Argumento #142

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Ano XXIX | n. 142 | Janeiro 2013 | € 2

NA RETINA

CINE-COSMOS

crebinsky

ensaio

OBSERVATÓRIO

O Fio do Horizonte DE fernando lopes

DE EDGAR PÊRA

entrevista

Os canibais: DO TEXTO AO FILME

dark matters


F I C H A T ÉC N I C A

EDITOR E PROPRIETÁRIO CINE CLUBE DE VISEU inscrito no ICS sob o nº 211173

SEDE E ADMINISTRAÇÃO Largo da Misericórdia, 24, 2º Apartado 2102 3500 – 158 Viseu

Periodicidade Quadrimestral

TEL 232 432 760 geral@cineclubeviseu.pt www.cineclubeviseu.pt

ANO XXIX Boletim inscrito no ICS sob o nº 111174

CONCEPÇÃO E EXECUÇÃO GRÁFICA DPX .com.pt

CAPA Crebinsky, elemento do cartaz

IMPRESSÃO Tipografia Beira Alta, Viseu

agradecimento Cinemateca Portuguesa Museu do Cinema

TIRAGEM 500 ex.

colaboram neste número

anabela moutinho

edgar pêra

Sócia do Cine clube de Faro desde 1986 e sua dirigente desde 1992. Gosta de dizer coisas sobre cinema.

Terminou, em 2011, a sua última longa-metragem, “O Barão”. Além de cineasta, desenvolve, neste momento, a tese de doutoramento O Espectador Espantado.

O CCV É APOIADO POR

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CINEMA PA R A A S ESCOLAS

enrique otero + miguel de lira Criadores de “Crebinsky”

hélio t

dark matters

Professor e investigador na área de cinema e literatura.

Colectivo dinamarquês que veícula mensagens numa linguagem visual minimalista abstracta, interpelando a imaginação da audiência.

serviços web


índice

edit!

P.4 bilhete postal

(...) desta vez tem destaque uma longa galega, “Crebinsky”, confirmada no nosso ciclo Europa 2013.

Como vão os cine clubes? Uma cartografia do movimento cineclubista: o que fazem, para quem e com que objectivos trabalham os cine clubes pelo mundo fora.

P.5 na retina

Espaço para partilha de olhares e gostos sobre um filme escolhido por um convidado. “Porque o cinema é sobretudo isto: emoção que se quer partilhável”.

É quando à volta parece a terra adormecida e as estruturas não sustentam matéria nem frutos que o Cine clube renasce e se renova. Cumprimos em Dezembro cinquenta e sete ferazes primaveras. E fecha-se agora um ano tão invernoso que é de estranhar a tamanha safra... O Argumento mantém a sua firme confiança no trabalho dos artistas portugueses, particularmente, claro, dos cineastas, sendo, cada vez mais, também um lugar de resistência.

P.6 cine-cosmos

A crónica de Edgar Pêra.

P.8 entrevista: CREBINSKY

Conversa a propósito do filme que o CCV dará a ver, pela primeira vez, em Portugal, em Fevereiro.

P.12 ensaio parte 2

Assim, nesta edição, voltamos a debruçar-nos sobre nomes nossos, como Manoel de Oliveira, em continuidade com o último número e com a particular atenção que lhe demos nas últimas sessões do ano; ou Fernando Lopes, uma recente grande perda. Quanto ao que se faz lá fora, desta vez tem destaque uma longa galega, “Crebinsky”, confirmada no nosso ciclo Europa 2013. Trar-nos-á, talvez, a graça de que um ano realmente novo precisa...

As relações entre literatura e cinema são centrais em boa parte das obras de Manoel de Oliveira. Fixemo-nos numa delas: Os Canibais.

P.17 what’s up ccv?

Actividade do Cine Clube de Viseu.

P.19 observatório

A palavra aos autores. Edição de trabalhos originais, e um olhar sobre o estado das artes e do cinema na primeira pessoa.

Apesar de todas as limitações, temos podido acreditar que são as ideias que nos mantêm e movem. E é desconcertantemente bom observar o poder inspirador dos períodos especialmente negros. Veja-se como, embora com cada vez menos apoios e meios, o cinema nacional tem crescido, com mais realizadores, mais produções, mais reconhecimento... Do mesmo modo, o Cine clube volta a empenhar-se numa programação abrangente, que garanta um lugar digno ao cinema na região, e que o faça, como desde o início quis ser, “merecedor do maior apoio e carinho a quantos se interessam pelos problemas de espírito”. Pois, não murchar e manter “raízes graníticas”, apesar de tudo, acaba por não ser uma surpresa: afinal, nascemos, resistentes, no inverno viseense.

CINE-COSMOS Ficha técnica O ESPANTO & A ESTRANHEZA imagens retiradas do filme Cinesapiens 3D com Nuno Melo, Leonor Keil Jorge Prendas, Keith Ester Davis, Valdemar Santos, Carolina Amaral, Tiago Correia, Adelaide Teixeira, Pedro Almeida, Sara Pereira, entre outros. produtor Rodrigo Areias para Guimarães Capital Europeia da Cultura 2012

Argumento Publicação editada pelo CCV desde 1984, pensada, originalmente, para a divulgação de actividades e debate do fenómeno fílmico. O boletim tornou-se um veículo indispensável de reflexão da sétima arte e divulgação do CCV, a justificar um cuidado permanente das suas sucessivas direcções. Fundado em 1955, o CCV é um dos mais antigos cineclubes do país, sendo o Argumento um projecto central na sua actividade.

direcção de fotografia Luís Branquinho Guarda Roupa Susana Abreu Cenografia Ricardo Preto Cinesapiens 3D faz parte do projecto de de tese de doutoramento O Espectador Espantado.

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bilhete postal

© T e a G a b i dz a s h v i l i , d i r ec to r a

Cine Clube de Kutaisi Geórgia

CHARLIE CHAPLIN RETROSPECTIVA JUNHO 2012 O garoto de Charlot A quimera do ouro Luzes da cidade Tempos modernos O grande ditador

A Geórgia é um pequeno país na região do Cáucaso que tem, todavia, uma cultura original interessante, devendo notar-se particularmente o cinema. Realizadores georgianos como Kalatozishvili, Shengelaia, Chkheidze, Abuladze, Ioseliani assumem um destaque no mundo do cinema revelado no largo conhecimento que amantes e profissionais têm acerca dos seus filmes. Kutaisi foi e é actualmente o centro cultural da Geórgia. E o nascimento da cinematografia georgiana está ligado ao nome da cidade. O realizador da primeira longa-metragem georgiana, “Viagem de Akaki Tsereteli em Racha-Lechkhumi”, Vasil Amashukeli nasceu em Kutaisi e aqui rodou o filme. A tradição da cinematografia georgiana na nossa cidade continuou, depois disso. Nos anos 90 do século XX, a produção de cinema parou e fecharam muitas salas. Foi isso que, em 2009, nos levou a fundar, com o apoio do Open Society Institute (“Programa Arte e Cultura”), em Kutaisi, o cine clube, que tem apenas cinquenta sócios. Críticos de cinema profissionais, como o Professor G. Dolidze, da Universidade de Teatro e Cinema, participam nas actividades do cine clube, que trabalha também em estreita colaboração com a televisão. A nossa intenção é popularizar o cinema e apoiar o renascimento da tradição cinematográfica georgiana. Para ir de encontro ao potencial criativo dos nossos sócios, aos seus interesses culturais e estéticos, exibimos filmes, georgianos e estrangeiros, de grande valor artístico. O cine clube assume ainda a importância educativa e formativa para os mais novos: está em funcionamento um grupo de preparação de cinema experimental, para aqueles que querem especializar-se em cinema.

Na verdade, começámos recentemente a nossa actividade, mas podemos orgulhar-nos dos muitos eventos que temos organizado. Por exemplo, uma masterclass sobre o tema “Especificidades do trabalho do realizador em cinema de ficção” conduzida pelo famoso realizador georgiano Merab Kokochashvili, proeminente representante da geração chamada de “sixties” - um dos seus filmes, “O Grande Vale Verde” foi exibido no festival internacional de Pesaro no programa “100 Filmes Inovadores de Todos os Tempos e Nações”. Para além do mais, demos oportunidade às crianças de se familiarizarem com novos filmes de animação de países dos quatro cantos do globo: Bélgica, Estónia, França, Geórgia, Alemanha, Letónia, Lituânia, Polónia, Rússia, Espanha e EUA. O cine clube passou o programa do Festival Internacional de Cinema de Animação, “Tofuzi”. Temos ainda projectos de cariz solidário. Tentamos envolver crianças de famílias com dificuldades na produção de filmes, incluindo workshops de argumentistas, actores, realizadores e críticos. O resultado será a criação de uma curta com argumento próprio, em que os actores e realizadores serão as próprias crianças. Os princípios e o regulamento dos cine clubes emanados pela Federação Internacional correspondem totalmente aos nossos objectivos. Contamos que a colaboração entre o cinema georgiano e a FICC seja muito interessante para ambos e que sejamos capazes de proporcionar bons momentos aos fãs de cinema.

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na retina

© anabela moutinho

O Fio do Horizonte

REALIZADOR Fernando Lopes

MONTAGEM Jacques Witta

Produção Filmes do Princípe Real

ARGUMENTO Christopher Frank, Jan Nachbaur a partir de “Il Fillo dell’Orizonte”, Antonio Tabucchi

COM Claude Brasseur, Andrea Ferreol, Ana Padrão, Miguel Guilherme, Nicolau Breyner, Fernando Heitor, Joaquim Leitão, Paulo Rocha, Margarida Marinho.

Portugal / França / Espanha, 1994 90’

FOTOGRAFIA Javier Aguirresarobe

Esta é a estória de alguém que morre em alguém que foi morto, de uma pulsão para o reconhecimento no outro de si mesmo, de uma perseguição em que duplo é, ao mesmo tempo, o outro e o si mesmo, sem se conseguir determinar qual o original e qual a cópia – e por isso Fernando Lopes abraçou esta estória de uma maneira afincadamente pessoal: «Todos os filmes são à sua maneira uma forma de autobiografia». Convocação de fantasmas, recuperação do passado, duplicação de eus num só – o fio do horizonte a atormentar quem o tenta alcançar. Matar fantasmas é como matar saudades – esgota-se na tentativa de o fazer. Resta pouco mais senão perseguir a imaterialidade dum-tempo-sempre-o-mesmo. Parafraseando – sim, parafraseando -, afirma Fernando Lopes que o filme mais próximo de “O Fio do Horizonte” será o igualmente seu “Belarmino”. À surpresa de tal afirmação (desde logo porque Belarmino, o homem real, é um retirado boxeur, e Spino, a personagem fictícia, um praticante autopsiador) é o próprio Lopes que nos esclarece: ambos são filmes sobre o medo da morte. A morte metafórica de um país no decurso de um regime fascista que desta indirecta maneira é exposto na sua podridão, a morte real de um personagem em dois momentos por entre diferentes-iguais corpos. Como se ambas as mortes fossem sentidas por Lopes como mortes suas. “O Fio do Horizonte” não é um thriller. Lopes nunca o desejou nem nunca lhe interessou que o fosse, pois pretendeu – e conseguiu - um filme metafísico e fantástico na forma como lida com a questão da identidade. A identidade do morto: no filme sabemos quem morre – SpinoSpino; para além do filme podemos intuir quem “morre” juntamente com Spino: quem fantasia e teme e convoca a sua morte, tentando ajustar contas com o seu passado sem nunca o resolver - Spino-Belarmino-Fernando Lopes. Essa é a questão vital e mortífera desta obra, por essa questão vital e mortífera passa aquele que é o ponto de vista subjetivo desta obra, por entre essa questão vital e mortífera do ponto de vista subjetivo se obtém a finalidade desta obra: uma incursão transtemporal, espacial na sua a-espacialidade. Presente, passado e futuro mesclando-se num só, a viagem desenrolando-se num espaço que é o mesmo não o sendo porque não é nenhum – única possibilidade de viajar para além do tempo. O que é espantoso neste filme é como, partindo de uma voluntária e consciente tentativa de ilustrar uma Lisboa de Cesário Verde, particularmente a soturna, melancólica, noturna de “O Sentimento de um Ocidental”, por oposição a uma Lisboa de O’Neill e Cesariny (em “Belarmino”) naquilo que esta poderia ser de solar, popular e típica (mesmo que em jeitos de distância crítica e ironia acre), se tenha transformado Lisboa numa cidade qualquer.

Isto é: não se reconhece Lisboa neste filme. Aquele cabaré é um qualquer cabaré, aquele porto é um qualquer porto, aquela morgue é uma qualquer morgue, aquela escola é uma qualquer escola, aquela loja é uma qualquer loja. Há uma despacialização da identidade topográfica, que releva do caráter misterioso e in-identificável dos locais, como referido, mas igualmente da dimensão labiríntica e obsessiva da narrativa e do protagonista. Inclusivamente, a única cena fora de Lisboa resulta numa das de efeito mais paradoxal – em pleno Cabo Espichel, e a sua vastidão, e o seu mar, e o seu longínquo horizonte, tudo banhado por uma luminosidade forte, dir-se-ia que tal luminosidade cega Spino que se sente tentado a cair literalmente no abismo após – mais uma – confirmação de que o morto – ele – já havia estado ali antes. Tal como a vertigem da identificação que sente nos bares fumarentos, ou nas ruas desertas, ou nos becos sombrios, ou no quarto em penumbra da prostituta, ou na morgue anónima; em síntese, na cidade in-possuível e in-identificável. Como se fosse a “Laudomia” de Italo Calvino, aquela cidade que é tripla ao incluir os vivos, os mortos que são esses vivos e os não nascidos que são esses mortos (-vivos), ou seja, um espaço a-espacial metafísico, longínquo e secreto. O que me parece novo nesta Lisboa filmada é essa realidade outra que nos é, em simultâneo, exortada e provocatoriamente oferecida, de um inconsciente da cidade que, por via dele, se transmuta de local temporal em universal intemporal. Ora, nada mais imaginário que o universal intemporal em nós. E, contudo, nada mais tangente que tal espaço a-espacial e tal universal intemporal em nós: quem pensa que Fernando Lopes morreu, desengane-se, pois matar fantasmas é como matar saudades – esgota-se na tentativa de o fazer. 5


cine-cosmos Š edgar pêra

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entrevista

CREBINSKY: RESGATAR A GALIZA (E O CINEMA)

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Enrique Otero, realizador, e Miguel de Lira, actor e guionista, dois dos criadores de “Crebinsky”. Para contornar os constrangimentos que, em Espanha, se colocam à distribuição de cinema independente da indústria, a Banda Crebinsky (que interpreta a música do filme) realizou concertos pelo país, a complementar a projecção do filme. As receitas geradas permitiram, em 2011, a estreia nas salas de cinema.

Galiza, anos 1940, alvores da Segunda Grande Guerra. Os irmãos Crebinsky (Miguel de Lira y Sergio Zearreta) vivem na costa, lado a lado com um farol, num universo por eles concebido e desenhado, inventam tudo. “Uma história de dois irmãos que têm o seu próprio mundo”, é como Enrique Otero (Corunha, 1972) apresenta a sua primeira longa-metragem, “um conto, sem mais pretensões, feita para entreter”, disse à imprensa, por alturas da estreia nas salas de Espanha. Em entrevista com Otero e de Lira (Lira 1964), um dos guionistas, não há como

evitar as tradições e raízes galegas reconhecíveis em “Crebinsky”, e uma das conquistas do filme: a procura de uma linguagem que, ancorada no local, se converte em universal. Como Chaplin, referido pelo realizador nesta conversa, o filme ultrapassa fronteiras linguísticas, culturais, emociona na Galiza ou na Coreia do Sul (onde já foi exibido). “Crebinsky” apresenta uma linguagem e estilo únicos, “uma mistura de surrealismo, comédia muda e realismo mágico” (Variety). Filme inédito em Portugal, sessão imperdível.

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as personagens bebem muito do teatro, tanto por influência do co-guionista, Miguel de Lira, e o seu vínculo ao teatro, como pelas minhas referências fílmicas do cinema mudo, ou filmes recentes muito teatrais, como “Delicatessen” ou os filmes de Kaurismaki.

A história é tão inverosímil como parece? Enrique Otero: Creio que a história, ainda que seja fantástica na sua génese, tem tantas ligações às nossas raízes e coerência com factos históricos verídicos, que tem muita verdade em si. Miguel de Lira: A história do filme é uma hipótese provável, que navega entre as águas do inverosímil e do verdadeiro.

a linguagem que vai permitir que o local e o particular se convertam em universal. Em relação ao humor, procurámos nunca passar a fronteira da subtileza, um humor muito humano, chapliniano. ML: O humor de situação que impregna todo o filme tem a missão de potenciar a ingenuidade dos protagonistas, totalmente alheios à guerra mundial que os rodeia. São personagens perdidos e um tanto surrealistas porque vivem isolados da sociedade, em estreia convivência com a sua vaca. No guião, procurámos um tipo de humor com grande dose de ternura.

São várias as panorâmicas sobre as paisagens, penhascos, percebe-se uma importância das casas e tradições regionais. Que Galiza é esta? EO: É uma Galiza velha, a Galiza sem construção costeira, sem estar destruída pelos construtores. Uma costa muito abrupta, com mar muito bravo e com a essência das gentes que em tempos habitaram estes lugares. ML: É uma Galiza virgem com locais onde a paisagem produz emoções muito fortes. Uma Galiza dos anos 1940, rica e abundante em recursos naturais. É a Galiza do mar e das crebas, que são os objectos que aparecem pela costa procedentes dos naufrágios.

Há um estilo muito próprio do filme, “uma mistura de surrealismo, comédia muda e realismo mágico”, como descreveu a Variety. Existe uma continuidade com a produção teatral de onde partem alguns responsáveis pelo filme (grupo Chévere, Santiago de Compostela), ou nasce com a própria transição para o cinema? EO: É uma espécie de “Esperando Godot”, as personagens bebem muito do teatro, tanto por influência do co-guionista, Miguel de Lira, e o seu vínculo ao teatro, como pelas minhas referências fílmicas do cinema mudo, ou filmes recentes muito teatrais, como “Delicatessen” ou os filmes de Kaurismaki. ML: Gostamos de qualificar o filme como Realismo Fantasioso.

O recurso ao humor, e os diálogos quase ausentes, conferem um carácter acessível e universal a “Crebinsky”. Como surgiu esse recurso? A sátira e o humor parecem povoar naturalmente o cinema de autor produzido em Espanha, desde Berlanga, Buñuel, ou Almodóvar. EO: Decidimos fazer desta forma, poucos diálogos, muita presença dos actores e de elementos como a paisagem ou a música como parte activa do filme. Esta é

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é indignante ver como se estão a deitar para o lixo tantos anos de investimento no audiovisual galego, que chegou mesmo a ser um sector estratégico no âmbito das políticas culturais da nossa Autonomia

O que significa? ML: Os Crebinsky são personagens isolados do resto da sociedade, que convivem unicamente com a sua vaca e com as memórias pouco claras de infância. Substituem a falta de informação sobre a utilidade das crebas e das situações que vão encontrando com uma grande dose de imaginação e fantasia, algures entre o infantil e o surreal. Esta particular visão do mundo é o que poderíamos definir como Realismo Fantasioso.

A Galiza é uma referência na produção de cinema, nomeadamente na área do cinema de animação e em tempos recentes. Como está o sector neste momento? EO: A parte institucional, em decadência. O governo retirou todas as ajudas a vertentes tão importantes como curtas-metragens ou desenvolvimento de guião, com o qual se fecham muitas portas para os novos criadores, que são o cinema de amanhã. Por outro lado, nunca houve tantas pessoas a fazer cinema, nunca tanta gente se dedicou ao audiovisual como agora. Isto deveria reforçar-se com políticas culturais condizentes com o bom momento criativo. Sobretudo se quisermos que as gerações futuras, além de consumir vídeojogos, casas, carros e futebol, consumam também cultura. ML: Com este realismo cru que estamos a viver, é indignante ver como se estão a deitar para o lixo tantos anos de investimento no audiovisual galego, que chegou mesmo a ser um sector estratégico no âmbito das políticas culturais da nossa Autonomia. Actualmente, padecemos de uma vaga de indiferença e desinteresse absoluto em todos os domínios culturais, quer na Galiza, em Espanha… e imagino que em Portugal.

Na estreia de “Crebinsky” em Espanha falou-se, novamente, no realismo mágico onde entronca um tipo de criação artística oriunda da Galiza, relacionado com uma forma autóctone de entender a vida. Enrique Otero traçou, então, algumas diferenças em relação a “Crebinsky”: “Há uma tradição na Galiza de “realismo mágico”, mas para nos diferenciarmos um pouco adoptámos um “realismo fantasioso”, porque a fantasia dos nossos personagens é muito importante. Digamos que a história se cria nas suas cabeças. É um road movie atrás da sua vaca. E eles estão tão metidos no seu próprio mundo que não se dão conta do que se passa à volta, vêm as suas próprias fantasias.”

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ensaio parte 2

As relações entre literatura e cinema são centrais em boa parte das obras de Manoel de Oliveira. Fixemo-nos numa delas, surpreendente, negramente irónica em si e também quanto às expectativas que, na altura da sua realização, o público tinha em relação ao cineasta.

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Os Canibais: do texto de Álvaro do Carvalhal ao filme de Manoel de Oliveira Transgressão e limites Literatura e cinema

fortemente interventivo, constantemente denuncia os limites da ficcionalidade, numa auto ironia que se revela destrutiva da convencionalidade própria da época, sobretudo no que respeita à estrutura diegética de cada conto, o que depois se reflecte na dinamitação irónica dos próprios temas românticos recorrentes. Escrita à flôr da página, surge frequente depararmo-nos com a perfeita consciência do estereótipo, cristalização formal e temática, que o autor tinha em relação à literatura da sua época. Muito significativo é o início do capítulo VII do conto Os Canibais, onde o narrador reconhecendo a sua inépcia em fazer literatura de moda, cuja paradoxal forma seria o romance, se anematiza por não conseguir pôr em prática uma teoria formal e estética mais do que consabida: notar a sua curiosa receita para se fazer um romance de época. Como Maria de Lourdes Ferraz nota, em A Ironia Romântica, 1987, para além da constante auto ironia que o autor pratica, releva ao longo do texto em causa “uma espécie de dissolução do eu que escreve”, decorrendo esse facto de uma espécie de “dramatização na alucinação”. A permanente fragmenteção do eu, praticada ao longo de todo o conto, acarreta consequências semântico-pragmáticas bem visíveis quanto à estrutura da ficção. Dividida em oito capítulos, cada um deles marca uma elipse, mais ou menos longa. Apresentam-se

Tentemos concluir, provisoriamente, com uma sumária análise da adaptação feita por Oliveira. A ideia de adaptar o conto surgiu da vontade de João Paes, responsável pelas bandas musicais dos seus últimos filmes, em escrever uma ópera a partir de um argumento seu. Oliveira, em entrevista concedida a José de Matos- Cruz, diria: ”... Lembrei-me do conto de Álvaro do Carvalhal, que ele não conhecia e só agora está publicado. Há muito tempo que me fascinava...”, e mais à frente: ”... Há livros que me tocam, outros que são simpáticos, há os que me apetece levar ao cinema... A razão porque é assim, porque reajo de tal modo, isso desconheço...”. Saliente-se que, até ao filme de Oliveira, Álvaro do Carvalhal era um autor praticamente desconhecido, mesmo daqueles leitores mais bem informados. E no entanto, como anotou José Régio, em artigo publicado em 14-02-1968, no Primeiro de Janeiro, a sua obra é de uma profunda singularidade e originalidade no contexto estético-literário em que se insere. A obra de Álvaro do Carvalhal, editada postumamente, pois entretanto, vítima de um aneurisma, o autor faleceria apenas com 24 anos quando revia as provas do seu livro, resume-se praticamente à colectânea Contos. Foi considerada essa obra como uma ficção programática do ultra-romantismo, devido à constante desconstrução que o narrador faz da matéria ficcional. Narrador 12


Os Canibais (1988), adaptação do conto homónimo de Álvaro do Carvalhal, incluído na colectânea Contos, publicado em 1868. Imagem: Colecção Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema

cheio de fome, e, face à inusitada ausência dos recém-casados, resolve entrar na vazia câmara nupcial onde descortina um rescendente pedaço de carne assada com óptimo aspecto. Logo convoca os seus filhos, pensando ser aquilo o almoço do dia. Munidos dos utensílios necessários, desejando pregar uma partida ao Visconde de Aveleda, entram os três no quarto, colocam a peça de carne num recipiente em cima da mesa e logo passam à degustação de um pedaço, contudo insípido demais. Interrompidos por um grito, vindo do exterior da casa, para lá se dirigem, constatando o suicídio de Margarida e a tentativa de suicídio de D. João que, em expiação, revela o segredo do misterioso pedaço de carne: o Conde de Aveleda ele mesmo. Os três canibais dirigem-se fulminados para casa e meditam o suicídio como única forma de compensar a ignóbil afronta contranatura. Neste transe, o filho magistrado do Sr. Urbano Solar, constata que eles serão os legítimos herdeiros do Visconde de Aveleda em face da realização do casamento. Iluminam-se os olhares dos dois circunstantes que logo se encanizaram “no magistrado, como molossos esfaimados num couro rijo de pernil de Lamego”. O conto dissipa-se na antropofagia, canibalismo do próprio discurso, tão conscientemente retórico e logo paródico.

as personagens intervenientes no drama burlesco, que imediatamente criam fortes relações entre si: de aparente proximidade, caso de Margarida e do Visconde de Aveleda; ou de forte oposição, caso de D. João, apaixonado por Margarida e por ela rejeitado, o que lhe provoca uma forte comoção neurasténica. Quanto à acção ela é quase linear no seu jogo de aparências e equivocos: Margarida convence, no baile introdutório, o Visconde de Aveleda do seu amor, perante as misteriosas escusas deste; D. João despeitado clama vingança; realizam-se as núpcias, altura em que D. João lança uma maldição sobre o casal a pretexto de um brinde; o casal retira-se para os aposentos núpciais; D. João arrasta-se pelos jardins e acoita-se numa árvore, junto à janela dos noivos, meditando numa cena de cruel vingança; o Visconde de Aveleda revela-se para além da aparência e desestrutura-se num mecanismo surreal, ficando apenas cabeça e membros; Margarida, interdita, depois de ter prometido ao seu amado realizar as suas núpcias num cemitério se tal fosse necessário, fica apavorada e enlouquecida e lança-se por uma janela; o Visconde de Aveleda, desesperado, abisma-se, com grande esforço, na lareira acesa, sendo de imediato envolvido pelas chamas; D. João entra neste passo nos aposentos e constatando a desgraça foge esbaforido. No dia seguinte, pela hora do almoço, o pai de Margarida, 13


O canibalismo surge como a única possibilidade de contacto íntimo entre os corpos. Afinal pela degustação do corpo do outro, se chega a essa negra verdade, para lá da mascarada do jogo social, transvestido em retórico fraseado de circunstância. Imagem: Colecção Cinemateca Portuguesa Museu do Cinema

b) Os diálogos de Álvaro do Carvalhal, quer as partes do narrador quer as das personagens da intriga, foram mantidos até ao limite, isto é, apenas circunstancialmente se alteraram devido à necessidade de os adequar a uma notação musical operática. c) Em termos expressivos, cada personagem, dependendo da função que na acção representa, exprime-se modalmente de acordo com a forma musical mais adequada. d) Se a obra de Carvalhal pode ser sujeita a várias interpretações, de tão complexa e autoreflexiva, a de Oliveira não lhe fica atrás, pois que insiste sobre certas recorrências como sejam os reflexos, as aparências, o logro, a traição. Belo momento para atentarmos agora na recriação de Oliveira a partir da matéria adaptada, que, para além das constantes, demonstra ser bem mais excessiva: i) Perante a irónica omissão de Álvaro do Carvalhal em situar espacialmente e temporalmente o seu conto, Oliveira optou por um anacronismo: chegada dos convidados em automóvel de luxo, vestidos à Século XIX. Logo neste primeiro plano se introduz a ironia: os convidados que chegam são aplaudidos por uma multidão que os espera por detrás de barreiras metálicas- sinal de distanciamento social, tópico recorrente na tetrologia, agora uma clara evidência metafórica, assim como cristalina

Antes de mais, Os Canibais é um filme ópera. Aparentemente seria este o apogeu do artificialismo teatral. Mas esse facto é totalmente subvertido, visto ser esta uma obra com um ritmo muito rápido, onde a montagem é amplamente utilizada, onde se verificam inúmeros campos e contra campos, onde se recorre amiúde às transparências especulares, onde, pasme-se, se utilizam com alguma frequência grandes planos. Formalmente, este filme afasta-se da precedente obra de Oliveira, desde o início da tetrologia dos amores frustrados- O Passado e o Presente (1971). Estamos perante um exercício de portentosa auto ironia, onde aqueles temas descambam no mais puro grotesco. Analisemos em linhas gerais a adaptação feita no sentido da identificação com a obra ficcional: a) A estrutura do conto de Álvaro do Carvalhal é basicamente mantida. A mesma progressão diegética separada por cenas, introduzidas por um violinista e um narrador. Este narrador, personagem física do filme, para além de introduzir a diegese, vai comentando os principais episódios da narrativa. Na verdade é ele narrador autodiegético, que guia o olhar e condiciona a palavra dentro da estrutura narrativa do filme.

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a verdade instala-se quando Margarida vê o seu esposo nu, desarticulando-se qual marioneta, verdade insuportável que a leva ao suicídio, não restando ao Visconde opção, senão seguindolhe os passos, lançar-se à combustão. Neste passo, Oliveira recriou um significativo diálogo, inexistente em Carvalhal.

iiii) As palavras funcionam também como espelho, visto serem aparência e devolverem como reflexo essa mesma aparência. Aqui, as palavras andam a par com a ilusória imagem sempre devolvida através de reflexos enganadores. Note-se que a imagem do misterioso Visconde de Aveleda reflecte um ser de excepção, charmosamente misterioso, até ao limite do amor de Margarida que não sabe ver para além da mera aparência- reflexo enganador. iiiii) Este perverso e exterior jogo de olhares diferidos dura até ao momento da revelação. Nesta sequência o espelho como que se quebra, e a verdade instala-seneste caso quando Margarida vê o seu esposo nu, desarticulando-se qual marioneta, verdade insuportável que a leva ao suicídio, não restando ao Visconde opção, senão seguindo-lhe os passos, lançar-se à combustão. Neste passo, Oliveira recriou um significativo diálogo, inexistente em Carvalhal. Estando o Visconde a consumir-se no fogo e entrando de rompante D. João, diz o primeiro fixando nos olhos o rival: “a dizer dessa ingrata, da boca que cantou me devia ser enfeitiçada, arde na fogueira, ela mesmo avisou”. A palavra reflexa, por certo duplo apelo da sereia, quer por parte de Margarida que convenceu o Visconde do seu amor para além de todos os obstáculos, quer por parte do próprio Visconde que se deixou

demonstração de acto artístico, longe portanto de qualquer efeito de verossimilhança, auto paródia, logo no início, ao próprio conceito de ficção fílmica. ii) Igualmente nesse prodigioso primeiro plano se instaura ironicamente o principal motivo do filme: o fatal jogo de aparências e falsas prespectivas - conforme a sequência em que o porteiro abre a porta do primeiro automóvel, mas os convidados/actores já haviam saído pela outra porta do veículo. O porteiro, primeiro não percebe, depois indigna-se até manter a compostura. Os dois foliões riem-se dele e entram na sala de festas. iii) O filme é todo um longo jogo de aparências. Estas surgem melhor operacionalizadas do que no conto, devido à profusão de espelhos que ocupam o cenário. Os olhares são antes de mais direccionados para esses espelhos. As figuras reflectem-se pois especularmente, o que, aumentando a sua carga misteriosa, sobretudo quanto ao Visconde de Aveleda, instaura uma intranquila subjectividade, entremeada pelo contracampo do narrador que, mudo, se limita a rir com malícia. O momento mais intenso deste processo acontece com a chegada desse mesmo Visconde de Aveleda, primeiro entrevisto no espelho, e depois, aquando do primeiro diálogo com Margarida observado através desse mesmo espelho pelo narrador e depois pelo violinista. 15


Oliveira, em entrevista concedida a José de Matos- Cruz, diria: ”... Lembrei-me do conto de Álvaro do Carvalhal, que ele não conhecia e só agora está publicado. Há muito tempo que me fascinava...”, e mais à frente: ”... Há livros que me tocam, outros que são simpáticos, há os que me apetece levar ao cinema... A razão porque é assim, porque reajo de tal modo, isso desconheço...”.

canibal-mor suicida-se, o que faz com que o lamentável corpo de seu marido se volte a transfigurar num belo naco de carne, novamente aparência aos olhos daqueles. A segunda revelação, e aqui se desmonta a perversidade dos circunstantes, causa uma outra transfiguração: aquele que deu voz, quando se meditava um plano de suicídio colectivo pela ignomínia de se haver consumido a carne do Visconde, à salvação pela herança dos bens desse mesmo Visconde já consumido, transforma-se em porco perante os olhos de todos e é comido. Conclusão: a palavra neste filme nunca revela mas esconde sempre. A palavra quando supõe revelar, antes opera, perante aqueles desde sempre habituados à aparência, uma outra espécie de transfiguração. Na margem, transfiguração comestível e auto reversível, sendo que, qual caixa chinesa, as palavras saem devoradas e devoram, para lá de qualquer espécie de salvação, aqueles que as dizem: no caso, as palavras de Álvaro do Carvalhal e como consequência as palavras visualizadas de Manoel de Oliveira- amor, morte, aparência, transfiguração, canibalização, eis os termos chave nos confins de duas obras que, no limite, não existem. Porque a primeira foi devorada por Oliveira e a segunda, fatiada, é-o por nós. •

iludir por essas palavras, mas que iludiu também pela sua aparência, apenas revelada nesse grotesco momento patético onde seria suposto os corpos se conhecerem. iiiiii) Para terminar analizemos a última sequência do filme, essa da visceral antropofagia, onde todos devoram todos. Paralelamente à aparência reflectida em mys en abyme que domina todo o filme, e mais do que o filme, as relações entre todas as personagens, o canibalismo surge como a única possibilidade de contacto íntimo entre os corpos. Afinal pela degustação do corpo do outro, se chega a essa negra verdade, para lá da mascarada do jogo social, transvestido em retórico fraseado de circunstância. Foi esta a sequência que Oliveira mais recriou. No conto de Carvalhal são apenas três os canibais: o pai e os irmãos de Margarida. Depois da revelação feita pelo filho magistrado, este transforma-se em presa dos seus familiares. No filme todos acabam por se revelar canibais, mostrando animalescamente os dentes atiram-se à uma ao magistrado, visto, e aqui novamente a aparência a funcionar, como um saboroso porco. Curiosamente, as cenas de canibalização acontecem depois de se romperem as aparências através das revelações. A primeira, na câmara nupcial, que como consequência acarreta a oferta que Margarida faz de seu noivo à degustação de seus parentes próximos: Margarida a 16


what’s up ccv?

Pequeno Cinema

Aprender em Filmes

12 GRUPOS e 202 PARTICIPANTES NO ANO LECTIVO 2012/13

Nova animação ATUAIKA, SUKITA e ANDAKATU são os protagonistas pré-históricos da última curta produzida pelo CCV / Espalha Fitas (Abrantes), com crianças do 1º CEB. A convite do projecto ANIMAIO, a realizadora Graça Gomes e os alunos pensaram e escreveram a história, criaram o storyboard e os personagens, animaram e gravaram sons, durante 30 dias de intensa actividade. AS DESCOBERTAS DE ATUAIKA, SUKITA e ANDAKATU pode ser visto no portal vídeos.sapo.pt/ccv.

PEQUENO CINEMA é o projecto desenvolvido para o público escolar dos três aos dez anos, integrado no projecto CINEMA PARA AS ESCOLAS. Resultado das reacções positivas ao projecto (iniciado em 2010), decidimos alargar a rede de escolas beneficiárias do mesmo, sendo esta vontade possível, no presente ano lectivo, através do financiamento assegurado pelo programa VER (Instituto do Cinema e Audiovisual), pelas escolas e encarregados de educação. Até Maio de 2013, o projecto envolverá 202 participantes distribuídos por 12 grupos: Abraveses, Gumirães, Ranhados (Jardins de Infância), Colégio da Via Sacra, Ranhados, Nesprido e Farminhão (escolas). O projecto consiste em três sessões no espaço escolar (projecção de curtas-metragens, oficina de construção de brinquedos ópticos e, por fim, uma oficina de cinema de animação), terminando com a projecção de uma longa-metragem na sala de cinema.

da nossa história 1955

1997

Centenário do cinema em Viseu fevereiro 1997 Duas obras de Ernst Lubitsch, “Os olhos da múmia” e “A boneca do amor”, um espectáculo de teatro e música ao vivo foram propostos pelo CCV para assinalar a primeira sessão do animatógrafo em Viseu (5 de Fevereiro de 1897). Os filmes foram musicados ao vivo, com música original, pelo Prof. João Lucena e Vale, do Conservatório Regional de Música Dr. Azeredo Perdigão, de Viseu. A data foi assinalada no auditório da Casa da Juventude.

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2013


15 Jan

A LOUCURA DE ALMAYER

europa

2013 ciclo de cinema

La folie de Almayer, de Chantal Akerman, Bélgica, França, 2009, 127’

22 JAN

OSLO, 31 DE AGOSTO

Oslo 31 August, de Joachim Trier, Noruega, 2011, 95’

29 JAN

CÉSAR DEVE MORRER Cesare deve morire, de Paolo Taviani e Vittorio Taviani, Itália, 2012, 76’

05 fev

AS NEVES DO KILIMANJARO Les neiges du Kilimandjaro, de Robert Guédiguian, França, 2011, 107’

19 FEV

BELLAMY

de Claude Chabrol, França, Alemanha, 2009, 110’

26 FEV

CREBINSKY

de Enrique Otero, Espanha, 2011, 90’

IPDJ Viseu | 21:45 | Terças sócios €1,5 / €2,5 • não sócios €4

05 mar

AMOR

Amour, de Michael Haneke, França, Áustria, 2012, 127’

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observatório

Dark Matters Na Dark Matters, tentamos surpreender-nos através do jogo. Através do jogo infinito; por outras palavras, em oposição ao jogo com fronteiras estabelecidas, exploramos os desafios subjacentes à descoberta da essência das ideias e exprimimo-las em formas que nos permitem obter novas perspectivas dos temas. Através da acção, reacção e reflexão podemos alargar sistematicamente os limites da nossa existência. Algo que parece ser catalisado através de colaborações, a que nos dedicamos quando tal é possível. A viagem, especialmente tendo a internet como fonte inevitável e constante de inspiração, é sobre a análise, a reorganização e a criação de algo novo. Isto por si só coloca um grande problema para o conceito de criatividade e estilo. Nesse contexto, gostamos de considerar a internet para, tal como os sonhos, ser uma área maravilhosa onde se liberta a consciência reprimida. www.darkmatters.dk

o Estado da arte

sobre o Cinema

O que é que marca a criação artística actual?

o cinema é uma incontornável mais-valia na construção da visão do mundo, ou não?...

Uma distinção, ou melhor, uma categorização que gostamos de fazer é entre arte tecnológica e arte provocadora. Não se excluem mutuamente, mas enquanto categorias servem o objectivo de responder a esta questão. A primeira categoria, arte tecnológica, significa arte com a qual nós, humanos, empurramos as fronteiras físicas utilizando o nosso conhecimento tecnológico – e a exploração de diferentes expressões nesse processo. Actualmente, com a segunda categoria, arte provocadora, já não se trata tanto sobre o que se pode e o que não se pode fazer; em vez de se tocar em tabus, ética ou linguagem cultural, a provocação resulta do desprezo da linguagem (visual) dos nossos antecessores. Tomemos, por exemplo, um fenómeno trivial, mas paradigmático, como a crescente utilização de filtros de focagem na fotografia (amadora). Por que é que consideramos uma qualidade na fotografia a desfocada profundidade de campo? Na verdade, é um problema com o qual os fotógrafos estão a trabalhar enquanto limitação física. E é interessante que se tenha tornado esteticamente agradável e um bom ponto de partida para falar sobre a onda de desprezo/ anti/feia a que nos estamos a referir com a categoria de arte provocadora. A criação de lixo onde alguém poderia potencialmente criar algo de belo ainda parece ser provocadora e interessante, especialmente num tempo em que qualquer pessoa pode fazer coisas belas. O feio tornou-se, de muitas maneiras, muito mais interessante do que o belo. E agora que a técnica e o uso de ferramentas já não são o denominador principal para decidir quem é perito ou não, o que distingue o amador do perito? Para sermos breves, e simplificando a questão: é “a ideia” por trás da obra de arte.

Sim. O cinema permite esquecermo-nos do nosso corpo, ligar o nosso cérebro a uma história e experienciar emoções pessoais directas relacionadas com essa história. Permite o questionamento da nossa visão do mundo perante universos que são bastante diferentes dela. Pensem em filmes marcantes que nos aproximam de experiências 1:1 onde nos sentimos ligados ao universo (experiências holísticas). Quebrar os limites do nosso corpo é uma experiência espiritual. Na sua essência, o cinema é uma introdução à realidade. A realidade é reproduzida, ou melhor, é criado um novo universo onde se pode cair, uma espécie de momento sagrado, digamos. Mas depois há a consciência de estarmos a olhar para um actor que está a tentar fazer parte dessa diferente realidade e é aí que entra o cepticismo em relação ao cinema e especificamente em relação à indústria de Hollywood. Os melhores filmes não nascem de um argumento bem escrito, uma vez que lhes falta esta qualidade narrativa que, por exemplo, a literatura tem. Estamos entusiasmados ao ver o cinema manifestar-se no espaço físico – e pensem que os desenvolvimentos actuais estão a provar que há soluções muito mais potentes do que 3D, IMAX, etc. Adoramos ver a mistura entre o cinema e o teatro. Além disso, quando a maior parte da nossa inspiração vem do ecrã, sentimos que é um dever sermos críticos em relação a ele. Ele influencia as nossas ideias de um modo que faz com que queiramos desafiar esse médium. O cinema é como um palco musical. É uma progressão de media que está envolvida numa decisão de como contar uma história – fortificada em indústrias, movimentos anti/independentes e progresso tecnológico. Dito de forma descuidada, o cinema pode nem sempre ser o melhor meio para experienciar as ideias que subjazem ao nascimento de um filme.

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observatório

O R E ( v i d eo) © da r k m at t e r s + E m p e r o r o f A n ta r t i c a

Dark Matters e Emperor of Antartica vão do espaço ao rosto humano. O vídeo é um estudo destrutivo do corpo humano onde a beleza se funde com o animal num verdadeiro festim carnívoro.

R o s k i l d e F e s t i va l S o c i a l Z o n e © da r k m at t e r s

Um recreio de 500 m2 onde o público pode estar e relaxar entre concertos. O nosso objectivo era utilizar os dois projectores de vídeo gigantes com uma altura de 20 metros para criar um universo visual labiríntico em constante mutação com que o público pudesse interagir.


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