UNINOVE- DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR-Prof.
ª Maria-Teresa Bianco.
CHOMSKY E AS 10 ESTRATÉGIAS DE MANIPULAÇÃO MIDIÁTICA O linguista estadunidense Noam Chomsky elaborou a lista das “10 estratégias de manipulação” através da mídia: 1- A ESTRATÉGIA DA DISTRAÇÃO. O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites políticas e econômicas, mediante a técnica do dilúvio ou inundações de contínuas distrações e de informações insignificantes. A estratégia da distração é igualmente indispensável para impedir ao público de interessar-se pelos conhecimentos essenciais, na área da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética. “Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar; de volta à granja como os outros animais (citação do texto 'Armas silenciosas para guerras tranquilas')”. 2- CRIAR PROBLEMAS, DEPOIS OFERECER SOLUÇÕES. Este método também é chamado “problema-reação-solução”. Cria-se um problema, uma “situação” prevista para causar certa reação no público, a fim de que este seja o mandante das medidas que se deseja fazer aceitar. Por exemplo: deixar que se desenvolva ou se intensifique a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público seja o mandante de leis de segurança e políticas em prejuízo da liberdade. Ou também: criar uma crise econômica para fazer aceitar como um mal necessário o retrocesso dos direitos sociais e o desmantelamento dos serviços públicos. 3- A ESTRATÉGIA DA GRADAÇÃO. Para fazer
com que
se aceite uma
medida
inaceitável,
basta aplicá-la
gradativamente, a conta-gotas, por anos consecutivos. É dessa maneira que condições socioeconômicas radicalmente novas (neoliberalismo) foram impostas durante as décadas de 1980 e 1990: Estado mínimo, privatizações, precariedade, flexibilidade, desemprego em massa, salários que já não asseguram ingressos decentes, tantas mudanças que haveriam provocado uma revolução se tivessem sido aplicadas de uma só vez.
4- A ESTRATÉGIA DO DEFERIDO.
Outra maneira de se fazer aceitar uma decisão impopular é a de apresentá-la como sendo “dolorosa e necessária”, obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro, porque o esforço não é empregado imediatamente. Em seguida, porque o público, a massa, tem sempre a tendência a esperar ingenuamente que “tudo irá melhorar amanhã” e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Isto dá mais tempo ao público para acostumar-se com a ideia de mudança e de aceitá-la com resignação quando chegue o momento. 5- DIRIGIR-SE AO PÚBLICO COMO CRIANÇAS DE BAIXA IDADE. A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discurso, argumentos, personagens e entonação particularmente infantis, muitas vezes próximos à debilidade, como se o espectador fosse um menino de baixa idade ou um deficiente mental. Quanto mais se intente buscar enganar ao espectador, mais se tende a adotar um tom infantilizante. Por quê? “Se você se dirige a uma pessoa como se ela tivesse a idade de 12 anos ou menos, então, em razão da sugestão, ela tenderá, com certa probabilidade, a uma resposta ou reação também desprovida de um sentido crítico como a de uma pessoa de 12 anos ou menos de idade (ver “Armas silenciosas para guerras tranquilas”)”. 6-
UTILIZAR
O
ASPECTO
EMOCIONAL
MUITO
MAIS
DO
QUE
A
REFLEXÃO. Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional, e por fim ao sentido critico dos indivíduos. Além do mais, a utilização do registro emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para implantar ou enxertar ideias, desejos, medos e temores, compulsões, ou induzir comportamentos… 7- MANTER O PÚBLICO NA IGNORÂNCIA E NA MEDIOCRIDADE. Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão. “A qualidade da educação dada às classes sociais inferiores deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância da ignorância que paira entre as classes inferiores às classes sociais superiores seja e permaneça impossível para o alcance das classes inferiores (ver ‘Armas silenciosas para guerras tranquilas’)”. 8- ESTIMULAR O PÚBLICO A SER COMPLACENTE NA MEDIOCRIDADE. Promover ao público a achar que é moda o fato de ser estúpido vulgar e inculto…
9- REFORÇAR A REVOLTA PELA AUTOCULPABILIDADE. Fazer o indivíduo acreditar que é somente ele o culpado pela sua própria desgraça, por causa da insuficiência de sua inteligência, de suas capacidades, ou de seus esforços. Assim, ao invés de rebelar-se contra o sistema econômico, o individuo se auto desvalida e culpa-se, o que gera um estado depressivo do qual um dos seus efeitos é a inibição da sua ação. E, sem ação, não há revolução! 10- CONHECER MELHOR OS INDIVÍDUOS DO QUE ELES MESMOS SE CONHECEM. No transcorrer dos últimos 50 anos, os avanços acelerados da ciência têm gerado crescente brecha entre os conhecimentos do público e aquelas possuídas e utilizadas pelas elites dominantes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o “sistema” tem desfrutado de um conhecimento avançado do ser humano, tanto de forma física como psicologicamente. O sistema tem conseguido conhecer melhor o indivíduo comum do que ele mesmo conhece a si mesmo. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos do que os indivíduos a si mesmos.
TER OU SER: EIS A QUESTÃO Jornal do BrasilMaria Clara LucchettiBingemer+A-AImprimirPublicidade Entre as múltiplas definições de cultura que hoje circulam no mundo do saber, uma delas é “o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizamuma sociedade ou um grupo social e que abarca, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças.”
Isto que se convencionou chamar cultura, mas que pode ter já de entrada várias definições, segundo a área de especialidade desde onde se fala, é algo que tem sofrido grandes e profundas mutações na passagem da modernidade para a pósmodernidade. A tal ponto que passou a se constituir na área maior de interesse do ser humano hoje. O que era o “social” para a segunda metade do século XX é o cultural para este início de século XXI.
Porém a primeira dificuldade com esse
estado de coisas é que o conceito mesmo de cultura não e mais tão unívoco.
O grande crescimento da importância dos problemas culturais se enquadra em um amplo contexto caracterizado pela lógica de uma sociedade produtivista que respondeu às necessidades elementares da população mais abastada e que, para continuar mantendo seu ritmo de crescimento e consumo, deve desenvolver e satisfazer as necessidades «culturais «
de sua clientela.
Assim, a cultura se
torna, mais que “valores” a defender ou idéias a promover, um trabalho a empreender sobre todo o tecido da vida social a fim de manter a maquina do consumo azeitado. Trata-se de uma sociedade feita de “homens e mulheres que querem ter alguma coisa” e cada vez menos de homens e mulheres que” querem ser alguém”.
Quando falamos, portanto,dessa cultura não mais hegemônica, mas plural como é a nossa, estamos, obviamente referindo-nos ao contexto
no qual vivemos toda a
nossa vida e cujas rápidas transformações das ultimas décadas por isso mesmo nos espantam.
Trata-se de uma cultura da passividade exatamente por ser uma cultura do espetáculo.
Instalada nos lazeres como compensação do trabalho, a cultura
consumista desenvolve nos espectadores que são os homens e mulheres de hoje a passividade da qual ela já é o efeito.
A cultura serve para ajudar o indivíduo a escapar das questões mais candentes e mordentes da sociedade e consumir o vazio que vai nadificá-lo. As formas atuais de conscientização e, portanto de aglutinação se fragmentaram e suas fronteiras já não são mais definidas. Encontram-se, sim,abertas fazendo inúmeras interfaces e provocando um novo recorte social onde os atores são dificilmente situáveis.
Finalmente, a cultura se tornou instrumento de poder. Tal como o que era ontem o folclore ou a cultura popular, a cultura de massa hoje permanece afetada pelo coeficiente social que a distingue de uma cultura operacional, sempre reservada. Ela não tem mais uma função colonizadora (no bom como no mau sentido da palavra: ao mesmo tempo civilizadora e conquistadora) como foi o caso durante longo tempo da educação que vulgarizava e difundia as concepções de uma elite. Na verdade, a
cultura se tornou um objeto rentável e maleável, segundo as necessidades da produção e do consumo, antes que uma arma de combate.
O poder então se serve da cultura sem se comprometer com ela. Não está mais comprometido nos discursos que fabrica. Seu centro de atenção não está mais substantivamente na produção cultural, ou na difusão cultural, mas apenas tangencialmente. E os produtos culturais servem à classe daqueles que os criam e são pagos pela massa daqueles que deles não usam nem aproveitam.
A grande questão que isso levantaé se os membros de uma sociedade como a de hoje, afogados que estão no anonimato de discursos que não são mais os seus, e submetidos a monopólios cujo controle lhes escapa encontrarão, juntamente com o poder de se situar em algum lugar, num jogo de forças assumidas, a capacidade de expressar-se.
Parece que a questão não é mais a mesma que atormentava o Hamlet de Shakespeare: ser ou não ser. Mas sim ter ou ser. Se continuar alugando-se e vendendo-se a si mesma para que o consumo reine soberano, dominando e monopolizando a atenção dos indivíduos, seguramente a cultura não cumprirá seu papel de testemunha da maravilha que é o ser humano. Rastejará ao nível das necessidades artificiais e não permitirá que apareçam os desejos que libertam e apontam para a Transcendência.
Maria Clara Bingemer é professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio e autora de "Deus amor: graça que habita em nós”(Editora Paulinas), entre outros livros RESENHA DO LIVRO DE ERICH FROMM: TER OU SER? A importância da diferença entre ter e ser . Ter é uma função normal de nossa vida. Para a existência humana é necessário que tenhamos e utilizemos certas coisas para a sobrevivência. Digamos que é uma necessidade existencial. Porém o que presenciamos atualmente são práticas que vão além do "ter para existência". Presenciamos uma ideologia consumista.
Erich Fromm acentua o quase desaparecimento da escolha entre ter e ser em uma sociedade em que se valoriza ter cada vez mais e só é reconhecido aquele que possui significativos bens de consumo, ou seja, " tem-se a impressão de que a própria essência de ser é ter, de que se alguém nada tem, não é"( p.35).
E essa não é uma discussão recente. Buda ensina que para se chegar ao mais elevado estágiodo desenvolvimento humano não devemos ansiar pelas posses. Jesus pregava: " pois quem quiser salvar a sua vida, perdê-la (LUCAS, 9:24-25). Já Eckhard ensina que ser nada é tornar-se aberto para conseguir riqueza espiritual. Para Karl Marx, nosso ideal deve consistir em ser muito e não ter muito.
Antropólogos e psicanalistas também tendem a demonstrar que ter e ser são modos fundamentais de existência que determinam as diferenças entre caracteres dos indivíduos e caráter social.
O sentimento de ter é característica da sociedade industrial ocidental, na qual o dinheiro, fama, poder são temas dominantes. Já sociedades menos alienadas que não foram afetadas pelas idéias modernas de progresso industrial, são menos afetadas pela ideologia do "ter".
Pode-se observar que essas mudanças afetaram também a linguagem. As mudanças idiomáticas acarretaram mudanças de ênfase nos verbos "ter" e "ser", um crescente emprego de substantivos e decrescente emprego de verbos. Ao exprimir uma atividade emprega-se o "ter" relacionando-o com substantivo, emprego errôneo da língua, pois atividades não podem ser possuídas, somente vividas.
A expressão "ter" indica incorporação, posse e não esta relacionada ao modo de identidade existencial, mas nos hábitos lingüísticos da sociedade moderna, pois " os consumidores modernos se identificam com o ato de incorporação, eu sou aquilo que tenho e consumo"( p.45).
A ideologia do "ter mais" e "querer sempre mais" se expressa no consumo. Consumir é uma forma de "ter" no sentido de posse, considerada das mais importantes na atual sociedade, pois ao consumirtem-se um alivio instantâneo da angústia, sentimento de vazio de identidade, impotência existencial e moral.
O homem atual, consumista, não se reconhece como transformadore criador de sua realidade, digno de si mesmo para mudar a realidade sofrida em que se encontra, rodeado de conformismo e egoísmo. O crescimento da sociedade de consumo faz com que o homem aperfeiçoe técnicas de produção e tecnologias. E se esqueça do aperfeiçoamento do ser...
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
FROMM, E. A importância da diferença entre ter e ser. In:______. Ter ou Ser? 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1977. cap. 1.
O vídeo-clip da banda musical SLIPKNOTilustra bem o tema discutido no texto. Observe a relevância da arte popular como um movimento crítico:
Sem dúvida, é a partir desta concepção de natureza humana que emerge o seu humanismo e que vai estar presente na sua concepção de ética, de psicanálise, de marxismo e de socialismo. É também a base da renovação da psicanálise empreendida por Fromm. É por isso que Fromm irá revalorar a cultura e as relações sociais para explicar o ser humano e seu psiquismo. O modelo biologista de Freud é criticado, incluindo sua concepção da existência de um "instinto de morte" (Fromm, 1975). Fromm explica o ser humano como potencialmente bom, e somente em condições adversas pode desenvolver uma potencialidade secundária, tornando-se mau (Fromm, 1965).
Uma de suas teses mais interessantes é a do caráter social. Fromm encontra alguns tipos de caráter social que podem ser divididos entre aqueles que possuem orientação produtiva e aqueles que possuem orientação improdutiva. As orientações improdutivas são a receptiva, a exploradora, a acumulativa e a mercantil e as produtivas são reduzidas a uma só, que é a do ser humano que manifesta a essência humana, que realiza a produtividade (Fromm, 1978). Ao contrário de Freud, cuja base fundamental do caráter estaria nos vários tipos de organização da libido, Fromm pensa o caráter social a partir da relação da pessoa com o mundo que, no curso de sua vida, ocorre por meio do processo de adquirir e assimilar coisas e na relação com as demais pessoas e consigo mesmo, o que significa que é social. A função do caráter social é moldar os indivíduos no sentido de agir na direção exigida pela sociedade. O caráter social produz o desejo de agir no sentido de que a sociedade exige e produz no indivíduo a satisfação ao agir de acordo com as exigências da cultura e assim realiza uma mediação entre o modo de produção e as idéias dominantes em uma determinada sociedade (Fromm, 1979).
As orientações de caráter improdutivas são as seguintes: a) receptiva: a pessoa pensa que tudo que é bom está fora dela e espera receber tudo de uma fonte exterior, sendo que o fundamental nesta orientação é ser amado e não amar; b)
exploradora: a pessoa também pensa que o bem está no exterior, mas busca tomálo por meio da astúcia ou da força; c) acumulativa: as pessoas com esta orientação, ao contrário das anteriores, não têm fé no mundo exterior e sua meta é acumular e poupar, sendo que gastar é visto como uma ameaça; d) a orientação mercantil passa a predominar na sociedade moderna e está intimamente ligada à expansão mercantil e o capitalismo, sendo produto da mercantilização das relações sociais e dominando o indivíduo na sociedade capitalista, que "se sente ao mesmo tempo como o vendedor e a mercadoria a ser vendida no mercado"; "sua auto-estima depende de condições que escapam ao seu controle. Se ele tiver sucesso, será "valioso"; se não, imprestável, o que gera a luta constante pelo sucesso". A orientação mercantil é a predominante na sociedade moderna e é o que gera a opção pelo ter ao invés do ser (Fromm, 1987; Fromm, 1992). Estas orientações de caráter podem se mesclar num indivíduo concreto e o tipo de caráter predominante nos indivíduos é um produto social.
A orientação de caráter produtivo aponta para um ser humano que se relaciona de forma produtiva com o mundo e com as pessoas, desenvolvendo o amor e o pensamento produtivos, que se manifestam na ética humanista. O amor produtivo não é possessivo e nem se reduz ao amor sexual. O amor produtivo tem sua base na produtividade e é o amor autêntico, que tem como exemplo máximo o amor materno e é marcado pelo desvelo, responsabilidade, respeito e conhecimento (Fromm, 1978). É por isso que o amor produtivo é desintegrado na sociedade capitalista contemporânea (Fromm, 1990).
Amor materno: exemplo máximo do amor produtivo.
O pensamento produtivo não é aquele que espera tudo do exterior – solicitando e esperando recebê-lo dos outros, como na orientação receptiva, ou tomando e plagiando como no caso da orientação exploradora. Também não é uma fortaleza que se isola e se poupa como na orientação acumulativa ou, ainda, um mero valor de troca utilizado para conquistar o sucesso e por isso segue as modas, tal como na orientação mercantil. O pensamento produtivo é aquele que possui interesse e reage ao seu "objeto", e, ao mesmo tempo, o respeita, buscando compreendê-lo, a
vê-lo como realmente é, tendo também uma visão total e não fragmentária dele. Fromm opõe consciência humanista e consciência autoritária:
"A consciência humanista é a expressão do interesse próprio e integridade, ao passo que a consciência autoritária preocupa-se com a obediência, abnegação e dever do homem ou com seu "ajustamento social". A meta da consciência humanista são a produtividade e, portanto, a felicidade, posto que esta é o concomitante necessário da vida produtiva. Prejudicar a si mesmo tornando-se um instrumento de outros, não importando quão dignos esses aparentem ser, ser "desprendido", infeliz, resignado, desencorajado, opõe-se aos reclamos da consciência da pessoa; qualquer violação da integridade e o funcionamento adequado de nossa personalidade – tanto no que se refere ao pensamento quanto a ação e mesmo a assuntos como preferência de alimentos ou comportamento sexual – são uma intervenção contra a consciência da pessoa" (Fromm, 1978, p. 140).
Estas são as bases da ética humanista e da psicanálise de Erich Fromm. Sua discussão sobre orientação de caráter será fundamental para sua "psicologia do nazismo", na qual Fromm busca explicar a emergência da barbárie nazista. Ele explica tal emergência a partir das condições sociais da Alemanha e do processo de crise que atingiu sobremaneira a classe média, que perdeu status com a ascensão da classe operária e a tentativa de revolução proletária, e teve prejuízos financeiros com a crise alemã e ainda teve a família – "o último baluarte da segurança da classe média" – sido solapada com a redução da autoridade do pai e o declínio da moralidade desta classe. Estes acontecimentos proporcionaram um grande "montante de frustração social", que acabou se convertendo em uma fonte importante do nazismo. O sentimento de impotência, angústia e isolamento e a destrutividade que o acompanha ao lado do ressentimento dos camponeses diante de seus credores urbanos constituem a base humana que não foi a causa do nazismo, mas sem a qual ele não poderia ter sido criado e se tornado vitorioso. Fromm retoma um dos princípios metodológicos fundamentais do marxismo ao reivindicar a necessidade de uma análise da totalidade das relações sociais, incluindo não apenas as condições econômicas e políticas, mas também as psicológicas. Fromm lembra que o papel das classes proprietárias (junkers semifalidos e a classe capitalista) é fundamental e sem o apoio destas o nazismo jamais teria sido vitorioso, mas o seu foco é as condições psicológicas e não as condições econômicas e políticas, tal como o financiamento do nazismo pelas grandes empresas capitalistas.
Holocausto: exemplo da destrutividade humana.
"Vimos, pois, que certas mudanças socioeconômicas, sobretudo a decadência da classe média e o poder crescente do capital monopolista, tiveram profundo efeito psicológico. Estes efeitos foram acentuados ou sistematizados por uma ideologia política – tal como o haviam sido por ideologias religiosas no século XVI, – e as forças psíquicas assim despertadas passaram a agir em sentido oposto aos dos interesses
econômicos
originais
daquela
classe.
O
nazismo
ressuscitou
psicologicamente a classe média inferior, ao mesmo tempo que participava da demolição de sua antiga posição socioeconômica. Ele mobilizou suas energias emocionais para convertê-las em uma força importante na luta pelas metas econômicas e políticas do imperialismo alemão" (Fromm, 1981, p. 176).
Fromm acrescenta outros elementos, tal como a estrutura da personalidade de Hitler e o sadismo e masoquismo que formam os impulsos básicos a serviço do nazismo, sendo que o sadismo foi amplamente utilizado pelos líderes, mas também por amplas camadas da população contra judeus e comunistas, entre outros grupos sociais perseguidos. O masoquismo é o seu complemento e atinge as massas, fundamentalmente, convertidas ao caso de defender um "governo forte". A orientação de caráter autoritária é predominante e aliada com a orientação de caráter receptiva, que se complementam.
A psicanálise humanista de Fromm vai além da tipologia do caráter e suas influências na sociedade e no processo histórico, pois ele irá questionar as próprias bases da sociedade moderna, anti-humanista e mercantil. Fromm faz em uma de suas principais obras, Psicanálise da Sociedade Contemporânea, uma extensa análise do homem no capitalismo, discutindo novamente a questão do caráter social e os processos sociais gerados pelo capitalismo que terá grande influencia sobre ele, tal como a quantificação/abstratificação, a alienação, a burocratização e mercantilização.
Capitalismo igual alienação, burocratização e mercantilização.
Fromm coloca estes processos sociais mostrando que até mesmo as organizações surgidas das lutas dos trabalhadores, como partidos e sindicatos, se tornam organizações burocráticas. Sua crítica da democracia moderna surge neste contexto:
"Na realidade, o funcionamento da máquina política em um país democrático não difere essencialmente do procedimento que se segue no mercado de mercadorias. Os partidos políticos não são muito diferentes das grandes empresas comerciais, e os políticos profissionais se esforçam por vender seus artigos ao público. Seu método se assemelha cada vez mais ao da publicidade a alta pressão" (Fromm, 1976, p. 185).
É neste contexto que Fromm irá abordar os efeitos destas relações sociais sobre a saúde mental. Assim, ele abre espaço para questionar a idéia de normalidade. A normalidade é uma idéia que o indivíduo deve se submeter ao que é considerado norma em determinada cultura. A questão que Fromm coloca é que a qualificação de anormalidade está na dependência de uma concepção de normalidade que é a adaptação do indivíduo a determinadas relações sociais, mas que é preciso saber se tais relações são saudáveis. Se tais relações sociais não são saudáveis, então a adaptação a elas não significa que o indivíduo seja saudável mentalmente, mas, ao contrário, significa que ele compartilha com a maioria uma mesma "doença psíquica". Nesse tipo de sociedade, o indivíduo considerado socialmente anormal é mais saudável mentalmente ("normal", num sentido mais amplo) do que outros. Segundo Fromm:
"O que é muito enganoso no tocante ao estado mental dos indivíduos de uma sociedade é a "validação consensual" de seus conceitos. Supõe-se, ingenuamente, que o fato de a maioria das criaturas compartilhar certas idéias e sentimentos prove a validez dessas idéias e sentimentos. Nada está mais afastado da verdade. A validação consensual não tem, como tal, qualquer impacto sobre a razão ou saúde
mental. Assim como existe uma "folie à deux", existe uma "folie à millions". O fato de milhões de criaturas compartilharem os mesmos vícios não os transforma em virtudes, o fato de elas praticarem os mesmos erros não os transforma em verdades e o fato de milhões de criaturas compartilharem a mesma forma de patologia mental não torna essas criaturas mentalmente sadias" (Fromm, 1976, p. 28).
Após sua crítica da sociedade contemporânea, Fromm apresenta sua proposta de um socialismo humanista, no qual o ser humano poderia realizar sua natureza humana. Após criticar o "socialismo real" – que ele denominou "capitalismo de Estado" em sua obra Conceito Marxista do Homem e posteriormente como socialismo em Psicanálise da Sociedade Contemporânea – ele propõe o "socialismo comunitário humanista", como modelo alternativo de socialismo, bem distinto do modelo soviético, cujo foco seria as relações sociais e não a questão da propriedade e no qual o trabalho empregaria o capital e não o contrário (Fromm, 1976; 1984b).
Este breve resumo das idéias básicas de Fromm é muito incompleto e incipiente. Seria necessário acrescentar suas incursões sobre "linguagem simbólica", os sonhos (Fromm, 1983), sobre o inconsciente social (Fromm, 1984a; Viana, 2002), a tecnologia (Fromm, 1984c), a religião (Fromm, 1966 e outras obras), a destrutividade (Fromm, 1975), entre várias outras. Também não é possível expor os debates e críticas que foram endereçadas a Fromm, especialmente a de Marcuse, LucienSève, Dobrenkov. Porém, uma avaliação geral da obra de Fromm é fundamental, mesmo que breve e incompleta.
Um dos principais méritos de Fromm foi a sua crítica da sociedade capitalista e ao processo de desumanização que ela provoca. A sua percepção da burocratização e da mercantilização, que já havia sido feita por outros antes dele, mas que ele forneceu uma análise psicanalítica, é outro mérito de sua obra. A valoração das idéias e do psiquismo para explicar os fenômenos sociais, tal como o caso do nazismo, também merece ser ressaltado, entre outros.
Porém, sua obra também tem pontos problemáticos, pois ao superar o biologismo de Freud, Fromm acaba caindo no culturalismo e retira do conceito de inconsciente (e
do termo derivado inconsciente social) a base biológica e acaba ofuscando a radicalidade do conceito. Ao incluir o psiquismo na análise das relações sociais e dar um passo no sentido de uma percepção mais ampla da realidade, concebida como totalidade, acaba se limitando ao excluir da análise os aspectos vitais, "biológicos", e sua concepção culturalista se torna problemática devido a isto. Outro limite se encontra em seu humanismo abstrato, pois parte de uma concepção correta de natureza humana, mas que não chega a perceber a questão fundamental das classes sociais e das lutas de classes e por isso sua ética humanista também se revela limitada, tal como sua proposta de mudança social. Fromm atribui ao indivíduo uma tarefa hercúlea e muitas vezes cai ingenuamente em receitas de solução individual numa sociedade repressiva. Isso lhe valerá a crítica correta de Marcuse, que o compara com as receitas do "poder do pensamento positivo" (Marcuse, 1986) e certamente este é um dos motivos da popularidade de Fromm e de seu sucesso no mercado editorial. No entanto, se neste aspecto a crítica de Marcuse foi correta, nos demais é permeada por equívocos, inclusive em torno da palavra produtividade, que ele interpreta no sentido oferecido pela ciência econômica e não no sentido amplo oferecido por Fromm (Viana, 2008).
Parte dos equívocos de Fromm é de origem metodológica, já que lhe falta um maior domínio do método dialético e do materialismo histórico. Sua interpretação de Marx também se revela problemática em alguns aspectos, tal como no que se refere ao conceito de alienação e concepção de socialismo, por se basear apenas nas obras mais conhecidas de Marx. A sua defesa da totalidade é limitada devido ao problema que ele mesmo identificou várias vezes: a especialização. Por ser psicanalista, embora erudito e que adentrava sobre questões culturais, sociais, políticas e econômicas, o fazia de forma bastante restrita nos dois últimos domínios. Sua análise política e econômica era marcada por equívocos devido a pouca profundidade que ela manifestava.
Freud: abordagem biologista.
As soluções apresentadas por Fromm, tal como o seu "socialismo comunitário", que não conseguiu ir além das relações de produção capitalistas, apenas mudando a
relação entre trabalho e capital ao invés de aboli-la, mostra novamente sua limitação metodológica e na compreensão das relações sociais e de produção. Sua concepção de socialismo se revela um capitalismo reformado, democrático e redistributivo, muito distante da proposta de Marx do "autogoverno dos produtores", da autogestão social.
Porém, não é possível desconsiderar as contribuições de Fromm e que ele, mesmo com seus equívocos, é uma referência fundamental para analisar a sociedade contemporânea e um dos grandes intelectuais do século 20. Ele também foi um dos principais responsáveis pela renovação da psicanálise, promovendo a percepção da necessidade de incluir as relações sociais e a cultura na busca de compreensão dos fenômenos psíquicos, o que era uma necessidade teórica e, apesar de seus exageros neste sentido, foi um antídoto para os exageros que iam no sentido contrário e abriu novas perspectivas para a psicanálise.
Referências
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VIANA, Nildo. Universo Psíquico e Reprodução do Capital. Ensaios FreudoMarxistas. São Paulo - Escuta, 2008.
Frases de Eric Fromm
FRASES DE ERIC FROMM A maior parte das pessoas vê no problema do amor, em primeiro lugar, o problema de ser amado, e não o problema da própria capacidade de amar. A ânsia de poder não é originada da força, mas da fraqueza. A principal missão do homem, na vida, é dar luz a si mesmo e tornar-se aquilo que ele é potencialmente.
A principal tarefa na vida de um homem é a de dar nascimento a si próprio. A busca da felicidade é uma das principais fontes de infelicidade. Somos uma sociedade de pessoas com notória infelicidade: solidão, ansiedade, depressão, destruição, dependência; pessoas que ficam felizes quando matam o tempo que foi tão difícil conquistar. O amor imaturo diz: eu te amo porque preciso de ti. O amor maturo diz: eu preciso de ti porque te amo "Você tem que parar para mudar de direção." O amor é uma atividade, não um afeto passivo; é um ato de firmeza, não de fraqueza... é propriamente dar, e não receber. O perigo do passado era que os homens se tornassem escravos. O perigo do futuro é que os homens se tornem autómatos. As nossas maiores dissimulações são desenvolvidas não para esconder o que há de ruim e feio em nós, mas o nosso vazio. A coisa mais difícil de esconder é aquilo que não existe. A única forma de prever o futuro é ter poder para formar o futuro. Dizem que o talento cria suas próprias oportunidades. Mas às vezes parece que a vontade intensa cria não apenas suas próprias oportunidades, mas seus próprios talentos. Estamos mais preparados para tentar o não tentado quando o que fazemos é inconsequente. Daí o fato notável de que muitas invenções tenham começado como brinquedos. Num tempo de mudanças drásticas, são os que aprendem que irão possuir o futuro. Os cultos geralmente encontram-se equipados para viver num mundo que já não existe. Prosperidade é um modo de viver e pensar, e não apenas dinheiro ou coisas. Pobreza é um modo de viver e pensar, e não somente a falta de dinheiro ou coisas. Você nunca consegue o suficiente daquilo que você não precisa para torná-lo feliz. Os elementos mais dotados da espécie humana encontram-se no auge da sua criatividade quando as suas vontades não são satisfeitas.
Para que serve um advogado honesto quando o que você precisa é de um advogado desonesto? Saber significa ver a realidade em sua nudez. REFERÊNCIA DO VÍDEO-CLIP http://www.youtube.com/watch?v=tJl8zo__6jM