O demônios estão todos em Ruanda

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O demônios estão todos em Ruanda. Kigali, a capital de Ruanda, tinha 350 mil habitantes em meados de abril de 1994. Um mês depois, não havia mais que 250 mil pessoas vivendo na cidade. Pelo menos 60 mil foram assassinadas. Mais de 20% dos 8 milhões de ruandenses abandonaram suas casas, em pânico, para se refugiar no interior ou países vizinhos. Em um único dia, 250 mil pessoas cruzaram a fronteira com a Tanzânia por uma ponte estreita – o maior e mais rápido êxodo já visto por funcionários da ONU e Cruz Vermelha. Em menos de 4 semanas, houve uma chacina de proporções assombrosas: mais de 200 mil mortos, 500 mil trucidados ( homens, mulheres, crianças, velhos). Um missionário que se encontrava em Ruanda disse à revista Time: ‘Não sobraram demônios no inferno. Eles estão todos em Ruanda’. A tragédia é mais uma etapa da guerra civil que despedaça Ruanda desde 1990 e mais um round na histórica briga entre as duas etnias que povoam a região desde o século XV – os hutus e os tutsis (ou watusis). O ódio entre esses dois povos é um legado do colonialismo. Os hutus, de estatura mais baixa e de cor negra mais acentuada, formam hoje 85% da população. Falam a mesma língua e conviveram em paz com os tutsis, mais altos e de pele mais clara, até a chegada dos europeus, em 1885. Primeiro foram os alemães, que colonizaram a região até a Primeira Guerra Mundial, e depois os belgas, que ficaram até 1961, um ano antes da independência de Ruanda. Os colonizadores escolheram os tutsis como testas de ferro de seu domínio. Concederam a eles os cargos na burocracia governamental, as vagas nas escolas, os postos mais importantes no exército e facilidades para se instalarem no comércio. Na década de 50 ocorrem os primeiros conflitos entre as duas etnias. Com o crescimento do sentimento de nacionalidade em toda a África, os hutus lançam um movimento separatista, mas seus líderes são assassinados pela elite tutsi. Em 1959 os hutus finalmente derrubam a monarquia tutsi, instalam um governo provisório no ano seguinte conseguem a independência, em 1962. Em 1963, um movimento guerrilheiro tutsi invade Ruanda procedente do vizinho Burundi, mas é derrotado e perde 12 mil homens. Dez anos mais tarde um golpe militar põe no poder um hutu A atual guerra civil começou em 1990, quando guerrilheiros tutsis invadem Ruanda procedentes de Uganda. Intermináveis negociações de paz foram conduzidas pela ONU, por países africanos, França e Bélgica. Em abril de 1994, o avião em que viajava o presidente Habyarimana (hutu), foi derrubado por míssil quando retornava de uma rodada de negociação da paz na Tanzânia. Os <;B>hutus responsabilizaram os tutsis pelo assassinato, mas suspeita-se que líderes radicais hutus é que tenham disparado o míssil a fim de criar pretexto para massacrar os tutsis. Milícias que atuam como braços armados de partidos políticos hutus saíram à caça de seus adversários em todo país. A chacina foi monstruosa. Invadiram a universidade de Kigali e mataram, com tiros e golpes de facão, todos os estudantes que estavam no campus. Os milicianos tinham listas com nomes de pessoas a serem mortas e as perseguiam até atingir os objetivos. Aldeias inteiras foram dizimadas. Moradores de países vizinhos e observadores internacionais presenciaram cenas horripilantes, que demonstravam um método macabro de extermínio: primeiro apareciam boiando nas correntezas dos rios os corpos chacinados de homens e jovens, que morreram lutando para defender suas famílias; depois apareciam os corpos das mulheres e velhos, também trucidados; por fim os corpos intactos de crianças e bebês, que foram jogados nos rios para se afogarem. Fonte: Revista Nova Escola.Agosto: 1994, p.42/43. Atividade de interpretação do texto e do filme 1 - Construir um argumento geopolítico para explicar a relação entre o processo histórico de colonização e o desenvolvimento do conflito. Basear-se no conflito étnico: hutus e tutsis. 2 - Explicar o significado de etnia e genocídio revelados nas cenas do filme e no texto acima. 3 - Problematizar: O genocídio de Ruanda seria uma versão africana da limpeza étnica que ocorre em alguns países europeus? Em quais lugares do mundo essa prática ainda ocorre? Por quê? 4 - O hotel Mille Colines representa uma segregação espacial contraditória: a) antes do conflito só recebe turistas estrangeiros; durante o conflito abriga a população local e retira os turistas. Como você analisa essa contradição e conceitua a segregação espacial no filme? 6 - Um conceito significativo abordado no filme: fronteira política do território de Ruanda. Ele é mostrado nas cenas finais dos refugiados, procurando desesperadamente sair do pais. Apresente argumentos sobre a barbárie hutu, respomdendo: É possível reorganizar esse território? Como? Quais suas sugestões para retirar esses povos do caos étnico e político?


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