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Revista Sustentabilidade novas tecnologias para um mundo melhor
ano IV • edição impressa no 2 junho/julho 2011 • R$ 22,50
EDIÇÃO ESPECIAL: INOVAÇÃO/RECICLAGEM
O futuro da embalagem Resíduos sólidos: o lixo que não é mais lixo Dia Mundial do Meio Ambiente e a importância das florestas
dia mundial da água
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dia mundial da água
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editorial }
Perdoem-me os pessimistas de plantão, que olham para o Brasil como um país que muito fala e pouco faz. A eles é dedicada esta edição. Apesar de ser uma visão cautelosa, o pessimismo pode inibir a compreensão da realidade, pois ignora processos. O importante é questionar, econômica e socialmente, o alinhamento das agendas e desses processos com o desenvolvimento sustentável, por serem equânimes, justos e respeitosos com o meio ambiente. Dito isto, precisamos entender que nas últimas três décadas o Brasil se transformou e conseguiu tomar a direção certa, pautado pelo consenso: não há um só agente da sociedade brasileira que discorde da necessidade em melhorar a competitividade do setor produtivo, por meio da inovação e da resolução do grande problema que é a geração de resíduos. A proposta desta edição da Revista Sustentabilidade é fazer uma análise mais cuidadosa dos setores da ciência, tecnologia e inovação e de resíduos sólidos e saneamento ambiental. Em inovação, o Brasil ainda patina. Apesar de nossa reconhecida criatividade, não registramos um número de patentes condizentes com uma população de 190 milhões, com as dezenas de milhões de empresas ativas, e nem com a diversidade cultural e biológica de nosso país. Nossa comunidade togada de 12 mil doutores e 41 mil mestrados nos coloca entre os 15 países que mais geram conhecimento de qualidade, mas na corrida por patentes, estamos na 68º posição: em 2010 registramos apenas 422 patentes, uma fração dos 45 mil registrados pelos Estados Unidos e dos 12 mil registrados pela China. Mesmo assim, a inovação está em todos os lugares. Na década de 90, quando se alastrou o conceito de restaurante por quilo no Brasil, era uma curiosidade para os estrangeiros. Lembro também como um vendedor ambulante de milho me explicou um dia, que sua idéia de cortar os grãos do sabugo cozido e vende-los num pratinho surgiu a partir de um concorrente que fazia freguesia na Praça da Sé paulistana. Nos dois casos a inovação alastrou-se como uma febre. Hoje, temos modos diferentes para se comer milho na rua, ou para o almoço em restaurantes. Também recordo de uma entrevista onde um pesquisador universitário, responsável pelo desenvolvimento de poliéster a partir do óleo de mamona, disse que não queria patentear sua ideia. “Deixo para uma outra equipe fazer”, disse-me à época. Nestes três casos, podemos ver que a criatividade e a busca de melhoria existem, mas vemos também que falta sagacidade para a apropriação formal da ideia. Entretanto, como os leitores poderão ler aqui, estamos num ponto de inflexão na política de pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Temos um arcabouço quase pronto, ao mesmo tempo em que criamos uma nova cultura de aproximação entre a academia e as empresas. A Inovação também pautará a reorganização do setor de resíduos sólidos. Demoramos duas décadas, mas aprovamos a Política Nacional de Resíduos Sólidos, uma lei moderna e em certos pontos audaciosa, pelas propostas que aborda. Teremos que incorporar uma população de um milhão de catadores a uma indústria complexa e crescente que gira mais de R$8 bilhões anuais. Seis setores pioneiros implementarão sistemas de logística reversa para fechar o ciclo dos produtos, incorporando o máximo possível dos resíduos na produção. Além disso, o setor de coleta de resíduos urbanos, hoje dominado por grandes empreiteiras, cujo principal negócio é construir aterros sanitários, não poderá mais se resumir a catar sacos de lixo na rua e comprar caminhões. Também deverá incorporar a redução do que é destinado aos aterros e a necessidade do entendimento do ciclo de vida dos materiais e dos produtos, o conhecimento dos sistemas de fermentação de resíduos orgânicos, e a pré-preparação de materiais destinados a voltar para a indústria e ao mercado de energia. As mais de 5.500 prefeituras também terão que, até 2014, eliminar os lixões. Tudo isso requererá inovação para não seguir o padrão perdulário do primeiro mundo. Temos aí uma grande oportunidade, já que um brasileiro produz 52% menos resíduos que um americano. O Dia Mundial do Meio Ambiente este ano foca no Mecanismo de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), que fomenta a manutenção de florestas em países em desenvolvimento. A ideia é simples – pagar para não derrubar as florestas –, mas o sistema é complexo. Questões como autonomia nacional, origem dos recursos, precificação dos bens de uma floresta – natural ou plantada –, seu gerenciamento por empresas privadas, além do papel das populações tradicionais, atravancam negociações e dificultam a aprovação de projetos. De novo, a Inovação vai fazer parte das soluções. É preciso resignificar o conceito de floresta para podermos oferecer soluções viáveis. Em resumo, sustentabilidade é inovação, e é isso que discutimos nesta edição. Boa leitura, Alexandre Spatuzza Editor
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{ sumário Inovação
Reciclagem
6 Capa Brasil na trilha da inovação
32 Capa O lixo que não é mais lixo
12 Entrevista Pierre Moreau
38 Embalagem O futuro imperfeito
5
do pretérito
16 Case Construtora inova
42 Entrevista Marina Grossi
para ser sustentável
17 Case Sustentabilidade é um processo 20 Artigo Finanças sustentáveis 22 Entrevista Glauco Arbix 25 Artigo Sustentabilidade nas empresas 26 Ponto de vista O dia a dia da pesquisa
44 Biomimetismo Natureza inspira inovação
49 Artigo Arnaldo Jardim 53 Dia Mundial do Meio Ambiente O valor das florestas
58 Visão de futuro
Aliança estratégica e comercialização InvestVida Brasil
Projeto gráfico e direção de arte Lu Cury
Diretor Executivo Ailton Oliveira
Assistência de arte e pré-impressão Ione Franco
Projetos e Marketing Camila Santana
A edição especial Inovação/Reciclagem é uma publicação do portal Revista Sustentabilidade Projeto editorial e reportagem Vespa Serviços de Comunicação Diretor de conteúdo e editor executivo Alexandre Spatuzza (MtB 42261/SP) Colaboradores Giuliano Agmont, Kalinka Tavares Sílvia Dias e Vinícius Gorgulho
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Revisão Ana Cristina Pinho e Heloize Campos
Assistente comercial Ilma Ramos
Impressão Gráfica Referência
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6 capa } inovação
Inovação: perspectivas promissoras Partindo de um consenso entre os setores público, produtivo e acadêmico sobre o sucesso do sistema nacional de inovação na última década, especialistas sugerem mudanças no arcabouço legal para acelar o processo inovador Por Alexandre Spatuzza
pesar do contingenciamento pesado que o governo voltou a fazer no setor de ciência e tecnologia, 2011 promete ser um ano de aprofundamento das políticas brasileiras de inovação que, há uma década começaram a mudar o panorama brasileiro. Tanto o setor produtivo quanto a academia estão propondo mudanças para melhorar o cenário atual e ambos os seguimentos dizem que o governo está ouvindo e fazendo as coisas certas. Tanto o setor produtivo, liderado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), quanto o setor acadêmico estão preparando documentos e estudos para melhorar o arcabouço legal que rege as políticas de inovação nacionais. O financiamento à pesquisa, bem como o desenvolvimento e fomento à inovação no Brasil hoje baseiam-se, entre outras coisas, na Lei da Inovação, na Lei do Bem e em 16 fundos setoriais criados em 1999 e que já injetaram mais R$7 bilhões na economia. Mesmo com estes avanços e o lançamento do PAC da Ciência – que representou uma injeção de R$41 bilhões no setor, em 2009 –, o investimento em pesquisa e desenvolvimento no Brasil, em 2010, limitou-se a apenas 1,2% do PIB nacional. Desse montante, 60% veio de investimento público, proveniente principalmente das universidades. Os 40% restantes vieram do setor privado, o que afasta o Brasil dos países líderes em tecnologia onde é o setor empresarial que investe mais pesadamente.
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Além disso, o investimento em relação ao PIB ficou aquém da meta de de 1,5% determinada pelo governo para 2010. O resultado: o número de pedidos brasileiros de registros de patentes na seara mundial é de menos de 1% de todos as patentes depositadas. E esse índice registra queda pois foram 493 solicitações em 2009 e 442 em 2010. “O Brasil representa 0,2% a 0,3% das patentes estrangeiras depositadas nos EUA. Nosso país deveria estar com cerca de 3% de participação no depósito de patentes, equivalente à sua participação no PIB mundial e a sua produção de conhecimento,” analisa Rochel Montero Lago professor de química na UFMG e pesquisador de inovação e empreendedorismo. Para ele, trata-se de um fenômeno cultural. Os pesquisadores nas universidades têm a cultura do conhecimento aberto e do processo científico no qual seu trabalho é reconhecido pelos pares com a publicação de artigos, que ganha preferência sobre a defesa da propriedade intelectual e do empreendedorismo. “Eles veem um falso dilema de que o conhecimento tem que ser público,” conclui. Para o pesquisador do Instituto de Pesquisas Econômica Avançadas (IPEA), Luiz Ricardo Cavalcante, o grande problema das políticas de pesquisa, desenvolvimento e inovação no Brasil é a falta de prioridade. No Pintec, seu trabalho de análise do le–vantamento do setor pelo IBGE, falta foco e direcionamento
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na implementação das políticas. “É sintomático, por exemplo, que as prioridades estabelecidas pela Turquia, por exemplo, não pareçam essencialmente distintas das da Alemanha. Ocorre que no Brasil – onde os recursos alocados em atividades de CT&I são proporcionalmente mais escassos que nos países da OCDE – a fixação de prioridades é um requisito sem o qual as políticas têm escassas possibilidades de contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento econômico e social”, concluiu Cavalcante. Além disso, mesmo com as mudanças institucionais – e o esforço que vem sendo feito com editais, subvenções e financiamento para estruturar melhor os departamentos de P&D nas empresas –, o sistema de contratação dos recursos governamentais beneficiam mais as universidades. Daí o peso que os investimentos públicos em P&D têm em comparação aos investimentos das empresas que, segundo o estudo de Cavalcante, ficou bem aquém da meta de 0,95% do PIB.
Predominância das grandes empresas Outro estudo do panorama de CT&I do últimos anos, elaborado pelo IPEA e pela Universidade Federal de Minas Gerais, mostra que as empresas de grande porte e multinacionais têm conseguido uma fatia importante dos recursos do sistema de inovação apesar do foco em pequenas empresas que o governo tem buscado. Segundo dados apresentados no estudo, 47% dos recursos dos fundos setoriais de ciência e tecnologia entre 2000 e 2008 foi destinado a empresas com 500 funcionários ou mais.
Paralelamente, 21% foi para empresas com até 30 funcionários. Este panorama se repete com outros programas de incentivo. Mais significativamente na Lei do Bem que, desde sua promulgação, beneficiou um pouco mais de 1 mil empresas que fizeram investimentos totais de cerca de R$ 20 bilhões, a maior parte por grandes empresas, as menores respondendo por uma pequena propoção destes investimentos. “A lei do bem beneficiou muito as grandes empreses e empresas de base tecnológica,” criticou Paulo Mol, coordenador do Movimento Empresarial pela Inovação (MEI) promovido pelo CNI. Mol diz crer que o caminho é ampliar e mudar a cultura da inovação que ainda é muito ligada a ideia de cientista maluco trancado no laboratório. “Inovação não é só departamento de P&D e não é só Professor Pardal. Inovação hoje é ser absolutamente aberto e buscar incluir os funcionários e clientes no processo para fazer pequenos avanços em processos e produtos que dão ganho de competitividade”, lembrou Mol. O MEI tem uma agenda de 10 pontos sendo discutidos em reuniões regulares com o governo. Entre eles está a facilitação de enquadramento das empresas menores para a obtenção de benefícios. Outro tópico é o alongamento dos critérios de contabilidade para poder descontar os investimentos não só quando a empresa tem lucro e sim por mais de um exercício fiscal. Uma prioridade mais urgente da agenda é aumentar a frequência de editais para a contratação de pesquisadores pelas empresas. Além disso, o MEI propõem um processo mais rápido para avaliação de
Pedidos de registros de patentes por país por ano 2006
2007
2008
2009
Brasil
333
398
472
493
442
China
3.942
5.455
6.120
7.900
12.337
EUA
51.280
54.043
51.637
45.618
44.855
Japão
27.025
27.743
28.760
29.802
32.156
5.945
7.064
7.899
8.035
9.686
Argentina
20
32
24
10
15
Portugal
68
93
98
163
117
Coréia do Sul
2010 (estimativa)
Fonte: WIPO - Organização Mundial de Propriedade Intelectual (2011)
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patentes – que hoje leva em média três anos –, um risco que, segundo ele, as empresas brasileiras não conseguem assumir. De acordo com Mol, isso seria possível se o INPI emitisse rapidamente um documento atestando a “passibilidade de patenteamento” de um novo produto ou ideia. Outro tema do debate entre MEI e o governo é o baixo nível de educação e do trabalhador brasileiro que atrapalha a inovação nas empresas: falta gente capaz de dialogar com a academia e entender de forma mais abstrata os conceitos de inovação e ganho de competitividade. Além disse, exemplifica Mol, o Brasil forma pouco enge-
nheiros, cerca de 10% do total de formandos anuais, abaixo dos 40% na China, 30% na Alemanha e 20% dos países da OCDE. “A implementação de uma cultura de inovação é um processo de longo przo de 15 a 20 anos. A Coreia do Sul, começou nos anos 70 e 80”, explicou Mol.
Mudanças no marco legal Mudanças no marco legal do sistema de inovação brasileiro também foram alvo de discussão no fórum conjunto do Conselho das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap) e do Conselho de
INOVAÇÃO SUSTENTÁVEL CRESCE, MAS AINDA FALTA FOCO
Em uma tese de mestrado concluída em 2011, Rafael Kellermann Barbosa identificou que, entre 1989 e 2007, das 501 patentes depositadas pela Agência de Inovação (Inova) da Unicamp, 127 foram classificadas como ecopatentes, ou seja tecnologias ou processos que reduzem o impacto ambiental das atividades econômicas. Para Barbosa, este é um sinal claro de que os limites ecológicos estão sendo considerados pelos pesquisadores dentro da universidades. “Foi um resultado surpreendente, mas não há uma orientação de política do governo e sim uma motivação que vem em parte do foco das pesquisas dos pesquisadores e de uma pressão do setor empresarial por estas tecnologias,” explicou o Bastiaan Reydon, professor do Instituto de Economia da Unicamp que orientou o estudo. Na tese, as ecotecnologias foram classificadas em cinco categorias: produtos mais limpos (17% do total de patentes), tecnologias de controle e redução de poluição (39%), tecnologia mais limpa (16%), tecnologia de reciclagem 18% e energia limpa e renovável (10%). O mercado para tecnologias limpas no Brasil tem crescido. Segundo estudo divulgado pela Câmara de Comércio Brasil Alemanha, em 2009, este mercado era
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de US$1,8 trilhões em 2006 e deverá atingir US$20 trilhões em 2020. Segundo Reydon, estima-se que o segmento de energias renováveis já atingiu os R$6,7 bilhões e os setores de resíduos, água e esgoto e poluição atmosférica, US$5,2 bilhões. “Hoje os conceitos de inovação, sustentabilidade e empreendedorismo estão entrelaçados,” concluiu Paulo Tadeu, professor do Instituto de Química da Universidade Federal de Viçosa e consultor para a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado de Minas Gerais. “A questão ambiental está em evidência. Por exemplo, os deslizes de terra no Rio de Janeiro no início do ano e agora a discussão do Código Florestal”. No entanto, a inovação para a sustentabilidade ainda não é norma, pois falta sistematização e foco das políticas públicas. “As empresas que inovam nesta área são estimuladas pelo medo, pois, ao invés de incentivo, temos a visão de 'comando e controle', ou seja, limites mínimos de desempenho ambiental que têm que ser atendidos”, lembra Reydon. Incentivar certos tipos de tecnologias deveria ser uma decisão política e, segundo estudiosos dos sistemas de inovação e empreendedorismo, é essencial. Em sua
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Secretários de Ciência e Tecnologia (Consecti) que aconteceu em Belo Horizonte no final de maio. Para Mário Neto Borges, presidente da Confap e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), é preciso reforçar a aproximação entre o setor produtivo e as universidades na área de pesquisa. Ele frisa que, mais do que isso, é preciso expandir para outras regiões o modelo que vem dando certo em estados líderes na área com São Paulo e Minas Gerais. “O primeiro desafio é a consolidação do Sistema Nacional de CT&I, aperfeiçoando e fortalecendo as relações entre as diversas
análise da Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (Pintec) do IBGE, com dados de 2008, o pesquisador do IPEA Luiz Ricardo Cavalcante, identificou as áreas estratégias para inovação de 24 países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Todos os países elencam o meio ambiente, mudanças climáticas e oceanos com um setor prioritário – dos 12 identificadas. Dos 24 países pesquisados, 21 elencam recursos naturais e energia como foco (veja quadro na página seguinte). Inovar para a sustentabilidade, entretanto, exige uma mudança mais profunda de cultura dentro das empresas e do governo, na opinião de Paulo Vobianibiskaia, consultor da Hapi Consultoria e membro da Associação de Profissionais de Sustentabilidade. “Inovar para a sustentabilidade deve ser encarado de um forma sistêmica, por que sustentabilidade é sistêmica,” lembrou. Para ele, é necessário haver mudanças de comportamento individual e organizacional, o que, apesar da crescente discussão sobre sustentabilidade, ainda é incipiente. “Hoje vivemos um grau de mobilização baixíssimo,” lembra. “Para mim é sintomático que se discute mais os efeitos da Copa do Mundo do que a cúpula Rio +20, o evento do decênio na área, que acontecerá no Rio de Janeiro em 2012”.
FAPs e entre estas e as agências federais de ciência, tecnologia e inovação. Segundo, é preciso estabelecer uma proposta de política que considere este trinômio CT&I como uma política de estado. Dessa forma, e como terceiro aspecto, assegurar mais recursos e um arcabouço legal e de controle moderno e adequado”, disse. Para ele, o papel do governo é essencial. Ele vê o investimento em P&D no Brasil chegando a 2% do PIB em 10 anos se for garantida a aplicação de recursos públicos e programas de subvenção. Isso reforça a importância do papel dos governos estaduais que, seguindo a Lei de Inovação, têm em funcionamento sistemas
No entanto, o Brasil tem registrados alguns avanços no incentivo à inovação para sustentabilidade. Luiz Henrique Brito, diretor científico da Fapesp, lembrou dos programas como o Biota, Bioen e de mudanças climáticas, focados respectivamente na biodiversidade, bioenergia e análise dos efeitos da mudanças climáticas e que resultaram em várias decretos e leis buscando melhorias do desempenho ambiental no estado. Da mesma forma, Mário Borges, presidente da Fapemig e do Conselho das Fundações de Apoio à Pesquisa (Confap), elencou os programas federais como o Sistema Nacional de Pesquisa em Biodiversidade (Sisbiota), que apoia projetos de pesquisa para preservar os biomas nacionais, e o Conhecimento e Conservação da Flora Brasileira (Reflora), que apoia jardins botânicos e planeja o repatriamento de plantas raras da nossa biodiversidade. Em Minas Gerais, a Fapemig lançou um edital de R$ 3 milhões visando monitorar, estudar e buscar adaptações frente às mudanças climáticas. Além disso, Borges destacou o Centro de Inovação em Bioenergia do Estado de Minas Gerais (Bioerg), rede de pólos de energias limpas e renováveis que foca em etanol, solar, biomassa, eólica e biodiesel.
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nos modelos da Fapemig e Fapesp destinando uma percentagem da receita do ICMS para financiar pesquisa básica e aplicada, cujas as necessidades variam de estado para estado de acordo com a vocação econômica e as condições educacionais regionais. Borges descreve o papel dos estados como complementar à
política nacional. As fundações atuam no eixo da pesquisa, na formação de pesquisadores, que é feita por meio da concessão de bolsas em todos os níveis de formação e na inovação, que vem sendo incentivada por meio de programas e editais que associam pesquisadores e empresas. Finalmente, as fundações precisam
Áreas prioritárias das estratégias de políticas de CT&I
Segurança nacional
Meio ambiente, mudança climática e oceanos
Recursos naturais e energia
Segurança alimentar
Saúde e ciências da vida
Desafios sociais (transporte, previdência, urbanização e habitação, por
Engenharia e indústrias avançadas
Novos materiais e tecnologias (inclui nanotecnologia)
exemplo)
Tecnologias de informação e comunicação
Crianças, educação e indústrias criativas
Influência regional, turismo e cultura
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África do Sul
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Alemanha
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Áustria
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Bélgica (Flandres)
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Bélgica (Valônia)
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Canadá
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Dinamarca
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Eslovênia
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Espanha
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Coreia do Sul
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EUA
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Finlândia
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Itália
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Noruega
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Nova Zelândia
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Reino Unido
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Rep. Tcheca
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França Holanda
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Hungria Israel
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Suécia
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Turquia
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Fonte: OCDE (2010, p. 89 apud IEDI, 2011). Obs.: Outras áreas de prioridades são espaço, na Bélgica, Coreia do Sul e África do Sul; mobilidade, na Alemanha e na Holanda; e indústrias de baixa tecnologia, em Israel.
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também divulgar suas ações, ou seja, levar para a sociedade em geral os resultados alcançados por esses trabalhos. “Em outras palavras, as fundações estaduais de amparo à pesquisa desempenham em cada estado um papel triplo equivalente ao da Capes, do CNPq e da Finep juntos,” concluiu Borges. Apesar de reconhecer os avanços em inovação da última década, o diretor científico da Fapesp, Luiz Henrique Brito, sugere que as políticas de inovação têm que focar mais na empresa do que na academia. Segundo ele, a conjuntura econômica é fator inibidor de investimentos privados em pesquisa e inovação. “O custo de capital alto, o câmbio valorizado e a falta de clareza nos marcos de propriedade intelectual conspiram para que o Brasil seja pouco ativo na área de inovação”, analisou. No entanto, a Fapesp tem buscado formas de estimular a inovação nas empresas. Um caminho encontrado foram os 14 convênios para financiar pesquisas aplicadas, iniciados em 2008, após um diagnóstico do setor. Em 2010, foram fechados convênios com 140 empresas, entres eles um de R$50 milhões com a Vale, o maior da história da Fapesp. Na área de pequenas empresas, a Fapesp também tem o programa Pipe que não apenas oferece subvenção econômica, mas também apoio técnico para a montagem adequada de projetos. Desde seu lançamento em 1997, o Pipe já apoiou 995 empresas. “Cada real aplicado nas empresas geraram outros 11 reais em faturamento e levantamento de outros recursos e aumentou o número de pessoas com mestrados e doutorados nos quadros da empresa”, disse Brito. Com o mesmo foco de fomentar a pesquisa em empresas, o governo federal tem implementado vários programas como o RHAE-Pesquisador na Empresa e o Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec). “A ciência avançou muito no Brasil. No entanto, a inovação tecnológica em nossas empresas ainda é tímida. Tal situação decorre da carência de cultura de inovação no ambiente empresarial, da historicamente insuficiente articulação entre política industrial e ciência e tecnologia e da falta de recursos humanos aptos a lidarem com um cenário onde inovação tem máxima centralidade”, disse Ronaldo Mota, secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério de Ciência e Tecnologia. Enquanto o RHAE, entre 2008 e 2009, concedeu bolsas a mais de 300 empresas, possibilitando a inserção de 507 mestres e doutores e 550 técnicos nas equipes de trabalho, o Sibratec
conta com 56 redes de núcleos de pesquisa e desenvolvimento, sendo 14 redes de centros de inovação, 20 de serviços tecnológicos e 22 de extensão organizadas nos estados.
Hélice tríplice No fundo, está sendo construído no Brasil um sistema de inovação conhecido com hélice tríplice, no qual o governo, a academia e o setor produtivo têm que se entrelaçar, no sentido de se conhecer e formar um sistema único, bastante calcado na inovação aberta, conceito pelo qual pesquisadores têm um trânsito facilitado na universidade e nas empresas. Cada vez mais, a universidade tem que transferir conhecimento para a sociedade. Essa é a opinião de Paulo Tadeu, pesquisador da Universidade de Viçosa e consultor da Secretaria de Ciência e Tecnologia de Minas Gerais. A lacuna entre o conhecimento acadêmico e a inovação é em parte responsável pelo que Tadeu identifica com um déficit tecnológico de US$20 bilhões. “São produtos tecnológicos que importamos ao invés de criarmos a tecnologia”, lembra. Nos primeiros dos quatro anos como diretor do centro tecnológico da universidade, Tadeu lançou uma chamada para e recémcriada incubadora, mas teve que fazer visitas pessoais a quase todos os mais de 200 laboratórios da universidade para identificar projetos passíveis de virar produtos ou empresas. “Fui recebido com muita desconfiança e no final identificamos 60 projetos que resultaram em apoio a 20 protótipos”, lembrou. Um destes projetos tornou-se a primeira investida pelo fundo de capital semente do BNDES Criatec, que hoje fatura mais de R$1 milhão. No final, os especialistas concordam que o Brasil tem avançado no campo da inovação, cuja a importância econômica e social é um consenso principalmente, como apontou Tadeu, para acompanhar o ritmo alucinante de lançamentos de novos produtos a cada ano. “Inovação é um risco, mas é mais arriscado não inovar”, disse lembrando a LG que, em apenas um ano, registrou 400 pedidos de patentes, quase que toda a solicitação brasileira. Mota diz acreditar que, até 2014, o Brasil tem condições de chegar a investir cerca de 1,8% do PIB em P&D, dividido igualmente entre setor privado e setor público. “O país começa a formar uma nova geração de empresários empreendedores que reconhecem na inovação a devida centralidade em termos de competitividade e desenvolvimento econômico e social sustentável,” concluiu. k
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12 entrevista } inovação
Está na hora de compartilhar o conhecimento para inventar novos produtos Pierre Moreau, fundador da consultoria paulistana em inovação Ideabank, aprova modelo de aproximação de empresas com universidades, mas pede pressa.
sustentabilidade desponta como um fator competitivo para o Brasil na corrida tecnológica, principalmente por causa de sua biodiversidade e a capacidade intelectual de seus pesquisadores. Mas para isso e, principalmente, recuperar o tempo perdido na área de inovação, as empresas e universidades precisam parar de segurar o conhecimento apenas para si e começar transformá-lo em bens e produtos que possam ser aproveitados pela sociedade. Pierre Moreau, advogado formado pela PUC-Rio, hoje consultor de inovação da Ideabank, acredita que ainda temos um desafio forte e sugere um flexibilização da legislação que gere os ICTs (Institutos de Ciência e Tecnologia) para permitir que um maior número de parcerias e empresas possam surgir. Moreau acredita que estamos melhorando, mas ainda estamos longe de uma Coréia que, de uma posição igual ao Brasil, hoje encontra-se entre os líderes da inovação tecnológica. Ela saiu do impasse com um visão a longo prazo e pesados investimentos em ciência e tecnologia. “Fato marcante pode ser observado no investimento em C&T nunca ter sido abaixo de 2,5% do PIB, sendo que no Brasil esse investimento jamais passou de 0,9%,” explica o consultor. “O modelo de industrialização brasileiro foi baseado na aquisição de tecnologias estrangeiras, enquanto a Coréia se baseou no desenvolvimento de tecnologias nacionais via cooperação com os países em melhor posicionamento tecnológico”. Leia a seguir a íntegra da entrevista.
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Revista Sustentabilidade: Como o senhor avalia a evolução das políticas de ciência e tecnologia nacional e estadual, tendo em vista as recentes aprovações de leis inovação que visam fomentar este setor nos últimos anos? Pierre Moreau: As discussões sobre ciência e tecnologia nos âmbitos nacional, estadual e municipal tem se intensificado nos últimos anos. A Lei de Inovação sancionada em dezembro de 2004, que foi regulamentada em outubro de 2005 teve um impacto muito positivo no Brasil. Tal fato pode ser observado pelo crescente aumento de propostas de projetos ao edital de Subvenção Econômica à Inovação realizada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e também pelo número de empresas que foram beneficiadas. Acredito que a Lei de Inovação foi um passo muito importante para o despertar brasileiro, tanto para o setor privado, universidades e governo. Hoje o tema inovação está na agenda de todos e é tema chave na política industrial. O país atravessa um momento favorável para o desenvolvimento das empresas nacionais, visto que o cenário econômico tornou-se atrativo ao capital internacional. A chave para firmar o posicionamento do Brasil como um país de relevância industrial, comercial e econômica está no fortalecimento da indústria nacional que recebeu mais ferramentas como a Lei de Inovação Federal e as estaduais e incentivos municipais, que visam o desenvolvimento tecnológico. Hoje, há discussões para aumento
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da atuação de órgãos governamentais como a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) com foco na inovação oriundas das parcerias de empresas com centros de pesquisas. Essa capitalização da FINEP é um indicativo de que o governo tem um olhar pró-ativo ao cenário atual, com intuito de promover o desenvolvimento cultural de inovação. A parceria públicoprivado é um modelo que já mostrou ser bem sucedido em diversos países como Estados Unidos, Japão e Inglaterra, dentre outros. Já demos um passo nessa direção porém, agora é necessário um alinhamento das partes, pois cada um dos players (universidade, empresas e governo) possui uma linguagem e timing de trabalho distintos. O grande desafio é uni-los com um objetivo comum. Revista Sustentabilidade: Tendo em vista a política nacional de ciência e tecnologia, qual é o papel e vocação dos estados para melhor transformar a geração do conhecimento em produtos e inovação? Pierre Moreau: Existem estados no Brasil que têm uma infra-estrutura portuária, aérea e ferroviária que facilita o escoamento de sua produção, seja ela agrícola ou industrial. Logo, estes estados têm uma possibilidade maior na exportação de seus produtos. Basta olhar o mapa do Brasil e ver com relação à infra-estrutura já implantada que é mais fácil no momento exportar ou importar por estes Estados. É provável que a logística faça com que cada vez mais estes estados tenham uma vocação mais exportadora. Por outro lado, estados mais interiorizados tendem a gerar mais produtos para as regiões onde estão instalados, seja Norte, Centro-Oeste ou Sul. Estes estados, salvo políticas especiais tais como as de Manaus, devem atender mais a produção interna. Não obstante, alguns deles devem se tornar como hub [pólo] de desenvolvimento, como por exemplo, a cidade de Belo Horizonte em Minas Gerais. Revista Sustentabilidade: Discutindo apenas a inovação para a sustentabilidade, que é o foco da Revista Sustentabilidade, existem vocações regionais ou estaduais neste âmbito? Se sim, quais? O Brasil deve ser um oferecedor ou um absorvedor de inovações e tecnologias para enfrentar as mudanças climáticas e preparar-se para transitar para uma economia de baixo carbono? Existe algum programa que o senhor conheça ou projeto interessante para enfrentar este desafio? Pierre Moreau: Um dos grandes motores de sustentabilidade no Brasil encontra-se na região Norte, devido à biodiversidade
encontrada na Floresta Amazônica. Por exemplo, a pesquisa e o desenvolvimento oriundos de produtos dessa região são pensados de forma consciente desde o estágio primário do desenvolvimento, onde há um comprometimento com todos os stakeholders envolvidos. Essa nova forma de fazer negócio é um dos grandes paradigmas para a economia atual, onde equilibrar o lado econômico, social e ambiental é um grande desafio. A gestão de gases de efeito estufa é hoje um elemento chave da estratégia de sustentabilidade e responsabilidade de qualquer empresa. Porque permite uma abordagem integrada à gestão ambiental, com retorno do investimento. O Brasil tem a capacidade de oferecer tecnologias e inovações para enfrentar as mudanças climáticas devido a nossa grande variedade na fauna e na flora e também devido à substancial massa crítica de cientistas que possuem capacidade para analisar, entre as soluções existentes, qual tem o melhor valor agregado e que se aproxima de uma solução sustentável, pois sabemos que é um grande desafio trazer benefícios nas três esferas: ambiental, social e econômica de forma sincronizada. Um exemplo de solução harmoniosa pode ser observado na iniciativa da empresa de bioenergia Sykuè. Por meio do cultivo do capim-elefante, que é uma fonte com alto potencial de energia alternativa, a empresa viabilizou a alta produção de biomassa e possibilitou uma grande captura de carbono. Revista Sustentabilidade: Quais são os principais gargalos do sistema brasileiro de inovação e como devem ser resolvidos? Pierre Moreau: Ainda observamos a dificuldade na compreensão da necessidade da inovação, tanto por parte das empresas quanto das universidades e do governo. O timing também é defasado, pois em grande parte dos casos a universidade retém quase todo o conhecimento tecnológico e científico, as empresas dominam as necessidades do mercado e o governo determina as políticas públicas. O alinhamento desses três interesses é o principal papel da nossa empresa, visto que compreendemos as necessidades e expectativas de cada uma das partes e conseguimos estruturar planos de ação alinhados com o conhecimento disponível, as necessidades do mercado e o interesse econômico nacional, através da gestão da inovação. Revista Sustentabilidade: Há uma demanda das empresas por recursos públicos para estruturar e implementar programas de inovação?
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Pierre Moreau: Sim. Hoje o cenário brasileiro considera a inovação como uma característica essencial para sobrevivência e diferenciação no mercado. Ao olhar esse cenário propício, o governo observou elementos que poderiam trabalhar em conjunto para o crescimento econômico do país, mas que não possuíam o budget necessário à inovação. Um dos pioneiros foi o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento) que possui diversas linhas para fomento de novas tecnologias como Inovação Tecnológica, Inovação de Produção, Cartão BNDES, Linha de Capital Inovador, linhas voltadas para o setor da Indústria Aeronáutica, das Engenharias, do Complexo Industrial da Saúde, entre outros. Atualmente, além do BNDES, o desenvolvimento tecnológico nacional conta com o apoio da FAPESP, FINEP e outras agências de fomento, além das legislações que regulamentam benefícios fiscais às empresas que investem em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento). Revista Sustentabilidade: Qual o papel do governo, setor produtivo e academia em um sistema de inovação para o atual nível de desenvolvimento do país? Pierre Moreau: Os três setores desempenham atividades distintas, porém igualmente importantes que precisam ser alinhadas. A geração do conhecimento começa na academia, através de pesquisadores determinados em buscar a resposta nas questões cientificas e tecnológicas. Essas respostas poderão ser caracterizadas como solução, caso o mercado esteja maduro o suficiente para absorvê-las, dentro das suas necessidades comerciais e econômicas, visto que a analise da viabilidade comercial e aceitação de novos produtos no mercado são critérios observados pelo setor produtivo antes da inclusão de um novo formato de negócio ou produto que podem aquecer a economia do país. Por sua vez, a implementação ou regulamentação de políticas publicas de incentivo a inovação e investimento em educação e ciência e tecnologia são ações fundamentais para a geração deste conhecimento e viabilização das linhas de pesquisa, tanto cientifica como mercadológica, tornando todo processo um ciclo. Revista Sustentabilidade: O senhor acredita em necessidade de medidas ou propostas de mudanças no arcabouço legal do sistema de inovação? Se sim, quais?
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Pierre Moreau: Sim. A flexibilização das legislações dos ICTs (Institutos de Ciência e Tecnologia) referente a parcerias com empresas visando o desenvolvimento de novos produtos, processos e tecnologias, visto que a política atual é um dos principais entraves na aproximação do meio privado com o público, onde a universidade geralmente não abre mão da titularidade e do conhecimento gerado. Tal postura de retenção do conhecimento deve-se muito ao histórico de falta de cultura de inovação, e em contrapartida observamos um movimento conhecido como Open Innovation (Inovação Aberta) onde o modelo de gestão é baseado na troca de informações em fluxo aberto e não na retenção, possibilitando a utilização de soluções de grupos de pesquisa e empresas de diferentes partes do mundo. Revista Sustentabilidade: Nos últimos anos o Brasil tem feito vários acordos e convênios com outros países para desenvolvimento tecnológico. Quais são os modelos de sistemas de ciência, tecnologia e inovação que devem servir de benchmark para o Brasil? Pierre Moreau: Nos anos 80, a Coréia do Sul e o Brasil estavam no mesmo patamar científico-tecnológico, com um número de patentes bem abaixo de Japão e EUA. Ao enxergar esse cenário os investimentos da Coréia foram direcionados para ciência e educação, além da sinergia entre academia, governo e empresas. Fato marcante pode ser observado no investimento em C&T nunca ter sido abaixo de 2,5% do PIB, sendo que no Brasil esse investimento jamais passou de 0,9%. O modelo de industrialização brasileiro foi baseado na aquisição de tecnologias estrangeiras, enquanto a Coréia se baseou no desenvolvimento de tecnologias nacionais via cooperação com os países em melhor posicionamento tecnológico. Isso refletiu diretamente na produção mundial de ciência, tecnologia e inovação, onde a Ásia possui representação de 18%, EUA e Europa 80% e América Latina apenas 2%. Acredito que o pré-requisito para ser uma potencia ou um país de destaque em inovação não está baseado no seu poder econômico. As oportunidades decorrentes das Olimpíadas e Copa tornam o momento propício para repensar e agir, redirecionando os investimentos em áreas de relevância que são: educação, ciência e tecnologia, enquadrando assim, o país na rota da inovação e não apenas como um produtor de commodities. k
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A busca pela sustentabilidade estrutura departamento de pesquisa em construtora Empresa pioneira em sustentabilidade no setor de construção muda estrutura administrativa e fortalece setor de inovação para continuar produzindo dentro de critérios de sustentabilidade.
m 2008, quando a construtora paulista Even decidiu que iria implementar critérios de sustentabilidade nos seus processos produtivos, ela não esperava a profunda mudança que iria acontecer na empresa, que, no final, resultou na criação não só de um departamento de sustentabilidade, mas também no fortalecimento do departamento de pesquisa e inovação. Naquela época, foram estudados os conceitos de certificação como Aqua e Leed, mas alguns critérios foram implementados sem que esta certificação fosse buscada. Hoje, a situação é completamente diferente, pois não só seus empreendimentos buscam a certificação Aqua, desde 2008 ela publica um relatório de sustentabilidade auditado pela BSD Consulting, que certifica os relatórios de multinacionais, foi a primeira empresa do setor a ser listada no Índice de Sustentabilidade da BMFBovespa (ISE), e também investiu nos últimos dois anos em um levantamento da pegada de gases efeito estufa de seus projetos que inclui a cadeia e hoje tem uma departamento de pesquisa, desenvolvimento e inovação. “Hoje temos uma área de inovação e tecnologia com sete funcionários exclusivos e uma de sustentabilidade também com sete pessoas,” explicou Sílvio Gava, Diretor Técnico e de Sustentabilidade da empresa. Apesar de existir esta estrutura administrativa, a empresa
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percebeu que a implementação de critérios sustentáveis é necessariamente transversal, portanto ficou definido que quem determina a sustentabilidade não são os funcionários do departamento de sustentabilidade, mas sim os líderes dos projetos. “Todos os anos temos de 10 a 15 estudos e projetos sendo desenvolvidos que são por definição grupos multidisciplinares,” afirmou. “As pessoas não podem pensar sozinhas”. Entre os projetos estão incluídos: redução de resíduos, a busca de financiamento diferenciado para projetos que embutem tecnologias e técnicas menos agressivas ao meio ambiente, a educação dos funcionários e compradores finais e a pesquisa de novas tecnologias. Hoje, depois confirmar que mais 90% da emissão está na cadeia de produção – um levantamento que levou dois anos – a empresa também começa a se preocupar com a cadeia de fornecimento, para buscar melhorar a pegada a médio e longo prazo. Além da inovação de buscar identificar o impacto, calculado em uma emissão de 0,275 toneladas de carbono equivalentes por metro quadrado construído, a empresa também disponibilizou a metodologia para o público em geral, incluindo concorrentes. Medida que segundo o executivo foi bem recebida pelo mercado e tem atraído o interesse de várias empresas, consultorias e pesquisadores. Mas, explicou Gava, é o começo de um trabalho, pois a
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A aposta na sustentabilidade mostrou que é caminho que abre portas, pricipalmente para a inovação de produtos e processos em todas as áreas medição permite buscar melhorias. “Não podemos ainda instituir metas, pois o ciclo desde o projeto até sua venda ao consumidor final leva cerca de três anos, portanto, o que implementamos agora só vai poder ter resultado à médio prazo,” Levando em conta o tripé da sustentabilidade incluindo o tripé financeiro, Gava admitiu que o custo de incorporar novas tecnologias que reduzam o impacto ambiental da obra pode sim ser mais alto no início, mas depois se equilibra à medida que os custos são internalizados pela própria empresa e os fornecedores
que começam a ganhar escala. “O custo é transitório,” lembrou. “Um exemplo foi a decisão de investir em molduras plásticas, mais caras quando comparadas as de madeira para um empreendimento, mas ao longo da vida se paga, pois são reutilizadas”. No final, a aposta na sustentabilidade mostrou que é caminho que abre portas, principalmente para a inovação de produtos e processos em todos as áreas. “O principal é mudar as atitudes”, concluiu.
Reciclagem para a comunidade: sustentabilidade requer inovar nas relações com o entorno
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Inovação para a sustentabilidade é um processo Gerente de sustentabilidade da fábrica de chás secos da Coca Cola mostra os desafios para buscar inovações para poder melhorar o desempenho ambiental e social da unidade no Paraná.
inovação para a sustentabilidade, ou ecoinovação, é um processo. Foi assim que o Gerente de Sustentabilidade de Responsabilidade Social Corporativa da SABB Coca-Cola, Fabiano Rangel, definiu o desafio de construir a fábrica da Mate Leão no estado do Paraná, com critérios que reduzam os impactos sociais e ambientais. “Hoje eu vejo muito a sustentabilidade intimamente ligada à inovação, pois toda esta relação de melhoria de qualidade de vida e do meio ambiente vai além da relação tradicional entre preço e qualidade,” concluiu. “Para atender os critérios, é necessário que as empresas inovem a visão de sustentabilidade que, em si, é uma grande mola para perceber que é preciso fazer uma revisão dos processos”. A fábrica Leão Júnior, inaugurada em 2009 no município de Fazenda Rio Grande, foi planejada para embutir tecnologias que reduzam o consumo de energia, água e outros insumos, visando como um todo uma menor pegada de carbono, o processo incluiu também uma adequação dos hábitos dos funcionários. A empresa, SABB Coca Cola, uma associação entre a Coca Cola e fabricantes regionais, estima que investiu no projeto cerca de 15% a mais do que teria investido se fosse uma fábrica convencional. “Como sustentabilidade é um processo, este custo é absorvido pelas economias geradas com as tecnologias, mas considero também que é um investimento em aprendizado e tenho certeza que nas outras fábricas vai ser menor,” declarou Rangel. A partir do departamento de sustentabilidade dentro da diretoria de recursos humanos na empresa, o projeto foi desenvolvido para poder receber certificação LEED do GBC-Brasil. Isto
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envolveu não só buscar e aplicar tecnologias existentes – o que foi o caso na maioria dos itens –, mas também foi necessário fazer interlocução com os fornecedores para atender os requisitos da certificação. Este foi o caso ao buscar atender os requisitos mínimos de compostos orgânicos voláteis (COV) das tintas a serem utilizadas. Técnicos da SABB tiveram que negociar a fabricação do insumo com melhores tecnologias, pois tinham que atender a outro critério da certificação que obriga a compra de materiais dentro de um raio de 800km. Outro quesito que necessitou de intensa cooperação entre a equipe técnica da nova fábrica e os fornecedores foi os sistemas e equipamentos para o acondicionamento de ar. “Não dá para deixar casos como estes apenas com o comercial,” disse. “No final, o resultado é interessante também para a sociedade local, pois hoje existem vários fornecedores que se desenvolveram muito na área de sustentabilidade em função de ter atendido nosso projeto”. Iluminação e ventilação natural, isolamento térmico, telhados verdes, sistemas hidráulicos – que incluem reuso de água da chuva - e projetos elétricos permitiram uma redução mensal de 23% no consumo de água e 36% no consumo de energia elétrica, se comparado a fábricas convencionais. Além disso, o projeto no processo fabril inclui tratamento de resíduos líquidos. Uma inovação interessante foi a decisão de usar o desnível do próprio terreno para montar a linha de produção e utilizar a gravidade para movimentar a erva mate, reduzindo assim, a necessidade de uso de energia.
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Menos pegada no transporte Além disso, o projeto se preocupou em incluir os 450 funcionários que foram estimulados a optar por meios de transporte que reduzam a emissão de gases de efeito estufa. “Isso foi uma diretriz deste do começo e demos prioridade para contratação local. Cerca de 30% a 40% do nosso quadro vem da Fazenda Rio Grande,” ilustrou. Enquanto muitos dos funcionários que moram em Curitiba a 40 quilômetros de distância pegam ônibus fretado para reduzir o uso de transporte individual, o estacionamento foi desenhado para incluir um bicicletário e vagas demarcadas em lugares privilegiados para os veículos que usam etanol ou cujos motoristas participam de programas de carona solidária.
“Hoje, 15% da população da fábrica já usa bicicleta para ir e vir do trabalho”, lembrou. Segundo Rangel, a empresa quer continuar a melhorar os indicadores sociais e ambientais da fábrica e avaliar a pegada ecológica dos produtos, além da linha orgânica que já está mensurada. Isso, no entanto, depende não só da implantação de novas tecnologias, mas também do treinamento e motivação dos funcionários que são capacitados para poder atuar de uma forma mais consciente o que, segundo o gerente, gera mais eficiência. “A nossa empresa tem três anos e, tendo colocado a sustentabilidade dentro do departamento de recursos humanos, podemos trabalhar de forma transversal olhando as tecnologias, mas trazendo as pessoas para a reflexão”, concluiu.
Iluminação natural no chão da fábrica ajuda a reduzir conta de eletricidade em 36%
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O papel do setor financeiro para a sustentabilidade e seus avanços Por Victorio Mattarozzi e Cássio Trunkl *
uando aplicado ao setor financeiro, o conceito de sustentabilidade não se limita às iniciativas de ecoeficiência nem deve ser confundido com atividades de cunho social desenvolvidas pelas organizações do setor. Mais propriamente, remete à necessidade delas incorporarem a perspectiva sustentável à sua missão e estratégia de negócios. As instituições financeiras estão cada vez mais percebendo que a adoção de práticas de sustentabilidade nos negócios traz resultados positivos: aumenta receitas, reduz custos, facilita o acesso a linhas de crédito e melhora a qualidade do capital humano. Minimiza também o risco de reputação decorrente de eventual dano a pessoas e comunidades ou ao meio ambiente causado por seus clientes. O papel do setor financeiro como indutor de práticas de sustentabilidade empresarial é considerado estratégico desde as primeiras discussões sobre desenvolvimento sustentável em nível global anos atrás. Não é difícil compreender a força de persuasão das instituições detentoras de recursos sobre aquelas que precisam obtê-los. O modo pelo qual as instituições financeiras vêm incorporando a perspectiva sustentável aos negócios se traduz por meio da adoção de princípios e diretrizes socioambientais e de governança corporativa, os quais são denominados de finanças sustentáveis. Entre diversas iniciativas individuais ou institucionais, as mais relevantes no setor financeiro com alcance internacional são os Princípios do Equador (The Equator Principles) e os Princípios para o Investimento Responsável (The Principles for Responsible Investment), respectivamente, voltados a identificar e avaliar os riscos sociais e ambientais associados ao financiamento de projetos, e a incorporar questões sociais, ambientais e de governança corporativa nos processos de decisão de investimentos. Aqui no Brasil, no âmbito das finanças sustentáveis, destaca-se o Protocolo Verde, em suas versões para os bancos públicos federais e para os bancos privados, que estabelece princípios socioambientais nas análises de risco para o financiamento de clientes e projetos e no processo de decisão de investimento. Embora haja sempre uma expectativa do processo ocorrer de
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modo mais acelerado, no decorrer dos últimos seis ou sete anos, como demonstra a adesão das instituições a essas iniciativas, a estratégia de incorporação da sustentabilidade aos negócios vem ganhando terreno no setor financeiro brasileiro. A perspectiva sustentável passa a ser vista como uma vantagem competitiva e está adentrando as práticas das mais relevantes atividades do setor e chegando também às instituições de menor porte. A efetiva implantação de princípios e diretrizes socioambientais e de governança adotados pelas instituições financeiras se apresenta como um desafio no processo de incorporação da perspectiva sustentável pelo setor. Algumas instituições aderem voluntariamente a iniciativas voltadas à sustentabilidade como forma de assegurar sua reputação, porém, negligenciam a implantação dos compromissos assumidos. Boas práticas de governança, liderança, políticas robustas e ambiciosas, prestação de contas e transparência são pré-requisitos para promover uma mudança cultural real das instituições financeiras que perseguem a perspectiva sustentável em seus negócios. É essencial incluir a perspectiva sustentável na cultura das instituições financeiras em todas as suas facetas de negócios. Questionar se a instituição realmente está encorajando seus colaboradores a tomar as atitudes certas no dia-a-dia dos negócios. Para tanto, é preciso mobilizar todos os níveis hierárquicos na direção da sustentabilidade, a fim de que essa perspectiva passe a ser percebida como uma estratégia de negócios sistematicamente vinculada ao sucesso da organização. Há avanços nessa direção, mas o setor financeiro brasileiro e mundial tem ainda muito que trilhar. k
* Victorio Mattarozzi e Cássio Trunkl são sócios-diretores da Consultoria Finanças Sustentáveis e co-autores dos livros: Sus-
tentabilidade no Setor Financeiro: Gerando valor e novos negócios – Ed. Senac; e Sustentabilidade dos Negócios no Setor Financeiro: Um caso prático – Ed. Annablume. E-mail: contato@financassustentaveis.com.br.
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Portadoras de futuro A política industrial, baseada na inovação, começa a ser focada em áreas prioritárias para buscar resultados, mesmo ameaçada por contigenciamento do orçamento
m meio às discussões da formulação da nova versão da política de desenvolvimento produtivo, uma palavra é chave: inovação. Dentro desse marco, a Financiadora de Projetos de Pesquisa (Finep), vem ganhando destaque. À frente da Finep desde fevereiro, o sociólogo Glauco Arbix defende menos burocracia e mais coordenação entre empresa e academia, e lamenta o contingenciamento que voltou a fazer parte da realidade da instituição, devido ao corte orçamentário definido pelo Governo Federal. "O corte em ciência e tecnologia é de longa duração", lembra Arbix, em entrevista à Revista Sustentabilidade, afirmando que o Brasil agora deverá dar mais atenção às áreas que serão as "portadoras do futuro" da economia brasileira.
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do Programa de Sustentação do Investimento via BNDES. Destes, R$ 750 milhões vêm diretamente do banco, que nos reconhece como um agente financeiro que repassa recursos. Realizamos operações automáticas – fazemos as aplicações de crédito e enviamos todos os relatórios, prestações de contas para a fonte. O outro bilhão vem na forma de empréstimo direto do BNDES à Finep, nas mesmas condições do PSI. Esses recursos vêm para a Finep com aval do Tesouro Nacional. Isso tudo é crédito; há ainda uma parcela de R$ 80 milhões, que se refere a R$ 220 milhões que recebemos do FAT, e que tem de ser orientada para as micro, pequenas e médias empresas a partir de um acordo que assinamos para ampliação da nossa carteira com eles.
Revista Sustentabilidade: Como tem sido a evolução dos repasses da Finep a projetos inovadores?
Do ponto de vista histórico, estamos recuperando esses recursos do FAT porque, há cerca de três ou quatro anos, chegamos a ter R$ 300 milhões. Esse valor foi diminuindo por uma série de circunstâncias, que agora estamos tentando recuperar. Se fizermos um bom trabalho, temos todas as condições para esse tipo de cooperação de longo prazo, o que significaria uma ampliação dos recursos para crédito. São recursos do PSI, oferecidos em condições especiais que, dependendo da linha em que você enquadra, são de 4 a 5% ao ano, o que significa juros negativos, se contar a inflação, e carência entre três anos e dez anos para pagar. Então é uma situação muito vantajosa em um país onde o dinheiro custa caro.
Glauco Arbix: A evolução dos recursos da Finep é muito grande, significativa. Em 2003, a Finep investia cerca de R$ 300 milhões em inovação. Em 2010, a Finep investiu cerca de R$ 4 bilhões, atingindo cerca de 2 mil empresas. Este ano, entretanto, vivemos uma série de situações e componentes diferenciados. Tivemos um corte orçamentário por conta do contingenciamento no FNDCT. Depois tivemos um corte suplementar como componente do sistema MCT. Trabalhamos para obter outras fontes na área do chamado recurso reembolsável, na área de crédito. Conseguimos US$ 1,75 bilhão
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Se fizermos um bom trabalho, temos todas as condições de recuperar esse tipo de cooperação, de longo prazo, o que significaria uma ampliação dos recursos para crédito
Revista Sustentabilidade: Vocês esperam que a reserva de contingenciamento deste ano permaneça tal qual a anunciada? Glauco Arbix: Por lei, no Brasil, recursos voltados para a educação, ciência e tecnologia não podem ser contingenciados. Houve uma alteração nos anos 90 chamada reserva de contingência. Não é exatamente contingenciado, mas está numa rubrica que não pode ser utilizada, ou em outras palavras não pode ser liberada. Do ponto de vista legal é uma pequena, mas importante alteração. Quando é contingenciado, o voto do Congresso é a última palavra. Quando é reserva de contingência, você pode reaver o recurso sem ter de passar pelo Congresso. O governo pode descontingenciar, não precisa votar nova lei. Do ponto de vista institucional isso é uma facilidade muito grande. Nós não estamos contando com isso este ano, pois é um volume muito grande – 22% de R$ 3 bi e pouco, R$ 600 milhões – mas como existe essa possibilidade, se viesse seria benvindo. Revista Sustentabilidade: Vocês se preocupam com a volta dessa restrição orçamentária? Glauco Arbix: Claro. Sempre que você corta recursos você gera um impacto ao longo dos anos. O corte em educação, ciência e tecnologia tem um efeito no curto prazo de “engordar” o caixa do governo por necessidade. Nós entendemos isso, mas o corte em ciência e tecnologia é de longa duração. Não é a mesma coisa quando você suspende a construção de um viaduto. Quando você para uma construção assim, pode retomar daqui a dois anos. Em ciência, tecnologia e educação, quando uma empresa deixa de investir, ela perde uma oportunidade. Revista Sustentabilidade: Vocês defendem novas mudanças na regulamentação para facilitar o acesso das empresas a créditos para inovação?
Glauco Arbix: Esse é o problema. Nossas sugestões sobre marco regulatório são muito pontuais. Não temos nenhuma pretensão de fazer uma discussão geral, de conjunto. Legislação é um corpo vivo e sempre tem que ser alterada. Às vezes há certos detalhes que geram inconvenientes para todo mundo, para as empresas e para nós. Em 2005 passou a vigorar a Lei de Inovação, que abriu a possibilidade de você celebrar acordos entre empresas e universidades com uma qualidade diferente, podendo inclusive remunerar o pesquisador quando ele é um funcionário de uma universidade pública, de organizar os editais de subvenção econômica, como fazemos hoje. Ao mesmo tempo, quando você nota imprecisões, ou pontos que são claros, mas que podem dar margens a dúvidas na interpretação, isso pode gerar problemas jurídicos. Então as empresas ficam com medo de investir, porque a lei de inovação se baseia numa série de sistemas em que a empresa investe e depois ela pode descontar de sua declaração de impostos, pagamento de taxas, uma série de pontos que são bastante relacionados à prestação de contas diante da receita. Se os pontos não são claros, o medo é o de que a receita pode não aceitar a declaração da empresa, o que então lhe obriga a devolver o que investiu – e se a empresa soubesse disso com antecedência, talvez não tivesse nem investido. Todo o nosso objetivo é flexibilizar o repasse de recursos para tentar alocar investimento em todas as áreas possíveis da economia brasileira. Temos que facilitar esse trabalho para a empresa. Revista Sustentabilidade: Você concorda com a ideia de que no Brasil os empresários são acomodados quanto à inovação? Glauco Arbix: Não sei se podemos falar de acomodação. A economia se movimenta com base em estímulo. Quando não é estimulada, a empresa busca algo que seja mais favorável a ela. Diferenciar produtos, lançar novos, montar departamentos de
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A economia se movimenta com base em estímulo. Quando não há estímulo, a empresa busca algo que seja mais favorável a ela. Diferenciar produtos, lançar novos, montar departamento P&D, estimular e fortalecer suas engenharias, é bonito e verdadeiro. Mas no dia a dia das empresas essas decisões são complicadas. Inovação diz respeito a mudança e isso não é fácil. P&D, fortalecer suas engenharias, é bonito e verdadeiro, mas no dia a dia das empresas essas decisões são complicadas. Inovação diz respeito a mudança, e isso não é fácil. Por que vou entrar em um processo de mudança em que a margem de segurança sobre o retorno é pequena? Então eu penso dez vezes. Tem várias formas de explicar isso. Mas é claro que a competição faz a diferença. Senão você se dá ao luxo de ficar com o mesmo produto por dez, quinze anos. Revista Sustentabilidade: Política horizontal é melhor que industrial? Glauco Arbix: Tem gente que pensa assim; não é o que eu penso e, graças a Deus, não é o que o governo pensa. Acho que só a política horizontal nunca resolveu, em nenhum país do mundo, isoladamente. Não é certo achar que se você fornece somente as condições de infraestrutura, a competitividade brota como as laranjas, alface e berinjelas. O problema é que os países que hoje falam isso para a gente nunca o fizeram no passado. Hoje eles falam porque tem uma economia desenvolvida. Nesse mundo desenvolvido é que estamos tentando entrar e sentar à mesa de jantar, para a qual ainda não fomos convidados. A comida está posta, mas ainda não conseguimos chegar lá. Para chegar lá, o governo tem que desenvolver políticas de infraestrutura, básicas, e tudo o que você imaginar de custo, mas também montar sistemas de estímulo externo à empresa para que ela possa se perceber capaz de mudanças. Fundamentalmente, o Brasil tem que ter políticas orientadas às áreas que podem ser portadoras
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de futuro, não tem conversa. Senão ficaremos para trás mais uma vez. Revista Sustentabilidade: Qual, então, o caminho ideal? Glauco Arbix: O nome política industrial já é complicado, é dos anos 50, 60. Hoje, política industrial não necessariamente é voltada para a indústria. O que é importante saber é que as condições de hoje não são as mesmas da dos anos 50, 60, 70. O Brasil não vive em uma economia fechada, protegida, em uma situação em que o estado manda e desmanda, orienta e determina o investimento, é proprietário de gigantescas empresas em praticamente todas as áreas da economia e controla diretamente mais de 50% da economia como foi no passado. As condições hoje do Brasil e do mundo são completamente distintas. Hoje para fazer política industrial, seja ela qual for, você precisa conversar, convencer, chamar as empresas. As condições da economia aberta no Brasil, as condições de democracia, fluxo de informação obrigam o Estado a ter de conversar , estabelecer formas de diálogo permanente, com os empresários, com as empresas, com os sindicatos, para desenhar os seus planos. Eu sei que se o Brasil não conseguir fazer esse casamento entre setor público e privado, e avançar em construir uma sociedade mais amigável à inovação, a situação ficará difícil para nós, porque China e Índia não vão esperar que resolvamos nossos problemas para nos atropelar. k
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Empresa verde: um diferencial para seus negócios e consumidores Por Timothy Altaffer *
ivemos a época em que as limitações de recursos naturais começam a aparecer. Estimativas do Instituto Internacional para o Meio Ambiente e Desenvolvimento revelam que, considerando os níveis atuais de produção, as reservas de cobre da Terra poderão se esgotar em 28 anos, as de prata, em 17 e as de estanho, em 37 anos. A escassez de água também começa a se tornar um problema: segundo projeções dos estudiosos, no ano de 2030 um em cada três seres humanos não terá água suficiente para consumo próprio. Com tal cenário, fica ainda mais perceptível a movimentação de empresas: organizações que não forem consideradas “ecoeficientes” terão dificuldades em competir quando os recursos se tornarem mais escassos. O meio ambiente entrou definitivamente na pauta de negócios. Empresas de todos os setores sabem que só há um caminho para se adaptar aos novos tempos: inovar para transformar a crise ambiental em vantagem competitiva. A sustentabilidade começa a ser também um tema importante para os consumidores e clientes, que preferem produtos que não prejudiquem o meio ambiente ou que ajudam a comunidade local. Não ter o posicionamento verde é um risco grande para a empresa. Desta forma, muitas empresas tentam se reposicionar para se adequar aos desejos e expectativas dos clientes. A competitividade entre companhias para provar quem é o mais verde e consciente, também aumentou. Além da imagem positiva para seu publico, as empresas estão apurando seu senso de ética e começam perceber a necessidade de existir responsabilidade filantrópica na relação com o mercado. Para empresas que já têm em sua cultura a sustentabilidade, o processo é mais fácil. Infelizmente tal princípio é raro: na empreitada de ser conhecido como verde, muitas companhias decidem tomar o caminho mais superficial e menos eficaz. Estas empresas acreditam que palestras com a participação de colaboradores e comunicados ao mercado com mensagens de sustentabilidade são suficientes para torná-las conhecidas como consciente. Mas isso não as faz “verdes”. Para se tornar sustentável de verdade, as empresas devem
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possuir executivos que reconheçam as mudanças que o planeta está enfrentando: o líder que traça as estratégias da empresa para o futuro baseado no sucesso do passado, transforma a companhia em um fracasso. Incorporar a filosofia verde implica em trazer esse pensamento para as questões mais profundas da condução de negócio. Os processos organizacionais, decisões da alta liderança, de alocação de recursos e o envolvimento das pessoas em projetos internos, devem ser contemplados. Se a conscientização for profunda e contínua, a organização consegue implantar em sua cultura, a sustentabilidade. Se for um programa superficial, dentro de pouco tempo, a antiga mentalidade pode retornar e os velhos hábitos também. A companhia não pode se esquecer de seus stakeholders: deve haver uma nova cultura de se relacionar com clientes, comunidade e colaboradores. O responsável pelo projeto deve definir quais são os valores individuais e da empresa, e começar a trabalhar com essa cultura. No entanto, não será simples: as companhias terão que percorrer um longo caminho para se igualar a instituições que já foram criadas com a cultura verde. Muitos negócios terão que redefinir suas principais vantagens competitivas num mundo com recursos restritos. Outros encontrarão novos potenciais de mercado. O termo “verde” não deve estar só relacionado à preservação do meio ambiente, mas também com a proteção da comunidade. A sustentabilidade precisa ser vista e trabalhada como sendo a integração de todas as cadeias de atuação da sociedade em sintonia com a natureza. Só assim, todos juntos, podemos atingir um propósito maior: manter a qualidade de vida no planeta. k
* Timothy Altaffer é presidente da Axialent Brasil e consultor sênior da Axialent. Atua nas áreas de governança corporativa, marketing e comercial da empresa no Brasil, além de trabalhar com altos executivos em projetos de transformação cultural. Altaffer é formado pela Universidade de Lehigh, na Pensilvânia, especializado em gestão da estratégia e da mudança e Mestre em finanças pela Stern.
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O dia a dia da pesquisa O pensamento lógico pode levar você de A a B, mas a imaginação te leva a qualquer parte do Universo. Albert Einstein
As equações contam as mais maravilhosas histórias
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Cristais de ácido ascórbico (vitamina C) vistos pelo microscópio
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O começo de todas as ciências é o espanto de as coisas serem o que são. Aristóteles
Geneticistas pesquisam mudas de arroz nos EUA
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Células tronco humanas vistas pelo microscópio
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Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica
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O lixo só deixará de ser lixo com inovação A implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que torna obrigatórias metas decrescentes para o material destinado aos aterros, faz renascer o setor de manejo de resíduos, oferecendo oportunidades a novos negócios de reciclagem, compostagem, geração de energia e prestação de serviços
Por Kalinka Tavares
screvendo em português claro, a Política Nacional de Resíduos Sólidos definiu que lixo não é mais lixo, é insumo para a indústria. Simplesmente assim. É isto que se discute ao longo dos 57 artigos da lei aprovada após 19 anos de discussões no Congresso Nacional. Isto, no final, muda tudo, pois o que botamos para fora de casa não pode mais ser enterrado em aterros ou lixões e ser esquecido. Teremos que, a cada ano, diminuir o que destinamos a aterros, o que significa reusar ou reciclar e, para isso, precisaremos inovar. Determina a lei que somos todos – empresários, governadores e prefeitos, comerciantes e consumidores – responsáveis pelos rejeitos que produzimos. No entanto, isto não quer dizer que está tudo resolvido, pois, a cada ano, o brasileiro e a empresa brasileira só produz mais resíduos. Em 2010, de acordo com um levantamento da Abrelpe, os moradores e empresas localizadas nos centros urbanos botaram para fora de suas casas escritórios e comércio 1,03Kg
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de resíduos por dia, um aumento de 5,3% comparado a 2010. Esse acréscimo é inferior ao aumento do PIB (7,5%) e da taxa de crescimento populacional (1,2% ao ano). Mesmo com a visível degradação do ambiente urbano e rural e a crescente consciência da população, temos que fazer uma mudança de comportamento e olhar com outros olhos o que jogamos fora. “Ainda é importante avançar no sentido de fazer a população compreender que não existe mais lixo, e que tudo é resíduo e que é um bem econômico, mesmo a matéria orgânica, mesmo não sendo coletada de forma diferenciada”, disse Pedro Jacobi, Professor Titular da Faculdade de Educação e do Programa de Pós Graduação em Ciência Ambiental (PROCAM) da Universidade de São Paulo. Hoje, o governo discute com a indústria, comércio, prefeitos e catadores – reconhecidos pela lei como um grupo beneficiário do rearranjo do sistema de manejo de resíduos – como fazer isso, para buscar acordos que definam metas e responsabilidades claras. Mas se lixo não é mais lixo, e é um bem com valor econômico, quem serão os grandes players
deste novo setor que surge? Um setor que na área de coleta seletiva e reciclagem já tem contabilizado R$8 bilhões anuais.
Responsabilidade compartilhada A grande vedete da PNRS é a logística reversa que – baseada na responsabilidade compartilhada e na ideia de que a vida útil de um produto não termina após seu consumo –, prevê um conjunto de ações e procedimentos de coleta, reciclagem, reutilização e descarte de, a princípio, cinco grupos de resíduos: eletroeletrônicos; medicamentos; embalagens; resíduos e embalagens de óleos lubrificantes; lâmpadas de vapores mercuriais, sódio e mista. Isto sem contar as embalagens após o consumo, que também virarão responsabilidade de toda a cadeia e devem ser retornadas aos seus fabricantes ou vendedores. O consenso é que a implementação da logística reversa, prevista para 2012, vai garantir o aumento do percentual de reciclagem no Brasil. “A quantidade, a variedade, a redução do ciclo de vida dos produtos passa a ser um problema social. Um computador, uma geladeira, não voltam sozinhos para as empresas que os produziram. É necessária regulamentação que obrigue esse retorno de produção”, avalia o professor Paulo Roberto Leite, presidente do Conselho de Logística Reversa do Brasil (CLRB). “Com a implan-
Custos dos insumos para produção primária, preços de produtos e preços de sucata Custo da produção primária
Aço Alumínio Celulose Plástico Vidro
Preços de mercado dos materiais (R$/t)
Preços das sucatas de material reciclagem (R$/t)
552
932
423
6.162
4.725
3.447
687
879
356
1.790
2.186-3.516
440-750
263
1.036
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Fonte: IBGE (2007b), Cempre (2007) e anexo 1
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tação da logística reversa teremos uma explosão de mercado em todos os sentidos”. Carlos Vieira, diretor executivo da Abrelpe, concorda. Ele revela que os 48 associados de sua entidade, que coletam o lixo das ruas, já estão fazendo estudos para determinar que tipo de atuação terão, desde a coleta até a reciclagem, e quanto terão que investir para abocanhar parte do novo mercado e deixarem de ser apenas empresas construtoras de aterros e coletores de resíduos para se transformarem em empresas de manejo de resíduos verticalizadas. “Vai ter um abertura neste setor para empresas em vários campos e tipos de atuação. Estas passarão a diversificar suas atividades”, explicou o diretor executivo da Abrelpe. “As empresas já internalizaram a lei e estão neste momento estabelecendo parcerias com provedores de tecnologias e sistemas que possam ser aplicados, principalmente empresas do exterior onde as tecnologias estão mais disponíveis”.
Talvez a solução não seja investir em novos aterros, mas sim em novos sistemas de triagem, fábricas de reciclagem, usinas de compostagem e até centrais elétricas
Número de aterros sanitários nos EUA, 1988-2009 24
8.000
7.9
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7.3
7.000
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6.3
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4.4
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resíduos destinado à reciclagem, compostagem e geração elétrica. Em 2009, existiam menos de 2 mil aterros naquele país comparados aos quase 8 mil dos anos 80. Enquanto isso, a cada quilo de resíduo urbano produzido por americano, 25% era reciclado, 8,5% ia para compostagem, 12% era queimado para gerar eletricidade e 54% era destinada a aterros. Em 1970, 92% ia para aterros. As informações são dados oficiais da Agência de Proteção Ambiental (EPA). Para Beth Grimberg, diretora do Instituto Pólis, já temos tecnologias e conhecimento para recuperar valor de 90% dos resíduos, inclusive o material orgânico. “Nas grandes cidades, o lixo orgânico pode ir para o aterro, para geração de gás metano, e nas cidades menores poderemos implementar usinas de biodigestores para compostagem e produção de adubo,” disse Grimberg. “Temos que entender que a lógica de colocar o resíduo na porta de sua casa e levar ele para
Compostagem pode gerar empregos Compostagem, reciclagem, recuperação energética são as palavras de ordem. Segundo consultores do setor, as empresas que investirem para apresentar soluções poderão ser as primeiras a ganhar. Já as prefeituras também terão que inovar a gestão pública dos resíduos buscando contratos condizentes com as diretrizes da Política Nacional de Resíduos Sólidos que visa a redução gradual do que é destinado a aterros. São mais de 5.500 prefeitos que, até 2014, terão que eliminar lixões e implementar sistemas de coleta seletiva e estimular a reciclagem. Talvez a solução não seja investir em novos aterros, mas sim em novos sistemas de triagem, fábricas de reciclagem, usinas de compostagem e até centrais elétricas. Nos Estados Unidos, o número de aterros diminuiu substancialmente desde o final da década de 80, em proporção inversa ao aumento do volume de
Proporção de material reciclado, 1990-2009
Porcentagem de material reciclado da coleta urbana
40% % 1,6
3
30% %
,7 25
,3%
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,8%
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,6%
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longe precisa acabar. Todos têm que se responsabilizar”. Grimberg salientou que 60% dos resíduos urbanos são de material orgânico e compostável e que, com a instituição de uma política de coleta seletiva que remove impurezas e materiais danosos à saúde, o adubo produzido desde a compostagem pode ser usado até em culturas alimentícias e não apenas para florestas ou culturas não alimentícias como são atualmente. No final, não se trata apenas de uma questão de adoção de tecnologia, mas também de geração de emprego já que este trabalho é intensivo em mão de obra. Percebendo a oportunidade, a Associação Brasileira das Empresas de Compostagem, Abisolo, em março foi pesquisar na Europa novas tecnologias para melhorar o setor no Brasil. Segundo estudos da própria entidade, em 2004, o Brasil destinava à compostagem 1,5% de todo o resíduo orgânico coletado. A média do Mercosul é acima de 5%, enquanto nos EUA, que possui uma forte tradição de compostagem dos resíduos agrícolas, chegava a 59%.
Portanto, a incorporação da inovação na gestão pública dos resíduos é um fator essencial para as prefeituras e estados elaborarem suas políticas de gestão nos próximos dois anos, como ordenado pela lei. Para fazerem isso, a PNRS prevê subsídios, incentivos fiscais e financiamento para pesquisa e inovação, além de permitir a cobrança específica para o setor – a taxa do lixo. Um dos caminhos é o consórcio de municípios – priorizado pela PNRS - que ajuda a reduzir custos e racionalizar os recursos. Algumas administrações já estão adotando essa solução para alcançar esse objetivo. Na região metropolitana de Curitiba (PR), desde 2007, há um consórcio intermunicipal envolvendo 20 municípios. “O projeto do Sistema Integrado de Processamento e Aproveitamento de Resíduos (SIPAR) prevê a substituição dos aterros e a ideia é que sejam aproveitados no mínimo 85% do lixo enviado a essas áreas”, diz Marilza Dias, Secretária de Meio Ambiente da prefeitura de Curitiba. A capital paranaense, de fato, está num estágio mais adian-
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As empresas já internalizaram a lei e estão neste momento estabelecendo parcerias com provedores de tecnologias e sistemas que possam ser aplicados para oferecer soluções. tado na gestão dos resíduos, pois realiza a coleta seletiva de lixo desde 1989. A campanha “Lixo que não é Lixo” contou com diversas ações de mídia e outras pontuais, para conscientizar a população sobre os impactos de suas ações sobre o meio ambiente. Hoje o programa recicla 22% do lixo doméstico (cerca de 540 toneladas por dia). No entanto, mesmo Curitiba e as cidades com ela consorciadas terão de inovar para se adequar a lei, já que os aterros devem desaparecer. “No documento mundial Visão 2020, os aterros sanitários são considerados soluções obsoletas a partir de 2020, enquanto no Brasil até hoje o destino final de resíduos sólidos ainda é o lixão, ou seja, o despejo dos resíduos de toda espécie a céu aberto”, lembrou Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.
Catadores vão ser mais importantes Para fechar ciclo, o foco será na triagem e separação do lixo seco doméstico, que atualmente é feito por cerca de 1 milhão de catadores nas regiões metropolitanas. Estes, pela lei, terão que ser incluídos e, portanto, serão atores importantes no processo. “Pela primeira vez temos uma tentativa de viabilizar a coleta e incluir os catadores de material reciclável”, avalia Sabetai Calderoni, presidente do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (IBRADES). Não está claro, no entanto, como se dará esta inclusão. Para Vieira, da Abrelpe, a situação de precariedade que aflige
esta população vai precisar mudar. “Um ponto pacífico é que os catadores vão participar, mas precisamos chegar a um consenso sobre como isso será feito. Não podemos suportar este mundo cão onde estas pessoas ficam puxando carroça no meio da rua,” diz. As novas exigências da lei levam à conclusão de que também haverá mudanças nos serviços públicos de limpeza urbana. “Na verdade, o que esperamos é que os municípios reconheçam os serviços dessa parcela de trabalhadores”, declara Severino Lima Júnior, coordenador nacional do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR). Há quem defenda as Parcerias Público Privadas (PPP), como formas de viabilizar obrigações e modelos de cooperação entre os setores público e privado. “Antes havia quem alegasse que sairia caro fazer aterros ou que seriam necessários investimentos significativos. Hoje pode se fazer uso das PPPs e a implementação de reciclagem pode ser feita por empresários. Fica custo zero para os municípios”, diz Sabetai. Para diretora do Pólis, a especialização desta população é o caminho. No entanto, Grimberg alerta que é preciso mais comprometimento de toda a cadeia e sugere que os catadores, organizados em cooperativas ou em empresas, terão que ser remunerados pelo serviço e não apenas ficar compondo o elo fraco, recebendo apenas pelo que conseguirem amontoar a preços extremamente defasados. “Os geradores de resíduos, ou seja, a indústria, são agora responsáveis pelos produtos após o consumo, e apenas financiar a organização das cooperativas e jogar o custo todo da coleta para o setor público não cumpre a exigência da lei,” disse. Para ela, os catadores poderão ser contratados para fazer o serviço e existem recursos públicos para isso, se os programas e projetos consistentes forem elaborados pelas prefeituras. Ela acredita que – com organização, financiamento dos fabricantes das matérias primas e a aplicação de tecnologia – é possível recuperar 75% a 85% dos resíduos secos como metais, papel, vidro e plástico, que representam 40% dos rejeitos urbanos coletados. No final, o lixo deixar de ser lixo não é mera questão semântica. É, sim, uma questão de organização da sociedade que precisa mudar o paradigma de tirar recursos natureza em uma velocidade mais rápida do que ela pode reproduzir. Isso é o que a reciclagem faz e o que está escrito na lei. k
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Embalagens: o futuro imperfeito do pretérito Retornáveis e refis voltam à cena amparados pelo design do berço-ao-berço para embalagens sustentáveis. Por Vinícius Gorgulho
futuro das embalagens no Brasil parece ser uma briga de gigantes épica e retrofuturista, que ainda não tem vencedor claro. Do lado verde, há a necessidade da economia reduzir o impacto ambiental gerado por seus resíduos e o consumo de recursos naturais, estandarte do desenvolvimento sustentável carregado por cidadãos e, agora, também pelos consumidores e pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). No outro canto do ringue, estão várias décadas de cultura – desses mesmos cidadãos e consumidores – habituada à praticidade e conveniência imediata da descartabilidade e o poder econômico que se preocupa com o custo de mudar e perder a visibilidade das marcas, hoje uma das principais funções dos rótulos, caixas, garrafas, sacos e uma miríade de formatos coloridos e chamativos que embalam todos os tipos de produtos. Essas forças são, por ora, bastante equilibradas e, às vezes, chegam a se confundir sobre a lona. Sejam movidos por diletantismo, pressões populares, novas leis ou vantagens competitivas há quem aposte que o universo das embalagens está diante de uma volta ao básico: o apelo às práticas de consumo que resgatam o tradicional uso de embalagens retornáveis, do refil e até da quase utópica volta da compra à granel. Há ainda as abordagens processuais como o conceito de planejamento do “berço-ao-berço”, que oferece uma lente
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ética à análise do ciclo de vida dos produtos, e a biomimética, uma abordagem de design que busca aprender com as soluções de engenharia da própria natureza. As boas práticas do passado têm, entretanto, novos aliados na briga. Há fortes apostas sobre o desenvolvimento de novos materiais como biopolímeros, nanotecnologia e fibras naturais.
Inútil Paisagem Segundo informações do Ministério do Meio Ambiente, no Brasil, aproximadamente um quinto do lixo é composto por embalagens. Se considerarmos apenas os resíduos domésticos, elas são um terço do total. São 25 mil toneladas de embalagens enviadas diariamente aos depósitos de lixo. Cerca de 80% das embalagens são descartadas após serem usadas uma única vez. No final são toneladas de papel, plásticos, vidro, aço, alumínio, ou tudo misturado, como no Tetrapak, que trilham o caminho inexorável do solo para os lixões e aterros e que, no caminho coloridamente 'iluminam' nossas ruas, parques, matas, rios e mares. Em 2010, a produção física de embalagem cresceu 10,13%, após queda de 3,77%, em 2009, conforme dados da Associação Brasileira de Embalagens. Projeções do mesmo estudo indicam que o segmento alcançará receitas próximas a R$ 44 bilhões em 2011, superando os R$ 41,1 bilhões gerados em 2010.
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Mas, apesar da disponibilidade de tecnologia, os índices de reciclagem de materiais pós consumo são baixos, indicando que menos da metade dos materiais produzidos voltam à indústria. Na cidade de São Paulo, por exemplo, apenas 2% dos resíduos coletados são destinados à reciclagem. Na indústria, apesar dos altos índices de reciclagem de latinhas de alumínio, a reciclagem de outros alumínios está em 35% de tudo que é produzido. O setor de plásticos (de todos os tipos) recicla apenas 19% do total, o do papel, 46% e o do vidro, 47%.
Design e Ciclo de Vida A pressão popular proporcionada pela nova legislação está movendo a indústria a adotar práticas de sucesso do passado, como a embalagem retornável, que contempla o item reuso da lógica dos 5 R (Recusar, Repensar, Reduzir, Reutilizar e Reciclar) ou o refil. Alguns, como a Tetrapak, investiram no desenvolvimento de tecnologias próprias para oferecer à sua cadeia a reciclagem do material descartado. Mas esta parece ser uma estratégia isolada, pois as soluções buscadas hoje buscam mais simplicidade nos materiais para poderem ser recicladas com tecnologias mais disseminadas ou na sua retornabilidade para reuso. Os designers apostam muito nas embalagens retornáveis, mas sabem que décadas de investimentos nos descartáveis solidificou uma cultura de conveniência entre os consumidores. No caso da indústria de bebidas não alcoólicas, sai o vidro e entram novas tecnologias. Desde 2008, por exemplo, a Coca-Cola está apostando na garrafa de PET (politereftalato de etila) retornável para reduzir o preço de seu produto e conquistar clientes de baixa renda. Segundo a empresa, a vasilha retornável pode ser reutilizada 25 vezes. Agora em 2011, a AmBev também retomou o conceito retornável para garrafas PET do guaraná Antártica. Há quem desconfie do potencial desse mercado por razões culturais. Como o professor Fábio Mestriner, Coordenador do Núcleo de Estudos da Embalagem ESPM. “As embalagens retornáveis são uma boa alternativa desde que sua logística não complique a vida do consumidor, pois ele já tem coisas demais para fazer e se preocupar. Elas devem dominar uma parte pequena do mercado, pois a praticidade e a conveniência que antes eram um luxo, se tornaram necessidade da vida contemporânea”, disse. Em contraponto, o custo de se gerar impacto ambiental será um motivador para mudanças, pois ele subirá a ponto de forçar a indústria a adotar soluções sustentáveis para seus produtos.
Compartilha dessa opinião Euler Santos, diretor executivo da Verti Ecotecnologias. “O problema é que a disposição dos resíduos no Brasil ainda é barata, custa R$ 40 para jogar uma tonelada num aterro sanitário e R$ 70 para aterros industriais de classe 2 (para materiais inertes)”. Segundo ele, em muitos países da União Europeia, como a Alemanha, é proibido fazer o descarte em aterro. As empresas de coleta de lixo têm também de fazer a triagem, reciclagem e compostagem dos resíduos. Para Santos, em breve, o segmento de embalagens também será contemplado com as obrigações de adoção da logística reversa previstas atualmente pela PNRS para agrotóxicos, resíduos perigosos, óleos lubrificantes, pilhas e baterias, pneus, lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista, produtos eletroeletrônicos e seus componentes. Por conta disso, a designer Elisa Barbosa, especializada em embalagens sustentáveis, confirma a tendência de os designers de embalagens abandonarem a lógica linear do “berço-ao-túmulo” e passarem a trabalhar com a filosofia do “berço-ao-berço”. Também conhecida como C2C (cradle-to-craddle), essa abordagem de
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O designer precisa pensar em todas as entradas de materiais e utilização de energia de um produto durante seu ciclo de vida planejamento de design não apenas transcende a logística reversa, mas procura pensar em todo o ciclo de vida dos produtos considerando todos os impactos ambientais. Desde a obtenção da matéria prima, passando pelo desenvolvimento, produção, até o descarte de forma que seus resíduos possam ser reintroduzidos na natureza, inclusive gerando ativos ambientais, como a geração de subprodutos, ou retornando de forma totalmente reaproveitável à indústria, não necessariamente no mesmo segmento. Há muito disseminada, essa filosofia acaba por fomentar a participação dos designers desde a concepção do produto. Segundo os designers, isso hoje acontece raramente: eles são chamados
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para participar apenas do momento relativo à comunicação da marca. “Passa a ser um design de sistema”, disse Barbosa. O Francisco Manacorda, CEO da consultoria Zero-C Sustainable Design Group, criou uma relação de 10 regras para o ecodesign, entre as quais um dos pontos trata da necessidade de o designer pensar em todas as entradas de materiais e utilização de energia de um produto durante seu ciclo de vida. O indicador de energia consumida para a produção de determinado bem é um dos itens mais importantes na qualificação da sustentabilidade desse produto. “O sol é a fonte de energia inesgotável do planeta”, explica. O grande segredo é a transformação em energia para que possamos utilizar na produção de bens de consumos, serviços etc. Assim é com relação às embalagens: elas consomem energia tanto para serem produzidas e como para serem decompostas. “Quando falamos de embalagem ’eco’ ela tem que produzir negawatts, ou seja a energia gerada em toda a cadeia produtiva da embalagem deve gerar demanda negativa pelas fornecedoras de energia, custo e demanda energética negativa”, explica Manacorda. Ao pensar mais amplamente no ciclo de vida dos produtos é possível estudar e propor soluções de ergonomia, transporte, manutenção das características do produto embalado, maior durabilidade, escolha e redução de materiais apropriados, entre outros
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itens. O uso de novos materiais – como os biopolímeros à base de cana de açúcar e milho e as fibras vegetais – também é objeto de pesquisas de ponta e tendência forte para o design de embalagens. Manacorda também frisa a necessidade de não apenas fazer embalagens recicláveis, mas de se utilizar materiais reciclados. “O caminho ideal é o freio. O mundo não pode mais consumir como o faz. Espero que, no futuro, os designers de embalagem ajudem a constituir novos sistemas de distribuição de bens”, diz Manacorda, mencionando o projeto italiano Cittáslow. Assim, seria possível retomar a cultura pré-guerra da venda à granel? Cético com relação aos avanços do segmento de embalagens, o professor da área de Materiais e de Engenharia Ambiental da
UNESP de Sorocaba, Sandro Mancini, é categórico ao dizer que “nada vai mudar” se não houver um processo educativo sistemático de engajamento do consumidor e das indústrias. “Sem isso não haverá pressão popular e, portanto legislação. Só restarão as regras de mercado”. Estamos ainda nos primeiros rounds do confronto e só a inovação de conceitos, processos e produtos determinará um futuro para a embalagem. Entrarão nesta briga os grandes setores industriais como o do plástico, papel, vidro e metais que montam departamentos inteiros pensando em como enfrentar o novo paradigma que é acondicionar e embalar o que consumimos com menos rastros que no presente e no passado recente. k
CONSUMIDOR E EMBALAGEM: UM DIÁLOGO POSSÍVEL Uma pesquisa realizada em 2008 e lançada em 2009 pela empresa britânica de inteligência de mercado, Datamonitor, revelou o que cidadãos de 15 países das Américas, Europa e Leste da Ásia pensam sobre o excesso de material nas embalagens. Segundo o estudo, 27% dos brasileiros preocupam-se com a sobrecarga de embalagens nos produtos, sendo que 12% são apontados como “muito preocupados”. Esta é a deixa para os designers de embalagens reduzir a pegada de carbono dos produtos e ajudar a educar o consumidor a respeito das formas mais adequadas de praticar os 5 Rs. A redução dos materiais é ponto fundamental da redução da pegada de carbono das embalagens. Para o designer Fred Gelli, fundador da Tátil Design e professor de biônica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) A biomimética é a saída ideal. “Usando ranhuras numa embalagem, é possível reforçar sua estrutura e ao mesmo tempo reduzir a quantidade de material nela aplicada”, explica. A Tátil conseguiu diminuir em 83% o uso de plástico
das embalagens de uma linha de cosméticos da Natura e aumentou a reciclagem. “Tiramos a tinta e pusemos rótulo adesivo removível. Só isso já ofereceu uma grande contribuição ao processo de reciclagem do produto”, conta. Para estimular o reuso, o designer carioca acredita que é possível apresentar a marca adequadamente para que o consumidor tem que ter prazer no uso da embalagem numa nova realidade orientada ao retornável e ao refil. Um exemplo é fazer uma garrafa PET de água mais charmosa para ser adotada como utensílio cotidiano. A designer Elisa Barbosa defende o uso inteligente do design de embalagens para orientar o consumidor a respeito de sua responsabilidade ambiental. “A arte de uma embalagem pode informar e engajar o consumidor para que a forma como ele usa o produto também gere menos impacto ambiental”, diz. Francisco Manacorda, CEO da consultoria Zero-C Sustainable Design Group, diz que o desconhecimento dos materiais por parte dos designers é um ponto fraco muito recorrente que compromete a qualidade dos projetos de design de embalagens sustentáveis. (VG)
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O mundo sem aterros Mesmo sem clareza no cenário dos resíduos sólidos, grandes empresários já traçam cenário para se adaptar e investir em novas oportunidades.
ma coisa está clara para as grandes empresas do mundo: os aterros vão desaparecer na próxima década. Os existentes vão no máximo ser explorados pelo seu metano. Segundo Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), isto vai fazer com que as empresas invistam no próprio setor de tratamento de resíduos, um dos resultados da Política Nacional de Resíduos Sólidos. “[As empresas] que melhor investirem em políticas corporativas de cuidado e tratamento de resíduos e reciclagem ganharão vantagens competitivas. Isto já vem acontecendo. Leia abaixo os principais trechos da entrevista de Grossi à
U
Revista Sustentabilidade. Revista Sustentabilidade: Como ficará o setor empresarial após a implementação da política de resíduos sólidos? Quais serão os grandes players? Marina Grossi: O primeiro fator de importâcia é que a Política Nacional de Resíduos Sólidos é um marco regulatório nacional, que dá fim a problemática de se ter leis diferentes nos municípios e estados. Isso facilita a atração de investimento. Outra vantagem é que a lei vai nivelar a responsabilidade das empresas no que diz respeito à incorporação da sustentabilidade no modo de produção e na forma de pensar os negócios. A política nacional de resíduos sólidos vai reestruturar a
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responsabilidade ambiental das empresas antes e depois do consumo, fazendo com que aquelas que melhor investirem em políticas corporativas de cuidado, tratamento de resíduos e reciclagem, ganhem vantagens competitivas. Isto já vem acontecendo. Cada vez mais empresários se lançam no setor das centrais de tratamento de resíduo em função de sua alta rentabilidade. Indústrias de reciclagem e centrais de tratamento de resíduos estão entre os grandes players em ascensão. Revista Sustentabilidade: Qual o nível de investimentos que será necessário para as empresas se adequarem à nova realidade? Marina Grossi: Investimentos em pesquisa e desenvolvimento serão determinantes na busca por diferenciais competitivos. Novas possibilidades de financiamento especializadas para tecnologias verdes também estão crescendo e se diversificando, e certamente muitos bancos já estão entrando neste mercado. Ainda é muito cedo para que se determine o nível de investimentos necessário. A nova política ainda esta sendo decidida, a partir principalmente da elaboração dos planos nacional, estaduais e municipais de resíduos sólidos, e grupos de trabalho estão sendo formados para se discutir como cada setor poderá trabalhar com questões como a da logística reversa, em que o produtor se responsabilizará pelo destino final do seu produto, incluindo a embalagem.
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Revista Sustentabilidade: Como o CEBDS está orientando ou ajudando seus associados para se adequarem às mudanças? Marina Grossi: O CEBDS está usando como guia para suas ações o documento Visão 2050 que discute o que precisa ser transformado no mundo até 2050, partindo da premissa que nesta data teremos um mundo com nove bilhões de pessoas vivendo com qualidade de vida e sustentabilidade. Este documento divide as questões em nove pilares, e entre eles esta o pilar ‘Materiais’, onde a questão dos resíduos é discutida. Muitos tomadores de decisões estão se apoiando neste documento para o planejamento estratégico de suas instituições, públicas ou privadas, principalmente por que este conteúdo foi gerado por 29 empresas globais de 14 setores da indústria em debates com mais de 200 representantes de empresas, governos e especialistas de 20 países, entre eles o Brasil. Esse ano, o CEBDS está promovendo a “tropicalização” deste
documento. No dia 25 de maio, aconteceu o primeiro workshop para debater o tema com especialistas do Brasil todo, e certamente a discussão sobre a política nacional de resíduos sólidos será aprofundada. Os descompassos entre as diferentes realidades nacionais são sentidos, sem dúvida, no pilar ‘Materiais’, por exemplo. No documento mundial os aterros sanitários são considerados soluções obsoletas a partir de 2020, enquanto no Brasil até hoje o destino final de resíduos sólidos ainda é o lixão, ou seja, o despejo dos resíduos de toda espécie a céu aberto. Pensando nos desafios constituídos para a Sustentabilidade com a realização da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos no Brasil, o CEBDS lançou ainda a publicação Diretrizes para a sustentabilidade dos Megaeventos, que aborda também a questão do tratamento de resíduos e ajuda a orientar as empresas sobre o que vem sendo feito na preparação para esses encontros. k
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Buscando inspiração na natureza para inovar Especialistas de diferentes áreas do conhecimento buscam na natureza inspiração para soluções cada vez mais criativas. Por Giuliano Agmont
uita gente defende a preservação da Amazônia por acreditar que ali pode estar a cura de doenças como a Aids. São pessoas que acreditam no valor da natureza como fonte de matéria-prima para o desenvolvimento de novas tecnologias. De fato, uma região tão rica em biodiversidade tem tudo para prover moléculas com variadas aplicações para diferentes indústrias. Porém, o valor da maior floresta tropical do planeta – assim como o de outros ecossistemas – não se mede
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apenas pelo o que o homem pode extrair dela, mas sim e, principalmente, pelo o que tem a aprender com ela. É o que sustentam os adeptos de uma metodologia científica que emerge com força neste início de século: a biomimética, ou apenas biônica. A ideia básica por trás do biomimetismo, como o próprio nome sugere, é a imitação dos princípios da natureza na busca por soluções para problemas humanos, uma ferramenta valiosa diante dos crescentes desafios de inovação. Não se trata, eviden-
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temente, de um conhecimento novo. Desde os primórdios, o homem se inspira em animais para produzir suas ferramentas. Não é coincidência, por exemplo, a semelhança da lança de nossos ancestrais com os dentes dos grandes predadores. O que mudou é que a sabedoria acumulada pela natureza durante bilhões de anos passou a ser sistematizada e posta em prática em áreas como design, ciência biomolecular e construção civil. “A natureza é um atalho radical na busca de inspiração para os desafios criativos. É tudo copyleft, não precisamos pagar direitos autorais”, acredita o designer Fred Gelli, fundador da Tátil Design e professor de biônica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). “O mais vantajoso desse procedimento, porém, é que os insights vêm alinhados com princípios amigáveis à vida. São projetos prontos e sustentáveis, quase sempre exuberantes”. O criador da logomarca oficial para as Olimpíadas de 2016, inspirada nos morros monolíticos do Rio de Janeiro, se refere ao que ele chama de princípios básicos da natureza: a austeridade, obtida com desperdício mínimo e eficiência máxima; o ciclo, que rege cada um dos processos; e a interdependência, estabelecida pela relação em rede entre os elementos. Os exemplos de sabedoria natural brotam da boca de Gelli como sementes que germinam no campo. Ele gosta de dizer que a flor é um dos cases de marketing de maior sucesso da história vegetal. “É uma evolução relativamente recente, nem sempre insetos e pássaros tiveram a função de agentes polinizadores, mas hoje 95% das plantas usam flores para se reproduzir. Porque é uma garantida de diversidade, o que significa maior capacidade
O valor da maior floresta tropical do planeta e de outros ecossistemas não se mede apenas pelo que o homem pode extrair dela, mas sim pelo que tem a aprender com ela de sobrevivência diante de mudanças no meio ambiente”, explica o designer, que gosta de falar também das diferentes embalagens naturais, como a placenta, as cascas de frutas e as sementes. A convicção de Gelli em torno da biomimética o aproximou de uma das principais pesquisadoras do assunto, a norte-americana Janine Benyus, autora do livro “Biomimetismo: Inovação Inspirada pela Natureza”, editado no Brasil pela Cultrix. Hoje, ambos estão envolvidos em um projeto de desenvolvimento de novas soluções criativas para a Natura, empresa de cosméticos. “A Janine pesquisou 30 diferentes espécies de seres vivos e agora vamos utilizar esse conhecimento para o desenvolvimento de projetos dentro da Natura. Uma das fontes de inspiração que pretendemos aproveitar é a concha de um caramujo, que tem uma estrutura leve e resistente, algo desejável para uma embalagem”.
Ao lado: estrutura metálica nervurada garante maior resistência, assim como as nervuras na concha abaixo
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Teias de aranha e nervuras das folhas combinam geometria e leveza para maior eficiência na estrutura
Outra atuação importante do professor Fred Gelli na área de biomimética é sua parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) para o estudo do ambiente marinho, em especial dos recifes de corais, que representam 1% dos oceanos e concentram 50% da população de peixes, como as metrópoles. “É um ambiente absolutamente competitivo, mas todas as relações são regidas pelo ganha-ganha. Queremos entender como isso pode ser incorporado nas relações corporativas e estabelecer uma dinâmica do que chamamos bionegócio. Ou seja, uma dinâmica sustentável em que todos ganham, o que significa uma mudança de paradigma nas relações capitalistas”, diz. Na área da construção civil, a natureza também volta a ser foco de inspiração para engenheiros e arquitetos com a emergência da biomimética. O telhado verde é um exemplo clássico. “Numa floresta, a maior parte da água é absorvida e filtrada pelo solo, que também responde por grande parte do ciclo do carbono. Com o telhado verde, 70% da água que cai na cobertura é absorvida e pode ser reutilizada para regar outros jardins”, ilustra o arquiteto Tomaz Lotufo, autor do site www.bioarquiteto. com.br e adepto da permacultura, que prevê o desenvolvimento
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de culturas permanentes. Ele também cita o exemplo das folhas de palmeiras. “É uma estrutura que oferece pouca resistência ao ar, apropriada para regiões onde se venta muito. Esse princípio pode ser imitado na arquitetura”. Mas uma das soluções mais engenhosas que o arquiteto gosta de mencionar é a do sistema de tratamento do esgoto doméstico inspirado em brejos. Segundo ele, o ecossistema de regiões pantanosas favorece a decomposição de materiais orgânicos. “É possível construir um jardim no quintal com características de brejo e escoar o esgoto da casa para lá. Basta cavar uma área de cerca de 30 centímetros de profundidade e colocar ali pedras, terra, areia e plantas brejeiras, como o junco. A atividade biológica dessa área filtra o esgoto e o que sai na outra ponta do brejo é uma água apropriada para ser devolvida para a terra”, explica Lotufo. É claro que um sistema sustentável como este não aceita nenhum produto que não seja biodegradável, o que obriga a casa a funcionar com uma inteligência natural. A busca de inspirações na natureza é uma tradição que Tomaz herdou de seu pai, o arquiteto Vitor Lotufo, proprietário e idealizador dos restaurantes Oficina das Pizzas e Matterello,
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Aprendi que não precisamos necessariamente copiar as formas da natureza, mas seguir seus princípios norteadores na Vila Madalena, em São Paulo, cujas estruturas tem estreitas semelhanças com leis naturais, como a que se vê em cogumelos. “Aprendi com ele que não precisamos necessariamente copiar as formas da natureza, mas seguir seus princípios norteadores, o que inclui padrões e ciclos”, esclarece o permacultor. “Meu pai construiu uma casa com blocos de cupinzeiros, por ser uma estrutura rígida e térmica ao mesmo tempo, o que lhe permite retardar a troca de calor entre os lados de dentro e de fora e deixar a casa quente à noite e fresca durante o dia”. Mais um exemplo biomimético das obras da família Lotufo são as extensas coberturas parabolóides hiperbólicas, feitas com grandes nervuras estruturais. “Temos ali o princípio das folhas. Usamos o mínimo
Padrões repetidos combinam estética com utilidade
de materiais com máxima rigidez. Se segurarmos uma folha de papel de qualquer jeito, ela tende a cair. Agora, experimente colocar o dedão no meio dela, ficará rígida, é o que a natureza faz para economizar energia”, explica Tomaz. A biomimética também fornece infinitas referências para a ciência biomolecular. Que o diga o físico Carlos Renato Rambo, coordenador do Núcleo de Pesquisas de Materiais Cerâmicos e Vidros (CERMAT) do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele vem desenvolvendo em parceria com o CTA (Centro Tecnológico Aeroespacial) um sistema plano de refrigeração de satélites por capilaridade, inspirado na arquitetura celular de uma planta chamada rattan. “É um sistema que não precisa de bateria para funcionar. Ele usa o mesmo princípio de transporte de seivas das árvores. Um líquido circula por capilaridade de forma contínua entre a face voltada para o sol, quente, e a voltada para a sombra, fria, garantindo a manutenção da temperatura do satélite”, explica Rambo, que obteve os primeiros resultados em 2009 e deve colocar em prática sua invenção em 2012. “As propriedades dos materiais, o que vale para rigidez, flexibilidade, leveza ou qualquer outra, estão na forma como são construídos e por isso a observação da natureza ganha cada vez mais espaço nas discussões de inovação”. k
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Revista Sustentabilidade: contribuindo para o protagonismo do Brasil na trilha para o desenvolvimento limpo O Brasil enfrenta o desafio de realizar a transição para uma economia de baixo carbono e mais limpa sem deixar de crescer. A inovação verde, a economia verde e o desenvolvimento baseado em padrões éticos trarão empregos sustentáveis, sobretudo com o advento de empresas de base tecnológica, muitas que já estão incubadas nas universidades, que gerarão mais empregos estáveis com longevidade. A Revista Sustentabilidade tem a missão de transcrever, incentivar e contribuir para o desenvolvimento verde e consciente do país, lançando luz e promovendo reflexões para o debate. Convidamos todas as empresas que apostam no protagonismo do Brasil como um país social e ambientalmente responsável a participar conosco das próximas edições publicando seus relatórios sociais, de sustentabilidade e com seus ativos intangíveis. Vamos juntos rumo ao futuro limpo e com crescimento!
Ailton Oliveira Diretor Executivo InvestVida Brasil* *InvestVida Brasil é parceira da Revista Sustentabilidade na representação comercial e projetos especiais
As próximas edições impressas serão: • agosto/setembro abordando eficiência energética e energias renováveis; • novembro/dezembro abordando COP17 e empresas que mais inovam para a sustentabilidade.
Reserve já o seu espaço! www.revistasustentabilidade.com.br comercial@revistasustentabilidade.com.br Telefone: (11) 3105-1143
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{ artigo 49 reciclagem
PNRS: a lei pegou A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) entrou em vigor há menos de um ano e já estimula a estruturação de um novo e importante segmento econômico no País Por Arnaldo Jardim e José Valverde Machado Filho *
penas 25% de todos os resíduos são recuperados ou reciclados, segundo o recente relatório do PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, intitulado “Rumo a uma Economia Verde: Caminhos para o Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza”. O documento alerta que o mundo deverá gerar 13 bilhões de toneladas de resíduos urbanos até 2050.
A
Desafio Global e potencial econômico O PNUMA destaca ainda que o mundo precisará investir US$ 108 bilhões/ano no “esverdeamento” do setor de resíduos, o suficiente para triplicar a reciclagem de resíduos até 2050 e reduzir em 85% a quantidade de rejeitos encaminhados a aterros sanitários. No Brasil, atualmente a reciclagem gera US$ 2 bilhões/ano, ou seja, 0,3% do PIB, além de evitar a emissão de 10 milhões de toneladas de gases de efeito estufa. Todavia, a prevenção e o manejo de resíduos permanecem como um grande desafio, pois embute a necessidade de repensarmos os atuais processos produtivos, sob o foco de produzirmos mais utilizando menos recursos naturais, além da necessidade de investirmos na inovação tecnológica, que pode criar toda uma gama de novos produtos que poderão, inclusive, influenciar nos modos de consumo da população. Neste aspecto reside um potencial formidável para toda uma cadeia produtiva que começa a se estruturar no País a partir da regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Há um ano sancionada, a PNRS está em meio a um
célere processo de implementação por parte do Governo Federal e conta com a atenção do setor empresarial e da sociedade. Decreto de regulamentação Sob o argumento de assegurar a manutenção do espírito participativo que permeou o processo de formulação da PNRS, liderado pelo Poder Legislativo, conseguimos aprovar a realização de audiência pública, na Comissão de Desenvolvimento Urbano, com a Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. Além disso, temos participado de inúmeros eventos, em todas as regiões do país, para sanar dúvidas, conhecer as dificuldades de implementação e acompanhar o processo desencadeado a partir desta política pública transformadora. Responsabilidade compartilhada Fundamentada no artigo 225 da Constituição Federal, a Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida dos Produtos foi reafirmada no decreto e se destaca como o pilar de sustentação da PNRS, ao garantir a segurança jurídica na atribuição de responsabilidades, individualizadas e encadeadas, seja do Poder Público, fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes e consumidores. Assim como, os acordos setoriais foram fortalecidos, se constituindo como um instrumento preferencial do Executivo para estruturar a logística reversa. Foram detalhados os procedimentos para a sua implantação, que poderão ser iniciados pelo Poder Público (precedidos de editais de chamamento), ou por fabri-
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cantes, importadores, distribuidores ou comerciantes. Entre os avanços, podemos destacar a previsão de participação das entidades na sua elaboração e a possibilidade dos acordos se tornarem regra em todo o território nacional. Termos e regulamentos Apesar de pouco detalhado na regulamentação, o Termo de Compromisso não deve ser desprezado, pois diante da ausência de acordos setoriais, estes poderão se constituir num instrumento viável para agilizar pactos individuais de empresas com o Poder Público e assim garantir a execução da logística reversa e demais exigências impostas pela legislação. A ausência de acordos e termos poderá ser suprida por meio de regulamentos advindos do Governo. Logística reversa A logística reversa é um conceito que veio para ficar e a tendência é que seja estendida à produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas, vidros e as demais embalagens. Neste ponto, vale saudar a iniciativa do Governo Federal de instituir um Comitê Orientador, composto pelos ministérios do Meio Ambiente, Saúde, o Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e da Fazenda. Empossado e definido o “modus operandi”, o Comitê já está em funcionamento e está priorizando setores como o de eletroeletrônicos, lâmpadas, resíduos de saúde e embalagens de óleo lubrificantes, no sentido de iniciarem os diálogos para construírem seus próprios acordos setoriais. Este Comitê, inclusive, pode convidar as entidades representativas de setores diretamente impactados pela logística reversa a participar das suas discussões técnicas. Planos de gestão A proposta preliminar do Governo para o plano de gestão nacional é aguardada para junho próximo e estará fundamentada por estudos, excetuando-se a previsão das condições de acesso aos recursos da União. Até o momento, não houve avanços expressivos, como por exemplo, no detalhamento de cooperação técnica para estimular Estados e Municípios a elaborar seus respectivos planos. Todavia, saudamos a interação dos planos de resíduos sólidos com os planos de saneamento básico, sobretudo por promover compatibilidades, ganhar eficiência e otimizar os custos de elaboração de ambos os planos.
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Reforçadas as prioridades para a instituição de microrregiões e soluções consorciadas, podemos verificar que existem iniciativas em curso, como o Consórcio Público de Saneamento Básico da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (Pró-Sinos), no Rio Grande do Sul, que reúne 23 municípios e já trabalha na integração do plano de saneamento com o plano de resíduos sólidos em elaboração. Em relação aos planos de gerenciamento sob incumbência do setor empresarial, pouco se avançou, o que suscita dúvidas de quando serão exigidos. Para nós, temos claro que os planos já podem ser exigidos, especialmente em atividades que demandarão obtenção de licença ambiental. Instrumentos econômicos Faltou consistência e objetividade por parte do Governo, especialmente do Ministério da Fazenda, na instituição de medidas concretas sobre os instrumentos econômicos, mas já há descrição de medidas indutoras, como: incentivos fiscais, financeiros e creditícios; cessão de terrenos públicos; subvenções econômicas; fixação de critérios, metas e outros dispositivos complementares de sustentabilidade ambiental para as aquisições e contratações públicas e pagamento por serviços ambientais (projeto que, inclusive, tramita na Câmara dos Deputados). Além disso, a regulamentação abre a possibilidade de instituições financeiras federais criarem linhas especiais de financiamento para cooperativas e associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, objetivando: a aquisição de máquinas e equipamentos a serem utilizados na gestão de resíduos sólidos; atividades destinadas à reciclagem e ao reaproveitamento dos resíduos; atividades de inovação e desenvolvimento relativas ao gerenciamento de resíduos sólidos e atendimento a projetos de investimentos. Neste aspecto, há também a necessidade de estimularmos as Parcerias Público Privadas para garantir os recursos necessários para toda a reestruturação exigida por lei. Geração de energia Sobre a recuperação energética dos resíduos, foi acertada que a matéria será disciplinada de forma específica em ato conjunto dos Ministérios do Meio Ambiente, de Minas e Energia e das Cidades. Contudo, não podemos abrir mão deste debate, pois são reais as exigências das grandes cidades que têm, anualmente, aumentado os percentuais de geração de resíduos.
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Instituído o Comitê Interministerial – coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e composto por representantes de nove ministérios, da Casa Civil e da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República–, já foi empossado, no último mês de março, e terá a incumbência de apoiar estruturação e execução deste marco regulatório. Estimular a reciclagem Suprir as deficiências existentes e estabelecer avanços serão exigências aos titulares dos serviços públicos de limpeza e planejamento no que se refere à coleta seletiva formal, além de priorizar a participação das cooperativas de catadores. Os últimos dados da Pesquisa Nacional de Saneamento (2008) apontam a existência de coleta seletiva em apenas 994 municípios brasileiros. Considerações finais A aplicação da PNRS e seu Decreto de regulamentação nos permitirão percorrer esse imenso caminho que temos pela frente e
de imediato começar a recuperar o tempo perdido, que resultaram em proliferação de lixões, ineficiência dos padrões produtivos e estagnação da consciência ambiental. O tema demanda do Poder Público, do setor empresarial e da coletividade, um conjunto de iniciativas que nos garantam modernidade na gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos. k
* Arnaldo Jardim é Deputado Federal pelo PPS de São Paulo. Foi coordenador do Grupo de Trabalho que discutiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos e é membro da Frente Ambienalista da Câmara dos Deputados. José Valverde Machado Filho é especialista em direito ambiental
e gestão ambiental.
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Florestas: por que as queremos de pé? O Mundo busca um mecanismo para comprovar que temos mais a ganhar mantendo florestas de pé do que derrubando-as, mas a busca do consenso ainda é difícil Por Sílvia Dias
egundo as estimativas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), se o mundo investisse US$30 bilhões para combater o desmatamento das florestas, o retorno seria de US2,5 trilhões em novos produtos e serviços com ageração de 10 milhões de novos empregos. Esta é uma das principais motivações das comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente neste ano de 2011, cujo o lema é Florestas: Natureza a seu serviço. A Índia foi escolhida pela comunidade internacional para ser o país sede do Dia Mundial do Meio ambiente. Lá, apesar de todo seu avanço tecnológico e acelerado crescimento econômico, a população de 1,2 bilhão de pessoas exerce forte pressão sobre suas florestas remanescentes. O mesmo acontece no Brasil: a florestas são as fronteiras agrícolas do grande negócio de agricultura e fonte de energia e recursos para milhões de famílias de baixa renda. Não importa se pensarmos na Índia, na Indonésia, no Panamá ou no Brasil, o desafio é o mesmo: buscar um jeito de manter as florestas de pé. Pensando além da simplória taxa de retorno de investimento de US$ 83 dólares para cada dólar investido, ao manter as florestas de pé ganharíamos em qualidade de vida, no combate direto ao aquecimento global, em melhoria no regime das águas mundiais, em diversidade biológica e cultural e, principalmente, na garantia do futuro das comunidades locais e do planeta. Mas, é uma tarefa árdua, o desmatamento continua a taxas alarmantes de 13 milhões hectares por ano e, como estamos vendo
S
no nosso Congresso Nacional no debate da atualização do Código Florestal, nem todos consideram florestas de pé um patrimônio. Querem usar as florestas sim: para derrubá-las. Mas, numa estreita trilha aberta nas negociações internacionais, é possível vislumbrar um jeito de conscientizar os cabeças de planilha, pagando para manter as florestas em pé e pelos serviços ambientais que podem ser prestados. São fundos nacionais e internacionais e, principalmente, o mecanismo REDD (sigla em inglês para redução das emissões causadas pelo desmatamento e degradação), hoje REDD+, criado nas negociações do mundiais de clima no âmbito de 2008. A lógica é simples, os países e instituições se juntam, alocam dinheiro em fundos, desenvolvem critérios de redução de emissão de carbono para os projetos de manter florestas de pé e desembolsam o dinheiro. Hoje, são mais de US$6 bilhões já prometidos pelos países mais ricos para o mecanismo. Mas, isso não quer dizer que o dinheiro está chegando pois, como tudo que tramita na ONU, leva anos para sair do papel. Na verdade, no caso do REDD+ levou mais de um ano apenas para começar a implementação e cerca de dois anos para terminá-la. A Índia, por exemplo, deve enquadrar o seu primeiro projeto do mecanismo REDD+ este ano. O Brasil tem sete, a maioria em fase de desenho. A Bolívia tem um projeto em fase de estudos, e por aí vai. A seguir, explicamos um pouco do mecanismo REDD.
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Desbravando o REDD Uma árvore, além de um ativo da biodiversidade, é também um estoque de carbono: durante anos (em alguns casos, séculos), ela absorve, por meio da fotossíntese, o gás carbônico da atmosfera. Se queimada volta a liberá-lo – o que, aliás, já acontece, e em uma escala preocupante. Hoje as emissões geradas por queima de floresta oscilam em torno de um quinto de todos o gases causadores do efeito estufa que liberamos na atmosfera. Só o setor energético emite mais! Mas olhar para as florestas como um instrumento para retardar as mudanças climáticas só aconteceu depois que as negociações climáticas em si já haviam começado: onze anos depois, para sermos exatos. Foi na CoP11, realizada em Montreal, Canadá, a Convenção Quadro da ONU para Mudanças Climáticas (UNFCCC) que este conceito foi adicionado ao rol de ações de mitigação. Ele veio complementar os já existentes Mecanismos de Desenvolvimento Limpo, estabelecidos dentro do âmbito do Protocolo de Quioto. Em 2009, na CoP15, de Copenhague, começouse a desenhar o texto regulamentando o mecanismo, mas assim como as negociações em torno dos impactos do uso da terra, mudanças no seu uso e reflorestamento (ou LULUCF,na sigla em inglês usada nas negociações climáticas), também REDD avança lentamente, sob o peso dos fortíssimos lobbies do agribusiness e das indústrias de papel e madeira. Não se trata simplesmente de querer preservar o direito de desmatar, mas de ter culturas florestais, tais como palma e eucalipto, consideradas como florestas capturadoras de CO2 – o que gera inúmeras distorções na contabilidade das emissões e na destinação dos recursos financeiros. Tanto que um dos avanços obtidos recentemente foi excluir a expressão “floresta plantada” desse mecanismo, que avançou da
meta originária de manter florestas em pé (RED) para aumentar o estoque de carbono das florestas (REDD+). No ano seguinte, na CoP16, realizada em Cancún, México, a questão indígena entrou definitivamente na pauta – e no texto, que agora inclui salvaguardas aos direitos dos povos que residem nas florestas.
Financiamentos prosseguem mesmo sem marco regulatório O castelo de Abrantes, onde tudo continua como dantes, é a questão do financiamento das ações, ficou para ser decidido na CoP17, no final deste ano, em Durban, na África do Sul. O que está em jogo é se os recursos serão públicos, privados ou um mix de ambos. Como era de se imaginar, os países desenvolvidos veem o financiamento privado com bons olhos, em oposição a ONGs ambientais e movimentos sociais, que temem a mercantilização das florestas. Também aguardam definição os parâmetros de mensuração, verificação e relato (MVR) que devem ser aplicados para avaliar a efetividade das iniciativas implementadas. Enquanto o marco regulatório e os fundos oficiais não saem, as iniciativas prosseguem em três trilhas: por meio de fundos voluntários de governos, como o da Noruega (as doações para o Fundo Amazônia integram o raciocínio REDD) ou fundações (como a do Príncipe Charles), reunidas na REDD+ Partnership, pelo Programa REDD das Nações Unidas e ainda em ações individuais baseadas no mercado global de carbono. Segundo a REDD+Partnership, de 2008 em diante, os países desenvolvidos destinaram (embora não necessariamente tenham desembolsado) US$ 6,2 bilhões para iniciativas REDD+ (ver gráfico abaixo). O Brasil aparece como o segundo principal destino desses recursos, atrás apenas da Indonésia (ver tabela na página seguinte).
Recursos prometidos para o REDD, proporcionalmente por país (total de US$6,2 bilhões) Noruega
46%
Japão
24%
França Alemanha UK
2%
Finlândia
2%
Suécia
5%
União Europeia
Austrália
4%
Suíça
1% 1%
Dinamarca
4%
1%
3%
Estados Unidos
3%
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Outros
4%
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55
Destino dos recursos para REDD+ Outros 78% do financiamento realcionado ao REDD+ está concentrado em quatro países
Bolívia México Gana
Acesso a financiamento varia: alguns países têm várias fontes, mas a maioria tem apenas uma
Chade
Países
Nepal Etiópia Congo Laos Vietnã Tanzânia China Guiana Índia Brasil Indonésia 0%
5%
10%
Indonésia
Brasil
15%
Índia
Guiana
20%
25%
30%
35%
40%
China
Tanzânia
Vietnã
Laos
Congo
Etiópia
Nepal
Chade
Gana
México
Bolívia
Total de todos os países
30,2%
22,6% 19%
5%
2,4%
2,3%
2,3%
1,3%
1,1%
0,9%
0,8%
0,8%
0,7%
0,7%
0,6%
Financiamento bilateral
30,5%
24,1% 20,8%
5,3%
2,5%
2,3%
2,3%
1,2%
0,5%
0,9%
0,8%
0,1%
0,6%
0,4%
0,4%
Financiamento multilateral
27,5%
7,4%
1%
1,5%
2,9%
2,0%
0,9%
7,9%
0,9%
0,9%
8,3%
0,9%
2,8%
3,6%
0
Percentagem do total de recursos
Brasil, oportunidade ou risco?
colocam o país em uma posição bastante confortável para ne-
Para o Brasil, REDD é uma verdadeira janela de oportunidade. Primeiro, porque foca justamente a principal causa de emissão dos gases causadores de efeito estufa em nosso país: o desmatamento. Segundo, porque o tamanho de nossas reservas florestais nos credencia a sermos grandes destinatários desses recursos. Não por acaso, o governo foi bastante ágil na criação de mecanismos para captura e gestão desse dinheiro, como o Fundo Amazônia e o Fundo Nacional sobre Mudanças Climáticas. Junto com os sistemas de monitoramento via satélite e um incipiente diálogo com as comunidades locais, estes fatores
gociar em prol desse mecanismo. Segundo o Guia de Projetos REDD na América Latina, o Brasil possui sete projetos que devem reduzir 267 milhões de toneladas de CO2 e em até 44 anos.
Como viabilizar um projeto REDD Inúmeras instituições e comunidades ao redor do mundo se preparam para captar recursos provenientes dos mecanismos estabelecidos pelo REDD, mas esse ainda é um caminho em construção. É certo que já existem vários critérios balizadores.
Revista Sustentabilidade Edição Especial
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Por exemplo, o projeto deve ser nacional, uma vez que ele é classificado, nas negociações climáticas, como NAMA, Ação Nacionalmente Apropriadas de Mitigação. Deve também ser aplicado em florestas nativas e não matas replantadas e sua degradação prévia ao projeto deve ser claramente comprovada. É preciso, ainda, respeitar os direitos dos povos indígenas e, principalmente, equacionar legalmente a quem devem ser destinados os direitos da floresta. Por fim, deve contemplar mecanismos de mensuração, verificação e relato que possam ser compartilhados e checados. Preenchendo tais requisitos, o projeto pode ser apresentado a um agente financeiro para ser equacionado no mercado de créditos de carbono. Este é o caso, por exemplo, do projeto Ulu Masen, na Indonésia, que levantou US$ 2 milhões em uma captação conduzida pelo Merryl Lynch via mercado de carbono. Ou do projeto piloto em East Khasi Hills, gerenciado conjuntamente por uma comunidade local e por uma ONG norte-americana e que poderá colocar a Índia ainda este ano no mapa-mundi do REDD. Iniciado em 2005 pela Community Forestry International (CFI) e pela comunidade Mawphlang, ele visa preservar 75
hectares na base da bacia hidrográfica do Umiam. As negociações com a Parceria para o Carbono Florestal do Banco Mundial visam formatar o projeto como uma iniciativa REDD. Conta pontos, para isso, o fato de que comprovadamente essa região teve sua cobertura vegetal diminuída em 5,6% entre 2001 e 2005, além do fato de que a comunidade conseguiu provar seus direitos sobre a área do projeto. Outra opção é o acesso via os fundos nacionais alimentados pela REDD+Partnership, como é o caso do Fundo Amazônia. Mas se o país integrar os beneficiários do UN-REDD Program, é possível buscar suas linhas de financiamento, que já aprovaram (mas não necessariamente transferiram) US$ 55,4 milhões para nove projetos piloto. Esta é uma ação colaborativa iniciada em 2008 integrando vários braços das Nações Unidas: Fundo para Alimentação e Agricultura (FAO), Programa de Desenvolvimento (UNDP) e Programa Ambiental (UNEP). Hoje ele conta com 29 países parceiros na África e Ásia, além da América Latina, treze dos quais recebem apoio para desenvolver atividades locais: Bolívia, Cambodja, República Democrática do Congo, Equador, Indonésia, Panamá, Papua Nova Guiné, Paraguai, Filipinas, Ilhas Salomão, Tanzânia, Vietnã e Zâmbia.k
CONHEÇA O MAIOR PROJETO QUE BUSCA RECURSOS REDD+ NO BRASIL: ACRE O projeto Acre ou PSA Carbono é o maior em termos de
e moradores da região por serviços ambientais que vão de
área de floresta incluída. São 5,8 milhões de hectares em
ações desde o extrativismo sustentável ao gerenciamento
oito municípios na fase inicial do projeto. Proposto pelo
de ativos florestais.
governo estadual em parceria como entidades ambientais e
Nas áreas de florestas já degradadas prevê-se o reflo-
governamentais estrangeiras, a implementação do projeto
restamento denominadas de: dendê, seringueiras, florestas
vai custar mais US$300 milhões.
energéticas e floresta industriais. Nas áreas onde ainda exis-
Durante os 15 anos do projeto, prevê-se que 62 mi - tem florestas de pé, busca-se incentivar produtos flolhões de toneladas sejam deixadas de serem emitidas. O
restais e gestão sustentável com incentivos fiscais e bônus.
programa extensão busca pagar os proprietários das ter-
No final, os proponentes do projeto também pretendem
ras, prestadores de serviços, concessionários de florestas
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vender créditos e carbonos oriundos do projeto.
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PARA SABER MAIS • Resolução CANCUN http://unfccc.int/resource/docs/2010/cop16/eng/07a01.pdf #page=2
• REDD+ Partnership Meetings Documents - http://redd pluspartnership.org/65563/en/ • Portal REDD+ Brasil – http://www.florestal.gov.br/redd/
• REDD Web Plataform - http://unfccc.int/methods_science/redd/items/4531.php
• REDD no Brasil - http://www.ipam.org.br/biblioteca/livro/ REDD-no-Brasil-um-enfoque-amazonico-fundamentos-criterios-e-estruturas-institucionaispara-um-regime-nacional-deReducao-de-Emissoes-por-Desmatamento-Florestal-REDD/583
• Programa REDD das Nações Unidas - http://www.unredd.org/ • The Little REDD Book http://www.amazonconservation.org/pdf/redd_the_little_red d_book_dec_08.pdf • UFCCC Fact Sheet on Deforestation http://unfccc.int/files/press/backgrounders/application/pdf/fa ct_sheet_reducing_emissions_from_deforestation.pdf
• Guia de Projetos REDD na América Latina http://www.idesam.org.br/noticias/informa/2010/pdf/Guia%2 0de%20Projetos%20de%20REDD+%20na%20America%20Latina.pdf • Projeto Merryl Lynch – http://www.environmental-finance.com/news/view/1523
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