Guia microfinanceiro

Page 1

Guia microfinanceiro sensível ao género

ASEG

Programa de Análise Sócio-Económica e de Género

Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação


As referências feitas nesta publicação e a apresentação dos dados incluídos não implicam por parte da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura qualquer tomada de posição nem com respeito ao estatuto jurídico dos países, territórios, cidades ou zonas, ou das suas autoritdades, nem com respeito ao traçado das suas fronteiras ou limites.

Todos os direitos desta obra são reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, nem fazer parte de qualquer base de dados ou de pesquisa documental, nem transmitida sob qualquer forma ou por qualquer processo, seja electrónico, mecânico, por fotocópia, ou outro, sem autorização prévia do detentor dos direitos de autor. Todo o pedido de autorização tem de ser enviado ao Director da Divisão de Género e População, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, Viale delle Terme di Caracalla, 00100 Roma, Itália, contendo indicações precisas relativamente ao objecto e à dimensão da reprodução. © FAO 2002

Elaborado por Una Murray e Ruxandra Boros Traduzido por Valerio E. Tranchida Em colaboração com o programa ASEG Serviço de Género e Desenvolvimento

2


Prefácio Muitas das ideias contidas neste Guia são o resultado de um demorado processo de verificação de metodologias para integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas nos programas e iniciativas microfinanceiros. As autoras gostariam de expressar o seu agradecimento a todos aqueles que foram envolvidos neste processo, pelos seus pontos de vista e opiniões acerca destes assuntos. Para além disso, o serviço de desenvolvimento e de género da FAO organizou dois workshops em assuntos de género e de microfinança, nomeadamente na Grécia (1998) com participantes da Europa Ocidental, de países em transição e em vias de desenvolvimento, e no Irão (2001), com participantes do governo local, bancos e algumas ONG. Um workshop contendo os elementos da ASEG para as ONG romenas que desejam começar operações microfinanceiras foi criado pelo Centro de Formação Internacional da Organização Internacional de Trabalho na Roménia (2001). Muitos dos conceitos deste Guia foram testados nestes workshops bem como durante as missões levadas a cabo pelas autoras noutras regiões do mundo.

3


ÍNDICE Introdução .............................................................................................................................................. 8 Porquê microfinança e género?........................................................................................................ 8 Objectivos........................................................................................................................................... 9 Grupo-alvo ......................................................................................................................................... 9 Estrutura .......................................................................................................................................... 10 Como usar este Guia ....................................................................................................................... 10 Capítulo 1 - Introdução à Microfinança ............................................................................................. 11 1.1 Sistemas bancários de Anti-pobreza: A revolução da Microfinança.................................... 11 1.2 Metodologias microfinanceiras ................................................................................................ 12 1.2.1 Empréstimos de grupo.......................................................................................................... 12 1.2.2 Empréstimos Individuais ...................................................................................................... 13 1.2.3 Uniões de Crédito................................................................................................................. 13 1.2.4 Village banking (Bancos comunitários) ............................................................................... 14 1.2.5 Associações de grupos de ajuda mútua ................................................................................ 14 1.3 A evolução da microfinança ..................................................................................................... 16 1.4 Microfinança sustentável .......................................................................................................... 16 1.5 Escala e impacto: a microfinança alcança dimensões globais ............................................... 18 1.6 Homens da microfinança e mulheres clientes ......................................................................... 20 1.7 Serviços prestados por intermediários microfinanceiros....................................................... 21 1.7.1 Crédito .................................................................................................................................. 22 1.7.2 Serviços de Depósito ............................................................................................................ 23 1.7.3 Seguros ................................................................................................................................. 23 1.7.4 Serviços de desenvolvimento de Negócio (SDN) ................................................................ 24 1.7.5 Aluguer-compra para os mais carenciados........................................................................... 24 1.8 Microfinança e o seu efeito nas mulheres empresárias .......................................................... 25 1.9 Assuntos específicos que as mulheres enfrentam em relação aos serviços financeiros ....... 27 Capítulo 2 - Microfinança: o contexto socio-económico e de género ................................................ 29 2.1 Microfinança e ASEG ............................................................................................................... 29 2.2 Microfinança e pobreza ............................................................................................................ 30 2.3 Qual o significado de ‘Género’?............................................................................................... 31 2.3.1 Análise das questões de género ............................................................................................ 32 2.4 Os programas microfinanceiros direccionados para as mulheres podem não ser sensíveis ao género .......................................................................................................................................... 33 2.5 Diferentes perspectivas: os níveis macro, intermédio e de base ............................................ 35 2.6 Análise de partes intervenientes............................................................................................... 36 2.7 Factores sócio-económicos que afectam a microfinança........................................................ 37 2.8 Análise de recursos e restrições................................................................................................ 41 2.8.1 Recursos ............................................................................................................................... 41 2.8.2 Restrições ............................................................................................................................. 42

4


Capítulo 3 - Género e Microfinança: o nível de base.......................................................................... 43 3.1 Introdução.................................................................................................................................. 43 3.2 As partes intervenientes no nível de base ................................................................................ 43 3.2.1 Focalizando os pobres? ........................................................................................................ 44 3.2.2 As mulheres empresárias são clientes viáveis? .................................................................... 44 3.2.3 Apresentação transparente da oferta das instituições microfinanceiras ............................... 45 3.2.4 Informação financeira das Partes intervenientes .................................................................. 45 3.2.5 Debates de grupo .................................................................................................................. 45 3.2.6 Perfil institucional do ponto de vista do nível de campo...................................................... 46 3.2.7 Necessidades e prioridades dos partes intervenientes, evitando suposições ........................ 46 3.3 Factores sócio-económicos e de género ao nível do cliente .................................................... 48 3.3.1 Matrizes de despesa e proveito............................................................................................. 49 3.4 Recursos e restrições de clientes............................................................................................... 52 3.4.1 Recurso a cartões descritivos para desagregar a gestão de recursos .................................... 52 3.4.2 A percepção de risco dos clientes......................................................................................... 53 3.4.3 Restrições relacionadas com as actividades rurais ............................................................... 53 3.4.4 Restrições que as mulheres rurais tem que fazer face (e pessoas com baixo rendimento em geral).............................................................................................................................................. 53 3.5 Aproveitando as oportunidades sensíveis ao género, no nível de base ................................. 54 3.5.1 Participando num encontro de partes intervenientes ............................................................ 54 3.5.2 Levantamento das necessidades dos clientes ....................................................................... 55 3.5.3 Feedback dos clientes sobre participação institucionalizada................................................ 57 Capítulo 4 – Microfinança e Género: o nível Intermédio................................................................... 58 4.1 Introdução.................................................................................................................................. 58 4.2 As partes intervenientes fundamentais no nível intermédio.................................................. 58 4.3 Factores sócio-económicos e assuntos de género nas instituições microfinança .................. 62 4.3.1 O que é o Mainstreaming ?................................................................................................... 63 4.3.2 Funcionários das instituições de microfinança e de Género................................................. 64 4.4 Recursos (financeiros e não financeiros) ................................................................................. 65 4.5 Restrições às operações das instituições de microfinança...................................................... 67 4.5.1 Restrições financeiras........................................................................................................... 67 4.5.2 Custos dos serviços adicionais das instituições de microfinança ......................................... 67 4.5.3 Custos da garantia de participação dos clientes ................................................................... 68 4.5.4 Restrições impostas pelos ‘doadores’................................................................................... 68 4.6 Rumo a instituições de microfinança sensíveis ao género: aproveitando as oportunidades70 4.6.1 Sensibilidade de género: planificando no sector microfinanceiro........................................ 70 4.6.2 Redes e lobbies..................................................................................................................... 72 4.6.3 Aprendendo através das ‘metodologias acertadas de outras instituições microfinanceiras.. 73 4.6.4 Fornecendo serviços não-financeiros ................................................................................... 74 Capítulo 5 - Microfinança: o nível Macro........................................................................................... 75 5.1 Introdução.................................................................................................................................. 75 5.2 Assuntos de género e factores sócio-económicos no processo político .................................. 76 5.3 Partes intervenientes envolvidas na decisões políticas ........................................................... 78 5.3.1 A percepção das partes intervenientes da microfinança e dos assuntos de género .............. 79 5.3.2 A percepção das partes intervenientes das regulamentações microfinanceiras.................... 79 5.3.3 Implicações do processo de regulamentação para diferentes partes intervenientes ............. 82 5.3.4 Analisando as alterações de política que afectam as provisões microfinanceiras ................ 84

5


5.4 Recursos para uma política sensível à dimensão de género................................................... 85 5.4.1 Dados de desagregação de sexo ........................................................................................... 85 5.4.2 Mobilização de recursos para políticas de implementação .................................................. 85 5.4.3 Recursos para o sector privado............................................................................................. 85 5.4.4 Recursos dos doadores ......................................................................................................... 85 5.5 Restrições à política sensível à dimensão de género ............................................................... 86 5.5.1 Restrições que as mulheres tem que enfrentar devido às políticas insensíveis ao género.... 86 5.5.2 Restrições que as instituições de microfinança tem que encarar devido à política .............. 88 5.6 Rumo às políticas sensíveis ao género : aproveitando as oportunidades.............................. 89 APÊNDICES ........................................................................................................................................ 91 INSTRUMENTOS AO NÍVEL DE BASE (CAPÍTULO 3)................................................................ 92 Apêndice A3.1: Identificação de partes intervenientes ................................................................ 92 Apêndice A3.2 Categorias das partes intervenientes ................................................................... 93 Apêndice A3.3: Enquadramento da classificação dos serviços financeiros na perspectiva dos aldeões .............................................................................................................................................. 94 Apêndice A3.4: Questões iniciais para os clientes intervenientes ............................................... 95 Apêndice A3.5: Matrizes de rendimento e de despesa ................................................................. 96 Apêndice A3.6: Recursos (cartões descritivos) ............................................................................. 98 Apêndice A3.8: Restrições que as mulheres enfrentam em relação aos serviços financeiros. 100 Apêndice A3.9: Orientações para preparar e facilitar as reuniões entre partes intervenientes ......................................................................................................................................................... 102 INSTRUMENTOS DO NÍVEL INTERMÉDIO (CAPÍTULO 4) .................................................... 103 Apêndice A4.1: As categorias de partes intervenientes no nível intermédio – Diagrama da abordagem de Venn....................................................................................................................... 103 Apêndice A4.2: Matriz de avaliação dos riscos, da influência e importância dos partes intervenientes ................................................................................................................................. 105 Apêndice A4.3: Exemplos de questões utilizadas para resolver a postura das equipas em relação ao género ........................................................................................................................... 106 Apêndice A4.4: Listas preliminares para a integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas (Mainstreaming) nas Instituições Microfinanceiras...................................... 107 Apêndice A4.5: Categorias dos dados e informações ................................................................. 108 Apêndice A4.6: Planificando actividades supervisionadas ........................................................ 109 Apêndice A4.7: Supervisionando as alterações de rendimentos ............................................... 110 Apêndice A4.8: Exemplos de indicadores ................................................................................... 111 Apêndice A4.9: Influenciando a agenda política ........................................................................ 113 Apêndice A4.10: Exemplos de ‘metodologias acertadas’........................................................... 114 INSTRUMENTOS DO NÍVEL MACRO (CAPÍTULO 5)................................................................ 115 Apêndice A5.1: Lista para uma identificação abrangente das partes intervenientes que estão envolvidas na decisões políticas relacionadas com a microfinança........................................... 115 Apêndice A5.2: Matriz para desagregar os motivos, posições e recursos dos diversos grupos intervenientes. ................................................................................................................................ 116

6


Apêndice A5.3: Identificando as posturas das partes intervenientes na regulamentação e supervisão das Instituições Microfinanceiras. ............................................................................ 117 Apêndice A5.4: Associações de políticas...................................................................................... 118 Apêndice A5.5: Assuntos a ter em conta na implementação de uma política microfinanceira sensível ao género. ......................................................................................................................... 120 Apêndice A5.6: Lista para garantir a implementação de uma política associada às actividades empresariais no nível de base. ...................................................................................................... 121 Apêndice A5.7: Questões que permitem determinar se a implementação da política está efectivamente associada às operações das Instituições Microfinanceiras. ............................... 122 Apêndice A5.8: No caminho das abordagens globais para as alterações da política. ............. 123 Bibliografia e leituras recomendadas ................................................................................................ 124

7


Introdução

Porquê microfinança e género? A microfinança como sector de negócio surgiu quando se compreendeu que pessoas com baixo rendimento podem pagar os seus empréstimos dentro dos prazos e podem poupar dinheiro, desde que tenham acesso a serviços financeiros personalizados. Então, qual a importância de garantir que as políticas e programas microfinanceiros sejam sensitivos ao género? A experiência tem demonstrado que os melhores programas microfinanceiros (e mais eficientes) para pessoas com baixo rendimento têm que ser explicitamente personalizados tendo em atenção as necessidades desses clientes (uma abordagem microfinanceira tipo ‘O cliente em primeiro lugar’). Uma prática de negócio prudente enfatiza a correspondência dos clientes. Uma análise sócio-económica e das questões de género pode auxiliar a desagregação dos clientes e determinar se existe algum nicho de mercado negligenciado pelos serviços oferecidos por um intermediário microfinanceiros específico. Além disso, a distribuição microfinanceira deve ser sensível à dimensão de género porque uma nova fonte de rendimento pode alterar o relacionamento dentro do agregado e tem um impacto distinto nos homens e mulheres dependente de quem controla a nova fonte de rendimento. Uma análise de assuntos de género na fase de planificação das actividades microfinanceiras garante que os programas e projectos provavelmente atinjam os seus objectivos. Muitas instituições microfinanceiras estão progressivamente cientes da importância das preocupações do género nas suas actividades. Isto é especialmente verdadeiro quando o financiamento de doadores externos está dependente de uma auditoria social e de género do programa proposto. No entanto, os assuntos de género são frequentemente destacados na retórica dos intermediários microfinanceiros, mas ausentes na prática. De facto, alguns pontos de vista microfinanceiros assumem a ausência dos assuntos de género simplesmente porque a microfinança se tornou um sector que cuida predominantemente das mulheres. No entanto, o facto de existirem projectos exclusivamente para homens ou mulheres não significa que não haja assuntos de género. Podem ainda haver assuntos de género importantes e podem existir preconceitos de género na entrega de serviços. Por exemplo, alguns membros da comunidade ou da sociedade podem ser afectados adversamente e excluídos de um programa microfinanceiro, e podem não ter voz activa ou a influência necessária para expressar as suas necessidades. Este Guia introduz uma abordagem de que não basta satisfazer as necessidades das mulheres-clientes para resolver os assuntos de género. Uma aproximação sensível à dimensão de género deve ser preferencialmente inclusiva mais do que exclusiva. Ter em atenção as necessidades e restrições de ambos, homens e mulheres, quando se projectam e entregam operações financeiras, auxilia a garantir a sensibilidade de género. A análise das questões de género é uma poderosa abordagem para avaliar o impacto da microfinança sobre as diversas partes intervenientes independentemente de serem ou não beneficiárias. Outra razão para nos concentrarmos na microfinança é porque os assuntos sócio-económicos e de género, estão agora na agenda de dia de muitos governos, de doadores internacionais e fundadores bilaterais. Na amplamente aceite, Plataforma de Acção de Pequim, na IV Conferência Mundial para as Mulheres, em 1995, os governos comprometeram-se a “promover e apoiar emprego independente das mulheres em termos apropriados iguais àqueles dos homens e rever, reformular se necessário e implementar políticas, assegurando que não haja qualquer tipo de discriminação contra micro, pequenas e médias empresas geridas pelas mulheres, nas áreas urbanas e rurais” (UNDP, 1995a). As políticas microfinanceiras sensíveis ao género fornecem a estrutura básica para um ambiente propício.

8


A promoção do emprego autónomo das mulheres requer amiúde a transformação das políticas existentes com a perspectiva de género para assegurar que as mulheres tenham, por seu próprio direito, iguais direitos para obter serviços financeiros (Jahan, 1995). Este guia foi desenvolvido como uma ajuda prática para os que estiverem envolvidos em programas de microfinança, de forma a assegurar que as questões sócio-económicas e de género, sejam levadas em conta no momento em que se começa ou se desenvolve um programa de microfinança, quando se desenham políticas nacionais para a microfinança, e para desagregar mercados de microfinança para obter mais informações sobre os clientes. Uma abordagem deste tipo pode minimizar o risco e melhorar a sua eficácia através do que se aprendeu com respeito às problemáticas de género podendo ajudar as instituições de microfinança a tornarem-se sustentáveis. O guia baseou-se na estrutura da Análise Sócio-Económica e de Género (ASEG) da Organização para a Agricultura e a Alimentação (FAO). O objectivo do programa ASEG é tanto o de aumentar a consciência das questões de género, como o de reforçar a capacidade dos especialistas em desenvolvimento a considerar as questões sócio-económicas e a análise de género no planeamento do desenvolvimento. A ASEG enfatiza os factores socioculturais, económicos, demográficos, políticos, institucionais e ambientais que afectam as iniciativas de desenvolvimento e as ligações entre eles a partir de uma perspectiva de género. Aliás, a ASEG examina as ligações que existem entre esses factores a três níveis – macro (programas e políticas), intermédio (instituições) e de campo (comunidades, famílias e indivíduos).

O guia fornece questões que podem ser feitas pelos intermediários de microfinança na tentativa de assegurarem que as suas acções estão atentas ao género. No guia há sugestões para assegurar que tanto a política como o planeamento microfinanceiro, no nível macro estão atentos ao género. Algumas perguntas são feitas para conseguir mais informações sobre as relações de género ao nível do cliente da microfinança. Finalmente, este guia deverá servir como ponto de referência para assegurar que as actividades microfinanceiras alcancem o seu grupo-alvo sócio-económico.

Objectivos Os objectivos deste guia são dois: 1. Aumentar a consciência referente às questões sócio-económicas e de género no âmbito da microfinança. O contexto de desenvolvimento para a microfinança é nomeadamente formado pela política de ambiente macro, pelos intermediários que fornecem serviços microfinanceiros e pelas mulheres e homens clientes. O guia esboça questões sócio-económicas e de género a estes três níveis. 2. Oferecer aos utilizadores deste guia sugestões práticas para integrar a abordagem sócio-económica e de género a estes três níveis: (a) através das acções a nível de campo; (b) no âmbito das estruturas dos seu intermediários de microfinança; e (c) na sua política de mudança a nível macro. Aliás, espera-se também que o guia estimule o diálogo e discussão entre os agentes de género e os sectores de desenvolvimento de microfinança e privados, nas agências de doadores.

Grupo-alvo Este guia é para pessoas envolvidas ou interessadas na microfinança aos três níveis: os decisores políticos e os doadores (nível macro), os que a praticam e outros agentes (nível intermédio) e por 9


último os próprios clientes (nível de campo). No texto são levantadas algumas questões, utilizando alguns exemplos para encorajar o leitor a reflectir sobre a sua própria situação. O guia destina-se aos utilizadores dos países tanto desenvolvidos, como em via de desenvolvimento, sendo de relevância para qualquer contexto em que sejam propostas actividades de microfinança para melhorar o desenvolvimento social e económico. Embora a microfinança tenha surgido nalguns países em via de desenvolvimento, como uma alternativa às actividades de desenvolvimento económico descendente, hoje em dia tornou-se uma interessante proposta para as economias industrializadas e aquelas em transição. Este guia dá particular atenção à análise do ‘controlo da realidade’ para saber se os grupos sociais marginalizados ou mais pobres podem ser alcançados por actividades microfinanceiras específicas.

Estrutura O guia é formado por 5 capítulos. O Capítulo 1 é uma introdução à microfinança e ao pano de fundo do tema. O Capítulo 2 sublinha a diferença entre os programas microfinanceiros orientados para as mulheres e aqueles mais abrangentes baseados na abordagem do género. Os factores sócioeconómicos que afectam a microfinança estão sumariados e o conceito da ‘análise das partes intervenientes, aplicado à microfinança é explicado com exemplos. O Capítulo 3 examina os factores sócio-económicos e de género a nível de cliente ou de campo. O Capítulo 4 considera as questões sócio-económicas e de género entre os intermediários de microfinança, examina o que se entende por ‘género de mainstreaming’ (integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas) a nível organizacional, e possui sugestões concretas para planear os programas de microfinança. O Capítulo 5 trata especificamente do nível macro ou da política ambiental necessária para operações microfinanceiras sensíveis ao género, fornecendo sugestões práticas para o desenvolvimento das políticas microfinanceiras mais sensíveis ao género. Os Capítulos 3, 4 e 5 têm uma estrutura semelhante. Cada capítulo examina as questões sócio-económicas e de género ao nível respectivo (macro, intermédio e de campo). As partes intervenientes principais (stakeholders) de cada nível são identificadas, e cada capítulo evidencia tanto os recursos como as limitações das operações microfinanceiras em cada nível respectivo. Finalmente, cada capítulo possui guias práticos para continuar a implementação das actividades microfinanceiras sensíveis ao género. Estes guias práticos, sugestões e questões estão contidos nos apêndices depois do Capítulo 5.

Como usar este Guia Cada capítulo deste Guia pode ser lido individualmente e sem ligação com os outros. Recomenda-se que todos os utilizadores leiam os Capítulos 1 e 2. Se forem necessárias sugestões sobre questões sócio-económicas e de género por afectarem clientes de microfinança, o Capítulo 3 esquematiza informações práticas sobre este assunto, enquanto se for necessário aprender mais sobre questões de mainstreaming sócio-económico e de género respeitantes a intermediários de microfinança, o capítulo mais adequado é o Capítulo 4. Aqueles que trabalhem em políticas relacionadas com a microfinança e que estejam interessados em incluir a perspectiva sócio-económica e de género em tais políticas, podem ir directamente ao Capítulo 5. Para manter o fluxo e a continuidade de texto do guia, a gama de instrumentos sócio-económicos e de género (por exemplo a lista de verificação, linhas-mestras, questões etc.) que pode ser usada no contexto das actividades de microfinança encontra-se nos apêndices anexos a este Guia.

10


Capítulo 1 - Introdução à Microfinança

1.1 Sistemas bancários de Anti-pobreza: A revolução da Microfinança. Por motivos comerciais os serviços financeiros foram historicamente destinados à camada mais rica da sociedade que tinha uma maior capacidade para pagar os empréstimos e manter poupanças. No entanto, caracteristicamente, os mais carenciados ou não eram favorecidos, ou tinham acesso a uma oferta de serviços financeiros inadequada. Os camponeses e os trabalhadores sem-terra têm enormes dificuldades em aceder aos serviços financeiros oferecidos por instituições financeiras convencionais, como os bancos comerciais (Marr, 1999). As estimativas afirmam que os bancos e outras instituições financeiras oficiais estão a servir apenas 25% dos potenciais clientes do mundo inteiro. Estatísticas indicam que apenas 2% dos micro-empresários são servidos pelos bancos (Women’s World Banking, 1994). Para ultrapassar esses obstáculos, nas décadas passadas surgiu uma nova abordagem, destinada a fornecer serviços financeiros adequados, para os clientes mais pobres – esta abordagem é chamada microfinança. A microfinança oferece o acesso a serviços financeiros e não-financeiros a pessoas com baixo rendimento, que desejem obter dinheiro para começar ou para desenvolver actividades geradoras de rendimento. Tal como o nome sugere, os empréstimos e poupanças dos indivíduos mais pobres são pequenos. A microfinança adquiriu o estatuto de reconhecer que os micro-empresários e alguns dos clientes mais pobres podem ser ‘bancáveis’ isto é, eles podem pagar em prazos os empréstimos e os juros e também economizar algum dinheiro, desde que os serviços financeiros sejam personalizados, de forma a preencherem as suas necessidades. A microfinança como método criou produtos financeiros que são estruturados de tal forma, que permitem que as pessoas com baixos recursos passem a ser clientes de intermediários bancários. As características dos produtos microfinanceiros incluem:

Pequenos montantes de empréstimo e de poupança

Empréstimos a curto prazo (frequentemente até um ano)

Amortizações agendadas com prestações frequentes (ou depósitos frequentes)

Prestações feitas a partir do lucro e capital

Taxas de juro altas para o crédito (mais altas do que os juros dos bancos comerciais, mas mais baixas do que empréstimos com juros reduzidos), reflectindo o trabalho intensivo dos trabalhadores, associado ao facto de solicitarem pequenos empréstimos e permitindo que os intermediários de microfinança se tornem sustentáveis ao longo do tempo.

Fácil acesso ao intermediário de microfinança, poupando tempo e dinheiro ao cliente, permitindo que o intermediário ao mesmo tempo possa conhecer melhor o cliente no contexto da sua própria casa/negócio

Impressos simples de preencher

Curtos períodos de processamento (entre o fim do processo de candidatura e a concessão do empréstimo)

Possibilidade de contrair novos empréstimos mais elevados, para os clientes que cumprem os prazos.

O uso de taxas de juro reduzidas (taxas de juro decrescentes sobre muitos ciclos de empréstimos) como incentivo para pagar dentro do prazo. Quanto maior for o empréstimo,

11


menores serão os custos para as Instituições de Microfinança, alguns devedores cobram taxas de juro mais baixas: juros mais altos, sobre pequenos montantes de crédito e mais baixos, sobre créditos maiores.

Não ser necessária garantia colateral ao contrário das práticas oficiais bancárias. Para substituir a garantia colateral (que geralmente as pessoas com baixo rendimento não têm), os intermediários microfinanceiros utilizam métodos alternativos, como: a avaliação do potencial de amortização dos clientes através de análises de ‘cash flow’ (meios libertos) baseadas no fluxo de entrada de capital produzido pelas actividades para as quais foi solicitado o empréstimo; todas as receitas e despesas da empresa/família; garantias individuais ou de grupo (grupos solidários) e esquemas de poupança obrigatória.

Durante muitos anos a banca acreditou que a concessão de empréstimos aos pobres, sobretudo àqueles das áreas rurais periféricas, era uma iniciativa de alto risco para as operações bancárias comerciais. Quando se trata de conceder empréstimos para pessoas com baixo rendimento, os bancos comerciais preocupam-se com uma quantidade de questões, incluindo a falta de informação quanto à utilização dos empréstimos, falta de garantias colaterais, capacidade limitada de endividamento, habilidade limitada para reforçar a amortização dos empréstimos, e os altos custos de transacção associados aos serviços prestados a clientes pobres com pequenos empréstimos (Marr, 1999). O sector comercial bancário falhou em reconhecer as forças das instituições financeiras paralelas a ‘nível local’ (por ex.: agiotas, casas de penhores, cooperativas, ONGs) e as vantagens comparativas de alguns métodos para conceder empréstimos e amortizações que se praticam no sector paralelo (Marr, 1999). Os mercados financeiros paralelos sempre existiram entre os pobres, nomeadamente nas áreas rurais e envolvem grupos de pessoas com baixo rendimento, com responsabilidades comuns (garantia colateral social) para a amortização dos empréstimos entre os seus membros. Factores sociais, como a pressão da sociedade funcionam como incentivos de coacção ao pagamento das amortizações de empréstimos. Nalguns casos, observou-se que tais esquemas de endividamento colectivo tinham taxas de amortização mais altas e custos de transacção mais baixos. Por conseguinte, podem fornecer mecanismos-chave para o desenvolvimento dos serviços de microfinança para os grupos mais pobres. Como resultado o sector da microfinança está a crescer, existindo um grande potencial de desenvolvimento.

1.2 Metodologias microfinanceiras A grande maioria das instituições de microfinança concede crédito na base de empréstimos a grupos solidários sem garantias colaterais. Aliás, existe toda uma gama de outras metodologias que as instituições de microfinança utilizam. Algumas começam com uma metodologia e mais tarde mudam ou diversificam para outra, de modo a não excluírem certas categorias sócio-económicas de clientes. É necessário ter um conhecimento de base das metodologias de microfinança para desenvolver qualquer questão de género relacionada com a actividade de microfinança. 1.2.1 Empréstimos de grupo Os empréstimos de grupo são uma moderna abordagem que permite emprestar pequenas quantias de dinheiro a um grande número de clientes que não possuem garantias colaterais. A composição dos grupos varia, mas a maioria tem entre quatro e oito membros. O grupo auto-elege os seus membros antes de pedirem o empréstimo. Primeiro os empréstimos são concedidos a um ou vários membros seleccionados do grupo e seguidamente aos outros. A maioria das instituições de microfinança exige

12


que uma percentagem do empréstimo seja poupada antecipadamente, de forma a assegurar a capacidade de amortização da dívida e manter uma garantia colateral. Os membros do grupo são responsáveis conjuntamente pela amortização de cada um dos outros empréstimos e costumam encontrar-se semanalmente para recolher essas amortizações. A pressão da sociedade e a responsabilidade conjunta é utilizada para assegurar a amortização. No caso de incumprimento por parte de um membro, o grupo não poderá usufruir de outros empréstimos. A solvência do mutuário é portanto determinada pelos membros em vez de ser pelas instituições de microfinança. Uma das mais conhecidas instituições de empréstimos e poupanças para grupos é o Grameen Bank no Bangladesh. Os seus clientes-alvo são as mulheres (elas constituem 98% dos seus clientes), com o fundamento de que as mulheres amortizam as suas dívidas melhor que os homens, o Grameen acredita que os empréstimos concedidos às mulheres beneficiam todos os membros do núcleo familiar, originando uma melhoria na qualidade de comida ingerida, na saúde, e na educação. A média dos empréstimos varia de 100 US$ a 200 US$ por um período de 3 a 12 meses (Binns, 1998). Nos países em transição a média de empréstimo tende a ser mais alta (500 US$ ou superior). Apesar de a formação de grupos originar custos mais baixos de transacção para as instituições de microfinança, existem custos sociais associados a este processo. Estes custos sociais podem constituir limitações negativas para os empréstimos de grupo e aproximação das responsabilidades comuns e incluem pressão coerciva da sociedade, perda de credibilidade e predisposição dos mais pobres e mais vulneráveis ficarem excluídos ou ainda estigmatizados (Marr, 1999). Estes custos sociais são mais altos nalgumas sociedades do que noutras e dependem de uma base de relações sociais (que influenciam a facilidade/dificuldade da formação dos grupos) e a distância que as pessoas têm que percorrer para participar nas actividades do grupo. Em áreas rurais estes custos podem ser mais altos. 1.2.2 Empréstimos Individuais Apenas um pequeno número de instituições financeiras convencionais (por ex. bancos) concede empréstimos individuais a pessoas com baixo rendimento. Isto simplesmente porque os clientes mais pobres são considerados de alto risco – devido à sua falta de garantias colaterais, associada à natureza da exigência de recursos destes créditos e por conseguinte a falta de proveitos de um grande número destes pequenos créditos. Actos de usura (emprestar com juros) amiúde definem um tecto para as taxas de juro, que podem estar abaixo das taxas exigidas pelas microfinança, limitando ainda mais a probabilidade dos empréstimos individuais serem concedidos aos clientes microfinanceiros mais pobres. Além do mais, os bancos frequentemente não podem competir com a concessão de fundos (subsídios) que as instituições de microfinança obtêm na fase de arranque dos projectos. Todavia, o Banco Rakyat da Indonésia (BRI) e o ADEMI da República Dominicana são exemplos de instituições de crédito bem sucedidas e vocacionadas para clientes individuais microfinanceiros de parcos recursos. Contudo, o BRI requer garantias colaterais e fiador abonado para os empréstimos, enquanto o ADEMI fica com as melhores garantias colaterais que puder obter. O banco Barclays no Quénia possui uma linha especial de crédito para clientes individuais femininas, que é garantida pelo Women’s World Banking (WWB). Algumas agências ainda não concederam empréstimos individuais devido à resistência dos seus gerentes. O Barclays está agora ponderar a hipótese de substituir a garantia colateral por um prémio de seguro (Binns, 1998).

1.2.3 Uniões de Crédito As uniões de crédito são organizações populares que operam como cooperativas de poupança e empréstimo baseadas num sistema de sociedade financeira (Poyo, 1995; Adams, 1995). Recolhem as poupanças e fornecem créditos a curto prazo. A procura de empréstimos costuma exceder o suprimento das poupanças, portanto os empréstimos dos associados costumam ser limitados a um múltiplo baixo dessas poupanças. Na maioria das áreas rurais, as uniões de crédito são ainda a única fonte de serviços de depósito e de crédito, para além do mercado financeiro paralelo. Por terem tanto

13


objectivos sociais, como comerciais, as uniões de crédito desenvolvem um papel-chave na concessão de serviços financeiros para os mais carenciados. Chegou-se à conclusão que algumas mulheres não beneficiaram muito das uniões de crédito porque o nível de poupanças exigido é demasiado alto. Frequentemente as uniões de crédito costumam conseguir autonomia financeira no espaço de uma década. Estas foram as observações para as uniões de crédito na África Ocidental (PARMEC1), Madagáscar (CECAM2), Haiti (Caisses Populaires) e América Central (Bancos Comunales). Segundo o Conselho Mundial das Uniões de crédito (WOCCU), no fim da década de 1980 em 67 países com baixo rendimento existiam cerca de 17.000 uniões de crédito com aproximadamente 9 milhões de membros, 60% dos quais na África e nas Antilhas. Estas uniões de crédito geriam aproximadamente 2 biliões de US$ em depósitos e capital social, estimando-se que concederam 300 milhões de US$ em pequenos empréstimos para cerca de 1.5 milhões de pequenos negócios (Adams,1995).

1.2.4 Village banking (Bancos comunitários) Os Village banking ou bancos comunitários, são modelos de serviços financeiros que permite às comunidades pobres estabelecerem as suas próprias associações de crédito e poupança. Os Village banking (Bancomunales) foi criado pela FINCA (Fundación Integral Campesina) na Costa Rica em 19843. Na Bolívia, desenvolveu-se durante os anos 80 como alternativa ao crédito rural. Os bancos comunitários forneciam linhas de crédito sem garantias colaterais para os empréstimos dos seus membros, e ainda um lugar onde investir as poupanças e promover a solidariedade social. A agência que patrocina concede um empréstimo ao banco comunitário, o qual, por sua vez, concede empréstimos individuais aos seus membros. O banco concede estes empréstimos, porque confia na pressão e apoio da sociedade entre os membros para assegurar as amortizações. Os pequenos empréstimos de capital circulante são amortizados cada quatro ou seis meses. Os beneficiários começam com um pequeno empréstimo e progridem graças ao seu esforço até a um empréstimo com um tecto estabelecido. O crédito é associado às poupanças, e na maioria dos casos, o volume dos empréstimos está relacionado com a quantia que cada beneficiário conseguiu poupar. As poupanças dos membros são guardadas no banco comunitário e são emprestadas ou investidas para aumentar os recursos do banco. Os padrões comerciais são aplicados às taxas de juro e comissões. No fim de 1994 havia 3.499 bancos comunitários registados com 90.754 membros. Segundo a UNIFEM, em 1996 as mulheres constituíram 90% dos associados dos bancos comunitários do mundo. Na Ásia todos os 6.678 membros dos 172 bancos são mulheres (Nelson et al., 1996). Os bancos comunitários nas áreas rurais tiveram mais dificuldade na estruturação de credibilidade e de solidariedade, e por razões ainda não compreendidas sofrem de um grande número de saídas de membros. O baixo nível de alfabetização é um factor que impede os membros de terem o mesmo controlo sobre as organizações (Nelson et al., 1996).

1.2.5 Associações de grupos de ajuda mútua As associações de poupanças e créditos em circulação (RoSCAs) existem em muitas partes do mundo e são denominadas de diferentes maneiras incluindo Tontines e Susus (Bouman, 1995). São muitas vezes organizações geridas por mulheres, que poupam pequenas quantias e que podem assim beneficiar de empréstimos dos valores comuns numa base circulatória. As RoSCAs e outros grupos de ajuda mútua têm sido utilizados pelas instituições de microfinança para empréstimos de grupo. As ‘Tontine’ são amplamente utilizadas na África Ocidental. No Senegal por exemplo as Tontines, permitem aos membros poupar quantias de dinheiro muito pequenas a um ritmo preestabelecido, obtendo 1

Project d’Appui à la Réglementation sur les Mutuelles d’Epargne et de Crédit Projet de promotion des Caisses d'Epargne et de Crédit Agricole Mutuels 3 FINCA International está presentemente activa em muitas partes do mundo. 2

14


empréstimos sem juros pela parceria colectiva (Balkenhol e Gueye, 1995). O nível de empréstimo que pode ser obtido pela parceria colectiva varia entre encontros porque o direito a um sistema de empréstimos associados é rotativo entre os membros. Em Dakar e noutros centros urbanos do Senegal algumas Tontines foram originadas em grupos de mulheres. As Tontines são também mais comuns nalgumas ‘castas’ da sociedade senegalesa do que noutras. O ‘nienio’, uma casta de artesãos composta por ourives, ferreiros, tecelões e sapateiros têm usado de maneira extensiva o sistema de garantia mútua das Tontines. Entre as duas maiores comunidades muçulmanas no Senegal desenvolveram-se diferentes tipos de Tontines. Há uma Tontine (adji maka) entre os Tidianes que funciona como meio de poupança para a peregrinação a Meca, enquanto entre nos Mourides há uma Tontine ‘tipo de seguro’ chamada ‘dahira’ que assiste os membros que se encontram em dificuldades financeiras por causa de roubos, contenciosos legais, doenças e incêndios. Em Dakar o sistema das Tontines é progressivamente mais importante para o financiamento de actividades de financiamento de negócios de curto prazo. No Senegal, as Tontines constituem a forma mais importante de organização de poupanças paralelas e as somas que estão envolvidas são substanciais (Balkenhol e Gueye, 1995).

15


1.3 A evolução da microfinança Os movimentos da microfinança desenvolveram-se em muitos programas de campo conduzidos nos anos 70 na Ásia, América Latina e África, provando que as populações com baixo rendimento que desejavam fundar ou desenvolver uma microempresa, estavam preparadas para amortizar os seus micro-empréstimos ao mesmo tempo que geriam com êxito os seus negócios. Esta descoberta representava uma mudança de paradigmas no desenvolvimento económico pela forma como apresentava as populações com baixos rendimentos, não como um grupo que necessitava de caridade, mas sim como uma população que podia ser tratada numa base de igualdade desde que lhes fossem oferecidas oportunidades iguais. Os beneficiários dos empréstimos eram agora vistos como ‘parceiros’ no desenvolvimento, e ‘ajuda’ para o desenvolvimento que envolvesse microfinança passou a basearse mais numa filosofia comercial. Alguns dos intervenientes mais conhecidos no desenvolvimento inicial da microfinança nos anos 70 foi a ACCION International na América do Sul e o Banco Grameen no Bangladesh. A ACCION International promoveu abordagens minimalistas para a microfinança enquanto que aos clientes apenas lhes é dado pouco mais que um empréstimo, com o mínimo de serviços auxiliares (Adams, 1995). Durante os anos 80 e 90 o ‘movimento’ de microfinança foi-se desenvolvendo, nomeadamente devido ao facto que alguns aspectos dos programas de microfinança estarem alinhados com as alterações do pensamento sobre o desenvolvimento ao longo deste período. Por exemplo, os programas de microfinança desenvolveram ‘serviços de alcance’ para os seus clientes, muitas vezes em países onde as medidas de ajustamentos económicos do governo estavam cortando os serviços que eles tinham fornecido no passado, evidenciando uma abordagem abrangente na promoção do sector privado em detrimento das iniciativas de desenvolvimento governamentais (tais como créditos e subsídios agrícolas) que estavam a ser executadas. O movimento ganhou relevo quando se tornou evidente que os programas de microfinança estavam contribuindo para o desenvolvimento da ‘sociedade civil’ através do reforço do nível intermédio – as organizações que concediam esses serviços, muitas vezes ONGs - e também através do empoderamento (ou empowerment) dos clientes ao nível de campo. A microfinança promove uma base de relacionamento entre o cliente e o devedor, por muitos considerada como a relação de negócio do futuro. Existem muitos exemplos de programas de microfinança no mundo que contribuem para a redução da pobreza, e concedem poderes (empowerment) para os grupos desfavorecidos (sobretudo as mulheres) e para a criação de emprego.

1.4 Microfinança sustentável Nos círculos do desenvolvimento, o termo amplamente utilizado ‘sustentável’, provou ser difícil de definir e ainda mais difícil de avaliar quando se trata de microfinança. O indicador mais discutido para a sustentabilidade institucional é a sustentabilidade financeira. Esta é geralmente considerada como sendo: rendimentos ganhos (excluindo os subsídios) divididos por despesas operacionais e financeiras, onde as despesas financeiras incluem alguns custos associados com a inflação (Yaron, 1992). As instituições de microfinança que oferecem instrumentos de poupança têm uma fonte mais barata de fundos para promover os empréstimos de forma a originar operações mais sustentáveis. As uniões de crédito e as cooperativas utilizam sempre fundos dos associados para originarem empréstimos, muitos deles apenas começam as operações de empréstimos depois de terem conseguido obter fundos suficientes para os empréstimos através dos seus associados. As instituições de microfinança que não atraem poupanças têm que depender das fontes comerciais dos fundos (pagando uma taxa de juro mais 16


alta para esses fundos, em comparação com os juros pagos nas poupanças), ou em fontes públicas ou de doadores. As Instituições de Microfinança podem também obter fundos através dos juros dos seus próprios investimentos, e cobrando comissões pelas suas operações, incluindo comissões de penalização. Algumas instituições microfinanceiras são financiadas pelo sector público. Nalguns casos são financiadas conjuntamente por dinheiro dos governos locais e pelo dos doadores. Muitas delas começaram como ONGs com dinheiro dos doadores e algumas ONGs internacionais tornaram-se especialistas na formação de instituições de microfinança4. É bastante frequente para alguns doadores atribuírem às instituições microfinanceiras de sucesso, o dinheiro necessário para capitalizarem as suas operações. As instituições microfinanceiras podem colocar no banco, o dinheiro para investimento dos doadores e ganharem juros, uma fonte de rendimento. Algumas ainda preferem investir parte dos seus capitais em imobiliário, por exemplo adquirindo o edifício onde operam, evitando assim de futuro altos custos de arrendamento (ex. a ADOPEM, da República Dominicana). Em ambos os casos, as instituições microfinanceiras aumentam os seus activos, o que torna mais barato o empréstimo de fundos comerciais. Isto facilita a forma das instituições microfinanceiras se tornarem organizações sustentáveis. Os doadores podem de facto providenciar tanto recursos financeiros como não financeiros para as instituições microfinanceiras. No entanto, os doadores e os governos que financiam as actividades microfinanceiras deverão certificar-se de que não estão a subsidiar taxas de juros para os pobres, a não ser que tenham por objectivo a sua perpetuação pois isto minimiza as hipóteses das operações se tornarem sustentáveis. Se são necessários subsídios de duração limitada, para uma actividade microfinanceira a favor dos pobres, então tais subsídios são provavelmente direccionados para a melhoria da gestão das instituições microfinanceiras (Marr, 1999). Quaisquer recursos dos doadores na forma de subsídios deverão ser temporários e transparentes, e não associados a actividades de empréstimo mas antes à própria instituição (FAO, 1998b). O custo dos empréstimos é feito de a) custo dos fundos; b) custos de funcionamento; c) reservas de perdas sobre os empréstimos e d) inflação. As taxas de juros pagas pelos devedores têm, em princípio, que cobrir estes custos, de forma a permitir a auto-sustentabilidade a longo termo dos intermediários microfinanceiros. Uma pequena margem adicional é incluída nas taxas de juro de forma a pagar o desenvolvimento posterior do programa. A experiência demonstrou que o sector da microfinança pode ser sustentável a longo prazo por ex. as instituições de microfinança podem cobrir os seus custos entre 3 e 5 anos depois da sua criação, desde que tenham sido alcançadas as escalas operacionais suficientes e uma organização institucional sólida. O devedor típico dos programas financeiramente auto-suficientes tem um balanço de empréstimo de aproximadamente 430 US$ e os montantes de empréstimo muitas vezes mais altos. Um cliente típico dos programas subsidiados com uma clara ligação à redução da pobreza tem como balanço de empréstimo 100 US$ (Morduch, 1999). Na realidade, muitos programas de microfinança concedem micro-empréstimos a juros que não cobrem todos os custos. Este é nomeadamente o caso de alguns programas que têm por objectivo a erradicação da pobreza, que são contrários à exigência de cobrarem taxas de juros muito altas. Todavia, a coexistência na mesma área de programas que requerem juros muito altos com alguns financeiramente insustentáveis que cobram taxas de juros mais baixas causa atritos. É importante criar fóruns oficiais ou paralelos para os intermediários de microfinança, onde possam discutir vários assuntos tais como as taxas de juros cobradas. Além do mais, estes operadores podem permutar listas com os nomes dos clientes, de forma a evitar situações de duplicação de empréstimos por parte do mesmo cliente em dois ou mais intermediários de microfinança. 4

Existe um grande número de ONGs dos Estados Unidos que têm operações microfinanceiras internacionais. Por exemplo, a Accion International, uma das pioneiras da microfinança nos anos 70, tem presentemente 15 instituições de Microfinança na América Latina e nos Estados Unidos. Algumas organizações mais recentes no campo da microfinança incluem a Save the Children, Opportunity International, e a Mercy Corp.

17


As instituições microfinanceiras financeiramente sustentáveis encontrarão dificuldade em alcançar os mais carenciados ou os marginais da sociedade (Hulme e Mosley, 1996; Marr, 1999). Por exemplo, o banco Grameen não foi capaz de atrair aqueles que são considerados como os mais pobres (Schneider, 1997). Os mais carenciados podem considerar-se a si próprios tão destituídos, que não podem contrair dívidas ou podem ser votados ao ostracismo pelos outros membros do grupo, quando as garantias dos empréstimos de grupo são solicitadas (Hulme e Mosley, 1996). Outras abordagens para garantir a redução de pobreza podem ser necessárias, se a fonte de subsistência dos mais pobres for melhorada. Enquanto se fixam os objectivos da microfinança sustentável há uma vasta gama de desafios para o sector, especialmente se forem de encontro às necessidades dos sectores mais pobres da sociedade (Marr, 1999). Estes incluem: a) Como alcançar os mais pobres dos pobres, incluindo os lavradores sem terra? b) Como identificar os grupos mais pobres (por ex. trabalho infantil, idosos, deficientes) que são excluídos dos serviços das Instituições Microfinanceiras e determinar as razões que levaram à sua exclusão? c) Como alcançar os pobres nas áreas mais remotas e marginalizadas? d) Como aumentar o impacto das Instituições Microfinanceiras nos clientes mais carenciados? e) Como reduzir a vulnerabilidade dos devedores às bruscas quebras de rendimento, ou à inflação daqueles que têm depósitos? f) Como diversificar os serviços de microfinança, e melhorar as condições e os termos de contractos? g) Se a provisão dos serviços financeiros deve fazer parte de uma estratégia de desenvolvimento rural mais ampla ou se deve ser uma intervenção única? h) Como descobrir novas formas de reduzir os custos de transacção dos empréstimos para os beneficiários de pequena escala, e ao mesmo tempo aumentar as taxas de amortização? Geralmente, a microfinança pode ser sustentável e um ‘bom investimento’ para os doadores (e para os investidores do sector privado). O sucesso dos programas microfinanceiros contribuiu para uma mudança de atitude, na forma como o trabalho de desenvolvimento é encarado; de uma abordagem de florescimento social passou para uma abordagem tipo comercial, que pode ‘outorgar poderes’ de parceria com os beneficiários, trabalhando em conjunto com a organização intermediária para uma mútua satisfação. As ajudas monetárias canalizadas através das Instituições Microfinanceiras podem contribuir para a criação de instituições sustentáveis (não subsidiadas) capazes de oferecer aos empresários com baixo rendimento, acesso contínuo aos serviços financeiros.

1.5 Escala e impacto: a microfinança alcança dimensões globais Embora o movimento da microfinança tenha começado nalguns países em vias de desenvolvimento, a sua escala de aplicação tornou-se global porque têm um enorme potencial para mudar as situações económicas. Apesar das diferenças culturais e sócio-económicas, modelos microfinanceiros distintos foram amplamente transferidos e globalmente adaptados, em escalas diferentes. A Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) estimou que existem cerca de 7000 instituições microfinanceiras no mundo, alcançando apenas uma fracção muito pequena dos potenciais

18


clientes (Filippis, 2000). O banco Grameen estima que existem aproximadamente 20 milhões de clientes no mundo que beneficiam dos serviços de microcrédito (Filippis, 2000). Em 1997 a Cimeira de Microcrédito5 lançou uma campanha para alcançar 100 milhões das famílias mais pobres do mundo, sobretudo mulheres, oferecendo serviços de desenvolvimento financeiro e de negócio para o emprego autónomo até ao ano 2005. Estima-se que para cumprir este objectivo serão necessários cerca de 21.6 biliões de US$. Estes fundos cobrirão as despesas operacionais, capital de empréstimo e infra-estruturas de desenvolvimento. Destas 100 milhões de famílias considera-se que quatro milhões estarão em países industrializados (Cimeira de Microcrédito, 1997). Existem vários tipos diferentes de instituições envolvidas em microfinança (Binns, 1998). Estas podem ser: (a) Instituições microfinanceiras relacionadas com o Governo (ex. o BRI, na Indonésia; o Grameen Bank, no Bangladesh) (b) Privadas (ex. o Hatton Bank no Sri Lanka, o Barclays Bank do Quénia; o Banco Comercial do Zimbabwe; a ADEMI na República Dominicana; o BancoSol na Bolívia) (c) ONGs (ex. CARE Nigéria; ACCION International; Oxfam; Opportunity Trust) (d) Cooperativas (ex. Uniões de Crédito, bancos comunitários como os FINCA no Uganda; grupos de entreajuda ou associações como as Tontines da África Ocidental). (e) Individuais (ex. devedores, casas de penhores, amigos, fornecedores, familiares) Muitos dos intermediários microfinanceiros iniciais expandiram-se. A rede ACCION serve 277.000 clientes em treze países da América Latina e nos EUA; o Grameen Trust replicou o seu modelo em dezanove países da África, Ásia, Europa e América Latina; a Opportunity International iniciou programas em vinte e seis países enquanto que o modelo dos ‘Bancos Comunitários’ foi replicado em trinta e dois países à volta do mundo. Alguns bancos já existentes também começaram a oferecer serviços microfinanceiros em grande escala. Os exemplos incluem o Banco Hattem no Sri Lanka e o BRI, na Indonésia, bancos agrícolas estatais. Nos anos 70 o BRI responsabilizou-se pela implementação a nível comunitário, do factor de crédito do plano nacional agrícola de forma a alcançar auto-suficiência na produção de arroz. No fim de 1996, o Bank Rakyat da Indonésia (BRI) tinha cerca de 2.5 milhões de mutuários e 16 milhões de depositantes espalhados em 3.500 localizações. Todavia, estas são excepções – a ampla maioria das Instituições Microfinanceiras tem menos de 10.000 mutuários (Binns, 1998). Muitas Instituições Microfinanceiras eventualmente transformaram-se em bancos comerciais, tais como o K-Rep no Quénia. Outro exemplo, o BancoSol na Bolívia começou por ser uma ONG (PRODEM) e tornou-se num banco em 1992. No fim de 1998 o BancoSol prestou serviço a mais de 81.000 beneficiários com baixo rendimento nas áreas urbanas. Isto representa cerca de 40% dos clientes bancários de todo o país (Morduch 1999). A média dos empréstimos para o BRI e o BancoSol em 1996 foi de 560 US$ e 660 US$, respectivamente. Os exemplos acima descritos ilustram operações microfinanceiras alcançando proporções globais.

O sector da Microfinança é caracterizado por um rápida taxa de câmbio, com expectativas de 5

A primeira conferência internacional sobre a microfinança reuniu mais de 3000 representantes de todos os níveis macro, intermédio e de campo

19


continuar assim. O sector responde constantemente às necessidades dos clientes. Por exemplo existem actualmente Instituições Microfinanceiras que oferecem cartões de crédito, como o ADEMI na República Dominicana; seguros: o banco SEWA, na Índia; ou empréstimos para habitação: o Banco Grameen, no Bangladesh. Este último também inovou um esquema para envolver os clientes em serviços de alta tecnologia, formando duas companhias independentes, a GrameenPhone e a Grameen Telecom. A GrameenPhone obteve uma licença para telemóveis, sendo uma companhia com fins lucrativos, enquanto a Grameen Telecom, companhia sem fins lucrativos compra grandes volumes de tempo de transmissão à GrameenPhone e revende-os aos mutuários do Grameen nas aldeias do Bangladesh. Espera-se que em 68.000 aldeias do Bangladesh uma mulher mutualista se torne na ‘senhora dos telefones’ da aldeia, vendendo serviços telefónicos. Apesar do seu crescimento, há falta de condições para um enquadramento de políticas favoráveis que afecta a escala, o crescimento e o sector microfinanceiro em muitos países. Acresce-se ainda que a legislação existente, os instrumentos financeiros, e as infra-estruturas nestes países não reflectem a urgência necessária para criar um ambiente empresarial sensível à dimensão de género. A prestação de serviços financeiros nas áreas rurais demonstrou ser o desafio mais difícil para a comunidade microfinanceira. As questões rurais e agrícolas, tais como a sazonalidade, os riscos associados à produção agrícola e a distribuição espacial dispersa dos potenciais clientes, aumenta tanto o risco como os custos de transacção, que servem as necessidades individuais ou as dos grupos rurais mais pobres. Estes problemas são particularmente acentuados na África rural, onde houve poucas iniciativas microfinanceiras bem sucedidas.

1.6 Homens da microfinança e mulheres clientes Dado que nos maiores bancos comerciais 80% do seu negócio é originado em 20% dos seus clientes, o seu fundamento para evitar clientes de baixo rendimento é evidente. No entanto, o sucesso dos programas de microfinança provou que os ‘bancos’ podem confiar nos clientes de baixo rendimento, se existir um incentivo para ambos desenvolverem uma parceria a longo termo, mesmo quando o banco não tiver algumas vezes garantias reais para pagamento do empréstimo. De facto, quando os bancos foram inicialmente criados na Idade Média ‘crédito’ ou ‘credo’ em latim, significava ‘confiança’ no cliente. Desde o início, o foco da microfinança tem sido fornecer poupanças e créditos a empresários de baixo rendimento, facilitando as pequenas empresas, sobretudo no sector dos serviços (Caixa 1.1). No sector da alimentação e da agricultura, a clientela típica das instituições de microfinança são micro empresas rurais ou suburbanas, agricultores empobrecidos, agricultores sem terra, mulheres, comerciantes, cultivadores, pescadores de pesca artesanal, e pequenos agregados familiares. Estes homens e mulheres de baixo rendimento, micro-empresários urbanos e rurais, têm insistentemente provado que são devedores e economizadores fiáveis. Particulares, famílias, e grupos familiares ganham a vida de diversas formas. O sistema de vida das mulheres e dos homens pode ser diferente, e certos grupos de pessoas podem ter problemas de liquidez em alturas diferentes do ano. Por exemplo, devido à sazonalidade da produção agrícola, o rendimento não é regular e frequentemente os pagamentos da produção têm que ser contidos, para libertar as pessoas dos meses menos lucrativos do ano quando os particulares não são capazes de gerar o mesmo rendimento. Igualmente os gastos podem ser sazonais, com pagamentos particulares que são cíclicos, como por exemplo as despesas escolares (livros, propinas) e pagamentos de impostos que são devidos em certas alturas do ano. Não pode ser assumido que é o chefe de família que tem as responsabilidades sobre as despesas, pois difere internamente e de país para país. Por exemplo, em muitas culturas, maridos e mulheres ganham e guardam os seus rendimentos separadamente, e pagamentos relacionados com os filhos não são considerados como despesas do pai, mas sim da responsabilidade da mãe. Nalgumas regiões da Bolívia, por exemplo, quando as agências de desenvolvimento estiveram a trabalhar na redução

20


das plantações de coca, depressa verificaram que o ganho realizado com a venda destas plantações ilícitas iam para as mulheres agricultoras, que chamavam a planta de “sua plantação”. As agências de desenvolvimento tiveram que reajustar os seus programas de desenvolvimento de plantações, de forma a criar outras fontes de rendimento ou plantações alternativas para as mulheres. Os serviços da microfinança estão sobretudo vocacionados para as microempresas que provavelmente produzirão um rendimento que permitirá ao devedor repor o empréstimo. Um leque de microempresas típicas encontra-se listado na caixa 1.1. As microempresas são normalmente negócios de família, ou de empresários individuais que operam nos sectores semi-oficiais e não oficiais. Nos países mais desenvolvidos as microempresas e as de pequena escala estão contabilizadas como companhias e geram uma larga percentagem de emprego. Na Roménia, firmas com menos de 10 empregados são mais de 90% de todas as companhias. A definição estatística das Pequenas e Médias Empresas (PMEs) varia de acordo com o país e é Caixa 1.1: Tipos ilustrativos de micro-empresas Serviços Transportes Reparação de máquinas Debulha de arroz Vendedores ambulantes Vendedores de mercado Cabeleireiro Fotocópias/fax/telefone Lavoura

Produção Alfaiate /costureira Fabricação de mobília Produção de comida Tecelagem Fabricação de cerveja Horticultura Carpintaria Ferreiro Artesanato

normalmente baseada no número de empregados ou na quantidade de activos. As microempresas empregam até 4 pessoas, o limite mínimo para as empresas de pequena escala é normalmente considerado entre 5 e 10 empregados e o limite máximo de 50 a 100 empregados (Hallberg, 1999). O sector das PMEs (sobretudo comércio) é normalmente muito vasto, empregando uma parte substancial da população activa, por exemplo 16% a 27% foram avaliadas através do Quénia, Zimbabwe, Suazilândia, Malawi e Lesoto (Parker e Torres, 1993). Em todos os países, os rendimentos dos pobres rurais, não provêm apenas da agricultura e frequentemente têm que realizar diversas tarefas de lavoura para manter a sua subsistência (Binns, 1998). Consequentemente, é de realçar que um número significativo das PMEs esteja situada em áreas rurais (68% a 90% foram analisadas acima) e mais de metade dos agregados pode depender das PMEs para produzir pelo menos metade dos seus rendimentos (Parker e Torres, 1993). Um número significativo de PMEs opera a partir de casa. Ensaios realizados no Zimbabwe, na Suazilândia, Quénia, Lesoto, Malawi e República Dominicana, revelaram que aproximadamente metade dos empresários das PMEs eram mulheres (Liedholm e Mead, 1995).

1.7 Serviços prestados por intermediários microfinanceiros Frequentemente as pessoas mais carenciadas necessitam de serviços adicionais, para além do acesso ao crédito. Podem não ter acesso a locais seguros que concedam juros para as suas poupanças, ou podem não ter acesso a informação relevante e atempada sobre os mercados, para além da sua vizinhança imediata. Sobretudo podem não ter conhecimento do leque de serviços financeiros que poderiam rentabilizar ainda mais os seus negócios.

21


Os intermediários microfinanceiros podem fornecer uma variedade de serviços aos seus clientes. Estes serviços incluem: Crédito Serviços de Depósito (voluntários ou obrigatórios) Seguros (saúde, vida, reforma, etc.) Cartões de crédito Capital de risco Serviços de desenvolvimento de Negócio Aluguer-compra para os carenciados Detalhes sobre alguns dos acima descritos (uns quantos ainda em fase embrionária para clientes com baixos rendimentos) são destacados de seguida. Para garantir que os assuntos sócio-económicos e de género, sejam sistematicamente incluídos nos seus serviços, as instituições de microfinança deverão rever todas as operações e regulamentos numa perspectiva de género, integrar práticas de equidade de género nos serviços para mulheres e homens, integrar globalmente assuntos de género, ao nível de direcção e em todas as acções de formação para clientes/membros e funcionários, condições de recrutamento e estruturas de incentivo.

1.7.1 Crédito É necessário reconhecer que o crédito tende a ser usado pelos clientes, não apenas com o motivo de produzir rendimento, mas também para necessidades inerentes ao agregado, tais como a habitação ou as reparações domésticas. Por vezes é difícil distinguir entre estas duas utilizações do crédito, pois as pessoas com baixo rendimento utilizam frequentemente as suas casas como a base para as suas produções. No sector paralelo é muitas vezes difícil separar actividades de empresa, da economia doméstica. Uma mulher devedora que tenha um negócio caseiro de fabricar pão ilustra este facto. Quando contrai um empréstimo para reparar o telhado, a questão põe-se se este é ou não um empréstimo de consumidor? Por vezes há a necessidade de pedir dinheiro emprestado para pagar dívidas, e os empréstimos são utilizados para este fim. Se o dinheiro é originariamente emprestado para actividades geradoras de rendimento e o dinheiro tem que ser utilizado para outros fins, é muitas vezes criada uma tensão no agregado, dependendo de quem é responsável pelo pagamento da dívida (Goetz e Sen Gupta, 1996).

Utilizando a casa para planificação e produção

22


1.7.2 Serviços de Depósito Os depósitos são serviços seguros para os particulares ganharem juros. A experiência tem demonstrado que existe uma grande procura de serviços de depósito. Por exemplo na Guiana e Moçambique as vendedoras dos mercados pagam a agentes colectores para passarem regularmente e recolherem fundos remanescentes. As poupanças são importantes por causa dos aspectos sazonais de muitas actividades das microempresas e também por causa de situações de emergência ou inesperadas que as pessoas têm que enfrentar. Muitos pressupostos são feitos sobre a forma como as pessoas mais carenciadas gerem o seu dinheiro e muitas vezes é esquecido que os mais pobres também se protegem contra os riscos e as emergências. A maior parte das pessoas reserva algum dinheiro para gastos inesperados, tais como fundos para funerais, colheitas perdidas ou desastres naturais. As agências de poupança são serviços que são necessários e no entanto são amplamente negligenciados. Questões chave que devem ser postas sobre os potenciais clientes de microfinança incluem que tipos de serviços de poupança podem ser fornecidos aos clientes e que tipo de juro pode ser pago? Como deverão ser as poupanças facilmente acessíveis para que os clientes, mulheres e homens, possam usar estes serviços? Qual a diversidade das actividades de subsistência das pessoas? Quais são as maiores fontes de rendimento e de despesa, e quais são, em tempo de crise, as estratégias competitivas previstas para diferentes grupos socio-económicos? Muitas organizações de microcrédito criaram no seu sistema de crédito uma componente obrigatória de poupança. Outras preferem ter uma componente voluntária de poupança no seu esquema de crédito. Como a maior parte das instituições de microfinança não está autorizada a captar as poupanças para si por medidas de segurança, pedem aos devedores que ou depositem as poupanças no banco, na maioria das vezes em nome do grupo de solidariedade, ou deixam o grupo guardar as poupanças. 1.7.3 Seguros O banco SEWA foi um inovador no lançamento de diversos seguros que vieram provar que as mulheres de baixo rendimento os valorizavam e arranjavam maneira de os pagar, desde que fossem talhados para colmatar as suas necessidades. Outras instituições de microfinança estão agora a experimentar este domínio.

23


1.7.4 Serviços de desenvolvimento de Negócio (SDN) Os serviços não financeiros, ou serviços de desenvolvimento de Negócio (SDN), podem incluir desenvolvimento empresarial, formação profissional e de gestão, extensão, consultoria e aconselhamento, desenvolvimento tecnológico e divulgação; informação sobre os mercados, padrões, tecnologias; desenvolvimento de ligações através de ‘franchising’, subcontratos, criando grupos de negócio, etc. Estes serviços fazem parte da ‘estrutura de suporte de mercado’ que auxilia as Caixa 1.2: Exemplo ‘da oferta’ de Servicos de desenvolvimento de Negócio (SDN) A SwissContact é uma ONG suiça que se especializou no apoio de fornecedores de SDNs, chamados Centros de Desenvolvimento de Negócio (CDN). Tem trabalhado com 8 destes CDNs no Perú e 6 CDNs na Indonésia. A abordagem da SwissContact destaca uma filosofia tipo empresa e uma orientação de mercado que rompe com as anteriores disposições de subsídios, muito frequentes dentro do sector das ONGs. No entanto, pelo menos 2 advertências existem: 1) O risco que os CDN apenas trabalhem com as microempresas mais ricas, e 2) Os custos associados com a assistência técnica da SwissContact e a vigilância dos CDN ser elevado. A SwissContact tem um contracto empresarial com os CDN que tenham esquematizado alvos financeiros. O CDN parceiro normalmente cobre até 50% dos seus custos operativos até 1 ano. A SwissContact concede bolsas para formação de equipas, inquéritos de mercado, e redes de comunicação com outros centros de negócio. A solidez financeira deverá ser alcançada pelos CDN em dois ou três anos a partir da sua abertura. Outras medidas de sucesso são custos de efectividade (tais como a capacidade por cliente) e contribuições financeiras (margem bruta) de serviços distintos. A experiência da SwissContact demonstra que existe um mercado para os SDN e que os fornecedores dos SDN podem transformar-se em instituições sustentáveis. Adaptado de Hagnauer, 1999

microempresas a ficarem e continuarem competitivas (Hallberg, 1999). O fornecimento dos SDN tende a ser orientado para os lucros, oferecido por actores de mercado para responder às necessidades do cliente, tal como a microfinança, em vez de ser obtido por subsídios governamentais e doações. Mecanismos do lado da oferta dos termos dos SDN, dependem das instituições que fornecem assistência técnica e de marketing às micro ou pequenas e médias empresas (PMEs), e que podem tornar-se comercialmente viáveis a longo termo. As intervenções do lado da procura são concebidas tendo por base a observação das necessidades dos compradores. Os mecanismos do lado da procura incluem o uso de títulos e de subsídios paralelos que possam ser justificados numa base temporária, e em casos de mercados subdesenvolvidos onde as microempresas desconhecem os benefícios dos SDN. Existem também intervenções do lado da procura relativas aos SDN (Caixa 1.2). Nos SDN, a chave para o sucesso é desenvolver um serviço de baixo preço que vá ao encontro das necessidades e ‘solvência’ dos pequenos clientes, homens e mulheres (Hallberg, 1999). 1.7.5 Aluguer-compra para os mais carenciados Aluguer-compra é um sistema através do qual uma pessoa pode adquirir e usufruir de um objecto através de pagamentos regulares. É um serviço frequentemente fornecido. Por exemplo, de forma a colmatar o receio que algumas pessoas têm em contrair empréstimos, a Ajuda de Acção no Bangladesh adquire riquexós e aluga-os a um grupo. Mais tarde, o cliente pode decidir pela compra do riquexó, e parte da taxa de aluguer é usada como entrada, dessa forma apenas um pequeno empréstimo é necessário para a quantia que falta.

24


1.8 Microfinança e o seu efeito nas mulheres empresárias As mulheres constituem a maioria dos pobres (PDNU, 1995b). No entanto, numa perspectiva de género socio-económica, as mulheres (ou os pobres) não são um grupo homogéneo e não existe receita microfinanceira genérica, que possa ir ao encontro das necessidades diferenciais das mulheres. Há um consenso crescente relativo aos assuntos socio-económicos e de género que necessitam ser analisados, de forma a garantir que a microfinança seja igualmente útil para homens e mulheres, ou para grupos marginais da sociedade ou para pobres diferenciados (Binns, 1998). Embora no passado, nem sempre tenha sido reconhecido pelo governo ou pelos bancos comerciais, muitas mulheres pobres tinham perspicácia empresarial e dotes de gestão, e nalguns contextos suportavam amplamente o agregado. Mas foi em parte através do seu sucesso como utentes da microfinança, que as mulheres empresárias, por mérito próprio, ficaram conhecidas. Os programas microfinanceiros que inicialmente pretendiam alcançar ambas as clientelas, feminina e masculina, passaram a ser predominantemente orientadas para as mulheres. Isto porque estes programas acreditavam que as mulheres pobres cumpriam melhor os seus compromissos dos que os homens pobres, e ainda porque as mulheres dedicavam mais dos seus rendimentos produzidos pelas suas actividades financeiras para o bem-estar das suas famílias (devido à sobreposição entre o papel produtivo e reprodutivo da mulher).

Muitas mulheres trabalham no sector paralelo (fonte IIRR 1998)

Nalgumas situações, os programas microfinanceiros ajudaram a melhorar a posição social da mulher. Por exemplo, a mulher tornou-se geograficamente mais móvel, dado que dirige o seu próprio negócio. Por causa do sucesso de muitos negócios femininos, as mulheres dizem que passaram a ser mais respeitadas nas suas comunidades, e a sua opinião e poder decisório, na família e na comunidade passou a ter mais influência. Muitas mulheres clientes da microfinança afirmam que agora sentem-se menos isoladas; manifestam satisfação por pertencerem a grupos solidários ou grupos de clientes não oficiais, onde se sentem incentivadas, compreendidas e apoiadas pelos seus pares. Esta perspectiva emergiu em muitas partes do mundo, conforme manifestado por clientes da microfinança nalguns dos países em desenvolvimento, a ADOPEM, uma ONG microfinanceira na República Dominicana; e outros países desenvolvidos, a Fundação de Microcrédito Froya e Hitra na Noruega. No entanto, apesar de muitas mulheres com baixo rendimento serem activas economicamente, como empresárias independentes (não reconhecidas) e como microempresárias, são ignoradas em geral, pela maioria das instituições financeiras convencionais e por muitas leis. Por conseguinte, um acontecimento significativo no sector da microfinança é a visibilidade e a evidência das mulheres como agentes principais no desenvolvimento social e económico. As mulheres passaram a ser

25


encaradas como microempresárias de sucesso; criadoras disciplinadas; investindo os lucros dos seus negócios na melhoria das suas casas e nutrição da família, no acolhimento das crianças, na saúde e na educação. A microfinança também fornece a ‘plataforma’ de poder necessária para criar um contexto favorável para incentivar as mulheres a ganhar direitos políticos. O banco SEWA em Ahmedabad, Índia é um destes exemplos. O SEWA criou um sindicato e ajuda os seus membros a lutar pelos seus empregados e outros direitos.

Os serviços financeiros permitiram a muitas mulheres o desenvolvimento dos seus negócios (fonte: IIRR 1998)

Outro desenvolvimento positivo para as mulheres na arena microfinanceira é a sua contratação deliberada como membros das intermediárias microfinanceiras, para posições de gestão e chefia, incluindo as de direcção. O Women’s World Banking6 (WWB) desenvolveu critérios de sucursais que incentivam as instituições de microfinança a usar mulheres em posições de gestão e de chefia. O WWB apenas aceita afiliações com instituições de microfinança cujos directores executivos sejam mulheres e cujos conselhos de direcção sejam maioritariamente femininos.

6

O Women’s World Banking foi fundado em 1975 tendo por missão a expansão do poder e da participação económica das mulheres com baixo rendimento, abrindo o acesso à finança, à informação e aos mercados. O WWB opera através de uma rede associada de 45 instituições de microfinança em 37 países por todo o mundo. Desde 1979, as instituições de microfinança assciadas do WWB fizeram mais de 200,000 empréstimos a mulheres de fracos recursos em todo o mundo, com 80% aproximadamente dos empréstimos (numa média de 600 US$) para negócios existentes, com uma taxa de reembolso de 97%.

26


1.9 Assuntos específicos que as mulheres enfrentam em relação aos serviços financeiros Com excepção das barreiras normais que as pessoas com baixo rendimento enfrentam, quando lidam com as instituições financeiras (por exemplo, a sua necessidade de pequenos empréstimos que não são lucrativos para os bancos), as mulheres mais carenciadas como grupo, têm ainda mais inconvenientes e dificuldades para alcançarem os serviços financeiros. Enquanto o analfabetismo impede homens e mulheres de preencherem os formulários para obtenção de serviços financeiros, o nível de analfabetismo das mulheres é superior aos dos homens na maior parte dos países. Muitas vezes, tanto as mulheres como os homens acham confusos os conceitos e símbolos da linguagem financeira. Em muitos países, enquanto os homens geralmente, são proprietários de terras e de outros capitais fixos, as mulheres carecem das garantias exigidas pelas instituições de empréstimo financeiro. Frequentemente os procedimentos das instituições oficiais de empréstimo requerem a assinatura do chefe de casal masculino – o que não facilita as candidaturas do chefe de casal femininos. Na globalidade, as mulheres tendem a desconhecer os seus direitos de se candidatarem aos serviços financeiros, mesmo nos países industrializados e nos países em transição. Na maior parte dos países em transição, tanto os homens como as mulheres não estão habituados a contratar os serviços de empresas privadas e ainda menos a contrair empréstimos bancários para necessidades empresariais. Inicialmente, provavelmente devido à sua falta de confiança, as mulheres em geral, estão ainda menos inclinadas do que os homens, para contraírem empréstimos, embora possam ter uma taxa de juro bonificada. Isto porque a estrutura do sistema de crédito formal tem tendência a ser hierarquizado e na perspectiva da mulher empresária pobre, o sistema pode parecer ainda mais complicado do que para os outros potenciais devedores. As mulheres com fraco rendimento são predominantemente menos literatas e menos habituadas a lidar com funcionários públicos e procedimentos formais. Os bancos são vistos como instituições poderosas e muitas mulheres podem não ter a confiança necessária para se aproximarem deles.

A percepção feminina dos banqueiros

Mesmo quando no sistema bancário oficial, existem oportunidades de empréstimo para os microempresários (devido ao programa de subsídios dos governos), frequentemente o seus processos de

27


candidatura e de selecção são muito morosos e por vezes muito desagradáveis. Como uma empresária polaca relembra, em 1977, “os empresários eram tratados pelos empregados bancários como ladrões, quando avaliavam os seus riscos de crédito”. Concluindo, os empresários preferem pagar aos intermediários microfinanceiros acima das taxas de mercado, desde que tenham a garantia de obter empréstimos mais rápidos e convenientes, do que tentarem contrair empréstimos que são difíceis de obter. Apesar destas dificuldades, o acesso aos serviços financeiros, pode ajudar as mulheres a dinamizar as suas capacidades e finalmente desenvolver os seus negócios. Com a melhoria destas (através do acesso a tecnologias, matérias primas, informação de mercado e integração de negócios), as mulheres podem expandir o seu papel económico. A melhoria da posição económica das mulheres contribui para o aumento da sua confiança, e por fim também para o seu papel social e político.

Caixa 2.2: Mulher Jordana aumenta o seu poder negocial na família Uma cliente de um dos programas de microfinança da Agência de Ajuda e Trabalho das Nações Unidas (UNRWA) na Jordânia que retrata os grupos solidários de mulheres, recorda que desde que se tornou empresária, a sua opinião passou a ser mais valorizada nas discuções com o seu marido por exemplo,aquelas relacionadas com os produtos que deviam comprar para a família. Agora sente que ganhou mais autoridade e que o marido a ouve, por exemplo, convenceu-o a comprar uma televisão mais pequena do que aquela que ele inicialmente queria comprar, e aproveitou o dinheiro extra, para adquirir coisas mais prementes para a família.. Fonte: trabalho do autor 1998

28


Capítulo 2 - Microfinança: o contexto socio-económico e de género

2.1 Microfinança e ASEG Um programa de Análise Sócio-Económica e de Género (ASEG) é organizado pela ‘Food and Agriculture Organisation’ (FAO). A abordagem da ASEG é baseada nos distintos factores sócioeconómicos e de género que afectam o resultado das iniciativas de desenvolvimento técnico. Estes podem incluir as considerações sócio-económicas e de género num programa de microfinança. Este Guia baseia-se no sistema da ASEG. Uma das ideias fundamentais da ASEG é a análise dos problemas e das situações em diversas perspectivas. A abordagem da ASEG é estruturada a três níveis, 1) o nível macro ou político, 2) o nível intermédio ou institucional e 3) o nível de base ou rural. Por conseguinte a abordagem da ASEG da FAO é muito útil para planificar sistematicamente uma operação microfinanceira; onde as pessoas rurais requerem serviços financeiros, os intermediários tentam fornecer esses serviços, e todos operam dentro do contexto nacional legal e regulador. Embora existam muitos exemplos bem sucedidos de programas microfinanceiros, é necessário reconhecer que a distribuição dos serviços microfinanceiros, nem sempre é bem sucedida. Isto pode acontecer devido a factores sócio-económicos ou de género que não foram previstos, ou que ficaram fora do controlo dos intermediários microfinanceiros ou dos clientes. Uma vez que os problemas das actividades microfinanceiras tenham sido identificados, tanto os projectistas como os clientes microfinanceiros podem decidir se são matérias fora do seu controlo (por exemplo uma política que não possa ser facilmente alterada) ou se é alguma matéria ao seu alcance (por exemplo um assunto relacionado com acções de formação de equipes, ou que lhes permita ter uma melhor percepção das necessidades dos clientes). As soluções possíveis para ultrapassar estes “empecilhos de progresso” podem ser analisadas num dos três níveis, no ambiente das políticas microfinanceiras, no dos intermediários financeiros, ou no dos clientes microfinanceiros, ou ainda nalguns casos, em todos os níveis. Muitas vezes as soluções para estas condições que retardam o progresso requerem um entendimento entre a realidade do nível de base e as decisões a nível macro ou institucional. No Programa de ASEG da FAO, o destaque é colocado na identificação participativa das prioridades de desenvolvimento tanto dos homens como das mulheres. Por conseguinte a participação dos clientes é necessária para a definição das suas necessidades e a planificação da participação de mudança baseada nessas mesmas necessidades. Isto é muito relevante para programas microfinanceiros, onde as instituições de microfinança criam os seus produtos e serviços especificamente para irem de encontro as necessidades dos seus clientes. O programa de ASEG disponibiliza uma forma sistemática de identificar os maiores intervenientes de um assunto específico ou de um conjunto de assuntos. Estas partes intervenientes incluem todos aqueles que directa ou indirectamente ganham ou perdem num programa microfinanceiro, incluindo aqueles que podem ficar descontentes acerca de actividades microfinanceiras planeadas, porque podem afectar o seu negócio ou território. Os recursos e as restrições de cada grupo de intervenientes são examinados. Se possível, é recomendável que grupos muito distintos de intervenientes, se reúnam e resolvam os seus conflitos desde o início.

29


2.2 Microfinança e pobreza A maioria dos serviços financeiros oficiais não está ao alcance dos pobres. A análise das actividades microfinanceiras numa perspectiva sócio-económica e de género, podem ajudar a focalizar as actividades microfinanceiras para os pobres ou grupos sociais marginalizados. É argumentado que a melhoria de acesso e opções para serviços financeiros, tais como depósitos, créditos e outros serviços, potenciam o nível de rendimentos, facilitando empresários individuais produtivos, e permitindo aos mais carenciados salvaguardar as suas posses em tempos de privação. No entanto também é do consenso comum, que a complexidade de restrições que a desigualdade e a pobreza acarreta, torna a microfinança apenas um elemento na abordagem para erradicar a pobreza. A premissa deste Guia é que a ‘microfinança’ é apenas um instrumento muito útil que permite o acesso a serviços financeiros e não financeiros, a empresários com baixo rendimento e que não é por si própria um ‘ingrediente mágico’ para a redução da mesma (Mayoux, 1997). Este Guia fornece alguns instrumentos de análise de género que permitem apoiar as iniciativas microfinanceiras, de forma a definir claramente as necessidades dos seus clientes e se essas actividades podem contribuir para a redução da pobreza. O esboço da declaração da ‘Cimeira de Microcrédito’ que teve lugar em Washington em 19977 promoveu o microcrédito como um ‘instrumento eficaz no combate para erradicar a pobreza e a dependência económica’. O Grupo Consultivo de Ajuda aos mais Desfavorecidos (CGAP) é uma iniciativa estabelecida pelo Banco Mundial com multi-doadores para reduzir a pobreza, através da concentração de recursos direccionados para o sector microfinanceiro dos mais pobres (CGAP, 2000). O CGAP foi criado em 1995 com um fundo de aproximadamente 35 milhões de US$. O CGAP decidiu que os seus clientes finais são os pobres, que podem beneficiar de um melhor acesso ao crédito (o CGAP centraliza-se mais no crédito do que nos serviços financeiros), com o objectivo de atingir os mais carenciados. O CGAP decidiu que a sua política será vocacionada para as mulheres mais pobres. A pobreza não é apenas um fenómeno económico e quantitativo, mas está inteiramente relacionado com assuntos estruturais de um determinado país. Recentemente tem sido debatido o fornecimento de serviços financeiros para os pobres e a capacidade de esses serviços terem algum impacto na redução da pobreza (Johnson e Rogaly 1997). Os ‘pobres’ não são uma massa homogénea, mas um enorme grupo heterogéneo de consumidores, produtores, economizadores, investidores, inovadores e agentes económicos adversos ao risco (Remenyi, 1997). Infelizmente a pobreza também é um fenómeno crescente. Estima-se que aproximadamente um bilião de pessoas vivam na pobreza, com menos de 1 dólar por mês. A diferença entre os 20 % do topo e os 20% mais baixos da população mundial foi calculada pela comparação dos PNB dos países com os maiores e os menores rendimentos per capita Em 1993 o rácio era de 60 para 1; em 1998 aumentou de 74 para 1. A disparidade do rendimento estava prevista alcançar 150 para 1 em 2000 (Baker e Nordin, 1999 citado em Ricupero 1999). Tem sido demonstrado que alguns aspectos da pobreza podem estar arreigados das desigualdades entre homens e mulheres. De facto, o risco de empobrecimento das mulheres pode ser maior do que o dos homens em três aspectos (Moghadam, 1996 em Chant 1997): 1. Estar em desvantagem em relação aos direitos e capacidades 2. Ter uma maior sobrecarga de trabalho e menor retribuição

7

Na altura da Cimeira muitos agentes microfinanceiros lamentaram a escolha do nome ‘Cimeira de Microcrédito’. Salientaram o facto que os empresários com baixo rendimento necessitarem tanto de poupança como de crédito, talvez até mais, e a microfinança é um termo mais abrangente que também cobre outros serviços financeiros não disponíveis para os mais pobres, tais como seguros e hipotecas. Muitos agentes também objectaram sobre a focalização da Cimeira no crédito, alegando que o crédito não deve ser interpretado como fazendo parte da panaceia para reduzir a pobreza, mas sim como um instrumento que a pode ajudar a reduzi-la.

30


3. Enfrentar restrições na mobilidade ascendente bem como na sua mobilidade geográfica, devido a barreiras culturais, legais e de mercado de trabalho Recentes descobertas sugerem que os créditos microfinanceiros acarretam maiores benefícios para pessoas apenas abaixo da linha de pobreza, do que para aquelas muito abaixo desta, e que as pessoas mais pobres tem, nalguns casos ficado ainda pior (Hulme and Mosley, 1996). Desta forma, a realidade é que não podemos exagerar o poder da microfinança e a respectiva assistência, enquanto se ignoram assuntos estruturais vitais que podem ser mais pertinentes na melhoria a longo termo, das situações de certos grupos com mais baixo nível sócio-económico. A mitigação da pobreza é raramente um assunto de simplesmente melhorar o acesso aos serviços financeiros. Por outro lado, é reconhecido que se forem dadas oportunidades a homens e mulheres com baixo rendimento, para desenvolverem o seu negócio, poderá inverter as condições predeterminadas da herança da pobreza. Por outro lado, é necessário combinar estratégias de redução de pobreza a nível local, com estratégias sectoriais com os intermediários que trabalham com os ‘pobres’ e ao nível macro. As dúvidas mais pertinentes são como e quais as maneiras mais eficientes de combinar tais estratégias.

2.3 Qual o significado de ‘Género’? A premissa de que alguns dos aspectos da pobreza podem estar enraizados nas desigualdades entre homens e mulheres necessita a consideração do significado do termo ‘género’. Mulheres e homens têm diferentes responsabilidades numa determinada cultura ou localidade. Por exemplo, nalguns países quando nos referimos a ‘lavradores’, é frequentemente assumido que nos estamos a referir a homens; no entanto em muitos países, são as mulheres que estão envolvidas na maior parte dos trabalhos das quintas e por conseguinte são na realidade os ‘lavradores’. Um lavrador pode portanto ser feminino ou masculino. O género refere-se ao papel social das mulheres e dos homens, e não deve ser confundido com os sexos biológicos de homem e mulher. O género é portanto um conceito relacional que analisa os papéis sociais das mulheres em relação aos dos homens e vice-versa. Desde muito jovens, aprendemos os nossos papéis de género. Mas estes papem não são estáticos, por exemplo, as mulheres podem fazer trabalhos tradicionalmente masculinos, e os homens podem tomar conta das crianças. Os papéis alteram-se de acordo com a localização geográfica e variam em resultado das circunstâncias sócio-económicas e políticas. Tomando por exemplo as finanças domésticas, muitas intervenções de crescimento no passado, fizeram assumir que, o dinheiro que entra num agregado é fundido para o benefício comum daqueles que o constituem. Nalgumas culturas as mulheres controlam o dinheiro para as pequenas despesas do agregado, mas os homens controlam o rendimento para artigos maiores, noutras culturas os rendimentos das mulheres e homens estão completamente dissociados e quando é necessário dinheiro para adquirir algum artigo, é mantido um sistema de negociação entre homens e mulheres dentro da ‘caixa preta’ chamada família. Os papéis de género são influenciados pelo entendimento e pela expectativa crescente de vários factores incluindo a classe, idade, etnia e religião. Tomando o dinheiro e a religião como exemplo, nalgumas culturas budistas, é considerado ‘humilhante’ lidar com dinheiro e frequentemente o manejo do dinheiro é da responsabilidade das mulheres, por causa do seu estatuto de ser inferior. Enquanto nalgumas culturas islâmicas, os homens podem controlar as finanças do agregado e comprar todos os artigos para utilização no lar. Tais diferenças sociais referentes aos papéis dos homens e mulheres através das regiões e culturas, pode ser apelidada de desigualdade relacionada com o género.

31


2.3.1 Análise das questões de género A análise das questões de género é uma maneira sistemática de estudar os diferentes impactos do desenvolvimento das actividades nos homens e nas mulheres e normalmente requer, a separação da informação e dos dados por sexo (ou etnia, nível de rendimento, idade etc.). Também requer uma percepção do como o trabalho é dividido e valorizado dentro de um determinado contexto cultural. A planificação de desenvolvimento pode tornar-se mais efectiva se for baseada num entendimento das relações sociais e de género, através das quais a produção é organizada e são encontradas as necessidades. Caixa 2.1: Alteração dos papeis na Armenia Um grupo de mulheres em Erevan na Armenia, referiu aos autores em Maio de 2000, que sentiam que no seu país, as mulheres eram as mais capazes de se adaptar as condições de alteração de mercado e de abraçarem livres iniciativas, como único recurso para sustentar as suas famílias. Numa situação de grande desemprego endémico, estimado em mais de 40% da força laboral, os homens, tradicionalmente o sustento da sociedade arménia, não parecem tão rápidos como as mulheres a assumir a alteração dos seus papeis de empregados estatais, e a começarem o seu próprio negócio. Com o acesso aos serviços microfinanceiros de um punhado de instituições de microfinança, muitas mulheres assumiram os seus novos papeis, começando as suas próprias operações negociais durante os últimos dois anos, e transformaram-se em pequenos comerciantes, pequenos produtores e fornecedores de serviços. Diversas clientes microfinanceiras femininas sustentam agora as suas famílias. Algumas dizem que preferiam voltar a ser empregadas, mas uma vez que isto não parece ser uma opção, estão satisfeitas por ganharem dinheiro como micro-empresárias.

Dado que as funções das mulheres e homens divergem em culturas, locais e contextos diferentes, a análise das questões de género, auxilia-nos a ajustar os problemas de maneira a evitar suposições incorrectas acerca das funções e actividades das mulheres e dos homens. Ainda nos permite enquadrar os problemas acerca das relações entre mulheres e homens. Homens e mulheres não vivem isolados uns dos outros. Por exemplo, se o programa microfinanceiro tem como objectivo específico as mulheres, os homens podem por vezes manipular o programa, resultando em empréstimos que são desembolsados nos nomes das mulheres mas utilizados para outros fins. Por conseguinte, para além de considerar as funções estáticas das mulheres e dos homens, devemos também tentar perceber a dinâmica das relações entre mulheres e homens e como a iniciativa microfinanceira pode alterar as funções e se isto irá afectar as operações microfinanceiras.

De facto, tomando ainda como exemplo as finanças domésticas, a análise das questões de género demonstra que não podemos planificar actividades microfinanceiras, baseadas na noção que dentro do agregado as decisões são um modelo ‘unitário’. O modelo unitário familiar, trata o agregado como tendo uma única opinião (Becker, 1981) e em termos da distribuição dos recursos assume-se que o que detém essa opinião é altruísta. No entanto, não se deve pensar nisto como a norma, como tem sido demonstrado na composição realista dos agregados, a utilização dos recursos, e a tomada de decisões é muito mais complexa e não implica necessariamente que uma vez que os recursos entrem no agregado, sejam divididos equitativamente. Frequentemente, o acesso aos meios dentro do agregado segue normas culturais complexas que implicam sistemas de negociação entre maridos e mulheres. A maneira distinta de como os homens e mulheres utilizam o dinheiro no agregado é objecto de muitas políticas e implicações programáticas. Os estudos de caso têm demonstrado que um rendimento acrescido recebido pelas mulheres, conduz a uma maior repartição do orçamento familiar dedicado às despesas com capital humano e a um melhor índice de influxo de nutrientes (Haddad, 1999). Embora as análises de impacto da microfinança nos micro-empresários, e implicitamente nas mulheres, sejam ainda muito escassas, têm sido feitas observações que apontam para o facto de as mulheres

32


aumentarem a sua participação de trabalho no agregado, quando se responsabilizam por uma actividade adicional remunerada. Isto acarreta complicações na maneira de planificar os programas microfinanceiros, se as mulheres já estiverem ‘sobrecarregadas’ nas suas funções dentro do agregado.

A análise das questões de género permite-nos evitar suposições incorrectas acerca das funções das mulheres e dos homens e reconhecer funções invisíveis (fonte: IIRR 1998)

2.4 Os programas microfinanceiros direccionados para as mulheres podem não ser sensíveis ao género Na área da microfinança, a crescente evidência de algumas taxas de amortização serem maiores nas mulheres, conduziram alguns intermediários microfinanceiros a especificamente se focalizarem nelas. É perfeitamente visível que as pequenas quantias de crédito usadas na microfinança parecem adaptarse mais facilmente às mulheres, do que aos homens e porque nalguns países, as mulheres têm menor mobilidade do que os homens e não tendem a ‘agarrar no dinheiro e fugir’8. No entanto, inerentes à abordagem direccionada ‘exclusivamente’ para as mulheres, existem problemas que podem exacerbar (ao contrário das expectativas) ainda mais as desigualdades de género.

Por causa das suas funções distintas, quer os homens quer as mulheres têm necessidades diferentes nos serviços financeiros e acessos diferentes à infra-estrutura que apoia a sua produção de rendimento, ou aos esquemas de expansão de negócio. Mas uma vez, no entanto, é importante ressaltar que nem os homens nem as mulheres (nem aqueles mais carenciados) são um grupo homogéneo e não devem ser tratados como tal. As mulheres por exemplo podem ser viúvas, solteiras, recém-casadas, grávidas, jovens, empregadas, do campo, da cidade, etc. Do mesmo modo, os homens podem ser classificados pelo seu estado civil, idade, nível de rendimento e de bem-estar económico. Por exemplo, as poupanças são muito importantes para ambos, homens e mulheres com baixo rendimento. Estas são particularmente importantes como rede de segurança para mães solteiras ou mulheres que têm um futuro incerto.

8

Rahman (1998) generalizou quanto ao comportamento dos homens e mulheres no referente aos serviços financeiros, e sugeriu que as mulheres tendem a agir de acordo com um ‘comportamento de modelo cultural’ , ou seja: tendem a ser mais susceptíveis à hostilidade verbal que lhes é dirigida pelos empregados bancários e companheiros de grupo, quando surgem dificuldades no pagamento das dívidas. O estigma da não execução das dívidas pode ser ainda pior se houver lugar a execução pública de dívidas em reuniões de grupo. Rahman acrescenta ainda a noção de que as mulheres são particularmente mais susceptíveis, porque o seu insucesso em pagar as dívidas reflecte-se negativamente na família e linhagem, enquanto os homens parecem ter uma postura mais despreocupada.

33


Provas recentemente acumuladas ilustram que quando os programas microfinanceiros se focalizam exclusivamente nas mulheres, estas frequentemente funcionam como ‘fachada’ para os homens que querem ter acesso ao crédito (Haddad, 1999; Goetz e Sen-Gupta 1996). Os motivos que levam uma mulher a ser uma devedora ‘substituta’ podem ser extraídos da sua habilidade em auxiliar o seu marido, os filhos, ou outros familiares a alcançarem uma melhor posição social e uma melhor perspectiva económica. De facto contrair empréstimos ou outro tipo de serviços financeiros, é raramente obtido individualmente. No âmbito do Grameen Bank, Goetz e Sen-Gupta (1996) chegaram à conclusão que a maioria das mulheres devedoras do seu estudo, não controlavam nem os empréstimos recebidos, nem o rendimento produzido pelas suas microempresas. Um número significativo dos empréstimos femininos era na realidade controlado por familiares masculinos, que tinham utilizado as mulheres para servirem de fachada para obterem os créditos que eram oferecidos. Há a possibilidade que a centralização de créditos ‘só em mulheres’ podem colocá-las em risco de abuso doméstico, quando são forçadas a agir como cobertura para outros que estão excluídos do acesso a esses créditos. Nalguns casos, os empréstimos têm sido utilizados pelos homens para montarem empresas nas quais as mulheres têm pouco controlo, e noutros casos receia-se que o pequeno aumento no rendimento feminino esteja a originar um decréscimo na comparticipação masculina em certas despesas do agregado (Mayoux, 1997). Muitas vezes é presumido que, uma vez que são as mulheres que estão envolvidas nas transacções financeiras rurais, são elas que controlam os empréstimos. A questão mantém-se de como saber qual a melhor maneira de garantir que as mulheres mantenham o controlo suficiente dos seus empréstimos, invistam nas actividades mais rentáveis (que podem ser dominadas pelos homens) e manter o controlo nos lucros desse investimento (Binns, 1998). Noutros casos, os programas microfinanceiros que se centram exclusivamente no papel económico produtivo da mulher, ou seja, a sua capacidade para ganhar dinheiro, também conduziram a uma carga mais pesada de trabalho para as mulheres (Mayoux, 1997), com aumento da pressão de trabalhar para o dinheiro, simplesmente porque foram focadas como tendo o potencial para reembolsar os empréstimos. Por conseguinte, o impacto das actividades microfinanceiras não pode ser simplesmente deduzido pelo recolher dos serviços financeiros ou a capacidade de reembolso das mulheres. No conjunto, não pode ser assumido de forma ingénua que os aumentos do rendimento do agregado, possam ser necessariamente traduzidos num aumento de controlo sobre esse rendimento ou aumento de bem-estar no agregado, ou alterações noutros aspectos de desigualdades de género (Mayoux, 1995). É importante não ignorar o facto que os homens e mulheres vivem juntos e têm relações e negociações complexas. Por outro lado, os programas que se centram nas mulheres podem ser e são, o ponto de entrada mais prático para fazer os programas funcionarem, justificados pela forma de dirigir as causas estruturais da iniquidade entre géneros a longo prazo, e como recompensa aumentar a consciência de género. Por exemplo, se a mulher vai a uma reunião de grupos de empréstimos e não teve possibilidade de pagar o seu empréstimo, porque o seu marido levou o dinheiro e utilizou-o para comprar álcool com os amigos, ou se ela não pôde ir ao mercado para vender os seus produtos, porque o seu marido lhe bateu, pelo simples facto de fazer parte do grupo, a mulher pode ganhar mais confiança para discutir os seus problemas ao nível do grupo e podem surgir formas de lidar com este problema. Estes problemas não são raros, e a pressão da sociedade é frequentemente uma maneira vantajosa de os homens deixarem de bater nas mulheres (Johnson, 2002 com. pessoal). Portanto, a incapacidade da mulher poder pagar os seus empréstimos é examinada no contexto mais alargado das suas relações com o seu marido. Por conseguinte a ‘abordagem de género’ examina as relações entre homens e mulheres e a sociedade. Em comparação, as intervenções que se centram exclusivamente nas mulheres como grupo, podem resultar em ressentimentos entre os homens e podem não ser sucedidas, porque não consideram as relações entre os sexos. O “género” e as “mulheres” não são termos que possam ser trocados. Incorporar a perspectiva de género é uma tarefa analítica. Requer uma avaliação da maneira de como o género (entre outros factores) contribui para desenvolver uma tendência específica, um problema, ou o resultado potencial das intervenções. A razão porque a análise das questões de género muitas vezes resulta, em mais debates sobre as pressões sofridas pelas mulheres, é porque a desigualdade é normalmente destacada através dessa análise. 34


No entanto, em muitos países pode ainda existir a necessidade de focalizar programas, legislação e políticas específicas para as mulheres, porque estas têm menos alternativas do que os homens em termos de acessibilidade ao crédito ou outros serviços financeiros. Por esta razão, muitos dos exemplos e recomendações neste Guia defendem a discriminação positiva dirigida às mulheres (i.e. centrada nas mulheres) em situações onde a análise das questões de género indica que as mulheres são um grupo social marginalizado ou negligenciado. Resumindo, os programas microfinanceiros que ‘focalizam as mulheres’ isoladamente podem não ser sensíveis ao género, porque dirigir assuntos de género nas intervenções da microfinança significa muito mais do que centralizar um programa ou calcular o número de empréstimos contraídos pelas mulheres. Requer a adopção de uma abordagem direccionada para o cliente. Por exemplo, uma abordagem de género deverá implicar a análise da posição económica e social da família e da comunidade, tantos dos homens como das mulheres. Uma abordagem de género também deverá implicar a investigação de como a posição económica e social dos homens e das mulheres é reforçada através das instituições com as quais lidam, e como o nível nacional das leis e costumes, governa a posição económica e social das mulheres e dos homens (Johnson, 1999). É por isto que este Guia não se centra apenas em assuntos de género ao nível do cliente (ou de base), mas também questiona a forma de como os assuntos de géneros são encaixados dentro dos intermediários que fornecem os serviços microfinanceiros e dentro de uma política de contexto nacional.

2.5 Diferentes perspectivas: os níveis macro, intermédio e de base Diferentes agentes microfinanceiros, quer sejam utentes ou fornecedores dos serviços microfinanceiros terão perspectivas diferentes. Para distinguir os desafios, problemas e assuntos que surgem nas operações microfinanceiras, é útil diferenciar as perspectivas em três níveis essenciais: o nível macro ou político; o nível dos clientes microfinanceiros e o intermédio ou nível das instituições de microfinança. Os três níveis são esquematizados na Caixa 2.2 abaixo. A vantagem de dividir o contexto em níveis macro, intermédio ou de base, é que torna mais fácil Caixa 2.2: Níveis Macro,intermediário e de base O nível Macro inclui as políticas nacionais que governam as actividades microfinanceiras no país. Incluem, legislação e regulamentação. Tais políticas nacionais influenciam a forma como as instituições microfinanceiras operam e também os incentivos existentes para os empresários. As políticas Nacionais de Agricultura, as tendência demográficas, termos de negócio, política nacional de educação, taxa de desemprego, e despesas públicas também têm uma enorme influência quer nos intermediários microfinanceiros quer nos clientes. As instituições multilaterais que podem exercer influência ao nível macro, através de leis e acordos internacionais, cooperação e desenvolvimento internacional e político, são o Banco Mundial, o FMI, Agências das NU, a União Europeia (UE),as agências bilaterais bem como a OCDE. O nível Intermediário centra-se nas instituições (ONG, bancos, organizações de desenvolvimento, cooperativas de crédito e cooperativas, etc.), e como operam em termos de prestação de serviço e de implementação, bem como influenciam a política nacional relacionada com a microfinança, e a metodologia acertada dentro do sector. Neste nível, os assuntos incluem as funções dos sectores privado e público, níveis de descentralização, estructuras institucionais e níveis de especialidade e experiência entre as instituições. No nível de base o foco incide nas mulheres e homens empresários. É essencial questionar como é que os intermediários microfinanceiros ou verdadeiramente os agentes políticos, podem identificar as necessidades e prioridades específicas das mulheres e homens no referente aos serviços financeiros. Outros agentes são as organizações rurais, associações de clientes e redes de clientes.

35


diagnosticar a que nível é que os problemas devem ser tratados, e decidir quais os assuntos que estão dentro do nosso controlo, em termos de efectuar as alterações. Identificar as associações e interdependência entre os níveis é vital. Tendo em consideração os outros níveis, espera-se que independentemente do nível onde cada um funciona, as actividades sejam organizadas de maneira mais eficiente. Depois desta categorização, é importante identificar os intervenientes em cada nível. Isto é alcançado usando a análise das partes intervenientes, a qual fornece a percepção interna da dinâmica de cada nível, e também a interligação entre níveis.

2.6 Análise de partes intervenientes Para as operações microfinanceiras, identificar um lago espectro de partes intervenientes pode ser um útil exercício de planificação, para garantir que os programas microfinanceiros possam realizar-se conforme previsto. Os intervenientes incluem, todos aqueles, que directa ou indirectamente, intervêm em determinada actividade, programa ou política microfinanceira. Os intervenientes podem ser individuais ou grupos e podem incluir: Homens

e mulheres empresárias e organizações rurais no nível de base. Nas áreas rurais, estes podem ser lavradores com pequenas parcelas de terra, trabalhadores sem terra, trabalhadores migrantes, camponeses restabelecidos, diferentes grupos étnicos (com diferentes práticas de agricultura), trabalhadores infantis, juventude rural, comerciantes, etc.

Fontes

financeiras não oficiais (devedores ; associações de crédito, associações mutualistas RoSCAS, etc.) bem como oficiais (bancos; outras instituições financeiras), instituições microfinanceiras, ONGs, Cooperativas de Crédito, cooperativas, empresas do sector privado, organizações rurais, grupos de influências e sociedades financeiras no nível intermédio

Agentes

governamentais nacionais e locais; diversos ministérios (Agricultura, Finança, Comércio e Indústria, etc.) o Banco Central, agências e corporações internacionais (União Europeia, o FMI, o Banco Mundial, as agências das NU, doadores bilaterais) no nível macro

A tentativa de identificar um largo espectro de intervenientes nas actividades microfinanceiras particulares, requer um conhecimento e uma avaliação dos riscos de todos os intervenientes. O relacionamento de cada grupo de intervenientes com os objectivos dos programas microfinanceiros deve ser considerado. O sucesso de uma operação microfinanceira depende em ultima análise das interacções de todas as partes intervenientes, que têm inevitavelmente objectivos e interesses diferentes. A identificação das partes intervenientes irá talvez ajudar a reconciliar as várias exigências e posições desses intervenientes, e destacar os potenciais conflitos de interesse entre os diferentes grupos. As instituições microfinanceiras podem não ter a capacidade de resolver os conflitos entre grupos distintos, mas precisam de estar conscientes que eles existem, caso eles comprometam o programa. A análise das partes intervenientes permite uma troca efectiva de informação. Identificar, e se possível incluir um largo espectro de intervenientes em cada um dos três níveis de planificação, deverá ajudar a estabelecer estruturas, que eventualmente canalizarão a informação da situação real, ao nível de base para as instituições microfinanceiras e vice-versa – tais informações deverão em última análise alcançar o nível dos decisores políticos.

36


2.7 Factores sócio-económicos que afectam a microfinança Tanto os homens como as mulheres vivem num mundo complexo, que está constantemente em mudança. Por exemplo, os agricultores têm que se confrontar constantemente com decisões de escolha, sobre quais colheitas ou variedades se devem concentrar os seus esforços e recursos microempresariais, sobre as novas oportunidades de mercado, de restrições ambientais, como pragas e enfermidades, a possibilidade e custo de trabalho, entre outras razões. Muitos agricultores mais pobres não obtêm o seu rendimento apenas das suas actividades agrícolas, e tem que examinar os proveitos de outras actividades geradoras de rendimento. Geralmente Não é recomendável transferir uma abordagem microfinanceira particular, ou um modelo microfinanceiro que funcionou com êxito num contexto ou cultura para outro, sem antes prever alterações para essa localização ou contexto particular. O contexto dentro do qual diferentes actividades microfinanceiras funcionam, difere de lugar para lugar e vários factores (incluindo os de género) influenciam a maneira como elas funcionarão na prática. Nalgumas culturas, por exemplo, os grupos solidários como metodologia microfinanceira não são apreciados. Este é o caso da maior parte dos países em vias de transição, onde qualquer forma de colectivismo imposto reaviva a memória do comunismo. Alguns exemplos de diferentes abordagens de cópias de programas microfinanceiros estão incluídos na Caixa 2.3.

37


Caixa 2.3: Copiando e modificando abordagens microfinanceiras. Na Rússia: Diversos programas começados pela ‘Opportunity International’, uma ONG cediada nos EUA, criados inicialmente como modelo para grupos de solidariedade, trocaram a sua metodologia para empréstimos individuais. Na França: A ‘ADIE’, uma ONG francesa prevista para se centrar numa populaçaão que inclui imigrantes e desempregados, teve que deixar o modelo de grupo de solidariedade que estava a utilizar, a favor do empréstimo individual. A razão para tal troca teve a ver com o facto dos devedores serem de ambiente urbano e de terem muito poucos laços comunitários. Era portanto difícil identificar e convencer membros potencialmente interessados em se reunirem. Na Polónia: Os clientes inicialmente resistiram à ideia de se juntarem a grupos de solidariedade num programa microfinanceiro organizado pelo ‘Fundusz Mikro’, uma das maiores instituições microfinanceiras na Polónia. O ‘Fundusz Mikro’ adoptou uma interessante solução intermédia – Usaram incentivos financeiros para atrair mutuários para emprestimos de grupos de solidariedade. Um grupo de quatro mutuários teria melhores taxas em cada um dos seus empréstimos, do que se tivessem solicitado empréstimos individuais. Os empréstimos para grupos de solidariedade são menos onerosos para as instituições microfinanceiras do que os empréstimos individuais, dado que não existem garantias dos mutuários microfinanceiros e as economias de escala lucram quando prestam serviço a vários mutuários ao mesmo tempo. Para além disto, os grupos de solidariedade partinham algum do trabalho dos funcionários microfinanceiros, o que diminui ainda mais o custo dos empréstimos. Por conseguinte existia um forte incentivo para o ‘Fundusz Mikro’ dar preferência a grupos de solidariedade com a sua metodologia de empréstimo, e deixar as poupanças para os seus clientes. Na Noruega: Na ilha Lofoten no norte da Noruega, as mulheres não tinham nenhuma actividade remunerada, o que as impelia a abandonar a ilha em grande número. Os homens estavam envolvidos na pesca. Uma adaptação do modelo do ‘Grameen Bank’ foi iniciado na ilha, como forma de controlar o exodo das mulheres para o continente. O modelo de grupo de solidariedade, adaptado à realidade norueguesa na ilha veio a ser um sucesso. As mulheres começaram a desenvolver pequenas produções e negócios de prestação de serviços, sobretudo orientados para o mercado de turismo. Na generalidade as mulheres ficaram mais satisfeitas por ficarem na ilha. Subsequentemente o modelo de grupo de solidariedade multiplicou-se noutros locais da Noruega. Por exemplo o programa de microcrédito de Froya e Hitra centraliza-se nestas duas ilhas e na região continental central da Noruega. Em 1998 representantes do governo suéco ficaram interessados em adoptar o modelo Norueguês ao contexto Suéco. Consideraram mais sensato adaptar o já adaptado modelo Norueguês ao contexto Suéco do que começarem do nada, a partir do modelo original do Bangladesh. Fonte: trabalho das autoras

Para um planeamento efectivo, é importante considerar antecipadamente os factores socio-económicos que podem afectar um modelo microfinanceiro particular, numa nova localização ou uma operação microfinanceira recém planificada. No programa da ASEG seis factores sócio-económicos são salientados e servem para lembrar os factores que podem ser tidos em conta quando se planificam actividades microfinanceiras. Estes factores incluem: os económicos, socioculturais, institucionais, políticos, ambientais e demográficos. Todos estes factores deverão ser considerados nas diferenças de género.

38


Factores económicos Um factor económico pode ser a diferença entre o acesso que homens e mulheres têm a um trabalho remunerado e consequentemente o nível de poupança que podem ter. Diferenças entre o acesso aos serviços financeiros de ambos ou problemas sobre quem controla o dinheiro no agregado. Factores económicos também estão relacionados com a propriedade das terras e outros recursos. O ambiente económico total do país é também relevante para a forma como as instituições microfinanceiras podem operar. Liquidez de mercado, PIB per capita, potenciais exigências para serviços microfinanceiros tal como existem, o nível de inflação (por exemplo as crise financeiras na Rússia e partes da Ásia), a quantidade de ajuda dos doadores (o Fundo Monetário Internacional, por exemplo, ajuda a manter uma baixa inflação), níveis de pobreza, todos são factores importantes a ter em conta quando se esquematiza ou gere um programa microfinanceiro. Factores políticos Os factores políticos podem alterar a forma como as mulheres e homens assumem e partilham o poder e a autoridade. Isto pode alterar o processo de orientação política referente à microfinança. Os factores políticos incluem políticas governamentais que incentivam os empresários em geral e as mulheres empresárias em particular. A situação sócio-económica no país é um factor crucial para o investimento e para a compreensão da estabilidade política ou para a falta desta, bem como a situação política previsível do país são factores importantíssimos. Em situações de conflito, os programas microfinanceiros, têm que fazer face a diferentes desafios, por exemplo a circulação de bens pode ser difícil, se não impossível. Não obstante, os programas microfinanceiros podem ser adaptados para tais situações. Por exemplo, onde existem refugiados políticos (Geórgia) ou onde ocorreram conflitos inter-étnicos (Bósnia e Herzegovina) é ainda possível organizar programas microfinanceiros. Factores demográficos Os factores demográficos relacionados com os serviços financeiros incluem o número de bancos per capita, ou a capacidade do intermediário microfinanceiro conseguir alcançar um espaço vital nas suas operações, através do aumento do número de clientes. Por exemplo, na Bósnia e Herzegovina onde existem cerca de 3.8 milhões de habitantes, existem agora 27 instituições microfinanceiras. Tendo-se apercebido que eram demasiadas, começaram a fundir-se umas com as outras. O facto de actualmente muitas pessoas se mudarem para as áreas urbanas é também um factor demográfico importante. Em 2025, a maior parte da população mundial viverá em áreas urbanas. Pode ser necessário determinar em cada região se as pessoas que estão a mudar-se para as cidades são mais homens do que mulheres e quais as suas consequências. Os níveis de migração, imigração e emigração, num determinado país ou região são uma consideração demográfica. Uma grande percentagem da população sueca é composta por imigrantes. Alguns dos recém-chegados manifestam interesse em adquirir empréstimos para criar microempresas. As autoridades estão a considerar a microfinança como uma forma de auxiliar os imigrantes a integrarem-se na sociedade e simultaneamente fomentar o crescimento do emprego e alicerçar os negócios sustentáveis. Factores socioculturais Os factores socioculturais incluem a maneira de como socialmente pensamos que as mulheres devem funcionar de determinada maneira e os homens noutra no que se refere a operações negociais (por exemplo o ‘código de indumentária’ pelo facto de ser uma mulher de negócios, conforme se ilustra na figura). Mulheres e homens são condicionados a ter certos comportamentos e a seguir determinados caminhos pela maneira como são educados. Os rapazes e raparigas brincam com diferentes brinquedos, tem tarefas domésticas distintas, e espera-se que escolham determinadas profissões, e

39


estes condicionalismos estão enraizados nas pessoas desde tenra idade. Em muitos países os livros escolares contêm ilustrações onde os homens são médicos, engenheiros e directores e as mulheres enfermeiras, educadoras e secretárias. Na generalidade existem muito poucas mulheres em posições estratégicas a todos os níveis, nas conferências são essencialmente os homens que são moderadores dos debates ou que fazem apresentações, etc.

Factores socioculturais alteram a nossa percepção das pessoas, por exemplo os ‘códigos de indumentária’

Factores institucionais Os factores socioculturais frequentemente tornam-se institucionalizados. Os factores institucionais podem estar ligados à falta de educação e oportunidades de formação das mulheres empresárias, porque é assumido pelos formadores que os homens deverão ter a liderança ou que eles transmitirão o conhecimento adquirido para as suas mulheres ou colegas. Factores ambientais Os factores ambientais poderão incluir recursos naturais disponíveis para iniciação de actividades empresariais. Tais recursos poderão ser legislados ao nível nacional (exp. abate de florestas) mas a realidade ao nível de base pode ser diferente. Mulheres e homens usam os recursos naturais de maneira distinta. As catástrofes naturais, tais como inundações, terramotos e seca têm consequências ambientais que afectam as actividades empresariais. Nalguns países existe legislação que, através de impostos, incentiva o uso de recursos amigos do ambiente.

40


2.8 Análise de recursos e restrições Dentro da estrutura deste Guia observamos ambos os recursos e restrições dos diferentes grupos de partes intervenientes (nos níveis macro, intermédio e de base). É importante entender como os indivíduos e grupos em todos os níveis distribuem e usam os recursos e superam as dificuldades numa análise das questões de género sócio-económico duma operação microfinanceira.

2.8.1 Recursos Um recurso é o meio de fornecer o que é necessário. O capital financeiro é um recurso, e inclui acesso à poupança e ao crédito bem como remessas regulares para uso do trabalho. Bens tangíveis como a terra e equipamento de produção são recursos disponíveis para certos grupos. Outros recursos necessários para as actividades empresariais incluem habilidade, conhecimento, trabalho e sociedade em grupos específicos. Uma política macro, favorável às actividades empresarias é também um recurso. Os recursos naturais também podem ser contemplados (terra, água, vida selvagem). As infraestruturas de base são recursos muito úteis que auxiliam em termos de activos de mercado e frequentemente são fornecidos e controlados pelo governo. O Estado, as instituições, a família e os privados tentam maximizar os seus recursos e utilizá-los para gerir riscos e aproveitar ao máximo as oportunidades. No nível de base, por exemplo, os particulares necessitam de recursos específicos para as suas actividades empresariais. Tanto os homens como as mulheres têm que equilibrar a utilização de recursos, de forma a garantir a estabilidade do sustento familiar e fornecer abrigo, vestuário, cuidados de saúde, educação e a salvaguarda de materiais necessários à produção. Do ponto de vista do intermediário microfinanceiro, será necessário por exemplo, questionar a competitividade dos recursos, antes de conceder empréstimos. No nível intermédio, através da distribuição de serviços, as instituições microfinanceiras concedem recursos respeitando as regras definidas pelo Estado, e a autoridade que lhes é dada por ele. A forma como os recursos são e podem ser usados dentro de uma instituição, e a forma como são distribuídos a grupos de clientes é também de grande importância para as operações microfinanceiras. Intermediário microfinanceiros bem sucedidos têm demonstrado que podem alcançar a sustentabilidade de materiais subsidiados, desde que existam recursos de gestão. Os conselhos de gestão podem ser um recurso vital e podem exercer um papel importante no sucesso das instituições microfinanceiras. Em 1995, um inquérito efectuado a todas as afiliadas do WWB apontava o relacionamento entre a gestão das instituições microfinanceiras e os conselhos de gestão, como sendo o desafio principal para a formação de instituições microfinanceiras fortes. A existência de um conselho de direcção perfeitamente funcional e bem sucedido é portanto um dos recursos mais importantes das instituições microfinanceiras. No nível macro, o Estado controla os recursos financeiros e produtivos e alguns recursos naturais principais. Políticas nacionais favoráveis, que regulam os intermediários microfinanceiros são um recurso importante para as instituições financeiras rurais, bancos, e ONGs que pretendem levar a cabo programas e actividades. A política nacional dita como os recursos são distribuídos entre os cidadãos de um país. A tomada de decisões políticas, sistemas legais e económicos e normas étnicas e culturais, influenciam a forma como os recursos são distribuídos em todos os níveis.

41


2.8.2 Restrições Restrição é uma limitação imposta sobre um movimento ou acção desejada. As restrições para alcançar uma melhor posição de bem-estar económico existem nos três níveis, macro, intermédio e de base. No nível de base, homens e mulheres encaram muitas restrições para saírem da sua situação de pobreza. Também enfrentam restrições em termos de normas predominantes e valores baseados nos papéis sociais ou de grupo. Em muitos casos as restrições ao desenvolvimento dos negócios para mulheres são o resultado de diferenças associadas ao género. Por exemplo, nalguns contextos, as próprias mulheres não são incentivadas por outras mulheres a iniciarem um negócio. Por conseguinte existe uma pressão da sociedade para impedir que elas comecem actividades empresariais. Os governos enfrentam restrições em termos de gastos nos diferentes sectores. Também têm que enfrentar restrições devido à situação económica durante o seu mandato. As condições ambientais como a seca, a poluição e a delapidação dos recursos naturais são forças que compelem e restringem a capacidade governamental de atingir os seus objectivos. Os intermediários microfinanceiros enfrentam restrições devido à legislação e regulamentação dos países onde estão a funcionar, bem como restrições nos termos da sua estrutura organizacional. Além disso, são restringidos no seu acesso ao dinheiro dos doadores e das fontes comerciais dos fundos. Frequentemente, os acontecimentos políticos e económicos atingem gravemente a operação de intermediários das instituições microfinanceiras. Algumas restrições ficam para além do controlo dos grupos particulares de intervenientes, enquanto que outros podem ser superados. Por exemplo, o grau da infra-estrutura num país é controlado no nível macro, enquanto no nível de base restringe os empresários em termos do seu acesso aos mercados. A taxa de inflação pode afectar o valor real das poupanças dos particulares. De modo inverso, as restrições relacionadas com abordagens não profissionais das equipes das instituições microfinanceiras podem possivelmente ser superadas através da formação.

42


Capítulo 3 - Género e Microfinança: o nível de base

3.1 Introdução A microfinança é muitas vezes proposta como a ‘cura milagrosa’ para as pessoas mais ‘pobres’, com pequenos empréstimos e poupanças. No entanto é necessário ser realista e salientar o facto que muitos programas de crédito e de poupança, não chegam de facto aos mais necessitados, embora possam beneficiar os ‘ligeiramente menos pobres’ (Marr, 1999). Apesar de tudo, há algumas abordagens de serviços financeiros para os sectores mais carenciadas das comunidades, que têm sido bem sucedidas e, é com base em determinadas regras de ‘metodologias acertadas’ destes programas que esta secção é extraída. A secção do nível de base deste Guia concentra-se nos clientes microfinanceiros. A centralização é feita na análise das diferenças sócio-económicas de diferentes grupos de clientes, de modo a que os serviços microfinanceiros possam melhor corresponder às necessidades dos clientes. Se as actividades de desenvolvimento forem concebidas apenas por observadores externos, incluindo as actividades microfinanceiras, estas podem ignorar as capacidades, prioridades e necessidades dos homens, mulheres e crianças nativos e podem conduzir ao fracasso. Mesmo nos casos onde se pergunta aos nativos que são potenciais clientes, dados sobre o alcance dos serviços financeiros disponíveis para eles, os programas microfinanceiros podem ainda assim, ser planificados sem o envolvimento dos nativos nesse processo. No entanto, convém salientar que os programas microfinanceiros não podem ser personalizados exactamente para cada região, porque seria extremamente oneroso ter serviços distintos para cada região. Não obstante, conhecer os clientes pode significar que os serviços correctos disponíveis são propostos aos grupos correctos. Uma forma de conduzir este problema, é considerar a análise sócio-económica e de género como um conjunto de instrumentos que permite uma melhor avaliação das necessidades dos clientes. Qualquer uma destas análises deverá ser feita de forma a permitir a participação activa de potenciais clientes microfinanceiros a todos os níveis de planeamento. Se forem evitados os pressupostos acerca da repartição de trabalho dentro duma comunidade, incluindo a avaliação das actividades empresariais por género, poderá ser obtida uma melhor compreensão da utilização dos recursos.

3.2 As partes intervenientes no nível de base As partes intervenientes chave no nível de base são os homens e mulheres com baixo rendimento, potenciais clientes dos programas microfinanceiros. Na generalidade, as partes intervenientes deste nível incluem os devedores e os que economizam, bem como outros grupos interessados (incluindo o Estado e as próprias instituições microfinanceiras). Embora as partes intervenientes chave sejam os clientes (ou potenciais clientes) dos serviços microfinanceiros, não podem ser tratados como um grupo homogéneo. São na realidade grupos altamente heterogéneos de consumidores, produtores, investidores, inovadores e agentes económicos não especuladores (Remenyi, 1997, FAO, 1994). Desagregar e dispersar grupos de partes intervenientes garantirá que os produtos e serviços mais apropriados sejam personalizados para grupos diferentes de clientes. A análise das partes intervenientes pode facilitar o entendimento da importância das instituições financeiras e quaisquer

43


grupos de poupança e de crédito que existem ou existiram no passado. As questões no Apêndice A3.1 serão úteis para obter uma imagem completa das partes intervenientes. As seguintes subsecções levantam questões que irão destacar os potenciais ‘engarrafamentos’ evidentes no nível de base. Esta secção pode ser utilizada pelos agentes das instituições de microfinança para reflectirem nos programas existentes, ou para melhorá-los.

3.2.1 Focalizando os pobres? A microfinança evoluiu para se centralizar nos empresários com baixo rendimento, particularmente aqueles que não têm acesso a serviços financeiros oficiais. Embora muitos agregados estejam abaixo do limiar da pobreza, uma instituição microfinanceira tem que dar precedência a que grupos se deve focalizar ou centralizar grupos diferentes com produtos diferentes. Separar os clientes por categorias de partes intervenientes de certa forma semelhante àquela delineada no Apêndice A3.2 pode ser útil como primeiro passo (Remenyi, 1997). Tal categorização ajudará na decisão de escolha dos serviços que deverão ser propostos a cada grupo. Também ajudará a identificar o ponto de paragem em termos de clientes adequados, para instituições microfinanceiras auto-financiáveis, e ainda identificar os grupos ‘mais carenciados’, que deverão ser beneficiários de outros tipos de intervenção de desenvolvimento, e quais podem requerer subsídios (ex. de educação, saúde).

3.2.2 As mulheres empresárias são clientes viáveis? As mulheres são muito activas no sector paralelo, como proprietárias e operadoras de microempresas. No entanto, as mulheres empresárias como categoria são frequentemente esquecidas quando se trata de necessidades dos serviços financeiros, embora investigações de diversos países em desenvolvimento, indiquem que mais de um terço de todos os negócios no sector não oficial, são propriedade das mulheres. Em certas regiões este número é ainda mais alto. Por exemplo, no Zimbabwe 67% das pequenas e médias empresas são de mulheres; no Lesoto 73%; na Suazilândia 84% e em dois distritos da África do Sul 62% são propriedade de mulheres (Downing e Daniels, 1992). Os negócios das mulheres podem ser diferentes dos homens em muitas dimensões importantes (Rhyne e Holt, 1994). Uma análise feita na África do Sul demonstra alguns modelos chave e esta análise foi apoiada por dados de outros países. Algumas das conclusões são mencionadas de seguida: Embora os negócios das mulheres durem tanto como os dos homens, tem tendência a começar numa escala mais pequena e a evoluir mais lentamente; ficando pequenos ao longo da sua duração. Os negócios das mulheres estão concentrados no comércio, serviços e manufactura ligeira, particularmente em sectores que utilizam tecnologias tradicionais. As mulheres utilizam frequentemente membros da sua família em vez de trabalho contratado (as condições e métodos de pagamento podem divergir); as suas fontes de rendimento são geralmente sediadas em casa. As actividades do negócio fornecem um importante rendimento para as mulheres poderem manter o bem-estar familiar, e frequentemente o seu rendimento é tão importante ou superior ao dos homens. Consequentemente, é necessário ter em conta as características particulares dos negócios pertencentes às mulheres em contextos diferentes, de forma a apoiar um sector empresarial tão importante. As instituições microfinanceiras têm que compreender estas diferenças sócio-económicas, de forma a oferecer produtos específicos para incentivar o empresariado feminino.

44


3.2.3 Apresentação transparente da oferta das instituições microfinanceiras A participação activa dos clientes como partes intervenientes no planeamento e execução dos serviços das Instituições microfinanceiras, pode tornar a tomada de decisões mais transparente, e ajudar a clarificar aquilo que as mesmas podem ou não podem fazer. No entanto, o envolvimento dos potenciais clientes no estádio inicial de um programa microfinanceiro, cria demasiadas expectativas sobre o que a microfinança pode oferecer. Isto pode tornar-se problemático se a operação microfinanceira não alcançar as expectativas, ou se a comunidade tiver estado envolvida em programas de crédito subsidiados no passado. É essencial ser honesto e preciso desde o início, acerca do que a microfinança pode e não pode oferecer, de forma a evitar os danos a longo prazo que podem ser causados por expectativas irrealistas ou em excesso.

3.2.4 Informação financeira das Partes intervenientes Qualquer discussão acerca da forma como as pessoas organizam os seus assuntos financeiros como família, ou como indivíduos, é extremamente delicada e deve ser tratada atenciosamente. Nem todos os homens e mulheres estão preparados para divulgar detalhes sobre as suas fontes de rendimento ou de despesa. Muitas pessoas podem não querer discutir os seus assuntos financeiros com um desconhecido ou um entrevistador. Frequentemente as pessoas inflacionam ou deflacionam o seu verdadeiro rendimento. Podem ficar amedrontadas por revelar fontes ilegais de rendimento, ou receosas de poderem ser denunciadas às autoridades por fugirem ao fisco, ou até perder os apoios governamentais. Devido à complexidade dos modelos das relações de poder, as pessoas muitas vezes fornecem aos estranhos, as informações que julgam que eles querem ouvir, sobretudo se julgarem que esses estranhos têm um estatuto social ou económico superior ao seu. As respostas das pessoas serão portanto variadas dependendo de quem é o entrevistador, de como a entrevista é conduzida, e do poder de relação entre o entrevistador e o entrevistado. O poder das relações locais e as desigualdades, também influenciam os pontos de vista que são expressos, bem como quais os membros da comunidade que participam nos encontros com os observadores das Instituições Microfinanceiras (Mayoux, 1999). O local, o momento e os promotores tem que ser os apropriados para cada grupo de pessoas. Além disso, há que ponderar o custo de tempo nessa participação, porque as pessoas estão ocupadas e podem não ter tempo para responder. Os ‘custos de participação’ podem ser mais elevados para os mais carenciados da sociedade e portanto funcionar como um obstáculo significativo para o envolvimento activo dos grupos sociais mais carenciados nas actividades financeiras. As respostas das pessoas podem ser interpretadas de forma diferente daquela que o entrevistador pretende. Além disso, a informação sobre os rendimentos e despesas alteram-se rapidamente e apesar de serem verdadeiras na altura da entrevista, podem facilmente ter sido alteradas desde essa altura (Mayoux, 1999). Por exemplo se uma entrevista é feita antes da colheita, os entrevistados podem não ter um rendimento regular nessa altura, ou podem prever uma colheita desastrosa ou muito abundante dependente da estação de cultivo. 3.2.5 Debates de grupo É sempre difícil conseguir que as pessoas discutam assuntos financeiros em grupo. Se as discussões de grupo ao nível de campo são planeadas em qualquer ponto do programa microfinanceiro, tem que ser tratadas cuidadosamente. Por vezes é aconselhável separar homens de mulheres, ou ter discussões de grupo em separado e em conjunto. Efectivamente, melhor do que falar acerca de pobreza e dinheiro, podem ser imaginadas alternativas à pobreza. Isto pode incluir por exemplo situações de habitação, perguntando às famílias onde a migração ocorre involuntariamente, e sobre a alimentação das crianças. Os clientes actuais e potenciais podem fornecer a informação mais precisa acerca dos níveis

45


de pobreza. Classificando os vizinhos numa escala que vai do mais rico ao mais pobre, pode resultar num consenso geral, sobre qual é o agregado de uma aldeia que está no fim da pirâmide de pobreza.

Discussão de grupo usando os métodos do Diagnóstico Rural Participativo (fonte: IIRR, 1998)

3.2.6 Perfil institucional do ponto de vista do nível de campo As diferentes organizações, instituições e indivíduos que oferecem serviços financeiros para a comunidade, após identificarem os potenciais clientes microfinanceiros, deverão criar um gráfico analítico como o do exemplo no Apêndice A3.3, para examinar o que cada serviço financeiro efectua. Para cada grupo local ou instituição identificado pela comunidade, vale a pena discutir diferentes tipos de informação: (1) a sua missão original, estratégia, e objectivos; (2) os serviços oferecidos e quem é que beneficia deles (homens, mulheres, grupos sócio-económicos etc.); (3) gestão e flexibilidade; (4) capacidade de chefia, (5) controlo e (6) quaisquer problemas com o serviço, em particular aqueles relacionados com o género, por exemplo porque é que os homens ou mulheres podem usá-los ou não. Estas informações devem ser colocadas num gráfico, de forma a todos poderem vê-lo e comentá-lo. Também vale a pena perguntar sobre sociedades, actividades, processos decisórios e interacções ou conflitos com outros grupos ou instituições. 3.2.7 Necessidades e prioridades dos partes intervenientes, evitando suposições É essencial determinar as necessidades financeiras dos potenciais clientes dos serviços microfinanceiros, antes de organizar operações microfinanceiras. Um sistema de consulta participativa envolvendo as diferentes partes intervenientes numa localização geográfica particular é muitas vezes sugerido (Mayoux, 1997). Outras instituições financeiras que operam localmente (incluindo os devedores do mercado paralelo) podem ser fontes de informação necessária, se não associarem as Instituições Microfinanceiras a novas (ou alteradas) formas de perigo. Uma abordagem avaliativa das necessidades participativas pode ajudar a estabelecer formas nas quais a distribuição da mobilização de créditos e poupanças pode ser mais relevante para o mercado, e conciliar os diversos pedido e capacidades das diversas partes intervenientes, enquanto ao mesmo tempo identificam potenciais conflitos de interesse entre as várias partes intervenientes (Mayoux, 1999). Por exemplo, as avaliações de necessidades participativas podem determinar se as poupanças e/ou créditos são o que na realidade são necessário ou não para os clientes mais pobres. Entre os devedores existe muitas vezes a crença que as mulheres pobres querem empréstimos menores ou apenas têm uma pequena importância que podem poupar cada semana. Os devedores acreditam então que os empréstimos solicitados pelos mais pobres são demasiados pequenos para gerar rendimentos em juros significativos e a sua entrega é cara, especialmente no caso de populações rurais dispersas, e igualmente que as poupanças são demasiado pequenas para serem atractivas.

46


Os pobres rurais podem ser mais susceptíveis às flutuações do seu rendimento devido à sazonalidade das colheitas e do emprego, ou o preço demasiado alto das pestes/doenças climáticas nas colheitas entre outros factores. Por conseguinte, o empenho dos agregados mais pobres para estabilizar as suas despesas, e muitas vezes sacrificar oportunidades potenciais de investimento ao nível local, que possam melhorar a sua subsistência a longo prazo. Nestes exemplos, os serviços financeiros como os seguros, poupanças e empréstimos para o consumo, podem ser mais eficazes do que crédito produtivo (Marr, 1999). No entanto, o ponto chave é que os autores dos planos microfinanceiros não devem fazer pressupostos, sobretudo acerca de quem faz o quê, quem tem acesso aos diferentes recursos e quais os serviços financeiros e conselhos que as pessoas requerem. As avaliações das necessidades participativas podem ser usadas para determinar se os pressupostos das organizações financeiras são válidos ou não. Muitas mulheres rurais não têm acesso às terras ou têm arrendamentos instáveis. São os seus maridos, pais e irmãos que são titulares das terras, uma prática que essencialmente elimina a sua elegibilidade para as fontes oficiais de crédito ou para membros das organizações de agricultores, o que poderia permitir-lhes o acesso a entradas (inputs) que poderiam ajudar a estabilizar ou aumentar os seus sistemas de produção. De novo a assunção não deve ser feita de que as mulheres só necessitam de crédito para actividades empresarias tão tradicionais como o artesanato. As mulheres são também agricultores de pleno direito, e estão envolvidas nas colheitas, na venda e outras actividades rurais. As situações não são estáticas, a migração rural e o HIV/Sida está a mudar a demografia da vida rural, portanto os pressupostos não podem ser feitos acerca de quem está presente nas áreas rurais. Conforme sublinhado em 2.4 os problemas das mulheres rurais devem ser vistos em relação aos homens, mais do que isoladamente. As soluções podem então ser menos fixadas nas mulheres sozinhas, mas mais em alterando os pontos de vista estereotipados e encontrando necessidades estratégicas. Os pobres muitas vezes preferem poupar, acumulando activos não financeiros, como animais, ouro, e Caixa 3.1 Exemplo de pressupostos irreais aceerca das mulheres Um projecto de desenvolvimento rural integrado nos planaltos de Luzon nas Filipinas estava a usar uma abordagem de poupança em grupo antes de organizar os empréstimos, com grupos de 10 mulheres. Cada mulher tinha que contribuir com uma pequena quantia todas as semanas, cerca de 20 pesos. Foi assim assumido porque supunha-se que seria isto que as mulheres poderiam poupar. Apesar das mulheres referirem que estavam contentes com a abordagem, numa análise mais profunda, chegou-se à conclusão que a quantia que as mulheres estavam a poupar era muito baixo, elas facilmente podiam e desejavam poupar mais por semana, e o aspecto do projecto que ela mais apreciavam era o facto de se poderem encontrar umas com as outras semanalmente para contribuir com pesos, conversar com as suas vizinhas, bem como discutir as suas actividades empresariais. Na realidade, estas mulheres rurais estavam envolvidas num processo complexo de produção e de venda, onde as mulheres do mercado viriam das aldeias proximas e compravam a produção das mulheres rurais antes das colheitas. Um preço fixo seria acordado antecipadamente, e as mulheres de facto muitas vezes requeriam grandes somas para ultrapassarem o periodo anterior às colheitas. Consequentemente e seguindo a cadeia de produção, algumas das mulheres dos mercados requeriam grandes empréstimos para comprar os produtos antes de os vender, e algum tipo de seguros na eventualidade de uma má safra. Portanto, neste caso, essencialmente os componentes microfinanceiros actuais do programa de desenvolvimento rural integrado foi ineficiente e não respondeu às necessidadedes reais das mulheres. No entanto, pode ser argumentado que quando as mulheres se encontram como grupo, tal como no exemplo citado, num periodo mais vasto, elas ganham confiança e conhecimento acerca dos serviços disponíveis, conduzindo-as a uma capacidade acrescentada para negociar com estruturas financeiras oficiais, e mais tarde solicitar serviços dos bancos. Fonte: trabalho das autoras

47


bens de consumo que podem ser rápida e localmente liquidados, em vez de dinheiro. Isto é particularmente verdadeiro em países onde a inflação é um problema e os juros ganhos nas poupanças não acompanham a inflação. Por vezes as mulheres não querem que os maridos saibam das suas poupanças, portanto a confidencialidade é importante. As pessoas podem querer apenas poupar algum dinheiro para acontecimentos pontuais, tais como uma cerimónia que está para vir, ou uma viagem que tem que ser feita a algum centro urbano mais próximo. As Instituições Microfinanceiras deverão ter em conta onde tais actividades estão difundidas. Incluindo um largo espectro de partes intervenientes numa fase inicial e evitando suposições, também pode ajudar a criar um processo que associe uma informação correcta às autoridades responsáveis num período posterior. Algumas sugestões de questões iniciais para potenciais clientes intervenientes de diferentes grupos sócio-económicos estão retractadas no Apêndice A5.4. É importante que os pontos de vista das mulheres (e de grupos marginalizados) sejam contemplados, porque as suas opiniões frequentemente são negligenciadas quando são feitas perguntas aos chefes de casal, ou em discussões de grupo.

3.3 Factores sócio-económicos e de género ao nível do cliente A cultura determina quem na família controla os recursos, quem toma as decisões sobre o que produzir, como produzir, quanto produzir e como distribuir os benefícios. Por exemplo, uma mulher que gere a sua própria empresa pode não ter automaticamente acesso aos recursos controlados pelo seu marido. Pode ter que chegar a um acordo com o marido, no qual ela terá acesso a terra adicional para poder semear vegetais para venda, em troca da sua ajuda para uma safra que ele controla na íntegra. Do mesmo modo, para iniciar uma empresa de comercialização de comida, a mulher pode ter que adquirir um empréstimo do seu marido ou irmão, e amortizá-lo com juros (Wilde, 1997). Conforme foi salientado em 2.3.1 o termo ‘análise das questões de género’ é utilizado para descrever uma abordagem sistemática para examinar as diferenças do impacto do desenvolvimento das actividades relacionadas com o género. Envolve um esforço deliberado para identificar e entender os diferentes papéis, relações, situações, recursos, benefícios, restrições, necessidades e interesses dos homens e mulheres num determinado contexto sociocultural. A análise das questões de género pode revelar não apenas onde as mulheres e homens têm interesses e responsabilidades distintas, mas também onde existem sobreposições. Todos estes pressupostos são importantes para a microfinança por causa da relação entre os sexos que altera as capacidades de produzir rendimento e a tomada de decisões. Por exemplo, a empresa de produção de vegetais da mulher, a empresa de venda de colheitas do marido e a empresa de produção de cerveja da filha, podem estar interligadas entre si, através da troca de trabalho e da partilha de recursos, mas os seus rendimentos não são compartidos, o rendimento da mulher é frequentemente o único que é utilizado em proveito do agregado (Wilde, 1997). A análise das questões de género das empresas e opções de emprego nas regiões, podem ilustrar a segregação que existe nos tipos de actividades económicas em que as mulheres estão envolvidas, as diferenças nas taxas de participação da força de trabalho, diferenças de sexo em trabalho remunerado, salários distintos para trabalho remunerado, segregação profissional, bem como partilha desigual no trabalho a tempo parcial e no emprego paralelo. Isto revela que embora as mulheres tenham rendimentos por mérito próprio, acarretam ainda as responsabilidades da família e do acolhimento das crianças. A repartição de tarefas dentro do agregado e a distribuição do rendimento tem implicações importantes nas poupanças e na amortização de empréstimos. Os estrategas microfinanceiros não devem fazer suposições acerca do que acontece dentro do agregado sobretudo aquelas que dizem respeito à distribuição do rendimento do agregado, ou como um rendimento aumentado se pode repercutir no bem-estar geral de todo o agregado (ver 2.3.1). Há provas que sugerem que o efeito marginal do rendimento nas mãos de uma mulher é diferente do mesmo rendimento nas mãos de um homem (Haddad, 1999). Provavelmente, tanto homens como mulheres gastam quaisquer somas adicionais ao seu rendimento de maneiras diversas, originando diferentes melhorias para o agregado como um todo (Tripp, 1981; Pahl, 1983). 48


Os factores sócio-económicos determinarão o tipo de serviços financeiros a fornecer às comunidades. Nalgumas áreas do Uganda, chegou-se à conclusão que as mulheres preferiam poupanças em grupo apenas com mulheres da mesma idade, porque a tradição dificultava a pressão para cumprir as obrigações de amortizações quer dos homens quer das mulheres mais velhas (Binns, 1998). Os factores socioculturais podem conceder oportunidades para discutir serviços financeiros, tais como tomando partido das áreas onde as mulheres se concentram, como os mercados. Tais ocasiões podem ser locais oportunos para levar a cabo transacções financeiras, pois exigem pouco tempo extra das mulheres comparado com aquele que perderiam, se tivessem que se deslocar a uma instituição financeira. Informações sócio-económicas e de género podem melhorar e aumentar a planificação dos serviços de acordo com as necessidades dos clientes. O manual de campo da ASEG oferece muitos métodos e técnicas de conduzir a análise das questões de género e apoia o processo participativo ao nível da comunidade (Wilde, 1997). Dois métodos específicos que são úteis para adaptar ao sector dos serviços financeiros estão aqui incluídos.

3.3.1 Matrizes de despesa e proveito A vulnerabilidade de subsistência varia por grupo social e por género. Este facto tem implicações para as actividades microfinanceiras. Para compreender a segurança ou vulnerabilidade da subsistência das diferentes pessoas, pode ser feita uma tentativa para quantificar a importância relativa de diferentes fontes de rendimento. Além disso, as prioridades e limitações da subsistência de pessoas distintas (incluindo mulheres e homens de cada grupo social) podem ser salientados pela quantificação da importância relativa das diferentes fontes de despesa.

Se uma Instituição Microfinanceira está a trabalhar com grupos em desvantagem e com baixo rendimento, torna-se necessário reconhecer que os empréstimos são utilizados para actividades não produtivas (Johnson e Kidder, 1999). Por conseguinte, será importante verificar se todos, a maioria ou alguns dos rendimentos totais dos grupos de clientes são gastos em necessidades básicas, como comida, água, vestuário, abrigo, cuidados de saúde primários e educação. Só depois de satisfazer as necessidades básicas, é que as pessoas estarão dispostas a reservar algum dinheiro ou activos para as poupanças, ou dispostas a assumir riscos em termos de investimento numa nova actividade empresarial. As pessoas adaptam as suas despesas em tempos de crise, e também podem ser formuladas questões sobre isto. O Apêndice A3.5 resume um método indirecto para descobrir rendimentos e despesas (Wilde, 1997). Este método funciona muito bem no contexto da microfinança porque as verbas não são discutidas, mas apenas as fontes.

Um exemplo matricial de alguns rendimentos e despesas da aldeia Yabrang no Butão oriental é apresentado nas Caixas 3.2 e 3.3. Estas matrizes foram o resultado de dois grupos alvo, um centralizado nas diferenças originadas por sexo (Caixa 3.2) e o outro centralizado nas diferenças originadas na riqueza (Caixa 3.3). As matrizes de rendimento e despesa desagregadas por diferenças de sexo, revelam que as mulheres e homens em Yabrang têm fontes de rendimento completamente distintas (Wilde, 1997). Para as mulheres, as aves de capoeira e os vegetais são o mais importante, enquanto os homens obtêm a maior parte do seu rendimento através de grandes stocks e colheitas de cereais. Isto significa que homens e mulheres têm diferentes tipos de poupanças que possam depositar. As responsabilidades dos gastos, por outro lado, sobrepõem-se consideravelmente; a maior despesa para mulheres e homens é a que é gasta em propinas escolares. O que pode significar que os empréstimos concedidos durante o período em que as propinas deverão ser pagas (isto se o pagamento for feito pontualmente) podem ser utilizados para este fim mais do que para fins produtivos.

49


As matrizes de rendimento e despesa desagregadas por diferenรงas de riqueza, revelam que as actividades de desenvolvimento que melhor funcionaram para diversificar os rendimentos dos agregados mais pobres, foram aquelas que necessitavam pouca terra e inputs limitados, nomeadamente porcos, aves de capoeira, frutas e vegetais.

50


Caixa 3.2: Exemplo de matrizes de rendimento e de despesa desagregadas por sexo

Matrizes de rendimento & despesa por sexo Localidade: Aldeia de Yabrang, Phongmey Gewog, Trashigang Participantes: 8 mulheres, 2 homens Data: 16 de Novembro de 1996 Fontes de rendimento

Mulheres

Fontes de despesa

Homens

Mulheres

Homens

6

Despesas religiosas

7

4

Arroz

6

Básicas (sabonete, sal)

5

8

Milho

6

Fagópiro – trigo sarraceno

Propinas escolares

14

11

Batatas

7

Vestuário

5

6

Açúcar de cana

7

Jóias

3

Vegetais

9

Sementes & Inputs

2

Bananas

4

1

Gado

3

3

Gado

11

Cavalos

3

5

Cavalos

7

Porcos

4

3

6

1

Aves de capoeira

3

Aves de capoeira

14

Manteiga e queijo

1

Venda de roupa

9

Utensílios de lavoura

3

Rádios e relógios

5

Porcos

Construção de estradas

8

Nota: A cada homem e mulher foram dados 50 paus representativos dos seus rendimentos anuais. Após seleccionarem cartões descritivos das actividades e recursos relevantes, distribuíram os paus em conformidade.

Caixa 3.3: Exemplo de matrizes de despesas desagregadas por riqueza Matrizes de rendimento e de despesa por riqueza Localidade: Yabrang Village, Phongmey Gewog, Trashigang Participantes: 3 mulheres, 5 homens Data: 16 de Novembro de 1996 Fontes de rendimento Ricos Médios

Pobres

Nota: 50 folhas grandes representando o rendimento total anual da comunidade. Os participantes dividiram as folhas da seguinte forma: 30 folhas = rendimento anual dos “ricos”; 15 folhas = rendimento anual dos “médio”; e 5 folhas = rendimento anual dos “pobres”. As mesmas proporções foram utilizadas para discussões de despesa. Fontes de despesa

Ricos

Médios

Pobres 1

Casa

4

2

Milho

5

1

Religião

3

1

Trigo

1

1

Uniformes escolares

1

1

1

Açúcar de cana

1

2

Básicas (óleo, sal, peixe seco)

2

2

1

Frutas

1

1

Laranjas

1

1

Vestuário

2

1

Vegetais

1

2

Bois

5

1

Cavalos

5

1

1

1

Porcos

3

1

1

Ovos

2

1

1

Manteiga Trabalho assalariado

5

2 1

1

Gado

2

1

Bois

2

1

Cavalos

2

1

Chiqueiro

1

1

Aves de capoeira

1

Sementes, sementeira e ferramentas

3

2

Fertilizantes

1

1

Poupanças

3

Diversos

3

1

1

1

Fonte: Wilde (1996).

51


3.4 Recursos e restrições de clientes As pessoas ocupam-se em actividades como a agricultura, venda nos mercados e trabalho remunerado, para garantirem as suas necessidades básicas e para ganharem dinheiro extra. Estas actividades dependem em grande escala do acesso a recursos como terra, água, trabalho e tecnologia. Dentro de qualquer cultura, o acesso a tais recursos varia de acordo com o género, idade, riqueza, casta e etnia. Quando se planificam actividades microfinanceiras a nível de campo é essencial ter bons conhecimentos e percepção dos recursos disponíveis para os clientes. É importante não fazer suposições relativamente ao acesso dos diferentes grupos de clientes, a diferentes tipos de recursos, ou se diferentes grupos de potenciais clientes têm controlo sobre recursos particulares. Além disso, as Instituições Microfinanceiras têm que estar cientes das restrições que os diversos clientes terão que fazer face, se tais clientes se tornarem parceiros microfinanceiros sustentáveis.

O acesso e controlo aos recursos podem variar segundo o sexo (fonte: IIRR, 1998)

3.4.1 Recurso a cartões descritivos para desagregar a gestão de recursos De forma a conhecer o uso e controlo de recursos baseados no género e a forma como se relacionam especificamente com as actividades empresariais propostas, uma técnica apelidada recurso a cartões descritivos pode ser utilizada. Este exercício ajudará a perceber quem têm acesso aos recursos que são relevantes para as actividades geradoras de rendimento propostas, e para as quais foi fornecido um serviço financeiro concedido pelas Instituições Microfinanceiras. Isto inclui terras para garantias colaterais, animais domésticos, matéria prima e equipamento. Podem ser formuladas questões acerca de quem toma as decisões acerca do uso de tais recursos. Os passos necessários para conduzir tal exercício estão esquematizados no Apêndice A3.6.

52


3.4.2 A percepção de risco dos clientes Quando se planificam operações para as Instituições Microfinanceiras, é importante reconhecer que os seus programas requerem que os seus clientes mais carenciados invistam os seus recursos ganhos com sacrifício, e que frequentemente isto pode significar um grande risco. O nível de risco é provavelmente maior para uns grupos do que para outros. A suposição é que existe um ponto no qual o risco não vale o potencial resultado para os clientes, e por conseguinte não é razoável os clientes investirem os seus recursos num programa microfinanceiro. Minimizar o risco deverá fazer parte do processo de planificação (Norem, 2000).

3.4.3 Restrições relacionadas com as actividades rurais As actividades microfinanceiras podem ocorrer em áreas rurais onde as pessoas estão ocupadas com trabalhos relacionados ou não com a agricultura. No entanto, a agricultura tem características únicas que podem limitar o acesso aos serviços financeiros. O Apêndice A3.7 resume as restrições quando se lida com empréstimos para a agricultura debaixo de diversas práticas económicas, políticas, culturais, institucionais demográficas e ambientais. As abordagens para ultrapassar estas restrições dependerão se essa coacção for devida a; (a) práticas agrícolas dos próprios agricultores, (b) a percepção e atitude dirigida aos agricultores por parte dos intermediários financeiros ou (c) devido a políticas nacionais. De forma a alcançar os objectivos de erradicação de pobreza, as Instituições Microfinanceiras e as suas partes intervenientes precisam considerar se os empréstimos deverão apenas ser concedidos para fins produtivos. Em muitas ocorrências, os clientes mais carenciados estão sujeitos a flutuações sazonais do seu rendimento familiar e podem querer os empréstimos para fins de consumo para ultrapassar períodos difíceis (Marr, 1999). Por exemplo, as pessoas com baixo rendimento, frequentemente trabalham em casa o que torna difícil distinguir entre empréstimos geradores de rendimento, e créditos dirigidos para a melhoria do bem-estar do cliente. Um empréstimo utilizado para reparar o telhado da casa, pode ser encarado como tendo um efeito produtivo se o devedor empresarial trabalha debaixo desse telhado. Se a definição de objectivos produtivos é limitada apenas a actividade geradoras de rendimento, então os clientes que podem querer ter acesso a empréstimos para objectivos socialmente produtivos, como a melhoria da sua educação ou saúde serão provavelmente excluídos. Se as Instituições Microfinanceiras decidem que concedem empréstimos apenas para objectivos produtivos ‘geradores de rendimento’, forçará os clientes mais pobres a propor ‘actividades produtivas’ como forma para aceder aos empréstimos para finalidades de consumo. Esta fraude não beneficia nem os clientes mais carenciados, nem as Instituições Microfinanceiras.

3.4.4 Restrições que as mulheres rurais tem que fazer face (e pessoas com baixo rendimento em geral) As restrições específicas que as mulheres rurais e com baixo rendimento têm que fazer face, podem ser diferentes daquelas dos homens. Algumas das restrições que as mulheres encontram particularmente, estão esquematizadas no Apêndice A3.8. Obviamente nem todas as mulheres terão que fazer face a tais restrições, No entanto, questões acerca destas podem ser levantadas quando se planificam actividades microfinanceiras. Do mesmo modo, as restrições que as pessoas de diferentes castas têm que ultrapassar, como uma baixa auto-estima, podem não ser aplicadas a grupos mais ricos ou socialmente mais influentes. Informações sobre diferenças relevantes e restrições que têm que fazer face deverão ser obtidas se tais grupos são potenciais clientes microfinanceiros. Utilizando grupos de focalização, as questões relativas a restrições podem ser feitas a grupos diferentes e representados graficamente como nos exemplos fornecidos no Apêndice A3.8. Analisar a identificação das restrições em relação aos serviços financeiros, pode ser referenciada nos diferentes níveis; ou seja no macro (político), intermediário (agências de desenvolvimento ou instituições

53


microfinanceiras) e de campo (pessoas no nível rural). Uma vez as restrições identificadas, as pessoas podem decidir se o assunto está para além do seu controlo (uma política que não pode ser alterada facilmente) ou se podem chegar a uma solução – alguma coisa que está dentro do seu poder. O próximo passo é desenvolver estratégias que lhes possam ser dirigidas.

3.5 Aproveitando as oportunidades sensíveis ao género, no nível de base 3.5.1 Participando num encontro de partes intervenientes Um encontro com as partes intervenientes deverá ser conduzido antes da formulação de mais iniciativas ou propostas para a implementação de programas microfinanceiros ao nível local. Após a condução de uma análise de participação do estado de acesso aos serviços financeiros numa localização geográfica particular, e depois da identificação dos recursos e restrições de grupos particulares, é importante que as conclusões sejam partilhadas de forma aberta e transparente. No entanto, em muitas culturas os detalhes sobre a forma como as mulheres e homens individualmente gerem as suas finanças e como partilham ou não os recursos ou como os utilizam dentro do agregado é um assunto muito sensível. A maior parte das pessoas não querem discutir este assunto em frente dos outros, no nível comunitário. Portando os objectivos da reuniões com as partes intervenientes será partilhar com os potenciais clientes uma variedade de serviços que as Instituições Microfinanceiras podem eventualmente oferecer, e fornecer exemplos do que foi oferecido noutras aldeias, ou seja apresentar as acções que estão a decorrer e as que pretendem implementar. Tais reuniões servem para partilhar informação e tentar interessar todas as partes intervenientes que foram consultadas para as mesmas a conhecerem melhor as Instituições Microfinanceiras. Aprendendo por ilustrações é frequentemente uma boa maneira de apresentar aos potenciais clientes quais os benefícios que podem obter dos serviços das Instituições Microfinanceiras e pode ser útil convidar um empresário ‘bem sucedido’ de qualquer outra região próxima, particularmente uma mulher empresária. As restrições identificadas deverão ser partilhadas nas reuniões. As discussões deverão ser centralizadas nas oportunidades estratégicas rurais sustentáveis e sensíveis ao género, de forma a transpor as mesmas. Idealmente a organização e agenda de tais reuniões deverão ser engrenadas no sentido da instalação de serviços microfinanceiros. Nalgumas culturas, a maior pressão para conduzir tais reuniões, é convencer as mulheres a assistirem e participarem. Antes de mais, porque a maioria dos banqueiros e equipas de projecto são homens e portanto reúnem-se e conversam apenas com os homens da aldeia. O protocolo frequentemente requer que o líder/chefe/prefeito da aldeia seja consultado antecipadamente. Se nessas reuniões apenas estiverem presentes homens não se pode assumir que eles necessariamente informem as suas mulheres do que lá se passou. A mensagem também pode ser distorcida ou perdida na transmissão. Por conseguinte, as equipas das Instituições Microfinanceiras têm que referir claramente que os seus serviços tanto são para homens como para mulheres, e precisar explicitamente que as mulheres também podem estar envolvidas nos serviços de crédito de poupança ou outros. Se isto não for mencionado, poderá haver a tendência de as mulheres pensarem que é apenas dirigido aos homens e não assistirão às reuniões nem às acções de formação. Do mesmo modo, as equipas das Instituições Microfinanceiras devem claramente evidenciar que se as mulheres não assistirem às reuniões, elas, equipas, não irão. Tem que ser uma sugestão deliberada para a comunidade. Dependendo do tipo de produtos que as Instituições Microfinanceiras têm para oferecer, pode ser importante referir antecipadamente que as pessoas não tem necessariamente que saber ler ou escrever para participar nas reuniões das partes intervenientes, porque as pessoas do campo frequentemente assumirão que esse é o caso e podem não assistir porque se sentem envergonhadas ou embaraçadas. As mulheres na generalidade têm uma taxa mais baixa de literacia do que os homens.

54


As reuniões deverão ser organizadas na altura mais conveniente para os homens e mulheres, e deverão ter em conta que a intensidade de trabalho difere ao longo do dia e durante as estações. As reuniões podem ocorrer no local mais central para a maioria das potenciais partes intervenientes (stakeholders). Alternativamente, mas mais oneroso, reuniões ou sessões mais curtas mas mais frequentes podem ser agendadas para que as mulheres não tenham que ficar longe das suas famílias por longos períodos durante o dia.

O Apêndice A3.9 contem algumas sugestões adicionais para a preparação de reuniões com as partes intervenientes, para determinar os serviços microfinanceiros

Encontro com os clientes intervenientes (fonte: IIRR 1998)

3.5.2 Levantamento das necessidades dos clientes Os princípios básicos de marketing estratégico informam-nos que devemos sempre começar pelas necessidades dos nossos clientes. Convém salientar que as actividades microfinanceiras deverão começar com as prioridades inerentes aos homens e às mulheres, no âmbito do que foi identificado na análise sócio-económica e das questões de género. Isto em oposição aos serviços microfinanceiros projectados apenas na base das prioridades e estratégias do intermediário microfinanceiro. Questões básicas colocadas para discussão nas reuniões das partes intervenientes podem incluir: Como são satisfeitas as necessidades das mulheres, se o fornecimento dos serviços financeiros for efectuado em conjunto, apenas com mulheres, ou apenas com homens? Esta questão poderá ser formulada a diferentes categorias de clientes, tais como agricultores sem terra e pequenos comerciantes. O que pode ser feito na prática para garantir que certos grupos de mulheres (e outros grupos distintos) tenham capacidade para aceder aos serviços financeiros de forma idêntica à dos homens? Como é que um novo serviço microfinanceiro pode afectar as relações de género (e outras relações sócio-económicas)?

55


Um método é conseguir que os grupos de potenciais clientes anotem as suas expectativas sobre uma intervenção microfinanceira e os seus tipos de problemas, restrições, ou obstáculos que eles pensem que podem ocorrer. Isto pode ser feito separadamente para homens e mulheres. É também importante listar o que a intervenção microfinanceira não pode fornecer. A Caixa 3.4 resume a forma como pode ser feito (adaptado de Johnson, 1999).

56


Caixa 3.4: Potencial intervenção microfinanceira O que a comunidade espera das Instituições Microfinanceiras

Restrições ou obstáculos que podem ocorrer

1. 2. 3.

O que as Instituições Microfinanceiras não podem conceder

Porquê não?

1. 2. 3.

3.5.3 Feedback dos clientes sobre participação institucionalizada É importante assegurar que toda a informação relevante das reuniões com as partes intervenientes seja incluída na prática em qualquer actividade microfinanceira planeada. Isto dependerá amplamente da participação de todos os agentes pertinentes das Instituições Microfinanceiras, nas reuniões com as partes intervenientes. É necessário estabelecer desde o início qual a informação que é relevante para a planificação das actividades operacionais das Instituições Microfinanceiras, e quem necessita conhecer o quê, bem como quais as decisões que podem ser tomadas com base nesta informação. Poderá ser também considerada informação adicional. Se for necessário um relatório escrito, então deverá ser o mais sucinto possível e escrito numa linguagem simples. Num nível mais abrangente, e numa fase posterior, as redes desempenham um papel importante no feedback institucionalizado dos clientes, não apenas para os intermediários mas também para o governo. As redes podem ajudar na troca de informação; para garantir apoio psicológico e para incentivar as actividades negociais. As Instituições Microfinanceiras podem incentivar os clientes a fazerem parte das redes, ou podem facilitar a criação de grupos de apoio, sócios de organizações sub-sectoriais, grupos de negócio, associações de mulheres empresárias, ou centros de recursos. As Instituições Microfinanceiras podem criar as suas próprias redes (como no caso do Women’s World Banking, do Microfinance Network, Cashpor e outros), fazer lobby no governo para serem criadas legislações favoráveis à microfinança e ao desenvolvimento empresarial. Além disso as redes são veículos eficientes para a propagação de informação e de metodologias acertadas.

57


Capítulo 4 – Microfinança e Género: o nível Intermédio

4.1 Introdução Os bancos que fornecem serviços de crédito e de poupança são intermediários porque reúnem devedores e economizadores para facilitarem os objectivos uns aos outros. As Instituições Microfinanceiras como intermediários não são diferentes, excepto que o seu mercado consiste em clientes com baixo rendimento, os autónomos, e proprietários de microempresas dos sectores paralelos das áreas rurais e urbanas (Remenyi, 1997). Os Intermediários Microfinanceiros podem ser bancos comerciais ou de agricultura que prestam serviços financeiros aos mais carenciados do sector rural e urbano. No entanto, os Intermediários Microfinanceiros também podem ser referidos como ONGs financeiras, Uniões de crédito, ou organizações rurais que implementam actividades microfinanceiras; e outros devedores. Podem ainda ser classificados como fornecedores oficiais ou paralelos. Existem também redes microfinanceiras, compostas por uniões de Instituições Microfinanceiras (e outras partes intervenientes), que desempenham um importante papel na promoção do sector. Neste Capítulo, centralizamo-nos nos Intermediários Microfinanceiros como partes intervenientes fundamentais. Um dos maiores desafios para o desenvolvimento, é criar Instituições Microfinanceiras sustentáveis que possam desenvolver negócios sensíveis para os clientes de forma a aumentar significativamente o nível de vida. Instituições sustentáveis são aquelas que produzem rendimento suficiente para cobrir os custos administrativos e financeiros a médio e longo-prazo (Marr, 1999). Todas as instituições que oferecem serviços microfinanceiros têm que ser transparentes acerca do que fazem e saber porquê. Por conseguinte, uma visão clara e um manifesto de missão transparente, com uma estratégia associada são essenciais. Para clarificar as expectativas acerca do que pode ser alcançado, uma definição clara dos clientes é também particularmente importante e deverá ser incluída no manifesto da missão. A vida útil esperada das Instituições Microfinanceiras deverá também ser contemplada no manifesto da missão. Este Capítulo é direccionado para aqueles que trabalham nas Instituições Microfinanceiras, tencionam trabalhar com elas, ou que desejam considerar os assuntos de género e sócio-económicos na planificação das actividades microfinanceiras. As preocupações de género e sócio-económicas nas Instituições Microfinanceiras podem ser consideradas a três níveis: em primeiro lugar, em termos do que os programas, políticas e serviços que as Instituições Microfinanceiras oferecem aos seus clientes são sensíveis ao género; em segundo, em termos de assuntos de género na actual estrutura organizacional das Instituições Microfinanceiras e em terceiro lugar se os lobbies das Instituições Microfinanceiras têm uma dimensão que permita uma legislação de desenvolvimento de género.

4.2 As partes intervenientes fundamentais no nível intermédio As partes intervenientes fundamentais no nível intermédio são os agentes, a gestão, e o conselho executivo das instituições financeiras ou dos intermediários microfinanceiros. Isto também inclui as organizações de trabalhadores (ex.: sindicatos) e famílias daqueles que trabalham para os intermediários. As partes intervenientes principais são com certeza as mulheres com baixo rendimento

58


e os homens clientes das Instituições Microfinanceiras esquematizados no Capítulo 3. Nesta secção iremos concentrar-nos na identificação das partes intervenientes, do ponto de vista das Instituições Microfinanceiras. A análise das partes intervenientes é importante para determinar quem está envolvido na microfinança do ponto-de-vista do intermediário microfinanceiro. Conforme se menciona em 2.4. os programas microfinanceiros que se ‘centram nas mulheres’ podem não ser sensíveis ao género. Examinando as atitudes das partes intervenientes fundamentais ao nível intermédio, é essencial para garantir operações microfinanceiras sensíveis ao género. A caixa 4.1 apresenta a categorização do leque das partes intervenientes fundamentais (stakeholders), de ambos os sectores, oficial e paralelo, que oferecem serviços microfinanceiros. Estas análises podem incluir por exemplo, pessoas que já tem créditos ou usam serviços de poupança no sector paralelo, os negociantes e associações de crédito. Se for o caso, então o nível de sucesso e a conveniência dos mecanismos existentes deverá ser determinada. Tais análises fornecem informações que são importantes para a tomada de decisões relativas quanto às necessidades dos grupos-alvo de clientes serem melhor atingidas pelo apoio aos mecanismos de instituições financeiras paralelas, ou pelo desenvolvimento de novas Instituições Microfinanceiras. Caixa 4.1: Partes intervenientes que oferecem serviços microfinanceiros No sector oficial:

No sector paralelo:

Bancos comerciais**

Aqueles que emprestam directamente aos particulares: amigos/família, devedores , fornecedores ou retalhistas que concedem crédito, casas de penhores

Bancos de agricultura e de desenvolvimento** Bancos de poupança Cooperativas de crédito e Cooperativas Companhias de Leasing/e de compra-aluguer Companhias de Housing Companhias de seguros ONGs locais e internacionais a) ONGs financeiras (ADEMI na República Dominicana, PRODEM na Bolívia, Fundusz Mikro na Polónia). Algumas ONGs financeiras transformaram-se em bancos comerciais: BancoSol na Bolívia e K-Rep no Quénia.

Grupos/associações de auto-ajuda como as RoSCAS que podem ser estruturados de diversas formas para crédito de emergência, de consumo e investimento. Os grupos de auto-ajuda têm diversas planificações, ex.: Tontines nos países da África Ocidental e Susu na África Oriental Organizações Rurais

b) ONGs generalistas que executam programas microfinanceiros (BRAC no Bangladesh, BOSPO na Bósnia e Herzegovina, Catholic Relief Services e Save the Children em todo o mundo9). Redes de operadores microfinanceiros (Cashpor, Accion International, FINCA International, Women’s World Banking) ** Os bancos podem ainda ser classificados em bancos privados (O Hatton Bank no Sri Lanka); bancos agrícolas pertencentes ao estado (Bank Rakyat e Unit Desa na Indonésia) e bancos orientados para a pobreza (SEWA na Índia, o Grameen Bank no Bangladesh, BancoSol na Bolívia e K-Rep no Quénia).

9

A ONG Save the Children derivou recentemente, algumas das suas instituições microfinanceiras (ex.: na Arménia, em Gaza, na Jordânia, no Líbano, em Marrocos, e no West Bank). Estas Instituições Microfinanceiras tornaram-se (ou estão em vias de se tornarem) autónomas, ou seja instituições locais ‘únicas’.

59


Com excepção das Instituições Microfinanceiras e dos seus clientes como partes intervenientes principais e fundamentais no nível intermédio, outros tipos de organizações, individuais e grupos no nível intermédio serão afectados pelas actividades das Instituições Microfinanceiras e a sua opinião terá uma capacidade (input), em termos de apoio e da capacidade de actividade das mesmas. Uma vez que todas as seguintes partes intervenientes podem interagir com as Instituições Microfinanceiras e podem por conseguinte afectar os serviços que aquelas fornecem, uma perspectiva mais abrangente sobre as partes intervenientes no nível intermédio pode incluir: Fornecedores de negócio e compradores que se ocupam com transacções negociais com os clientes micro-empresários das Instituições Microfinanceiras ONGs

que não foram inicialmente criadas para trabalharem na área da microfinança, mas que desejam oferecer serviços de crédito e de poupança.

Associações

empresariais de diversos tipos (associações empresariais de PMEs, câmaras de comércio, associações de artesanato etc.)

Corporações

de consultores empresariais e fornecedores de serviços empresariais

Institutos

de formação e vocação que fornecem conhecimentos profissionais que podem ser utilizados para actividades empresariais

Diversas

instituições nacionais e do sector público engrenadas para desenvolver o sector privado

Depois de identificadas as partes intervenientes fundamentais, o próximo passo consistirá em avaliar as suas percepções sobre os serviços financeiros disponíveis. Esta avaliação acerca das diferentes percepções das Instituições Microfinanceiras (incluindo a dos clientes), poderá revelar alguns motivos porque potenciais clientes evitam ou não utilizam os serviços das Instituições Microfinanceiras. Por exemplo, muitos rurais mais carenciados preferem investir mais em activos tangíveis (ex.: animais domésticos, televisões) que podem ser facilmente liquidadas nos mercados locais, do que colocar as suas poupanças em novas Instituições Microfinanceiras, localizadas nas áreas urbanas das cercanias. As casas de penhores existem porque algumas pessoas preferem investir nestas espécies do que em dinheiro em espécie e liquidar os seus investimentos quando o dinheiro é necessário (Chua e Llanto, 1996). Os agentes das Instituições Microfinanceiras deverão ter estas percepções em consideração se pretendem alcançar clientes mais carenciados. As percepções que as pessoas do campo têm em relação à estabilidade e ao futuro a longo-termo das novas Instituições Microfinanceiras, também têm grande influência na forma de risco que estão dispostas a correr no caso de confiarem o seu dinheiro a essas instituições. Este problema será ainda mais sério em situações de revolução social ou incerteza política. O entendimento dos clientes sobre o tempo de vida útil das Instituições Microfinanceiras também influenciará a atitude dos mutuários face às amortizações. Se adivinhar que as Instituições Microfinanceiras não vão durar, poderão ser tentados a adiar os seus pagamentos ou mesmo até evitá-los. De facto as Instituições Microfinanceiras apostam na sua continuidade quando aliciam os seus clientes a amortizar os seus empréstimos dentro do prazo de forma a poderem contrair empréstimos subsequentes progressivamente mais avultados. Este problema, tal como o precedente, será mais sério em situações de revolução social ou incerteza política. Por conseguinte, do ponto de vista das Instituições Microfinanceiras, é crucial conhecer a forma como as pessoas vêem as suas posições no mercado. Resumindo, se uma organização pretende planificar novas operações microfinanceiras numa determinada localidade/sector ou com um grupo de clientes particulares, um primeiro passo essencial será listar todas as partes intervenientes (individuais, organizações ou grupos) que são mais importantes em termos da distribuição de serviços financeiros, e quem tem o direito adquirido nas iniciativas microfinanceiras, incluindo os grupos de clientes potenciais. A construção de um Diagrama de Venn das Partes intervenientes conforme se esquematiza no Apêndice A4.1 é uma forma útil de examinar os interesses de todas as partes intervenientes fundamentais, incluindo aquelas

60


que podem ser pressionados adversamente por quaisquer novos serviços financeiros oferecidos. A vantagem de desenvolver tal representação das partes intervenientes, é de identificar todos os actores relevantes, e se as mulheres e homens, ou diferentes grupos sócio-económicos visualizam e valorizam os diferentes serviços das Instituições Microfinanceiras de igual forma. Também pode auxiliar o exame das relações entre grupos de intervenientes.

61


Conduzindo um Diagramas de Venn das Partes intervenientes (fonte IIRR 1998)

Após identificar as partes intervenientes, é útil avaliar o seu ‘interesse’ relativo para os programas ou projectos das Instituições Microfinanceiras. Para fazer isto, é vantajoso listar sistematicamente o interesse e a influência relativa de cada grupo identificado como parte interveniente vital, os potenciais efeitos que terão no programa microfinanceiro, e a importância dos grupos de intervenientes para o sucesso das operações microfinanceiras. Uma matriz semelhante àquela fornecida no Apêndice A4.2 poderá ser desenvolvida para esta finalidade (Rietbergen-McCracken e Narayan 1997). Este exercício ajudará na planificação das operações microfinanceiras e na determinação dos serviços que deverão ser oferecidos pelas Instituições Microfinanceiras. Sem margem para dúvidas, as Instituições Microfinanceiras quando planificam as actividades microfinanceiras são uma das partes intervenientes mais importantes. É necessário avaliar internamente os seus procedimentos, métodos e programas, de forma a assegurar que os seus serviços são sensíveis ao género.

4.3 Factores sócio-económicos e assuntos de género nas instituições microfinança Uma variedade de factores sócio-económicos e assuntos de género no interior das Instituições Microfinanceiras afectará a sua capacidade de fornecer de forma bem sucedida, serviços microfinanceiros de forma sustentável para os seus clientes-alvo. A este respeito, a categoria do intermediário envolvido em operações das Instituições Microfinanceiras tem menos importância do que as políticas que segue relativamente aos seus clientes e ao ambiente dentro do qual trabalha (FAO, 1998b). Uma distribuição bem sucedida de serviços financeiros para as mulheres (e outros grupos potencialmente marginalizados) deverá responder ao diferencial de ajuda de tais clientes, e por conseguinte diferirá dos programas de desenvolvimento empresarial (Rhyne e Holt, 1994). Em todos os casos, os clientes participarão provavelmente mais quando os serviços oferecidos parecerem mais apropriados para o tipo de empresas que dirigem ou que gostariam de dirigir. A identificação e o acesso aos recursos da rede (addressing) dos factores sócio-económicos e assuntos de género que afectam os serviços de distribuição, das Instituições Microfinanceiras poderá melhorar o funcionamento e a efectividade das suas actividades. Nesta secção os elementos são esquematizados de forma a constituírem em conjunto, as pré-condições para institucionalizarem as considerações sócio-económicas e de género nos intermediários microfinanceiros, incluindo a integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas (mainstreaming) e preocupações de género nas

62


operações do dia-a-dia das Instituições Microfinanceiras e na examinação dos assuntos dos seus agentes. Para uma visão geral das características das empresas pertencentes às mulheres deverá ser consultado o Capítulo 3.

4.3.1 O que é o Mainstreaming ? O Mainstreaming ou integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas,10 é alcançado quando as Instituições Microfinanceiras podem sistematicamente avaliar as implicações para os homens e mulheres em qualquer acção planeada, incluindo legislação, estruturando as preocupações dos homens e mulheres e experiências na dimensão integral da planificação, implementação, monitorização e avaliação das políticas e programas (ECOSOC, 1997). O Mainstreaming assegura que os homens e mulheres beneficiem equitativamente dos serviços das Instituições Microfinanceiras e que a desigualdade não seja perpetuada. Desta forma, mais do que se centralizar meramente nas clientes femininas, o mainstreaming de género refere-se ao processo através do qual uma organização assume uma perspectiva de género abrangente. Portanto, em vez de se centrar apenas nas mulheres, as condições relativas dos homens e mulheres ao acesso dos serviços financeiros são examinados de forma a sublinhar as diferenças e depois concentrar-se na identificação e redução de distâncias e desigualdades entre homens e mulheres. Esta abordagem reconhece que os papéis de género são culturalmente específicos. De facto a finalidade ao adoptar tal abordagem, é a de compreender as diferentes realidades dos homens e mulheres e em particular os contextos culturais. Como tal, a análise das questões de género, deverá assegurar que tais actividades são desenhadas para serem mais apropriadas em contextos culturais diferentes, pela informação e compreensão das normas e realidades dos homens e mulheres no terreno. Como primeiro passo para um ‘mainstreaming’ sobre assuntos de género no interior das Instituições Microfinanceiras deverá ser perguntado como as vossas Instituições Microfinanceiras avaliam os seguintes assuntos ou abordagens: Consciência dos assuntos sócio-económicos e de género nas operações microfinanceiras Compromisso de acesso aos recursos de rede (addressing) dos assuntos sócioeconómicos e de género nas actividades microfinanceiras Capacidade de programar actividades microfinanceiras centralizadas no género (mais do que centralizadas apenas em mulheres) Capacidade da aplicação das despesas (findings) da análise sócio-económica e das questões de género a actividades em curso Disponibilidade para permitir que as actividades das Instituições Microfinanceiras sejam abertas ao exame detalhado de observadores sobre impactos específicos de género Disponibilidade para discutir a apresentação de um repertório de exemplos estudados, relacionados com o género e uma subsequente adaptação de programas de actividades Contratando e promovendo as mulheres ou homens sensíveis ao género ao nível das equipes, de gestão e de chefia, bem como na administração das Instituições Microfinanceiras (adaptado de Norem, 2000)

10

Mainstreaming de género /integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas conforme definido pela ECOSOC, em 1997

63


4.3.2 Funcionários das instituições de microfinança e de Género Um assunto prioritário do ‘mainstreaming’ dentro das Instituições Microfinanceiras, é a ‘abertura’ de atitudes da equipa em relação aos seus clientes. As atitudes dos empregados financeiros afectam em larga escala a percepção do serviço. Melhorias significativas na distribuição de serviço têm sido ilustradas em organizações e programas, onde as equipas são sensíveis ao género e a capacitação dos assuntos é levantada como uma parte rotineira das interacções entre as equipas e os clientes (Mayoux, 1999). De modo contrário, enquanto as equipas de muitas ONGs envolvidas em microfinança podem ter uma vantagem comparativa relativa ao conhecimento dos assuntos de género, a falta de capacidade negocial entre as equipas do sector das ONGs pode também limitar a sua capacidade de entrega de serviços microfinanceiros sustentáveis para clientes mais pobres (Gibson, 1993). O Mainstreaming não se soluciona com programas microfinanceiros centralizados apenas em mulheres, porque estes não provocam a desigualdade de género (Mayoux, 1999). Estes são benefícios significativos para os programas microfinanceiros onde o mainstreaming de género não foi apenas deixado para as ‘mulheres’ nas Instituições Microfinanceiras, ou seja, onde equipas masculinas também estão a trabalhar em assuntos de género. No entanto, uma questão importante mantém-se frequentemente, se equipas femininas adequadas podem na prática ser recrutadas se isso for exigido, i.e. nas comunidades ou culturas onde as mulheres não se reúnem frequentemente com observadores particularmente homens. Deverá ser clarificado antes do início do programa, se deverão criar condições especiais para equipas femininas. Quando são esboçados esquemas de incentivo para as equipas, estas devem ser sujeitas a uma auditoria sócio-económica e de género, de modo a evitar consequências indesejáveis na distribuição de serviços que pode daí advir. Por exemplo, muitas Instituições Microfinanceiras estabeleceram novas regras para aumentar a produtividade dos grupos de trabalho, tais como promoções e salários mais elevados, que dependem da rapidez e quantidade de empréstimos que são distribuídos e recuperados. Tais esquemas de incentivo podem inadvertidamente originar a exclusão dos clientes mais pobres, especialmente nas áreas rurais. (Marr, 1999). É também necessário determinar as atitudes dos grupos de trabalho perante os clientes com mais baixo rendimento. As atitudes variam, desde as pessoas pensarem que as pessoas mais carenciadas não têm suficientes oportunidades para economizar e investir, até àquelas que acreditam que os pobres são preguiçosos e ‘não sabem mais’. Uma forma útil para a ‘abertura’ e educação das atitudes dos grupos de trabalho é levantar questões sensíveis ao género nas reuniões regulares dos grupos. Isto pode ser feito através de uma lista de depoimentos controversos que será feita antecipadamente e posta a circular por cada um dos membros dos grupos, de modo a conceder-lhes tempo de reflexão sobre as questões. Posteriormente os assuntos podem ser trazidos para as reuniões de grupo. O Apêndice A4.3 sintetiza os tipos de questões que podem ser utilizadas como base para estas discussões. Uma política sensível ao género nas Instituições Microfinanceiras ajuda a determinar um enquadramento de apoio à implementação de programas microfinanceiros sensíveis ao género. Em conjunto com os grupos de trabalho das Instituições Microfinanceiras, traçar uma lista de verificação do mainstreaming conforme está esquematizado no Apêndice A4.4 ajudará a garantir que essa integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas seja posta em prática nas Instituições Microfinanceiras.

64


4.4 Recursos (financeiros e não financeiros) O controlo dos recursos dentro das Instituições Microfinanceiras pode criar restrições ao mainstreaming ou apoiar essa abordagem. Por exemplo, pode ter que ser determinado um orçamento para obter os pontos de vista dos homens e mulheres intervenientes (stakeholders) antes da introdução de um programa das Instituições Microfinanceiras. Diferentes doadores terão abordagens distintas ao mainstreaming e por conseguinte, dependendo da origem dos fundos das Instituições Microfinanceiras, o peso dado a essa integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas irá provavelmente variar. Mais tarde quando o programa tiver sido aceite e implementado, os doadores muitas vezes advogam uma monitorização e avaliação constante dos mesmos ao nível institucional e do cliente. No entanto, se as Instituições Microfinanceiras se pretendem sustentáveis, não têm tempo para realizar elas próprias essa avaliação e monitorização detalhada. Normalmente nem têm a capacidade para tais avaliações. Os estudos de impacto deverão ser criados e organizados pelos doadores. Será no entanto necessária uma coordenação entre doadores sobre as metodologias para uma avaliação de impacto das actividades das Instituições Microfinanceiras. No entanto, se ou quando a informação sobre as funções de género e o seu impacto em tais programas estiver disponível, as Instituições Microfinanceiras precisam de ter os recursos disponíveis para adaptar os seus serviços a tais circunstâncias. As Instituições Microfinanceiras devem ser dinâmicas e têm que estar aptas a reagir, porque estão inseridas dentro de um ambiente que está constantemente em mudança interna e externa. Uma ‘organização autoavaliadora’ (learning organisation) procura compreender essas dinâmicas de forma a maximizar o progresso dos seus objectivos (Norem 2000). Por exemplo, alterar as funções do género em transacções negociais, implicará que as Instituições Microfinanceiras também terão que alterar a sua forma de implementação das suas actividades para grupos diferentes. A organização autoavaliadora necessita de recursos para desenvolver e ensinar a sua administração, as suas equipas de trabalho e as partes intervenientes (stakeholders). Os Recursos humanos de qualquer organização são os seus activos mais valiosos. A gestão de recursos humanos inclui a criação de um ambiente de trabalho que preencha as necessidades das pessoas, de forma a elas poderem ser o mais produtivas possível. As melhores pessoas disponíveis deverão ser recrutadas e contratadas. Se for realizado algum investimento na formação das equipas, então esses elementos serão um recurso demasiado caro para se perder. O sistema de avaliação deverá recompensar de forma tangível as pessoas e ajudá-las a manter-se na organização com oportunidades de aprendizagem progressiva, desenvolvimento e progressão na carreira (Norem, 2000). Por um lado, espera-se frequentemente que os funcionários das instituições microfinanceiras persistam em objectivos convencionais proveitosos quando lidam com a maioria dos seus clientes. Por outro lado, espera-se que os mesmos funcionários adoptem uma atitude diferente quando lidam com projectos para erradicação de pobreza, sem incentivos internos diferenciais para premiar o sucesso de conceder empréstimos e o relacionamento com os pobres (Kabeer, 1995). É evidente que uma atitude e uma abordagem diferentes são necessárias quando se lida com clientes mais carenciados. O Apêndice A4.4 enuncia assuntos e depoimentos que podem ser utilizados para determinar as atitudes das equipas perante assuntos sócio-económicos e de género. Um Sistema de Informação de Gestão (SIG) eficiente e sensível ao género é um recurso importante para as Instituições Microfinanceiras. A natureza e o tipo de SIG variam entre programas, com alguns que têm informação muito limitada, e outros que têm informação computorizada abrangente sobre execução financeira e outros impactos especiais e procedimentos de avaliação. A informação relevante pode ser recolhida relativamente, facilmente e de forma pouco onerosa através da reformulação dos formulários para pedidos de empréstimo, a compilação de dados para monitorização de empréstimos e modelos de saída de programas e/ou acréscimo de questões específicas baseadas nos critérios e indicadores conhecidos. SIGs sensíveis ao género podem ser desenvolvidos. O que permitirá uma informação estatística desagregada por sexo (ou outras variáveis) sobre os clientes, a ser recolhida numa base progressiva. Além disso, como existe presentemente uma experiência crescente de integração avaliativa do impacto de pobreza na monitorização dos programas, deverá ser relativamente

65


fácil conduzir a análise das questões de género nos dados financeiros (Mayoux, 1999). No entanto, como foi anteriormente referido, idealmente, para manter o impacto da sustentabilidade financeira, a sua avaliação e estudos não deverão ser realizados pelas próprias Instituições Microfinanceiras, mas sim delegados aos agentes especializados em assuntos sócio-económicos e de avaliação do impacto em função do género. Informação de fundo como recurso: Tanto a informação qualitativa como as variáveis quantitativas sobre factores sócio-económicos nas áreas de recolha são recursos muito valiosos para as Instituições Microfinanceiras. Algumas categorias de informação são importantes para compreender as diferenças associadas ao género, à idade, à etnia, à posição sócio-económica, local de residência, região e nível de literacia dos potenciais clientes. É necessária prudência na recolha e análise de informação, porque é dispendiosa em tempo e dinheiro e pode originar grandes dificuldades devido ao volume de informação. As Instituições Microfinanceiras normalmente recolherão o mesmo tipo de informação sobre os clientes que os grandes bancos comerciais recolhem. Isto obriga a que a informação de Mercado reparta os grupos de clientes por factores como a geografia, demografia, volume de negócio, rendimento, capacidade de endividamento, necessidade financeira e características comportamentais. Uma variedade mais alargada de indicadores poderá ser utilizada para promover a desagregação dos mais carenciados ou grupos marginalizados que estejam envolvidos na alimentação e agricultura, como: Tipo e tamanho da terra Sexo Situação nutricional Incapacidade Composição do agregado

O primeiro passo consistirá em definir quais as informações que estão faltando e porquê? Já estará disponível? Poderão eles ter um fácil acesso a essa informação? Como é que as informações sobre clientes e mercados podem ser sistematicamente integradas nas Instituições Microfinanceiras? Como será mantida a confidencialidade das informações dos clientes e quem terá acesso a essa informação? De forma a categorizar qual o tipo de informação que pode ser útil o Apêndice A4.5 fornece uma lista de verificação sobre as categorias de informação e como essa informação em cada categoria pode ser útil (adaptado de Norem, 2000).

66


4.5 Restrições às operações das instituições de microfinança 4.5.1 Restrições financeiras Tanto a implementação como a execução das actividades microfinanceiras é onerosa. Depois de um período inicial, normalmente de 3 a 5 anos, a experiência tem demonstrado que os Intermediários Microfinanceiros podem tornar-se operacional e financeiramente sustentáveis. Para se tornarem sustentáveis, os custos de transacções tenderão a ser mais altos no início para os devedores, de forma a que os custos das operações sejam cobertos pelos lucros produzidos (FAO, 1999). Porque as Instituições Microfinanceiras lidam com clientes diferentes dos outros bancos e utilizam metodologias bancárias diferentes, têm riscos exclusivos que podem constringir as suas operações. Por exemplo: Risco de incumprimento, custo elevado por unidade financiada, Risco de liquidez, quando as Instituições Microfinanceiras não são capazes de cumprir as suas necessidades de dinheiro, incluindo as necessidades de empréstimo, Risco de taxas de juro, os empréstimos decairão em valor à medida que as taxas se alteram, Risco de taxas cambiais, que afectam os empréstimos internacionais, Riscos de inflação. As Instituições Microfinanceiras rurais ainda se deparam com riscos adicionais de amortização quando emprestam a empresários ocupados com a agricultura (FAO, 1999). Estes incluem: Colheitas incertas devido ao tempo, pestes ou doenças Preços incertos devido às flutuações de mercado, sobretudo nos países em desenvolvimento, onde os mercados são imperfeitos Mercados de crédito distorcidos, com concorrentes oferecendo taxas de juro subsidiadas Também se deparam com riscos originados por alterações nas políticas domésticas e internacionais. Por exemplo as alterações de preços nas produções transaccionadas internacionalmente, como a flutuação do preço do café, acordos comerciais preferenciais de produtos, como as bananas, como parte de convenções internacionais, como a Convenção de Lome ou como parte de um mercado simples europeu. Muitas Instituições Microfinanceiras desenvolveram soluções para os riscos e custos elevados, associados aos empréstimos a agricultores e pessoas com baixo rendimento. Alguns dos meios encontrados para ultrapassar estes custos incluem: Desenvolvimento de sistemas operativos estandardizados, incluindo sistemas eficientes de aprovação de empréstimos Mobilização de fundos e poupanças Construção de Sistemas de Informação de Gestão Garantia de que têm uma diversificação de carteira optimizada. Atraírem clientes repetidos Terem procedimentos nítidos de supervisionamento e de informação com mecanismos no local para monitorização e avaliação, bem como um bom sistema de cobranças de amortização, que accione mecanismos próprios quando os pagamentos não são pagos a tempo.

4.5.2 Custos dos serviços adicionais das instituições de microfinança Tem sido amplamente debatida a questão se as Instituições Microfinanceiras devem seguir uma abordagem minimalista (apenas finança) ou uma abordagem crédito-mais (oferecendo serviços adicionais). Algumas Instituições Microfinanceiras têm oferecido serviços de apoio ao negócio para

67


além do financeiro (tais como formação empresarial, assistência técnica, e formação sensível ao género), muitos dos quais se verificou serem muito onerosos e com pouco impacto nos clientes. Este insucesso verificou-se porque as instituições não eram especializadas, nem na formação nem nestas áreas. De forma a ultrapassar estas desvantagens, particularmente quando as Instituições Microfinanceiras não têm o conhecimento específico para fornecer tal apoio, poderá ser possível fazer uma ligação com outras organizações que forneçam esses serviços, mais do que tentar fornece-los directamente através das próprias Instituições Microfinanceiras. De facto, as ligações com agências especializadas em formação que oferecem cursos de desenvolvimento de conhecimentos profissionais, têm demonstrado ser eficientes. Por conseguinte, como norma geral, a formação deverá ser gerida separadamente (numa organização diferente) uma vez que a formação necessita de doações continuadas, ao passo que as Instituições Microfinanceiras devem procurar gerar proveitos para se tornarem sustentáveis. No entanto, nalguns países as agencies de formação podem não existir e as Instituições Microfinanceiras podem sentir-se obrigadas e fornecer elas próprias esse serviço.

4.5.3 Custos da garantia de participação dos clientes Os negócios bem sucedidos ouvem os seus clientes. As Instituições Microfinanceiras de sucesso tentam dar resposta às necessidades captadas dos clientes e adaptar os seus serviços para melhor corresponderem as exigências em constante alteração dos seus clientes. Uma importante dimensão da capacitação (empoderamento) dos clientes com baixo rendimento é a capacidade, ou o poder de colocar alguma coisa na agenda das reuniões da administração e de gestão das Instituições Microfinanceiras (Lukes, 1974). As Instituições que preferem envolver os devedores na actividade de empréstimos financiados podem contribuir para a capacitação dos clientes (Ackerly, 1995). As estruturas que são criadas para a representação de clientes nas instituições, são frequentemente referidas como adaptando uma ‘abordagem participativa’ (Chambers, 1994). O nível de participação dos clientes na tomada de decisões varia em grande escala, de acordo com as diferentes Instituições Microfinanceiras. O custo da criação de um processo participativo onde os clientes tenham mais voz activa na tomada de decisões pode ser elevado. Apesar dos custos iniciais serem altos, uma abordagem participativa é mais eficiente a longo prazo porque auxiliará o estabelecimento de uma relação mais eficiente entre os clientes e o serviço de distribuição (Ashby e Sperling, 1994). No entanto uma questão mais abrangente deverá ser colocada (independentemente do nível de ‘participação’) sobre se a auto-escolha de clientes das Instituições Microfinanceiras não poderá levar à exclusão de clientes mais pobres. Se uma Instituição Microfinanceira propõe ter uma focalização na redução da pobreza, então uma fusão de estratégias selectivas (por ex.: auto-selecção, mecanismos de incentivo, quotas, alvos) pode ser necessária para assegurar a introdução de grupos sociais mais pobres (Marr, 1999). É importante compreender que as Instituições Microfinanceiras não serão capazes de resolver todas as questões que os clientes levantam através da abordagem participativa (por exemplo aquelas relacionadas com as do nível macro conforme esquematizadas no Capítulo 3). No entanto, um processo de participação de clientes poderá significar que as Instituições Microfinanceiras funcionam como ligação para outras agências que tratam de tais questões.

4.5.4 Restrições impostas pelos ‘doadores’ Frequentemente as Instituições Microfinanceiras são pressionadas para reportarem aos doadores, governos ou investidores particulares todos os aspectos das suas operações incluindo as escalas crescentes e o seu alcance. Esta pressão dos seus ‘fundadores’ para se tornarem financeiramente autosustentáveis, num curto espaço de tempo, determina que elas trabalhem com devedores menos pobres que possam solicitar empréstimos maiores. Os mecanismos para esclarecer as necessidades dos

68


‘doadores’ e a negociação entre estes e os pedidos dos grupos rurais deverão ser clarificados desde o início.

69


4.6 Rumo a instituições de microfinança sensíveis ao género: aproveitando as oportunidades Uma consideração importante para a planificação das Instituições Microfinanceiras deverá contemplar se a informação sensível ao género, pode ser incluída de forma a aumentar a sua correspondência às diferenças de género entre clientes microfinanceiros. Os estrategas microfinanceiros estabelecem objectivos para as actividades das Instituições Microfinanceiras e desenvolvem estratégias para alcançar esses objectivos, tais como fixar taxas de crédito, desenvolver critérios para as aplicações dos empréstimos, e fixar taxas de amortização de empréstimos. O mais importante para identificar as oportunidades, é avaliar se os estrategas microfinanceiros estão conscientes das prioridades diferentes dos diversos grupos de clientes (baseadas no género, idade, etnia, raça e outros factores sócioeconómicos), e qual a melhor maneira de dar resposta a estes através da distribuição microfinanceira. 4.6.1 Sensibilidade de género: planificando no sector microfinanceiro Estabelecer objectivos sensíveis ao género para os programas microfinanceiros. Este é o primeiro passo. É importante não sobrecarregar os objectivos, de forma a esperar que estes resolvam todos os problemas identificados pelas comunidades. Em particular é importante reconhecer que alguns problemas seriam melhor tratados por outros meios. Cada objectivo deverá ser verificado de forma a ver se está: relacionado com as necessidades dos clientes (as necessidades expressas por potenciais clientes masculinos e femininos); limitado no tempo; devidamente mencionado; com a acção orientada; preciso acerca dos resultados finais; e se é tangível. É necessário considerar os serviços de apoio necessários para alcançar os objectivos, garantindo que as mulheres possam participar e principalmente, saber quem deverá fornecer tais serviços não-oficiais (ex.: literacia, capacidade de formação). Implementação de programas microfinanceiros: Uma vez identificados os objectivos sensíveis ao género, uma questão crítica são os empregados das Instituições Microfinanceiras. A implementação das actividades sensíveis ao género requer que os empregados dessas instituições também sejam sensíveis ao género. Os projectos de desenvolvimento de grupos de trabalho sensíveis ao género, implicam que os seus membros quer masculinos quer femininos, compreendam claramente como o género se relaciona com os objectivos das Instituições Microfinanceiras, concordem com eles, e possam identificar indicadores, de maneira a avaliar continuamente como os objectivos estão a ser alcançados. Monitorizando as actividades microfinanceiras: Isto ajuda a determinar como as Instituições Microfinanceiras estão a corresponder às necessidades dos clientes com baixo rendimento. Os dados que relacionam o volume, composição e execução das carteiras de empréstimos, bem como as contas de poupança podem avaliar a efectividade dos programas das Instituições Microfinanceiras. No entanto, a recolha dessa informação dos clientes é onerosa, e é importante que apenas a informação mais relevante seja recolhida. Devido aos custos de transacção envolvidos, os devedores não devem ser atolados com a vigilância dos usos exactos dos empréstimos, especialmente quando os empréstimos são muitos e pequenos. É muito importante estabelecer se os devedores podem amortizar os seus empréstimos e assegurar que os incentivos para amortizar (ex.: pressão da sociedade, empréstimos renováveis, garantias colaterais, sanções sociais) são incorporados no processo microfinanceiro. De forma a reduzir os elevados custos da recolha de informação primária, um dos níveis de monitorização pode ser feito pelos próprios clientes da microfinança, outro nível pode ser feito pelos grupos de trabalho dos intermediários microfinanceiros, através de visitas ao campo e relatórios de rotina para o programa. Muitas Instituições Microfinanceiras têm questões de monitorização de impacto nos clientes incorporadas nos seus SIG (ex.: Kamurj na Arménia). Um outro nível de monitorização e avaliação global do impacto dos programas microfinanceiros deverá ser feito por

70


‘observadores’ por exemplo ‘fundadores’, e o resultado deverá ser repartido com os membros das Instituições Microfinanceiras. Isto assistirá na dimensão da execução. Para determinar qual a informação que deverá ser monitorizada pelos membros das Instituições Microfinanceiras e porquê, um gráfico de monitorização pode ser delineado e a pessoa ou pessoas responsáveis por recolherem esses dados deverão ser designados antecipadamente. Desenvolver um gráfico semelhante àquele que aparece no Apêndice A4.6 é um exercício útil para assegurar que a focalização da monitorização é clara para todos os que estão envolvidos. É importante questionar se o devedor é também o beneficiário primário. Muitos investigadores observaram que apesar de os empréstimos serem feitos predominantemente por mulheres, o controlo desses empréstimos e a forma como seriam gastos continuava a ser feito pelos homens do agregado. No entanto, as obrigações de pagamento continuavam com o devedor. Deste modo, se a distribuição de empréstimos por sexo é um indicador fiável para a distribuição dos benefícios pode (e deve) ser questionada (Remenyi, 1997). Os impactos das Instituições Microfinanceiras diferem tipicamente entre mulheres, portanto algum cuidado deverá ser utilizado quando se identificam um conjunto de indicadores que são relevantes para todas as mulheres. Outro método de monitorização, é comparar as alterações nos rendimentos das famílias envolvidas nos programas microfinanceiros com as famílias que não estão envolvidas. Tal como um sistema também pode ser criado para individuais. Uma matriz semelhante à que se vê no Apêndice A4.7 pode ser desenvolvida para este efeito. Avaliação é o processo de reunir e analisar informação para determinar: (1) se o programa microfinanceiro está a executar as suas actividades planificadas, e (2) a extensão em que o programa microfinanceiro está a alcançar os seus objectivos declarados através destas actividades. Para além da avaliação dos assuntos financeiros de rotina como a sustentabilidade operacional e financeira, preocupações específicas em termos de assuntos de género e sócio-económicos também deverão ser avaliados. No entanto, as próprias Instituições Microfinanceiras não estarão provavelmente na posição de determinar adequadamente o impacto das suas actividades em diferentes partes intervenientes, e conforme atrás foi mencionado, é mais eficiente se os ‘observadores’ ou as ‘autoridades delegadas independentes' avaliarem o impacto do programa microfinanceiro. Algumas questões para avaliação de um programa microfinanceiro, em termos de assuntos de género e sócio-económicos são: A posição de género no projecto do programa foi apoiada durante a sua implementação? Qual foi a resposta das mulheres aos serviços microfinanceiros em oferta? Foram contempladas as mulheres e os grupos em desvantagem? Para quem foram os benefícios? Para as mulheres? Agregados e famílias? Grupos sociais particulares? Quais as mulheres que foram e não foram contempladas? Quais os grupos sócio-económicos que foram e não foram contemplados? Ate que ponto os efeitos negativos e positivos, que eram esperados nas mulheres, ocorreram na prática, houve alguns impactos inesperados nas mulheres e nas relações de género mais amplas (positivas e negativas)? O Apêndice A4.8 sintetiza alguns dos exemplos dos indicadores quantitativos e qualitativos que podem ser usados. É recomendado que uma Instituição Microfinanceira escolha aqueles indicadores mais relevantes para as suas actividades.

71


4.6.2 Redes e lobbies As Instituições Microfinanceiras estão frequentemente numa posição de exercerem lobby para possibilitarem a legislação e as regulamentações que governam as suas actividades. Devido à sua proximidade, e ao seu conhecimento dos clientes, as Instituições Microfinanceiras podem saber qual a política que está a faltar ou a que é necessária, e podem estar numa posição para fazerem lobby para que os assuntos de género sejam considerados nas políticas financeiras. Caixa 4.2: Um exemplo de redes jogando um papel de Uma forma de criar lobbies consiste em destaque na alteração das políticas. apresentar relatórios aos governos ou outros potenciais patrocinadores No fim de 1999, a Câmara alta do Parlamento Russo reviu salientando os programas bem sucedidos a versão final de uma lei que propunha alterações que do passado, enquanto acentuam as altas eram positivas para as Instituições Microfinanceiras. O taxas de amortização que são conseguidas Women’s World Banking, a Opportunity International mesmo com clientes mais pobres. Os (duas organizações internacionais que executavam Intermediários Microfinanceiros e outras programas MF na região) e a Russian Women’s partes intervenientes (stakeholders) Microfinance Network influenciaram com sucesso as podem participar nas reuniões de forma a autoridades Russas sugerindo que a legislação nacional conhecerem os decisores políticos com o passasse a ser favoravel para as Instituições propósito de discutir essas políticas. Os Microfinanceiras e seus clientes. Os seus esforços decisores políticos neste sentido são resultaram numa legislação de apoio para que as muitos, incluem altos dirigentes Instituições Microfinanceiras Russas sejam consideradas bancários, ministros, Oficiais das como fundações, que não necessitam de obter licenças agências de desenvolvimento, e outras bancárias para conduzir actividades de microaltas individualidades do governo. As empréstimo. Também acionaram um lobby para isenção de partes intervenientes podem reunir-se e taxas de valor acrescentado. formar alianças com organizações com os mesmos fins para influenciar as políticas. As Instituições Microfinanceiras podem ter um impacto na política nacional se os seus representantes forem convidados a participar nos comités nacionais consultivos. Frequentemente também são concedidas oportunidades às organizações rurais quando os seus contributos e inputs são necessários para a elaboração de relatórios nacionais nas conferências internacionais. Foi o que aconteceu durante os preparativos governamentais para a IV Conferência Mundial sobre as Mulheres (1995) e para a Cimeira do Microcrédito (1997). O processo preliminar para tais conferências pode funcionar como elemento catalisador para muitos tipos de alterações políticas. O Apêndice A4.9 fornece algumas sugestões de como as Instituições Microfinanceiras podem influenciar a arena política para integrar assuntos de género. Com excepção da informação partilhada, que é necessária para influenciar as políticas sensíveis ao género de forma a facilitar o progresso da microfinança, uma Instituição Microfinanceira pode apoiar as mulheres que ficam com riscos micro-empresariais, através da sua ligação a redes de apoio mútuo entre mulheres que podem obter conhecimentos de formação adequados e outras formas de apoio técnico de reserva. As Instituições Microfinanceiras podem também tentar incentivar o suporte masculino para as actividades onde as mulheres empresárias estão envolvidas. As redes microfinanceiras têm realizado um importante papel na promoção do sector. O Secretariado do Grupo Consultivo para Assistir aos Mais Carenciados (o CGAP) concede fundos para redes de Instituições Microfinanceiras, e paralelamente ao seu apoio directo às mesmas. As redes oferecem a vantagem de economias de escala, e um conhecimento profundo das suas filiais. Baseada na experiência da CGAP, o trabalho para incorporar a capacidade através das redes deverá incluir: um elemento humano (alta capacidade de liderança profissional de redes); capacidade para capitalizar através de recursos externos; relacionamento excelente com os membros da rede; uma agenda

72


orientada para os membros, exigência de serviços direccionados conforme evidenciado pelo custo de recuperação. Qualquer proposta de capacidade incorporada deverá ser propriedade dos membros da rede, mais do que da rede ou do dirigente da rede (Brandsma e Sapcanin, 1999).

4.6.3 Aprendendo através das ‘metodologias acertadas de outras instituições microfinanceiras Existem muitos exemplos de aumento do bem-estar dos clientes como resultado dos serviços oferecidos pelas Instituições Microfinanceiras. Apesar de existirem poucos estudos de impacto detalhados, em muitas partes do mundo há exemplos de Instituições Microfinanceiras sustentáveis com ‘sucesso’. As Instituições Microfinanceiras de sucesso tendem a ter custos reduzidos por unidade de empréstimo, baixos custos operativos, elevados proveitos nos investimentos, altas taxas de amortização e elevado número de empréstimos por executivo. O acesso aos recursos financeiros como resultado da mobilização de poupanças e o seu investimento para os seus clientes, mais do que confiar nas fontes externas de fundos é outra medida de sustentabilidade dentro das Instituições Microfinanceiras. Adicionalmente, para estas se tornarem financeiramente sustentáveis, e terem uma presença duradoura numa determinada área, quer a sua escala quer o seu alcance devem ser maximizados. O Apêndice A4.10 detalha algumas ‘metodologias acertadas para o serviço de distribuição das Instituições Microfinanceiras.

73


4.6.4 Fornecendo serviços não-financeiros Técnicas eficientes de custos para fornecer serviços não-financeiros tais como o aproveitamento eficaz da gestão e dos conhecimentos profissionais técnicos entre os empresários não estão presentemente muito bem elaborados. Conforme se refere no Apêndice A4.10 é difícil fornecer eficazmente e ao mesmo tempo, serviços financeiros e não-financeiros. Rhyne e Holt (1994) sugerem as seguintes abordagens para serviços não-financeiros: 1.Integrar os princípios ‘seguros’ da distribuição dos serviços financeiros nos desenho de quaisquer formações não-financeiras e assistências técnicas. 2.Aplicar as abordagens específicas do sector. Exemplo de focalização nas intervenções que podem fazer a diferença a um grande número de empresários do mesmo sector. 3.Promover uma maior evidência do emprego independente nas instituições vocacionais locais ou regionais de formação, se tiver acesso a essas instituições. 4.Para os clientes mais pobres, tentar integrar funções de desenvolvimento social nas metodologias dos serviços financeiros, ex. através do trabalho com organizações especializadas para estes clientes. Outras experiências sugerem que trabalhar com grupos e redes de empresas pode ser uma forma eficiente de fornecer serviços para desenvolvimento de negócio. Alguns operadores microfinanceiros sugerem que uma abordagem dirigida para a procura (que seja focalizada nas necessidades dos compradores dos produtos e serviços), pode na maioria das vezes motivar os empresários a melhorar os serviços e produtos que estão a vender (Humphrey e Schmitz, 1995). Algumas tentativas recentes para aplicar esta abordagem aos microempresários apontam para o seu potencial sucesso. Noutros casos ficou demonstrado que uma abordagem baseada na procura, isto é olhando para as necessidades dos compradores, os serviços não financeiros não tiveram o impacto mais eficiente na melhoria da execução das microempresas. As Instituições Microfinanceiras têm o poder de levar os assuntos de género para as agendas políticas. Em particular, elas podem melhorar a sua sensibilidade ao género através de várias práticas (ex.: práticas de gestão, alteração de objectivos, incentivos aos clientes). Os Apêndices fornecem sumários e sugestões de uma variedade de acções que podem ser tomadas para melhorar a execução das Instituições Microfinanceiras e de aumentar a consciência de género dentro das próprias Instituições Microfinanceiras.

74


Capítulo 5 - Microfinança: o nível Macro 5.1 Introdução O nível macro diz respeito às políticas nacionais que governam as actividades microfinanceiras em qualquer país. Isto inclui a legislação e as regulamentações que influenciam as actividades das instituições microfinanceiras, bem como as que afectam individuais como empresários ou como devedores. No contexto da alimentação e agricultura, os programas microfinanceiros são frequentemente localizados ou focalizados em áreas rurais. As políticas de agricultura nacionais, em conjunto com a política do sector financeiro, podem determinar uma política agrícola e rural financeira. Muitas políticas nacionais são modeladas pelo ambiente global macro-económico. Os assuntos que envolvem a globalização da economia mundial criam um novo ambiente operacional para a produção, distribuição, e trocas comerciais. Os tratados comerciais e de serviços financeiros ao nível global, conduzem a maiores alterações no ambiente da economia doméstica, que têm impacto ao nível local. A capacidade de uma pessoa funcionar como uma economia pessoal, isto é, ser capaz de entrar em contractos voluntários para troca de bens e serviços, é frequentemente determinada pelo estado. Neste contexto, o género é uma variável central na produção, distribuição de recursos, e na estrutura de decisão da família, comunidade ou esferas sociais (Coelho e Coffey, 1996). A igualdade de direitos entre mulheres e homens significa frequentemente que os governos terão especificamente que conceber legislação focalizada que facilite a participação económica das mulheres. Se as políticas sobre a microfinança reconhecem explicitamente as limitações da abordagem microfinanceira sustentável para a redução da pobreza (Hulme e Mosley, 1996; Marr, 1999), então a política microfinanceira pode ser integrada e servir de apoio para as outras políticas e actividades que sejam directamente orientadas para os pobres. Por exemplo, em países com Planos Nacionais de Acção contra a Pobreza (ex.: Uganda, Gana, Moçambique) onde as entradas (inputs) das partes intervenientes microfinanceiras são importantes, convém salientar o que a microfinança pode e não pode fazer em relação à erradicação da pobreza (Healey et al., 2000). Embora muitas mulheres com baixo rendimento sejam economicamente activas, e microempresárias independentes, até à data muitas leis e instituições financeiras ignoram-nas. As mulheres empresárias em pequena escala, não são consideradas frequentemente como um grupo de clientes importante pelos decisores políticos. Apesar de as mulheres serem representadas em excesso no sector de negócio paralelo, os decisores políticos muitas vezes são indiferentes a este sector e focalizam-se em estratégias de desenvolvimento para o sector oficial. As mulheres e homens com baixo rendimento ou micro-empresários podem ter que ultrapassar barreiras difíceis de transpor quando tentam obter serviços financeiros. Nalguns casos a definição dos empresários alvo, implica que eles tenham pelo menos um empregado. Alguns esquemas financeiros exigem que os clientes operem a tempo inteiro numa pequena ou média empresa (PME), para se candidatarem aos empréstimos oferecidos através desses esquemas, ou ainda que sejam manufacturas mais das empresas de serviços. O empréstimo pode ser mais para investimento de capital fixo do que para capital circulante. As mulheres raramente são capazes de dedicar todo o seu tempo às suas PME devido aos seus múltiplos papéis e tendem a concentrar-se no sectores dos serviços e no paralelo e por conseguinte necessitam mais de capital circulante do que capital fixo.

75


Na globalidade, pode ser dito que as microempresas e PMEs constituem o sector privado emergente na maioria dos países e deste modo são considerados como os alicerces para o crescimento do sector (Hallberg, 1999). Os governos estão interessados em políticas que fortaleçam as microempresas por causa do potencial de escala inerente aos seus números e aos números de trabalhadores que elas empregam. No entanto, é crucial que os decisores políticos e as partes intervenientes consultadas durante o processo de elaboração de políticas possam promover as necessidades dos microempresários de ambos os sexos do sector oficial e paralelo. Neste capítulo, observamos como os assuntos de género e sócio-económicos podem ser examinados relativamente à microfinança no nível das macro-políticas e como afectam os intermediários microfinanceiros e a capacidade das mulheres e homens funcionarem como micro-empresários. Além disso, são ainda descritas estratégias para identificar os grupos principais de intervenientes envolvidos no processo de elaboração de políticas, ou grupos-chave que possa influenciar as políticas no sector microfinanceiro. São também abrangidos neste Capítulo, os recursos e restrições relacionados com a elaboração de políticas sensíveis ao género para os intermediários microfinanceiros.

5.2 Assuntos de género e factores sócio-económicos no processo político O género não pode continuar a ser tratado como uma área ‘suplementar’ da política e da intervenção. Já existem provas suficientes disponíveis para argumentar que o género é um princípio de organização à volta do qual são estruturados, não apenas processos sociais e culturais, mas também económicos (Elson, 1995). Este Capítulo não repete em detalhe, os argumentos válidos que foram propostos quanto à relevância do género e da política macro-económica (para uma informação detalhada de assuntos de género na política macro-económica o leitor deverá consultar Van Staveren e Elson (1995)11). Em suma, tratar as mulheres e homens como substitutos perfeitos quando se determina a disponibilidade de trabalho, ou a natureza das unidades de produção ou de consumo, produz falsas estimativas e pode tornar as mulheres invisíveis no planeamento económico (Coelho e Coffey, 1996). Uma perspectiva consciente ao género é muito mais provável que se preocupe com a mulher e o homem económicos, como eles pensam em termos de actividades empresariais e como eles interagem. A capacidade das mulheres de terem acesso a contratos económicos está limitada quando a legislação do estado não trata as mulheres como cidadãs de pleno direito. Um exemplo fundamental que ilustra este caso nalguns países, é a sua restrição de acesso a créditos bancários simplesmente porque elas não têm direito aos activos da família. Frequentemente as mulheres não podem assinar contratos em pleno direito e são obrigadas a ter um fiador masculino (pai, irmão, marido) (Elson, 1995). As restrições especiais, controladas pelas macro-políticas, que as mulheres empresárias com baixo rendimento têm que encarar são esquematizadas na Secção 5.5.1, enquanto detalhes mais generalizados sobre essas restrições (e não apenas aquelas que estão debaixo da alçada da macro-política) estão esquematizadas no Capítulo 3 deste Guia. Uma variedade de assuntos sócio-económicos também afecta e influencia o processo de elaboração de macro-políticas. Tendências demográficas, condições de negócio, políticas educacionais nacionais, taxas e tendências de desemprego, gastos do sector público, todos têm impactos diferenciais na capacidade dos homens ou mulheres funcionarem como empresários. Para avaliar o impacto dos factores sócio-económicos em termos de política nos intermediários microfinanceiros, foram formuladas uma quantidade de questões, que são apresentadas na Caixa 5.1, e funcionam como apoio, para os decisores políticos ou para aqueles que tentam influenciar o processo de elaboração de políticas, para obter um painel mais abrangente do ambiente onde operam.

11

Consultar também o Manual da Macro ASEG

76


Caixa 5.1: Factores sócio-económicos que podem influenciar o processo de elaboração de políticas Qual é a ideologia política do presente governo, regime ou burocracia, por exemplo se a ideologia é

centrada no estado, orientada para um mercado livre ou em transição? Tenta promover as mulheres?

O nível da intervenção do estado no sector bancário e dos serviços financeiros é oportuno ou

restrictivo?

Quais são os grupos de interesse que têm poder e autoridade e podem afectar as decisões acerca das

operações das instituições microfinanceiras? Existem alguns incentivos para tais grupos incluirem assuntos sócio-económicas e de género?

Quais são os peritos

técnicos que têm acesso ao conhecimento especializado das operações microfinanceiras? Pode algum destes peritos influenciar o processo de elaboração de políticas? Por exemplo há grupos ou individuais da comunidade empresarial? Se estes peritos técnicos que podem ser parte integrante do ‘grupo de pensadores’ da elaboração de políticas, podem tornar-se campiões da sensibilidade ao género para permitir uma política microfinanceira?

Existem alguns relatos de desenvolvimento (histórias que simplifiquem situações complexas e que

eventualmente sejam aceites incontestavelmente e genericamente como descrição da realidade), referentes ao género e/ou microfinança que possam influenciar o processo de elaboração de políticas? Por exemplo se as taxas de amortização para as mulheres são mais elevadas do que as dos homens, ou se os empregados dos bancos nacionais de agricultura estão desmotivados etc. Estes relatos de desenvolvimentos são úteis ou impedem as políticas sensíveis ao género?

Quando os decisores políticos estão olhando para opções que facilitem as micro-empresas e a

microfinança, de que forma radicalmente diferente são as opções que eles têm que considerar em comparação com as políticas que existiam anteriormente? Na generalidade, a maioria das novas políticas apenas diferem marginalmente das políticas existentes. Esta é uma consideração importante a ter em conta se alguém quiser exercer pressão para qualquer coisa radicalmente nova.

As políticas são às vezes ‘herdadas’ em vez de desenvolvidas a partir do nada ex: políticas que foram

adaptadas por causa dos quadros de membros nacionais com outros grupos (a Commonwealth ou a OCDE). Podem as políticas que favorecem os grupos desfavorecidos e a igualdade de género ser facilmente transferidas de outro lugar?

De que forma são influênciadas as políticas nacionais pelas organizações internacionais como a WTO, o

FMI, o Banco Mundial, a UE, a FAO, o ILO, a OCDE? Existem alguma justificação, posição política ou acordos que possam destacar-se para influenciar a política nacional? Por exemplo o género foi uma consideração importante em diversas cimeiras internacionais (A Cimeira Mundial sobre Desenvolvimento Social, em Copenhaga, em 1995, A IV Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Pequim, em 1995, A Conferência de Pequim dos Cinco Mais, em 2000).

Quais são as tendencias demográficas? Existe grande incidência da migração rural para a urbana que

implique que os serviços financeiros rurais não sejam uma prioridade máxima? Podem as actividades microfinanceiras contribuir para a desacelaração da migração e emigração?, aumentar o bem-estar social em situações pós-conflito?, ou facilitar a integração de novos imigrantes no seu novo país?

Adaptado de Sutton, 1999

77


5.3 Partes intervenientes envolvidas na decisões políticas Nitidamente, um primeiro passo importante para garantir que os assuntos de género e sócioeconómicos sejam integrados nas políticas microfinanceiras e nas posições referentes às operações dos Intermediários Microfinanceiros é sistematicamente identificar as partes intervenientes principais envolvidas no processo de elaboração de políticas no nível macro e depoi, de acordo com o contexto, solicitar a sua participação ou requerer o seu conselho. Uma lista de verificação das partes intervenientes é útil para garantir que uma grande variedade de partes intervenientes seja considerada (ver Apêndice A5.1). As políticas do governo que lidam com finança estão usualmente concentradas no Ministério das Finanças, na Alta Autoridade Bancária do país, e/ou o Ministério do Comércio Exterior, por conseguinte, estes são as partes intervenientes mais importantes para qualquer política relacionada com microfinança. As políticas do governo relacionadas com finança rural estarão também sobre a alçada do Ministério da Agricultura. As políticas que lidam com serviços financeiros e Intermediários Microfinanceiros para pobres, não podem ser desenvolvidas isoladamente de uma perspectiva social abrangente. Políticas microfinanceiras e anti-pobreza apenas podem ser consideradas em conjunção com políticas existentes que lidem com a agricultura, saúde, educação, infra-estruturas e investimentos. Por exemplo, são necessários investimentos a longo prazo na alfabetização das mulheres e grupos desfavorecidos para o eficaz desenvolvimento da contabilidade e gestão de conhecimentos profissionais. Cortes nos serviços de educação poderão afectar mais as raparigas do que os rapazes. Nalguns casos, o governo de um país pode ter um plano de acção definitivo para os assuntos de género, distribuído por diversos ministérios. No entanto, em muitos casos, este plano pode estar concentrado no ministério que trata dos assuntos das mulheres, ou no dos assuntos sociais, nas secretarias de género (se existirem) ou em departamentos específicos de outros ministérios, como o da agricultura, do trabalho, da indústria e comércio. Preocupações com o género não são tipicamente evidentes no ministério das finanças. Para além do governo (particularmente o ministério das finanças), existirão diferentes intermediários financeiros intervenientes envolvidos de uma maneira ou de outra, influenciando e implementando as políticas microfinanceiras, como os bancos, uniões de crédito, organizações multinacionais, cooperativas; sindicatos de trabalhadores, e ONGs. Por conseguinte, uma variedade de partes intervenientes pode incluir; vários ministérios (da agricultura, do trabalho, comércio e indústria, educação, e ainda bancos centrais, etc.), grupos com interesses especiais (organizações de agricultores, cooperativas agrícolas), bancos e outras instituições financeiras, uniões de crédito, ONGs; o sector privado; ‘equipas de pensadores’ especialistas, comités de organização, peritos técnicos e o sector académico. Identificar as partes intervenientes em relação ao processo de elaboração de políticas, bem como aqueles que podem eventualmente influenciar a política, pode ser alcançado inicialmente através da criação de uma lista daqueles que têm interesses indirectos ou directos nas políticas, e podem ter influência nas operações dos intermediários microfinanceiros. É fundamental assegurar que aqueles que representam a opinião dos empresários pobres, homens e mulheres, estejam também envolvidos na planificação das políticas. Uma maior sinergia pode ser alcançada se for facilitado o diálogo entre as partes intervenientes microfinanceiras e os defensores do ‘género’ no país, de forma a identificar objectivos comuns, incorporar uniões e mediar conflitos. Uma forma adicional de incentivar a planificação das políticas microfinanceiras sensíveis ao género é fomentar o emprego de mulheres sensibilizadas em posições estratégicas nas instituições.

78


5.3.1 A percepção das partes intervenientes da microfinança e dos assuntos de género Uma vez identificadas as partes intervenientes, as suas expectativas, e opiniões sobre o sector microfinanceiro e o papel dos Intermediários Microfinanceiros deverão ser determinados de forma evidente. Os benefícios prováveis de cada grupo das partes intervenientes podem ser identificado; bem como quais os recursos que cada grupo de intervenientes pode ser capaz e desejar mobilizar. Criticamente, deverá ser transparentes quais os interesses dos grupos que podem entrar em conflito com o estabelecimento dos serviços microfinanceiros num determinado país. Uma forma útil de analisar os grupos intervenientes é dirigir uma prática para examinar os seus motivos, posições e recursos. Uma matriz com quatro colunas pode ser esquematizada (FAO, 1997). Uma coluna registará as partes intervenientes, a segunda os seus motivos para as Instituições Microfinanceiras, a terceira os seus motivos contrários; a quarta coluna registará os seus recursos. Uma matriz semelhante àquela do Apêndice A5.2 poderá ser construída.

5.3.2 A percepção das partes intervenientes das regulamentações microfinanceiras Por fim, o custo da regulamentação e supervisão é frequentemente suportado pelos clientes intervenientes, ficam fora do seu alcance, as mulheres e os homens com mais baixo rendimento, que podem ter acesso restrito aos intermediários financeiros como resultado de sobre regulamentações e serviços financeiros onerosos. Por conseguinte, partes intervenientes diferentes terão diferentes entendimentos sobre os assuntos tais como a regulamentação e a supervisão das actividades microfinanceiras. Regulamentação significa que o governo e outras entidades (o Banco Central) definem regras para fornecedores de serviços financeiros, por exemplo, controlando os padrões de segurança que devem cumprir. A regulamentação é necessária para assegurar que os fundos dos depositantes são seguros. A supervisão significa que certos organismos sistematicamente fiscalizam o fornecimento dos serviços financeiros de forma a assegurar que eles cumpram as regras definidas pela regulamentação. No caso de incumprimento, são obrigados a modificar as suas práticas ou a fechar. Uma supervisão eficiente usualmente existe em concertação com um mecanismo de execução. Uma auto supervisão refere-se à situação em que as próprias organizações microfinanceiras criam uma entidade cuja responsabilidade consiste em regulálas. Existem ainda outras opções de supervisão directa. São supervisores delegados, apexes, agências de avaliação paralelas, seguros de depósito e garantias bancárias (Adaptado do CGAP, Jornal esporádico No 4, 2000). As questões mais importantes a nível político incluem; (a) Por que motivo é a regulamentação necessária para as Instituições Microfinanceiras? e (2) quem as regulamentará melhor e por quê? Os pontos de vista das partes intervenientes acerca deste assunto são diferentes de acordo com as suas necessidades e interesses. Uma terceira questão é que tipos de regulamentação e sistemas de supervisão são adequados para o sector microfinanceiro num determinado país ou para um grupo particular de clientes? Devido ao sector microfinanceiro ser relativamente novo, os governos podem não ter estabelecido regulamentação adequada e sistemas de supervisão, e modelos adequados podem não existir noutros países. As opiniões também variam entre as partes intervenientes relativamente ao tipo de Instituições Microfinanceiras que deve ser regulamentado: apenas Instituições Microfinanceiras de crédito ou organizações de base associativa. A atitude sobre a dimensão das Instituições Microfinanceiras a serem regulamentadas também variará. Uma corrente de pensamento defende que apenas as de crédito é que não deverão ser objecto de regulamentação e supervisão e que as instituições que tratam de pequenos depósitos não deverão ser proibidas de tomar esses depósitos apenas por estes estarem em

79


áreas longínquas ou serem demasiados pequenos e deste modo não serem fáceis e baratos de supervisionar. Aparentemente algumas Instituições Microfinanceiras foram frequentemente bem sucedidas simplesmente porque como ONGs, não eram regulamentadas e deste modo eram livres para inovarem. Consequentemente, a regulamentação pode algumas vezes funcionar como obstáculo para a experimentação e inovação (embora inversamente, também possam conduzir a práticas sem escrúpulos). Por conseguinte, alguns grupos de Instituições Microfinanceiras ONG intervenientes acreditam que a regulamentação não deve ser aplicada àquelas que operam programas de microcrédito, mas sim às que mobilizam créditos. Outros grupos intervenientes defendem que janelas reguladoras especiais para Instituições Microfinanceiras de crédito, serão apropriadas nalguns países enquanto noutros poderá ser prematuro e deste modo pode ter um impacto adverso no desenvolvimento inicial do sector microfinanceiro (Peck-Christen e Rosenberg, 1999). Dado que o sector microfinanceiro é ainda um sector em crescimento, depende muito do contexto do país, do sector, e do grupo de clientes onde se está a desenvolver. Na globalidade, é ainda necessário adoptar e desenvolver novos módulos de experimentação e ‘metodologias acertadas’. Outra argumentação, é que a regulamentação e supervisão das Instituições Microfinanceiras pode ser uma tarefa onerosa e longa, conforme o exemplo das Filipinas ilustrado na Caixa 5.2. A regulamentação e supervisão pode ser ainda mais onerosa nos países onde faltam recursos para suportar canais regulatórios e de supervisão elaborados. As Instituições Microfinanceiras e o governo são grupos intervenientes fundamentais em termos do

Caixa 5.2: Bancos Rurais nas Filipinas Os bancos rurais representam a parte mais reduzidas em termos de intermediários financeiros com licenciamento nas Filipinas. As suas operações englobam depósitos e crédito e são supervisionadas pelo Banco Central. Os depósitos nos bancos rurais são protegidos ao abrigo de um plano de nacional de seguros de depósito. No final de 1997, mais de 820 bancos rurais serviam de suporte a meio milhão de clientes com baixo rendimento num país com uma população de 65 milhões de habitantes. Com apenas 2% dos activos de todo o sistema bancário, correspondiam a 83% das instituições que o Banco Central tinha que supervisionar. Consequentemente os meios do departamento de supervisão do Banco Central foram severamente afectados. Em 1996, 200 inspectores foram alocados para os bancos rurais, e mesmo assim esse número foi considerado inadequado face às necessidades de supervisão. De modo a reduzir o número de bancos rurais e consequentemente aliviar o esforço de supervisão, a capitalização mínima para um banco rural foi aumentada dez vezes, de 100,000 US$ para 1 milhão de US$. Esta experiência demonstra numa perspectiva de ‘regulamentação’ governamental que um capital mínimo elevado necessita ser instituído para reduzir as exigências das autoridades reguladoras. Contudo permanece a questão relativamente ao impacto que a decisão de aumentar o capital mínimo terá nos clientes com baixo rendimento. É provável que o número de Bancos Rurais tenha diminuído e consequentemente torna-se mais caro para estes clientes trabalhar com esses bancos Adaptado de CGAP, Jornal Ocasional No 4, 2000

desenvolvimento da regulamentação. As suas possíveis motivações a favor da regulamentação, supervisão e a aplicação de modelos deverão ser examinada por todas as partes intervenientes, particularmente os grupos de clientes. Um dos métodos consiste em desenvolver uma tabela como

80


aquela que se apresenta no Apêndice A5.3 para tentar determinar os motivos a favor ou contra a regulamentação. Em conjunção com um sólido ambiente regulatório para as operações microfinanceiras, é necessário um enquadramento das políticas microfinanceiras. Deverá ser favorável para os desprotegidos da sociedade e deverá também reconhecer a necessidade de incluir clientes do sector paralelo. Uma questão crítica para os decisores políticos é saber que políticas são necessárias para facilitar a entrada de mulheres mais pobres na finança rural/urbana e por conseguinte na participação do mercado. O enquadramento da política global deverá promover uma intermediação financeira eficiente. Deverá incluir políticas de mercados financeiros para incentivar os mercados rurais a serem competitivos e no entanto distribuírem benefícios sociais. Uma variedade de elementos possíveis para um clima favorável à macroeconomia estão esquematizados na Caixa 5.3.

81


Caixa 5.3: Um clima macro-económico favorável De seguida são apresentados elementos que podem contribuir para um clima favorável macroeconómico. A questão chave é saber se estes elementos afectam de maneira diferente as mulheres e homens clientes Reconhecimento que os mercados requerem uma intervenção política para estabelecer regras de base. Alguma desregulamentação do sector financeiro – como pré-requisito essencial para expandir o alcançe microfinanceiro em muitas economias pobres (Remenyi 1997). Linhas mestras, disposições processuais e documentação padronizada tem que ser consentida em ambos os sectores microfinanceiros, oficial e paralelo. São necessários os procedimentos de registo das empresas e Instituições Microfinanceiras. Nalguns países esses procedimentos são excessivamente complicados, burocráticos, lentos e onerosos. Por exemplo na Croácia, os passos necessários para o registo de uma cooperativa são inúmeros e não é garantida a sua aprovação, é necessário um compasso de espera de pelo menos 60 dias até à aprovação (Tsilikounas, 2000). Deverá ser programada uma política que defina o tamanho das micro, pequenas, médias e grandes empresas e as medidas apropriadas para as promover. Uma política respeitante ao registo da empresa deverá garantir que as oportunidades de mercado não estão perdidas. Na República da Macedónia, por exemplo existem 49 procedimentos burocráticos que devem ser feitos antes de registar uma companhia (ESA, 2000). Na Arménia a maior parte das companhias têm que ser registadas em Erevan, a capital, o que torna um exercício oneroso e demorado para as das províncias (USAID, 2000). Políticas de fixação de preço que considerem que as taxas de juros determinadas pelo mercado, sejam incentivadas pelo governo. Isto permitirá às Instituições Microfinanceiras definirem o nível de taxa de juro que necessitam para se tornarem sustentáveis ao longo do tempo. Salientar a importância da mobilização de depósitos locais, e a eficiência intermediária entre os devedores e credores, de forma a que o sistema microfinanceiro não se torne predominantemente devedor (FAO, 1998). Em muitos países, as instituições bancárias enfrentaram graves problemas incluindo a falência, e a questão de salvaguardar os depósitos de economias tornou-se complicada. A salvaguarda destes depósitos pode depender do alcance da intervenção das autoridades públicas. (Isto pode ser limitado no que se refere aos tipos de economias menos oficiais ou não-regulamentadas). Garantir que as instituições microfinanceiras não estejam a operar num limbo legal o que tornará difícil a sua apresentação como legalmente capazes de garantir a segurança dos depósitos (Remenyi 1997). Por exemplo na Croácia, as ONGs foram impedidas de exercer actividades microfinanceiras (Tsilikounas, 2000). Permitir que as instituições microfinanceiras possam oferecer seguros acessíveis nas áreas da saúde, pensões, vida, protecção de colheitas, etc. Incentivos de taxas para as actividades micro-empresariais. Na Croácia por exemplo, as taxas de proveitos e as taxas pagas pelos funcionários para seguros, para poupanças e cooperativas de empréstimos não incentivam a criação dessas cooperativas. Os empregados pagam 50% dos seus salários em taxas e a própria cooperativa tem que pagar os salários dos empregados, resultando entre 70% e 100% de salário bruto que é pago em taxas. Para além disto, as taxas sobre os proveitos são examinadas anualmente pelo Ministério das Finanças e estão numa faixa entre 15 a 35% (Tsilikounas, 2000).

5.3.3 Implicações do processo de regulamentação para diferentes partes intervenientes Um desafio consiste em regular as operações microfinanceiras de uma forma sensível ao género, no entanto a maneira de o fazer variará de acordo com os diferentes contextos nacionais. Conforme foi atrás referido, facilitar o diálogo entre ‘reguladores’ microfinanceiros ao nível político e aqueles que possam defender quais serão os efeitos que terão nos clientes (mulheres e homens), será uma estratégia eficiente. O fornecimento de um enquadramento regulador tem implicações diferentes para distintos grupos de intervenientes. A Caixa 5.4 esquematiza qual é o enquadramento regulador favorável ao

82


género, indicado para os níveis macro, intermédio e de clientes e o que pode originar uma política microfinanceira nacional sensível à dimensão de género.

Caixa 5.4: Noções de enquadramentos reguladores favoráveis para políticas microfinanceiras sensíveis ao género nos níveis macro, intermédio e de campo Para as Instituições Para os clientes das Instituições Microfinanceiras um Microfinanceiras um enquadramento regulador implica: enquadramento regulador significa: Que os clientes podem ter acesso a Planificar possibilitando políticas Que serão fornecidas regras transparentes e previsíveis de quer para os clientes quer para serviços microfinanceiros supervisão e de regulamentação as Instituições incluindo crédito, apólices de para pressionar a adesão à Microfinanceiras seguro e serviços de execução das normas definidas desenvolvimento empresarial Planificar legislação de forma a Que sejam definidas baixas incentivar a participação Que poderá ser legislada desde já, entradas iniciais para as económica das mulheres a igualdade de direitos entre Instituições Microfinanceiras e mulheres e homens Trabalhar inter-sectorialmente que um mínimo de capital com os ministérios que lidem Que possa haver um necessário para se integrarem com assuntos de género através reconhecimento das actividades no sistema oficial tenha sido da colaboração e planificação de económicas não-oficiais esquematizado regulamentações que sejam Que as actividades geradoras de Que Instituições Microfinanceiras sensíveis a categorias rendimento para alguns grupos de tipos e tamanhos diferentes particulares de mulheres e de intervenientes sejam sejam incentivadas devido à homens com baixo rendimento examinadas de acordo com a sua existência de uma variedade de Incentivar o sector privado, dos ligação à economia do agregado estruturas legais doadores, de outros Que possam existir procedimentos Que seja concedido espaço de intermediários de registo de empresas mais manobra às Instituições Por vezes financiar programas fáceis e menos onerosos Microfinanceiras para que relevantes até que eles se Que existam incentivos fiscais possam continuar a tornem financeiramente para as actividades experimentar novos produtos sustentáveis empresariais para clientes de ambos os sexos Facilitar, não fornecer serviços Possam ser oferecidos incentivos para as Instituições Microfinanceiras Os Governos devem:

83


5.3.4 Analisando as alterações de política que afectam as provisões microfinanceiras Por vezes as políticas podem alterar de forma a impedir o desenvolvimento do sector microfinanceiro. É importante analisar as razões por detrás das quais essas alterações políticas ocorrem, e verificar se mais algumas alterações podem ser realizadas. Na Croácia por exemplo, as ONGs não são autorizadas a executar actividades microfinanceiras. Os bancos, e cooperativas de depósitos e empréstimo são as únicas instituições agora autorizadas a fornecer serviços financeiros. Todos estão debaixo da alçada do ministério das finanças e são regulados por uma lei de ‘Cooperativas de depósito e empréstimo’ de 1998. Esta lei veio substituir uma lei mais flexível de 1989 de forma a evitar fraudes. A Caixa 5.5 sintetiza o enquadramento para examinar as alterações de políticas e as implicações para as Instituições Microfinanceiras como resultado dessas alterações.

Caixa 5.5: Alterações de políticas na Croácia que afectaram o sector microfinanceiro Artigos na lei

Lei de 1989

10 fundadores ou 20 Necessidade de registo pessoas físicas para cooperativas de poupança e empréstimo Capital social para o registo Sem mínimo referido

Lei de 1998 30 pessoas físicas

Implicações para mulheres e homens O registo das organizações é difícil e oneroso

Mínimo capital requerido O capital requerido é muito 100,000 Kuna elevado A aprovação de registo e Apenas Câmara de Ministério das Finanças e Procedimento demasiado concedida por: Comércio posteriormente Câmara de rígido Comércio O processo é muito Sem especificação Especificado pela lei. Conhecimentos incómodo; também incentiva Aprovação do ministro profissionais necessários o nepotismo; as mulheres para a selecção de para os gerentes não têm nenhuma hipótese gerentes. porque os homens são tidos como a escolha lógica para gerentes de uma instituição financeira Procedimentos Podem ser subcontratados Têm que ocorrer dentro Pode incentivar abusos e contabilísticos solicitados da Instituição de Poupança práticas desonestas e Empréstimo. Os relatórios anuais são É um custo adicional para a enviados para o ministério gestão do negócio das finanças e podem ser verificados pela política financeira As mulheres raramente Entidades dentro da Apenas assembleias Assembleias com os cooperativa específicas membros e o conselho de ocupam os lugares de chefia fiscalização Requisitos para o capital nenhum Manter sempre um fundo É ineficiente empatar esta verba social total da cooperativa de 100,000 Kuna para assegurar solvências e evitar falências

84


5.4 Recursos para uma política sensível à dimensão de género Nesta secção são examinados os recursos e restrições no processo de elaboração de políticas nas operações microfinanceiras. As políticas nacionais favoráveis que governem as Instituições Microfinanceiras são um importante recurso. Os dados desagregados por sexo são frequentemente solicitados antes dessas políticas poderem ser desenvolvidas. Os recursos são também necessários para implementar políticas nacionais favoráveis. Para além do governo, os meios para uma implementação de políticas são frequentemente disponíveis no sector privado ou nos doadores.

5.4.1 Dados de desagregação de sexo Os dados desagregados por sexo são uma fonte proveitosa para uma tomada de decisão quanto à política sensível ao género, e um ponto de partida para garantir que os assuntos de género e sócioeconómicos são incluídos no nível político. Os dirigentes governamentais frequentemente declaram que para reformular as suas políticas e orçamentos, primeiro necessitam destes dados. As estatísticas disponíveis por sexo variarão internamente e entre países12. Ao nível macro as questões mais prementes são: Quem utilizará os dados e de que forma? Se estes dados já foram recolhidos? Quem recolherá tal informação se ainda não estiver disponível? Quem a compilará? Quem pagará a compilação e a análise de tais dados? Como poderá ser assegurado que apenas dados relevantes e actuais são recolhidos? Como difundir esta informação de forma eficiente?

5.4.2 Mobilização de recursos para políticas de implementação Desenvolver políticas é na generalidade mais fácil do que implementá-las. Com o desenvolvimento de uma política favorável dirigida aos intermediários microfinanceiros, uma das questões mais importantes que os decisores políticos devem formular é que recursos deverão ser mobilizados para implementar a política. Os meios que os grupos maioritários de intervenientes trazem, para garantir a igualdade de género na política que afecta as operações microfinanceiras pode ser verificado, quando se conduzem análises das partes intervenientes conforme se esquematiza no Apêndice A5.2. 5.4.3 Recursos para o sector privado As cinco maiores corporações de todo o mundo13 tiveram em 1998, rendimentos combinados no valor de 708.9 biliões de US$, o que é mais do que o dobro do PIB combinado dos 100 países mais pobres (Utting, 2000). Tendo chegado à conclusão que elas representam algumas das instituições do mundo mais poderosas e ricas em recursos, muitas corporações estão a alterar o seu relacionamento com as suas partes intervenientes e a promover uma atitude socialmente responsável face a elas. Esta atitude predominou na I Cimeira do Microcrédito que teve lugar em Washington DC em 1997. Bastantes corporações – industriais e financeiras – estão a suportar activamente o sector microfinanceiro. Este apoio inclui intervenções ao nível macro. 5.4.4 Recursos dos doadores Os doadores muitas vezes concedem doações, fundos, garantias de empréstimo, incluindo capital de forma a estabelecer intermediários microfinanceiros14. Em termos de política, em muitos casos os doadores influenciam a legislação e as regulamentações o que pode ser positivo, especialmente se os doadores tiverem uma visão favorável à integração do género no sector microfinanceiro.

12

Guias para ajuda de recolha de dados sensíveis ao género estão disponíveis na FAO. General Motors, DaimlerChrysler, Ford Motors, Wal-Mart Stores e Mitsui 14 Os recurso dos doadores para as operações das Instituições Microfinanceiras estão esquematizados no Capítulor 4, Secção 4.1.4. 13

85


Muitos doadores multilaterais e bilaterais como a UNDP, o Banco Mundial/CGAP, A Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação (SDC), USAID e a GTZ promovem actualmente ‘metodologias acertadas’ na microfinança. Estas ‘metodologias acertadas’, são princípios ou procedimentos que provaram ser bem sucedidos em muitos contextos e são necessários para garantir que as Instituições Microfinanceiras operem de maneira sustentável. São ainda um importante recurso que pode ser utilizado no processo de elaboração de políticas. Nalguns países os doadores reúnem-se regularmente para trocar informação acerca dos seus programas de apoio ao desenvolvimento do sector das PME, incluindo o microfinanceiro. Estes encontros podem por vezes tornar-se avenidas eficientes para intermediar uma legislação capacitante para o nível macro.

5.5 Restrições à política sensível à dimensão de género Na generalidade, um plano governamental sensível ao género, coerente com a redução de pobreza e onde a microfinança tem um papel a representar, pode auxiliar as Instituições Microfinanceiras a operarem eficazmente. Aspectos sectoriais da política como orçamentos governamentais podem ser olhados sistematicamente através de uma perspectiva sensível ao género, conforme é demonstrado no trabalho sobre orçamentos governamentais, que tem vindo a ser feito em muitos países. Uma análise de orçamento sensível à dimensão de género é uma avaliação do impacto que o género tem sobre esse orçamento governamental. É também uma tentativa de decompor (desagregar) o objectivo final do orçamento de acordo com o seu impacto nas mulheres e homens, e em diferentes grupos de mulheres e homens (Buelender & Sharp 1998). Obviamente, é mais fácil defender uma estratégia de redução de pobreza sensível ao género do que implementá-la, pois existem muitas restrições. Os governos têm que fazer frente a restrições em termos orçamentais nos diversos sectores. Também têm que fazer face a restrições devido à situação económica em que estão a governar. Restrições económicas em muitos países originaram cortes orçamentais em subsídios para as instituições financeiras rurais traduzindo-se numa maior confiança nas estruturas relacionadas com os mercados. O papel crescente do governo na microfinança consiste em facilitar e catalisar, e ao mesmo tempo utilizar o apoio do sector privado. No entanto, os governos têm que tomar consciência das restrições relacionadas com o género global que afectam o acesso ao Mercado, a entrada e participação de grupos sociais diferentes numa economia e as restrições que as Instituições Microfinanceiras têm que enfrentar como resultado das suas políticas.

5.5.1 Restrições que as mulheres tem que enfrentar devido às políticas insensíveis ao género As restrições que as mulheres e homens com baixo rendimento têm que enfrentar, têm que ser examinadas cuidadosamente de forma a determinar quais são as que podem ser resolvidas pelos governos e quais as que têm que ser deixadas para o sector privado. Por exemplo, os empresários podem ter pouco controlo sobre os preços, mercados e matérias primas. Um estudo de pequena escala de uma industria de tecelagem e de redes no Brasil concluiu que muitos pequenos produtores com capacidades, não tinham acesso às matérias primas, o que era uma restrição mais incapacitante do que o seu acesso à formação (Mayoux, 1995). Se os estrategas souberem quais as restrições para os empresários masculinos e femininos, então será mais fácil integrar uma política microfinanceira que responda favoravelmente ao género. Algumas das restrições que os macro estrategas deverão ter em conta, e quais particularmente afectam as mulheres

86


ou empresários mais pobres, encontram-se esquematizados de seguida15. No entanto, não é apenas suficiente tomar conhecimento dessas restrições, é necessário tomar medidas. Acesso aos mercados: Dependente da mobilidade social das mulheres, a distância para os mercados pode ser uma restrição. Devido às responsabilidades do agregado e educação dos filhos, a conveniência dos tempos de mercado pode afectar a capacidade das mulheres para vender os seus produtos. A disponibilidade de transporte a preços competitivos para os mercados afecta tanto homens como mulheres, bem como o acesso à informação de mercado. A exclusão das mulheres dos mercados nalguns países como o Bangladesh é uma restrição à sua produtividade. Estratégias inclusivas para ultrapassar as restrições do acesso das mulheres aos mercados rurais podem ser o método simples mais eficiente para aumentar o seu controlo sobre os serviços financeiros bem como expandirem a sua presença pública e autoconfiança.

Quem controla o acesso aos mercados? (fonte: IIRR 1998)

Entrada e participação nas actividades micro-empresariais: A maneira como um fornecedor/fornecedora pode colocar no mercado as suas mercadorias, pode ser um factor restritivo para pequenos empresários. Por exemplo, os compradores podem aceitar apenas consignações de um determinada quantidade, ou aceitar quantidades menores a um preço unitário mais baixo. Pequenos produtores com excedentes de mercado irregulares, ou em pequenas quantidades, ou sem a mobilidade necessária para ir ao mercado regularmente, têm que fazer frente a um custo de transacção comparado com os outros produtores. Numa perspectiva macro-política, muitos das mercadorias focadas para aumentar a produção são feitas por mulheres, mas devido aos elevados custos de transacção, os incentivos de preços não alcançam os trabalhadores, e os proveitos vão para os intermediários. Restrições salariais: Disparidade salarial entre homens e mulheres não pode ser sempre explicada pelas suas diferentes tarefas ou actividades produtivas. Os salários das mulheres reflectem muitas vezes uma avaliação sociocultural mais baixa atribuída ao seu trabalho e é também uma restrição. Por outro lado as mulheres têm um impedimento adicional na participação laboral devido às responsabilidades familiares. Isto é significativo em termos de taxas de participação de força laboral ‘oficial’. Propriedade dos activos e dos capitais: Conforme referido noutros Capítulos, muitos países têm políticas que requerem garantias colaterais para empréstimos das agências governamentais, que usualmente preferem terras como garantias. Isto pode causar uma incapacidade especial nas mulheres, sobretudo em países onde elas não têm direito a herdar ou possuir terras. Tal é o caso de África e da Ásia. Mesmo quando as mulheres herdam terras podem ter dificuldade em obter a prova legal da sua posse, conforme é solicitado pelos bancos. Mulheres com baixo 15

As restrições que afectam as mulheres nas suas actividades diárias são esquematizadas no Capítulo 5, Secção 5.5.2.

87


rendimento podem achar difícil encontrar documentos através dos órgãos de registo de propriedade. Tipicamente não estão familiarizadas com os procedimentos legais e não estão à vontade quando têm que lidar com burocratas masculinos. Existem mais mulheres iletradas do que homens e sem conhecimentos para preencher formulários. Podem não ter o dinheiro suficiente para pagar comissões ou para subornar oficiais corruptos. Frequentemente não conseguem ter dispensas para ir repetidamente às agências. Tais ‘estrangulamentos’ burocráticos representam um dos maiores problemas para os clientes da microfinança, sobretudo para as mulheres (Women’s World Banking, 1994) Disparidades em níveis de educação: Cerca de 565 milhões de mulheres no mundo são iletradas, sobretudo em áreas rurais pobres. Estas mulheres não conseguem assinar o seu nome nem preencher formulários de candidatura. A sua falta de ensino em muitos casos incapacita a sua forma de ganhar dinheiro e de ter acesso aos serviços financeiros. O insucesso da educação destas mulheres quando crianças é resultado de uma variedade de factores, incluindo a necessidade das raparigas trabalharem em casa, atitudes que desvalorizam a educação das raparigas, receio sobre a segurança das raparigas fora de casa, e falta de recursos para pagar a educação. Investigações demonstraram que a educação das raparigas oferece muitos benefícios (Haddad e Smith, 1999). Um dos papéis do governo é a planificação de uma política eficiente que permita ultrapassar as restrições com a educação das mulheres.

5.5.2 Restrições que as instituições de microfinança tem que encarar devido à política Os Intermediários Microfinanceiros podem enfrentar um determinado número de restrições do nível político. Por exemplo podem frequentemente não ser capazes de melhorar as suas operações como resultado de políticas desfavoráveis. A política macro económica aplica-se a assuntos monetários, taxas de câmbio e política fiscal. Tais políticas podem tem um impacto diferente sobre o género, devido à forma como a economia é estruturada e os papeis dos homens e mulheres na economia. As políticas do governo relacionadas com a microfinança não podem ser examinadas isoladamente, porque em termos do seu impacto nas mulheres e homens, em assuntos relacionados com a política como o analfabetismo por exemplo, são necessárias para aproveitar as oportunidades que são oferecidas. Por exemplo o acesso à formação em gestão de activos e planificação de negócio deverá ser disponibilizado e observado com mais destaque de forma a ser acessível para homens e mulheres. A política também está associada a reformas legais (contratos e posses de terras), necessárias para que as mulheres e homens tenham as mesmas oportunidades, e as matérias regulatórias se exerçam ao nível das garantias colaterais e substitutos dos empréstimos. Outras restrições que as Instituições Microfinanceiras têm que encarar, ao nível do governo, tem a ver com as melhorias de infra-estruturas rurais que podem ser exigidas para que os clientes tenham acesso ao mercado e conforme tem sido ilustrado, em muitos países, tanto as mulheres como os homens têm necessidades distintas de infra-estruturas e de transportes. Outras limitações gerais, em termos de expansão e devido ao ambiente global macro-económico são esquematizadas de seguida: Restrições Macro-económicas: Elevadas taxas de inflação questionam o verdadeiro valor dos fundos capitais e reduzem o verdadeiro valor do pagamento de juros sobre empréstimos. Como resultado, as Instituições Microfinanceiras têm que imputar a taxa de inflação aos clientes, através da cobrança de elevadas taxas de juros ou reduzir o prazo dos seus empréstimos. Além disso, os clientes recusam-se a poupar em tempos de grande inflação, e durante estes períodos, as Instituições Microfinanceiras limitam por vezes os seus serviços, a acções de formação relacionadas com os negócios.

88


Restrições às ONGs que trabalham com instrumentos microfinanceiros: Regulamentações que proíbem a mobilização de fundos e tectos impostos pelo governo, sobre o tamanho dos empréstimos que as ONGs podem fazer para clientes com baixo rendimento, tectos sobre taxas de juro que elas podem cobrar aos devedores, e a recolha de fundos que podem receber de fontes externas. O Women’s World Banking compilou uma lista de políticas relacionadas com restrições baseadas num inquérito que foi conduzido junto das suas Instituições Microfinanceiras afiliadas (Women’s World Banking, 1994). Algumas das restrições que foram apontadas no referente a políticas do governo são esquematizadas de seguida, sendo necessário considerar como tais restrições podem ter um impacto diferencial no género. -Regulamentações governamentais proibindo a mobilização de fundos das ONGs -Percepção governamental que as ONGs competem com os seus programas -Tectos governamentais sobre o tamanho dos empréstimos das ONGs -Tectos governamentais sobre as taxas de juro que as ONGs possam cobrar -Restrições governamentais sobre os financiamentos que as ONGs possam receber de agências externas -Elevadas taxas de inflação -Políticas monetárias restritivas limitando os fundos emprestados pelos bancos

5.6 Rumo às políticas sensíveis ao género : aproveitando as oportunidades Por forma a aumentar as oportunidades de políticas microfinanceiras sensíveis ao género, podem ser levadas a cabo determinadas acções. Uma variedade de instrumentos e recursos são fornecidos nos Apêndices para analisar as oportunidades dos processos de elaboração de políticas sensíveis ao género. Estas incluem: Análise de ligações políticas para aumentar a sensibilidade de género: Os enquadramentos políticos devem ser analisados em termos de orientação para um nível de campo mais alargado. Por exemplo, as questões devem ser formuladas sobre como as diferenças do género em leis de heranças, leis de divórcio e direitos de propriedade afectam a capacidade das mulheres para desenvolver pequenas empresas; como enquadramentos legais podem facilitar os vendedores ambulantes noutros assuntos, particularmente em países onde a maioria dos vendedores ambulantes são femininos. Uma forma útil de observar os recursos e restrições do ponto de vista de como a política se associa às Instituições Microfinanceiras e em última análise ao nível do cliente (campo) é considerar a forma como os seus assuntos estão associados. Enfatizando a interdependência entre assuntos em diversos níveis torna possível diagnosticar onde os problemas sobre implementação de políticas irão provavelmente acontecer e a que níveis os problemas deverão ser tratados. O Apêndice A5.4 pode ser utilizado para examinar como as políticas se ligam às Instituições Microfinanceiras e por último ao nível do cliente. No Capítulo 3, deverão ser examinados os elos de ligação em conjunção com as restrições particulares que as mulheres com baixo rendimento têm que enfrentar com respeito aos serviços financeiros. Incentivar análises orçamentais sensíveis à dimensão de género Aprender com as experiências de orçamentos governamentais desenvolvidos a pensar numa abordagem sensível ao género que existem em diversos países (por exemplo Austrália, África do

89


Sul, Moçambique, Tanzânia, Sri Lanka e Barbados). Elson (em Buelender e Sharp 1998) sugeriu uma variedade de instrumentos diferentes16 que pode ser utilizada para uma análise sensível à dimensão de género dos orçamentos governamentais. As suas sugestões incluem: -Avaliação de políticas sensíveis ao género -Avaliações dos beneficiários desagregadas por género -Análise da incidência de despesas públicas desagregadas por género -Análise de taxas de incidência desagregadas por género -Análise desagregada por género do impacto orçamental no tempo de utilização -Enquadramento de políticas económicas sensíveis ao género a médio prazo -Demonstrações orçamentais sensíveis ao género Incentivar a implementação de políticas sensíveis à dimensão de género: As políticas que governam as actividades empresariais sensíveis ao género e as operações microfinanceiras podem alterar a sua ênfase à medida que se movem através da burocracia. Na generalidade, é através de intermediários que as políticas são implementadas, tais como: bancos; instituições microfinanceiras; ONGs; governos locais; tribunais de primeira instância; polícia; departamentos de bem-estar social e Ministérios da Justiça. Os decisores políticos podem evitar a responsabilidade da implementação prática ‘na base’. Podem imputar as culpas mais nos factores administrativos do que nas motivações políticas, se a política não for bem sucedida. O Apêndice A5.5 lista alguns assuntos que podem ser tomados em conta em relação à implementação de políticas microfinanceiras sensíveis ao género. Assegurar que a implementação de políticas seja ligada às actividades empresariais ao nível de campo: Ao nível do cliente, com excepção de uma política microfinanceira global sensível ao género, são exigidas pelo governo, políticas específicas de forma a assegurar que exista um espírito empresarial entre mulheres e homens, o que irá conceder aos governos uma oportunidade de fomentar o crescimento. As questões no Apêndice A5.6 podem ser utilizadas como ponto de partida para considerar os tipos de acções e políticas que irão influenciar as actividades micro empresariais ‘na base’. As políticas deverão ser desenvolvidas de forma a facilitar ambos os clientes masculinos e femininos. Associar explicitamente a implementação de políticas às operações das Instituições Microfinanceiras: No Capítulo 4, examinamos os Intermediários Microfinanceiros em detalhe. Os decisores políticos no entanto, podem utilizar as questões no Apêndice A5.7 como ponto de partida para avaliar a forma como os Intermediários Microfinanceiros implementam as suas políticas, quais são as que utilizam e se eles estão a operar dentro do plano de desenvolvimento global nacional. É importante associar explicitamente a implementação de políticas às operações das Instituições Microfinanceiras.

Facilitar a utilização de redes de trabalho (networking) em assuntos políticos: Se as políticas microfinanceiras não existirem em determinado país, há diversas medidas associadas a redes de trabalho que podem ser tomadas de forma a pesquisar exemplos de políticas eficientes. O Apêndice A5.8 sintetiza alguns métodos que facilitam a utilização de redes de trabalho em assuntos políticos. O Capítulo 4, Secção 4.6.2 também tem algumas sugestões sobre a forma como as próprias Instituições Microfinanceiras podem fazer lobby para a alteração de políticas

16

Para informação mais detalhada sobre como funcionam na prática os orçamentos desagregados do género e exemplos de tais análises deverá ligar-se a: http://www.thecommonwealth.org/género / ou http://www.unctad.org/en/docs/poldcm74.en.pdf

90


Análise Sócio-Económica e de Género FAO (ASEG)

Instrumentos sócio-económicos para a análise das questões de género nas actividades microfinanceiras

APÊNDICES Este conjunto de apêndices fornece uma variedade de instrumentos e recursos para conduzir uma análise sócio-económica e das questões de género das actividades microfinanceiras nos níveis de Campo (Capítulo 3), Intermédio (Capítulo 4) e Macro (Capítulo 5). Cada um dos apêndices é comentado no texto do Capítulo apropriado, que fornece um fundo de trabalho, facilita sugestões e contextos relativos ao uso de cada um dos instrumentos ou recursos.

91


INSTRUMENTOS AO NÍVEL DE BASE (CAPÍTULO 3)

Apêndice A3.1: Identificação de partes intervenientes

A3.2 1: Questões para a identificação de partes intervenientes Pedir aos participantes que enumerem os grupos e organizações locais que funcionam com

créditos e poupanças e quaisquer bancos na área (RoSCAS/Tontines/Susus).

Perguntar quem participa em cada grupo de crédito ou de poupança, e quem usa que bancos. Os pobres são excluídos de algum dos grupos locais? Quais? Porquê? Algumas das instituições são essencialmente para homens? Se sim, qual é o seu lucro? O que

é que perdem se não participarem?

Estes grupos são exclusivamente para mulheres? Se sim, qual é o seu lucro? O que é que

perdem se não participarem? ,

Quais são os elos entre os grupos ou organizações locais e as instituições externas? Quais são as necessidades de investimento, de crédito e de poupança para cada grupo de

intervenientes?

92


Apêndice A3.2 Categorias das partes intervenientes

A3.2.1: Pirâmide das categorias dos clientes intervenientes (Remenyi, 1997)

Operadores de Microempresas, que podem empregar outros Trabalhadores independentes pobres, Que produzem para o mercado Trabalhadores pobres que vendem a sua produção no mercado ou a utilizam como produção de subsistência Os mais pobres dos pobres, vulneráveis, velhos, crianças, doentes, algumas grávidas ou mulheres solteiras, viúvas O seu rendimento não é suficiente para suprir a sua sobrevivência.

93


Apêndice A3.3: Enquadramento da classificação dos serviços financeiros na perspectiva dos aldeões

A3.3: Serviços financeiros – Exemplos na perspectiva dos aldeões17

Serviços financeiros

Fundações e objectivos

Credores

2 Famílias com longa Intimidação directa história de empréstimos de Pressão da sociedade dinheiro

Fornecedores sementes

deDesconhecidos – Grande companhia da capital com sucursais na aldeia mais próxima

Gestão

Resistência

Problemas por utilizar estes serviços financeiros

Fácil acesso, na comunidade Elevadas taxas de juro Conhecem toda a gente Em caso de incumprimento, não podem voltar a solicitar novos empréstimos

Representantes de vendas das Podem comprar as sementes Apenas podem comprar uma cidades que vestem fatos a crédito, e pagá-las quando variedade de cultivo, se elegantes – falam um dialecto tiver sido feita e vendida a houver alguma doença ou diferente e muitas vezes colheita seca, tudo estará perdido reportam aos seus chefes (monoculturas) para a tomada de decisões

União Nacional das Mulheres(ONG)

O esquema de crédito organizado pelo Estado começou em 1991, através da União Nacional das Mulheres

Bancos de Agricultura

Dirigido pelo Estado – 20 Hierárquico anos de actividade. Fornece crédito e conselhos aos agricultores

Está disponível para as gentes locais. Taxa de crédito mais baixa do que a dos agiotas Podem colocar os proveitos das colheitas em contas de depósito a prazo

É dominado pelos homens, têm funcionários masculinos. As mulheres não os utilizam na realidade (a não ser que sejam viúvas). Necessitam de empréstimos maiores ou precisam ser grandes agricultores para abrirem uma conta

Instituição de Microcrédito

Começou por ser uma ONG Opera autonomamente como internacional, fundada há Instituição Microfinanceira. dois anos com fundos de Utiliza metodologia de grupos doadores bilaterais. Acabou solidários de mulheres e de se transformar em ONG poupanças voluntárias. local.

Gestão e empregados empenhados profissionalmente. Beneficia de ‘metodologias acertadas’ e de exposição a outros programas microfinanceiros realizados pela ONG internacional que lhe deu origem. Já alcançou sustentabilidade operacional. Empregados amistosos que estão dispostos a ir ao encontro dos clientes nos sítios mais convenientes para eles.

A carteira esta a aumentar mais rápido do que o capital de empréstimo. Já se candidatou a um novo subsídio mas não tem a certeza de o obter. Os clientes não podem solicitar créditos tão frequentemente como desejariam (grande lista de espera)

Grupos de crédito e de Cada aldeia tem um representante da UNM, que poupança de mulheres frequentemente é a mulher do adquiriram máquinas de chefe da aldeia. O costura e começaram a representante é o responsável fabricar vestuário para pelo esquema vender na vila

Apenas as mulheres que não tinham trabalhos pesados no campo tinham tempo para costurar, Tendência para convidar mulheres mais ricas a participar Todas fabricaram o mesmo tipo de vestuário o que originou a descida dos preços

17

Enquadramento dos perfis institucionais adaptado do ASEG Manual de Campo (Wilde, 1997). Os conceitos foram originados em trabalhos dos autores na Albânia, Arménia, República Dominicana, Tailândia, RDP do Laos, Filipinas, Rússia, etc..

94


Apêndice A3.4: Questões iniciais para os clientes intervenientes

A3.4: Questões iniciais para os clientes intervenientes (stakeholders) As pessoas economizam, e de que forma? Como e quando economizam dinheiro? Qual a sua relação com os sistemas financeiros locais (RoSCAS/Tontines/Susus

cobradores de depósitos, agiotas) e como é que elas os entendem?

Como é que os serviços financeiros as podem ajudar? Os serviços que elas gostariam de receber diferem daqueles que elas pensam que os

seus maridos/mulheres ou o resto das suas famílias gostariam de receber?

Qual é a variedade dos serviços financeiros que conhecem e que estão à disposição?

Têm acesso a estes?

Quem fornece estes serviços, que tipo de estruturas? Existem alguns serviços de apoio disponíveis tais como fornecedores de acções de

formação empresarial?

Qual é a percepção dos homens em relação ao papel das mulheres e vice-versa nas

áreas financeira e económica?

95


Apêndice A3.5: Matrizes de rendimento e de despesa

Apêndice A3.5: desenvolvendo matrizes de rendimento e receita (Wilde, 1997) 1.Na área alvo, organizar dois ou três grupos alvo, misturar grupos sócio-económicos, homens e mulheres, velhos e novos. Trabalhar cada grupo individualmente. Explicar que deseja compreender como é que eles conseguem dinheiro e onde o gastam. 2.Comece por pedir ao grupo que enuncie as suas fontes de rendimento. Comece a desenhar uma matriz no chão, ou numa folha grande de papel, indicando cada fonte de rendimento através do eixo horizontal. O grupo pode querer seleccionar gravuras ou símbolos para representar cada categoria. 3.Recolha 50 pedras. Explique que estas representam o rendimento global anual de toda a comunidade. Peça aos participantes para dividirem as pedras de acordo com a sua riqueza/rendimento, com uma pessoa representando cada grupo sócio-económico e tendo uma parte das 50 pedras, conforme discutido e aceite de um modo geral pelo grupo. 4.É pedido ao representante de cada grupo sócio-económico que fique junto do eixo vertical com a sua proporção de pedras. Por outras palavras, o eixo vertical pode incluir um representante para as mulheres ricas, mulheres pobres, homens ricos, homens pobres. A cada um por sua vez é solicitado que distribua as suas pedras na matriz para indicar as suas fontes de rendimento – colocando um grande número de pedras debaixo da maior fonte de rendimento, poucas pedras debaixo de fontes de rendimento mais baixas, e nenhuma pedra se não fizerem dinheiro nessa fonte específica. Isto é executado, em debate com os seu companheiros participantes, até as pedras estarem todas distribuídas. 5.Registe a matriz – contando todas as pedras para cada fonte de rendimentos de cada grupo sócioeconómico. 6.Agora peça aos participantes para enumerarem as suas despesas, incluindo as poupanças. Altere o eixo horizontal da matriz para representar cada categoria de despesas. Novamente poderão ser desejadas gravuras ou símbolos. 7.Peça ao representante de cada grupo sócio-económico que recolha as suas pedras (o mesmo número que cada um utilizou para a matriz de rendimento) e que as distribua para demonstrar como foi gasto o seu dinheiro. 8.Gravar a matriz – contando todas as pedras para cada despesa de cada grupo sócio-económico. 9.Finalmente, simular uma crise relevante (peste nas colheitas, seca) e peça a cada um dos representantes para retirar diversas pedras da matriz para demonstrar como é que obteriam o dinheiro para a enfrentar. Discuta o impacto da crise e as estratégias que os diversos participantes têm para ultrapassá-la. 10.Registe de onde foram retiradas as pedras para ultrapassar a crise. Nota: O momento mais sensível é quando pede aos participantes para concordar com o número de pedras que cada

96


representante de cada grupo sócio-económico deve ter. Mas usualmente isto também funciona bem porque o rendimento individual não é revelado – Apenas quantias relativas entre um grupo e outro.

Ao longo do processo, as seguintes questões também devem ser colocadas Existem muitas ou poucas fontes de rendimento na comunidade? Quais são as mais importantes? Qual a vulnerabilidade destas fontes de rendimento em caso de crise? Por exemplo seca ou doenças? Alguns dos grupos sócio-económicos têm meios de subsistência mais vulneráveis do que outros? Por outras palavras, algumas pessoas dependem apenas de uma ou duas fontes de rendimento, enquanto outros têm fontes diversificadas? Existem fontes de rendimento disponíveis para determinados grupos, como por exemplo, velhos, ricos, grupos de castas mais importantes, que não estejam disponíveis aos outros – mulheres jovens, mais pobres, grupos de castas inferiores? Como são comparadas as fontes de rendimento das mulheres e dos homens? Poupanças Onde é que as pessoas colocam o dinheiro excedente? Em animais, jóias, bancos? Que tipo de sistema de poupanças as pessoas gostariam de ter? Qual a importância de poder ter acesso às poupanças? Matriz de Despesas As despesas são poucas e concentradas ou espalhadas em diversos tipos de consumo? Quais são as despesas mais comuns para a maior parte das pessoas? Para cada grupo social, qual a proporção que é destinada a suprir as necessidades básicas - alimentação, água, habitação, vestuário, cuidados sanitários e educação? Para cada grupo social, qual é a proporção de rendimento que é aplicada em poupanças, e investimentos produtivos? Exemplo, entradas (inputs), equipamento, animais? Como são comparadas as despesas das mulheres com as dos homens? Como é que grupos sociais diferentes da aldeia se comparam a outros grupos em termos de despesas? Para ultrapassar uma crise, onde é que as pessoas gastariam menos? – actividades de ócio, vestuário, pagamentos escolares, carne, outra alimentação?

97


Apêndice A3.6: Recursos (cartões descritivos)

Apêndice A3.6: Exercício para ser utilizado com os clientes (recorrendo a cartões descritivos ) para determinar os recursos relevantes para as actividades empresariais propostas Desenhe nos cartões descritivos imagens dos recursos relevantes necessários para uma

actividade específica de produção de rendimento que tenha sido proposta. Por exemplo: dinheiro; matérias primas, uma tecnologia específica que traga valor acrescentado para a material prima, técnicas ou conhecimentos de como acrescentar valor aos recursos, conhecimentos de Mercado, transportes para o Mercado, acesso a uma banca no mercado,

Coloque três desenhos grandes, um com um homem, outro com uma mulher e outro com ambos,

no chão em fila com espaço adequado entre cada um deles. Debaixo destes desenhos espalhe os cartões com as imagens dos recursos. Inclua alguns cartões em branco para as pessoas poderem adicionar mais recursos se acharem necessário.

Peça aos presentes para ordenar os cartões debaixo dos desenhos grandes, dependendo de

quem usa o recurso, se homem, mulher ou ambos. Facilite o debate entre os participantes acerca das suas escolhas. Especifique que apenas os recursos que são utilizados ou controlados a 50-50% pelos homens e mulheres são colocados debaixo do desenho de ambos, caso contrário deverão ser colocados debaixo da mulher ou do homem para indicar quem tem o uso maioritário ou o controlo.

De seguida coloque o segundo conjunto de desenhos e cartões no chão, junto do primeiro

conjunto. Repita o exercício mas nesta altura focando quem tem o controlo, a posse ou o poder decisório referente a cada recurso. Novamente, promova o debate entre os participantes sobre as escolhas que fizeram.

Peça aos presentes para compararem a forma como organizaram os dois conjuntos de cartões

descritivos de recursos.

Repita com outros grupos, se necessário, e compare.

98


Apêndice A3.7: Características do empréstimo rural (adaptado da FAO pelas autoras, 1999) Apêndice A3.7: Características exclusivas dos empréstimos rurais Quantos assuntos abaixo mencionados dizem respeito aos seus clientes? Restrições em relação à agricultura e finança rural Económicas

Ao nível individual e do agregado

Institucionais

Ambientais

Demográficas

Socioculturais

Devido ao contexto nacional

Ocorrem frequentemente Custos adicionais elevados para Baixa disciplina de intervenções estatais em amortização em esquemas os devedores e custos de mercados financeiros de créditos financiados oportunidade elevados (ex.: rurais externamente perda de tempo laboral), custos de transportes, Volume de negócios reduzido As intervenções estatais em subornos, taxas na carteira de empréstimos termos de movimentação de empréstimos podem ter criado uma ‘falsa’ atitude perante os serviços financeiros Os subsídios para colheitas A agricultura é um sector Colheitas específicas são politicamente sensível específicas na forma de feitas por causa das sementes, empréstimos, e potenciais ofertas de aconselhamento flutuam de exportação acordo com a colheita que está a ser promovida na altura Os empréstimos agrícolas Gestão e supervisão de Os agricultores têm estão dependentes do redes das sucursais dos dificuldade em nitidamente relacionamento entre o bancos rurais demasiado demonstrar a posse legal dos Ministério da Agricultura e onerosa activos o da Finança Problemas com a aplicação de contratos legais Infra-estruturas de A sazonalidade da agricultura – A sazonalidade dos comunicação e de empréstimos e das demasiado ocupada com as transportes pouco colheitas nalgumas alturas do amortizações afecta os desenvolvidas nas áreas intermediários ano e apenas requerendo rurais serviços financeiros noutras alturas Incentivo para uma Elevados custos das Os agricultores têm que agricultura intensiva em transacções financeiras percorrer grandes distâncias novas zonas de colonização devido à dispersão para alcançarem os geográfica dos clientes intermediários financeiros Os agregados familiares das A agricultura é mais Os agregados familiares das quintas são heterogéneos e entendida como ‘uma forma quintas são unidades de vida’ do que um negócio frequentemente existe integradas de produção e pouco conhecimento acerca consumo e o dinheiro emprestado pode ser utilizado da sua constituição para consumo, educação, seguros sociais, para objectivos de produção e de investimento Os trabalhadores das terras têm poucos activos físicos

Políticas

Ao nível intermédio

agrícolas ao longo do ano

99


Apêndice A3.8: Restrições que as mulheres enfrentam em relação aos serviços financeiros Apêndice A3.8: Restrições gerais que as mulheres enfrentam em relação aos serviços financeiros18 As suas clientes também enfrentam restrições semelhantes? Restrições que as mulheres podem ter que enfrentar

Ao nível individual e do agregado

Ao nível intermédio

No contexto nacional

Económicas

As mulheres são mal pagas Os sectores invisíveis da As mulheres tendem a para trabalho igual economia estão sujeitos à trabalhar nos sectores As mulheres são confinadas a sobre-exploração invisíveis da economia; ou seja o trabalho esporádico, As mulheres podem não ter trabalhos mal pagos o direito próprio ao acesso Falta de acesso aos mercados por tarefas, sazonal, feito se a mobilidade for restritiva aos bancos/serviços em casa Percepção dos homens como financeiros Alguns grupos empreendem controladores do dinheiro actividades que produzem /empréstimos baixo reembolso As mulheres têm uma pesada carga de trabalho doméstico que não é pago – os seus papéis múltiplos não são reconhecidos

Políticas

As mulheres e homens não As mulheres podem não ter As mulheres têm falta de repartem equitativamente direitos legais aos activos da confiança para reclamar o poder e a autoridade nas família por conseguinte não direitos legais e políticos podem utilizá-los como instituições As mulheres têm falta de garantias colaterais capacidade de liderança e de O ambiente de negócio As mulheres têm falta de influência de conhecimentos global é hostil para as posições políticas para mulheres As mulheres tendem a ter estabelecer /influenciar as uma fraca posição negocial e leis apropriadas devido a isto trabalham As mulheres não têm direitos frequentemente em sectores legais à terra nem invisíveis. Tendem a estar tradicionais nem oficiais isoladas e desorganizadas As Instituições religiosas Com excepção do acesso ao Os sindicatos podem não crédito, as mulheres não têm reconhecer as pessoas que opõem-se à capacitação das mulheres meios para formação, saúde e trabalham nos sectores Procedimentos institucionais invisíveis da economia aconselhamento. como potenciais membros. nacionais requerem atrasos As mulheres tendem a ter burocráticos para a aprovação Por exemplo o trabalho problemas no acesso à esporádico, por tarefas, educação. A educação das de empréstimos sazonal, feito em casa raparigas não é prioritário, por conseguinte as mulheres Muitas agências de são frequentemente deficientes na contabilidade implementação

Institucionais

18

Adaptado de Johnson, 1999

100


tecnicamente competentes têm pouca ou nenhuma experiência no aumento do nível de participação das mulheres no seu trabalho Os empréstimos de alguns Os governos estão a chegar à Os recursos naturais conclusão que é impossível intermediários têm utilizados para actividades separar assuntos de cláusulas que a actividade geradoras de rendimento não deve lesar o ambiente. desenvolvimento dos assuntos (como a madeira e o bambu) ambientais. Por causa desta Algumas actividades estão a rarear interdependência, a gestão de geradoras de rendimento A escassez da água significa recursos naturais está a perderam a sua que as mulheres têm que fazer parte da tomada de preferência para os fazer percursos mais longos decisões económicas estabelecimentos para obtê-la e por comerciais devido às conseguinte têm menos consequências ambientais tempo para as actividades geradoras de rendimento. e em conhecimentos profissionais de gestão e têm pouco tempo disponível para formação

Ambientais

Sociocultural

Demográficas

A mobilidade das mulheres é Os bancos e as instituições Os assuntos e restrições das mulheres não são constrita às normas sociais financeiras não vêm as considerados como mulheres como um As mulheres têm pouca autoprioritários ao nível da mercado potencial, as estima e podem ter política nacional actividades empresariais dificuldades em valorizar o das mulheres são seu próprio trabalho consideradas hobbies As mulheres têm que A propaganda sobre as equilibrar os seus papéis fontes de crédito e os múltiplos, mães, produtoras de economia e trabalhadoras processos de candidatura podem não alcançar as comunitárias mulheres As mulheres vêm os banqueiros como pessoas poderosas e importantes A linguagem do comércio pode ser confusa As mulheres podem não querer correr riscos As mulheres podem ser demasiado modestas e não muito boas a comercializar as suas capacidades Migração em larga escala das Não existem bancos As mulheres têm maior responsabilidade na educação suficientes per capita, não áreas rurais para as urbanas, por conseguinte menos existem bancos das crianças pessoas para servir nas áreas suficientes em áreas rurais; os decisores políticos remotas ou pobres, por não pensam que estas áreas conseguinte as mulheres necessitam de serviços têm que viajar para ir aos financeiros bancos

101


Apêndice A3.9: Orientações para preparar e facilitar as reuniões entre partes intervenientes

Apêndice A3.9: Sugestões suplementares para preparar e facilitar as reuniões das partes intervenientes (stakeholders) Os convites deverão ser preparados bem antecipadamente. Os representantes das partes

intervenientes (stakeholders) podem ser visitados anteriormente e serem-lhes explicados os objectivos e procedimentos das reuniões, com possíveis lembretes de discussão, por forma a ter a participação dos aldeões (incluindo as mulheres), O chefe da aldeia deverá ser consultado previamente. Explicar claramente quem deve participar de forma a que grupos específicos não sejam excluídos

Os potenciais doadores que financiam as iniciativas microfinanceiras também devem ser

consultados e convidados

A tónica das contribuições de cada um dos representantes dos grupos intervenientes

(stakeholders) acerca das seus pontos de vista deverá ser formulada antecipadamente

Os planos de acção preliminares para os lembretes deverão ser delineados durante a reunião Deverão ser delineadas propostas para operações microfinanceiras Pequenas implementações de forças de intervenção podem ser criadas (Kienzle, 1999)

Reuniões de partes intervenientes (fonte: IIRR 1998)

102


INSTRUMENTOS DO NÍVEL INTERMÉDIO (CAPÍTULO 4) Apêndice A4.1: As categorias de partes intervenientes no nível intermédio – Diagrama da abordagem de Venn.

A4.1 Diagrama de Venn dos partes intervenientes (stakeholders) 1. Anotar todos aqueles que podem ser directa ou indirectamente afectados pelas operações microfinanceiras. Questione sobre a expectativa que as partes intervenientes (stakeholders) têm dos programas microfinanceiros, quais os recursos que possuem que possam mobilizar e que grupos de intervenientes têm mais poder e posição social. Pergunte quais as partes intervenientes que têm mais poder de influência sobre as actividades microfinanceiras e porquê. Tente compreender qual a importância que um grupo específico de intervenientes pode ter para o sucesso das operações microfinanceiras. Inclua partes intervenientes indirectas (por exemplo os doadores, as famílias dos empresários, etc.). Tente perceber se grandes grupos de intervenientes podem ser divididos em grupos mais pequenos, e também que grupos se posicionam na vanguarda para lucrar mais do que os outros. 2. Classifique estes grupos individuais, organizações e instituições. Os círculos representarão cada grupo de intervenientes. O tamanho do círculo representa a dimensão (alcance) do interesse dos intervenientes nas actividades microfinanceiras propostas ou qual a importância que os serviços prestados tem para esse grupo: - Se tiverem um grande interesse, utilize um círculo grande - Se tiverem um interesse médio, utilize um círculo médio - Se tiverem um interesse reduzido, utilize um círculo pequeno 3. Represente as Instituições Microfinanceiras no centro da página. Arranje os círculos dos intervenientes dentro ou à volta das Instituições Microfinanceiras por forma a indicar a associação com as Instituições Microfinanceiras e o alcance do seu interesse. Faça os círculos tocar se a informação passar de uns grupos de intervenientes para outros, uma pequena sobreposição significará que existe alguma cooperação e comunicação, uma grande sobreposição indicará que os grupos cooperam e se os círculos não se tocarem então não existe contacto.

103


Exemplo do Diagrama de Venn das Partes intervenientes

Outras Instituições Microfinanceiras

Doadores Locais/Externos

Produtores Fornecedores

Agiotas

Instituições Apoio de redes de para as Microfinanceiras trabalho Instituições Microempresários masculinos Familiares de clientes

Microempresários femininos

Microfinanceiras

Fornecedores de Bases de Dados de Serviços

104


Apêndice A4.2: Matriz de avaliação dos riscos, da influência e importância dos partes intervenientes A4.2: Exemplos dos ‘riscos’, influências e importância das partes intervenientes

Grupos intervenientes

Exemplos de assuntos típicos relacionados com: ‘importância’ em relação às operações microfinanceiras

O seu intermediário •Garantir os fundos dos propondo novas doadores actividades •Garantir elevadas taxas de microfinanceiras amortização •Realização dos objectivos

Classifique o efeito dos novos serviços microfinanceiros nos seus interesses

+

Importâncias das partes intervenientes para o sucesso das operações microfinanceiras

Classe de influência das partes intervenientes sobre as operações microfinanceiras

D 1 2 3 4 5

D 1 2 3 4 5

=desconhecido = pequena/sem importância = alguma importância = importância moderada = muito importante = papel crucial

= = = = = =

desconhecida pequena/sem influência alguma influência influência moderada influência significativa muito influente

5

5

3

4

+

•Controlo sobre os recursos e actividades Bancos de •Podem colidir com alguns dos agricultura geridos seus serviços Formalmente pelo •Inscrever o seu apoio pode ser Estado útil

-

+ 3

•Ligações ao Estado Chefes Religiosos Tradicionais Mulheres micro empresárias e outros clientes potenciais Mulheres velhas

Homens microempresários e clientes potenciais Financiadores

•Preocupações sobre a erosão dos valores tradicionais e de usura •Não têm acesso a outros serviços financeiros

•Têm mais tempo para desenvolver as actividades empresariais e mais confiança •Eles próprios clientes potenciais ou as suas mulheres ou mulheres da família •Preocupação sobre apropriação indevida dos seus clientes •Grupos de Solidariedade

Grupos de Solidariedade •Concedem créditos a baixas operando através de taxas de juro ONGs locais

-

5

4

+

5

2

+

5

2

+

5

2

-

4

3

-

4

4

105


Apêndice A4.3: Exemplos de questões utilizadas para resolver a postura das equipas em relação ao género

A4.3: Abertura das atitudes dos agentes envolvidos nas actividades microfinanceiras Concorda ou discorda? Porquê ou porque não? Os

A A

empréstimos devem ser utilizados para outros fins sem ser o da produção de activos (para ultrapassar períodos de descobertos, sazonalidade, para a reparação da casa, para amortização, etc..)

assinatura do cônjuge não deverá ser necessária literacia não deve ser um requisito para o acesso aos serviços oferecidos pela nossa Instituição Microfinanceira

Os

funcionários encarregues dos empréstimos deverão auxiliar as mulheres e outros grupos desfavorecidos que sejam iletrados ou com pouca educação a preencherem os formulários

A

localização das Instituições Microfinanceiras deve ser conveniente e segura para as mulheres

O

horário de funcionamento das Instituições Microfinanceiras deverá ser compatível com o negócio das mulheres e com as suas obrigações domésticas

A

programação da amortização dos empréstimos deverá ser ajustada de acordo com os ciclos de negócio dos clientes

Serviços

especiais de formação deverão ser criados para assistir os devedores não familiarizados com o serviço financeiro oficial

106


Apêndice A4.4: Listas preliminares para a integração da igualdade de oportunidades em todas as políticas (Mainstreaming) nas Instituições Microfinanceiras A4.4: Lista de controlo dos mecanismos para incentivar a consciencialização do género nas operações das instituições microfinanceiras

Mecanismo

VerificarComentários

Consciencialização

Políticas escritas de género nas Instituições Microfinanceiras? Extracto da missão sensível ao género? Grupos de trabalho das Instituições Microfinanceiras consciencializados para as políticas? Grupo de trabalho com formação de sensibilização quanto ao género? Direcção com formação de sensibilização quanto ao género? Implementação da política? Compromisso Plano de acção sobre o género para as actividades microfinanceiras? Complacência localizada/consequências? Estruturas administrativas no lugar? Responsabilidades definidas? Dados desagregados por sexo sistematicamente Programas reunidos para as actividades das Instituições Microfinanceiras? Disponíveis informações e directivas escritas sobre as questões de género? Capacidade para traduzir dados desagregados Análise das por sexo para dentro da análise das questões de questões de género? género Assistência técnica disponível para a análise das questões de género? Aceitação dos observadores em fiscalizarem e avaliarem os programas microfinanceiros em termos da análise das questões de género? Relatório sobre dados e assuntos relevantes quanto ao género Lições aprendidas Análise sistemática das lições aprendidas Feedback partilhado com o sector microfinanceiro. Novos conhecimentos baseados nas lições aprendidas integradas na estratégia e no planeamento das actividades (ex. Diversas Instituições Microfinanceiras utilizam entrevistas de entrada e de saída como instrumento para monitorizar o impacto da microfinança nos clientes ) (Adaptado do ISNAR, 1997)

107


Apêndice A4.5: Categorias dos dados e informações

A4.5: Categorias de dados para as Instituições Microfinanceiras Debata com os seus colegas quão útil cada categoria de informação será se for desagregada

Informação Demográfica

Fornece a base para a planificação e o desenvolvimento dos serviços microfinanceiros. A desagregação destes dados por sexo, idade, rurais-urbanos e região ajuda na identificação de potenciais clientes alvo com necessidade dos serviços microfinanceiros

Participação da Os dados sobre o emprego e trabalho são cruciais para a compreensão do papel força laboral das mulheres na produção e as suas oportunidades para produzirem activos

Educação

Informação acerca do nível educacional de homens e mulheres é necessário– tal informação é um determinador importante dos seus estatutos, a suas capacidades de acesso aos serviços financeiros, e para dirigir Instituições Microfinanceiras

Habitação e utilidades

Isto ajudará os estrategas das Instituições Microfinanceiras a estabelecerem o nível de pobreza dentro do qual as mulheres, homens e as suas famílias funcionam

Saúde e Nutrição

Se o estado da saúde é baixo, talvez os empréstimos concedidos pelas Instituições Microfinanceiras sejam mais para necessidades básicas do que para actividades empresariais

PIB per capita

Ajudará a identificar quantias de empréstimo e taxas de juros realistas.

108


Apêndice A4.6: Planificando actividades supervisionadas Caixa 4.5: Gráfico de planeamento monitorizado Desenvolva um gráfico de monitorização semelhante

O que monitorizar

Quais os registos a guardar?

Quem recolheQuem os dados? utiliza os dados e como?

Que decisões podem ser tomadas?

Pessoas Número de clientes envolvidas nas Membros por sexo actividades Composição dos grupos por sexo se microfinanceiras existirem grupos mistos Cargos de posição nas Instituições Microfinanceiras exercidos por homens e mulheres (incluindo a administração) Execução do FMI

Actividades

Custos de transacção estorno de empréstimos mobilização de depósitos sustentabilidade financeira Volume e frequência das poupanças, depósitos, cancelamentos e balanços (por sexo) Volume e frequência da tomada de empréstimos (por sexo) Amortização, pagamentos atrasados e taxas por defeito (por sexo)

Serviços de suporte

Serviços de suporte (e fornecedores) distribuídos por sexo

Alteração de Políticas

Alterações em leis relacionadas com operações das Instituições Microfinanceiras Alterações nas leis relacionadas com mulheres e grupos desfavorecidos

Resultados ou consequências

Estudos sobre a utilização de empréstimos, se os empréstimos às mulheres são transmitidos para outros membros da família Formas como os homens e mulheres estão envolvidos em fazer depósitos, tomar empréstimos e fazer amortizações

109


Apêndice A4.7: Supervisionando as alterações de rendimentos

A4.7: Monitorização relativa às alterações de rendimentos Aumento no rendimento familiar dos devedores e grupos de controlo de não-devedores Desenvolva um enquadramento para monitorizar as alterações de rendimentos semelhantes ao do seguinte exemplo Alteração no rendimento familiar dos devedores %

Alteração no rendimento familiar dos nãodevedores %

Devedores como rácio de grupo de controlo

# Tamanho da amostra Devedores

Aldeia 1 (ou família 1) Aldeia 2 (ou família 2) Aldeia 3 (ou família 3) Adaptado de Hulme e Mosley, 1996

110


Apêndice A4.8: Exemplos de indicadores A4.8: Exemplos de quantitativos e indicadores quantitativos19 Indicadores quantitativos e qualitativos Para a monitorização de programas microfinanceiros Debata com os colegas quais os indicadores que são necessários para o seu programa Indicadores quantitativos Rendimento aumentado (quantia, cash flow, sazonalidade) e bem-estar – sensível ao género, a classificação da riqueza pode ser utilizada para identificar indicadores de rendimento aumentado Trabalho remunerado – relembrar que os trabalhos para as mulheres podem ser em tempo parcial, sazonal ou temporário baseados nos tipos de empresas onde as mulheres mais provavelmente trabalham Se a carga horária foi aumentada para algum membro específico do agregado ou se horas de trabalho adicional numa empresa resultaram em carga de trabalho adicional para as mulheres, se sim quanto? Níveis de inputs para ambos mulheres/homens clientes e trabalhadores no intermediário microfinanceiro Números de reuniões tidas entre as Instituições Microfinanceiras e as clientes intervenientes. Participação nestas reuniões dos clientes intervenientes por sexo, idade, etnia, e fundo sócioeconómico. Níveis de contribuição/participação dos clientes nestas reuniões. Níveis de participação dos clientes no esforço de recolha de dados. Número de mulheres e homens em posições chave nas Instituições Microfinanceiras e na sua administração

19

Adaptado do ASEG Guia Intermédio de Beck, Tony. “Can the uncounted count? Qualitative indicators and their uses.” Ensaio preparado para o Encontro de Análise Inter-Agência das Análises das questões sócio-económicas e de género, organizado pela UNDP, 5-9 Março de 1997, Pearl River, New York.

111


Indicadores Qualitativos O impacto da microfinança nas relações de género acarreta responsabilidades de despesas transferidas no agregado como resposta ao aumento de rendimento de membros individuais? Funções que podem ser utilizadas para estabelecer indicadores de alteração ao género ou relações de poder e explorar uma variedade de impactos potenciais e interligações bem como a exposição de alguns dos assuntos mais litigiosos. Matrizes de tomada de decisões podem ser a base de indicadores de controlo no agregado (Mayoux, 1999) Como foram alterados o acesso e controlo dos recursos relacionados com a empresa? A percepção do cliente das Instituições Microfinanceiras. Isto pode ser feito numa escala de 1 para 5 ou medido através de técnicas participativas como a classificação. O patamar de apoio mútuo entre grupos de crédito e de poupança e entre homens e mulheres. Isto pode ser medido através das respostas abertas das partes intervenientes. A capacidade do grupo moderar a resolução e de evitar conflitos. A participação de todos os grupos intervenientes, incluindo mulheres e homens, no processo decisório. Isto pode ser medido através da observação e das respostas das partes intervenientes.

112


Apêndice A4.9: Influenciando a agenda política A4.9: Sugestões de como as Instituições Microfinanceiras podem influenciar a agenda política microfinanceira Ponto de entrada para influenciar a política económica

ºSer

claro na mensagem que quer transmitir fazer contactos com os ministérios, utilize ligações ºUtilize encontros internacionais, visitas de estudo, ºConcentre-se nas mulheres já em posições de chefia, como as que trabalham para o governo, aquelas dos concelhos das mulheres. No entanto, o género não deverá apenas ser centralizado nas mulheres, e em cada país é diferente, requerendo uma abordagem individual, baseada no contexto do seu género. Além disso, o facto de ter mulheres como decisores políticos não é suficiente para assegurar que as políticas sejam sensíveis ao género. Como manter a atenção dos ºDesenvolva apresentações curtas e incisivas decisores políticos ºUtilize os média para a consciencialização dos aspectos positivos das operações microfinanceiras, como as elevadas taxas amortização ºUtilize peritos microfinanceiros ‘externos’ º’Ver para crer’ , ilustre com exemplos ºDemonstre a completa realidade da situação, utilizando dados, tendências gerais e estatísticas ºTente incluir membros do governo em quaisquer workshops internacionais sobre microfinança, redes de trabalho ou encontros ºEnvolva VIPs Construa redes de trabalho e contactos

ºFaça

Aprendendo acerca de técnicas de lobbying

ºPoderá

Aproveite os resultados das Conferências Internacionais

ºAs

Papel da informação

ºRelembre

ºPara

uso de conferências electrónicas às organizações internacionais para promover a construção de redes de trabalho entre aquelas que trabalham na área da microfinança e dos assuntos de género ºParticipe em acontecimentos chave ºEnvie (profusamente) brochuras e material microfinanceiro ºCrie programas de troca e canais de comunicação paralelos entre as Instituições Microfinanceiras no país/na região/no mundo ºPeça

ser necessária formação para saber como utilizar o lobby lobby de forma positiva ºRelembre-se que alguns grupos podem perder a sua posição se contestarem pessoas numa posição mais elevada ºUtilize todas as oportunidades para apresentar o seu ponto de vista transversalmente: festas; celebrações; encontros particulares; jantares; igreja ºExperiência partilhada, o conhecimento das metodologias acertadas pode originar ideias para os lobbyistas e também pode fornecer argumentos para convencer os tomadores de decisões a adoptar legislação e políticas de capacitação ºFazer

Conferências Internacionais são úteis para propagar a palavra sobre os assuntos de género. Aproveite o vocabulário das conferências internacionais ºPor vezes as conferências internacionais exigem comunicações nacionais ou planos de acção que incluam contribuintes da sociedade civil – assegure que a sua Instituição Microfinanceira é incluída em tais actividades 20. que a informação é ‘poder’ que a informação é válida e não exagerada, verifique as fontes de informação ºCoordene e organize informação ºAproveite todos os tipos de media, seja criativo na utilização desses meios ºTenha a certeza que troca informação com colegas e a outros níveis porque podem ser os decisores políticos de amanhã ou podem ter outros contactos diferentes ºAssegure-se

20

A IV Conferência da UN Sobre as Mulheres, que teve lugar em Pequim em 1995 foi decisiva para colocar os assuntos de género na agenda, tanto na microfinanceira como também noutro contexto, ex. em muitas economias em transição , pela primeira vez um ponto focal sobre os assuntos de género foi criado no Ministério do Trabalho.

113


Apêndice A4.10: Exemplos de ‘metodologias acertadas’

(Rhyne and Holt, 1994)

A4.10: Exemplos de metodologias acertadas ou para a distribuição de serviços Microfinanceiros

1. Ofereça serviços que correspondam às preferências dos empresários pobres. Os empréstimos podem

ir de 25US$ até várias centenas de dólares, mantenha empréstimos a curto-prazo, geralmente de três meses a um ano, e garanta que os empréstimos estão disponíveis repetidamente. Garanta que os clientes, tenham apenas que esperar o mínimo de tempo para o processamento do empréstimo e que os mercados de empréstimo estejam localizados perto das casas ou dos empregos dos clientes. Isto irá implicitamente ajudar as mulheres clientes a terem acesso aos serviços microfinanceiros.

2. Crie operações alinhadas para reduzir o custo por unidade. Formulários de empréstimos e procedimentos de aprovação standartizados permitirá aos promotores com formação relativamente simples, manusear um elevado número de clientes e por conseguinte cobrir os salários e a administração. A aprovação do empréstimo deverá ser baseada em dados facilmente verificáveis, em conformidade com as exigências do grupo e a confiança que o negócio do cliente é uma preocupação comercialmente viável. 3. Conceda mais incentivos para a amortização do que confie em análises detalhadas da utilização de empréstimos com pré-pagamentos e garantias colaterais formais. A motivação poderá incluir grupos de endividamento conjunto, acesso a futuros empréstimos, frequentemente maiores, para devedores disciplinados e incentivos monetários. Tais motivações são suplementadas com um acompanhamento imediato se existir criminalidade. Na generalidade, as mulheres demonstraram ser boas cumpridoras no referente às amortizações e terem boa aceitação nos empréstimos de grupos iguais. 4. Reconheça o valor dos serviços de poupança, sobretudo para as mulheres. Através destes, os empresários podem executar os mesmos serviços de administração financeira do que através do crédito, sem ficarem endividados. As características dos instrumentos de poupança bem sucedidos, incluem acesso imediato aos depósitos em caso de necessidade (liquidez), confiança nos procedimentos, regularidade na recolha e no local onde as poupanças deverão ser recebidas, e finalmente a manutenção do valor dos activos. 5. Cobre taxas de juros e comissões de custo total. A fixação de custo total é a base para operações financeiramente viáveis. Tal fixação, cobre custos administrativos, perdas de empréstimos, os custos de capital e quaisquer seguros de inflação. O custo total das taxas de juro pode exceder as taxas dos bancos comerciais, mas os empresários pobres demonstraram o seu desejo de pagar taxas altas em troca de serviços que correspondam às suas necessidades. As taxas praticadas, são na generalidade, muito abaixo do preço das alternativas do sector paralelo. 6. Concentre-se em serviços financeiros. As instituições que tentaram combinar serviços financeiros com formação e assistência técnica, chegaram à conclusão que é difícil pô-las em prática simultaneamente com sucesso. Técnicas rendíveis para o incremento das capacidades técnicas e de gestão entre os empresários pobres são parcas e difíceis de implementar. A competência institucional necessária para oferecer serviços financeiros é muito diferente daquela que é necessária para a área de formação, tal como são necessários diversos tipos de instituições.

114


INSTRUMENTOS DO NÍVEL MACRO (CAPÍTULO 5) Apêndice A5.1: Lista para uma identificação abrangente das partes intervenientes que estão envolvidas na decisões políticas relacionadas com a microfinança.

A5.1: Lista de controlo das partes intervenientes (stakeholders) Faça as seguintes perguntas de forma a garantir que inclui uma vasta variedade de intervenientes (stakeholders) e perspectivas no desenvolvimento das políticas financeiras sensíveis ao género em relação aos serviços microfinanceiros: ⇒Quem são as pessoas chave nos diferentes ministérios governamentais que estão envolvidos no processo

de elaboração de políticas da microfinança e nos assuntos de género? Existem algumas mulheres em posições chave?

⇒Quais são as organizações internacionais, doadores multi e bi-laterais,do sector privado, ONGs, que

têm direitos adquiridos no apoio ao desenvolvimento do género e no sector microfinanceiro?

⇒Quais são as pessoas ou organizações, incluindo ONGs, governos locais e funcionários ao nível macro que

participaram em conferências relevantes a nível nacionais e internacionais? Por exemplo, a Cimeira de Microcrédito que teve lugar em Washington, (1997) e as suas subsequentes reuniões anuais de actualização; as conferências sobre as mulheres da OCDE nas PMEs (1997 e 2000); conferências regionais sobre microfinança, por exemplo as conferências anuais organizadas pela Centro para a Microfinança da Europa Central e Ocidental estabelecido em Varsóvia etc.

⇒Quais são as pessoas, as organizações, e redes de trabalho que têm os conhecimentos e capacidades

técnicas relacionados com uma sensibilização política que afecte a microfinança quanto ao género?

⇒Existem pessoas ou organizações no país que tenham já fundado intermediários microfinanceiros? ⇒Existe algum gráfico organizacional que possa ser útil para a identificação dos tomadores de decisões ,

unidades técnicas, ou outras entidades-chave nos diferentes ministérios e grandes organizações?

⇒Que tipo de recursos (por exemplo manuais) podem eventualmente servir como guias para identificar

organizações femininas no país, unidades não governamentais, de negócio e indústria, funcionários técnicos de organizações doadoras?

⇒Também estão incluídos representantes da força laboral e sindical? ⇒Que funcionários governamentais, não-governamentais ou do sector privado trabalham ou irão

trabalhar com os intermediários microfinanceiros?

⇒Encontram-se designadas de forma correcta os representantes da estrutura do poder? (corporações

transfronteiriças, grandes companhias nacionais, o exército (se relevante), agências de doadores, ONGs internacionais influentes)

⇒Encontram-se representados aqueles que são capazes de representar os interesses das mulheres?

Existem algumas organizações no país que se focalizem em estratégias para melhorar a situação das mulheres, como promover a assistência em projectos que tornem mais leve a carga de trabalho tradicional das mulheres, ou a promoção da sua educação, e das capacidades técnicas e de gestão?

⇒Foram identificados os potenciais oponentes das Instituições Microfinanceiras? ⇒Existem restrições relacionadas com o envolvimento de grupos específicos de intervenientes

(stakeholders) que possam ser solucionadas de forma a garantir a sua participação?

Adaptado do Manual Macro ASEG (FAO, 1997)

115


Apêndice A5.2: Matriz para desagregar os motivos, posições e recursos dos diversos grupos intervenientes. A5.2: Identificando as partes intervenientes no processo microfinanceiro Desenvolva um gráfico idêntico. (adaptado do Manual Macro da ASEG, FAO 1997 Motivações e posições em termos da implementação de políticas sensíveis ao género que permitam o trabalho no país das Instituições Microfinanceiras Partes intervenientes A favor das Instituições Contra as Instituições Recursos Microfinanceiras Microfinanceiras Não familiarizadas com as operações dasBem financiados Ministério das Finanças Uma estratégia plausível com a erradicação da pobreza, aparentemente inovadora

Instituições Microfinanceiras em prática

Pode contribuir para aumentar o rendimento das pessoas mais carenciadas e para o desenvolvimento do sector privado. A longo prazo resultará no aumento das receitas do Estado

Preocupadas com a falta de regulamentação e supervisão prudentes (sobretudo em Instituições Microfinanceiras que mobilizam os activos)

Outros ministérios e A abordagem sugere uma melhor departamentos (cada coordenação e alcance para o nível de campo ministério pode ser feito individualmente, por exemplo Ministério do desenvolvimento rural etc.) Bancos Comerciais

Doadores

Organizações representativas das ONGs para mulheres

Como extensões dos empréstimos das Instituições Microfinanceiras, ficam satisfeitos por não ter que emprestar a pequenos devedores (exercício oneroso)

Preocupadas com os elevados custo da regulamentação e supervisão Sem vontade de partilhar recursos

Infra-estruturas administrativas e materiais, corpo de funcionários

Têm recursos, mas sem nenhuma obrigação de partilha de tais recursos Estão mandatados para o desenvolvimento sensível ao género

Os serviços que as Instituições Microfinanceiras fornecem poderão entrar em competição com alguns serviços que eles já oferecem

Unidades de estatística têm alguns dados desagregados por sexo Têm: - Infra-estruturas úteis em muitas áreas - Fundos disponíveis - Conhecimento sobre os clientes rurais

Não têm a certeza sobre a ‘invisibilidade’ das mulheres clientes Instituições Microfinanceiras A regulamentação poderá exigir regras Têm: regulamentadas serão mais demasiado severas, como um tecto sobre- Fundos disponíveis eficientes e transparentes a cobrança de taxas de juro; pode ter - Serviço de consequências indesejáveis como a falta pessoas com A sensibilidade de género encontra- de liberdade para inovar, o que conhecimentos se incluída no âmbito das suas provavelmente irá prejudicar as técnicos políticas globais esperanças de sustentabilidade das capacitadas para Instituições Microfinanceiras propagar ‘metodologias acertadas’

- Por vezes poder para influenciar o processo de tomada de decisões ao nível macro Entendem a microfinança como um Sentem que as quantias de empréstimo Experiência em estabelecer bom sector de prestação de serviços propostas são pequenas mulheres da aldeia para as suas constituintes Não têm a certeza de que categorias de Grandes centros de financiamento Acreditam que poderá resultar no mulheres irá beneficiar das políticas internacional incentivo das suas constituintes para trabalhar em actividades não Receio de perderem o poder face aos tradicionais seus membros que poderão ficar demasiado próximos das Instituições Microfinanceiras Podem não gostar das elevadas taxas de juro aplicadas pelas Instituições Microfinanceiras

116


Apêndice A5.3: Identificando as posturas das partes intervenientes na regulamentação e supervisão das Instituições Microfinanceiras.

A5.3: Exemplos de possíveis motivações em favor da regulamentação e supervisão Analise e discuta como a regulamentação/ supervisão pode afectar mais as mulheres clientes do que os homens clientes? Instituições Microfinanceiras

Governos

Serem capazes de atrair activos e deste modo terem Focalizam os serviços financeiros para grupos sociais (ex.: mulheres e homens mais carenciados) acesso a fundos mais baratos para empréstimos Se o seu país não tiver o enquadramento legal que Facilitam a actualização dos empresários e promovem redes de segurança financeira (activos) não permita que as ONGs se ocupem dos empréstimos, suportadas pelo estado, para os cidadãos Estas poderão sofrer riscos de acção, sobretudo quando se diz que faziam parte de ONGs Protegem os depositantes de ONGs não licenciadas e internacionais e estão a tentar estabelecer-se de grupos do sector privado que já se encontram a como ONGs locais autónomas mobilizar activos A regulamentação poderá eliminar as Instituições Porque o governo considera que as ONGs e os bancos Microfinanceiras mais fracas num mercado privados cobram taxas de juro muito elevadas e saturado e deste modo reduzir a competição através da regulamentação essas taxas serão A crença que as regulamentações as obrigarão a reduzidas melhorar as operações Porque a microfinança têm um grande destaque na arena internacional, os governos sentem-se obrigados a agir para apoiar o sector Adaptado de Peck-Christen e Rosenberg, 1999

117


Apêndice A5.4: Associações de políticas

A5.4: Associações políticas

Exemplos típicos de associações entre políticas que afectam os Intermediários Microfinanceiros e em última análise as mulheres e homens. Quantas afectam as suas operações?

Macro Intermédio Campo O Estado tem controlo sobre asAs instituições de empréstimo nãoNa generalidade os homens são instituições de empréstimo (ex.:têm autoridade para emprestardonos de terra e de outros capitais fixos. Muitos homens e mulheres empréstimos apenas disponíveisàqueles que não têm capital clientes microfinanceiros não para clientes com capital fixo) possuem terra que possa funcionar como garantias colaterais O código legal não prevê que asAs instituições de empréstimo não As mulheres empresários em pequena escala não são mulheres sejam donas das terras oupodem legalmente empresar a consideradas como devedoras de outros bens, e deste modo asmulheres adequadas mulheres podem ser consideradasOs empréstimos requerem a Não é fácil para os chefes de casal assinatura de um chefe de casal como ‘inferiores’ femininos candidatarem-se aos masculino serviços financeiros As mulheres podem controlar dinheiro para artigos específicos As políticas sobre crédito eA informação sobre os serviçosDeterminados grupos de pessoas disponíveis énão sabem quais são os seus empréstimos e outros serviçosfinanceiros disponíveis são canalizados atravéstransmitida através dos jornais ou‘direitos’ de usar os serviços financeiros ou como se candidatar a de circulares oficiais complicadas ede boca em boca empréstimos nas páginas financeiras dos jornais nacionais Os valores mínimos de empréstimo A quantia dos Apesar das políticas que as instituições financeiras empréstimos pedidos governamentais fomentarem as pelas pessoas empresas privadas, a extensão de podem conceder não são demasiadamente pequenos para desprotegidas é muito empréstimos em pequena escala algumas pessoas. Pequenos pequena para o início de actividade é empréstimos têm elevados encargos Iniciativas das empresas privadas verdadeiramente complicada administrativos por unidade não são ainda bem vistas pelos potenciais clientes, porque as pessoas não estão habituadas a situações não subsidiadas Os prazos de empréstimo não correspondem às necessidades específicas dos negócios das mulheres e homens pobres

O Governo é muito hierarquizado – A estrutura do sistema financeiro oficial é muito hierarquizado e não as estruturais de negócio são parecer ser ‘de fácil utilização’. É rígidas necessário um grande compasso de espera para a aprovação dos

As mulheres e homens que necessitem de rápido acesso ao crédito têm que enfrentar uma crise temporária São sobretudo homens que

118


empréstimos. Não existem unidades trabalham nas instituições oficiais bancárias móveis para as áreas de serviços financeiros. Não é rurais considerado apropriado as mulheres lidarem com os bancos As mulheres têm pouca autoconfiança e vêem os homens das instituições de empréstimo como ‘grandes e importantes’ Os horários de abertura dos bancos não são adequados para pessoas que têm que viajar para irem aos bancos As ONGs apenas podem ampliar os Não reconhecimento que existem Os Governos vêem o mais mulheres desempregadas do empréstimos para grupos de desenvolvimento da microfinança que homens clientes, e não para individuais. como uma solução para o O trabalho não remunerado das A política das ONGs para a desemprego mulheres não é contabilizado microfinança é a promoção de grupos de solidariedade como formaOs pedidos de empréstimos de de evitar garantias, que na maioria maior volume são para devedores individuais. dos casos é inacessível para As mulheres e homens têm devedores com baixo rendimento diferentes necessidades de crédito A prática demonstrou que as mulheres por vezes necessitam de empréstimos mais pequenos do que os homens As políticas de educação no país não Existe uma grande quantidade de Maior percentagem de mulheres trabalho administrativo envolvido iletradas. são adequadas. Na globalidade Tanto os homens como as mulheres existe uma grande percentagem de na distribuição dos serviços ficam confundidos com todos os financeiros o que desmotiva a pessoas iletradas inscrição de potenciais devedores símbolos, logótipos etc. que as Por vezes há grandes custos instituições oficiais de empréstimo têm associados ao acesso ao crédito Para beneficiar dos serviços bancários é necessário saber ler e escrever

119


Apêndice A5.5: Assuntos a ter em conta na implementação de uma política microfinanceira sensível ao género.

A5.5: Questões que deverá considerar em termos de implementação de políticas

Como são observadas as políticas governamentais? (Se as políticas governamentais são pouco

apreciadas então, existirá pouco compromisso em implementar políticas oriundas do governo)

Qual a reacção das pessoas a novas políticas que afectem os programas e operações

microfinanceiros?

Quem lucra e quem perde? Como foi canalizada a informação sobre alterações políticas referentes as instituições

financeiras?

Quem está a liderar o processo de implementação de alteração de políticas ? O que é que originará a alteração de políticas? A política requer que os bancos e outros intermediários sejam restruturados ou reformados? Quais são as capacidade necessárias dentro das instituições financeiras existentes, para gerir

as alterações de políticas?

Se a política é sensível ao género, em termos de igualdade de oportunidades, legislação,

educação para combater os preconceitos, como podem os assuntos de género ser incluídos nas instituições microfinanceiras que fornecem serviços para as mulheres?

Se as novas políticas redefinem funções, estruturas e incentivos no respeitante a impostos,

regulamentações, acesso a serviços, estereótipos de género, então como podem ser ultrapassadas as dificuldades de implementação?

Se as novas políticas trazem novos custos e benefícios para os executantes, poderá haver o

receio de fracasso comercial?

Os executantes têm falta de informação sobre a forma de implementar a política no referente

às novas regulamentações?

A nova política ameaça o estatuto das instituições ou das pessoas? (Particularmente se a

política concede poder informativo para as Instituições Microfinanceiras, talvez os bancos oficiais percam o seu estatuto)

Como é comparada a oportunidade das mulheres nas actividades micro-empresariais com a dos

homens, desde que foi consolidada uma nova política?

Há algumas restrições temporais ou burocráticas ao nível local que retarde os processos? Se

for este o caso, então as oportunidades podem estar perdidas.

Aqueles que trabalham nas ONGs ou nas organizações de serviços financeiros paralelos,

exercem demasiada flexibilidade na implementação das instruções superiores?

120


Apêndice A5.6: Lista para garantir a implementação de uma política associada às actividades empresariais no nível de base.

A5.6: Lista de Controlo para o incentivo de actividades empresariais ao nível de base

ÆExistem algumas políticas específicas para incentivar o início de companhias? (ex.: incentivos

fiscais), se não, que tipo de políticas globais são necessárias para incentivar ao criação de empresas?

ÆQual é a facilidade de criar uma companhia? Qual o custo envolvido? ÆDe que forma é que o governo facilita o registo das companhias? ÆA taxação de impostos para pequenas empresas incentiva as pessoas a iniciarem actividades?

Existem concessões de taxas vantajosas?

ÆQue tipo de dados desagregados são necessários nos grupos rurais/urbano de forma a

planificar actividades microfinanceiras?

ÆComo podem os decisores políticos garantir que incluem as mulheres com baixo rendimento

como agentes económicos?

ÆQual é a legislação referente à posição das mulheres na sociedade? Podem as mulheres ser

proprietárias/herdar?

ÆAs mulheres são discriminadas em termos de início de actividade? (ex.: falta de condições de

maternidade)

ÆQue tipo de leis para o bem-estar social existem? Incentivam pessoas ocupadas em

actividades empresariais?

ÆQuais são as escalas de salários para homens e mulheres? ÆDeverá o governo conceder formação para potenciais empresários com baixo rendimento? Se

sim, que tipo de formação poderá ser concedido? Se não, quem o deverá conceder? Existem organizações privadas de formação?

ÆQuais são os potenciais impactos das alterações de políticas (relacionadas com o

empresariado) nos grupos distintos? (ex.: rurais, urbanos, homens, mulheres, étnicos distintos)

ÆExistem algumas redes de empresas por sector? Existem nichos de negócio relacionados que

se possam unir para negociar melhores custos de matéria prima ou garantir uma melhor comercialização?

121


Apêndice A5.7: Questões que permitem determinar se a implementação da política está efectivamente associada às operações das Instituições Microfinanceiras.

A5.7: Política de implementação dos Intermediários Microfinanceiros ÆQue regulamentações estão a governar as actividades das Instituições Microfinanceiras?

Podem as ONGs operar eficazmente como intermediários financeiros, ou seja conceder extensão de empréstimos?

ÆQue tipo de escalas prudenciais (requisitos mínimos de capital) têm as Instituições

Microfinanceiras que preencher conforme é estipulado pelas políticas? satisfeitas através da mobilização de activos?

Poderão ser

ÆPodem as Instituições Microfinanceiras fixar taxas de juro de mercado? ÆDentro das presentes regulamentações que orientam as actividades das Instituições

Microfinanceiras, podem as ONGs tratarem de actividades MF?

ÆQual é o mínimo de capital necessário para iniciar um banco de uma ONG financeira? ÆEm que condições podem funcionar as uniões de crédito no país? ÆCom que regularidade fiscaliza o governo (através do banco central) as actividades das

Instituições Microfinanceiras?

ÆQue tipo de serviços concede actualmente o governo para as Instituições Microfinanceiras?

(ex.: conferências, relatórios, associações etc.)

ÆA política do governo garante que as mulheres têm acesso aos serviços das Instituições

Microfinanceiras?

ÆExiste alguma fonte de informação central de registo sobre o historial de crédito dos

potenciais devedores?

122


Apêndice A5.8: No caminho das abordagens globais para as alterações da política.

A5.8: Métodos de redes de trabalho na política incluem: Lançamento

de projectos de investigação sobre assuntos de interesse particular. Alternativamente, podem ser utilizados estudos existentes sobre microfinança numa determinada região, pelas agências das NU ou agências bilaterais.

Divulgue

e recolha informação através de seminários, publicações, ensino à distância. O Banco Mundial tem uma iniciativa recente na área da microfinança no ensino à distância.

Utilize

as redes já existentes para determinar como estas podem influenciar a política. O Centro de Microfinança para a Europa Central e Ocidental já existe, e o tema da sua conferência anual em Maio de 2000 foi o ambiente legal e regulatório para a microfinança na região.

Utilize

companhias ou projectos existentes que estão no seguimento de políticas e de publicação de informação. Um projecto sobre Padrões de Microbanking financiado pelo C-GAP e gerido pela empresa Calmeadow monitoriza a actuação de mais de 100 Instituições Microfinanceiras no mundo inteiro. Os seus objectivos incluem a fundação de padrões para a indústria, que promovam a transparência dos relatórios financeiros e a melhoria de execução das Instituições Microfinanceiras.

Newsletters

sectoriais também podem ser uma forma útil de trabalho de redes sobre assuntos políticos. O Boletim de Microbanking é uma publicação semi-anual com informação detalhada sobre padrões de execução

A

World Wide Web também fornece uma oportunidade de intercâmbio de metodologias acertadas ou ‘best practices’ na abordagem política para as Instituições Microfinanceiras. Os assuntos em volta das interesses sócio-económicos e de género na microfinança também podem ser ventilados através da www, e exemplos bem sucedidos de políticas que são sensíveis às necessidades das mulheres e de outros grupos sociais em desvantagem poderão ser procurados.

123


Bibliografia e leituras recomendadas

Adams, D.W. (1995) Using credit unions as conduits for microenterprise lending: Latin American insights. ILO: Geneva, ILO Enterprise & Cooperative Development Dept, Working Paper No 2. Ackerly, B.A. (1995) Testing the tools of development: Credit programmes, loan involvement and women’s empowerment. In: IDS Bulletin Vol. 26 No. 3. Institute of Development Studies, University of Sussex UK 1995 pp 57-68. Ariff, M. (1988) Islamic banking. In: Asian-Pacific Economic Literature 2:46-62. Ashby, J.A. and Sperling, L. (1994) Institutionalising participatory client-driven research and technology development in agriculture. London: ODI. Agricultural Administration (Research and Extension) Network Paper 49. Balkenhol, B. and Gueye, E.H. (1995) Tontines and the banking system: Is there a case for building linkages? Geneva, ILO Enterprise & Cooperative Development Dept, Working Paper No 2. Becker, G. (1981) A Treatise on the Family. Cambridge: Harvard University Press Binns, H.M. (1998) Integrating a gender perspective in microfinance in ACP countries. European Commission, Directorate-General VIII. Development Policy, Social and Human development, women and development EC DG VIII (binns.helen@skynet.be). Brandsma J. and Sapcanin, A. (1999) Spinning Off for Sustainable Microfinance, Save the Children Federation into JWDS, Al Majmoua, and Faten. Case Study. The World Bank in cooperation with UNDP, New York. Bouman, F. (1995) "Rotating and Accumulating Savings and Credit Associations: A Development Perspective", World Development, 23:3, pp. 371-384. Budlender, D., Sharp, R., & Allen, K. (1998) How to do a gender-sensitive budget analysis: Contemporary research and practice. Commonwealth Secretariat: London UK CGAP (1995) Maximizing the outreach of microenterprise finance: The emerging lessons of successful programs. The Consultative Group to Assist the Poorest (CGAP), Washington DC. Focus, no. 2 October 1995. CGAP (2000) The Rush to Regulate: Legal Frameworks for Microfinance. The Consultative Group to Assist the Poorest (CGAP), Washington DC. Occasional Paper, no. 4 April 2000. CGAP (2000) Consultative Group to Assist the Poorest, Internet homepage: www.worldbank.org/html/cgap/ Chambers R. (1994) Challenging the Professions: Frontiers for Rural Development. Intermediate Technology Publications Ltd., London. Chant, S. (1997) Women-headed households: Diversity and dynamics in the developing world. Basingstoke: Macmillan. Chua R.T. and Llanto G.M. (1996) Assessing the efficiency and outreach of micro-finance schemes. Geneva, ILO Enterprise & Cooperative Development Dept, Working Paper No 15. Coelho, K. and Coffee, M. (1996) Reversing the flow: Toward gender-oriented policy information systems in agriculture. A paper for FAO. Bureau of Applied Research in Anthropology (BARA), University of Arizona, USA, March 1996. Downing and Daniels, (1992) The Growth and Dynamics of Women Entrepreneurs in Southern Africa. GEMINI Technical Report No. 47. Bethesda, MD: Development Alternatives, Inc. August, 1992.

124


ECOSOC, (1997) United Nations, 1997: "ECOSOC Definition of Gender Mainstreaming," adopted 17.7.97 (ref: E.1997.L.10.Para.4), in UNDP/GIDP Gender. Elson, F. (1995) Micro, meso, marco: Gender and economic analysis in the context of policy reform. In Van Stavern, I. (1995) Gender and macro economic development Reader. The University of Manchester, and Oikos, Utrecht, The Netherlands. ESA (2000) Enterprise Support Agencies promotional material, 2000. ESA is an SME support agency established in three cities of the Republic of Macedonia: Gostivar, Ohrid and Tetovo, with financing from the Know-How Fund. FAO (1984) Promotion of Women’s Activities in Marketing and Credit. Rome, Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO). FAO (1985) Learning from women: A manual for village level training to promote women’s activities in marketing. Rome, Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO). FAO (1994) Rural Finance in FAO. Position Paper by Rural Finance Group Marketing and Rural Finance Service, June 1999. Rome, Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO). FAO (1997) The Macro Handbook, Bureau for Applied Anthropology, (BARA), University of Arizona. FAO (1998) Agricultural Finance Revisited: Why? Agricultural Finance Revisited No. 1. Rome, Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO) & Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (GTZ) 1998, 55 pgs. FAO (1998b) Agricultural Finance Revisited No.2: Agricultural Finance: Getting The Policies Right. Coffey, E. Rome, Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO) & Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (GTZ) Rome 1998, 71 pgs. FAO (1999) Agricultural Finance Revisited No.3: Better Practices in Agricultural Lending. Klein, B., Meyer, R., Hannig, A., Burnett, J. & Fiebig, M. Rome, Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO) & Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (GTZ) Rome 1999, 81 pgs. Filippis, V. (2000) Le microcredit maxi rentable, Article in Liberation, Monday 11 December 2000 Paris. Pp 26-27. Gibson, A. (1993) NGOs and income-generation projects: lessons from the joint funding scheme. In: Development in Practice 3:184-195. Goetz, A.M. and Sen Gupta, R. (1996) Who takes the credit? Gender, power, and control over loan use in rural credit programs in Bangladesh. In: World Development Vol. 24. No. 1. Pp. 45-63. Haddad, L. (1999) The income earned by women; impacts on welfare outcomes. In: Agricultural Economics 20:135-141. Haddad, L and Smith, L. (1999) Discussion Paper 60 Explaining child malnutrition in developing countries: A cross-country analysis. International Food Policy Research Institution (IFPRI), Washington, USA. Hagnauer, Juan R. (1999) Delivering Business Development Services to SMEs on a Sustainable Basis: Can it be Done? Draft Note, Small Enterprise Development Unit (PSDSE), World Bank, Washington, D.C. Hallberg, K. (1999) A Market-Oriented Strategy For Small and Medium-Scale Enterprises, Discussion Paper number 40, International Finance Corporation, The World Bank, Washington D.C. 1999. Havers, M. (1996) Financial sustainability in savings and credit programmes. In: Development in Practice 6:144150. Healey, J., Foster, M., Norton, A., Booth, D. (2000) Towards national public expenditure strategies for poverty reduction. ODI: London, ODI Poverty Briefing No 7: March 2000. Hulme, D., Mosley, P. (1996) Finance Against Poverty, Vol. 1. London: Rutledge. Humphrey, J. and Schmitz, H. (1995) Principles for Promoting clusters and networks of SMEs, Number 1, Paper commissioned by the Small and Medium Enterprises Branch, UNIDO, Vienna. ISNAR (1997) Gender Analysis for Management of Research in Agriculture and Natural Resources, A Training Module, May 1997. The Hague, The Netherlands.

125


Jahan, R. (1995) The Elusive Agenda: Mainstreaming Women in Development, London: Zed Press. Johnson, S. (1999) Gender and Microfinance: guidelines for good practice, Centre for Development Studies, University of Bath, Email: suzanjohnson@compuserve.com Gender and Microfinance: guidelines for good practice, mimeo, March 1999. Johnson, S. and Kidder, T. (1999) Globalization and gender – dilemmas for microfinance organizations. Small Enterprise Development, 10 (3): 4-15 Kabeer, N. (1995) Targeting women or transforming institutions? Policy lessons from NGO anti-poverty efforts. In: Development in Practice, Vol. 5. No.2. May 1995. Oxfam UK and Ireland. Kienzle, J. (1999) SEAGA Guide on Farm Tools and Sustainable Mechanisation, FAO, Rome. Liedholm, C. and Mead, D. (1995) The dynamic role of micro and small enterprises in the development process. Action Research program I, GEMINI, USAID Microenterprise Development Brief, No 24. Lukes, S. (1974) Power: A Radical View, Macmillan London. Lusthaus, C., Anderson, G., Murphy, E. Institutional assessment: A framework for strengthening organizational capacity for IDRC’s research partners. IDRC (www.idrc.ca/books/focus/771/) 1995. In: SEAGA Intermediate Handbook, Norem R. 2000, Rome, FAO. Marr, A. (1999) The poor and their money: what have we learned? ODI: London, ODI Poverty Briefing No 4, March 1999. Mayoux, L. (1999) From access to empowerment: Gender issues in microfinance Position paper presented to CSD Virtual Conference, October 1999. Mayoux, L. (1998) Microfinance and women's empowerment: Approaches, evidence and ways forward. Open University Development Policy and Practice Discussion Paper No. 41, August 1998. Mayoux, L. (1995) From Vicious To Virtuous Circles? Gender and Micro-Enterprise Development. Occasional Paper No. 3 prepared for the UN Fourth World Conference On Women, Beijing. United Nations Research Institute for Social Development, May 1995. Mayoux, L. (1997) The magic ingredient? microfinance & women's empowerment A briefing paper prepared for the Micro Credit Summit, Washington, February 1997. Microcredit Summit, 1997, 1999 Documents, Washington DC, 1997. Microfinance Centre for Central Europe and the New Independent States Newsletter, Winter/Spring 2000, Warsaw, Poland. Morduch, J. (1999) The Microfinance Promise, Journal of Economic Literature Vol. XXXVII (December 1999), pp. 1569-1614.

Nagarajan, G. (1999) Microfinance in post-conflict situations: towards guiding principles for action. Paper prepared by Nagarajan, Associate researcher, The Ohio State University/ Calmeadow for the joint ILO/UNHCR Workshop on microfinance in post-conflict countries, 15-17 September 1999. Geneva, ILO. Nelson, C., Nelly, B., Stack, K., Yonovitch, L. (1996) Village Banking: The State of the Practice. Small Enterprise Education and Promotion Network. New York, United Nations Development Fund for Women (UNIFEM). Norem, R. (2000) SEAGA Intermediate Handbook, FAO, Rome. Nyamugasira, W. (I995) NGOs and income-generation projects: Some further thoughts. In: Development in Practice, Vol. 5., No. 2, May 1995. O’Reilly, C. (1996) Urban women’s informal savings and credit systems in Zambia. In: Development in Practice, Vol. 6., No. 2, May 1996. OECD (1999) Women’s Entrepreneurship: exchange experiences between OECD and transition economy countries, Local Economic and Employment Development (LEED), Note by the Secretariat, Paris.

126


Pahl, J. (1983) The allocation of money within marriage. In: Sociological Review 31:237-264. Parker, J. & Torres, T. (1993) Micro and small enterprise in Kenya: Results of the 1993 national Baseline Survey, K-Rep research paper no 24, Kenya Rural Enterprise programme, Nairobi. Peck-Christen, Rosenberg R. (1999) The Rush to Regulate: Legal Frameworks for Microfinance, Washington, CGAP. Poyo, J. (1995) Expansion of rural financial services: The development of a community-based rural credit union network in the Dominican Republic (1984-93). Geneva, ILO Enterprise & Cooperative Development Dept, Working Paper No 10. Rahman, A. (1994) Study of the Grameen Bank and its impact on Women. Http://www.idrc.ca/media/Aminur_e.htm. Remenyi, J. (1997) Microfinance: A Panacea for poverty? Development Research Briefings, University College Dublin 1997(2) Rhyne, E. and S. Holt, (1994) Women in Finance and Enterprise Development. Washington, D.C.: World Bank. World Bank Discussion Paper Series. Rietbergen-McCracken, Narayan et al (1997) Participatory tools and techniques: A resource kit for participation and social assessment. Social Policy and Resettlement Division, Environment Department. The World Bank, Washington, USA. Ricupero . R. (1999) Beyond the unification of markets: A global community of cooperation and shared knowledge for security and development. Some personal reflections. Geneva, UNCTAD. http://www.unctad.org/en/special/ux_td380text.htm Rogaly, B. (1996) Micro-finance evangelism, destitute women and the hard selling of a new anti-poverty formula. In: Development in Practice Vol. 6 No.2 Oxfam, UK, May 1996 pp100-112. Rose, R. (1993) Where women are leaders: The SEWA movement in India. London: Zed Press. Schneider, H. (Eds.) (1997) Microfinance for the poor. IFAD/OECD. Singh, K., Dawkins-Scully, N., Wysham, D., (1997) Micro-credit: band-aid or wound? The gender imperative in development. In: Connections no. 6, June 1997 Vrouwenberaad Ontwikkelingssamenwerking. The Netherlands. Sutton, R. (1999) The Policy Process: An Overview. ODI, London, August 1999. The Micro Finance Network, Occasional Paper No 1. (1997), Regulation and supervision of microfinance institutions: Experience from Latin America, Asia and Africa, 1997. Tilakaratna, S. (1996) Credit schemes for the rural poor: Some conclusions and lessons from practice. Issues in Development Discussion Paper 9. Geneva, ILO. Tsilikounas, C. (2000) ICMC and Project Enterprise Bosnia and Herzegovina. Washington, D.C.: Management Systems International Tripp R (1981) Farmers and traders – Some economic determinants of nutritional status in northern Ghana. J. Trop. In: Pediatrics 27:15-22. UNDP (1995a) The Beijing Platform for Action. Fourth World Conference on Women. UNDP, (1995b) The Human Development Report. New York, UNDP. UNIFEM (1992) A question of access: Training workshops on planning credit projects that take women into account. New York, UNIFEM. USAID (2000) Assessment of the SME Sector in Armenia, USAID 2000. Utting P. (2000) Business Responsibility for Sustainable Development. UNRISD, Geneva, Switzerland.

127


Van Stavern, I. and Elson D. (1995) Gender and Macro Economic Development Reader. The University of Manchester, and Oikos, Utrecht, The Netherlands. White, B. (1996) Globalisation and the child labour problem. In: Journal of International Development 8:829-839. Wilde, V. (1997) SEAGA Field Handbook, FAO, Rome Women’s World Banking (1994) Achieving Policy Impact, What Works, A Women’s World Banking Newsletter, Volume 4 Number 5, December 1994. Yaron, J.(1992) "Successful Rural Finance Institutions" World bank Discussion Paper 150. Washington D.C.

128


ASEG

Programa de Análise Sócio-Económica e de Género

Serviço de Género e Desenvolvimento Direcção de Género e População Departamento de Desenvolvimento Sustentável Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação Viale delle Terme di Caracalla 00100 Roma, Itália Tel : (+39) 06 5705 6751 Fax : (+39) 06 5705 2004 E-mail: SEAGA@fao.org Internet Site: www.fao.org/sd/SEAGA


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.