do aumento do preço, que a qualidade dos pellets produzidos nem sempre é a desejável. De facto, a colocação de pellets no mercado carece de regulação, sujeita a regras de comunicação em torno das suas propriedades termoquímicas e mecânicas.
Como em muitas outras situações, os portugueses estão a colocar em evidência a sua capacidade de desenrasque e o mercado de
pelletizadoras em Portugal entrou em rutura de stock (equipamentos importados), mostrando que há quem procure, em suas casas, produzir pellets para autoconsumo. Pois, durante esta semana, num processo de consulta de mercado para aquisição de uma pelletizadora para instalação no Laboratório de Ciências Térmicas e Sustentabilidade da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, deparámo-nos com esta situação. Com efeito, éramos alertados, de imediato, para um prazo de entrega longo (devido aos prazos de importação) e do aumento previsível dos preços nestes equipamentos.
A enorme procura de equipamentos à escala doméstica para a produção de pellets para autoconsumo pode ser encarada como uma excelente notícia, atendendo que a recolha da matéria-prima levará à limpeza das áreas florestais privadas, contribuindo para a diminuição do risco de incêndio. Não obstante, torna-se importante verificar se a matéria-prima é a mais adequada, procurando evitar acidentes associados aos gases de combustão.
Perante todo um cenário de elevados preços para a energia, seria importante que o governo olhasse, também, para este setor que parece estar a desenvolver-se com lucros muito acima daquilo que os portugueses poderão suportar. Seria importante criar mecanismos de fiscalização, de regulação e de controlo que incidissem na produção, na comercialização, e nos limites à exportação.
é urgente a intervenção do governo no setor da biomassa florestal