REVISTA ULTIMA VERSÃO

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“Cantai louvores ao Senhor.” (Sl 30,4)

BELO HORIZONTE | 2019


s a r o d a d Fun

Comun

idade a tual


EDITORIAL NESTE ANO DE 2019, NOSSO MOSTEIRO COMPLETA 70 ANOS DE FUNDAÇÃO. 70 anos de oração, de louvor, de fraternidade, de vida entregue e doada a Deus para que Ele seja nosso verdadeiro fundamento. Tudo se constrói quando se tem por base um fundamento sólido, firme e estável como somente o Senhor pode nos oferecer. Ele é a Pedra fundamental sobre a qual, ainda hoje, estamos construindo nossa família monástica. No Mosteiro de Nossa Senhora das Graças passaram muitas irmãs que, com suas vidas, com seus testemunhos, fizeram deste lugar a habitação de Deus. Podemos pisar neste solo conscientes de que muitos pés nos antecederam, pés de irmãs que trabalharam com o corpo, a alma e o espírito para que hoje nos encontremos com Deus nesta casa de oração. Celebrar 70 anos significa para nós olhar nossa história com gratidão, contemplando o dedo de Deus passando e conduzindo cada acontecimento. Ao mesmo tempo, renovamos o compromisso de uma entrega de vida sem limites, sabendo que somos uma pequena parte, uma pequeníssima parte, de um projeto de amor entre Deus e a humanidade. Ser “pequena parte” não significa de modo algum ser insignificante! Deus, em sua infinita misericórdia, escolhe canais frágeis pelos quais passa sua imensa graça. Damos graças ao Senhor por estar sempre conosco, nas alegrias e nas fadigas, utilizando de todos os fatos para construir nossa história concorde a vontade do Pai.

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“Toma em Tuas mãos Senhor aquilo que somos ajudando nos a cumprir somente Teus desejos”

Diagramação: CI Comunicação Inteligente


(Madre Maria Letícia Junto às Irmãs Claustro Sta. Cecília)

Minha Vida é Um Saltério, Meu Saltério é Minha Vida “Vou louvar-vos, Senhor, entre os povos.” (Sl 56, 10)

N

osso Mosteiro de Nossa Senhora das Graças celebra 70 anos de vida na oração comunitária do Ofício Divino (RB 58,15). Aqui, nada se prefere à Obra de Deus (RB 43,5). Esta oração fundamenta a realização de nossa vocação monástica, que é: Dom do Espírito, identificação com Cristo presente na Palavra rezada, de maneira que nosso espírito concorde com nossa voz (RB 19), capacitandonos para a busca de Deus. Bem cedinho, pela graça e a palavra do Espírito, meu coração se eleva para o Pai: s “Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção, e sua face resplandeça sobre nós! Que na terra se conheça o seu caminho e a sua alvação por entre os povos! Que as nações vos glorifiquem, ó Senhor! Que todas as nações vos glorifiquem!” (Sl 66,2-4).

Com o decorrer do dia, minha alma vai se esquentando, ao calor de um sol mais forte do que esse que vai subindo no espaço infinito: “Senhor, quero dar-te graças de todo o coração, e falar de todas as tuas Maravilhas. Em ti quero alegrar-me e exultar, e cantar louvores ao teu nome, ó Altíssimo!” (Sl 9, 1-2). Chegando a hora feliz da Santa Eucaristia: “oferecemos, por meio de Jesus, continuamente, a Deus, um sacrifício de louvor, que é fruto de lábios que confessam o seu nome” (Hb 13,15). No silêncio e na oração, no trabalho e nos tropeços, vou percebendo a mão de Deus segurando as minhas e seus pés orientando os meus, paras as pegadas de Jesus:


Mudaste o meu pranto em dança, minha veste de luto em veste de alegria, para que o meu coração cante louvores a ti e não se cale. Senhor, meu Deus, eu te darei graças para sempre’’ (Sl 30, 11-12) As horas vão correndo com seu peso e as luzes, querendo se apagar, mas cada Salmo tem milhares de mensagens, que repito confiante: “Cantem de alegria ao Senhor, vós que o temeis. Aos retos fica bem glorificá-lo. Louvem o Senhor com harpa; ofereçam-lhe música com lira de dez cordas. Cantem-lhe uma nova canção; toquem com habilidade ao aclamá-lo” (Sl 33, 1-3). Meu Saltério não tem fim, minha vida há de ser saltério eterno:

“Louvai o Senhor Deus nos altos céus, louvai-o no excelso firmamento! Louvai-o, anjos seus, todos louvai-o, louvai-o, legiões celestiais! Louvai-o, sol e lua, bendizei-o, louvai-o vós, estrelas reluzentes! Louvai-o, céus dos céus, e bendizei-o, e vós, águas que estais por sobre os céus. Louvem todos e bendigam o seu nome, porque mandou e logo tudo foi criado. Instituiu todas as coisas para sempre e deu a tudo uma lei que é imutável. Louvai o Senhor Deus por toda a terra, grandes peixes e abismos mais profundos; fogo e granizo, e vós neves e neblinas, furacões que executais as suas ordens. Montes todos e colinas bendizei-o, cedros todos e vós, árvores frutíferas, Feras do mato e os mansos animais, todos os répteis e os pássaros que voam. Reis da terra, povos todos, bendizei-o e vós príncipes e todos os juízes. E vós jovens e vós moças e rapazes, anciãos e criancinhas, bendizei-o! Louvem o nome do Senhor, louvem-no todos, porque somente o seu nome é excelso! A majestade e esplendor de sua glória ultrapassam em grandeza o céu e a terra. Ele exaltou seu povo eleito em poderio, ele é o motivo de louvor para os seus santos. É um hino para os filhos de Israel, este povo que ele ama e lhe pertence” (Sl 148). Ir. Maria Letícia da Silva, OSB (Abadessa do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças)


(Papa Francisco com os participantes do Simpósio Da União Internacional das Beneditinas - 8 De Setembro de 2018)

“A Igreja recisa de Vós. Sede Faróis e Mostrai Aquele que é Caminho, Verdade e Vida” Mensagem do Papa às Contemplativas "Porquanto não recebestes um espírito de escravidão para viverdes ainda no temor, mas recebestes o espírito de adoção pelo qual clamamos: Aba! Pai! O Espírito mesmo dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus." (Rm 8, 15-16) “Queridas irmãs dos Mosteiros de vida contemplativa! Ouvimos as palavras de São Paulo, lembrando-nos que recebemos o espírito filial, que nos torna filhos de Deus. Nestas poucas palavras, se condensa a riqueza de cada vocação cristã: a alegria de nos sabermos filhos. Esta é a

experiência que sustenta a nossa vida; esta quer ser sempre uma resposta agradecida a tão grande amor divino. Como é importante renovar, dia a dia, esta alegria! Sobretudo nos momentos em que a alegria parece ter desaparecido, a alma está enevoada ou há coisas que não se compreendem, peçamo-la novamente repetindo: " Sou filha, sou filha de Deus".

A oração é o núcleo da vossa vida consagrada, da vossa vida contemplativa e é o modo de cultivar a experiência de amor que sustenta a nossa fé.

Um caminho privilegiado que tendes para renovar esta certeza é a vida de oração, oração comunitária e pessoal. A oração é o núcleo da vossa vida consagrada, da vossa vida contemplativa e é o modo de cultivar a experiência de amor que sustenta a nossa fé. (...) Não é uma oração que embate no muro do convento e volta para trás, não! É uma oração que sai e parte…


vergonha; eram “desavergonhados”, mas no bom sentido. Não tiveram vergonha de abrir um buraco no teto e fazer descer o paralítico. Sede “desavergonhadas”, não vos envergonheis de fazer, através da oração, com que a miséria dos homens se aproxime do poder de Deus. Esta é a vossa oração]. Através da oração, dia e noite, aproximais do Senhor a vida de tantos irmãos e irmãs que, por variadas situações, não O podem alcançar para experimentar a sua misericórdia sanadora, enquanto Ele os espera para lhes conceder a graça. Com a vossa oração, podeis curar as chagas de tantos irmão’’. (...)

A oração missionária é uma oração que consegue unirse aos irmãos nas mais variadas circunstâncias em que se encontrem, pedindo que não lhes falte o amor e a esperança. (...) Ser o amor! É saber assistir o sofrimento de tantos irmãos, irmãos, dizendo com o Salmista: ‘‘Na minha angústia, clamei ao Senhor. O Senhor escutoume e pôs-me a salvo.’’(Sal 118/117, 5). Assim, a vossa vida na clausura consegue ter um alcance missionário e universal e um papel fundamental na vida da Igreja. Rezai e intercedei por tantos irmãos e irmãs presos, migrantes, refugiados e perseguidos, por tantas famílias feridas, pelas pessoas sem trabalho, pelos pobres, os doentes, as vítimas das várias dependências… limitando-me a citar algumas situações que se tornam, de dia para dia, mais urgentes. Sois como aqueles amigos que trouxeram o paralítico à presença do Senhor, para que o curasse (cf. Mc 2, 1-12). [Não tinham

Queridas irmãs, sabei uma coisa: Não é que vos tolera a Igreja, ela precisa de vós! A Igreja precisa de vós. Com a vossa vida fiel, sede faróis e mostrai Aquele que é caminho, verdade e vida, o único Senhor que oferece plenitude à nossa existência e dá a vida em abundância. Rezai pela Igreja, rezai pelos pastores, pelos consagrados, pelas famílias, pelos que sofrem, pelos que praticam o mal e destroem tantas vidas, pelos que exploram seus irmãos. E por favor, continuando com a lista dos pecadores, não vos esqueçais de rezar por mim. Obrigado!” Discurso retirado a Viagem Apostólica do Papa Francisco ao Chile e Peru (21 de janeiro de 2018) w2.vatican.va/content/francesco/pt/homilies/2018/doc uments/papa-francesco_20180121_omelia-peru-limapreghiera.html


Escola da Oração “Senhor, ensina-nos a rezar” (Lc 11,1)

(Ir. Maria Cecília frente ao jardim)


O Mosteiro de Nossa Senhora das Graças celebra um momento muito especial da sua bonita e importante história: 70 anos, quase um século de vida dedicada às orações. Motivo de júbilo para a comunidade das monjas beneditinas e, especialmente, para o Povo de Deus na amada Arquidiocese de Belo Horizonte, o Mosteiro é nobre escola, onde se aprende um importante tratado da ciência do bem viver e de qualificação da existência: a prática da oração. Infelizmente, a mentalidade racionalista no mundo contemporâneo, que muitas vezes não consegue compreender o valor do transcendente, e o apego à ilusória alegria advinda de bens materiais prejudicam a vida oracional, tão necessária. A tendência de banir o divino, a espiritualidade, como referencial produz vazios que causam adoecimentos, impactam a existência. Resgatar a oração, tornando-a prática cotidiana, é cura.

melhor entendê-la e vivenciá-la. Nesse percurso, oportuno é ouvir o que diz um autor do século quarto: “A oração é a luz da alma”. Dedicar-se aos momentos de preces é caminho singular, que fecunda a fé. A prática da oração, de modo disciplinado, permite ao ser humano reconhecer suas bases, revisitar o que lhe é essencial: sua conexão com o sagrado. Proporciona, entre outros benefícios, mais fraternidade e experiências de solidariedade.

... o Mosteiro é nobre escola, onde se aprende um importante tratado da ciência do bem viver e de qualificação da existência: a prática da oração, permitindo ao ser humano reconhecer suas bases, revisitar o que lhe é essencial.

É preciso recordar e se inspirar nos anseios dos apóstolos, que pediram ao Mestre: “Senhor, ensina-nos a rezar”. Dedicar-se às preces é um exercício que tem força incomparável em relação às diversas abordagens de autoajuda, tão difundidas na atualidade, com a promessa de solução para acabar com o vazio existencial. Ora, esse vazio, para ser dissipado, necessita da presença amorosa de Deus. E para ouvi-Lo, é preciso dedicar-se à oração. Há uma tendência contemporânea a aberturas por milenares práticas meditativas, sinal de que a cultura ocidental anseia e pode revisitar os tesouros de sua herança cristã, para

Voltar-se para a interioridade, em diálogo com Deus, rezar uns pelos outros, é bonita e necessária atitude. Trata-se de contraponto ao consumismo e à autossuficiência humana. O mundo atual louva os avanços tecnológicos, os progressos da ciência, mas se esquece de que tudo isso, embora necessário e admirável, produz equívocos e inúmeras contradições, que exigem discernimento e sólido embasamento humanístico. E orar desperta uma consciência própria de autenticidade. Permite o reconhecimento de limites. Leva à conversão.

Deus seja sempre louvado pelo dom da vida dos que se dedicam à oração. De modo especial, pelo “sim” de cada monja beneditina, do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças. São 70 anos de serviços, ensinando a cada pessoa sobre a força e a centralidade da oração na trajetória de toda a humanidade.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo (Arcebispo de Belo Horizonte e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) (Me. Maria Letícia, Dom Walmor, Ir. Angélica)


(Madre Luzia Ribeiro de Oliveira, Fundadora Do Mosteiro De Nossa Senhora Das Graças)

Palavras sobre nossa mãe fundadora “Escutai minha filha, olhai, ouvi isto: Que o rei se encante com vossa beleza!’’ (Sl 44, 11) Nascida no Rio de Janeiro, em 1914, entrou para a Vida Monástica, na Abadia de Santa Maria, de São Paulo, Brasil, em 1940, onde fez sua Profissão Monástica Solene e recebeu a Consagração das Virgens, em 1944. Cinco anos depois, partiu de São Paulo como Prioresa da Fundação do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças, de Belo Horizonte, do qual foi consagrada Abadessa, em 1953, conduzindo a comunidade por 30 anos. Seu lema era Credidimus Caritate (Cremos na Caridade). Faleceu em 2004, deixando como herança sua consistente vida monástica, tendo sempre caminhado com a Igreja, atendido aos mais pobres e conduzido seu rebanho

com o exemplo e a palavra. Por ocasião da Celebração de nossos 70 anos de Fundação, escutamos algumas monjas que conviveram com nossa Madre fundadora, com o escopo de conhecer um pouco da experiência que nossas irmãs puderam viver no convívio filial: “As vezes que estive com Madre Luzia foram decisivas para marcar minha vocação. Ela era entusiasmada pelo Ofício Divino e nos passava esse amor. Acreditava que o Ofício alimentava totalmente sua vida e a vida das monjas.” (Me. Inês Cançado Bahia, OSB)


Madre Luzia “Madre Luzia era persistente em oferecer alimento espiritual sólido à comunidade: Sagrada Escritura e Patrística. Daí o esforço em adquirir para nossa biblioteca coleções dos Santos Padres. Incentivava o estudo. Colocava a caridade acima de leis, para socorrer necessitados. Era uma pessoa bem informada, estava por dentro dos acontecimentos importantes a nível mundial, nacional e local. Acolhia para orientações pessoas de elevadas responsabilidades: bispos, assessores de governadores, provinciais, padres...’’ (Ir. Maristella Matos, OSB)

‘Como é que não posso lembrar? Conheci Me. Luzia a fundo. Ai, ai... agente fica comovida também. Se estou nesse Mosteiro é pela ajuda dela. Ela ajudava muita gente, também os pobres. Tudo o que ela tinha, ela dava!” (Ir. Martinha Marques Mello, OSB)

“Eu vejo Madre Luzia como uma grande monja, que sempre amou a Deus e a Regra. Também

amava todos os Mosteiros e por isso fez amizades profundas com diversos monges e monjas em todo o Brasil. Desejava que nosso Mosteiro fosse luz para nossa diocese, porque valorizava o território onde estamos e se sentia responsável por sustentar na oração. Acolhia as crianças com todo o carinho, saia para comprar pirulitos para distribuir. Por isso, fizemos o Pavilhão como um local para atender os pequenos e necessitados das vilas. Tinha um coração de mãe!” (Ir. Helena Quintino dos Santos, OSB)

“Vejo Madre Luzia como alguém que aprendeu a escutar o Espírito e executar a Palavra de Deus, a despeito dos julgamentos humanos. Foi uma pessoa enigmática: A maneira de São Bento, via todos em Cristo e Cristo em cada um. Como tal, cumpria sua missão, dando oportunidades para que realizássemos nossa vocação de buscar a Deus só, e cumprir com fidelidade o que Ele pedia a cada uma.” (Ir. Irene Valadares de Oliveira, OSB)


‘‘Nossa mãe gostava das coisas ordenadas, bem arrumadas. Foi uma pessoa que organizava bem o Mosteiro. Valorizava a obediência. Quando fui para Olinda, segui aquilo que aprendi com ela, pois quando obedecemos, a vida monástica se torna mais leve, mais alegre. Agente se torna feliz seguindo a Regra que viemos para seguir. Obedecendo o superior, fazemos a vontade de Deus e não a nossa.” (Ir. Maria Madalena Gontijo, OSB)

‘‘Ir. Emerenciana aprendeu de Madre Luzia que algumas coisas são necessárias e outras desnecessárias, e essa simples frase a ajudou em pequenos discernimentos cotidianos. Então, resume esse ensinamento: “Tem né e tem dis!”

“Madre Luzia era de uma misericórdia enorme, mas, ao mesmo tempo firme, brava e exigente em defesa da caridade!” (Ir. Maria Petra de Bastos, OSB

“A imagem que tenho de Madre Luzia é de misericórdia. Era muito caridosa e querida por todos, uma monja voltada para a leitura, a cultura, as artes e atraía pessoas com essa sensibilidade. Gostava muito das crianças e nos colocava para catequizá-las. Tinha uma personalidade rica… Mas, o principal é que foi uma pessoa de Deus e uma grande monja”. (Ir. Úrsula Weinzierl Ribeiro da Silva, OSB)

“Nossa mãetinha um temperamento forte, por isso nosso Mosteiro é o que é! Graças a sua persistência. Tinha um coração de ouro, muito caridosa com os pobres que batiam na nossa porta”

“Conheço Madre Luzia desde anos e anos, também antes do Mosteiro, porque somos primas. Adimirava ela demais, sua personalidade forte para nos transmitir os valores monásticos. Ela gostava de fazer conferências para nós, ia no noviciado todos os dias e queria nos ver aprender a Regra de cor, para que ela estivesse dentro de nós”

(Ir. Ângela Diniz, OSB)

(Ir. Myriam Ribeiro de Oliveira Resende, OSB)

(Ir. Emerenciana Rocha, OSB

mãe fundadora...


Somos herança da caridade

“Nossa mãe foi uma exemplo de caridade. Firme e de coração bondoso, aberto para servir e ouvir. Quando percebia suas fragilidades, reconhecia e pedia perdão. Nunca deixou de rezar o Ofício. Quando escutava uma de nós errar nas palavras, logo falava corretamente! A caridade era tudo pra ela. Dizia que o amor é a melhor herança que temos de Cristo. Como eu ajudava na hospedaria, sempre me pedia para acompanhar os mais pobres dizendo que neles encontramos Jesus.”

“Nossa mãe Luzia era muito preparada e muito preocupada com a formação da comunidade. Ela estudava assuntos atuais da Igreja e passava para a comunidade toda. Preparava apostilas que algumas irmãs passavam no mimeografo para distribuir para nós e para outras casas religiosas. Ainda hoje eu guardo pastas que ela nos deu. Nos intervalos entre as orações de Laudes e a missa, ela dava conferências sobre o capítulo da Santa Regra que iríamos refletir naquele dia.”

(Ir. Margarida Lúcia dos Reis, OSB)

(Ir. Plácida Maria Mateus, OSB) “Deo Gracias!” (Ir. Maria Severina de A. e Costa, OSB)


(Alicerces para a construção do Mosteiro)

Um pouco da História de nosso Mosteiro “Às Novas Gerações, Nós Contaremos...” (Sl 77, 3)

R

elembrando com gratidão “os mistérios do passado” (Sl 77,26) vamos encontrar em 1946, numa visita às novas gerações Abadia de Santa Maria, em São Paulo, D. Antônio dos Santos Cabral, arcebispo da Arquidiocese de Belo Horizonte, fazendo, à Madre Abadessa Rosa Queiroz Ferreira, o pedido de uma fundação em sua diocese. Ele o fazia por estar convencido de que um mosteiro beneditino seria uma fonte de graças para sua diocese. O mesmo pedido fora feito pouco antes pelo casal, de Belo Horizonte, Dr. Balbino Ribeiro da Silva e D. Maria José Resende Silva, que ofereciam seus bens para esta fundação e se propunham a trabalhar para sua realização.

O pedido foi aceito por Madre Rosa e sua comunidade. Dom Arquiabade Plácido Staeb, osb abençoa o projeto da fundação, e nomeia Dom Inácio Accioly comissário da mesma. O Papa Pio XII abençoa a nova fundação e traça um verdadeiro programa de vida para as irmãs fundadoras: “A graça celeste sobrevenha copiosa a fim de que realizem com empenho e eficácia a bela tarefa a elas confiada. Que a nova casa religiosa seja apreciada pela disciplina, grandemente respeitada pela paz, ornada pela luz da doutrina, transbordante do zelo da fé, impregnada do odor da caridade. Todo bem esteja presente, todo mau se afaste.” (A comunicação é feita pelo subsecretário de Estado, J.B Montini, futuro Papa Paulo VI.)


foto do aeroporto

Monjas fundadoras no aeroporto de São Paulo

As monjas fundadoras chegaram em Belo Horizonte aos 12 de novembro de 1949. Do aeroporto foram direto ao palácio do senhor arcebispo. “Muito comovido Dom Antônio falou da alegria do seu coração de pastor, recebendo aquelas ovelhas tão caras que ele dera de boa vontade, e que o Senhor agora lhe restituía. Era a alegria de um pai revendo as filhas, a de um bispo ciente da fonte de graças que seria o Mosteiro para sua diocese.” Em seguida foram para o almoço na casa do Dr. Balbino e senhora Maria José Resende Silva. Às 16h30 estavam na cripta da futura catedral de Belo Horizonte, onde já se encontravam Dom Arquiabade Plácido Staeb, osb; Dom Martinho Michler, osb, monges, padres, seminaristas, parentes e amigos das monjas. Após chegada do Arcebispo foram em procissão até o novo Mosteiro, casa cedida pela senhora Sylvia Lanari Guatemosin, que entregou as chaves a Dom Cabral. Em seguida Dom Arquiabade Plácido proclamou o decreto de elevação canônica do novo Mosteiro. O Arcebispo abençoou toda a casa e entregou a chave à prioresa Madre Luzia Ribeiro de Oliveira. Tiveram início a clausura papal e a vida monástica no Mosteiro de Nossa Senhora das Graças.

A vida no Mosteiro girava em torno da Liturgia: da Missa, seu ponto culminante, e do Ofício Divino. A Lectio Divina – leitura orante da Palavra de Deus – era cultivada com zelo, e orientava o viver de cada dia. E também o estudo da Regra. Além das tarefas domésticas e da organização da nova moradia, as irmãs começaram a dedicar-se a trabalhos que ajudariam na manutenção do Mosteiro: bordados, pinturas, caligrafia, diplomas de Batismo e de primeira comunhão...

paralelo a isto as monjas acolhiam nos pequenos parlatórios “visitantes, que nunca faltavam, pedindo orações, aconselhamento espiritual, conforto moral e ajuda material.” Foi objeto de estudo entusiasta a Sponsa Christi, documento de Pio XII sobre a instituição monástica, que teve grande influência na vida e orientação do Mosteiro. Os fundamentos da vida monástica foram solidamente colocados. Daí pra frente vai haver uma consolidação daquilo que foi firmemente estabelecido nos inícios. A seiva fecunda da vida monástica irrigou o cotidiano de gerações de monjas que gastaram sua vida no louvor ao Senhor e no serviço fraterno, no empenho de transmitir o que receberam das Fundadoras. Cultivaram os valores recebidos com um pé na tradição e outro na atenção ao momento histórico.


Em 24 de junho de 1951, o cruzeiro foi abençoado e colocado no terreno do futuro Mosteiro. Dias depois, a 1° de julho, ouve a bênção da pedra fundamental , cerimônia oficiada pelo Arcebispo. Estiveram presentes: Dom Arquiabade Plácido Staeb, osb, Dom Abade Martinho Michler, osb, padres, religiosos, representantes das autoridades civis, benfeitores e moradores do bairro. “Este ano foi considerado o início da construção do Mosteiro.” Ela prosseguirá numa atmosfera de fé, dedicação e trabalho.

(Cruzeiro erguido em 1951, marcando o lugar onde futuramente seria o altar do Mosteiro)

Aos 14 de setembro de 1952, aconteceu a mudança da comunidade, da Rua dos Inconfidentes para a Rua do Mosteiro, depois das I Vésperas da Exaltação da Santa Cruz. Na Epifania de 1953, foi a bênção solene dos lugares regulares já construídos, feita por Dom Cabral. Estavam presentes: Dom Arquiabade Plácido e Dom Abade Martinho. Em 21 de março de 1953, o Mosteiro é elevado a Abadia e Madre Luzia R. de Oliveira será sua 1ª Abadessa. Recebeu a Bênção Abacial aos 29 de junho de 1953, em cerimônia oficiada pelo Arcebispo Dom Antônio dos Santos Cabral e com a presença de numerosíssimos fiéis, no próprio Mosteiro. Em julho, 22, teve início o Noviciado, com a entrada de Selda Cançado Bahia que, em 1983 será a 2ª Abadessa do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças. O Mosteiro crescia em construção e em número de Irmãs. O maior acontecimento eclesial dos anos 60 foi o Concilio Vaticano II. Nossa Comunidade viveu com grande entusiasmo este momento, exercitando Sentireacum Ecclesia. Acompanhávamos o que acontecia no plenário, através do jornal “O Diário”. Nos intervalos entre as sessões, recebíamos visitas

preciosas que nos falavam do que viram na Aula conciliar: Dom João Resende Costa, Dom Alexandre Amaral, Dom Abade Martinho Micheler, osb, Dom Clemente Isnard, osb, Jean Goss (leigo ouvinte). Os documentos do Concílio: Sacrosanctum Concilium, Dei Verbum, Lumen Gentium e Perfectae Caritatis foram estudados em Comunidade. Os outros, apenas lidos. O Mosteiro continuava a crescer, na década dos 70 houve 10 Profissões. Nos anos 80, nosso Mosteiro, assim como o mundo beneditino, alegra-se e entusiasma-se com as comemorações dos 1.500 anos de São Bento! As Comunidades empenharam-se em aprofundar o estudo de temas beneditinos. Nossa Comunidade preparou várias apostilas sobre o monaquismo de São Bento. O Abade Primaz Dom Victor Dametz, osb, convocou um Seminário de Abadessas, em Roma. Madre Luzia participou dele e Madre Prioresa Joana Calmon V. Boas acompanhou-a. Aos 21 de janeiro 1982, nossos sinos voltaram a tocar, graças à dedicação de Ir.Rafaela Carielo.


Foi um motivo de grande alegria para a Comunidade. Neste período, vivemos a consolidação das diretrizes litúrgicas, sobretudo da Liturgia das Horas, que adquiria uma forma estável, coroando esforços empreendidos anteriormente. Nosso Mosteiro colaborou na tradução, para o vernáculo, dos livros litúrgicos como: o Missal o Breviário, o Thesaurus monástico.

O dia 12 de novembro de 1991 foi marcante para nossa história – Dia das mais belas celebrações dos anos 90 - pela Consagração de nossa Igreja. Oficiada por Dom Serafim Fernandes de Araújo, Arcebispo de BH, na presença de inúmeros fiéis e de Superiores e Superioras, Abadessas e Abades beneditinos. Ao longo dos anos 90, algumas de nossas Irmãs participaram do PRO-FOCO e do Curso de Teologia para monjas, oferecido pela Escola Teológica do Rio. Outras fizeram cursos por correspondência, na Escola Mater Ecclesiae. Irma Irene Valadares, ao recordar a história mais recente nos conta: “Aos anos 80, seguiram-se períodos de escuta aos sinais dos tempos e nosso Mosteiro precisou discernir os passos que o Senhor nos chamava a dar. Nasceram numerosas solicitações: da Igreja, das obras sociais, dos atendimentos e cuidados externos e internos, dificuldades na Administração Geral. Muitos fatos importantes eram resolvidos pelas maravilhas da técnica de comunicação.”

De 2000 a 2012, esteve à frente do Mosteiro Madre Estefânia Vieira. Esse período foi marcado por incremento na vivência fraterna, na formação intelectual, humana e espiritual, contribuindo para o crescimento em número e em graça. Atualmente, Madre Maria Letícia da Silva conduz a Comunidade com um coração aberto e materno. O MOSTEIRO DE NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS continua esforçando-se por cultivar os

valores monásticos, adaptando suas concretizações às exigências dos tempos atuais. Assim, recordamos os acontecimentos que mais se destacaram, com o coração repleto de alegria pela celebração desse momento. Concluo esta contribuição, citando as palavras do Salmo 77,3-4, que expressam bem o coração de cada monja que construiu a história de nosso Mosteiro:

“Tudo aquilo que ouvimos e aprendemos e transmitiram para nós os nossos pais, não haveremos de ocultar a nossos filhos, mas à nova geração, nós contaremos: As grandezas do Senhor e seu poder, as maravilhas que o Senhor realizou!”

Ir. Maristella Matos, OSB


“Sobre nós venha Senhor a Vossa graça, da mesma forma que em vós nós esperamos” (Sl 32,22)

Madre Luzia Ribeiro de Oliveira Resende Primeira Abadessa (Conduziu a Comunidade até 1983). Lema: Credidimus Caritate (Cremos na caridade) Madre Inês Cançado Bahia Segunda Abadessa (1983 a 2000). Lema: Magis Prodesse (Mais servir que presidir)

Madre Estefânia Vieira Terceira Abadessa (2000 a 2012). Lema: Sicut Ancilla Domini (Como serva do Senhor) Madre Maria Letícia Abadessa Atual Lema: Servire Cum Lætitia (Servir com alegria)

Celebrar o jubileu do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças é celebrar a festa da Estabilidade de Deus e da resposta frágil, mas estável, de inúmera irmãs que se doaram nesta casa. Deus sustentou e sustenta essa obra que nasce do coração d'Ele. Ele deu a força necessária a nossa mãe fundadora, Me. Luzia, e à primeira comunidade de irmãs para que superassem os grandes desafios de uma fundação, esperando n´Ele. Ele encorajou nossa segunda madre, Me. Inês, a consolidar a comunidade, acolhendo inúmeras jovens que desejavam se consagrar neste Mosteiro, esperando n'Ele. Ele firmou nossa Me. Estefânia na Rocha, para

que ela se tornasse neste Mosteiro a Palavra viva que conduz a comunidade ao Cristo, esperando n'Ele.

E agora, Senhor, “venha sobre nós a vossa Graça”! Juntas,comMe.MariaLetícia,em“vósnósesperamos” comaconfiançadefilhas. Desejamosvoltaravós, pelo caminho que nosso pai São Bento nos indica. Desejamos viveraestabilidade, aconversãodenossos costumes e aobediência, imitandoseuFilho. Iluminai nossos corações, nossas mentes e ações paraque não esperemosocasiõesextraordináriasparaamar, paraque sejamosfiéisaoseuchamadonoordináriodavida.


Está escrito que “minha Casa será Casa de oração” (Mt 21,13) E nesta casa, portanto, mora Deus e todo orante, “todos vós que formais o sacerdócio deste Templo santo” (1Pd 2,5) É o Cordeiro imolado que nos traz tanta beleza e tanto enlevo, na Santa Eucaristia. Neste encontro sagrado,ressoa em nossos lábios o mais excelso louvor.

Casa de Deus

O Mosteiro é chamado a proclamar, no mundo inteiro, a Palavra do Senhor: No silêncio, na oração, no trabalho e doação, Em tudo que aqui se faz, É na paz, um só louvor. Tuas filhas, pela graça do Batismo que nos deste, leva-nos, Jesus, seguras, até a Jerusalém celeste! Todas somos pedras duras... que, moldadas e polidas, pelas mãos do Pai São Bento, com ele, vamos subindo, todas juntas, bem unidas, pelo cimento do amor: entregues às mãos divinas nas humildes oficinas dos altares do Senhor. Neles, o Espírito Santo, qual Sopro, aura divina vai transfigurando, transformando toda culpa, toda dor, sem lamúrias, sem rapina no holocausto do Senhor. Eis nossa “Casa de Deus”, erguida sobre a montanha deste mais belo horizonte. Celebramos e agradecemos tantas e tantas maravilhas que por nós fez o Senhor! Ir. Regina Maria Clemente, OSB

A jovem tão jovem de casa saía. Pra onde iria? Por quanta demora? No brilho do olhar, certeza do agora, Na mala, coragem, fé, paz e alegria! Conhecemos o lugar, de paz a quem vem! Recanto de amor, oração e trabalho. Do calor do dia, ao frescor do orvalho, O Mosteiro acolhedor, a todos faz bem! Qualquer dor da partida o tempo sara. O Espírito Santo, ajunta com o vento Em todas elas, carinho se repara. Setenta anos, gratidão sem lamento! Encanto de Deus que a todos ampara. Com Nossa Mãe, Graças, Mosteiro São Bento! Daniel Alves Garcia Santos Silva


Vida Doada! “Mesmo no Tempo da velhice darão frutos, cheios de seiva e de folhas verdejantes.” (Sl 91, 15)

(Ir. Myriam)

(Ir. Irene Valadares)

(Ir. Maria Madalena)

(Ir. Martinha)

(Ir. Emerenciana)

‘‘Vamos fazer o elogio dos homens famosos, nossos antepassados através das gerações. Estes, são homens de misericórdia; seus gestos de bondade não serão esquecidos. Eles permanecem com seus descendentes. A descendência deles mantém-se fiel às alianças, e, graças a eles, também os seus filhos. Sua descendência permanece para sempre, e sua glória jamais se apagará. Seus corpos serão sepultados na paz e seu nome dura através das gerações. Os povos proclamarão a sua sabedoria, e a assembleia vai celebrar o seu louvor.’’ Eclo 44, 1.10-15

Me. Maria Letícia com as irmãs no Claustro


Tradição e Vida “Uma idade conta à outra vossas obras e publica os vossos feitos poderosos” (Sl 144, 4)

“Como é importante o encontro e o diálogo entre as gerações (...) O Documento de Aparecida nos recorda: 'Crianças e anciãos constroem o futuro dos povos; as crianças porque levarão por adiante a história, os anciãos porque transmitem a experiência e a sabedoria de suas vidas' (DAp 447). Esta relação, este diálogo entre as gerações é um tesouro que deve ser conservado e alimentado!” Ângelus, 26 de julho de 2013 - Papa Francisco

Da esquerda para direita: Ir. Estefânia, Me. Inês e Me. Luzia

Ir. Maria Isabel e Ir. Úrsula

Da esquerda para direita: Me. Inês, Me. Maria Letícia e Me. Estefânia.

Da esquerda para direita: Ir. Martinha, Ir. Regina Maria e Ir. Úrsula

Me. Inês e Ir. Agnes


uando nosso terreno ainda estava vazio; quando sequer podíamos pensar como seria nosso Mosteiro, nossa casa, casa de Deus; quando todo esse projeto estava no coração do Senhor, celebramos aquilo que estava por vir, confiantes de que, se vem de Deus, é algo bom! Em 24 de junho de 1951 foi solenemente bento e erguido o cruzeiro que, conforme o Pontifical Romano, deve preceder a bênção e colocação da pedra fundamental. Essa cruz indicava o lugar onde futuramente será o altar da Igreja do Mosteiro. Mas, porque desde tão cedo marcar visualmente o lugar onde mais tarde colocaríamos o altar? O Salmista canta: “Então irei aos altares do Senhor, Deus da minha alegria” (Sl 42,4), mostrando como é fundamental para o povo de Israel reunir-se ao redor do altar, no Templo. Ali, encontrava-se a habitação de Deus, o coração da vida de Israel, sua identidade de povo escolhido. Para nós, o altar é lugar central da vida cristã, lugar do memorial, da ação de graças, da epíclese (Invocação do Espírito), da oblação, da partilha do pão, da comunhão.

Santo Irineu diz que o altar é um outro Cristo - “Ara auter Christus”. Também Santo Ambrósio ressalta essa dignidade “Forma corporisaltare est et corpus Christi est in altari”. Por isso, tão logo nasceu entre os cristãos o gesto de beijar o altar no início das celebrações litúrgicas. Por ocasião da Profissão monástica trienal de Ir. Catarina Azevedo Barbosa, OSB, Dom Adriano Bellini,OSB, em sua homilia frisou a importância do altar, ao redor do qual a comunidade desenvolve sua vida - ressaltando aspectos particulares daquele que hoje se encontra em nosso Mosteiro: “Na beleza austera dessa Igreja, encontramos ao redor do altar em forma quadrada - símbolo da perfeição de Deus, à qual a monja deve tender - quatro desenhos. Do lado anterior, temos as letras Alfa e Ômega e um peixe. Isso nos lembra que é Cristo, Alfa e Ômega, o princípio e o fim de todas as coisas, que as chamou até as montanhas de Minas Gerais, para habitar sobre um monte e para militar sob o Cristo, verdadeiro Rei (2º desenho).


Na verdade, é Deus que vem ao nosso encontro primeiro. O Senhor é que se inclina lá do céu à nossa procura, oferece a felicidade e a vida; que nos momentos difíceis nos assegura a sua Presença; que faz resplandecer sobre nós a sua Luz, como o Sol resplandece sobre as montanhas. A montanha também nos recorda que o cristão é um ser «transfigurado», que se deixa guiar pela luz esplendente da ressurreição de Cristo, em um caminho transformador, que eleva nosso ser acima das realidades sensíveis, para guiá-lo para as coisas do céu e conformá-lo a Deus. É necessário porém, descer do monte e aceitar a nossa condição presente e renovar o nosso empenho de conversão, que na vida monástica transparece especialmente nas três promessas: Estabilidade, Conversação de Costumes e Obediência. A Estabilidade no mosteiro diz respeito à constância e perseverança no propósito que cada monja assume publicamente. A Conversação de costumes diz respeito ao empenho diário de conversão, à renúncia a si mesmo para imitar Cristo que se fez em tudo obediente ao Pai. Essa obediência é representada pelo Cordeiro colocado desse outro lado do altar. Cristo, o «Agnus Dei», o cordeiro sem mancha, se sacrifica livremente para libertar a humanidade da escravidão do pecado. A inscrição «Agnes» recorda não só a pureza e a castidade do corpo, mas a pureza e a compunção de

coração, a reta intenção e a sinceridade. O conjunto recorda que, como Cristo, a mansidão é o rosto da monja, a humildade a sua definição, a obediência seu desejo, a oração seu trabalho, a escuta seu alimento, a Palavra de Deus sua bebida, o coração de Deus sua morada, o próximo o lugar da caridade de Cristo. Esse desenho resume em si todo o zelo bom que a monja deve ter, um zelo que separa dos vícios e conduz a Deus e à vida eterna. Enfim, a presença de Maria. A última representação nos mostra uma montanha com uma estrela e o nome de Maria. Ela é a Estrela segura que nos orienta ao nosso destino que é Cristo. Maria é a «cheia de graça», que derrama sobre nós as graças que necessitamos para a nossa peregrinação nessa vida, se faz peregrina conosco e intercede por nós. Ela é nosso modelo de escuta e custódia da Palavra de Deus, modelo de generosidade e prontidão na resposta ao chamado de Deus.” O centro da vida cristã é o próprio Cristo, presente no altar, lugar celebrativo onde, nós - monjas encontramos nossa identidade monástica. Ponto culminante de entrega e doação de Deus a nós e de nós a Deus.


Escuta

“Deus me confiou algo sublime: a vida monástica. Ao mesmo tempo, Ele me acompanha ao longo do caminho e me sustenta com a sua misericórdia que é eterna. “Ele me desperta cada manhã e me excita o ouvido, para prestar atenção como um discípulo” (Is 50, 4b). O Senhor me impulsiona a escutá-lo na Lectio Divina, no Ofício Divino, na vida fraterna e na mesa da Eucaristia. Sinto-me plenamente realizada, mas consciente de minha responsabilidade. Junto às irmãs, somos guardiãs desse tesouro que é a Tradição Monástica, há XV séculos servindo a Igreja e sustentando-a com a oração”. (Ir. Rosália Maria Dias de Araújo, OSB)


atenta


Ora... “Que as palavras da Escritura estejam sempre em teus lábios, para que, meditando-as dia e noite, te esforces para realizar tudo aquilo que ensinam, e terá sentido e valor a tua vida” (Js 1,8)

Ir. Giovanna Ir. Maria José


“Louve a Deus tudo o que vive e que respira, tudo cante os louvores do Senhor!” (Sl 150,5b)

O Louvor é uma grande manifestação de gratidão ao Pai por nos ter criado à sua imagem e semelhança. Diante de tamanha expressão de amor por nós, suas criaturas, brota, espontaneamente, o louvor do coração que vê e reconhece o amor recebido. O Louvor Divino só tem sentido se nasce do coração. Quando penso no Louvor Divino logo me vem à mente a Eucaristia e o Ofício Divino. Neles prestamos ao Pai o verdadeiro louvor: é o próprio Filho, pelo Espírito Santo que louva ao Pai através de nós. O Louvor é uma ação Trinitária.Como leiga, quando caminhava em meu grupo de jovens, procurava uma forma de ajudar todas as pessoas, principalmente os jovens que caminhavam comigo, a quem dedicava todo meu empenho e carinho. Sentia essa necessidade dentro de mim, mas não sabia como concretizar esse desejo. Foram anos de busca, até que nosso Senhor, em sua infinita misericórdia, me conduziu ao Mosteiro de Nossa Senhora das Graças. Recordar me traz uma profunda alegria e a gratidão permanece enraizada dentro de mim. O Senhor poderia ter chamado para esse caminho tantas pessoas melhores que eu… mas, em minha pequenez, Ele me conduziu até aqui. Como não agradecer? Lembro-me de Madre Regina Bernardes, com seu entusiasmo pela vida monástica, me falando belamente do Ofício Divino como lugar de oração por toda humanidade. No Ofício Divino, sete vezes ao dia, encontramos com aquelas pessoas que gostaríamos de ajudar, colocando-as bem dentro do coração de Deus. Foi a resposta que eu procurava! Neste contexto, decidi, com a graça de Deus, entregar a vida que recebi d'Ele a Ele. O Ofício Divino é uma oração da Igreja e para a Igreja. Nós nos colocamos como parte do Corpo Místico de Cristo, para com Ele, em comunhão, prestarmos o verdadeiro Louvor.

O Louvor Divino


O Ofício Divino não é uma oração minha, intimista, pessoal, mas uma oração do Corpo de Cristo pela humanidade inteira. A oração é perene, ininterrupta, intercessora e alcança a todos de forma eficaz. A monja não sabe por quem reza, ela reza confiando que o Senhor distribui as graças a quem delas necessita. Na oração dos Salmos encontramos as mais diversas situações vividas em nossos tempos, e essas situações são levadas ao coração de Jesus pela voz da monja que reza. Quantos irmãos se encontram angustiados, deprimidos, aflitos… Ao proclamar o Salmo 114, “Ó minh' alma, retorna à tua paz, é o Senhor quem cuida de ti”, estamos clamando pela paz nos corações que necessitam dela. Acreditamos que o Senhor escuta nossos pedidos e conforta aqueles que sofrem, fazendo-se Presença viva. Ao mesmo tempo, reconhecemos tantas graças e motivos para engrandecer o nome de Deus, pela sua ação misericordiosa na história humana. São inúmeros os Salmos de Louvor: “Como é bom agradecer ao Senhor” (Sl 91); “Eu agradeço a Deus de todo o coração junto com todos os seus justos reunidos” (Sl 110). São muitos que recebem tantas dádivas de Deus, mas se esquecem de prestar o seu louvor. A nossa boca louva por quem ignora a Fonte das graças que recebe. Madre Luzia, fundadora do Mosteiro de Nossa Senhora da Graças, foi uma mãe exigente em tudo aquilo que se referia a preparação e a nossa presença no Ofício Divino. Ela insistia demais na fidelidade ao horário de fazer Lectio Divina como um preparo para a

oração no coro; ressaltava a Lectio como oração individual, mas, ao mesmo tempo comunitária. Obedecer os tempos de Lectio nos permitia orar em comunhão com toda a comunidade, que naquele momento se dedicava a isso. Nossa mãe não gostava que as monjas se atrasassem para a statio, explicando a importância de nos prepararmos para a oração. A oração como momento de encontro entre a monja e seu esposo, como não se preparar? Para os encontros importantes todos nós nos preparamos. Madre Luzia recebeu sua formação na Ação Católica, da qual foi presidente, herdando e nos transmitindo um profundo amor pelo Ofício Divino como oração da Igreja. A nossa forma de vida, a nossa missão é levar toda alegria, conquista, gratidão, esperança, amor, felicidade ao Pai; mas também, toda hostilidade, medo, insatisfação, desespero, raiva, culpa… sendo pontes de encontro entre Deus e a humanidade. Essa é a missão do Filho, o grande Mediador, e essa é a missão do seu Corpo Místico, fazendo com que todos possam viver a experiência de encontro que os Salmistas viveram. Nossa esperança é um dia, unir nosso Louvor ao grande Louvor celeste, com todos os filhos de Deus e com nossas queridas irmãs que entregaram suas vidas em nosso Mosteiro e que hoje já se encontram na casa do Pai. Texto elaborado a partir de uma partilha com uma monja com 82 anos de vida e 53 anos de Vida Monástica


Lectio Divina e Opus Dei são duas asas tecidas com a Palavra de Deus, com as quais o Espírito Santo trabalha nos nossos corações transformando-os, paulatinamente, de pardais em águias. As duas asas devem ter as mesmas oportunidades de crescimento para que não haja desequilíbrio nem prejudique o voo. Ir. Felicidade Sarkis, OSB


...et Labora

“Do trabalho de suas mãos há de viver e tudo lhe irá bem” (Sl 127,1-2)


““Servi ao Senhor com alegria, ide a ele cantando jubilosos” (Sl 99,2) Surge a madrugada e com ela o primeiro e principal trabalho de nossa comunidade monástica, o Ofício Divino. Ali começa a oferta do dia, o empenho de cada uma, a serena firmeza de saber que se está respondendo ao chamado da primeira hora para que na vinha do Senhor não falte essa porção. Deixando o coro monástico, de mãos dadas com nosso amigo, o tempo, retomamos o trabalho manual interrompido no dia anterior. Cada dia se faz uma parte, não todo o trabalho, sempre com atenção para que nele não falte o cumprimento da vontade de Deus, a santificação pessoal e a comunhão com a humanidade. Entre o coro e as oficinas, o trabalho é alternado ao longo do dia até o cair da noite, quando então depomos diante do Senhor nossa jornada, com o olhar voltado para o Senhor, que nos prometeu dons tão excelentes que os olhos jamais viram, nem os ouvidos ouviram, nem mesmo se pode imaginar. No coro trabalhamos com Deus. Na Lectio Divina, mais trabalha o Espírito, para que depois a lida diária dê os frutos do labor espiritual. O trabalho manual cotidiano, perseverante, cheio de sentido e valor para Deus, é remédio poderoso para combater alguns males como a ociosidade, a preguiça, a acédia, a depressão, a

dissipação, a bisbilhotice; lembrando que um dia, ao prestar contas, o Senhor da messe vai nos interrogar: Amigas, a que vieram? Pois, enquanto estive pisando a terra lhes mostrei que o meu Pai trabalha sempre e eu também. Pela manhã, os trabalhos manuais fazem de cada setor e oficina um lugar de ganhar o pão com o suor do rosto, lembrando-nos do que São Paulo diz aos tessalonicenses:se alguém não quiser trabalhar, não coma também. Cheio de dignidade e peleja, o trabalho fala da nossa condição humana, dom de Deus para colaboramos com a obra divina. Como tudo concorre para o bem dos que amam a Deus, toda oferta de si é um trabalho ainda que, a princípio, não o pareça. Assim, exercer a paciência, não dizer palavras duras, suportar as próprias fraquezas e as alheias, procurar o bem onde parece que não está, conter a ansiedade e a inquietude, oferecer sacrifícios por um bem maior, acolher, ouvir, oferecer uma boa palavra, tudo isso é oferta de si. São tantos os modos de trabalhar com e para Deus que não se concebe, na Casa do Senhor, uma espécie de aposentadoria. Mesmo estando acamada, a oferta de si é válida, esperada e ainda mais frutuosa.


Nessa vida flutuante, incerta e passgeira recebemos a responsabilidade de acompanhar algumas oficinas, por dois anos, oferecendo à comunidade nosso trabalho manual. É uma forma de nos doarmos aos irmãos, entregando os dons que temos, colocando-os à disposição da comunidade. O que somos, o que temos é para ser oferecido a Deus, de forma concreta dentro de nossa comunidade. As responsabilidades temporárias nos ajudam ainda a desenvolver o desapego, o espírito de colaboração e não de dominação, tendo presente que tudo passa, só o amor permanece e, em tudo que se faz, a meta deve ser servir a Deus. Nosso Deus sempre operante nos convida a vir a ser, no servir. Após a refeição, o trabalho em conjunto realça o bem da vida comunitária, o regozijo de estar juntas em prazerosa colaboração mútua. A tarde chega com sua graça e expectativa. Em que momento vamos encontrar o Senhor que, passeando no jardim desse mundo, busca sua criatura para ver se ainda está voltada a Ele? Quanto mais humildemente for feito esse trabalho, tanto mais nobre o será, cheio de leveza, alegria e realização, não pelo retorno imediato de possíveis agradecimentos, elogios ou qualquer reconhecimento humano, mas por tê-lo feito dentro da vontade de Deus. Sob esse olhar que tanto nos atrai, instiga e conduz. Seu valor está, não no tipo de trabalho executado, mas justamente por fazê-lo diante da Presença, diante desse Senhor que nos invade por inteiro, que espera de nós uma adesão completa, progressiva e duradoura. Desvinculado do atrativo do lucro e da avalanche de poder, o trabalho ocupa seu lugar de colaborar com a implantação do Reino, cooperando para a unidade e complementaridade de nosso ser, fazendo de nossos braços a extensão da ação de Deus no mundo. Como no Mosteiro tudo é carregado pela oferta de vida, nenhum trabalho é solitário ou sem valor. O fato

de estar no Mosteiro supõe trabalhar em comunhão e docilidade, sabendo-se portadora da vontade de Deus, com a possibilidade feliz de realizar o que Lhe agrada. Por isso, não basta ser eficiente, é preciso atenção para ser eficaz e colaborativa, para fazer o que se deve de modo a ter o fruto imediato desse labor singelo, mas de modo que, também por meio dele a eternidade nos seja amplamente aberta. Ganhar o sustento da vida com o suor do rosto não é castigo, mas honra. Isso significa prolongar no mundo a obra de Deus e ver sua vontade instaurada na Cabeça, Cristo, e prolongada no Corpo, sua Igreja. Foi o Senhor mesmo que nos deu a nobreza do trabalho e ainda, em sua magnanimidade, oferece por ele recompensa desmedidamente superior. Como não desejar um tal Patrão que desculpa todo erro, sustenta o desanimado, engrandece o entusiasta, e que transforma a humilhação da falta em humilde graça de acolhida. Esse Senhor nos inflama de tal modo que nos faz abandonar delícias, seduções e realizações pessoais para viver em um mosteiro, com simplicidade diante d'Ele e para Ele. Somos operárias, sempre aprendizes, nessa escola onde o Senhor, dinâmico e criativo, nos dá o saboroso gosto de crescer para Deus servindo umas às outras e à humanidade. A monja, em tudo o que faz e em tudo o que toca, deve ter o senso do sagrado, considerando e cuidando dos objetos como se fossem vasos sagrados do altar. O mesmo sentido espiritual deve ser aplicado no trato com as irmãs, no modo de receber as pessoas, em especial a quem tem menos oportunidades nesse mundo: as pessoas pobres, as difíceis, as doentes, as desqualificadas. O serviço mútuo deve ser feito com caridade, organização e asseio, sempre prestando conta do que se usa. Tudo isso para que seja mantida a paz na comunidade, para que se sirvam sem grande cansaço, sem murmuração ou tristeza. Para que isso aconteça, quem serve recebe a oração da comunidade.


Desse modo, o inimigo da paz é afastado, esse soberbo quebrador de promessas que se desdobra em nos colocar ciladas a fim de nos tirar do caminho do progresso para Deus. Deus trabalha em nós e nosso trabalho é uma resposta a esse amor superabundante que nos concede amar, servindo. Devemos sempre nos perguntar: Esse trabalho e do agrado do Esposo? Assim como a ociosidade é inimiga da alma, a frouxidão e a preguiça são inimigas da caridade e do bom progresso para Deus. Aos domingo o trabalho maior é a Lectio Divina, essa leitura orante, saborosa, nutritiva, cheia de regozijo e frutos, nos fortalece em nossa vida de entrega. No entanto, os trabalhos básicos para manter o funcionamento da casa, o equilíbrio e a caridade também são realizados. É diminuída a intensidade dos afazeres para que se mantenha o equilíbrio entre trabalho e repouso. Às

vezes, enquanto se descansa, se carrega pedra, mas para edificar o reino, para que descendo a escada, pelo serviço e o coração humilde, suba-se a escada para o céu, que nos foi preparado pelo Cristo. Ele que nos aguarda no entardecer do dia terreno, que é essa brevidade de vida, nos toca para nos oferecer na glória eterna o trabalho mais excelente, sem perigo de sofrer desemprego, desilusão ou qualquer tristeza: adorar cantando, fruir intensa e ininterruptamente de Deus, participando da comunhão dos santos. É o exemplo luminoso e cheio de cuidados que nos dá nossa Mãe Santíssima que, mesmo no céu, não se cansa de velar por nós e nos incitar para que toda essa oportunidade de progressão na vida humana seja rumo ao supremo regozijo da vida eterna na visão da Trindade Santa. Ir Agnes Alves Garcia Santos Silva, OSB


Na Escola do Serviço do Senhor “Assim como há um zelo mau, de amargura, que separa de Deus e conduz ao inferno, assim também há o zelo bom, que separa dos vícios e conduz a Deus e à vida eterna. Exerçam, portanto, os monges este zelo com amor ferventíssimo, isto é, antecipem-se uns aos outros em honra. Tolerem pacientissimamente suas fraquezas, quer do corpo quer do caráter; rivalizem em prestar mútua obediência; ninguém procure aquilo que julga útil para si, mas, principalmente, o que o é para o outro. ‘Nada absolutamente anteponham a Cristo – que nos conduza juntos para a vida eterna’. (RB 72) Nos últimos anos de sua vida, Bento, com esse equilíbrio do homem sábio, conclui que não conseguirá mudar muita coisa em seus monges, como desejaria, mas quer que permaneçam unidos até o fim: 'Juntos para a vida eterna'! Mas, para que isso seja possível, para que reine entre eles o amor fraterno, como que 'saindo do sério' e abusando dos superlativos, o que nos faz ver nas entre linhas a situação que viviam, apresenta os dois pólos que Jesus nos coloca em seu Evangelho: o joio e o trigo É com os olhos fitos neste Cristo, carregando os fardos uns dos outros que chegaremos à alegria perfeita que sacia a nossa sede. 'Canta e caminha!'; 'Vem, Senhor Jesus!” (Ir. Marcella Pereira Vilela, OSB)

“A vida monástica é um caminho de santificação, de experiência de Deus, de amor a Igreja e de serviço a humanidade. Ainda ouço soar forte as palavras do bispo no dia de minha consagração: ‘Recebei o livro da Oração da Igreja. Ressoe sempre o louvor de Deus em vossos lábios e intercedei pela salvação do mundo’. No alto da cruz, Jesus disse: ‘tenho sede’, segundo as palavras dos Padres da Igreja esta sede, é sede de almas. Esta é a nossa missão na Igreja, intercede pela salvação das almas”. (Ir. Maria Isabel Formenti, OSB)


“A vida monástica é pura como a primeira comunidade cristã: ‘Perseveravam eles na doutrina dos apóstolos, nas reuniões em comum, na fração do pão e nas orações. De todos eles se apoderou o temor, pois pelos apóstolos foram feitos também muitos prodígios e milagres em Jerusalém, e o temor estava em todos os corações. Todos os fiéis viviam unidos e tinham tudo em comum’ (At 2,42-44). Renunciamos aquilo que o mundo oferece para viver a vida consagrada, fazendo a oferta de cada dia, sendo sinal da graça para a Igreja. Por primeiro somos recebidas pela Igreja, que confirma o chamado de Deus. Depois, ofertamos a nossa vida diante do altar, com nosso sim, prostradas, tendo como testemunhas a comunidade reunida.” (Ir. Marta Beatriz Gonçalves, OSB)

“Estou há quinze anos nesta casa, e durante esse período vi minha vida florescer de tal modo que me sinto feliz por ter respondido ao chamado de Deus. Disse a uma irmã, aspirante como eu na época, que meu sim era definitivo... só faltava Ele me mostrar onde queria que eu me doasse. Aqui estou! Celebramos 70 anos de fundação com a gratidão pela vida das irmãs que passaram por nosso Mosteiro. Agora, preparamos o caminho para as próximas que, com certeza, Deus chamará.” (Ir. Bernadette Brandão Jackson Costa, OSB)

“O Mosteiro para mim, o próprio nome já indica: Casa de Oração, lugar onde aprendo diariamente a me despojar de mim mesma, do meu eu, para que Deus realize – através desse despojamento – aquilo que Ele deseja. Isso é um desafio, porque exige uma abertura diária a vontade de Deus... uma vontade que se manifesta por meio do outro – abadessa, irmãs, irmãos. Isso me pede uma vigilância constante, para que minha entrega seja fecunda na vida da Igreja e da humanidade.” (Ir. Maria Cecília Drumond Araújo, OSB)

“A vida monástica é o chamado de Deus a uma doação e entrega na obediência e humildade, por puro amor. O valor que mais me atrai nesta vida é a caridade fraterna. Aqui posso viver e aprofundar o amor puro por cada irmã e irmão”, (Ir. Nara Beatriz Pereira, OSB)


“Quando visitei pela primeira vez o Mosteiro de Nossa Senhora das Graças senti a força do sagrado nesse ambiente. Quando entrei, ainda mais forte, experimentei a sacralidade em cada espaço e detalhe. A nossa Regra, no capítulo 31, pede para a monja que: 'considere todos os móveis e bens do Mosteiro como se fossem vasos sagrados do altar'. Essa atenção de nosso Pai São Bento me chamou a atenção. Como é bom experimentar esse profundo valor e sentir desejo de dar testemunho para o mundo! Na casa de Deus, não o glorificamos apenas quando estamos no coro, na Lectio Divina, na Capela do Santíssimo. O trabalho é tempo de glorificar a Deus! Glorifico a Deus no uso de tudo aquilo que está a minha disposição, mesmo uma simples ferramenta do jardim, ou uma agulha, no exercício de cada oficina o Louvor continua. A vida beneditina nos ensina o valor que cada objeto possui... não somente aqueles que são vasos sagrados do altar, mas todos! Se os objetos são sagrados, quanto não será minhas irmãs? Em um tempo marcado pelo consumismo, pela cultura de relações descartáveis – em que a pessoa facilmente é usada como objeto que supre necessidades e interesses egoístas – nossa vida fraterna deseja ser sinal de relações profundas, respeitosas, complementares, que tem por base o desejo de construir laços firmes na fé. Nossas relações também são oficinas de Louvor Divino”. (Ir. Vera Lúcia Rodrigues Dias, OSB)

“Eu louvo e bendigo a Deus por todas as pessoas que trabalharam pela fundação deste Templo de amor e caridade fraterna. Que o Espírito Santo continue suscitando novas vocações e iluminando a Madre Maria Letícia, o Conselho e todas as irmãs do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças”. (Ana Maria – vive um período de experiência no Mosteiro)



Fazer Memória “Grandes coisas o Senhor fez por nós” (Sl 126,3)

O

quê é? ...celebrar o passado e atuar o presente do desígnio futuro do Criador.

Nossa vida de Consagradas a Cristo, na imitação de Sua entrega ao Pai, entra na categoria dos sacramentais, é sinal visível do Mistério de Cristo, porque repete no hoje do desígnio divino, a paixão, a morte e a ressurreição de Jesus Redentor. Do sentido teológico-litúrgico da virgindade consagrada, nossa vida monástica é uma ação litúrgica, uma Celebração Eucarística, perene Missa. Porque nossa vida é, também ela: uma memória (anamnese) do Mistério Pascal de Cristo, pela invocação do Espírito Santo, (dupla epiclese) e por nossa participação (methexis) na ação do mesmo Espírito que conduz a História da Salvação. Na vivência profunda e sincera de cada Missa cotidiana, nossa vida vai-se identificando à Celebração Eucarística, de tal modo, que a Mãe Igreja houve por bem incluir nossa Consagração na categoria dos Sacramentais: ela é um sinal sensível do Mistério de Cristo, porque nos confere as disposições de acolher as graças eficazes de santificação provenientes do Sacramento da Eucaristia. Assim nos é lícito admitir a expressão que o sentido teológico-litúrgico dá a nossa vida: uma “VidaMissa”, expressão que aponta sobremaneira a honra, mas também, o quanto de nós exige. Celebrar a memória de 70 anos do Mosteiro de Nossa Senhora das Graças é exaltar o louvor e ação de graças que, nesta “Casa de Deus, celebraram, suas Vidas-Missas, as monjas que nos precederam. Sim, elas celebraram! A prova está aqui: de um terreno inculto, hoje a “Mata do Mosteiro” com suas mostras do Pantanal; de um “Pavilhão”, o Conjunto de Santa Maria; de um “Mosteirinho”, este Mosteiro de Nossa Senhora das Graças. Enfim, da célula embrionária de uma capela, a Comunidade dos que praticam a Lectio Divina e a vivem, fiéis à lei do Amor, distribuindo seu “pão a quem tem fome e incentivando a fome de Deus nos coração dos que têm pão”.


Os corpos das monjas, repousando no claustro, como húmus fecundo, devolvem à terra as mil florinhas que os Amigos e nós lhes oferecemos. Fazem circular entre eles, sempre conosco, aquela força vital do testemunho que nos ajuda a continuar a caminhada que com elas iniciamos, na alegria e na Paz, perseguidas e alcançadas. Esse retorno é concretizado pela seiva poderosa da Oração. Mais do que uma ação-troco propriamente nossa, é a oração que a Igreja eleva ao Pai, diariamente através de seu Divino Filho, a quem pertencemos em caráter nupcial e que, portanto, é única, d'Ele e nossa.

É o que nossas Monjas de hoje estão fazendo: repetindo, não só ritualmente, os gestos e as palavras de Jesus, mas, entrando no mistério dos seus sentimentos. Sem parar, portanto, no rito, consumimos nossa existência em total obediência à vontade do Pai, realizando plenamente o seu projeto de amor que exige outro tanto de nós. Porque, formamos um só corpo. Essa unidade de sacrifício e de vida, traz, em consequência a unidade de pessoas. Não poderíamos incorporar-nos n'Ele pela Eucaristia, sem nos incorporarmos também entre nós. É próprio da Eucaristia ser o Sacramento dos que estão na íntima união com Cristo. Por isso mesmo, Cristo reúne todos os fiéis no seu Corpo, a Igreja, numa completa ação de graças pelas “grandes coisas que o Senhor fez por nós” (Sl 126) e continua a fazer. Ponto importante também na consideração do sentido de “memória”, nesta Celebração de memória dos 70 anos, é a prática observada neste Mosteiro, desde seu início, do “Rito da Paz”: O Sacerdote reza pela PAZ e a unidade, e convida os fiéis a trocarem entre si o sinal de paz.

Rezar com Cristo é rezar junto com Jesus; rezar por Cristo é frutificar por Ele, toda alteridade; rezar em Cristo é comungar na fé e na caridade com todos a quem o Espírito de Deus nos uniu. Participando, com fé, da Celebração Eucarística, somos estreitamente inseridas na Aliança selada pelo Sangue de Cristo, no Seu Sacrifício de reconciliação que alcança a PAZ para o mundo inteiro. E somos, também cooferentes com Cristo e, por meio d'Ele, no mesmo movimento de doação, de obediência ao Pai, de culto verdadeiro, de reconciliação completa com Deus e entre nós mesmos. Santo Agostinho refere-se a isto, dizendo que “A Igreja, ao oferecer o Cristo, todos os dias, aprende a oferecer-se a si mesma”. Ora, o quê significa isto, senão “fazer memória”?

Evidentemente, “um sinal” sensível sobre a grave advertência de Jesus, que antepõe a reconciliação fraterna a qualquer oferta colocada sobre o Altar. Como deveríamos trazer na mente, no coração e na vida aquela Palavra de São Mateus! (cf. Mt 5, 24) Com essas e outras normas de vida espiritual e monástica, celebremos a “Memória”, a História da Salvação, que é a história de um Sacrifício único, de Cristo e nosso; de uma só História, criada pelo passado, vigente no presente e orientada para o eterno futuro, em que só Deus é. Deus só, e nós n'Ele. Com o coração repleto de gratidão por aquilo que pudemos testemunhar da ação de Deus por nós, confiantes nas “grandes coisas” que ainda vamos alcançar quando estivermos plenamente n'Ele. Irmã Irene Valadares de Oliveira, OSB


Amor fraterno: caminho de crescimento e santidade . “Vinde e vede como é bom, como é suave os irmãos viverem juntos bem unidos!” (Sl 132,1) Ninguém pode negar a necessidade e a importância de se viver o amor. Contudo, esta palavra vem perdendo sua força expressiva, sendo utilizada para indicar diversos tipos de afeição, tais como: ama-se um hamburger, um ídolo, chocolates, viagens etc... Na contramão dessa realidade de mundo, nós que estamos imersos na realidade da vida monástica beneditina, convencidos pela palavra de Jesus de que é essencial amar uns aos outros como Ele nos amou e como amamos a nós mesmos, vemos o desafio do amor fraterno como um caminho de crescimento gerador de alegria, que contribui imensamente para a almejada santidade. O Cardeal Dom José Tolentino Mendonça, em seu livro Nenhum caminho será longo – para uma teologia da amizade, diz que “habituamo-nos a ouvir o apelo ao amor, recebendo-o ou reproduzindo-o sem grande discernimento.” Também nós, monges e monjas, corremos o risco de não nos debruçarmos com solicitude sobre esse apelo cuja ressonância é tão grande em nosso dia a dia e, sem nos darmos conta, apenas

estabelecermos boas relações sociais com os nossos irmãos e irmãs. É preciso aprender a amar. E isso só pode acontecer no cotidiano, pois não existe um manual intitulado: Dez maneiras de aprender a amar – resultado garantido! Todos temos a experiência de que somente por graça de Deus, por puro dom, somos capazes de empreender uma tal aventura que pede esforço, perseverança e muita fé. Os mosteiros são locais privilegiados onde Deus nos ensina a perceber, em cada membro da comunidade, alguém escolhido por Ele para ser alvo do que há de mais belo: a capacidade de amar, unicamente por causa d'Aquele que nos chamou. Mesmo que tolhidos, algumas vezes, pela própria limitação no que concerne a amar verdadeiramente o outro, a graça de Deus vem em nosso auxílio, permitindo-nos dar passos importantes e necessários no caminho de sair de nós mesmos, o que nos torna semelhantes ao Senhor.


Em vários capítulos da Regra de Nosso Pai Santo Bento, encontramos o convite ao amor fraterno como sendo a mola propulsora para um bom desempenho do serviço mútuo. De forma especial todo o capítulo 72 ,“Do bom zelo que os monges devem ter”, tão caro a todos nós, é um convite explícito e sonoro a vivermos bem as nossas relações fraternas. Devemos ver o outro como alguém pelo qual Cristo deu a vida, alguém que tem muito a contribuir para o nosso crescimento pessoal, sobretudo possibilitando-nos viver virtudes que, sem um outro para receber, não poderiam firmar-se e desenvolver-se. Me. Anna Maria Cànopi, abadessa fundadora do Mosteiro Mater Ecclesiae da Ilha de San Giulio na Itália, ao comentar o capítulo 72, diz que “este capítulo nos chama antes de tudo às exigências da beleza espiritual – ou seja, da santidade – para vivermos realmente, em plenitude, o mistério da Igreja, Esposa de Cristo, para sermos, desde agora, uma imagem da realidade futura. Somos chamados a ser 'mais semelhantes' (a Cristo)”. E Cristo nos amou com ferventissimo amore, sendo essa a maneira de expressar o amor à qual São Bento nos chama. Temos inúmeras oportunidades de exercer o amor fraterno. É necessário que permaneçamos vigilantes, a cada momento, para escolhermos sempre o amor. Somos exortados a todo instante pela Sagrada Escritura, a deixarmos que o Espírito Santo inspire nossas ações. E, assim como é Ele que reza em nós, é também Ele que ama em nós. A nossa fragilidade trava uma grande luta em nosso íntimo, porque nem sempre é fácil amar os irmãos. Somos tentados a julgar suas fraquezas, a fazer comparações que nos impedem de crescer neste ponto tão essencial. Para essa luta interior, foi nos dado o Paráclito, nosso Defensor... é Ele quem nos socorre! Sem Ele não temos as forças necessárias para vencer os obstáculos que se apresentam. Continua Me. Anna Maria: “É preciso amar verdadeiramente aprendendo a sofrer, tomar sobre si o peso do outro e aceitar que o outro nos tome como peso sobre si. É um sustinere, ou seja, sustentar com robustez, tendo os outros acima de si, não uma aceitação indolente". Sendo suportes uns para os outros, poderemos realmente progredir mais e mais para Deus, conforme o pedido de São Bento no capítulo 62,4. Uma vez que o Senhor nos coloca para vivermos a nossa vocação próximos a outras pessoas igualmente escolhidas por Ele, cabe-nos cumprir com fidelidade e zelo o preceito do amor. E o amor com o qual amamos provém d'Ele mesmo, por isso deve ser sem medida e sem exceções. A fidelidade à vida de oração, as orientações recebidas pelo abade, o próprio desejo de fazer a vontade de Deus,

Da esquerda para direita: Ir. Marcella, Ir. Paula Maria e Ir. Plácida

tudo isso vai modelando em nós um coração mais aberto, disponível e consciente de que somente por amor é possível crescer na acolhida do outro. Esse caminho, ainda que árduo, é fonte de grande alegria para quem decide desbravá-lo confiando no auxílio de Deus. O Salmista não estava enganado quando disse que é “bom e suave os irmãos viverem unidos”. É durante o caminho que essa verdade vai sendo descoberta e, ao mesmo tempo, vai tomando consistência. Aquele que nos chamou é capaz de nos animar e fortalecer a cada passo dado. Tomando seriamente as exortações do Papa Francisco que nos pede construir pontes e não muros, crescer no diálogo e no respeito, teremos um horizonte belo, vasto e desafiador, mas também possível e gratificante a percorrer. Será esse um aspecto monástico a exercitarmos e a chamarmos de “Igreja em saída” dentro de nossas comunidades? Certamente sim. Porque também nós, mesmo na clausura, precisamos sair de nós mesmos para nos lançarmos em direção aos irmãos oferecendo-lhes o que necessitam, seja a escuta, um sorriso, a presença, a oração, o perdão. Só poderemos ser santos vivendo com intensidade, alegria, serenidade, cada oportunidade que surge de colocarmos o amor fraterno em ação. Embora seja, como já dissemos, um desafio, é também um meio seguro e eficaz de nos assemelharmos mais a Cristo que nos deu o irmão para ser receptáculo do amor que Ele mesmo fez nascer em nós e que só atingirá a sua maturação se devidamente partilhado. Celebrando os 70 anos de fundação de nosso Mosteiro, venha o Senhor em Sua misericórdia ajudar-nos a crescer no amor fraterno verdadeiro para com cada irmão que Ele nos oferece para nos auxiliar no caminho de santidade e conversão. Ir. Giovanna da Silva, OSB


Em Busca da Água Viva “A minh' alma tem sede de vós, Senhor!” (Sl 62,2)

E

nquanto peregrinamos nesta terra, estamos em um deserto, sempre sedentos, esperando pela fonte de água cristalina que irá nos saciar plenamente. Mas, Deus não descuida de nós! Ele é um Pai atento que, vendo-nos necessitados de água viva, não permite que desfaleçamos, dando-nos o necessário para caminharmos nesta vida, rumo a pátria prometida. Podemos considerar como normal que a vida monástica seja uma resposta à sede, isto é, à busca de Deus, busca de paz, de harmonia, de realização, de transformação em seres melhores, daqueles e daquelas que vivem nos mosteiros. Mas poderíamos falar da vida monástica como resposta à sede de quem vive uma vida engajada numa sociedade, numa realidade bastante diferente daquelas vividas nos claustros?

Primeiramente consideremos quem são estas pessoas que, impulsionadas por uma sede crescente e inquietante, foram e continuam a ir buscar resposta na vida cenobítica do mosteiro, guiadas pela Regra de São Bento. O Prólogo de um livro contém em germe tudo o que o autor quis desenvolver ao longo de sua obra. A Regra de São Bento não é uma exceção. O Prólogo da RB é uma catequese batismal, dirigida a toda pessoa de boa vontade, “quem quer que seja” que “quer a vida e deseja ver dias felizes”, vult vitametcupitvidere dies bonos (Prol 3.15). Assim, antes de mais nada, o monge e a monja são cristãos que buscam saciar sua sede de “vida e dias felizes”.


Sabemos por experiência que a procura traduz uma necessidade, uma insatisfação, alguma coisa está nos faltando. Se procuramos algo é porque não o temos: ou nunca o tivemos ou o tivemos e o perdemos e sentimos falta disso. É como a necessidade ou o prazer de beber água ou outra bebida de que gostamos porque além de fazer bem ao nosso corpo traz bonitas recordações e vida ao espírito. A sede é capaz de despertar em nós uma boa procura que nos estimula e polariza todo nosso coração, toda nossa alma, todas as nossas forças. Pergunte-se a um bom mineiro o que significa ter sede de tomar um cafezinho coado na hora, acompanhado de pão de queijo e uma boa prosa ...

morte. Como no plano físico, semelhante no espiritual. O que mantém viva a boa sede destas monjas que há 70 anos diuturnamente ( isto é, dia e noite) sustentam e renovam esta busca-sede começada há 1500 anos com o jovem Bento, transmissor fiel da tradição recebida dos monges, habitantes dos desertos e das montanhas, sedentos daquela palavra proclamada há 2000 pelo próprio Cristo que convida a todos: “ Quem tem sede venha a mim e de seu seio correram rios de água viva”? (Jo 7,37) Estas monjas nos indicam, pelo simples fato de existirem há 70 anos ( se é que se pode chamar simples viver 70 anos a vida monástica) qual é a boa, a justa, a essencial sede que se deve ter, e como saciar esta sede que vale a pena ser saciada. Poderíamos citar ao menos setenta vezes sete, mas vamos escolher simbolicamente sete:

Ter sede é parte essencial da história da Salvação, sem a sede a história não se realiza.

É interessante notar como a situação de sede está presente desde os primórdios até o fim nas páginas da Sagrada Escritura, ter sede é parte essencial da História da Salvação, sem a sede a história não se realiza, os grandes encontros se dão junto a um poço : o servo de Abraão e Rebeca, futura esposa de Isaac (Gn 24,15ss); Jacó e Raquel (Gn 29,10ss); Moisés e Séfora ( Ex 2,19ss). O Salmista canta sua alma “sedenta do Deus vivo” (Sl 62,2); Jesus no poço de Sicar pede de beber a uma samaritana e depois lhe oferece uma água viva (Jo 4,7.10). A sede acompanha Jesus até seu derradeiro momento na cruz: “Para que a Escritura fosse perfeitamente cumprida, Jesus diz: Tenho sede” (Jo 19,28). E no Apocalipse, o último livro da Revelação, ouvimos: “O Espírito e a Esposa dizem: “Vem!” E que o homem sedento se aproxime, que o homem de desejo receba água gratuitamente” ( Ap 22,17). A sede pode conduzir seja à vida, seja à morte. Foi constatado através de uma pesquisa que a falta de água potável faz mais vítimas do que as guerras. O nó da questão não é ter sede, mas discernir do que temos sede e como saciamos esta sede. Água contaminada conduz à

1) Sede da Palavra de Deus: Celebração da Eucaristia, do Ofício Divino, Lectio Divina, estudo da Sagrada Escritura, dos Padres da Igreja, etc.. 2) Sede de fazer bem o que se faz: o trabalho como continuação e expressão da oração 3) Sede de perseverar até o fim no amor concreto: o exercício da caridade fraterna a ser praticado cotidianamente 4) Sede de encontro com o Cristo: acolhida de todas as pessoas que veem ao mosteiro, cristãs ou não. 5) Sede do belo: a beleza cultivada na construção do mosteiro, na execução da música sacra, produção dos diversos ateliers de arte. 6) Sede de harmonia: a organização das coisas e do tempo, o respeito por todos os objetos e pelo meio ambiente. 7) Sede de se tornar um ser humano melhor: combate aos vícios e crescimento nas virtudes.


Como vemos, estas sedes não são exclusivas da vida monástica. Elas nos indicam que nós temos um denominador comum a todo ser humano que está à procura. Somos todos filhos e filhas do mesmo Pai que está no céu e é às apalpadelas que voltamos para a fonte primordial da água viva. Nós todos, familiares, amigos, oblatos, pobres, ricos, monges, monjas, os que estão longe e os que estão perto, fascinados pelo testemunho desta comunidade jubilar, temos a alegria de saciar nossa sede à sua sombra e à sua luz. Uma certeza nos anima e reconforta: a vida monástica autêntica e fervorosa no Mosteiro de Nossa Senhora das Graças nos garante que não morreremos de sede! Esse Mosteiro, assim como tantos outros espalhados pelo Brasil e pelo mundo, é um sinal de que Deus quer saciar nossa alma e nossa carne, com a sua Presença manifestada na vida monástica. É interessante que a primeira abadessa do Mosteiro de

Nossa Senhora das Graças, Madre Luzia Ribeiro tenha pedido certa vez à sua comunidade: “Para a missa das minhas exéquias, gostaria que cantassem o Introito “Sitientesvenite ad aquas, dicit Dominus”. Pelos seus longos anos de vida humana e monástica ela sabia que a vida é uma sede imensa cujo fim é uma fonte inesgotável. São Romano, o Melódio, é nosso convidado especial para dedicar à Jubilar Comunidade de Nossa Senhora das Graças um de seus versos sobre a sede de Jesus e da Samaritana, arquétipos das sedes de todas as épocas: “Que os tempos novos floresçam, que brote a água viva e sejam por ela regados todos os que procuram com fé a alegria e a redenção”. U.I.O.G.D. Ir. Escolástica Ottoni de Mattos, OSB (Abadessa do Mosteiro de Santa Maria - SP)


O Dom de acolher “Que alegria quando ouvi que me disseram: Vamos a casa do Senhor!” (Sl 122,1)

A

existência humana é feita de histórias que se misturam e se complementam. Das resistentes, belas, verdadeiras, inspiradas por Deus até às mais dolorosas e absurdas. Tudo é história. Elas contam sobre caminhos percorridos, falam de pedras e flores encontradas, narram das pontes e dos vales atravessados. São feitas de encontro e desencontro, de conflito e diálogo, de culpa e perdão, pois vão sendo escritas com o próprio ser, pele, olhos, ouvidos, boca, sentimentos, pensamentos e emoções de tantas vidas. Não é diferente com o Mosteiro de Nossa Senhora das Graças. Há 70 anos escreve a sua história, tendo como ponto de partida a coragem de algumas mulheres, que ousadamente subiram o morro da Vila Paris, e sozinhas se dispuseram a morar nesta casa, misturando simplicidade e grandeza, despojamento e beleza. Aos poucos o perfume suave do carisma beneditino foi exalando por toda a cidade de Belo Horizonte. Oração e trabalho. Silêncio e profundidade. Escuta e aprendizado. E assim, outras tantas mulheres sentiram o aroma, deixaram tudo, chegando ofegantes à sua porta e daqui nunca mais saíram, vivendo felizes a entrega

apaixonada a Jesus Cristo, desejosas de intimidade e dispostas a serem adubo na terra fértil da Igreja. Juntando as vozes umas com as outras, hoje formam um só canto que encanta e eleva. Eu também um dia subi o morro e me deparei com esse oásis. Ele inundou minha terra seca, sedenta e empoeirada pela dureza urbana, barulhenta, confusa. Pelos tantos atalhos e descaminhos em que me perdi. Pelas escolhas erradas e ilusões vividas. Neste silêncio de paz reencontrei Deus, como bem me disse irmã Cristiana Carvalho Leite, tão à frente do seu tempo ao acolher-me com tanta generosidade. Encontrei-me novamente nos braços do Pai e este encontro mudou o rumo da minha história. Por isso, hoje escrevo sobre esta casa de oração e acolhida, embora saiba que minhas palavras não alcançam a grandiosidade do que é essa obra de Deus .Aqui, acolher com alegria, gratuidade e sem restrições é carisma, e nasce do Espírito Santo. Não importa a condição social ou a cor da pele, a porta se abre e eis o sorriso amoroso, o abraço caloroso a dar boas-vindas, seja homem ou mulher, de qualquer idade, cansada (o) da luta lá embaixo, sedenta (o) de beber da Fonte de água viva.


Ir. Marta Beatriz e Ir. Paula Maria acolhendo alguns amigos do Mosteiro.



Ó Maria, nós te saudamos e te agradecemos, branco lírio da Santíssima Trindade, rosa fragrante do paraíso! De ti quis nascer o Verbo de Deus e de teu leite quis alimentar-se. Sacia, com a efusão da divina Graça, a sede destas tuas filhas que há 70 anos erguem contigo louvores ao Pai, espalham contigo o odor de Cristo, na ardente caridade do Espírito Santo. Faze de nossa vida um hino de amor, Secundum Verbum. Amém!


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