Exposição "Comércio tradicional - Espaços e Memórias"

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Integrada nos Festejos em Honra de Nossa Senhora da Salvação

Exposição

Comércio

Tradicional

Espaços e Memórias Tabernas, mercearias, lugares de fruta, sapateiros, barbeiros, casas de costura, tabacaria, grémio, são alguns exemplos do que foi a força comercial do concelho no século XX.

10 de Agosto a 17 de Setembro 2008 Galeria Municipal de Arruda dos Vinhos


Comércio Tradicional

Espaços e Memórias

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comércio tradicional é parte integrante da identidade de cada local, contribuindo para o seu ambiente e património. É um elo essencial da relação afectiva do território com os seus habitantes e estende-se aos visitantes, causando empatia e confiança que valoriza a comunidade. O concelho de Arruda dos Vinhos, enquanto espaço de características rurais, sempre teve um comércio tradicional que, para além de caracterizar social, económica e patrimonialmente a comunidade, gerou uma memória colectiva que faz parte de um passado ainda recente e, ao mesmo tempo, já longínquo. Tabernas, mercearias, lugares de fruta, sapateiros, barbeiros, casas de costura, tabacaria, grémio, são alguns exemplos do que foi a força comercial do concelho no século XX. Este ano, o Município de Arruda dos Vinhos promove este tema, estudando-o e apresentando-o nesta exposição temporária, integrada nos Festejos em Honra de Nossa Senhora da Salvação. Comércio Tradicional - Espaços e Memórias é apresentada nas vertentes histórica, social, cultural, económica, e abrange todo o concelho de Arruda dos Vinhos, muito embora tenha maior incidência na vila de Arruda, atravessando o século XX. Divisão Sócio-Cultural Município de Arruda dos Vinhos

Testamento "A minha alma encommendo A Noé e a outrem não, E meu corpo enterrarão Onde estão sempre bebendo. Leixo por minha herdeira E tambem testamenteira, Lianor Mendes d'Arruda, Que vendeo como sesuda, Por beber, at'á peneira. […]

Venha todo o sacerdote A este meu enterramento, Que tiver tão bom alento, Como eu tive ca de cote. Os de Abrantes e Punhete, D'Arruda e d'Alcouchete, D'Alhos-Vedros e Barreiro, Me venhão ca sem dinheiro Atá cento e vinte e sete." Gil Vicente in O pranto de Maria Parda

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Arruda dos Vinhos no Século XX vila, freguesia e concelho

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concelho de Arruda dos Vinhos foi restaurado, definitivamente, a 13 de Janeiro de 1898 com as freguesias de Arranhó, Arruda dos Vinhos, Cardosas e S. Tiago dos Velhos. A vila de Arruda, cujo núcleo principal se circunscreve ao interior do castelo medieval, prolongava-se pela actual Rua Cândido dos Reis (então Rua Almirante Reis ou Rua Direita). Numa descrição do Dr. Tito de Bourbon e Noronha, a vila tinha, para além do solar do extinto Barão de Arruda na Rua Almirante Reis, "duas casas mais solarengas; uma magra dúzia de prédios sólidos, de um andar e lojas, sem arquitecturas características, e ladeando os arruamentos tortuosos, pequenas casas rés-do-chão, mal divididas, mal arejadas, falhas de luz…" Após o tremor de terra de 23 de Abril de 1909, foram edificadas casas, a mando do governo, "com duas janelas em cada frente e uma porta, com quatro divisões bem iluminadas e arejadas que animaram a construção de outras habitações do mesmo tipo". Ao redor da vila de Arruda, e um pouco por todo o concelho "nas quintas e propriedades rústicas, alguns prédios, sem interesse e pelos lugares, de cerros, as moradias dos pequenos proprietários ou jornaleiros, casas térreas incaracterísticas, mais ou menos modestas, assim como os casais isolados pelas encostas e quebradas, manchas branquinhas de cal, no fundo verde-negro do terreno." (CÂNCIO, 1949: 297-298).

Arruda dos Vinhos - 1935

"O concelho de Arruda dos Vinhos sempre foi caracterizado por uma multiplicidade de paisagens, também elas resultantes de diferentes relações que o homem foi mantendo com o meio envolvente, salientando-se um característico mosaico de verdes, dourados, ou castanho-avermelhados, consoante as estações do ano popularmente apelidado de "manta de retalhos", decorrente das fases de crescimento e maturação das searas e das vinhas."

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(CMAV, 2008: 15).

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Caracterização Social e Económica do Século XX

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a vila concentrava-se o aglomerado populacional mais significativo de todo o concelho. No início do século XX a população do concelho era de 5547 habitantes, tendo quase duplicado para 10350 habitantes em 2001. Houve uma evolução acentuada no concelho, a nível demográfico, habitacional, etnográfico e económico, influenciando o modus vivendi da população.

Indumentária "…as mulheres usavam jaquetinha apertada ao busto, soerguendo os seios, muito cinturada, com pequena aba em canudos, estendidos em leque sobre os quadris. […] as raparigas usavam a jaquetinha de aba estreita, menos acanunada ou blusa também justa, saia de chita ou riscado mais alegre, bota de cordões azuis, ou sapato grosso de salto baixo, lenço atado no alto da cabeça.” "O homem usava jaqueta curta, colete de recorte em quadrado, calça muito justa, moldando a perna até ao tornozelo, onde alargava em polaina, cobrindo o sapato de prateleira a que se ajustava, chapéu de feltro preto, copa em cone truncado, aba larga rígida e cinta preta segurando a calça. Era o traje domingueiro.” […] "Para o trabalho, camisa de riscado azul, calça e colete de cotim, escuro, predominando o anilado, barrete preto enfiado até às orelhas, jaqueta ao ombro esquerdo, bota de cano alto, ou polaina de cabedal no Inverno, sapato de salto de prateleira de verão." (CÂNCIO, 1949: 298-299).

A respeito de população, hábitos e trajes, também o Dr. Tito de Bourbon e Noronha nos deixou um testemunho do princípio do século XX.

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Caracterização Social e Económica do Século XX

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m meados do século XX ocorreram algumas modificações na indumentária, nomeadamente:

Os homens passaram a usar "jaquetão comprido, modificou-se a abertura do colete, a calça alargou, à roda, chapéu mole de abas pequenas; só o barrete campeia ainda, agarrado à cabeça, de onde não larga nem para dormir, e os velhos friorentos só o tiram ao entrar na igreja, ou em casa de pessoas de respeito…” "Na mulher a transformação foi mais completa perdendo o típico regional, vestiu à moda, pelo figurino, à senhora citadina, blusa de seda e saia de fazenda ou vestido completo de sedas flamejantes, ou género alfaiate. O lenço desapareceu substituído pela mantilha, ou em cabelo, tendo também sacrificado as tranças, fazendo penteados permanentes; algumas que não conseguiram ainda de pais teimosos consentimentos para este sacrifício, substituem o carrapito por um laborioso encanastrado achatado na nuca, que lhes dá a ilusão de cabelo cortado, satisfazendo assim a vaidade da imitação senhoril." (CÂNCIO, 1949: 299).

Actividade económica e profissional "Na família tudo trabalha: o homem na faina agrícola, própria ou à jorna, ou no ofício, pedreiro, carpinteiro, sapateiro, ferreiro, etc; a mulher na lida da casa ajudando também aos trabalhos de fora, quando o tempo sobra; os filhos na adolescência trabalham para a casa, os rapazes na companhia dos pais, nos campos, auferindo féria como aprendizes ou serventes em ofícios de construção civil. As filhas nas mondas, ceifas, vindimas, apanha de azeitona, ou costureiras e serviçais, mas mesmo neste último caso entregam o ordenado à mãe que dele dispõe." (CÂNCIO, 1949: 300).

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Ligação das Freguesias à Sede do Concelho

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odas as freguesias, de pequena dimensão, tinham a sua própria dinâmica social e económica, com particular desenvolvimento para a actividade agrícola (cereais, legumes e frutas). No entanto, ao longo do século, ocorreram algumas transformações provocadas pelo surgimento de novas actividades ou pela deslocação de habitantes à procura de trabalho fora. É o caso das freguesias de Arranhó e S. Tiago dos Velhos, locais onde a actividade agrícola não teve tanto desenvolvimento como nas freguesias de Arruda dos Vinhos e Cardosas, tendo surgido actividades comerciais específicas, como o "ferro-velho", que nos dias de hoje, constitui uma das mais importantes actividades económicas do nosso concelho. Também devido à sua proximidade com o concelho de Loures e melhor acesso à capital do país, havia lugar a muitas trocas comerciais que não passavam pela vila de Arruda. No caso de Arranhó, existia forte ligação comercial com a vila de Sobral de Monte Agraço. A freguesia de Cardosas sempre teve uma ligação com Vila Franca de Xira, em actividades profissionais, com a ida de trabalhadores para os campos ribatejanos, mais tarde para a industria, e também a nível de trocas comerciais. A vila de Arruda era, e ainda é, o principal pólo comercial do concelho. Nas restantes freguesias, e em pequenos lugares, havia pequenos estabelecimentos comerciais nomeadamente tabernas com pequena mercearia, cuja coexistência era muito frequente. De resto, um pouco por todo o lado existiam ofícios que davam resposta às necessidades da localidade (barbeiro, sapateiro, etc.).

Vida Ribatejana, 16 de Abril de 1966, pág. 8

Pode considerar-se que as aberturas do Banco Burnay e do Externato Irene Lisboa tenham funcionado como pólos centralizadores das deslocações dos habitantes de todo o concelho, uma vez que o comércio absorve os clientes que se deslocam e circulam pelas localidades, sendo o ensino e o trabalho os principais factores de deslocação. Foi a partir daqui que se verificou maior mobilidade entre as restantes freguesias e a vila de Arruda.

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Caracterização do Comércio

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A Taberna

comércio assentava na venda de produtos de primeira necessidade, não havia lugar a grandes luxos, e as tabernas eram em grande número, fazendo jus ao nome de Arruda dos Vinhos. As compras eram feitas uma vez por semana, normalmente ao Sábado, e designava-se por avio da semana.

"A taberna foi sempre ligada à ideia de lugar mágico, de sítio preferencial para ligações com deuses e considerada por isso como manifestação social que deveria obedecer às escritas ordens do poder. Aliás, o poder, seja ele qual for, lida mal com as coisas e as pessoas que se podem livrar com alguma facilidade do mundo real da ordem e da regra. A taberna foi sempre um sítio onde o levantar de asa era possível e o seu fascínio, que um dia deverá merecer rasgado desenvolvimento, levou que os homens vissem nela uma porta aberta para a insubmissão, para a verdadeira revolta, para a liberdade." Alfredo Saramago in TABERNAS.

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Mapa da Vila (1955) com a indicação das tabernas e café existentes

1 - Matias 2 - Salvador 3 - Batata 4 - Manuel Coelha 5 - Galegos 6 - Herculano 7 - Joaquim Alho 8 - Melros 9 - Luís Constantino 10 - Linguiça 11 - Zé Carvalhito 12 - Augusto Benigno 13 - Manecas/Matelão 14 - Luís Caturra 15 - Gertrudes Caneca 16 - Carlos Marraça "Má Rassa" 17 - Maria Quintino 18 - Mateus d'Alice 19 - Bexiga 20 - Ilda do Torto 21 - Ti Bento 22 - Ti Beatriz 23 - Zé do Albino 24 - Obras "Canholas" 25 - Café do Albino

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Caracterização do Comércio

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ó na vila de Arruda, em meados do século XX, coexistiram 24 tabernas. Estes estabelecimentos eram, na sua maioria, explorados pelos proprietários e adoptavam o seu nome ou alcunha como identificação, mesmo sem que o proprietário manifestasse essa intenção. Na taberna vendia-se um pouco de tudo: vinho, bebidas engarrafadas e enrolhadas, alguns petiscos, bolos secos, guloseimas, tabaco e, curiosamente, alguns produtos de utilidade doméstica, sendo que em algumas tabernas coexistia um espaço de mercearia. Vendia-se de tudo, excepto café.

Um estabelecimento com todas as características atrás referidas, e que vendesse café não era uma taberna, mas sim Café. Digamos que se trata de uma distinção pela positiva, cujo factor distintivo era o café. E tratava-se do café de cafeteira, vendido em copo de vidro, depois do assentar da borra e devidamente adocicado. Mais tarde, foi introduzido o café de máquina. No centro da vila, por exemplo, refira-se o Café do Albino (ao lado do Chafariz) que foi o primeiro a ter televisão. Um estabelecimento que vendesse produtos derivados do leite e bolos de pastelaria era designado de padaria ou leitaria.

As tabernas eram locais de encontro e de socialização, onde se jogava às cartas ou ao dominó. Algumas tinham um posto público de telefone, facto que ainda apresenta vestígios nos dias de hoje, nomeadamente em locais onde antigamente existiu uma taberna.

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Caracterização do Comércio A Mercearia

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s mercearias vendiam produtos alimentares, higiénicos e alguns artigos de utilização ou decoração doméstica. O comércio era a retalho; grande parte dos produtos não era embalado ou empacotado, vendia-se a peso ou medida e, normalmente, apenas a quantidade necessária para o consumo semanal, ou a que era permitida pela economia doméstica, muitas vezes ditada pela escassez de dinheiro.

vila de Arruda, ou noutras vilas com as quais houvesse maior ligação comercial e, muito raramente é que havia necessidade de uma deslocação a Lisboa para efectuar compras mais específicas. Por outro lado, a deslocação a Lisboa era frequente para a venda de produtos agrícolas ou vinícolas desta zona saloia.

Percorrer o nosso país de Norte a Sul ou do Litoral para o Interior é como fazer uma viagem, ou várias viagens, no tempo. E ainda hoje conseguimos encontrar numa vila ou aldeia, numa taberna ou numa mercearia, um modus vivendi que reproduz tudo o que existe na memória do que foi Arruda dos Vinhos há vinte, trinta, quarenta ou cinquenta anos atrás. Existia um estilo de vida muito auto-suficiente em matéria de produção animal, hortícola e frutícola, que quando ultrapassava a esfera familiar, era resolvido na vila, neste comércio tradicional. Daí que o abastecimento era semanal, normalmente ao sábado, e ocorria na

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Caracterização do Comércio

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negócio da mercearia foi fortemente ameaçado com a instalação do primeiro supermercado, (marca SPAR, pertencente a uma cadeia internacional) no centro da vila, em frente ao Hospital da Misericórdia. Este novo negócio oferecia os produtos a preços mais acessíveis e permitia ao cliente, pela primeira vez, o contacto e a escolha do produto directamente da prateleira. Para fazer face a esta comerciantes uniram-se e central de compras com poderem concorrer com os supermercado.

ameaça, alguns formaram uma a intenção de preços do novo

Po s t e r i o r m e n t e , a r e d e d e supermercados SPAR acabou e o espaço foi ocupado pela firma Sociedade Alimentícia Central de Arruda dos Vinhos, Lda., pertencente a alguns comerciantes, nomeadamente: Sr. Fernando Luís, Sr. Isaías Oliveira, Sr. João Segundo, Sr. Manuel Batel, Sr. Manuel Pires. Este estabelecimento mantémse em funcionamento como supermercado.

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Caracterização do Comércio O Talho

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talho tinha duas vertentes: as carnes verdes ou frescas (miudezas) e salgadas (cabeça, chispe, toucinho, enchidos), que não eram vendidas em conjunto. Existiam os talhos do Sr. José Campos, do Sr. Amílcar, do Sr. Joaquim Félix, do Sr. João Lucas e do Sr. António Azevedo. Para a carne de qualidade havia procura por parte de alguns restaurantes, nomeadamente de Lisboa. Decorrente desta procura, deslocava-se semanalmente o Sr. Armindo (um dos actuais sócios do restaurante “O Fuso”) que chegava à vila de manhã para encomendar a carne, e aguardava na taberna do Sr. Luís Constantino (actual Restaurante "O Fuso") para a levar ao fim do dia. Foi num destes compassos de espera que surgiu a oportunidade de negócio que colocou o nome de Arruda dos Vinhos na lista dos concelhos com um dos mais conhecidos restaurantes do país.

A Barbearia

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ctualmente ainda existem êuas barbearias na vila de Arruda que se mantêm fiéis à tradição. Há registo de terem existido nove barbearias, sendo que o hábito de fazer a barba era mensal, normalmente ao sábado, e custava 8$500. Uma das barbearias era a do "Peixe-Cão" e situava-se no Largo do Terreiro. A barbearia era a faceta da pobreza e do jornalismo local, uma vez que ali se discutiam todos os assuntos e notícias da vila. Habitualmente as crianças não cortavam o cabelo na barbearia porque era d e m a s i a d o dispendioso, e era o tosquiador de ovelhas e burros que lhes cortava o cabelo.

Comércio Tradicional Vida Ribatejana, n.º 2017, 1 de Dezembro de 1957, pág. 5

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Caracterização do Comércio Outro Comércio Pensão e Casa de Pasto "Os Melros" - situados em frente ao Hospital da Misericórdia, onde mais tarde foi instalado o supermercado (marca SPAR).

Casa dos Galegos - situada na Rua Cândido dos Reis, após o Largo do Hospital da Misericórdia, era um negócio familiar (Firma Fernandes & Marques, Lda.) que abarcava diversas áreas: padaria, mercearia, taberna e fancaria. Possuía um pátio interno que funcionava como "parque de estacionamento" dos burros que transportavam os habitantes dos casais e das quintas para o "avio" semanal. Ao lado deste estabelecimento foi instalada a primeira agência bancária do concelho, em 1966 - Banco Burnay que utilizava o telefone da Casa dos Galegos, com o número 95244.

Loja do Lucas - negócio familiar na área da construção civil que

Anúncio publicado em 1956

Anúncio publicado em 1956

também teve uma carpintaria a funcionar, na Rua Almirante Reis (actual Taberna da Ti'Amélia), em sociedade com o Sr. Custódio Quintino. Surgiu depois dos estabelecimentos de Alfredo Quintino e de Domingos da Silva (Domingos Chá) , ambos no mesmo ramo de actividade.

Casa Cavaco - situada no principal largo da vila, funcionava como uma Central de Camionagem. Foi dos primeiros estabelecimentos que teve televisão. Era um negócio familiar que ainda hoje, com mais de 50 anos de estabelecimento, continua a ser gerido pela família Cavaco.

Lugar de Fruta

- Lugar do "Canholas", depois do Zé Roseira e mais tarde (1974) o lugar da D. Maria José. Sempre vendeu muito ao sábado por ser o dia do avio semanal.

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Caracterização do Comércio Outro Comércio Farmácia da Misericórdia - situada no edifício da Câmara Municipal. Padaria Amadeu - situada nas escadinhas da Taberna do Bento. União de Panificação - procedeu-se à união de todas as padarias de Arruda dos Vinhos, em 1962.

Cabeleireira Leonilde - situada por cima da antiga Farmácia. Salão-Cabeleireira da D. Deolinda - situada no largo da vila por cima do Alfaiate do Sr. Lavadinho e ao lado do Fotógrafo Ciness.

Leitaria da D. Regina - situada na Rua do Loureiro. Loja da Maria Fava - situada na Rua Cândido dos Reis, vendia um pouco de tudo e tinha barricas de atum e bacalhau no passeio. Loja da Emília Caixinha - situada na Rua Cândido dos Reis, em frente ao Café do Albino, e vendia gás.

Loja do José do Grão (funileiro) - situada no largo em frente à Igreja Matriz de Arruda dos Vinhos. O Clarim, Março de 1962, pág. 2 e 3

Loja do Domingos Pardalinho (funileiro) - situada na Rua Cândido Reis em frente ao Hospital da Misericórdia.

Sapataria Severino de Sousa - situada no largo da Vila (actual Café Creme). Fotógrafo Ciness - situado no largo da vila, em frente à Casa Cavaco.

Bomba de Gasolina - situada em frente à Câmara Municipal, entre o Chafariz e a Casa Cavaco.

Comércio

Grémio da Lavoura - situado no largo da vila (actual Café Central), vendia cereais e adubos. Mais tarde passou a Cooperativa Agrocamprest.

Tradicional Anúncio publicado em 1956

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Caracterização do Comércio

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comércio tradicional era composto por muitos mais estabelecimentos e registava uma dinâmica muito forte. Na impossibilidade de apresentar todas as actividades, centrámo-nos em aspectos que ocorreram na vila e no concelho e que decorriam do próprio comércio, assim como influenciaram o seu desenvolvimento. Para além da vertente comercial, os estabelecimentos tinham uma função social e educativa muito importante, porque a relação com os clientes era de grande proximidade; muitas vezes, alimentavam famílias cujo sustento não era regular pois dependia do trabalho à jorna ou da venda de cereais e vinho, e vendiam fiado, correndo sempre o risco de não receber o pagamento, ou receber tardiamente. As crianças com 11 e 12 anos, depois da instrução primária, iam trabalhar para um estabelecimento comercial e aprendiam um ofício. Nestes casos havia uma função educativa importante, porque empregavam-nos como aprendizes e ensinavam uma actividade específica; as crianças, por seu lado, aplicavam e desenvolviam alguns conhecimentos e, uma vez que não iam seguir os estudos, integravam-se no mercado de trabalho. Este ciclo gerava-se em função das necessidades que se v e r i f i c a v a m n o s estabelecimentos da vila, e como não havia grandes expectativas, as crianças e familiares sujeitavam-se ao serviço que era necessário satisfazer. Como aprendizes, adquiriam conhecimentos específicos, uma profissão e, por vezes, chegavam a abrir um negócio por conta própria.

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Praça de Homens

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evido à ruralidade que sempre caracterizou o concelho de Arruda dos Vinhos, o trabalho agrícola constituía um grande peso na economia local. Os proprietários dos terrenos que produziam fruta, legumes ou cereais, eram os patrões dos homens que tinham de vender a sua força de trabalho. A força de trabalho era colocada à venda diariamente, numa troca comercial a que se chamava Praça de Homens Homens. A Praça de Homens ocorria em alguns pontos centrais da vila, nomeadamente junto ao Hospital da Misericórdia, e marcava o primeiro momento comercial do dia, influenciando o restante comércio. O conceito de trabalho à jorna provocava muita instabilidade na economia da vida familiar já que, durante muitos anos, apenas o homem tinha uma actividade profissional remunerada, e quando a mulher trabalhava no campo, por conta de outrém, a remuneração era baixa. Essa instabilidade existia porque não havia certeza de se ser recrutado para trabalhar e porque mesmo que tal viesse a acontecer, o preço variava de dia para dia, conforme a procura de homens, a oferta de força de trabalho e a robustez do trabalhador. Normalmente, ficavam por recrutar as crianças (que começavam a trabalhar com 11 anos) e os idosos porque a força e robustez física não davam grandes garantias de proveito ao empregador. Em Arruda dos Vinhos, estes homens e crianças eram recrutados pelos proprietários das grandes quintas, que lhes garantiam o dia de trabalho e o sustento familiar. No entanto, outros factores como a sazonalidade do trabalho agrícola e as condições atmosféricas podiam resultar num período longo sem trabalho no campo, que se reflectia em termos económicos e comerciais, resultando numa debilidade acentuada que consequentemente assentava em pedidos de fiado aos estabelecimentos comerciais, e na honra dos homens que ficavam a dever e que pagavam quando voltassem a ter trabalho. A influência que a Praça de Homens provocava no restante comércio derivava do facto dos jornaleiros trabalharem ou não, pois daí podiam ganhar dinheiro para comprar os produtos de que precisavam. Tudo isto era, também, fortemente dinamizado com a sazonalidade das actividades agrícolas, mas mesmo assim, por ocasião das ceifas eram recrutados gaibéus do Norte do País e, nas vindimas eram recrutados muitos alentejanos. A vinda desses trabalhadores para a vila constituía, por si só, um incremento para o comércio.

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Curiosidades A instalação e abertura de unidades fabris em Arruda dos Vinhos influenciaram muito o crescimento do comércio na vila e arredores, como foi o caso da ILPA - Fábrica de Caju, e mais tarde a DCP, que provocaram um grande movimento comercial na vila de Arruda. O fecho destas fábricas, apesar de ter diminuído o movimento, não teve um efeito muito nefasto no comércio.

Revolução Comercial

aparecimento do primeiro supermercado SPAR.

Feira Anual de Santo António - grande venda de barro, representava um período de poucas vendas no comércio estabelecido.

Existia um mercado mensal, no último Domingo do mês, que atraía muitos forasteiros à vila.

Festas do Concelho

- representavam um momento alto no comércio local porque era a época do ano em que se estreava roupa nova, comia-se coelho e galinha e o rancho era melhorado, pelo que se compravam mais e melhores produtos do que o habitual.

Existia venda ambulante com destaque para o leite vendido de porta em porta; o ouro era vendido por um ourives que vinha de Mira; e o peixe que era vendido por varinas de Vila Franca de Xira que se deslocavam à vila de Arruda, de autocarro, para fazer a venda no largo junto à Misericórdia. Mais tarde, com a abertura do Mercado Municipal (1935), faziam a venda no Mercado e depois continuavam nas ruas da vila. As principais varinas eram: Prudência, Celeste, Carolina, Virgínia e Catarina. O peixe era 'amanhado' pelo "então" conhecido Joaquim da Rata.

Bruxa da Arruda

- funcionava como um incremento à actividade comercial porque tinha muita procura e muitas pessoas de fora se deslocavam à vila.

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Personagens da Vila Helena Major

- venda de tremoços e bolos, à porta da

taberna.

Manuel da Sola "Estica Barretes" - estabelecido na Rua Almirante Reis (actualmente Salão Carmo).

Margarida - (mulher do Sr. Rufino Ferrador) que bebia muito vinho. "Há em Arruda um homem/ que casou pela segunda vez/ ele deixou de beber/ e ela bebe por três" (verso feito ao Sr. Rufino).

Joaquim da Rata "Pregoeiro" - homem de grande porte que vivia na rua, normalmente dormia debaixo das arcadas do Hospital da Misericórdia, e fazia pregões em troca de alguns géneros alimentares. Apregoava todos os produtos que eram de venda ambulante (peixe, leite, etc.), assim como anunciava perdidos e achados na rua. Normalmente também 'amanhava' o peixe que as varinas vendiam.

Mestre António "Bagageiro" - homem de pequeno porte que via bastante mal e que distribuía, pelos estabelecimentos, as mercadorias que chegavam no autocarro de Bucelas à quarta-feira, com um carro de mão.

Luís da Mana - tosquiador de animais que cortava o cabelo às crianças, cujas famílias não tinham dinheiro para as levar ao barbeiro.

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Funcionamento e Horários dos Estabelecimentos Rua Almirante Reis ou Rua Direita (actual Rua Cândido dos Reis) - principal área de comércio da vila. A rua tinha dois sentidos de trânsito.

O horário dos estabelecimentos era rígido e sujeito a controle policial. Caso o estabelecimento estivesse a funcionar fora do horário, pagava multa. - Semana - 9h às 19h - Sábado - 9h às 23h - Domingo - 9h às 12h - Descanso semanal à Segunda-feira

Abastecimento do comércio - as compras

Vida Ribatejana, 19 de Dezembro de 1964, pág. 8

eram feitas por encomenda a um caixeiro-viajante que se deslocava à vila regularmente e, posteriormente os produtos vinham no autocarro para Arruda. Chegados à vila, os produtos eram transportados para os estabelecimentos comerciais pelo Mestre António com um carrinho de mão. Como caixeiros-viajantes foram referidos os seguintes: - Neves - vendia licores e cafés; - Marciano Mendonça de Vila Franca de Xira; - F. R. Maneira, Lda. de Alhandra; - Sr. Pereira do Brás & Brás; - Sr. Benjamim Kaç (Judeu) que não vendia produtos alemães.

Comércio

Vida Ribatejana, 18 de Março de 1977, pág. 4

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Expressões - Glossário Fiado

- a compra era efectuada sem dinheiro e por necessidade absoluta dos produtos, normalmente os de primeira necessidade. Os fiados ficavam registados no rol, existindo um livro de fiados e calotes para o efeito. O pagamento era efectuado quando houvesse dinheiro, depois da venda do vinho ou do trigo.

Crédito - a compra era efectuada sem ter dinheiro e o pagamento era assegurado por prestações ou letras. O crédito funcionava para compras de grande porte, nomeadamente para materiais de construção ou de laboração e a honra das pessoas era tida em conta.

Honra - nas transacções comerciais fiadas ou a crédito, principalmente porque não havia dinheiro para efectuar o pagamento, a palavra e a honra tinham uma importância muito grande e funcionavam como a garantia de pagamento. Aconteciam alguns suicídios quando não conseguiam honrar a palavra e efectuar o pagamento.

Pa g a m e n t o e m g é n e r o s alimentícios - quando não havia dinheiro

Comércio sazonal

- dependência da actividade comercial às actividades agrícolas sazonais (ceifas, vindimas, pós-vindimas).

Comércio familiar

- comércio suportado pelos próprios proprietários, podendo ter um ou outro empregado.

Livro dos fiados e calotes - onde ficavam registadas as dívidas dos clientes.

Venda a granel/retalho - produtos vendidos a peso ou medida.

Avio semanal - compra dos víveres para a semana.

Economia doméstica

- gestão das

receitas e das despesas familiares.

Modus Vivendi - corresponde ao modo de vida característico de uma local e de uma época.

para pagar, muitas vezes a troca directa de produtos por serviços, funcionava como meio de pagamento.

Andar ao regateio

- discussão do preço dos produtos em transacção comercial, muitas vezes era um comércio ambulante, sendo os produtos transportados em carroças.

Comércio

Trabalho à jorna - contratação diária e

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sem preço fixo para trabalhos agrícolas.

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Bibliografia CÂNCIO, Francisco (1949), Ribatejo - Casos e Tradições, Fascículo XXV, Imprensa Barreiro, pp. 289-322. FERREIRA, Paula e CÂMARA, Paulo, «Arruda dos Vinhos: Património e Ruralidade» in Actas do IV Seminário do Património da Região Oeste, Organização e Edição do Município de Arruda dos Vinhos (2008). INE, Censos Gerais de População de 1900. INE, Censos Gerais de População de 2001. Jornal A HORA (1934). Jornal A HORA (Julho de 1956). Jornal O CLARIM. Jornal VIDA RIBATEJANA (1925 a 2000). Mapa da Vila de Arruda dos Vinhos (1955), Edição ROTEP. NORONHA, Tito de Bourbon e (2006), Memórias de um João Semana, Organização e Edição do Município de Arruda dos Vinhos. SARAMAGO, Alfredo «Nota de Apresentação» in RODRIGUES, José Manuel (1998), Tabernas - Percursos na memória do Concelho de Grândola, Câmara Municipal de Grândola. VICENTE, Gil, O Pranto de Maria Parda.

Entrevistas António dos Santos Val-Flores António José Pinheiro de Oliveira António Martins Bexiga de Carvalho "Sanica" Asdrúbal Duarte Cunha Fernando Francisco Luís João José Pereira Cavaco José Mateus dos Reis Pedro Luísa Maria Lourenço Fernandes Maria José Branco Pedroso Maria Madalena Lourenço Fernandes

Ficha Técnica Exposição Temporária

Comércio Tradicional- Espaços e Memórias 10 de Agosto a 17 de Setembro de 2008

Responsabilidade Município de Arruda dos Vinhos Divisão Sócio-cultural

Concepção da Exposição e Preparação de Conteúdos Ana Filipa Correia Paula Ferreira

Trabalho de Investigação Ana Filipa Correia Maria Ana Fonseca Paula Ferreira

Recolha de Imagens Helder Alegria (2.º Prémio IX Jogos Florais Irene Lisboa) Jorge Rato Paulo Câmara

Concepção Gráfica da Exposição Município de Arruda dos Vinhos | Gabinete de Comunicação e Imagem

Agradecimentos Anabela Valente António dos Santos Val-Flores António José Pinheiro de Oliveira António Martins Bexiga de Carvalho "Sanica" Asdrúbal Duarte Cunha Fernanda Bexiga Fernando Francisco Luís Francisco Herculano Grupo de Teatro do Clube Recreativo e Desportivo Arrudense José Figueiredo João José Pereira Cavaco José Mateus dos Reis Pedro Luísa Maria Lourenço Fernandes Manuel Ricardo "Manuel das Antas" Margarida Soares Maria de Lurdes Lavadinho Maria de Lurdes Santos Maria José Branco Pedroso Maria Madalena Lourenço Fernandes Óscar Falcão Ribeiro Tito Sousa Vitorina Paulino Azambujo

Comércio Tradicional 19

Espaços e Memórias


Comércio Tradicional

Espaços e Memórias

O

comércio tradicional é parte integrante da identidade de cada local, contribuindo para o seu ambiente e património. É um elo essencial da relação afectiva do território com os seus habitantes e estende-se aos visitantes, causando empatia e confiança que valoriza a comunidade. O concelho de Arruda dos Vinhos, enquanto espaço de características rurais, sempre teve um comércio tradicional que, para além de caracterizar social, económica e patrimonialmente a comunidade, gerou uma memória colectiva que faz parte de um passado ainda recente e, ao mesmo tempo, já longínquo. Tabernas, mercearias, lugares de fruta, sapateiros, barbeiros, casas de costura, tabacaria, grémio, são alguns exemplos do que foi a força comercial do concelho no século XX. Este ano, o Município de Arruda dos Vinhos promove este tema, estudando-o e apresentando-o nesta exposição temporária, integrada nos Festejos em Honra de Nossa Senhora da Salvação. Comércio Tradicional - Espaços e Memórias é apresentada nas vertentes histórica, social, cultural, económica, e abrange todo o concelho de Arruda dos Vinhos, muito embora tenha maior incidência na vila de Arruda, atravessando o século XX. Divisão Sócio-Cultural Município de Arruda dos Vinhos

Galeria Municipal de Arruda dos Vinhos 10 de Agosto a 17 de Setembro 2008


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