6 minute read
O ser livre e as impressões do espaço e do tempo
Um pequeno transcorrido filosófico sobre a compreensão do mundo
Cleusa Rossetto
Advertisement
Ao entrarmos nesta senda sobre a compreensão do mundo, vale um pouco de filosofia, como intuito de ampliar a forma de entendimento sobre nossa participação no espaço e no tempo. Comecemos por David HUME, num texto escrito por Michelle VAZ, onde o autor explana que o pensamento parece não possuir limites, mas que encontrase detido à “limites bastante estreitos, e que todo esse poder criador da mente consiste meramente na capacidade de compor, transpor, aumentar ou diminuir os materiais que os sentidos e a experiência nos fornecem” (HUME, 1999, p. 13). Os pensamentos possuem leis através das quais ligam-se ao intelecto, ou seja, há famílias de ideias que montam várias formas de discurso – desde conversas triviais até um raciocínio mais grave. Os princípios de conexões também se aplicam aos sonhos: a imaginação possui a capacidade de fazer presente o que está ausente, enquanto a memória é a capacidade de armazenar imagens e palavras. Ambas não funcionam sem regras, sem uma lógica de ligação entre os pensamentos e as imagens – os quais são tarefas da memória e da imaginação. Ao admitir tais leis, faz-se notório um resquício metafísico em HUME, já que parece haver uma crença, por parte do filósofo, em uma ordem interna de acordo com as quais as associações se dão. Nas composições geniais, é imprescindível que o autor possua um plano ou objeto. Ademais, em composições narrativas, os eventos ou atos relatados pelo escritor devem estar unidos por algum elo, precisam estar ligados uns aos outros na imaginação a ponto de formar uma espécie de unidade que seja capaz de colocá-los em somente um plano, com apenas um ponto de vista. O princípio de conexão que há entre diferentes eventos forma o tema de uma história ou de um poema. HUME propõe-se a analisar o motivo que acarreta a necessidade de uma unidade mais próxima e mais estrita durante a fabulação da poesia. Primeiramente, o filósofo afirma que toda poesia – uma espécie de pintura – aproxima-nos mais do objeto do que outro tipo da narrativa, ilumina esse objeto com mais força
e delimita de maneira mais precisa as menores circunstâncias da história, cuja função é de deixar mais vivas as imagens e satisfazer a imaginação. Essa criação do leitor é estimulada pela sequência de descrições poéticas e suas paixões são estimuladas pela simpatia constante com os atores. As mentes humanas são formadas pela natureza, de modo que se aplicam a todos os seres humanos os princípios dos quais se parte para organizar os dados da experiência. HUME, apud VAZ, aceita apenas três princípios de conexão de ideias: o princípio de semelhança, o princípio de contiguidade no tempo e no espaço, e o princípio de causa e efeito. A relação entre estes e a linguagem é evidente: é através destes princípios que as ideias entram na mente e concebem diferentes discursos, que podem ou não serem convincentes, segundo a afinidade entre aquelas (ideias). Os limites do entendimento humano são, pois, conhecer apenas o que é dado aos sentidos, e, assim, o sujeito cognoscente é tomado como finito. As ciências também embasam-se na associação de ideias ou de pensamentos, na crença da veracidade destas associações. Contudo, apoiam-se em impressões as quais originam os pensamentos e estes, ao serem combinados de acordo com os princípios mentais de associação, produzem as palavras e o relato de seu mundo. Já, para Markus GABRIEL há de se repensar a filosofia. Entre outras questões aparecem: “Como podemos entender nossa existência ou, inclusive, a existência em geral? E até onde chega nosso entendimento?” Então GABRIEL desenvolve o princípio de uma nova filosofia a partir de que o mundo não existe. Existem nossos planetas, nossos sonhos, a evolução, gente que culpa o banho pela queda do cabelo, esperanças, partículas elementais e inclusive unicórnio na lua, e a não existência do mundo inclui tudo o mais que possa ser criado pela imaginação. O novo realismo descreve uma postura filosófica para uma era “pós-moderna” tentando começar do zero, depois das grandes promessas de salvação da humanidade que anunciaram as religiões, a ciência moderna 9
e até as idas políticas radicais de totalitarismos de esquerda e direita, ocorrendo uma ruptura com a tradição e a liberdade da ilusão de que existe um sentido para a vida que aspiramos. Criou-se então novas ilusões sobretudo das que estamos encalhados. A pós-modernidade queria dar um sinal de que a humanidade padece, desde a pré-história, de uma perigosa alucinação coletiva: a metafísica, que tenta desenvolver uma teoria do todo. De como o mundo é, e não de como se apresenta. O mundo é o âmbito de tudo o que existe sem nossa intervenção e que nos inclui. A ele pertence os Estados, os sonhos, as possibilidades não realizadas, as obras de arte e também nossos pensamentos, sobre tudo. Portanto, para GABRIEL, “o MUNDO somente pode ser definido, como o que abraça tudo, o âmbito de todos os âmbitos. Desta maneira, o ele seria no âmbito não somente de todas as coisas, e feitos que existem sem nossa intervenção, como também todas as coisas e feitos que somente existem por nós mesmos, e finalmente abrangendo tudo: a vida, o universo e, evidentemente, todo o demais.” Mudamos nossa imagem própria e de nosso entorno, e a cada instante nos adaptamos a uma situação na qual nunca antes nos havíamos encontrado. Isto também passa com o mundo. Segundo GABRIEL, “Também existem muito mais coisas do esperado, a saber, tudo o quê não é mundo. Afirmo que existem unicórnios vestidos com uniformes de polícia na face traseira da lua. Pois este pensamento existe no mundo e, com ele, os unicórnios vestidos de polícia. Ao contrário, até onde sei não existem no universo. Não posso comprar um vôo à Lua com a NASA, para fotografá -los. E que passa com todas as demais coisas que aparentemente não existem: duendes, bruxas, armas de destruição em massa em Luxemburgo, etc.? Isto acontece no mundo, por exemplo, em traduções equivocadas, nos contos, ou nas psicoses.” “Existe tudo o que não existe, excepto que tudo isto não existe no mesmo âmbito. Há duendes em contos, porém não em Hamburgo, há armas de
destruição em massa nos Estados Unidos, porém — até onde sei — não em Luxemburgo. Simplesmente a pergunta nunca deve ser se existe algo, mas sim, onde existe algo, pois tudo o que existe, existe em algum lugar, ainda que seja somente em nossa imaginação. A única exceção é, de novo, o mundo.” GABRIEL também cita que “na modernidade recente se fez evidente que, com o progresso científico, multiplicamos as perspectivas sobre o mundo, de maneira que já não se pode dizer com facilidade a que perspectiva deva se dar a prioridade. Isto conduz ao descobrimento do infinito em muitos âmbitos e pode inclusive se dizer que ainda batalhamos para pensar o infinito de uma maneira suficientemente grande de verdade, pois não somente existem infinitas coisas, como também infinitas perspectivas do infinito”. A temática segue longe, assim que, convém observar que a arte, suas impressões do tempo e do espaço apresenta uma linguagem carregada de significados e significância onde, segundo GABRIEL, qualquer que seja a interpretação o processo de compreensão de nenhuma maneira é absurdo, mas sim livre. A liberdade para compreender obras de arte consiste em que compreendemos algo e a sua vez experimentemos como o compreendemos.
Referências Bibliográficas:
- GABRIEL, Markus, Por qué no existe el mundo. ePub r1.1 Titivillus. 15.06.2020. - HUME, David, Investigação acerca do entendimento humano. São Paulo: Nova Cultural, 1999. - VAZ, Michelle, Os princípios de associação de ideias. Psicologia MSN - Tudo sobre Psicologia. https://www.psicologiamsn.com/2013/11/os -principios-de-associacao-de-ideias-david-hume.htm. 14 p.