BL 159 Setembro/Outubro 2020

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BORDO LIVRE REVISTA DO CLUBE DE OFICIAIS DA MARINHA MERCANTE

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SETEMBRO/OUTUBRO 2020


A Mystic Invest do empresário Mário Ferreira, holding da Douro Azul e da Mystic Cruises adquiriu, num leilão no Reino Unido, o navio Vasco da Gama.

Uma aposta que permite ao empresário, que foi recentemente nomeado personalidade do ano na indústria dos cruzeiros, expandir a sua frota de paquetes e aumentar a oferta de cruzeiros oceânicos.

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EDITORIAL

JOÃO TAVARES

Regressamos a um período com agravamento das condições epidemiológicas o que condiciona ainda mais as nossas actividades regulares do CLUBE e por isso estamos a preparar algo de novidade para este tempo de Outono. Vamos iniciar uma Série de documentários com histórias da Marinha Mercante que será realizada na sede em Lisboa, enquanto o estado de calamidade assim o permitir, com transmissão on-line para que possam assistir no conforto dos vossos “camarotes”. Digamos que é uma espécie de produção do CLUBE a partir da “Ponte” e difusão para todo o navio em circuito interno. Estejam atentos nos próximos dias à divulgação do programa respectivo. Esta série irá versar sobre temas tão variados como os novos navios, os navios especializados bem como os navios das carreiras mais antigas do mundo e que navegam nos dias de hoje. Terá início no final de Outubro com carácter regular às quintas-feiras no horário das 15h30. Este tempo de maior recolhimento é também favorável para uma leitura mais apaixonada sobre o Mar, suas gentes e as suas histórias. Em particular, recomendamos dois títulos que

recentemente adquirimos e que pela qualidade dos seus autores e respectiva editora, muito engrandecem a nossa secção de biblioteca. Um, é a nova edição do “Comandar no Mar” com novos textos e o outro “Memórias Navais” que podem ser adquiridos na nossa loja. Nestes tempos recentes, também foi publicado um texto muito apelativo e que será do agrado daqueles que gostam mais de temas exigentes de reflexão e de estratégia. Para uma leitura demorada e com sentido crítico foi publicada a proposta que está em consulta pública até ao início de Novembro da Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030, onde são apresentados os eixos estratégicos, os objectivos, as áreas de intervenção e as metas desejáveis para o país, em termos de política e desenvolvimento do Oceano. Da nossa parte estivemos presentes na sessão pública realizada em Lisboa com a presença do Sr. Ministro do Mar e da Sra. Directora da DGPM que explicaram as razões nomeadamente, as políticas, que presidiram à sua elaboração quer no domínio geopolítico, ambiental, social e económico. Foi o nosso primeiro contacto com o documento que apresenta dez objectivos estratégicos divididos em treze áreas prioritárias de intervenção. Iremos fazer uma leitura cuidada e dar o nosso contributo para um futuro oceânico em Portugal. Se pretenderem podem enviar as vossas sugestões para o CLUBE que organizará num documento único todos os contributos dos oficiais MM e assim reforçar a visão do CLUBE nas áreas

prioritárias a desenvolver. Outono também significa regresso às aulas e no passado dia 14 estivémos presentes na cerimónia solene de abertura do ano lectivo da ENIDH. Foi uma cerimónia rica de significado pois contou com a presença do Sr. Ministro do Mar e do Sr. Presidente da C.M.O., dois actores políticos, um de nível nacional e outro do poder autárquico que muito podem fazer em favor da formação e do ensino superior de marítimos. Creio que houve convergência de rumos para que a ENIDH ganhe uma outra dimensão e visibilidade no panorama das ciências do mar. A Alumni esteve representada pelo seu presidente nosso associado e membro dos Corpos Sociais, Eng. Rui Reis que fez as honras na entrega do Prémio Carreira 2020 com a atribuição da distinção à Cmte. Cristina Alves pelo mérito e relevo da sua brilhante carreira. O Prémio Padrão dos Descobrimentos foi entregue ao Sr. Dr. Mário Ferreira da DouroAzul pelo contributo dado em favor da Marinha Mercante, aquele que é o maior armador português a par do maior empregador de tripulações portuguesas. Esta empresa mantém o seu plano investimentos em novas unidades oceânicas apesar da conjuntura desfavorável o que acrescenta coragem, visão e confiança, atributos próprios dos homens do mar. Só assim alcançaremos os “Bojadores” da nossa história pessoal e universal. A bem do Mar desejo que se mantenham protegidos e em segurança.

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SUMÁRIO

SETEMBRO/OUTUBRO 2020

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DIRETOR Lino Cardoso

Editorial

João Tavares

O Senhor Zé e o « Visconde» Senos da Fonseca

COMM Natura Sabedoria do Mar Alberto Fontes

Os lemes dos navios não são todos iguais? - parte 2 António Costa

Notícias CMI inaugurou a instalação "Riscas da Costa Nova" Ana Maria Lopes

Em Maré de Estratégias Oliveira Gonçalves

Os Jovens e o Mar Bárbara Chitas

COLABORARAM NESTE NÚMERO João Tavares, António Costa, Alberto Fontes, Ana Maria Lopes, Bárbara Chitas, Oliveira Gonçalves, Senos da Fonseca

OS TEXTOS ASSINADOS SÃO DA RESPONSABILIDADE DOS SEUS AUTORES

COMPOSIÇÃO Mapa das Ideias TIRAGEM 1000 exemplares PERIODICIDADE Bimestral REG PUBL 117898 DEPÓSITO LEGAL 84303 CORREIO EDITORIAL Despacho DE00352020PE/PES PROPRIETÁRIO/EDITOR Clube de Oficiais da Marinha Mercante Trav S João da Praça, 21. 1100-522 Lisboa Tel (+351) 218880781. www.comm-pt.org secretaria@comm-pt.org CAPA © Vasco Pitschieller DISTRIBUIÇÃO GRATUITA AOS SÓCIOS DO CLUBE DE OFICIAIS DA MARINHA MERCANTE

A REVISTA ESTÁ DISPONÍVEL ONLINE para leitura, duma forma fácil e intuitiva em http://issuu.com/clubeoficiaismarinhamercante/docs/bl159 HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO DA SEDE DO COMM 2.ª, 3.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ªF - das 15h00 às 18h00 A SEDE DO CLUBE DISPÕE DE LIGAÇÃO PAGAMENTO DE COTAS: NIB 001000006142452000137


O SENHOR ZÉ E O «VISCONDE» -- do blog Terralampada

SENOS DA FONSECA

Mais uma sota, nesta segunda-feira, permitiu-me o reencontro. Eu, a Zefa e a Bernarda, falámos de muita coisa. De entre elas catei uma bonita «estória». Vo-la conto… § – Olhe – diz a Bernarda: este tempo desembestado faz-me recordar a nossa vida em pequenas. O palheiro onde nos abrigávamos do tempo, feito de um tabuado mal encostado, deixava passar o vento frio por entre as frinchas, que até zunia. Então, nas noites de surriada tiravam-se os cobertores serranos da enxerga e punham-se a fazer de anteparo. E para não ir para a enxerga e ter frio, abusacávamo-nos em volta do borralho. À luz de um candeeiro trémulo, por vias da fisga ventosa que escapulia entre frinchas, íamos ouvindo os maiorais, enquanto uns cavaquitos Mar. Fotografia de Celestino Alves.

apanhados do outro lado, no matagal da Maluca, ardiam, mitigando o frio. E entre conversa lá íamos assalgalhando, quebrando o jejum. Numa lengalenga familiar, ouvíamos «histórias» do antigamente. Lembro uma, que fez o encanto da minha meninice. Sabe?!: sempre pensei, porque fui testemunha viva da heroicidade demente daqueles «arraises», que, às vezes, até parecia não regularem bem, quando no meio do areal, frente ao desalmado mar, gritavam: – «bota prómar, que este mar enxogalhado não mete medo a homes». E nós, que ficávamos especadas na praia, arrepiadas a ver o meia-lua encabritar-se na primeira vaga, e logo atrás dela vir a segunda ainda mais danada, arrepanhávamos os cabelos e só sabíamos gritar: – ai o meu Pai, coitadinho, que lá fica! Ora um dia, contou o meu avô, o Chico «Cuteta», o Sr. José (José Estêvão) tinha vindo, como habitualmente, à borda a conversar com as «nossas» gentes. A saber da nossa vida. Trazia com ele uns «fidalgotes» da cidade, que se vestiam astrapalhados, dizia o Ti Cuteta, com a areia a entrar-lhes para as polainas. «Que inté» pareciam um barco alquebrado «a meter auga» … E parando, apresentou-os ao arrais Thomé. Um dos fidalgos, homem de larga bigodeira engomada e retesada que mais parecia imitar o «meia-lua», dirifiu-se sorridente ao Thomé dizendo-lhe: – Atão vossemecê é que é um dos tais «ílhavos» que o Visconde diz pedirem meças ao campino, a saber qual mais valente (?): se o que defronta o touro, se o que investe o mar!!!!... Sim senhora, finalmente vejo um dessa espécime. E Vossemecê que pensa do que diz «Visconde» (?), pergunta o

fidalgo letrado, ao Thomé. – Ora saiba òspois que eu penso que esse tal Visconde – òsculpe mas não o conheço – é zamparilha. Ora essa: – olhe … E zás!!! A um boi que vinha dar o chicote ao «calão», fila-o pelos cornos, torce… torce… torce… até que o boi ajoelha e cai de borco na areia, resfolegando e espumando, preso pelas manápulas do Thomé. Este levanta-se, sacode as mãos, põe o boné, e diz para o amigalhaço do Sr. José: – Ora diga agora ao tal «Visconde» que faça isto com o mar. E veja quantos homes eram precisos para o abraçar. Todos os que há no mundo. O «manso», esses (!), como-o eu em bifes. Sem sal parecem feitos de palha. O mar, esse (!), – e ao dizê-lo tira respeitosamente o boné – bebe-se aos golinhos, senão afogamos no seu sal. Essas gentes de que fala o dito, enfarpelam-se de vermelho e são bailarinos. Morres-lhe pouca gente, por certo. Olhe em volta Vossa Senhoria, e repare na nossas gentes: vê-os quase todos de preto. Vestem-se assim pelos que ali (apontando o mar) ficaram. Mas isso não os quita de «zangalharem» com ele, as vezes que forem precisas. Enquanto a conversa decorria, o Sr. José ria a bom rir. – Pois… Ó Pinheiro!!!, meteste-te com boa rês. Logo este gladiador do mar. SET-OUT 2020 | BORDO LIVRE 159 | 5


COMM NATURA

A NÁUTICA DE RECREIO, A FIBRA DE VIDRO E O AMBIENTE

Figura 1: Cemitérios de embarcações abandonados a céu aberto. Figura 2: No entanto, muitos são descartados no mar, simplesmente fazendo um furo no casco e deixando-os afundar num qualquer lugar da costa.

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O desenvolvimento sustentável é, tradicionalmente, definido como algo que atende às necessidades do presente sem comprometer as necessidades do futuro. À primeira vista a prática de náutica de recreio parece enquadrar-se neste conceito, mas… como qualquer atividade humana, trás consequências. A fibra de vidro alimentou o boom da navegação de lazer. A resistência e durabilidade da fibra de vidro transformaram a indústria náutica e possibilitaram a produção em massa de pequenas embarcações de lazer. No entanto, os barcos que foram construídos no boom da fibra de vidro das décadas de 1960 e 1970 estão, agora, em final de vida. Quando o custo da reparação ultrapassa o valor de revenda, o “azarado” proprietário descarta-se do “amado” barquito e da responsabilidade de o manter. A acumulação constante de embarcações em fim de vida nas comunidades costeiras tem vindo a gerar discussões em torno de uma variedade de questões ambientais e económicas interligadas. Atualmente, o destino mais comum para essas embarcações envelhecidas é o aterro ou pior: o abandono em quintais, estaleiros ou nas margens de rios e canais locais. Muito pouca pesquisa foi até hoje feita sobre o descarte no mar e a preocupação é que, eventualmente, esses barcos se degradem e se movam com as correntes e prejudiquem os ecossistemas locais, acabando por se decompor em microplásticos. Este tipo de descarte por abandono implica sérios riscos à saúde humana provocados por produtos químicos ou materiais usados no barco: borracha, plástico, madeira, metal, têxteis e, claro, óleo. Além disso, o amianto (era um material amplamente empregue como isolante nos sistemas de escape) e tintas com chumbo (comumente usadas como


inibidor de corrosão), ao lado de compostos à base de mercúrio e tributilestanho (TBT) como agentes anti incrustantes. Embora não tenhamos evidências sobre o impacto humano do TBT, o chumbo e o mercúrio são reconhecidos como neurotoxinas. E depois há as reparações, geralmente feitas a céu aberto, nas margens, criando nuvens de poeira no ar. Os trabalhadores nem sempre usam máscaras e alguns deles sucumbem a doenças semelhantes à asbestose. Inevitavelmente, parte dessa poeira tem como destino a água. A fibra de vidro é filtrada por crustáceos marinhos ou acabam nos estômagos de pequenos gastrópodes ou anelídeos e entram na cadeia alimentar de animais maiores, limitando, portanto, a capacidade dos organismos de detetar presas, alimentar-se, reproduzir-se e fugir de predadores. Enterrar milhões de toneladas de fibra de vidro por todo o mundo a toda a hora é uma prática contraproducente, por mau tratamento de materiais compostos e por serem resíduos perigosos para o meio ambiente. Essas micropartículas são as resinas que mantêm a fibra de vidro unida e contêm ftalatos, um grande grupo de produtos químicos associados a graves impactos na saúde humana, desde TDAH a cancro de mama, obesidade e problemas de fertilidade masculina. Os principais membros da indústria naval europeia sugerem que as nações costeiras da UE descartem, anualmente, entre 6.000 e 9.000 embarcações de recreio. Barcos abandonados são agora uma visão comum em muitos estuários e praias, vertendo metais pesados, microvidro e ftalatos: rapidamente, devemos começar a prestar atenção aos perigos que representam para a saúde humana e às ameaças à ecologia local.

Figura 3: Os gestores de aterros usam, geralmente, processos mecânicos simples para cortar e triturar a manta de fibra de vidro, resinas de poliéster e material auxiliar, comprimindo-os e enterrando os restos misturados com resíduos sólidos urbanos. Figura 4: Onde vão morrer os barcos velhos? Por vezes, são colocados no OLX por míseros euros, na esperança de se tornarem o problema de um outro qualquer sonhador ignorante…

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SABEDORIA DO MAR

A TEMPESTADE PERFEITA PARA O SECTOR DO MAR E SEUS PROFISSIONAIS

ALBERTO FONTES

Estamos perante uma das principais ameaças à humanidade, quando num tempo de muitos desafios pela frente, é preciso haver um optimismo moderado. As nações entram e saem de confinamentos, corredores aéreos abrem e fecham conforme a instabilidade política, aportando preocupações de segurança em diversas regiões, tudo isto associado às alterações climáticas e com a crise dos refugiados a aumentar, gera a tempestade perfeita para o sector do Mar, que deve reagir rapidamente, para ganhar segurança e voltar a ter a confiança mundial. Estando com estas ameaças à humanidade, há que aprender durante a pandemia, pois nenhuma indústria estava preparada ou com reservas, quando a COVID-19 apareceu mundialmente, motivando encerramentos de produção, negócios, fronteiras e portos, interrompendo a cadeia logística de abastecimento, impedindo a normalidade contratual com as tripulações, originando-lhes stress, num claro balanço entre navegação segura e graves acidentes. Passados que já estão seis meses da pandemia, muitos pela Europa e por todo o Mundo, começaram a focar-se em como a experiência vivida em 2020, possa ser uma ponte entre o pré-COVID-19 e o futuro que se quer diferente, na abordagem do sector, nas mudanças de comportamento face ao ambiente, na 8 | BORDO LIVRE 159 | SET-OUT 2020

transformação da sociedade, na economia que se pretende verde, mais sustentável e sobretudo descarbonizada. A Comissão Europeia, com visão, um plano e o investimento, fixou novo valor de 55% para redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2030, para acelerar a reconversão energética e garantir a neutralidade climática do continente em 2050. Estabeleceu metas concretas para medir o progresso da transição digital, da economia, da sociedade, nos próximos dez anos. O hidrogénio é sem dúvida a mais promissora nova tecnologia, a não emitir carbono de modo a reduzir a emissão de gases com efeito de estufa. Esta alternativa que entusiasma como propulsão para o sector das indústrias marítimas, não deixa de estar envolta em grande controvérsia pela inovação, gerando múltiplos artigos de opinião, mais ou menos fundamentados. Em Portugal o governo encomendou uma estratégia para vencer a crise e promover o desenvolvimento do país no período de 2020 – 2030. Aquilo que recebeu, foi um conjunto de muitas ideias oriundas de diferentes quadrantes. Uma estratégia implica fazer opções, ouvindo universidades e centros de conhecimento nacionais, apostando no que sabemos fazer bem, para uma definição do que queremos ser daqui a vinte ou trinta anos. Ficamos chocados com a DESUMANIZAÇÃO das sociedades mundiais, absolutamente indiferentes aos apelos do Papa Francisco, do Secretário Geral das Nações Unidas, da Comissão Europeia, das mais variadas Organizações como a IMO, da ICS, da ITF, ECSA, para que facilitem os desembarques, para facilitarem o repatriamento, em rendições de tripulações dos navios, a bem da segurança e da eficiência do comércio mundial, ignorando que os marítimos, são trabalhadores essenciais para manter a navegar os 55 mil navios que operam no comércio mundial. Se em tempos normais, períodos prolongados de trabalho a bordo, sem

paragens para repouso e em particular, sem uma estabilização em terra, originam situações anormais de fadiga, com prejuízo da segurança, em tempos de pandemia há riscos acrescidos. Segundo o Engenheiro Álvaro Sardinha “Portugal deixou de ser um país marítimo, no que diz respeito, a este importante sector da economia do mar – o transporte marítimo e os marítimos”. Talvez a confirmar esta afirmação, aqui trazemos uma excepção. Com sede no Funchal há 35 anos a operar, temos o Grupo Sousa, com 715 empregados é um dos principais operadores do sector marítimo-portuário em Portugal. Com a Portgus opera uma frota de 15 rebocadores nos portos de Lisboa, Setúbal, Sines, integrando o consórcio multinacional que opera o Terminal de Cruzeiros de Lisboa e assegura na Madeira, com a Gáslink a operação logística de gás natural liquefeito – GNL. Opera oito navios através de dois armadores a Porto Santo Line com o ferry Lobo Marinho e a GS Lines com linhas regulares marítimas entre Portugal continental, Açores, Madeira, Espanha (Canárias e Algeciras), Cabo Verde (Praia, Mindelo, Sal e Boavista) e Guiné-Bissau. Nas operações portuárias de mercadorias na Madeira detém a OPM e em parceria no Terminal de Santa Apolónia em Lisboa. Em termos logísticos dispõe e opera terminais da Logislink nos Açores, Alverca, Madeira e Matosinhos. O Grupo Sousa detém ainda os transitários Logislink e Marmod. Em 2019 tiveram uma facturação de 169 M€, capital próprio 233 M€ e activo de 271 M€. Por sua vez no sector das pescas em Portugal, uma voz que sabe do que afirma, como é o caso do Dr. Carlos Sousa Reis, ex-Presidente do INIP e do IPIMAR, é perentório a afirmar, em recente entrevista ao jornal Economia do Mar “que desde a entrada na CEE/UE a política das pescas seguida, tem sido um suicídio. Não sabemos pescar, não queremos pescar e, como se não fosse pouco, deixamos os nossos recursos serem


também delapidados por terceiros”. Mundialmente a indústria dos cruzeiros por mar, em números de 2018 gerou quarenta milhões de USD, com o transporte a nível mundial de 26.7 milhões de passageiros em 386 navios. As regiões mais navegadas foram o Carib/Bahamas com 38,4 %, Asia / Pacifico com 15.1 %, Mediterraneo com 14,2 %, Europa Norte / West 9,4 %, Alaska 4,0 %, Austrália 4,0 %, Costa West / México 3,3 %, América do Sul 2,1 %, Canárias 2,1 %. Interessante ainda será indicar, em relação a 2018, quais os maiores grupos de companhias com navios de cruzeiro, onde a maior é a Carnival Corporation com 105 navios, a Royal Caribean com 52 navios, a Norwegian Cruise Line com 26 navios, a MSC com 15 navios e a Genting Hong Kong com 9 navios. Todos estes grupos, alimentam a intenção de logo que possível, voltarem a ter os navios a operar, já com guidelines, estando envolvidos em tarefas protocolares de segurança, detalhes de saúde, práticas sanitárias, controle das excursões a terra, protecção sanitária dos passageiros e das tripulações, exigindo rigorosos testes antes do embarque, planos de contingência no caso de infecção positiva a bordo, gestão do ar ambiente com estratégias de ventilação, para garantir o ar fresco a bordo e onde necessário usar filtros com outras tecnologias que mitiguem o risco. De referir ainda a assistência médica a bordo, com disponibilidade de camarotes para isolamento e outras medidas operacionais, além de assegurarem acordos com entidades privadas, para quarentenas em terra, com assistência médica e transportes. Apesar dos Grupos terem perdas de valor, que nalguns casos atingiram os 2/3, os custos para implementar todas as acções requeridas para um reinício seguro da actividade, são desvalorizados. Em Portugal saudamos o aparecimento da Mystic Cruises S.A. que é uma empresa nova, com grandes ambições. Com um navio actualmente a operar o World

Explorer e já com mais dois em fase final de construção (World Voyager e World Navigator) com mais quatro navios em projecto, procura colocar-se no Mercado internacional dos navios de cruzeiro, para 200 passageiros e 112 tripulantes, numa altura em que com as limitações impostas pela crise, só por medo, não se investe mais no homem do mar português. Confirmado que está a ser um exemplo do saber fazer, respeitando imperativos da cultura ética, documentados pelo mérito das instituições de formação para o Mar. Tendo ao seu alcance técnicas de navegação, embarcações e instrumentos náuticos cada vez mais desenvolvidos e aperfeiçoados, tem na qualificação universitária do ensino, um acto de rigor, numa época de desordem global crescente. O Clube de Oficiais da Marinha Mercante, assumindo também preocupações na área do saber, acaba de editar a 2.ª edição do livro Segurança a Bordo dos Navios da autoria do prestigiado Capitão da Marinha Mercante J.J. Rocha Ramos. Esta obra que

contou com o patrocínio da Mystic Cruises S.A. é fruto de uma cuidadosa investigação do autor sobre a matéria, associada à variada experiência profissional e ao intimo contacto com as normativas internacionais sobre segurança a bordo dos navios, decorrentes das rápidas alterações ocorridas neste contexto, pelo que se tornou inevitável a sua actualização, de molde a satisfazer os actuais requisitos em vigor. Estamos perante um livro que serve de referência aos actuais e futuros tripulantes, visando um bem maior que é a segurança que envolve todas as pessoas embarcadas, o navio e o meio ambiente. Aqui deixo ao Cte Rocha Ramos o meu mais profundo agradecimento, por todo o esforço e sacrifício, necessários para dar forma a este notável livro. Não restem dúvidas que o homem do mar português é alguém experimentado, pronto a participar na reconstrução da nova ordem internacional, quando a desordem global for vencida.

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OS LEMES DOS NAVIOS NÃO SÃO TODOS IGUAIS? PARTE 2

ANTÓNIO COSTA

d) Outros tipos de lemes Podemos encontrar, de forma menos frequente, outros tipos de leme. Estão neste grupo os seguintes: i) Leme de portal ou Gate Rudder O Gate Rudder é um novo conceito de sistema de leme duplo, inventado pelo japonês Noriyuki Sasaki, no qual cada um dos lemes assimétricos está localizado ao lado do hélice para poder aproveitar os benefícios de um dispositivo de jacto acelerado. As portas podem ser controladas de forma independente, através de uma madre por cada uma. Devido ao efeito de canalização das duas portas, o sistema pode obter excelente desempenho, não apenas em manobrabilidade, como, também, conseguindo um desempenho propulsivo melhorado. Os seus construtores conseguiram garantir uma redução de 14% no consumo de combustível nos testes oficiais, embora em operação essa redução possa atingir os 25%, quando comparado com o sistema convencional de idêntico navio e que opera nas mesmas rotas. ii) Lemes de cilindros rotativos ou Leme de Borg

Este conceito possui um cilindro rotativo no bordo de vante do leme. Quando em operação, o leme pode ser accionado até os 90 ° BB ou EB. Um navio equipado com este arranjo de leme é o ro-ro “Rabenfels” de 14 300 toneladas, da Hansa Shipping. CIMA Figura 13: O leme de portal actua como um poderoso propulsor de popa, melhorando consideravelmente a capacidade de manobra e reduzindo qualquer necessidade de rebocadores ao atracar ou largar. Figura 15: Leme Pleuger – consiste num pequeno hélice eléctrico embutido no leme e que amplia o efeito deste. Muito usado em navios especiais, p.ex. os hidrográficos. BAIXO Figura 14: O efeito Magnus fornece manobrabilidade máxima ao operar a baixas velocidades.

O cilindro, neste navio de 195m de comprimento (LBP), tem 3 m de altura e 0,50 m de diâmetro. Gira a 300 rpm quando o leme está a 75 ° BB&EB. O cilindro pode girar no sentido antihorário e horário e o navio gira no espaço do seu próprio comprimento. O arranjo deste leme usa o efeito Magnus para dirigir o navio, segundo o qual, um corpo cilíndrico, que gira dentro de um fluido, desenvolve uma acentuada força lateral em ângulo recto à direcção do fluxo do fluido. A força de giração aumenta, rapidamente, à medida que a rotação do cilindro aumenta. iii) Leme activado ou Leme Pleuger Talvez um dos mecanismos de leme mais inovadores. Pensemos num navio grande demais para ser manobrado em determinada bacia, com restrições de tamanho e espaço, de tal forma que, dificilmente, o navio poderá usar o seu hélice durante a manobra. Esta situação, infelizmente, ocorre bastas vezes. Um leme Pleuger (ou activado) tem um pequeno hélice auxiliar nele alojado, accionado por um motor. Accionado, apresenta uma força propulsiva na direcção da guinada, o que lhe dá uma enorme vantagem evolutiva. Também pode ser usado em condições normais, no entanto, quando em funcionamento, o hélice principal do navio não deve ser operado em simultâneo. iv) Leme Oertz Tem a secção transversal hidrodinâmica (em forma de uma gota de água) para melhor dirigir a passagem dos filetes líquidos. A porta do leme trabalha por detrás de uma peça fixa que lhe completa a forma hidrodinâmica e serve de cadaste exterior do casco. Foi patenteado em 1925 pelo engenheiro alemão Oertz. e) Adaptações especiais i) Leme de tubeira ou leme Kort É constituído por um anel móvel de aço ao redor de um hélice para o tornar mais eficiente. Ele pode girar cerca de 35° para

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DIREITA; Figura 16: Sistema de leme Oertz, uma importante inovação à época, que permitia a melhoria considerável do desempenho do hélice, reduzindo o turbilhão.

BB&EB. As vantagens são óbvias ao aproveitar o fluxo do hélice em jacto, além de permitir maior capacidade de manobra quando se desloca a ré. Não necessita de instalar um leme convencional, embora em embarcações que neces-sitam de maior capacidade de manobra possam ser equipados com um apêndice tipo Becker. Este leme melhora a capacidade de manobra a ré e círculos de giração mais reduzidos. ii) Leme de proa Os navios que precisam dar ré por longas distâncias estão equipados com um leme de alheta integrado à proa. O ferry ferroviário “Skane” está equipado com um leme deste tipo. O leme de proa possui abas activadas hidraulicamente, que ladeiam o bolbo da proa que, em serviço normal, ficam completamente encostadas contra o casco. Somente quando o navio é obrigado a dar ré por maiores distâncias e a velocidades de 5 nós ou mais, o sistema é activado. iii) Sistema de leme de proa rotativo O sistema de leme de proa rotativo é baseado no princípio do Efeito Magnus. A pressão diferencial é gerada através do cilindro rotativo de afastamento que opera na corrente de entrada de água, resultando em efeito de atrito. Esse efeito de impulso e giração criado lateralmente é maior que o do leme convencional. O sistema de leme rotativo de proa foi desenvolvido por A. Van der Velden, especialmente para embarcações de navegação interior com grandes áreas vélicas.

CIMA: Figura 17: O tubo Kort, que envolve o hélice, controla a direcção e a velocidade dos filetes líquidos que passam dentro e fora dele. BAIXO: Figura 18: Leme de proa – Embora incomum, existem em alguns navios. Na foto, o da esquerda está completamente recolhido.

TIPOS DE SUPERFÍCIES DE CONTROLO DA PORTA DO LEME As forças desenvolvidas por um leme (ou superfície de controlo) dependem, fundamentalmente, da sua área, perfil e razão (razão entre altura e comprimento), formato da secção, quadrado da velocidade de entrada, densidade e viscosidade da água e ângulo de ataque SET-OUT 2020 | BORDO LIVRE 159 | 11


ou incidência do leme. Os perfis do leme são as formas seccionais do leme. O perfil é descrito pela curvatura do leme, a posição da curvatura máxima, a espessura do leme, a posição da espessura máxima e o raio do bordo de vante. Vários modelos de curvatura e de espessura formam diferentes séries ou famílias de leme. A maioria dos perfis de leme existentes foi projectada, originalmente, para aplicação aeronáutica como a série NACA. Também existem perfis projectados, especificamente, para os navios, como as séries IFS e HSVA. A figura 19 ilustra os perfis típicos de leme marítimo mais utilizados. O projectista tende a seleccionar a geometria e perfil apropriado do leme para poder aumentar a sua eficácia ao máximo, levando a um desempenho diferente na capacidade de manobra do navio, consumo de combustível e cavitação do leme. a) Perfil plano Os perfis de

chapa

planos

são,

normalmente, rectângulos em duas dimensões (bordo quadrado ou square head). São os dispositivos mais rudimentares e os mais fáceis de produzir. b) Perfil NACA Os perfis NACA são os mais amplamente aplicados. Também são aplicados a outras estruturas em forma de fuso, como hélices. A série NACA é o perfil mais minuciosamente investigado e, comumente, considerado e referenciado em estudos aerodinâmicos e hidrodinâmicos. c) Perfil HSVA Os perfis HSVA foram desenvolvidos para lemes marítimos pela Hamburg Ship Model Basin (Hamburgische Schiffbau Versuchsanstalt GmbH (HSVA)). Considerando as condições de trabalho do leme, a série HSVA foi projectada para ter uma boa distribuição de pressão, reduzindo a cavitação inicial. d) Perfil IFS Os perfis IFS foram desenvolvidos para obter uma inclinação acentuada da curva

de giração, a perda de sustentação a um grande ângulo e um alto coeficiente de giração. Comparado aos perfis HSVA, os perfis IFS podem gerar um pouco mais de sustentação, induzir maior resistência e sofrer menos cavitação. e) Perfil cauda de peixe (fishtail) Os perfis de cauda de peixe, também conhecidos como lemes Schilling, são normalmente desenvolvidos com base nos perfis convencionais NACA, HSVA e IFS com perfil de caudas de peixe no bordo posterior. A parte côncava, onde o perfil original se liga à cauda, é suavizada para ter uma melhor distribuição de pressão que atrasa a perda de sustentação. Os lemes de cauda de peixe podem, efectivamente, gerar maior sustentação, melhorando a manobrabilidade do navio. f) Perfil em cunha (wedge tail) Os perfis de cauda em cunha são perfis simplificados de cauda de peixe, que normalmente, têm um ponto côncavo agudo. As características hidrodinâmicas deste perfil estão proporcionadas ao tamanho da cauda e à espessura do leme.

OUTROS SISTEMAS DE DIRECÇÃO

Existem sistemas que, muito embora não sejam aparelhos de leme, permitem a direcção e governo dos navios. Na verdade, são propulsores, cujo princípio de funcionamento permite a função de direccionamento em simultâneo. Estão neste grupo 2 tipos principais: a) Propulsor azimutal ou Azipod Azipod é um inovador sistema de propulsão de alguns navios. O seu nome provém do inglês (Azimuthing Podded Drive) e é designado em português como Propulsor Azimutal. A ideia de colocar um motor eléctrico dentro de uma Figura 19: Diferentes perfis de leme características hidrodinâmicas diferentes.

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têm


cápsula de propulsão submersa já existia há algum tempo, mas só no final da década de 1990 foi experimentado o conceito com sucesso. Consiste num propulsor accionado electricamente com um motor CA incorporado numa unidade azimutal (com capacidade para girar 360º) “casulada” e acoplada ao casco do navio, que acciona directamente um hélice de passo fixo. Este conceito elimina a necessidade de leme já que ao dirigir directamente com o manípulo de comando electrónico (tipo joystick), o azipod projecta o fluxo de água no sentido desejado. É o sistema de propulsão de eleição para os grandes cruzeiros da actualidade, com enormes superfícies vélicas e que necessitam de capacidade de manobra acrescida.

DE CIMA PARA BAIXO Figura 20: Cada sistema de propulsão Azipod é projectado e optimizado, individualmente, a cada navio, para obter o máximo desempenho. Figura 21: O princípio hidrodinâmico que gera o “thrust” no “Voith Schneider Propeller” baseia-se na diferença de pressão gerada entre os bordos das lâminas do propulsor.

b) Sistema de propulsão cicloidal ou Voith Schneider propeller O sistema de propulsão cicloidal encontrado no Voith Schneider Propeller (VSP) é composto por um conjunto de lâminas verticais móveis instaladas num disco rotativo paralelo ao fundo do navio ou embarcação. O disco gira em velocidade baixa e constante, produzindo uma força de intensidade e sentido controlados através do ângulo (passo) de cada uma das lâminas. O conceito é semelhante ao do hélice de passo controlado (variável), com a diferença de que o posicionamento das pás é transversal à força exercida. É um sistema, maioritariamente, utilizado em rebocadores e navios de apoio inshore e offshore, devido à sua ultra manobrabilidade.

DEZEMBRO DE 2019 Fontes: ABB Marine; Becker Marine Systems; Damen Marine & Van der Velden Marine Systems; Marine Insight; “Marine Rudders and Control Surfaces”, de Anthony F Molland & Stephen R Turnock; MM-OffshoreGmbH Rudder Systems; Voith Group; “Wärtsilä Encyclopedia Of Ship Technology”, 2nd Edition.

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NOTÍCIAS MALTA RECUSA O DESEMBARQUE DE PASSAGEIROS DO MSC GRANDIOSA - do blogue Mar e Marinheiros, de António Costa

Os passageiros do cruzeiro da MSC Cruzeiros, MSC Grandiosa, não foram autorizados a desembarcar em Malta devido à suspeita de um caso de Coronavírus (COVID-19). O navio atracou em Malta na manhã de sexta-feira, 16 de outubro, e não foi autorizado pelas autoridades de saúde a desembarcar os seus convidados em Valletta depois que o capitão notificou as autoridades maltesas de que havia um caso suspeito de COVID-19 a bordo. O MSC Grandiosa foi autorizado a atracar em Malta para apenas abastecer, tendo os seus passageiros permanecido a bordo. O navio já deixou o país. Este é o primeiro incidente em que um navio de cruzeiro foi impedido de desembarcar passageiros desde a reabertura das viagens para Malta. O MSC Grandiosa visita o país como parte da sua rota do Mediterrâneo Ocidental, na qual fez escala em vários portos italianos desde 16 de agosto.

GIGANTE DA CMA CGM MOVIDO A GNL BATE RECORDE MUNDIAL - do blogue Mar e Marinheiros, de António Costa

O CMA CGM Jacques Saade, de 23.000 TEU, o maior navio de contentores movido a GNL do mundo, estabeleceu um recorde mundial para o número de contentores cheios carregados num único navio. À sua partida de Singapura a 12 de outubro, o novo navio “almirante” da 14 | BORDO LIVRE 159 | SET-OUT 2020

CMA CGM, principal armador francês, transportava um recorde de 20.723 contentores cheios a bordo. Depois de se juntar à frota do grupo em 22 de setembro, o CMA CGM Jacques Saade está agora na sua primeira viagem na Linha Francesa da CMA CGM na Ásia (FAL 1), ligando a Ásia à

Europa. Este novo recorde foi descrito pela CMA CGM como “uma importante conquista operacional e comercial” para um navio projetado para preservar a qualidade do ar e acelerar a transição de energia na indústria naval.


SINGAPURA RETOMARÁ OS CRUZEIROS SEM ESCALAS PARA RESIDENTES - do blogue Mar e Marinheiros, de António Costa Duas empresas de cruzeiros receberam luz verde para oferecer "cruzeiros para lugar nenhum" a partir de Singapura, com início em novembro, após o desenvolvimento de um conjunto de diretrizes de segurança para evitar a disseminação do coronavírus a bordo. Serão cruzeiros de ida e volta, mas sem escalas. As Genting Cruise Lines e Royal Caribbean International, que fazem porto de armamento em Singapura, farão parte de um piloto de "cruzeiro seguro" que atenderá apenas aos residentes de Singapura com uma capacidade reduzida a 50% da capacidade do navio, segundo foi explicado pelo Singapore Tourism Board (STB) numa declaração na quinta-feira (8/10). O “World Dream” da Genting Cruise Lines começará a navegar a 6 de novembro, enquanto o navio “Quantum of the Seas” da Royal Caribbean começará a navegar em dezembro.

AS "FORÇAS DAS TREVAS" EM TORNO DOS ADVOGADOS DO CAPITÃO DO WAKASHIO - do blogue Mar e Marinheiros, de António Costa Na cena de abertura do filme “All the Presidents Men”, o mais famoso denunciante da história (Garganta Funda) dá ao jornalista de investigação Bob Woodward do Washington Post alguns conselhos críticos: “Siga o dinheiro”. Woodward seguiu o dinheiro e usou essa evidência para derrubar o homem mais poderoso do mundo. Agora, outro jornalista de investigação – veterano da BBC e economista em Harvard Nishan Degnarain – está a seguir o

Todos os passageiros terão que ser testados para Covid-19 antes do embarque como parte do programa “CruiseSafe” do STB, desenvolvido em conjunto pelo órgão de classificação global DNV GL. Também terão de cumprir medidas de gestão seguras, como uso de máscara e distância social de 1m entre grupos de passageiros. Os padrões “CruiseSafe” incluem: - Medidas de controlo de infeção em todas as fases da viagem do passageiro, incluindo um teste obrigatório de Covid-19 antes do embarque. - Protocolos de limpeza e higienização

rigorosos e frequentes nos navios. - Medidas de gestão segura alinhadas com a política nacional vigente no momento da viagem - Garantir 100 por cento de ar fresco em todo o navio, sem recirculação de ar. - Reduzir a capacidade do navio para permitir um distanciamento seguro suficiente. - Estabelecer medidas a bordo para desencorajar o contato próximo e a mistura de grupos de passageiros. - Planos de resposta de emergência para incidentes relacionados com a Covid-19.

rasto do dinheiro que está a “fluir” no seguimento do derrame de óleo protagonizado pelo M/V Wakashio e, o resultado, pode vir a trazer enormes implicações para a indústria de transporte marítimo. A criminalização continuada do pessoal marítimo é um problema que vem crescendo desde que o capitão Joe Hazlewood foi preso em 1989, depois do petroleiro Exxon Valdez ter encalhado no Alasca. O problema cresceu até atingir níveis tão ridículos que já há capitães de navios ancorados a serem presos. Eo problema tem-se agravado muito. Hoje, até, se não for possível culpar o capitão, ainda se pode levar a sua viúva para as audiências. Muito tem sido escrito sobre esse problema. Menos tem sido escrito sobre o simples fato de que os armadores

quase sempre são considerados culpados nas investigações, mas nunca são presos. O que, AINDA não foi escrito é que culpar o capitão beneficia financeiramente os proprietários dos navios e as suas seguradoras. “Infelizmente, o marinheiro envolvido num qualquer acidente grave é sempre o alvo mais fácil e vulnerável”, diz Michael Chalos, que defendeu com sucesso o capitão Hazlewood. “Os interesses mais poderosos, que muitas vezes são responsáveis pela causa raiz do acidente, permanecem anónimos e unidos na proteção dos seus interesses e agendas, transferindo, injustamente, a culpa para os marinheiros infelizes que não têm os recursos, financeiros e outros, para se defenderem. Para esses interesses, a cadeia de causaSET-OUT 2020 | BORDO LIVRE 159 | 15


lidade começa e termina com o marítimo.” Não vale a penas debruçar-nos muito profundamente nos problemas dos derrames antes de observar esta declaração lapidar "A IMO estima que mais de 90 por cento de todos os incidentes de poluição marinha são devidos a erro humano". A IMO é a Organização Marítima Internacional, que tem uma folha sinopse oficial para as descrições dos incidentes e que a fechar tem uma secção titulada “Fatores Humanos” que, aparentemente, tem preenchimento obrigatório. Frequentemente, é a seção mais longa na descrição do incidente. Hoje, não podemos mergulhar em notícias sobre incidentes de navios sem ouvir essas palavras reiteradas por policias e investigadores como justificação para prender capitães. Se apenas lermos as manchetes, prender os capitães é uma decisão lógica. Mas quem escreve essas manchetes? Manchetes alegando que Joe Hazelwood do Exxon Valdez "estava bêbado", John Cota do Cosco Busan "estava drogado", Michael Davidson do El Faro "era incompetente" e Francesco Schettino do Costa Concordia era "um egomaníaco". Essas são as manchetes da mídia, o problema é que muitas vezes não são verdadeiras. A este nível, é fácil culpar os capitães pelos incidentes por “erro humano”. Mesmo depois das manchetes terem sido provadas falsas em tribunal e a respetiva licença profissional lhe ter sido devolvida. Ninguém pode negar que o capitão de um navio encalhado cometeu alguns erros. “Nesta altura, culpar derrames ou outros problemas com petroleiros por “erro humano” é um lugar comum estéril,” disse o ex-armador, chefe de departamento do MIT e denunciante da indústria de

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navegação, Dr. Jack Devaney. “Os petroleiros são criados e operados por humanos. Qualquer problema com qualquer sistema feito pelo homem é, em última análise, um erro humano, mas "erro humano", só por si, não nos diz nada. Mas, pior do que isso, 'erro humano' é, geralmente, uma frase de código para 'culpar a tripulação'.” Segundo o Dr. Jack Devaney, “As Sociedades Classificadoras – e os seus parceiros, os Estados de bandeira – competem e dependem financeiramente das entidades que deveriam regular: os estaleiros que constroem os petroleiros e os armadores que os operam.” Mas como é que esta “causa ou imputação” beneficia, financeiramente, o armador e a seguradora? A negligência da tripulação é um risco segurado. A negligência do proprietário não é. Neste seu livro inovador “The Tankship Tromedy”, o Dr. Devaney mostra, de forma clara, como algumas das organizações sem fins lucrativos mais lucrativas do mundo, Classification Societies, obtêm enormes lucros após as tragédias. No seu último artigo, Nishan Degnarain descreve os argumentos do Dr. Devaney e vai mais longe, seguindo o dinheiro de volta, até aos armadores. “Em alguns dos maiores casos marítimos da história”, escreve Degnarain, “Muitas vezes tem sido o capitão de grandes navios que foram colocados como bodes expiatórios pelas próprias companhias de navegação que os empregam e ganham biliões de dólares, anualmente, pelos seus leais serviços.” O artigo da Forbes aprofunda a investigação, explicando que “Culpar a tripulação” tem sido a resposta para muitos proprietários de navios, operadores,

seguradoras marítimas e reguladores de “bandeiras de conveniência”, em vez de abordar alguns dos maiores problemas de segurança sistémica no mundo da navegação marítima, que tem estado sem controlo por tanto tempo. Por quê? De acordo com Degnarain e Devaney, existem três razões: 1) os erros da tripulação são mais fáceis de reconhecer, em comparação com o projeto de engenharia deficiente do navio, a manutenção deficiente e a aplicação inadequada das regras. 2) os peritos e inspetores de navios são incentivados a se concentrar apenas nas questões superficiais e operacionais, e não nas questões sistémicas subjacentes. 3) culpar a tripulação é a saída mais fácil para evitar a identificação da culpabilidade dos armadores, construtores ou responsáveis pela manutenção deficiente do navio. Como em qualquer bom filme, não se quer revelar o final, mas ... no caso do M / V Wakashio, a combinação do diploma de economia de Harvard de Degnarain com a sua experiência de jornalista de investigação revelou uma história tão estranha e distorcida quanto qualquer blockbuster (caça-fantasmas) de Hollywood. Leia um pouco mais do que está a suceder na Ilha Maurício, no seguimento do acidente e derrame do M/V Wakashio, em https://www.forbes.com/sites/nishandegnarain/202 0/10/07/the-dark-forces-surrounding-the-captainslawyers-in-mauritius-wakashio-oil-spill-shipcase/#54a0097c49ce


CÂMARA MUNICIPAL DE ÍLHAVO INAUGUROU A INSTALAÇÃO "RISCAS DA COSTA NOVA" -- do blog Marintimidades

"Riscas da Costa Nova", do artista Paulo Neves, homenageia as gentes da localidade Cabeças de peixe “a sair da ria ou do mar”, que “espreitam para ver as pessoas a passar”, vieram embelezar a rotunda da Costa Nova. Sob o título “Riscas da Costa Nova”, por incluírem as riscas das casas típicas, a instalação do artista Paulo Neves apresenta oito esculturas que celebram a história e a identidade das gentes da terra. O escultor, natural e residente em Cucujães, disse-se “encantado” quando, há quase dois anos, o presidente da Câmara Municipal de Ílhavo, o “desafiou” a criar a obra de arte agora inaugurada formalmente, em 26 de Setembro de 2020.

ANA MARIA LOPES

CIMA: Em fase de montagem… BAIXO: Em dia de inauguração…

Paulo Neves disse que esta instalação pode ser “o início” de “um parque de esculturas” que quer instalar num terreno ali perto. “Será um ponto de referência”, considerou o autarca ilhavense sobre a instalação, opinando que “muita gente virá à Costa Nova para ver a obra de arte do Paulo”. Realçando que “a cultura também faz parte da identidade de um povo”, salientou que as esculturas “acrescentam à beleza do local”. Fernando Caçoilo destacou o tema dos peixes, enfatizando que é uma riqueza local que continua a ser valorizada, através do Mercado do Peixe, que promove a actividade de pescadores e vendedores, e de uma “oferta gastronómica” que atrai cada vez mais gente do exterior. SET-OUT 2020 | BORDO LIVRE 159 | 17


EM MARÉ DE ESTRATÉGIAS A DEFESA DO PORTO DE LISBOA

OLIVEIRA GONÇALVES

O porto de Lisboa está entalado entre o casario e o rio, numa estreita faixa de terra que o torna pouco competitivo. Tem pouco espaço para manuseamento e armazenamento de cargas (em especial contentores) e um dificílimo acesso rodoviário (normalmente congestionado) e ferroviário (praticamente inexistente). Não tem utilizado o transporte fluvial também. A um bom porto exige-se que a bacia portuária seja tranquila, que tenha as profundidades adequadas aos navios a receber e que não seja afetada por processos de assoreamento graves. Por tranquilidade entende-se principalmente ausência de agitação, o que Lisboa oferece gratuitamente por ser um porto natural. Nos portos de costa aberta essa tranquilidade tem que ser conquistada mediante obras de abrigo, em regra de custo muito elevado. Fala-se agora de construção de grandes quebra-mares e grandes dragagens oceânicas noutros 18 | BORDO LIVRE 159 | SET-OUT 2020

portos. Além de custos tremendos, os quebra-mares comem as praias a sul, que para serem protegidas obrigam à construção de novos quebra-mares e assim sucessivamente. As grandes dragagens oceânicas, para além do impacto ambiental, ou são permanentemente dragadas ou a natureza se encarrega com o tempo de fazer voltar tudo ao mesmo. Parece que não aprendemos nada com os erros do passado. A Grande Lisboa tem cerca de um terço da população do país. A logística moderna procura levar o transporte marítimo o mais próximo possível da porta do consumidor ou do exportador (porque é mais barato e mais amigo do ambiente). Os armadores procuram portos onde possam fazer negócio e transhipment simultaneamente. Já no tempo dos reis Filipe se pensou em abastecer Madrid por barcaça. Os europeus hoje transportam carga e passageiros por rio entre Le Havre e Marselha ou entre Le Havre e o Mar Negro. Se o tivéssemos feito o Tejo teria hoje mais água seguramente. Algumas Administrações Portuárias maltrataram este porto de Lisboa. Exemplos: 1 – Permitiu-se que fossem dragadas areias na cova do vapor. Alterou-se com isso o escoamento natural do Tejo abrindo um canal junto à costa, o que obriga a que se tenha que dragar por vezes a barra sul e a tentar abastecer de areia as praias da Costa da Caparica com resultados modestos. Alteraram também o formato das goladas, criando agitação nos cais da Silopor Trafaria e desprotegendo a margem direita do Tejo por fora da Torre de Belém.

2 – Cais de contentores do Beato – Com um layout daqueles, estava na cara que os cais a jusante daquela estrutura necessitavam de dragagens constantes para poderem ser utilizados. 3 – etc.etc. Tal como aconteceu em Rotterdam, Antuérpia ou Londres, torna-se necessário retirar o porto do centro da cidade. É necessário políticas que assegurem que o sistema de transportes seja seguro, fiável e com qualidade ambiental. Há que procurar outros locais onde estabelecer o porto. Humildemente sugerimos o seguinte:

HIPÓTESE I

Levar o comboio de mercadorias de 750 metros de comprimento à margem sul entre Cacilhas e a Silopor Trafaria. A ligação à rede ferroviária nacional farse-ia próximo da estação do Pragal. O túnel de ligação (700 mts) começaria a norte junto à fábrica de farinhas e óleos de Palença, e a Sul entre o Pragal


e a Fomega. O túnel rodo/ferroviário eventualmente podia correr por sob a estrada existente. Fazer um terminal marítimo na zona que engloba os antigos cais da SNAB, o cais do Olho de Boi (CPP) e o cais da Sociedade de Reparação de Navios (SNAPA). Este cais teria fundos de pelo menos 20 mts de sonda reduzida. Estaria livre de dragagens para sempre. É uma zona protegida das marés de vazante. Não haveria intrusão de vistas, já que os pórticos e os contentores ficariam protegidos pelo morro de Almada. Fácil escoamento dos produtos por rodovia, com vias rápidas e autoestradas. Ligação ferroviária fácil e barata. Transporte fluvial. Alternativa à exportação de carros da Autoeuropa. Os portos marítimos juntam o desenvolvimento do porto a plataformas logísticas multimodais selecionadas no seu hinterland: Barreiro A pouco mais de uma milha de distância há um enorme terrapleno com grande frente rio, ideal para cais de apoio ao terminal marítimo onde se pode fazer grupagem / desgrupagem de contentores, preparar/armazenar e receber lotes para navios de grande porte que escalassem o terminal marítimo. Podia abastecer o terminal marítimo “just in time” por barcaça, comboio ou camião. Fazendo um cais que ligasse o cais da Quimatex aos cais comerciais do Barreiro, podia receber todos os navios que abastecem as ilhas dos Açores e da Madeira, bem como todos os navios que fazem o short sea com os portos do norte da Europa e do Mediterrâneo

europeu ou africano, com investimento diminuto.

NOTA

Além do Barreiro, também se podem construir cais comerciais na Bobadela, Alverca ou Castanheira do Ribatejo com quase as mesmas vantagens e pouco custo. Há mais de quinze anos liderámos um trem de três reboques que levou uma estrutura mandada construir em Cadiz pela “Dragados & Constructiones” que produzia 50 caixões de vinte metros por dia para fechar uma baía a SE da entrada do porto de Cartagena para alargamento do porto. Não sei se ainda existe. Os grandes portos internacionais privilegiam os prospectivos arrendatários que se propõem mover a carga por meios não rodoviários.

HIPÓTESE II

Os Catalães desviaram o leito de um rio em Barcelona para poderem ter aeroporto/porto marítimo e comboios juntos. O aeroporto do Montijo está em construção e para termos o mesmo que os catalães bastaria enxugar o baixo da

Boca da Aperta e construir um cais para terminal marítimo na cala de Samora. Para obter 14 mts de sonda reduzida, as areias extraídas permitiriam enxugar o baixo. A cala é direita e natural, teria tendência para se manter por muito tempo. Tudo fica fora da área RNET.O comboio está ali perto. Relativamente ao edificado, o povo e o turismo se encarregarão de lhe dar o uso conveniente. Há que salvaguardar a “atmosfera” portuária no re-desenvolvimento das áreas portuárias antigas. Aumenta a atenção das entidades europeias e internacionais para o “soft value of seaports”.

POST SCRIPTUM

Um dia lemos num jornal diário que a APL ia fazer um grande investimento na Doca de Pedrouços para trazer a Lisboa a Volvo Racing. Achámos ser nosso dever alertar quem de direito para as especificidades da doca pelo conhecimento de uso que tínhamos dela. Deslocámo-nos à sede da APL, identificámo-nos e dissemos ao que íamos. Um exmº sr. Arquiteto mandou dizer pela segurança que escrevêssemos pormenorizadamente por escrito o que nos levara lá, para ele decidir se nos recebia ou não. Quem é que quer perder tempo com um capitão da M.M. comandante de praticamente todo o tipo de navios mercantes, piloto da barra em seis portos para tratar de assuntos de mar? Após o fracasso do tal investimento alegaram que tinha sido devido ao surgimento de um rio subterrâneo e outras desculpas do género, ouvimos dizer.

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A SEGURANÇA DO NAVIO

PORTA-CONTENTORES NA ORDEM DO DIA -- do blog Mar e Marinheiros Um webinar, organizado pela Thomas Miller, juntou seguradoras mútuas, especialistas em frete contentorizados e seguradoras de proteção e indemnização, como as TT Club e a UK P&I Club, tendo sido revelada uma ampla gama de fatores importantes para a operação segura de navios de contentores e a segurança das pilhas de contentores que carregam. Durante o seminário foram analisados, em detalhe, uma panóplia complexa de parceiros envolvidos nas múltiplas operações e concluiu-se que cada uma deve ser considerada não só de forma individual, como coletivamente, com a finalidade de manter o somatório de incidentes ao mínimo. Ao presidir a sessão, o Diretor de Prevenção e Perdas do P&I Club do Reino Unido, Stuart Edmonston, definiu o cenário: “Incidentes de perda de contentores chamam a atenção. No cômputo geral, a indústria perde uma quantidade, relativamente, pequena de cerca de uma unidade por 160.000 transportadas, mas cada perda tem significado para uma série de partes interessadas, incluindo os operadores de navios, interesses de carga, seguradoras e, não menos importante, para o ambiente natural, tanto no mar quanto em terra”. Uma revista pelos procedimentos durante o webinar, foi destacada a ampla diversidade de influências que podem levar ao colapso de pilhas em navios e à potencial perda de contentores no mar. O Diretor de Gestão de Risco do Peregrine

Storrs-Fox TT Club procurou resumi-los. Eis os principais: • Embalamento e correta identificação da carga no interior do contentor, • Estrutura do contentor, • Plano de estiva do navio e a sua implementação, • Peação (desempenho e equipamento), • Roteamento de viagem, • Princípios de navegação e técnica de marinharia, Arquitetura naval e forças dinâmicas.

De entre os fatores considerados, no que concerne a integridade da carga, e que afetam este tipo de sinistro, temos a declaração incorreta do peso de carga embarcada, bem como a ultrapassagem dos limites do contentor, em simultâneo com a qualidade da estrutura e manutenção do contentor. Os fatores a bordo, vão desde a inspeção adequada e manutenção regular dos acessórios do convés, barras de travamento, travas de torção e pontes de amarração, até o uso de dados precisos para prever o rolamento paramétrico e outros movimentos do navio, para além da incidência da situação conhecida como “navio rígido”, proveniente de possível conceção e construção menos conseguidas. A situação de chicotadas que os navios frequentemente experimentam pode ter um efeito significativo nas pilhas de contentores, altas e isoladas. A própria natureza da moderna indústria de transporte contentorizado, os navios muito grandes e sofisticados e o envolvimento das várias partes, colocam em

evidência o enorme desafio que envolvem a navegabilidade e a estiva adequada. Some-se a isso os padrões variáveis das exigências por parte dos Estados de bandeira e da formação e capacidade das tripulações. As próprias operadoras das indústrias de transporte contentorizado e de logística têm intensificado o seu apoio à segurança do transporte, lançando uma campanha coordenada para aumentar a consciencialização e as boas práticas na embalagem segura de contentores. Os navios porta-contentores têm vindo a ser construídos em tamanhos cada vez maiores para aproveitar as economias de escala e reduzir despesas como parte do transporte de carga intermodal. No entanto, os navios porta-contentores também estão sujeitos a certas limitações dimensionais. Em primeiro lugar, da disponibilidade de motores principais suficientemente grandes e a disponibilidade de um número suficiente de portos e terminais preparados e equipados para receber dessa envergadura. Além disso, algumas das principais vias navegáveis do mundo, como o Canal de Suez e o Estreito de Singapura, também restringem as dimensões máximas dos navios que podem passar por elas. A capacidade de um navio portacontentores é medida em unidades equivalentes de vinte pés (TEU). Em 2016, Prokopowicz e Berg-Andreassen definiram um porta-contentores com capacidade de 10.000 a 18.000 TEU como Very Large Container Ship (VLCS), enquanto os de capacidade igual, ou superior, a 18.000 TEU como Ultra Large Container Ship (ULCS). Na verdade, as dimensões dos navios são cada vez maiores. Lembremo-nos que foi, apenas, em janeiro de 2015 a inauguração do maior navio porta-contentores do mundo (à época), o MSC Oscar (19.224 TEU). Com o tamanho de quatro campos de futebol, ele pode transportar 19.000 contentores. No entanto, navios de até 22.000 TEU já estão em serviço desde o final do ano passado e a capacidade dos que estão em construção continua a aumentar. A infografia abaixo apresenta o incrível crescimento dos navios portacontentores a partir de 1968.

ANTÓNIO COSTA

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HAZCHECK DETECT -- do blog Mar e Marinheiros

ANTÓNIO COSTA

Nova ferramenta ajuda a Maersk a identificar mercadorias perigosas A Exis Technologies sediada no Reino Unido e a empresa-mãe National Cargo Bureau (NCB), a empresa de inspeção de carga sediada em Nova York, lançaram o Hazcheck Detect, uma ferramenta de triagem de carga para detectar mercadorias perigosas declaradas incorretamente (ou não declaradas) em envios por contentores. O Hazcheck Detect tem como objetivo: Mercadorias perigosas não declaradas – procura cargas que não estejam, convenientemente, declaradas como DG,

procurando itens suspeitos que deveriam ter sido declarados como DG. Mercadorias perigosas declaradas de forma incorreta – procura a carga que, embora declarada como DG, pode não ter sido declarada na categoria DG correta. A nova ferramenta verifica todos os detalhes da reserva procurando palavraschave, valida as regras e destaca as reservas suspeitas para identificar mercadorias perigosas (DG) não declaradas ou erroneamente declaradas. As linhas de contentores que se cadastrarem para utilizar o serviço poderão rastrear as suas reservas e conhecimentos de embarque utilizando as mesmas palavras-chave e regras para tentar localizar mercadorias perigosas erróneas e / ou não declaradas, ajudando assim a garantir a segurança da tripulação, navios e carga. No futuro, também haverá espaço para estender a aplicação da ferramenta para uso noutras aplicações de triagem global não relacionadas com mercadorias perigosas, por exemplo, o transporte ilegal de animais selvagens ou outra carga fora de conformidade. Atualmente, o sistema tem, disponíveis, cerca de 4.500 entradas para cargas declaradas incorretamente e 10.000 entradas para não declaradas. A solução suporta a criação de regras com base em palavras-chave e as regras foram projetadas para garantir que apenas os resultados da pesquisa de interesse sejam retornados para acompanhamento específico. As regras serão continuamente aprimoradas e evoluirão com o uso de aprendizado de máquina e técnicas de IA.

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OS JOVENS E O MAR

VIAJAR COM O COVID Ver a temperatura: Sei que já incluí no ponto anterior, a realidade é que as companhias de cruzeiro estão a pedir aos passageiros que a temperatura seja tirada várias vezes durante a viagem em pontos estratégicos, tais como: restaurantes, espetáculos, excursões, etc… Para ter a certeza de que mantêm a saúde a bordo.

BÁRBARA CHITAS Após a abruta paragem de todos os navios de passageiros pelo mundo fora, alguns já estão a voltar a embarcar passageiros. Aos poucos e poucos as pessoas estão-se a habituar à nova realidade do mundo em que vivemos e a aproveitar as suas férias da melhor forma possível. Algumas empresas começaram por fazer “viagens teste” levando passageiros a navegar por uns dias sem visitar um porto.

O QUE AS COMPANHIAS ESTÃO A FAZER PARA GARANTIR A SEGURANÇA DOS SEUS PASSAGEIROSABORDO? Claro que todos os regulamentos dependem de companhia para companhia, mas irei aqui referir algumas medidas que estão a ser, em geral, postas em prática. O check-in: Mesmo antes de entrar no navio, os passageiros deverão preencher um questionário online. Quando vão embarcar deverão ir a uma hora específica e submeter-se a um questionário mais detalhado feito por um profissional de saúde. Neste check-in também será tirada a temperatura aos passageiros.

Testes ao COVID: Como há a possibilidade de se ter o vírus sem apresentar sintomas, muitas destas empresas estão a fazer testes aos passageiros e também aos seus tripulantes antes de embarcarem. Redução da capacidade de passageiros: A grande maioria dos cruzeiros que estão a operar neste momento, reduziram a sua capacidade para 60%, de forma a garantir o distanciamento social. Agora cada passageiro irá ter mais espaço do que o normal. Mesmo cada espaço dentro do navio, tais como ginásios, teatros, lojas e elevadores terão um limite de pessoas que não poderá ser ultrapassado. Algumas empresas estão a optar por fazer os passageiros terem de marcar com antecedência o horário a que, por exemplo, querem ir jantar, ver um espetáculo ou até ir a um bar, de forma a garantirem a menor concentração de pessoas possível. Alteração no Muster Drill: Em vez de juntar as pessoas todas para praticar a evacuação do navio em caso de emergência, este exercício poderá ser feito através do telemóvel ou televisão. Depois de concluir esta formação, o passageiro deverá dirigir-se à sua Muster Station para fazer Scan com o seu telemóvel de um código que está exposto neste local, de forma a

comprovar que sabe para onde se deverá dirigir em caso de emergência. Uso de máscara: O uso da máscara será muito semelhante ao que experimentamos em terra. Em geral as máscaras são obrigatórias em locais onde a manutenção do distanciamento social seja mais difícil. Alterações nos restaurantes: A fim de evitar que as pessoas toquem nos mesmos talheres e comida, as companhias decidiram eliminar os Buffet como os conhecemos, em que cada pessoa se serve a si mesma retirando a comida com uma colher em que toda a gente toca. Algumas empresas optaram por colocar as refeições já servidas em pequenos pratos para que as pessoas pudessem tirar o prato já preparado, sem haver o perigo de contágio de uns passageiros para os outros. Também nos menus há alterações. Os menus em papel estão a ser substituídos pelos menus em formato digital através da aplicação do cruzeironoseutelemóvel. Alterações nos itinerários: Sendo a evolução do vírus imprevisível, os passageiros terão de se preparar para a possibilidade de os itinerários serem cancelados / alterados durante a sua viagem. Excursões: Irá haver pressão para os passageiros optarem pelas excursões, uma vez que é mais fácil saber o movimento dos passageiros e controlar possíveis contágios. Poderão ser proibidas as visitas aos países de forma própria. A parte positiva é que as excursões terão menos pessoas e poderão oferecer um serviço mais personalizado. Conclusões: De momento, enquanto não há uma vacina para o COVID, estes pontos que referi neste artigo serão a realidade a bordo dos cruzeiros. Há muitas pessoas que sentem que estas medidas são ótimas e que consideram que até torna os cruzeiros das formas mais seguras de viajar. Outros sentem que com todas estas medidas de distanciamento social, fazer cruzeiros perde um pouco o seu encanto, e por esse motivo só pensarão fazer um novo cruzeiro quando tudo isto “passar”.

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CONVOCATÓRIA À ASSEMBLEIA GERAL O Presidente da Assembleia Geral, cmdt. Fernando Ponces de Carvalho, convocou uma Assembleia Geral para o dia 12 de novembro, pelas 17:00 horas, na sede do Clube de Oficiais da Marinha Mercante a fim de discutir e aprovar o Orçamento para 2021 e ainda analisar o Plano de Atividades, conforme convocatória que se segue. Tendo em consideração o atual estado da Covid-19 a Assembleia Geral poderá ser acompanhada por videoconferência acedendo ao seguinte endereço:

HTTPS://MEET.JIT.SI/COMM

PARTE DA INDÚSTRIA QUER ARMADORES A DIVULGAR, PUBLICAMENTE, AS EMISSÕES - do blogue Mar e Marinheiros, de António Costa A Sea Cargo Charter, um grupo de empresas de comércio de energia, agricultura, mineração e commodities, irá, pela primeira vez, avaliar e divulgar o alinhamento climático das suas atividades de transporte marítimo. De acordo com agências das Nações Unidas, a indústria marítima internacional transporta cerca de 80% dos fluxos de comércio mundial e é responsável, anualmente, por 2 a 3% das emissões globais de gases de efeito estufa. Grandes corporações industriais são utilizadores significativos de serviços de transporte marítimo internacional. O transporte marítimo de petróleo bruto, carvão, minério de ferro, grãos e outras matérias-primas a granel utilizadas em todo o mundo representam mais de 80% do comércio marítimo global. A Sea Cargo Charter é uma estrutura global que permite a integração de considerações climáticas nas decisões de fretamento

para favorecer o transporte marítimo alinhado com o clima. Especificamente, pretende estabelecer uma linha de base comum para avaliar e divulgar se as atividades de transporte estão alinhadas com as metas climáticas adotadas. Também se apresenta em conformidade com as políticas da OMI. Isso inclui a sua ambição de que a emissão de gases de efeito estufa do transporte marítimo internacional atinja o pico o mais rápido possível e reduza as emissões anuais totais de gases do efeito estufa do transporte em pelo menos 50% dos níveis de 2008 até 2050. Um processo de relatório padrão de emissões de gases de efeito estufa simplificará algumas das complexidades frequentemente associadas aos relatórios. Isso incentivará uma abordagem mais transparente e consistente para rastrear as emissões, o que será uma parte crítica para tornar o transporte marítimo mais

sustentável A Sea Cargo Charter pretende evoluir ao longo do tempo à medida que a OMI for ajustando as suas políticas e regulamentos e quando outros impactos ambientais e sociais adversos sejam identificados para inclusão e pretende que seja aplicável a: - Fretadores a granel interessados na carga a bordo; - Aqueles que simplesmente fretam os navios; - Os proprietários disponíveis e todos os fretadores de uma rede de fretamento. Os 17 signatários fundadores do Sea Cargo Charter incluem as ADM, Anglo American, Bunge, Cargill Ocean Transportation, COFCO International, Dow, Equinor, Gunvor Group, Klaveness Combination Carriers, Louis Dreyfus Company, Norden, Occidental, Shell, Torvald Klaveness, Total, Trafigura e Ørsted. Todos os outros carregadores responsáveissão convidados a aderir à iniciativa. SET-OUT 2020 | BORDO LIVRE 159 | 23



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