Diretor Luís Manuel Barbosa Marques Leal Coordenador Técnico Correia Góis Edição Câmara Municipal de Montemor-o-Velho Paginação Gabinete de Apoio à Presidência e Relações Externas | Ana Luísa Ferreira Câmara Municipal de Montemor-o-Velho Impressão Rebelo Artes Gráficas Tiragem 500 Exemplares Capa e Contracapa Postal Antigo dos Paços do Concelho de Montemor-o-Velho. Câmara Municipal de Montemor-o-Velho. Brasões do Município de Montemor-o-Velho e de Cerizay. Ano 8 - Nº 15 · setembro 2013 Periódico Semestral Dep. Legal Nº 263153/07 ISSN 1646-9844
Índice
Concurso de Histórias e Ilustrações Elisabete Morgado
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Geminação de Montemor-o-Velho - Cerizay Sandra Lopes
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Montemor-o-Velho: o reerguer de um território Luís Barbosa Marques Leal
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A Missão Deolindo Pessoa
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A Família Oliveira Guimarães Mário Nunes
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Caça e Caçadores Júlio Delfim Torrão
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Breve História da Taça de Lisboa Carlos Manuel Henriques
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Manlianenses Ilustres - IX - Dr. Joaquim Alves de Sousa (1825-1892) Mário José Costa da Silva
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Poesia José Carlos da Silva Duarte
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Gatões, a Memória de Seu Povo Maria Bernardes e Maria Oliveira
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O “Hospício” dos Carmelitas Descalços em Montemor Correia Góis
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As “Memórias” Setecentistas de Montemor-o-Velho e seu concelho Sandra Lopes e Correia Góis
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A Procissão do Corpo de Deus em Montemor-o-Velho: 1552-1900 Mónica Santa Rita
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Mosteiro de Nossa Senhora de Campos (Montemor-o-Velho, 1503-1691) Correia Góis
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120 anos de História da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho Sandra Lopes
201
António Correia da Fonseca e Andrade e a História Manlianense - 14 Sandra Lopes
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Editorial
Às 12 horas do passado dia 17 de junho de 2013 assinalaram-se precisamente 120 anos da primeira Sessão de Câmara no atual edifício dos Paços do Concelho. Este número histórico faz-nos querer saber mais da história dos órgãos autárquicos deste concelho e, por isso, a capa desta edição Monte Mayor e algumas das suas páginas transportam-nos até finais do século XIX e mostram-nos que a história se repete e que os tempos não eram assim tão diferentes daqueles que hoje vivemos. Comemoramos, também em 2013, o 25º aniversário da geminação com Cerizay, a primeira que o Município de Montemor-o-Velho celebrou. Esta data celebra o estreitar de relações com uma cidade francesa cuja história, cultura e identidade passaram a estar associados à nossa Vila do Baixo Mondego.
O número 15 da revista “Monte Mayor - a terra e a gente” congrega, como é hábito, um conjunto diverso de temáticas multidisciplinares. E uma vez que a História e a Cultura se fazem de gentes, esta revista abre com as sugestões dos montemorenses mais jovens sobre como “Mudar aldeias e ideias e acabar com todas as guerras”. Publicamos, orgulhosamente, os trabalhos vencedores do VIII Concurso de Histórias e Ilustrações nas modalidades de texto escrito, ilustração e representação. Sugerimos ainda que se aperceba das reais mudanças que aconteceram neste nosso território ao longo dos últimos 12 anos, numa viagem pelas obras estruturantes que empreendemos com a ajuda, o empenho e as aspirações de todos. Temos hoje um concelho mais coeso, mais competitivo, dotado de condições para crescer e empreender. Nas páginas da Monte Mayor irá encontrar também a cultura, o teatro, a literatura popular, os costumes, tradições e memórias de Montemor.
Não posso deixar de relembrar duas personalidades que nos deixaram abruptamente. Uma sempre colaborou com este projeto. Ao dr. Mário Nunes tenho a dizer que deixou um lugar vazio na cultura de Coimbra e da região. Dedicado à cultura e à causa pública, era um homem humilde, nobre de espírito, generoso e pragmático. Dias antes de falecer, entregou aquele que viria a ser o seu último texto na Monte Mayor. Não podíamos deixar de o publicar. Foi uma honra termos contado com as suas palavras, dr. Mário Nunes! E é com uma transcrição deste último artigo que nos despedimos: “Não é a vida que cria a imortalidade: é a morte”. A outra personalidade que urge homenagear nestas breves linhas é o amigo Eng.º Carlos Laranjeira e ao recordá-lo vêm-me à memória as sábias palavras de Camões, n’Os Lusíadas, falando daqueles “que por obras valerosas / Se vão da lei da Morte libertando”. O Carlos Laranjeira foi um desses homens. Um ser humano dedicado, raro exemplo de empenhamento cívico, de compromisso para com a orizicultura, uma figura incontornável da agricultura portuguesa. Foi um homem de ação, que assumiu um compromisso para com a realidade da sua terra, da causa natural e da sua paixão: a defesa do arroz carolino do Baixo Mondego. A sua morte representa uma perda incomparável para o concelho de Montemor-o-Velho, mas estou certo de que a História dos campos do Vale do Mondego lhe fará justiça. Esta é a última revista publicada sendo eu o seu diretor. Face ao exposto, aproveito a oportunidade para agradecer a todos os colaboradores das 16 edições. Deixo aqui uma palavra especial ao coordenador técnico, dr. Correia Góis, pela amizade, empenho e trabalho demonstrados que foram decisivos na afirmação da publicação em apreço no panorama cultural, local e regional. Até sempre!
Boas Leituras!
Luís Manuel Barbosa Marques Leal, Dr. Presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho
Elisabete Morgado*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 7 - 33
Concurso de Histórias e Ilustrações
Ao longo da História, a preocupação com a leitura e com a escrita esteve sempre presente na vida dos Povos, apesar do conceito de “leitura” se ter vindo a modificar ao longo dos tempos. Atualmente, vive-se numa sociedade letrada em que a cada dia que passa, os indivíduos são desafiados, nas mais diversas situações, a usarem as suas competências de leitores, não apenas em textos escritos, mas, sobretudo a compreenderem o Mundo em que vivem, as próprias vidas e nelas serem os protagonistas. A leitura virtual proporcionada pelos equipamentos eletrónicos, cada vez mais ao alcance de todos e pela já familiar Internet, é um bom exemplo da linguagem utilizada nos tempos modernos e da chamada “leitura digital”. É, portanto, inquestionável, o facto de que o ato da leitura permite ao Homem a sua inserção e a participação ativa no meio social no qual está inserido e que a Escola e a Biblioteca, de qualquer tipo, devem constituírem-se como elos privilegiados que estabeleçam parcerias entre os leitores proficientes e a inserção social. Foi com o propósito de estimular o gosto pela leitura, escrita e criatividade ilustrativa e representativa, que a Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, através dos serviços da Biblioteca Municipal Afonso Duarte, dinamizou, já na sua oitava edição, o Concurso de Histórias e Ilustrações, subordinado ao tema genérico “Mudar aldeias e ideias e acabar com todas as guerras”.
Fazer a guerra é visar a conquista do que nos foi negado, porque o queríamos tornar nosso. Mas se nos propomos desperdiçar a oportunidade de vivermos em sintonia, partilhando os sentidos e a natureza, então o conflito de interesses levar-nos-á a esgotar as ilusões onde o ser humano perde todas as guerras, nesta aldeia global. Rejeitemos pois a ambição que motiva a hostilidade, aprendendo a respeitar as diferenças. Ver a vida de forma simples, apreciando o que ela nos oferece, mesmo que sejam coisas simples, ajuda-nos a descobrir a verdadeira beleza do Mundo.
* - Elisabete Morgado (Técnica Superior na Biblioteca Municipal Afonso Duarte - BMAD -, Montemor-o-Velho)
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Elisabete Morgado
No ano de 2013, foi nossa intenção que as crianças registassem através da escrita, da pintura ou da representação cénica, histórias sobre a temática Mudar aldeias e ideias e acabar com todas as guerras. Este objetivo pretendeu, desde o primeiro instante, consciencializar a criança, mesmo a de tenra idade, para a problemática da alteração de atitudes, de posturas sociais e de empenhamento perante um Mundo em constante mutação. Tudo dependerá de um gesto simples, de um passo que se der na direção certa e de uma atitude diferente, para que esta aldeia global onde todos vivemos, se torne melhor e onde a esperança continue a prevalecer. Foi este o desafio lançado aos alunos do 1º Ciclo do Ensino Básico do concelho. Tendo em conta a estrutura programática de anos anteriores, a primeira parte do projeto consistiu na itinerância de atividades pelos Estabelecimentos de Ensino do concelho. Durante cerca de cinco meses, os alunos do 1º Ciclo do Ensino Básico do concelho receberam a divulgação do concurso, através da encenação da temática proposta e, desta forma, tentou-se incentivar e motivar os intervenientes para a criação e apresentação de trabalhos relacionados com a temática. Os resultados apurados foram, na opinião do júri, de excelente qualidade: foram apresentados a concurso cerca de 50 trabalhos, nos quais estiveram envolvidas mais de 160 crianças. Esta adesão encheu-nos de genuíno orgulho. Nunca é demais deixar uma palavra de apreço, felicitação e de agradecimento, a todos os que tornaram possível este projeto e nele trabalharam para que o mesmo fosse um êxito. Aos professores, aos pais e encarregados de educação, aos avós e, especialmente, aos pequenos/grandes escritores e artistas, as nossas crianças, endereçamos o nosso apreço pelo empenho posto neste projeto, para nós tão especial.
Segue-se a publicação do 1º, 2º, 3º prémio e menções honrosas, respetivamente, das modalidades de texto, ilustração e representação.
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VII Concurso de Histórias e Ilustrações
Vencedores do VIII Concurso de Histórias e Ilustrações – Mudar Aldeias e Ideias e Acabar com Todas as Guerras: Texto Escrito 1º Lugar – Os Contadores de Histórias 2º Lugar – Gabriel Sebastião, Mariana Lopes, Mariana Oliveira, Rafael Veloso, Tiago Sargaço 3º Lugar – Diogo Miguel Marques Cardoso Menção Honrosa – Joaquim Manuel Oliveira Santos
Ilustração 1º Lugar – David Cruz, Carolina Pires, Carolina Lopes, João Gonçalves e Vera Simões 2º Lugar – Ana Beatriz Silva Rocha 3º Lugar – Mara Sofia Mendes Anastácio Menção Honrosa – Gabriel Sebastião, Mariana Lopes, Mariana Oliveira, Rafael Veloso, Tiago Sargaço
Representação 1º Lugar – Camila Moreira, Diana Gomes, Sofia Freitas, Margarida Freitas, Duarte Maia, Diogo Silva, Anita Faria, Francisco Faria, Guilherme Cavaleiro, Matilde Monteiro, Mariana Machado, Rodrigo Ribeiro, Gonçalo Andrade, Carlos Costa, Rafael Cunha, Vasco Branco, Tomás Gonçalves, Beatriz Manso, Carolina Simões, Daniel Antunes, Inês Girão e Vanessa Monteiro. 2º Lugar – Beatriz Leandro, Bruno Cadima, David Campos, Francisco Costa, Guilherme Simões, João Rama, Luís Sebastião, Rodrigo Pereira, Sérgio Lé e Sofia Oliveira.
Composição do Júri: Escritora Maria Teresa Duarte, pintora Isabel Barbas, representante da DREC, José Correia Lopes, individualidade convidada Vasco Neves.
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HISTORIAS>
1.º Lugar A guerra das bolas de lama e das bolas de sabonete
Era uma vez duas aldeias muito diferentes uma da outra, lá num país muito distante. Uma aldeia era limpa, onde todos se preocupavam em separar e tratar o lixo, as casas estavam pintadas de branco e tinham lindos jardins à frente. Todos respeitavam a natureza e até a areia brilhava. Na outra aldeia, o lixo amontoava-se por todo o lado. O ar cheirava mal e as plantas estavam a morrer. As pessoas, da aldeia suja, tinham muita inveja da aldeia limpa, mas não faziam nada para mudarem. Um dia, muito irritados, pegaram nas suas catapultas e começaram a lançar grandes bolas de lama suja contra a aldeia vizinha.
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VII Concurso de Histórias e Ilustrações
A população da aldeia limpa, quando começou a receber aqueles “presentes”, pensou: - Estamos em guerra! Vamos atiralhes bolas de sabonete, para eles aprenderem! Correram para as suas catapultas e começou o combate!
De um lado choviam bolas de lama e do outro, bolas de sabonete. E fizeram isto dia e noite, sem parar, durante uma semana. De ambos os lados a natureza e as pessoas começaram a entristecer. A poluição abundava por todo o lado, o ar cheirava mal e todos começaram a ficar doentes. Até o rio Espelho de Água, antes de águas cristalinas, estava a ficar castanho e borbulhante.
Os peixes, que nele habitavam, vinham à superfície à procura de um pouco de oxigénio e alguns até morriam. A água já não servia para tomar banho, para beber ou regar as plantas. Era um desastre!
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Foi então que o Chefe Limpinho resolveu ir falar com o Chefe Sujão para acabarem com a guerra. Reuniram-se durante vários dias e depois de muito conversarem e discutirem, chegaram à conclusão que ninguém estava feliz e que o melhor era terminar com a guerra e procurar uma solução para a lixeira em que se transformou as suas aldeias. O chefe Sujão pediu ajuda ao chefe Limpinho para limpar a sua aldeia e ensinar aos seus habitantes algumas regras sobre a política dos 3 R (Reciclar, Reutilizar e Reduzir).
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VII Concurso de Histórias e Ilustrações
Deste modo, todos começaram a aprender a respeitar a natureza, a reciclar o lixo e a respeitar os outros. E todos tentaram viver em paz e serem amigos. Será que conseguiram? Esperamos que sim!!!
Os Contadores de Histórias Alunos do 2º e 3º anos, da turma 2 da Escola EB1 da Bunhosa: Beatriz Jesus, Daniel Santos, Diana Marques, Íris Mendes, Mafalda Oliveira, Vitória Oliveira, Rúben Ribeiro, Bruna Rodrigues, Lara Portugal, Cláudio Bispo, Diogo Buco, Diogo Jorge, Francisco Silva, João Caniceiro, Rúben Dias, Andreia Bispo, Bernardo Oliveira e David Pereira
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2.º Lugar As Vacas e os Peixes
Era uma vez um reino animal, num país de África, onde uma aldeia de vacas e outra de peixes andavam em guerra. As vacas viviam nos prados e os peixes nos lagos. Os peixes andavam em guerra com as vacas porque estas bebiam a água do lago. O lago era só deles. As vacas andavam em guerra com os peixes porque, quando estavam a pastar, estes saltavam e salpicavam-nas constantemente. Aqueles borrifos incomodavam-nas, mesmo quando atingiam algumas moscas que nelas teimavam em poisar. O conflito era constante. Um dia, ao passar por ali, um gato observou as disputas e pensou: – Vou criar paz entre aquelas duas aldeias! Então, aproximou-se e perguntou: – Porque é que vocês andam em guerra? – São eles! – diziam as vacas. – São elas! – diziam os peixes. E os dois grupos explicaram as razões que os levavam ao conflito. Então o gato, perante o que ouviu, propôs uma trégua: durante um determinado tempo, nem as vacas se aproximariam da água nem os peixes as salpicariam. Após este período, ele regressaria para analisar esta situação. 14
VII Concurso de Histórias e Ilustrações
Chegado o dia do fim da trégua, o gato, curioso, apareceu. – Então, todos cumpriram o prometido? – Sim, mas como foi dfícil! – exclamaram quase em coro vacas e peixes. – Mas agora estamos com outro enorme problema. Não suportamos o calor, abafamos!
– Ficamos presos, não podemos nadar com segurança! – gritaram os peixes. – Calor? Presos? Não estou a perceber. Vou até aí para averiguar. O gato aproximou-se do lago e, fazendo uso do seu olfacto e da sua visão espetaculares, deu conta que havia um cheiro estranhíssimo e também algo disperso na água do lago. – Que cheiro esquisito! E estou a ver um peixe morto... – Se calhar é o meu melhor amigo, o Frederico, pois deixei de o ver! – acrescentou um peixe. É só mais um que não conseguiu escapar a esta terrivel planta que começou a desenvolver-se no interior da água. Não conseguimos nadar como anteriormente. Porque será que isto aconteceu? – indagou um peixe.
Aproveitando a distração do peixe, uma vaca, curiosa, aproximou-se, e observou a planta. Sem que se apercebessem, comeu um pouco, às escondidas. – Ai que saudades que eu tinha desta refeição! – deixou escapar à medida que comia mais pouco. 15
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– Uhm, uhm,.... Tenho a impressão de que já sei o que se está a passar. – adiantou o gato, ao mesmo tempo que endireitava os bigodes e deixava todos curiosos. – Há quanto tempo é que isto acontece? – Não há muito, mas talvez desde que o amigo gato aqui esteve. – E nós, as vacas, já não aguentamos o calor! Encontrámos outro local onde bebemos água, mas, parece que abafamos. Não é como antigamente, quando andávamos fresquinhas. Porque será? O gato aproximou-se ainda mais do lago. Pediu também às vacas que o fizessem. Queria estar bem perto daqueles animais. E começou por recordar-lhes: – Como sabem, fez-se um pacto que todos cumpriram. Mas, olho-vos e vejo que têm saudades dos tempos de anteriores. – Que bom, os peixes vão continuar a refrescar-nos! E vamos poder continuar com as refeições saborosas! – mugiram as vacas. – E nós vemo-nos livres destas plantas aquáticas! E vamos poder nadar à vontade e dar saltos mágicos! – Vivam os peixes! – gritaram as vacas – Vivam as vacas! – gritaram os peixes. A partir desse dia, as duas aldeias reencontraram a paz.
Alunos do 2º e 4º anos, da Turma 2 da Escola EB1 do Viso: Gabriel Sebastião, Mariana Lopes, Mariana Oliveira, Rafael Veloso e Tiago Sargaço.
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VII Concurso de Histórias e Ilustrações
3.º Lugar Mudar aldeias e ideias e acabar com todas as guerras Há muitos anos, numa aldeia de Montemor, havia um dragão que se chamava João. Ele destruía casas porque se considerava invencível. Só uma pessoa conseguia vencêlo; era Fernão Mendes que chegara há poucos dias à aldeia. Ele foi chamado pelos habitantes, porque tinha experiência em aventuras e tudo o que era necessário para o derrotar. Desta vez ele iria utilizar apenas as palavras. Naquele dia, Fernão Mendes andava a vigiar a aldeia, quando viu um grande dragão a cuspir fogo em direção às casas. Então, ele preparou-se para enfrentar o monstro e disse: – Vou falar com ele, nem que seja a última coisa que faça na vida. O povo desta aldeia não pode continuar a morrer queimado pelo fogo daquela boca, nem a ver os seus bens a serem consumidos pelo fogo. Quando João Dragão viu aquele homem de voz forte e cabelo desalinhado parou de cuspir fogo para as casas. Então virou-se para ele e disse: – Bou…bou…bou…bou… – Que estás para ai dizer? Não percebo nada! Estás a dizer isso porque estas com medo. Sabes bem que tens feito muito mal a esta gente. Se queres lançar fogo, lança fogo, não para os destruir mas para os ajudar. Acende-lhes as lareiras nas noites frias de inverno. Aquece-lhes a comida e as casas. Ilumina-os durante as longas noites. Então o João Dragão percebendo o mal que tinha feito àquela gente decidiu que regressaria à sua gruta na montanha e jamais voltaria a atacar a aldeia. Os aldeões reconhecidos pelo seu trabalho alimentavam-no todas as noites com feixes de lenha da melhor qualidade. Os dragões eram feliz e o povo também. Fernão Mendes ao ver aquela felicidade afastou-se sem que ninguém desse por isso e foi pelo mundo ajudar a acabar com todas as guerras. Dizem que ainda hoje anda por aí, porque a sua missão parece não ter fim!
Aluno do 4º Ano da Escola EB1 do Tojeiro: Diogo Miguel Marques Cardoso 17
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Menção Honrosa Mudar aldeias e ideias e acabar com todas as guerras Era uma vez, dois meninos vizinhos. Um chamava-se Gervásio e o outro Firmino. O Gervásio achava-se muito importante, pois era de uma família mais rica e, por isso, era muitas vezes mal-educado com o Firmino e procurava sempre fazer alguma coisa para o provocar. O Firmino era um rapaz simples, apreciava as pequenas coisas e tinha pena do Gervásio não ser seu amigo. Através do muro do quintal, o Gervásio observava o que o Firmino fazia nos tempos livres. Um dia o Firmino fez uma casinha numa árvore e divertia-se muito a inventar brincadeiras novas. Apesar de brincar só com os animais, sentia-se feliz. Esta situação desagradava muito ao Gervásio, que escondido observava o que o Firmino andava a fazer. O Gervásio tinha muitos brinquedos mas estes pouco lhe interessavam, parecia que nada o fazia feliz. Os seus pais andavam sempre muito ocupados e preocupados em ganhar cada vez mais dinheiro e pouco tempo tinham para brincar com ele. Certo dia, o Firmino descobriu que um casal de passarinhos tinha feito um ninho na sua árvore, onde estava a casinha. Quando o descobriu ele ficou muito contente e todos os dias, com muito cuidado ia ver o que estava no ninho. Alguns dias depois havia dois ovinhos no ninho. Com medo que os passarinhos abandonassem o ninho ia lá mais raramente. Como o passatempo preferido do Gervásio era observar às escondidas o que o Firmino fazia, ficou tão curioso, que um dia trepou o muro para ir ao quintal do vizinho descobrir o que se passava na casa da árvore. Como teve pouca sorte caiu e partiu o pé. Ficou muito atrapalhado! Os pais não estavam em casa e agora quem o iria ajudar? Não queria gritar pelo Firmino, pois sabia que tinha sido sempre muito desagradável com ele, por isso, achava que certamente o Firmino não o iria ajudar. A noite aproximava-se e ele tinha frio, fome e cada vez mais dores. Não lhe restava alternativa senão pedir ajuda, mas como era muito orgulhoso essa ideia desagradava-lhe muito. Finalmente resolveu gritar por socorro. Apareceu-lhe o Firmino, que de imediato o ajudou a levantar e levou-o para sua casa. Os pais do Firmino telefonaram aos pais do 18
VII Concurso de Histórias e Ilustrações
Gervásio e estes vieram buscá-lo e levaram-no ao hospital. O caso do Gervásio não era muito grave mas teve que pôr gesso e ficar alguns dias em casa. Passava a maior parte do tempo sozinho e começou a achar que seria tão bom ter alguém com quem conversar e brincar. Pensou logo no Firmino e em todas as maldades que lhe tinha feito até então. Achou que o Firmino não deveria querer brincar com ele, mas sentia-se tão triste e só. Então um dia ganhou coragem e pela janela chamou o Firmino e disse-lhe: — Olá, queres vir a minha casa? - O Firmino muito espantado respondeu: — Não sei! Queres mesmo que eu vá? — Sim, quero. Respondeu o Gervásio. O Firmino então disse: — Tenho que pedir à minha mãe. Uma vez que a mãe autorizou, o Firmino lá foi a casa do seu vizinho, muito curioso para saber o que ele queria, pois o Gervásio nunca lhe ligava nada. Em casa do Gervásio, este diz ao Firmino: — Sei que tenho sido muito estúpido contigo e quero pedir-te desculpa. Ajudaste-me quando caí do muro. Costumo ver-te a brincar e também gostaria de brincar contigo. Achas que ainda podemos ser amigos? O Firmino de olhos arregalados não podia estar mais espantado com a atitude do outro. — Sim, acho que podemos ser amigos se estiveres disposto a mudar a tua atitude para comigo. A partir desse dia, os dois meninos tornaram-se grandes amigos e o Gervásio sentiu-se feliz como antes nunca tinha sido. Ter um bom amigo era muito mais importante que todas as outras coisas do mundo.
Aluno do 3º Ano da Escola EB1 do Tojeiro: Joaquim Manuel Oliveira Santos
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ILUSTRAÇÃO>
1.º Lugar O Dia das Partidas
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Alunos do 2º e 4º anos, da Turma 2 da Escola EB1 do Viso: David Cruz, Carolina Pires, Carolina Lopes, João Gonçalves e Vera Simões.
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2.º Lugar A Guerra da Poluição
Aluna da Turma 1 do 4º Ano, da Escola EB1 da Bunhosa: Ana Beatriz Silva Rocha
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3º Lugar A Guerra da Poluição
Aluna da Turma 1 do 4º Ano, da Escola EB1 da Bunhosa Mara Sofia Mendes Anastácio
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Menção Honrosa As vacas e os peixes
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Alunos do 2ยบ e 4ยบ anos, da Turma 2 da Escola EB1 do Viso: Gabriel Sebastiรฃo, Mariana Lopes, Mariana Oliveira, Rafael Veloso e Tiago Sargaรงo. 26
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OUTRAS REPRESENTAÇÕES>
1º Lugar Os cinco sentidos (Filme) Era uma vez uma pequena aldeia onde vivia vários meninos de várias idades, todos brincavam alegremente. Certo dia, chegou a essa aldeia uma família que tinha um filho invisual, chamado Bernardo, apesar da sua diferença, fazia uma vida normal como outra criança. Também ele gostava de brincar. Ao aperceber-se que no largo da aldeia outras crianças brincavam, rapidamente se quis juntar a elas. Quando lá chegou, foi recebido com grande alegria. A curiosidade por verem um colega novo fez com que se dirigissem logo a ele. Então uma chuva de perguntas surgiu: - Quem és tu? - Como te chamas? - De onde vens? - O que tens nos olhos? - Não consegues ver? - És cego? E o menino sem conseguir responder a todas ao mesmo tempo, apenas disse: - Sim, sou invisual. Os outros: - Invisual? Não, tu és cego! - Não podes brincar connosco! E assim se afastaram deixando-o a um canto. No dia seguinte na escola, todos comentavam que tinha chegado à aldeia um menino deficiente.
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Era Primavera, os passarinhos começavam a chilrear, flores e árvores a ganhar uma nova vida e um novo cheiro começou a pairar no ar. As crianças escancaravam as narinas para conseguirem cheirar tudo. Nisto a Joana apanhou uma bela rosa cheirosa no jardim e dirigiu-se à sua prima, Raquel. Enquanto todos andavam entusiasmados a descobrirem os cheiros primaveris, esta estava sentada num banco a olhar tristemente para os outros. Quando a Joana, lhe ofereceu a rosa ela perguntou: - Joana, a rosa cheira bem? Os outros ouviram e num abrir e fechar de olhos a rodearam e rapidamente se espalhou a notícia de que havia uma menina que não conseguia cheirar. Por este motivo os outros achavam que ela não podia brincar com eles e foi posta de lado. Era sexta-feira, final de semana e o João fazia anos. Este andava muito entusiasmado a entregar os cartões de aniversário a todos os seus colegas da escola, pois no sábado iria fazer uma festa toda a tarde. No dia marcado, todos os meninos convidados foram ter a sua casa. Era uma festa enorme, tinha balões, fitas de todas as cores, todos os jogos típicos da sua idade estavam preparados, brincaram sem parar. Até que chegou a hora de cantar os parabéns. - Meninos! Meninos! Todos para dentro vamos cantar os parabéns ao João. – Gritou a mãe. Com a mesma euforia, todos correram para dentro de casa e rodearam a mesa onde estava um grande bolo de chocolate, decorado com morangos e pintarolas. Cantaram-se os parabéns, apagaram-se as velas e fatia a fatia, foi dada uma a cada menino. - Está tão bom! - Sabe bem. - Mas que delícia! - Adoro chocolate. E tu, Manuel? – gritou o João. O Manuel devorava o bolo e entre dentes, todo lambuzado balbuciou: - Chocolate? Não sei a que sabe. O João ficou muito intrigado. Foi ter com os colegas do futebol e disse: - O Manuel não sabe o que é o sabor de chocolate! - Ahahahahah – riram-se todos.
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Após darem a gargalhada, foram ao pé do Manuel e gozando, comentavam: - Tu não tens língua, não tens sabor! - Para que comes? Assim como gozavam também Manuel foi proibido de jogar à bola e posto de parte. O Bernardo, a Raquel e o Manuel como frequentavam todos a mesma escola e tinham sido rejeitados pelos outros, começaram a aproximar-se e a brincar juntos. A escola acabou, eram férias da Pascoa, mas todos continuavam a encontrar-se no parque da aldeia. Uns jogavam à bola, outros brincavam nos baloiços e os três meninos iam-se descobrindo, aprendiam a brincar com as diferenças de cada um. Ao brincarem conheciam-se cada vez melhor. Repararam que o Bernardo em determinadas brincadeiras era mais rápido e inteligente, tinha um tacto tão bem apurado que só com as suas mãos conseguia realizar as tarefas mais depressa, inclusivamente ganhando por vezes aos colegas. Certo dia apareceu no parque uma menina muito bonita, cabelos longos loiros, olhos grandes verdes e muito simpática. Todos pararam o que estavam a fazer, para lhe dar as boas vindas. - Olá! Como te chamas? Sem se aperceber da pergunta disse: - Sou a trapezista do Circo que chegou agora à aldeia. Estão todos convidados para irem ver o meu espetáculo, logo à noite. - Boa! – gritaram os outros. - Mas como te chamas? – perguntou o Luís que era o mais atrevido. A menina não ouviu a pergunta e ele sempre a insistir. - És surda ou quê? Como te chamas? Quando ela se apercebeu que o Luís tentava falar com ela, inocentemente disse: - Eu não ouço. Tens de falar devagar para eu ler os teus lábios. - Olha agora! Falar devagar?! Tenho mais que fazer! – disse o Luís com ar de gozo. E com isto, todos acompanharam o Luís, continuaram as suas brincadeiras e deixaram a nova menina sozinha. Os outros três que estavam a apreciar a atitude dos outros, foram ao seu encontro e a falar diretamente para esta, de forma pausada, souberam o nome de Cátia e explica29
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ram-lhe que também com eles se passara o mesmo e tinham ficado a brincar sozinhos. Assim apenas acrescentaram: - Anda, vem brincar connosco. Aos poucos estes meninos tão especiais conseguiram arranjar brincadeira e divertiram-se bastante. Riam às gargalhadas, jogavam à apanhada, à Cabra Cega, entre muitos outros. Um dia, os meninos brincavam alegremente no parque, quando de repente, uma nuvem muito escura, pairou sobre as suas cabeças e uma chuva intensa começou a cair. Todos correram na direção do toldo para se abrigar, era um espaço pequeno que não os deixava movimentarem-se tão livremente. Ficaram sentados, todos com um ar de desespero à espera que a chuva parasse, nisto, aperceberam-se que os meninos que tinham posto de lado, mesmo naquele pequeno espaço brincavam alegremente. Ficaram todos muito indignados, mas também muito intrigados e aos poucos foram-se aproximando. Um a um foi pedindo para brincar com eles, até que todos os meninos do parque brincavam juntos, todos tinham sido recebidos muito bem e rapidamente iam-se integrando em todas as brincadeiras. A chuva parou e nem se aperceberam tal era a brincadeira! Quando o dia acabou, todos estavam a brincar muito felizes e em forma de agradecimento e de pedido de desculpas para com os colegas que tinham sido rejeitados disseram: - Afinal as diferenças são todas imaginárias! Somos todos iguais!
Alunos do 1º, 2º, 3º e 4º anos da Escola EB1 de Tentúgal: Camila Moreira, Diana Gomes, Sofia Freitas, Margarida Freitas, Duarte Maia, Diogo Silva, Anita Faria, Francisco Faria, Guilherme Cavaleiro, Matilde Monteiro, Mariana Machado, Rodrigo Ribeiro, Gonçalo Andrade, Carlos Costa, Rafael Cunha, Vasco Branco, Tomás Gonçalves, Beatriz Manso, Carolina Simões, Daniel Antunes, Inês Girão e Vanessa Monteiro.
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VII Concurso de Histórias e Ilustrações
2º Lugar A Aldeia Florzita (Música) Era uma vez uma aldeia chamado Florzita. Nessa aldeia havia uma escola muito colorida, parecia um palácio porque era muito grande e bonita. Tinha flores cor de rosa e de mais sete cores como o arco íris, um passeio muito límpido e passarinhos a fazerem ninhos e a cantar como cantores verdadeiros. Nessa aldeia havia um casal que ralhava muito, mas um dia veio um arco íris mágico e uma fada para falarem com os seus filhos. Deram-lhe conselhos e ideias para ajudarem os pais a parar de ralhar e disseram-lhes: - Vocês devem dizer aos vossos pais para eles pararem de ralhar, porque o resto da aldeia é toda feliz, ninguém discute e têm muita paz. A fada com os seus poderes mágicos descobriu que tinham lançado um feitiço sobre o Casal dos Ralhos, o qual tinha muitos problemas de família. Bebiam álcool e tinham uma casa muito triste e tudo por causa dos ralhos. As Formiguitas descobriram, porque uma Formiguita inteligente chamada Ricardito, que era filho do casal dos Ralhos, contou às outras Formiguitas e à senhora professora que os pais dela discutiam sempre e pediu ideias à rainha Formiguita – a professora – para os seus pais acabarem com os ralhos e serem felizes para sempre. O Ricardito e a Rainha Formiguita pediram ajuda a todos os animais da Aldeia e do Concelho de Montemor-o-Velho e fizeram uma carta para distribuir à população da Aldeia Florzita com a seguinte mensagem: “Vamos todos/as ajudar a família do Ricardito a mudar, a parar de discutir para ver de novo o sol a sorrir…” Os pirilampos iluminaram as Formiguitas e colocaram-nas nas asas das borboletas mágicas, os mochos e os morcegos abriram as tampinhas das caixas do correio para as Formiguitas lá colocarem as mensagens. O dia nasceu com o sol muito brilhante, era um dia muito especial, as galinhas e os galos acordaram as pessoas, elas leram as mensagens e disseram: - mas que raio de casal é este? A aldeia é toda feliz!...
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Elisabete Morgado
Juntaram-se, deram as mãos às formiguitas para convencerem o Casal dos Ralhos a parar de discutir. A fada Mimi e o arco íris Zézé falaram com o médico e com a assistência social. Uniram os seus esforços e todos juntos conseguiram que o Casal dos Ralhos voltasse a ser feliz. Era uma quinta feira, último dia do mês de Maio, estava um dia quente de Verão, o Ricardito chegou à escola e disse à Rainha das Formiguitas: - O meu pai já não ralha, estou muito contente!...Acabaram-se as guerras e as discussões graças às vossas ideias e opiniões… A formiguita Olho Azul exclamou: - Senhora professora eu não encontro nenhuma ideia!... - Quando não tiveres nenhuma ideia pergunta-nos que nós ajudamos-te – disseram as outras Formiguitas – nós ajudámos a família do Ricardito e vamos ajudar todas as pessoas e os animais que tiverem problemas, a acabar com as guerras para terem paz e sossego, queremos que sejam muito felizes. - Obrigada Formiguitas e rainha Formiguita por me terem ajudado! – agradeceu o Ricardito. Um grupo de fadas com as suas varinhas cintilantes entrou de rompante pela janela, atrás dela estava um arco-íris de mil cores que esperava ansiosamente para começar a sua dança… - Muito bem! Palmas para vocês fizeram um trabalho excelente! Parabéns! – disseram as fadas. - Vá despachem-se estamos à espera de os ouvir cantar para começar a festejar!... – apressou o arco íris.
Somos dez formiguitas… Muito linditas… Gostamos de ajudar Demos as nossas mãos Pró Ricardito poder alegrar
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VII Concurso de Histórias e Ilustrações
Trabalhamos noite e dia Tocamos ideias com muita alegria Entregamos mensagens… Com os Pirilampos A servir de guia…
Agora um novo dia nasceu O seu pai já não bebeu A guerra já terminou…ou…ou…
Aldeia ficou muito mais contente C´a ajuda de toda gente Tudo se modificou.
(História inédita baseada num caso real.)
Alunos do 1º e 3º anos da Escola EB1 do Viso: Beatriz Leandro, Bruno Cadima, David Campos, Francisco Costa, Guilherme Simões, João Rama, Luís Sebastião, Rodrigo Pereira, Sérgio Lé e Sofia Oliveira.
BIBLIOGRAFIA NEVES B. C., SOUZA, N. V.J. SCHAFFER, P. C. G. KLUSENER, R.- Ler e Escrever: Compromisso de todas as áreas / 7ª. ed. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2006.
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Sandra Lopes*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 35 - 37
Geminação Montemor-o-Velho – Cerizay
No âmbito da estratégia de colaboração e aproximação dos povos, a Câmara Municipal de Montemor-o-Velho promoveu ao longo dos anos alguns atos de geminação com municípios da Comunidade Europeia e com municípios de Países de Expressão Portuguesa, estreitando assim relações com cidades cuja história, cultura e identidade estão associados a Montemor. Foi o caso de Cerizay (1988), S. José dos Pinhais – Brasil (1997) e Xai-Xai – Moçambique (2000). No território nacional, criou uma união mais próxima com Montemor-o-Novo, através da assinatura do protocolo de geminação em 2011. O Município de Montemor-o-Velho iniciou a sua caminhada nas geminações desde muito cedo. Cerizay foi o primeiro município com quem assinou protocolo de geminação em 1988. Na sua origem estiveram vários factores: cerca de 20% da população de Cerizay é portuguesa; a proximidade desta cidade com Poitier, uma zona universitária por excelência e, paralelamente, Montemor em relação a Coimbra; grande afinidade dos dois municípios no campo do desenvolvimento do sector secundário, com vetores de industrialização diferentes mas, eventualmente, complementares.
1998. Sessão solene de assinatura de geminação com Cerizay. Era presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho o Eng.º João Manuel Major Pinto Correia.
* - Sandra Lopes (Técnica Superior de Arquivo - A.M.M.V.)
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Sandra Lopes
Após a assinatura do protocolo de geminação, as atividades realizadas foram regulares durante os primeiros anos, destacando-se o intercâmbio no domínio escolar (grupos de alunos que mantiveram contactos e trocas de experiências através de deslocações e permanências entre os dois municípios), cultural (concertos de fado, exposições de pintura, música, entre outros). Em 1994, a Academia Musical Arazedense completou 100 anos de existência e, através de um protocolo, fomentou a constituição de uma orquestra juvenil europeia com jovens de Portugal (Montemor), Cerizay e uma cidade alemã, num total de 150 jovens. Foi também com a deslocação a Cerizay, em 1998, que esta Filarmónica fez a sua primeira internacionalização. De salientar ainda que, desde 2007 que, anualmente, o Município de Montemor recebe 3 estagiários, oriundos de Cerizay, do Curso BTS – Service en Espace Rural, do Institut Rural d’Éducation e d’Orientation de Bressuire, que permanecem durante um mês na nossa comunidade e que têm desenvolvido tarefas na área do turismo, apoio a crianças portadoras de deficiência e na ação social. Em Dezembro de 2008, vários artesãos deste Município participaram no Marché de Noël, que decorreu em Cerizay durante vários dias.
2013 é um ano importante para esta geminação não só porque se assinala o seu 25º aniversário, mas sobretudo porque se pretende dar um novo rumo e dinamismo a uma cooperação que estagnou no tempo, através de intercâmbios económicos e comerciais (divulgação para a realização de futuros negócios), turísticos (troca de experiências, nomeadamente do Turismo de Negócios e Eventos, em áreas naturais (Turismo Fluvial, Ecoturismo, Turismo Técnico-Científico e Histórico-Cultural). Pretende-se ainda o contacto com realidades ligadas com o agronegócio, ou seja, profissionalização dos meios de produção agrícola e aplicação dos avanços tecnológicos nas comunidades agrícolas. A área cultural assume também um papel de grande relevância, salientando-se o intercâmbio de artistas, exposições e projetos, bem como a criação de relações entre bibliotecas municipais, que venham a ser profícuos para ambas as comunidades. É igualmente o desenvolvimento de ações de partilha no campo do desporto, tirando partido do Centro de Alto Rendimento de Montemor-o-Velho. No passado mês de Julho, as cerimónias de comemoração decorreram em Cerizay, com a participação do Grupo Folclórico da Ereira, o mesmo que acompanhou em 1988 a delegação portuguesa no momento da assinatura do protocolo de geminação. Após uma sessão solene de comemoração na Câmara, onde se recordaram os 25 anos de partilha e os nomes de algumas pessoas que em muito contribuíram para esta geminação, seguiu-se uma grande festa popular no “Parc du domaine de La Roche”. Para além de um mercado de produtos tradicionais, este evento contou com a animação de alguns grupos musicais, realçando-se o Grupo Folclórico da Ereira que, com as suas cantigas e danças fez reviver a alma nacional na comunidade portuguesa radicada em Cerizay.
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Geminação Montemor-o-Velho - Cerizay
Sendo as geminações um instrumento indispensável para facilitar a aproximação entre os povos e cidadãos de diferentes países, é importante estabelecer alianças entre municípios, reforçando o crescimento das relações internacionais, possibilitando o conhecimento das vivências e fomentando o intercâmbio de ideias, experiências e soluções, numa Europa que se pretende mais forte e unida. É neste contexto que Montemor-o-Velho se assume como uma parte ativa e disponível para levar a cabo os mais diversos projetos de cooperação com o Município de Cerizay.
Julho 2013. Cerizay. Sessão solene dos 25 anos da assinatura de geminação com Cerizay.
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 39 - 88
Montemor-o-Velho O Reerguer de um Território 2002 - 2013
Honrar a memória e a identidade do concelho é honrar também um território forjado com a força dos braços dos homens e das mulheres da Gândara, dos Campos e do Rio do Mondego. Com uma história que se confunde, se apoia e caminha a par da própria História de Portugal, Montemor-o-Velho é hoje uma vila-desporto, um território de expressão artística consolidada e um espaço onde a ruralidade e biodiversidade dos nossos campos do Baixo Mondego convive harmoniosamente com o desenvolvimento e a modernidade. Ao longo destes quase 12 anos, a liderança do Município de Montemor-o-Velho tem continuamente apostado em políticas de desenvolvimento de longo prazo, integradas e integradoras, assentes numa cultura de planeamento e ordenamento do território tecnicamente competentes e respeitando sempre as componentes ambiental, social, patrimonial e cultural desse mesmo desenvolvimento. Hoje temos um Concelho diferente, mais bonito e, acima de tudo, mais moderno. Os resultados que encontramos aqui ilustrados pelas fotografias do João Pedro Jesus, jovem promessa na área da criatividade natural de Arazede, são hoje uma realidade bem visível mas que no passado mais não foram que apenas sonhos... Quantos julgavam possível erguer dois pólos industriais? Quem imaginava que a pista de remo se transformaria num complexo desportivo de âmbito nacional e internacional que faz campeões olímpicos? Quem sonhava com uma taxa acima dos 80% de cobertura do saneamento básico do concelho? Os feitos e os equipamentos não nasceram do improviso ou de um qualquer impulso. Refletem um trabalho de longo prazo. De esforço, de comprometimento, de visão, de liderança, de empenho, de estímulo e de otimismo, protagonizados diariamente * - Luís Manuel Barbosa Marques Leal (Presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho. 2002/2013)
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
pelos técnicos e trabalhadores desta Autarquia. Uma menção ainda para as catorze Juntas de Freguesia e para os seus dirigentes; todos, sem exceção, sempre deram o seu melhor por este rumo que traçámos há já 12 anos e que fazem deste nosso Montemoro-Velho um território mais feliz e mais coeso. Uma nota devida e enaltecedora para a sociedade civil e associativismo concelhio que com grande idoneidade e maturidade promoveram iniciativas e investimentos ajustados ao desenvolvimento social, cultural e desportivo deste território. O sucesso desta nossa política sustentável para o Município de Montemor-o-Velho deve-se também a si, caro Montemorense, que ao longo desta década acreditou ser possível construir um Concelho que apenas ousávamos imaginar. A população de Montemor-o-Velho tem sede de futuro. As nossas principais conquistas, quais Fernão Mendes Pinto da atualidade, são a qualidade de vida, a felicidade, o orgulho e o equilíbrio da nossa comunidade. Somos um concelho que tem orgulho na sua forte componente rural, contudo acreditamos ser possível o desenvolvimento coerente com a criação de pólos de desenvolvimento ligados à logística, à indústria, à criatividade e ao conhecimento. A construção do Centro Educativo de Montemor-o-Velho, a criação de um Centro de Alto Rendimento desportivo ou o desenvolvimento de um ciclo urbano da água, que vai chegar a 85% de cobertura do território, são algumas das mudanças que têm ocorrido ao longo da última década e que fizeram com que o concelho ganhasse mais expressão e iniciasse a conquista de uma melhor vivência, com condições de um território que se quer do séc. XXI. O que deixo aqui, nestas páginas da Monte Mayor, é um documento para as gerações vindouras e que mostra um outro olhar sobre o concelho, do que sonhámos e do que concretizámos. Muito foi feito, muito já está a ser feito e muito há ainda a fazer. É um orgulho ser montemorense, é um desafio e um estímulo fazer do concelho um espaço de sociabilidade modelo, com mais e melhor cultura, desporto, ambiente, património, história, conhecimento e criatividade.
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
REQUALIFICAÇÃO URBANA. Um território antigo e carregado de História como o nosso tem de ser reconquistado para atingir uma revigorada dimensão. Alcançar esta necessária e almejada dinâmica, alicerçada no viver e no sentir, foi o mote para as requalificações dos centros históricos, das vilas e das diversas localidades do concelho. Pelo caminho, as ruas ficaram mais luminosas, as vielas mais agradáveis e os recantos mais pitorescos. A urbe de Montemor-o-Velho ficou ainda mais bonita e recebeu o prémio Alexandre Herculano, atribuído pela Associação Portuguesa de Municípios com Centro Histórico. O concelho cresceu e com ele, lado a lado, também a sociedade foi mudando. Com a certeza de que, hoje em dia, as freguesias, as vilas ou os lugares são mais do que territórios de trabalho e descanso, o espaço urbano, sem esquecer os marcos que a História lhe deixou, adaptou-se à nova realidade e o investimento municipal fez nascer espaços com mais lazer, segurança e com uma apetência redobrada para o convívio e partilha. PEREIRA Investimento total: 347.334 € Entidade financiadora: PRAUD Ano de conclusão: 2003 TENTÚGAL Investimento total: 594.547,90 € Entidades financiadoras: POR Centro (QCA III) e PRAUD Ano de conclusão: 2003 LARGO DR. PERIÉ DE GATÕES Investimento total: 27.992 € Entidade financiadora: Programa LEADER + ADELO Ano de conclusão: 2003 MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 2.036.416,74 € Entidades financiadoras: POR Centro (QCA III), PRAUD, PROSIURB e URBCOM Ano de conclusão: 2004 41
Luís Manuel Barbosa Marques Leal
Requalificação Urbana de Montemor-o-Velho. Praça da República. (fotografia de João Pedro Jesus)
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
ARRANJO URBANÍSTICOS EM ARAZEDE – CRUZAMENTO DA BUNHOSA- PASSEIOS EM VILA FRANCA Investimento total: 162.502,42 € Ano de conclusão: 2004 ARRANJO URBANÍSTICO EM ARAZEDE – RUA FURRIEL FIDALGO Investimento total: 147.807,88 € Ano de conclusão: 2004 ARRANJO URBANÍSTICOS EM ARAZEDE – RUA 15 DE AGOSTO Investimento total: 81.057,49 € Ano de conclusão: 2004 ARAZEDE Investimento total: 380.753 € Ano de conclusão: 2006 SANTO VARÃO E FORMOSELHA Investimento total: 1.017.961,29€ Entidades financiadoras: POR Centro QCA III (2000-2006) e PRAUD Ano de conclusão: 2007 ARRANJOS URBANÍSTICOS NAS MEÃS: RUA PRINCIPAL (DESDE O LARGO DE S. SEBASTIÃO ATÉ AO CRUZEIRO) E ALARGAMENTO DE ARRUAMENTO NAS CALAÇOTAS Investimento total: 201.897,88€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 MECO: EIXO VIÁRIO DO SISTEMA URBANO DAS GÂNDARAS ARAZEDE/MECO Investimento total: 257.294,36 € Entidades financiadoras: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 ARRANJO URBANÍSTICO EM LICEIA Investimento total: 126.670,72 € Estado do projeto: em execução Ano de conclusão: 2013/2014 43
Luís Manuel Barbosa Marques Leal
CARAPINHEIRA (EIXO VIÁRIO DO SISTEMA URBANO DO VALE) Investimento total: 1.662.668,71€ Estado do projeto: Em execução Entidades financiadoras: POR Centro (QREN 2007-2013) e DGAL Ano de conclusão: 2013 ARAZEDE (EIXO VIÁRIO DAS GÂNDARAS) Investimento total: 2.300.000,00€ Estado do projeto: Adjudicado PEREIRA (RUA JOSÉ MENDES AUGUSTO DOS SANTOS) Investimento total: 310.000, 00€ Estado do projeto: Adjudicado
AMBIENTE. CICLO URBANO DA ÁGUA Um concelho com futuro tem de refletir e materializar o desenvolvimento, apostando, continuadamente, na qualidade de vida dos munícipes. O ciclo urbano da água e ambiente espelha uma consolidação de valores e princípios que, na última década, tem pautado o dia-a-dia da Autarquia, assumindo-se como uma das obras mais estruturantes para Montemor. Representando um custo superior a 18 milhões de euros, que contou com os apoios do Quadro de Referência Estratégico Nacional, o concelho alcançou uma cobertura de 100% de água canalizada e mais de 75% de saneamento básico (à data atual). Foi um esforço financeiro desmedido por parte da Autarquia e um esforço emocional das populações que diariamente conviveram com os transtornos das obras, mas era um esforço vital para o desenvolvimento da nossa terra. REDE DE ESGOTOS DE STO. VARÃO E FORMOSELHA – FASE B ETAR Investimento total: 511.706,00€ Ano de conclusão: 2002
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REDE DE ESGOTOS DA PORTELA – FASE A (redes) Investimento total: 230.569,00€ Ano de conclusão: 2004 CONSTRUÇÃO E REPARAÇÃO DE PEQUENOS PROLONGAMENTOS DA REDE DE ÁGUAS: RESERVATÓRIO R4 (S. TIAGO) A CASAL MINHOTO, FREGUESIA DE PEREIRA Investimento total: 94.940,00€ Ano de conclusão: 2004 PROLONGAMENTOS E LIGAÇÕES DA REDE DE ESGOTOS: CONDUTA ELEVATÓRIA ENTRE A ZONA INDUSTRIAL E A ETAR DA CARAPINHEIRA Investimento total: 97.446,00€ Ano de conclusão: 2005 REDE DE ESGOTOS DE STO. VARÃO E FORMOSELHA – FASE A REDES (PARTE) Investimento total: 1.100.873,00€ Ano de conclusão: 2005 REDE DE ESGOTOS DE ARAZEDE FASE A (REDES) Investimento total: 104.100,00€ Ano de conclusão: 2005 REDE DE ESGOTOS DOMÉSTICOS QUINHEDROS: FASE A (REDES) Investimento total: 46.746,00€ Ano de conclusão: 2005 PESQUISA E CAPTAÇÃO DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS CONSTRUÇÃO DE UM FURO EM TENTÚGAL (incluindo construção da caseta e equipamento electromecânico) Investimento total: 76.134,00€ Ano de conclusão: 2005 CONSTRUÇÃO E REPARAÇÃO DE PEQUENOS PROLONGAMENTOS DA REDE DE ÁGUAS: Verride – Outeiro da Mura e adutora do Brulho Investimento total: 32.965,00€ Ano de conclusão: 2005
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ETAR de Arazede. (fotografia de João Pedro Jesus)
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
MANUTENÇÃO DE RESERVATÓRIOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA: RESERVATÓRIO DE S. GENS Investimento total: 81.104,00€ Ano de conclusão: 2006 PESQUISA E CAPTAÇÃO DE AGUAS SUBTERRÂNEAS – CONSTRUÇÃO DE FURO EM FONTERMA II Investimento total: 45.829,00€ Ano de conclusão: 2006 PÓLO LOGÍSTICO E INDUSTRIAL DE ARAZEDE: CONSTRUÇÃO DE INFRA-ESTRUTURAS: EXECUÇÃO DE CONDUTA ADUTORA E CONSTRUÇÃO DE RESERVATÓRIO E GRUPO ELEVATÓRIO Investimento total: 257.914€ Ano de conclusão: 2008 CENTRO DE RECOLHA ANIMAL DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 63.033,00€ Ano de conclusão: 2008 CEMITÉRIO MUNICIPAL Investimento total: 114.985,32 Ano de conclusão: 2009 MANUTENÇÃO DE RESERVATÓRIOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA: SISTEMA DE TENTÚGAL: RESERVATÓRIO R9 Investimento total: 105.262,00€ Ano de conclusão: 2012 MANUTENÇÃO DE RESERVATÓRIOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA: SISTEMA DE ABRUNHEIRA: RESERVATÓRIO R2 Investimento total: 56.665,00€ Ano de conclusão: 2011 PESQUISA E CAPTAÇÃO DE AGUAS SUBTERRÂNEAS – CONSTRUÇÃO DE FURO EM FONTERMA I Investimento total: 47.503,00€ Ano de conclusão: 2012
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MANUTENÇÃO DE RESERVATÓRIOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA: SISTEMA DE PEREIRA – S. TIAGO Investimento total: 61.180,00€ Ano de conclusão: 2013 REDE DE ESGOTOS DE ARAZEDE FASE A + PARTE REFERENTE À EX-EN 335-1 + ETAR Investimento total: 2.482.753,49€ Estado do projeto: Em execução Entidade financiadora: POVT (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 / 2014 REDE DE ESGOTOS DE GATÕES, SEIXO E LICEIA + ETAR Investimento total: 4.170.525,93€ Entidade financiadora: POVT (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 REDE DE ESGOTOS DE VERRIDE, VILA NOVA DA BARCA E ABRUNHEIRA + ETAR Investimento total: 3.451.291,49€ Entidade financiadora: POVT (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 REDE DE ESGOTOS DO MUNICÍPIO DE MONTEMOR-O-VELHO (CONTINUAÇÃO): TORRE, MECO, PORTELA (ETAR), AREAL, SANTO VARÃO E FORMOSELHA, GORDOS E ZAMBUJEIRO, CASAIS VELHOS E CASAL MINHOTO, MOINHO DA MATA E GATÕES (CONDUTA ELEVATÓRIA) Investimento total: 1.831.689,62€ Estado do projeto: Em execução Entidade financiadora: POVT (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013/2014 AÇÕES DESENVOLVIDAS NA ÁREA DO AMBIENTE OAU – ÓLEOS ALIMENTARES USADOS Celebração de protocolo de colaboração ambiental para a recolha dos óleos alimentares usados. Data: Outubro 2009 Colocação de oleões nas Juntas de Freguesia e Escolas – 2009 Colocação de oleões de exterior – 2011 a 2013 48
Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
SOGILUB – SOCIEDADE DE GESTÃO DE ÓLEOS LUBRIFICANTES USADOS, LDA. Celebração de protocolo de colaboração ambiental para a recolha dos óleos lubrificantes usados. Data: Outubro 2012 VALORCAR – SOCIEDADE DE GESTÃO DE VEÍCULOS EM FIM DE VIDA Celebração de protocolo de colaboração ambiental para a gestão dos veículos em fim de vida. Data: Agosto 2011 REEE – RESÍDUOS DE EQUIPAMENTOS ELÉCTRICOS E ELECTRÓNICOS Colaboração/apoio ao protocolo celebrado entre a Ambi3e e os Bombeiros Voluntários de Montemor-o-Velho, para um Ponto de Recepção do Sistema Integrado de Gestão de REEE. Data: Novembro 2011 RECOLHA SELECTIVA Colocação de 70 ecopontos no Concelho (em parceria com a ERSUC), abrangendo a totalidade da população do Concelho Em 2012 a Empresa Pública de Recolha de Resíduos Sólidos Urbanos de Coimbra facturou à Câmara Municipal de Montemor-o-Velho cerca de 638.000€ de serviços.
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ECONOMIA. Dar um novo sentido à palavra ruralidade significa também criar condições para o desenvolvimento. O Parque de Negócios de Montemor-o-Velho e o PLIA – Parque Logístico e Industrial de Arazede repercutem a preocupação e o empenho na promoção de um progresso sustentado, assente nos valores do empreendedorismo e da responsabilidade social e ambiental. MERCADO MUNICIPAL Investimento total: 1.468.330,39€ Entidade financiadora: POR Centro (QCA III) Ano de conclusão: 2004 PARQUE DE NEGÓCIOS DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 1.677.687,90€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2006 PARQUE LOGÍSTICO E INDUSTRIAL DE ARAZEDE Investimento total: 2.457.760,70€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013
Parque Logístico e Industrial de Arazede. (fotografia de João Pedro Jesus)
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EQUIPAMENTOS CULTURAIS. Com fortes tradições teatrais, associativas e com quatro bandas filarmónicas centenárias, a aposta municipal não podia ficar alheia à cultura e ao favorecimento de um território que permita o florescer da arte, do conhecimento e da inovação. A aposta foi para espaços versáteis, multifacetados que respondam eficazmente aos anseios da população de hoje e de amanhã. CELEIRO DOS DUQUES DE AVEIRO Investimento total: 219.759,74€ Entidade financiadora: LEADER + ADELO Ano de conclusão: 2005 GALERIA MUNICIPAL Investimento total: 184.555€ Entidade financiadora: Programa LEADER+ ADELO Ano de conclusão: 2005 BIBLIOTECA MUNICIPAL AFONSO DUARTE Investimento total: 1.882.688,00€ Entidades financiadoras: POR Centro (QCA III 2000-2006) e IPLB Ano de conclusão: 2007 CENTRO CULTURAL DE SANTO VARÃO Investimento total: 65.020€ Ano de conclusão: 2013
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Biblioteca Municipal Afonso Duarte. Montemor-o-Velho. (fotografia de João Pedro Jesus)
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MOBILIDADE. O Rio Mondego e seus campos assistem à azáfama e ao bulício do quotidiano com a certeza de que o reforço da melhoria da mobilidade urbana fazem de Montemor-oVelho um concelho mais seguro. O caminho para o crescimento e para o sucesso tem de ser trilhado em rede e em parceria. Tal como as redes do conhecimento são fundamentais para a partilha de informação, também a rede viária concelhia se assume como um meio indispensável de acesso e ligação dos territórios e das pessoas. Com maior conforto, foi possível criar também acessos ao espaço urbano e convidar à sua fruição. CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: ARRUAMENTOS JUNTO À MISERICORDIA E ACESSO À PONTE EM PEREIRA – INFRAESTRUTURAS ELECTRICAS Investimento total: 65.457,30€ Ano de conclusão: 2002 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: CONSTRUÇÃO DE MURO R. DA MADALENA – MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 19.562,81€ Ano de conclusão: 2002 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ARAZEDE Investimento total: 102.827,05€ Ano de conclusão: 2002 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE CARAPINHEIRA Investimento total: 67.847,30€ Ano de conclusão: 2002 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE STO. VARÃO E PEREIRA Investimento total: 70.174,86€ Ano de conclusão: 2002
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ARAZEDE Investimento total: 114.780,26€ Ano de conclusão: 2002 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIA DO SEIXO Investimento total: 102.304,84€ Ano de conclusão: 2002 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: CONSTRUÇÃO DE PONTÃO (RIBEIRA DO SEIXO) Investimento total: 40.576,48€ Ano de conclusão: 2002 CAMINHO MUNICIPAL ENTRE CASAIS VELHOS E ENTRE VALAS Investimento total: 97.884,34€ Ano de conclusão: 2002 EM 578 – TROÇO ENTRE BOLETA E MECO Investimento total: 282.292,76€ Ano de conclusão: 2002 PARQUE DE MAQUINAS – CONSTRUÇÃO (1ª FASE) Investimento total: 47.298,83€ Ano de conclusão: 2002 EM577 (CHIEIRA-RELVEIRO) À EN111 (TENTUGAL) – REPERFILAGEM DA VIA Investimento total: 217.333,02€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE PEREIRA E ST. VARÃO Investimento total: 128.869,52€ Ano de conclusão: 2003
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: ARRUAMENTO NO PINHAL DA CRUZ - CARAPINHEIRA Investimento total: 41.819,93€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: DIVERSAS FREGUESIAS DO CONCELHO Investimento total: 70.794,36€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ARAZEDE – CAMINHO DAS FAISCAS À MOITA VAQUEIRA (LIMITE DO CONCELHO) Investimento total: 35.800,59€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ARAZEDE Investimento total: 35.274,28€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DAS MEÃS Investimento total: 90.932,86€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DO SEIXO E LICEIA Investimento total: 78.827,79€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: VILA DE MONTEMOR-O-VELHO – SINALIZAÇÃO VERTICAL E HORIZONTAL Investimento total: 41.743,80€ Ano de conclusão: 2003 E.M. ENTRE CARAPINHEIRA E GATÕES Investimento total: 374.509,66€ Ano de conclusão: 2003 55
Luís Manuel Barbosa Marques Leal
CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: INTERVENÇÃO NA RUA N. SRA DO PRANTO E RUA DE S. TIAGO EM PEREIRA DO CAMPO Investimento total: 68.061,67€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE ARAZEDE, EREIRA, GATÕES, SEIXO E TENTUGAL Investimento total: 44.494,07€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: ER335-1; EM581 E EM 577 Investimento total: 70.797,23€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE ABRUNHEIRA, VERRIDE, VILA NOVA DA BARCA, STO. VARÃO E PEREIRA Investimento total: 89.378,69€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIA DE LICEIA Investimento total: 29.478,45€ Ano de conclusão: 2003 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREG. DE CARAPINHEIRA, MONTEMOR-O-VELHO E SEIXO Investimento total: 41.398,16€ Ano de conclusão: 2003 EM581 – LICEIA AO LIMITE DO CONCELHO (FIGUEIRA DA FOZ) – CONSTRUÇÃO DE PONTÃO Investimento total: 45.188,69€ Ano de conclusão: 2004
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE GATÕES E CARAPINHEIRA Investimento total: 62.215.70€ Ano de conclusão: 2004 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE LICEIA E SEIXO Investimento total: 104.518,12€ Ano de conclusão: 2004 CM PRESALVES/OUTEIRO DA MOURA Investimento total: 36.344,18€ Ano de conclusão: 2004 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE ARAZEDE Investimento total: 106.944,38€ Ano de conclusão: 2004 ARRUAMENTOS VILA DE ARAZEDE – R. PADRE MANUEL CLARO Investimento total: 70.442,91€ Ano de conclusão: 2004 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE ABRUNHEIRA, MONTEMOR-O-VELHO, PEREIRA DO CAMPO E STO. VARÃO Investimento total: 67.531,64€ Ano de conclusão: 2004 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE CARAPINHEIRA E PEREIRA Investimento total: 55.915,65€ Ano de conclusão: 2004 CM CASAL FERNANDO/MECO – REGULARIZAÇÃO PLATAFORMA Investimento total: 22.465,16€ Ano de conclusão: 2004
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE ABRUNHEIRA E VERRIDE Investimento total: 26.082,00€ Ano de conclusão: 2004 SINALIZAÇÃO RODOVIÁRIA – SINALIZAÇÃO VERTICAL E HORIZONTAL NO CONCELHO DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 308,518,46€ Ano de conclusão: 2004 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE CARAPINHEIRA Investimento total: 102.250,58€ Ano de conclusão: 2005 INTERVENÇÃO NO ESPAÇO URBANO DA CARAPINHEIRA: R. NOVA DO ARNEIRO (CONSTRUÇÃO) Investimento total: 220.455,20€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: DIVERSAS FREGUESIAS DO CONCELHO Investimento total: 59.495,35€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS – DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS NA EX. EN111 Investimento total: 79.658,25€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS – FREGUESIAS DE LICEIA E SEIXO Investimento total: 97.228,90€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS – FREGUESIAS DE ABRUNHEIRA, EREIRA E VERRIDE Investimento total: 91.618,37€ Ano de conclusão: 2005
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS – FREGUESIAS DE GATÕES E MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 73.186,95€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES – FREGUESIA DE ARAZEDE Investimento total: 146.387,98€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES – DIVERSAS FREGUESIAS Investimento total: 73.361,40€ Ano de conclusão: 2005 EM 577 ARAZEDE - TENTUGAL Investimento total: 549.818,93€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS – FREGUESIAS DE MEÃS E TENTUGAL Investimento total: 118.240,94€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS (ALTERAÇÃO DO ENTRONCAMENTO DA EX EN341/ CARVALHAL DA AZOIA) Investimento total: 34.811,18€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE CAMINHOS AGRICOLAS/RURAIS: VERGIEIRA, FAISCAS E CHARRINS Investimento total: 83.228,99€ Ano de conclusão: 2005 EM ENTRE CARAPINHEIRA E GATÕES – TROÇO ENTRE VALE GRANDE E GATÕES Investimento total: 104.369,58€ Ano de conclusão: 2005
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS (FREGUESIA MEÃS – CONSTRUÇÃO DE PONTÃO) Investimento total: 22.794,19€ Ano de conclusão: 2006 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: SEMAFORIZAÇÃO DA PASSAGEM INFERIOR DE PEREIRA Investimento total: 3.785,14€ Ano de conclusão: 2007 SINALIZAÇÃO RODOVIARIA SEMAFORIZAÇÃO DO CRUZAMENTO DO BEBEDOURO Investimento total: 5.233,73€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS SEIXO, MONTEMOR-O-VELHO E GATÕES Investimento total: 139.264,95€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS TENTÚGAL, ARAZEDE E CARAPINHEIRA Investimento total: 17.459,31€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: CARAPINHEIRA, LICEIA E MEÃS Investimento total: 99.265,07€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DA CARAPINHEIRA Investimento total: 23.528,40€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE ARAZEDE, LICEIA, MONTEMOR-O-VELHO, PEREIRA E STO. VARÃO Investimento total: 97.549,57€ Ano de conclusão: 2007 60
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE LICEIA Investimento total: 23.303.86€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE MONTEMOR-O-VELHO (ROTUNDA NA EX. EN 111) Investimento total: 21.575,40€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE STO. VARÃO (R. CASAL DOS MOUROS) Investimento total: 99.165,80€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE STO. VARÃO (RUA CARREIRA NABAL EM FORMOSELHA) Investimento total: 66.281,95€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: (FREGUESIAS DE ABRUNHEIRA, EREIRA, VERRIDE, VILA NOVA DA BARCA E PEREIRA) Investimento total: 119.139,98€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: (FREGUESIA DE TENTUGAL Investimento total: 101.114,77€ Ano de conclusão: 2007 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE ARAZEDE E STO. VARÃO Investimento total: 135,757,92€ Ano de conclusão: 2007
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PASSAGEM SUPERIOR DE FORMOSELHA Investimento total: 1.114.523,90€ Entidade financiadora: IMTT Ano de conclusão: 2007 PASSAGEM SUPERIOR DE PEREIRA Investimento total: 553.441,66€ Entidade financiadora: IMTT Ano de conclusão: 2007 EX-EN 341 DO KM 30,050 AO KM 37,023 Investimento total: 1.413.576,17€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2007 PONTE DA EREIRA Investimento total: 144.616,45 € Entidade financiadora: POR Centro (QCA III 2000-2006) Ano de conclusão: 2008 EM 335-1 ENTRE ARAZEDE E VOLTA DA TOCHA Investimento total: 1.121.667,72€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2008 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE TENTÚGAL, ARAZEDE, MONTEMOR-OVELHO, MEÃS E VERRIDE Investimento total: 53.882,33€ Ano de conclusão: 2008 EM347 ENTRE QUINHENDROS E LIMITE DO CONCELHO (SANTANA) - PARTE Investimento total: 23.509,83€ Ano de conclusão: 2008
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ABRUNHEIRA, ARAZEDE, MEAS, GATÕES E VILA NOVA DA BARCA Investimento total: 112.731,63€ Ano de conclusão: 2008 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE CARAPINHEIRA - SEMAFORIZAÇÃO CRUZAMENTO DA BOLETA/CARAPINHEIRA Investimento total: 16.807,35€ Ano de conclusão: 2008 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE MONTEMOR, CARAPINHEIRA, MEÃS, LICEIA, TENTÚGAL E VILA NOVA DA BARCA Investimento total: 93.135,61€ Ano de conclusão: 2009 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE ARAZEDE E TENTÚGAL Investimento total: 141.167,33€ Ano de conclusão: 2009 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ARRUAMENTOS NAS POVOAÇÕES: FREGUESIAS DE ARAZEDE, EREIRA, GATÕES, MONTEMORO-VELHO, PEREIRA, TENTÚGAL, VERRIDE E V. N. BARCA Investimento total: 125.404,92€ Ano de conclusão: 2009 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE, ARAZEDE, MEÃS MONTEMOR-O-VELHO E VERRIDE Investimento total: 24.205,92€ Ano de conclusão: 2009 SINALIZAÇÃO RODOVIÁRIA Investimento total: 53.938,50€ Ano de conclusão: 2009
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE MONTEMOR-O-VELHO, MEÃS E TENTUGAL Investimento total: 69.362,24€ Ano de conclusão: 2009 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ABRUNHEIRA, EREIRA E VERRIDE Investimento total: 133.522,82€ Ano de conclusão: 2009 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE ABRUNHEIRA Investimento total: 53.959,25€ Ano de conclusão: 2011 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIAS DE CARAPINHEIRA, GATÕES, MEÃS E LICEIA Investimento total: 58.300,01€ Ano de conclusão: 2011 EIXO VIÁRIO DO SISTEMA URBANO DAS GANDARAS – ARAZEDE/ MECO: ROTUNTA DOS GORDOS À IGREJA (VIA CEMITÉRIO) Investimento total: 103.110,36€ Ano de conclusão: 2012 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE PEREIRA Investimento total: 73.510,30€ Ano de conclusão: 2012 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE TENTUGAL Investimento total: 20.653,77€ Ano de conclusão: 2012
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CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 156.656,15€ Ano de conclusão: 2013 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: FREGUESIA DE PEREIRA, STO. VARÃO E MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 37.559,47€ Ano de conclusão: 2013 EIXO PEDONALIZADO (LIGAÇÃO ENTRE CENTRO DE ALTO RENDIMENTO E CENTRO HISTÓRICO DE MONTEMOR-O-VELHO) Investimento total: 662.016,56 € Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 INTERVENÇÃO NO ESPAÇO URBANO DE MONTEMOR-O-VELHO (AV. DOS BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS E AV. 25 DE ABRIL) Investimento total: 454.824,77€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAMINHOS MUNICIPAIS: ABRUNHEIRA, VERRIDE E V. N. BARCA Investimento total: 476.194,72€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE ESTRADAS, ARRUAMENTOS E CAM. MUNICIPAIS: MONTEMOR-O-VELHO, GATÕES E SEIXO Investimento total: 713.181,77€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 ASCENSOR MECÂNICO DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 1.301.359,60 € Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013
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Ascensor Mecânico de Montemor-o-Velho. (fotografia de João Pedro Jesus)
Passagem Superior de Formoselha. (fotografia de João Pedro Jesus)
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ACESSO MONTANTE E NORTE DO CAR - CENTRO DE ALTO RENDIMENTO DE MONTEMOR-O-VELHO Ligação Formoselha/Casal Novo do Rio (Montemor-o-Velho) Investimento total: 1.250.000€ Estado do projeto: Em execução Ano de conclusão: 2014 PASSAGEM INFERIOR DE FORMOSELHA (LINHA DO NORTE) Investimento total: 500.000€ Estado do projeto: Adjudicado Ano de Conclusão: 2014 PASSAGEM SUPERIOR DE SANTO VARÃO Investimento total: 100.000€ Estado do projeto: Adjudicado Ano de Conclusão: 2014 ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS – (ROTUNDA DE LAVARIZ – EN111) Investimento total: 34.914,48€ Ano de conclusão: 2003 ILUMINAÇÃO PUBLICA – FREGUESIA DE ARAZEDE (ILUMINAÇÃO DO LARGO SILVA FERRÃO) Investimento total: 7.560,46€ Ano de conclusão: 2004 ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS – ILUMINAÇÃO DO EXTERIOR DO CEMITÉRIO DE VERRIDE Investimento total: 4.916,63€ Ano de conclusão: 2004 ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS – ILUMINAÇÃO PUBLICA DA PONTE DE PEREIRA E RESPETIVOS ACESSOS Investimento total: 51.510,92€ Ano de conclusão: 2005
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ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS – REDE DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA DA EN 111 ENTRE A ROTUNDA DA LAVARIZ E A ROTUNDA DO INTERMARCHÊ (MONTEMOR-O-VELHO) Investimento total: 125.945,67€ Ano de conclusão: 2005 ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS: EM335-1 ENTRE ARAZEDE E VOLTA DA TOCHA – CONSTRUÇÃO DE INFRAESTRUTURAS ELÉCTRICAS (PT179 CAETANAS) Investimento total: 46.751,01€ Ano de conclusão: 2007 ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS: RUA CARREIRA DO NABAL EM FORMOSELHA Investimento total: 39.010,25€ Ano de conclusão: 2007 ELETRIFICAÇÃO DE ZONAS URBANAS: EM335-1 ENTRE ARAZEDE E VOLTA DA TOCHA – CONSTRUÇÃO DE INFRAESTRUTURAS ELÉCTRICAS (PT089 VOLTA DA TOCHA) Investimento total: 88.284,99€ Ano de conclusão: 2007 Em 2012, os encargos com Energia foram 1.200.000€ dos quais 547.000€ dizem respeito a Iluminação Pública.
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EQUIPAMENTOS DESPORTIVOS. Descobrir Montemor-o-Velho é encontrar um espaço de excelência para a prática desportiva. Vivenciar os diversos equipamentos em família ou com amigos é um desafio e uma oportunidade não apenas de exercitar o corpo e a mente, mas também para apreciar o magnífico ar puro que ainda se respira por terras do Baixo Mondego. Somos uma vila olímpica, onde campeões, das mais diversas modalidades, desde a canoagem (com os vice campeões olímpicos dos Jogos de Londres 2012), ao remo, à natação, ao triatlo, à equitação, ao karaté ou ao xadrez, se formam e consolidam. Seja em lazer, de forma amadora ou profissional, o concelho pode orgulhar-se das suas condições para a prática desportiva. CONSTRUÇÃO DE POLIDESPORTIVO DOS RESGATADOS Investimento estimado: 84.023,36€ Ano de conclusão: 2004 PISCINA MUNICIPAL DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 2.402.355,11 € Entidades financiadoras: POR Centro (QCA III 2000-2006) e IDP Ano de conclusão: 2005 PAVILHÃO MUNICIPAL DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 985.534,18€ Entidade financiadora: POR Centro (QCA III 2000-2006) e DGAL Ano de conclusão: 2007 MINISINTETICO DE PEREIRA (CONSTRUÇÃO) Investimento total: 13.276,50€ Ano de conclusão: 2009 RELVADOS SINTÉTICOS DE ARAZEDE E CARAPINHEIRA Investimento total: 617.652,25€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2011
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Centro de Alto Rendimento de Montemor-o-Velho. (fotografia de João Pedro Jesus)
CENTRO DE ALTO RENDIMENTO DE MONTEMOR-O-VELHO (2ª FASE) Investimento total: 17.164.034,57€ Entidade financiadora: POVT (QREN 2007-2013) Ano de conclusão previsto: 2013 RELVADO SINTÉTICO DE PEREIRA Investimento total: 360.872,74€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2013 RELVADO SINTÉTICO DE EREIRA Investimento estimado: 280.000 € Estado do projeto: candidato a financiamento Ano de conclusão: 2014 RELVADO SINTÉTICO DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento estimado: 289.000€ Estado do projeto: Em adjudicação Ano de conclusão: 2014
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Relvado Sintético de Arazede. (fotografia de João Pedro Jesus)
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EQUIPAMENTOS DE LAZER. Se a História de Montemor-o-Velho se reveste de uma forte importância, remontando até aos primórdios da nacionalidade, também as suas componentes ambientais e paisagísticas se afiguram plenas de interesse e beleza. Experienciar o concelho é sentir também a Natureza e, ao mesmo tempo, usufruir de estruturas pensadas para tornar esses momentos ainda mais especiais. ARRANJOS DE ESPAÇOS VERDES E AMBIENTAIS NA FREGUESIA DE ABRUNHEIRA - ROTA DAS FONTES Investimento total: 262.780,56 € Entidade financiadora: POR Centro (QCA III 2000 – 2006) Ano de conclusão: 2008 JARDINS E ESPAÇOS VERDES - ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DO ESTEIRO DA EREIRA E BENEFICIAÇÃO DO ACESSO SUL Investimento total: 139.537,19 € Ano de conclusão: 2006 PARQUE INFANTO JUVENIL DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 89.833,67 € Entidade financiadora: Programa LEADER+ ADELO Ano de conclusão: 2006 JARDIM DE VERRIDE Investimento total: 233.707,37 € Ano de conclusão: 2010
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EQUIPAMENTOS DE EDUCAÇÃO. O desenvolvimento de um concelho tem de passar pela aposta na Educação. Com melhores equipamentos, os jovens munícipes têm a garantia de que o investimento é feito a pensar no futuro de um Montemor-o-Velho mais sábio e criativo, capaz de enfrentar as adversidades e investir nos desafios. O Município tem-se empenhado, na última década, em melhorar e requalificar o parque escolar do 1º ciclo do Ensino Básico. Em 2010 revolucionámos o panorama educativo com o novo Campus Escolar Jorge de Montemor, que integra o Centro Educativo de Montemor-o-Velho e a Escola Secundária, e que recebe 1400 alunos, do pré-escolar ao secundário. REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMARIAS: 1º CEB DE FORMOSELHA E BUNHOSA Investimento total: 75.289.03€ Ano de conclusão: 2003 REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMARIAS – 1º CEB DE MONTEMOR-O-VELHO CONSTRUÇÃO DE MURO DE SUPORTE) Investimento total: 43.005,69€ Ano de conclusão: 2003 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMARIAS: ESCOLA PRIMÁRIA N.º2 - LICEIA Investimento total: 72.140,21€ Ano de conclusão: 2003 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMARIAS: 1º CEB DE TENTUGAL Investimento total: 70.732,77€ Ano de conclusão: 2003 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMARIAS: ESCOLA PRIMÁRIA DO SEIXO Investimento total: 70.190,55€ Ano de conclusão: 2003
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GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMARIAS: 1º CEB DOS PELICHOS Investimento total: 89.704,87€ Ano de conclusão: 2004 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE PRÉ-PRIMÁRIA NA CARAPINHEIRA Investimento total: 133.850,41€ Ano de conclusão: 2004 REPARAÇÕES PARCIAIS DE ESCOLAS PRIMARIAS: 1º CEB DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 31.311,00€ Ano de conclusão: 2004 ESCOLA PRÉ-PRIMÁRIA DA BUNHOSA (CONSTRUÇÃO) Investimento total: 222.172,71€ Ano de conclusão: 2004 ESCOLA EB1 DO SEIXO Investimento total: 70.190,55€ Ano de conclusão: 2004 ESCOLA PRÉ PRIMÁRIA CARAPINHEIRA Investimento total: 133.850,40€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2005 ESCOLA EB1 DE ARAZEDE Investimento total: 45.263,51€ Ano de conclusão: 2005 ESCOLA PRÉ PRIMÁRIA LICEIA Investimento total: 161.770,62€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2005
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ESCOLA PRÉ-PRIMÁRIA DE LICEIA E RESGATADOS – CONSTRUÇÃO (REMODELAÇÃO E AMPLIAÇÃO DE EDIFICIO EM LICEIA) Investimento total: 180.607,63€ Ano de conclusão: 2005 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE PRÉ-PRIMÁRIA EM ARAZEDE Investimento total: 57.624,37€ Ano de conclusão: 2005 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMÁRIAS – 1º CEB DA PORTELA Investimento total: 122.879,19€ Ano de conclusão: 2005 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMÁRIAS – 1º CEB DE RIBEIRA DOS MOINHOS Investimento total: 46.646,93€ Ano de conclusão: 2005
Pré-Primária de Liceia. (fotografia de João Pedro Jesus)
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
ESCOLA PRÉ PRIMÁRIA BUNHOSA Investimento total: 222.172,71€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2006 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMÁRIAS – CARAPINHEIRA Investimento total: 74.737,11€ Ano de conclusão: 2006 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMÁRIAS – 1º CEB DE ARAZEDE Investimento total: 126.131,17€ Ano de conclusão: 2006 REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMÁRIAS – EXECUÇÃO DE PARQUE INFANTIL NO 1º CEB DO TOJEIRO Investimento total: 10.395,00€ Ano de conclusão: 2007 GRANDES TRANSFORMAÇÕES DE ESCOLAS PRIMÁRIAS – 1º CEB DE ARAZEDE (CONSTRUÇÃO DE REFEITÓRIO) Investimento total: 47.867,42€ Ano de conclusão: 2007 REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMÁRIAS: 1º CEB DE FORMOSELHA (CONSTRUÇÃO DE REFEITÓRIO) Investimento total: 90.608,72€ Ano de conclusão: 2007 REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMÁRIAS: 1º CEB DOS RESGATADOS Investimento total: 2.504,25€ Ano de conclusão: 2007 REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMÁRIAS: 1º CEB DA CARAPINHEIRA, COUTADA, VISO E RESGATADOS Investimento total: 137.262,65€ Ano de conclusão: 2007
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
REPARAÇÕES PARCIAIS EM ESCOLAS PRIMÁRIAS: ARAZEDE, CASAL NOVO, EREIRA, TOJEIRO E VERRIDE Investimento total: 104.744,19€ Ano de conclusão: 2007 ESCOLA EB1 DE TENTÚGAL Investimento total: 93.469,02€ Ano de conclusão: 2008 CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO DE PRÉ-PRIMÁRIAS: ALTERAÇÃO/ AMPLIAÇÃO DO JARDIM DE INFÂNCIA DE CARAPINHEIRA Investimento total: 48.786,08€ Ano de conclusão: 2008 CENTRO EDUCATIVO DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 2.141.914,57€ Entidade financiadora: POR Centro (QREN 2007-2013) Ano de conclusão: 2010 Alguns dados sobre encargos com “Educação” pagos em 2012: - transportes escolares 361.000€ - alimentação escolar 464.000€ - bolsas de estudos 48.000€ - auxílios económicos e material de educação 27.000€
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LuĂs Manuel Barbosa Marques Leal
Centro Educativo de Montemor-o-Velho. (fotografia de JoĂŁo Pedro Jesus)
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
MODERNIZAÇÃO ADMINISTRATIVA. Uma governação de proximidade só faz sentido se feita a pensar nas pessoas e na busca incessante de melhoria. Desburocratizar, simplificar e proporcionar um acesso de qualidade, célere, eficiente e transparente à administração pública são os objetivos que têm norteado a ação governativa local no sentido de prestar os melhores serviços aos cidadãos. POSTO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO – MULTIBALCÃO Entidade parceira: IGLC Ano de conclusão: 2003 ESPAÇO INTERNET DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 123.481,86€ Entidade financiadora: POSI Ano de conclusão: 2004 JULGADO DE PAZ Entidade parceira: Ministério da Justiça Ano de conclusão: 2004 MODERNIZAÇÃO ADMINISTRATIVA E CRIAÇÃO DE BALCÃO ÚNICO NO MUNICÍPIO DE MONTEMOR-O-VELHO Investimento total: 492.713,67 € Estado do projeto: Em execução Entidade financiadora: POFC Ano de início: 2013 Ano de conclusão: 2014
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
ESPAÇO PÚBLICO. À extensa produção e contributo para a memória imaterial concelhia, com a reconhecida e premiada produção editorial promovida pela Câmara Municipal, junta-se a homenagem à memória e identidade com as peças escultóricas do concelho. Lembrar a tradição é honrar o legado dos antepassados e abrir a porta à esperança, ao conhecimento e à passagem de testemunho às gerações vindouras. INÊS DE CASTRO Investimento total: 29.927,87 € Artista: Armando Martinez Ano de conclusão: 2003 HOMEM DOS CAMPOS DO MONDEGO Investimento total: 14.430 € Artista: António Nogueira Ano de conclusão: 2004 MULHER GANDARESA Investimento total: 14.430 € Artista: António Nogueira Ano de conclusão: 2007 MURAL DO BICENTENÁRIO Investimento total: 9.500 € Artista: Francisco Vidal Ano de conclusão: 2008 PESCADOR DA EREIRA Investimento total: 14.430 € Artista: António Nogueira Ano de conclusão: 2009 MONUMENTO AO LAVRADOR DE LICEIA Investimento total: 15.900 € Artista: António Nogueira Ano de conclusão: 2013
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
MONUMENTO À MONDADEIRA DAS MEÃS DO CAMPO Investimento total: 15.688 € Artista: António Nogueira Estado do projeto: Em execução Ano de conclusão: 2013
Monumento ao Pescador. Ereira. (fotografia de João Pedro Jesus)
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
EQUIPAMENTO SOCIAL A saúde e a assistência social são pilares que na última década têm norteado a estratégia de um crescimento sustentável. O acesso à saúde, o apoio às franjas populacionais mais carenciadas, às crianças e aos idosos e a redução das assimetrias sociais fazem de Montemor-o-Velho um território de causas e de estratégia para o futuro. RECUPERAÇÃO DA CASA DOS MAGISTRADOS (CANOAGEM) Investimento total: 54.541,86 € Ano de conclusão: 2002 EXTENSÃO DE SAÚDE DE ARAZEDE Investimento total: 402.896,65 € Entidade financiadora: ARS Ano de conclusão: 2006 CENTRO DE DIA DE VILA NOVA DA BARCA Investimento total: 137.814 € Ano de conclusão: 2008
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Montemor-o-Velho . O reerguer de um territ贸rio
Centro de Dia de Vila Nova da Barca. (fotografia de Jo茫o Pedro Jesus)
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
PATRIMÓNIO CULTURAL IMATERIAL MÓVEL ANO
AQUISIÇÃO RECUPERAÇÃO
/ DOAÇÃO
2003
Aquisição do manuscrito “Memórias”, de António Correia da Fonseca e Andrade Aquisição de coleção etnográfica a Arlindo de Almeida (cerca de 450 peças)
2004
Aquisição de 23 postais antigos de Montemor-o-Velho
2005
Aquisição de quatro peças etnográficas (Cachenés)
2006
2008
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Aquisição da 2ª edição da “Peregrinação”, de Fernão Mendes Pinto
Doação da família Condorcet da “Historia Manlianense, Cronológica, Epitomatica, Bélica, Genealógica e Panegírica, na qual a curiosidade decifrará sucessos que admiram, progressos que assombram e desenganos que aproveitam” Doação de coleção de publicações, duas espadas, três sombrinhas e um quadro, por Eng. Nunes da Costa Recuperação de espólio pétreo oriundo do Castelo, realçando-se as pedras do pórtico da Igreja Nova e três inscrições fúnebres, do início da nacionalidade Doação de coleção de artigos de imprensa e coleção de pautas de música, por Letícia da Silva Couceiro Lopes Maranha, Henrique Lopes Maranha e Judite Maria Couceiro Lopes Maranha Doação de coleção de material fotográfico (271 slides e 5 fotografias), por Varela Pé Curto Doação de réplica em miniatura da Capela de S. Sebastião de Montemoro-Velho, também designada do Santo Mártir, por Mário de Sousa Mano. Doação de coleção de publicações científicas por Manuel Carvalho Varela (115 peças) Doação de duas pautas de música, por Carlos Daniel de Freitas Oliveira Cordeiro
Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
2009
2010
2012
Aquisição de espólio de Afonso Duarte (cerca de duas centenas de peças) Aquisição de 12 desenhos de Manuel de Macedo Aquisição de manuscrito sobre a Quinta do Outeiro, na Carapinheira Restauro do relógio mecânico do Castelo e das Varas dos Vereadores
2013
Doação de coleções de mobiliário antigo, cerâmica, têxteis e objectos decorativos, pelo Dr. António Caetano (cerca de 200 peças)
Doação de coleção documental do Eng. Carlos Laranjeira Doação de espólio documental de Afonso Duarte, pela Dr.ª Maria Augusta Trindade TOTAL: 106.000€
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Luís Manuel Barbosa Marques Leal
INVESTIMENTO PAGO 2002-2013 (até 31 de julho de 2013) INVESTIMENTO 1. Vias Comunicação e Transportes
21.559.438 €
2. Desporto, Cultura e Turismo
28.471.660 €
3. Saneamento, Água e Meio Ambiente
17.903.008 €
4. Educação, A. Social e Saúde
5.656.609 €
5. Ord. Território e Habitação
8.646.224 €
6. Administração Geral/Protecção Civil
1.557.218 €
7. Indústria e Energia, Mercados e Feiras
6.669.498 €
TOTAL 1º mandato (2002/2005): 32.418.332€ 2º mandato (2005/2009): 23.949.741€ 3º mandato (2009/31 julho 2013): 34.095.582€
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TOTAL (€)
90.463.655 €
Montemor-o-Velho . O reerguer de um território
GESTÃO ORÇAMEN TAL 2002-2013 (até 31 de julho de 2013) 1. Receita Total
219.921.942 €
2. Despesa Total
219.916.335 €
3. Despesa Corrente
106.290.886 €
4. (3/2) (%) 5. Despesa Capital 6. (5/2) (%) 7. Investimento 8. (7/2) (%) 9. Despesa Pessoal
48,3% 113.625.449 € 51,7% 90.463.655 € 41,1% 46.671.337 €
10. (9/2) (%)
21,2%
11. (9/3) (%)
43,9%
12. Despesa Funcionamento 13. (12/2) (%) 14. Despesa Financeira 15. (14/2) (%) 16. Transferências e Outras Despesas 17. (16/2) (%)
43.758.497 € 19,9% 24.227.297 € 11,0% 14.795.542 € 6,7%
18. Transferências J. Freguesia
4.994.848 €
19. Transferências Associativismo
4.942.926 €
20. Transferências Proteção Civil
1.297.851 €
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Abreviaturas ADELO - Associação de Desenvolvimento Local da Bairrada e Mondego ARS – Administração Regional de Saúde do Centro, IP DGAL – Direcção Geral das Autarquias Locais IDP – Instituto do Desporto de Portugal IGLC – Instituto para a Gestão das Lojas do Cidadão IMTT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres IPLB – Instituto Português do Livro e das Bibliotecas QCA III (2000-2006) – 3.º Quadro Comunitário de Apoio 2000-2006 QREN (2007-2013) – Quadro de Referência Estratégica Nacional 2007-2013 POFC – Programa Operacional Fatores de Competitividade POR Centro – Programa Operacional Regional do Centro POSI – Programa Operacional para a Sociedade da Informação POVT – Programa Operacional Temático Valorização do Território PRAUD – Programa de Reabilitação das Áreas Urbana Degradadas PROSIURB – Programa de Consolidação do Sistema Urbano Nacional e de Apoio à Execução dos Planos Diretores Municipais URBCOM – Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial
Deolindo Pessoa*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 89 - 93
A Missão A Missão é a 50ª produção do CITEC estreada no passado dia 28 de Junho de 2013, no Convento de Nossa Senhora dos Anjos, em Montemor-o-Velho, e é uma criação teatral inspirada no livro de Ferreira de Castro com o mesmo título, escrito em 1950. Esta produção é concebida para um espaço próprio, os claustros do Convento em cuja igreja se encontra o túmulo de Diogo da Azambuja, embora se possa realizar noutros espaços não convencionais e monumentais. O seu primeiro grande objectivo é mesmo reavivar memórias e captar novos olhares para este espaço monumental existente na vila de Montemor-o-Velho, que nos últimos anos deixou de cativar a atenção dos diversos agentes culturais.
Plantas do Claustro e da Igreja do Convento de Nossa Senhora dos Anjos, a nível do piso 0 e piso 1 respectivamente.
A Missão de Ferreira de Castro foi editada pela primeira vez em 1954 e coloca um problema que ainda se mantém bastante actual, mesmo tendo em conta as mudanças registadas recentemente: a responsabilidade da Igreja perante a comunidade em geral. * - Deolindo Pessoa (Natural de Montemor-o-Velho, médico ortopedista no Hospital Pediátrico de Coimbra. Fundador do CITEC, Diretor da companhia de teatro “O Teatrão” de Coimbra). NB: Texto escrito de acordo com a antiga ortografia.
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Deolindo Pessoa
Em plena segunda mundial, de 1939 a 1945, que custou milhões de vidas e pilhas de cadáveres se converteram no espelho de uma civilização, de súbito, numa congregação os seus elementos são colocados perante um inesperado problema moral. As dúvidas, as reflexões e os conflitos estalam. E certezas tidas como inquestionáveis são discutidas. Voltam as memórias individuais e colectivas que se encontravam adormecidas. Tudo volta a poder ser posto em causa. Os medos e os fantasmas surgem para reavivar feridas passadas e que se desejam esbater para sempre. Quem nunca terá tido problemas de consciência? E hesitações? Quem nunca se questionou sobre o caminho a seguir? Mas com este espectáculo, a segunda produção de 2013, integrada no projecto “Teatro e Comunidade”, pretende-se também contribuir para o chamado “turismo cultural”, para além de renovar e resgatar velhas cumplicidades que facilitem uma maior integração do grupo no seu meio e região.
Fotografias do piso 0.
Fotografias do piso 1.
Após as comemorações dos 40 anos de actividade do CITEC realizaram-se algumas reuniões para uma reflexão alargada para se delinear uma estratégia para o futuro, a curto e a médio prazo. Delas dimanou uma ideia consensual, o CITEC tinha de retomar como principal objectivo da sua actividade a animação da vida cultural da sua terra, de se reinventar para voltar a captar o interesse da comunidade em que se insere. A busca da renovação de objectivos despoletou a questão: e agora? 90
A Missão
Agora uma via seria procurar um espaço nobre da vila, que também estivesse um pouco entorpecido, e montar lá um espectáculo que fosse capaz de o exponenciar na comunidade. Havia também que providenciar que este trabalho fosse complementado com outros eventos, que permitissem constituir uma temporada variada capaz de potencializar a frequência do espaço. É neste contexto que surge o Claustro do Convento de Nossa Senhora dos Anjos e o projecto teatral “A Missão”, na sequência do qual se concebeu a programação “Missão no Convento”, onde para além de se promover as artes do espectáculo, se pretende também divulgar o Convento dos Anjos e captar a comunidade para um plano para se deseja prolongar por tempo indeterminado, como catalisador da partilha e do debate de ideias, de uma forma aberta e sem se buscar receitas. Um dos ‘mendigos’ que no prólogo do espectáculo acolhem os espectadores discorre sobre a palavra “missão” e diz “uma missão é uma obrigação”, a que outro contrapõe “somos a necessidade do momento”. As ‘crianças’ também no mesmo prólogo, quando junto das pessoas procuram que fiquem com os seus folhetos dizem “são histórias de encantar, que até fazem chorar” ou “são histórias de maldizer, que nos dão de comer”. Tudo isto embrulhado de uma forma que se deseja atractiva, para testemunhar a nossa vontade de assumir a obrigação de procurar suprir as necessidades do momento da melhor forma possível, nas actuais circunstâncias. Mesmo com histórias de encantar, que nos possam fazer chorar. Ou até com histórias de maldizer, que não dão de comer.
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Deolindo Pessoa
Este espectáculo para além de apontar uma das vias possíveis na “viagem” de renovação do grupo, visa assumir o “teatro de resistência” como alternativa nos tempos que correm e nas circunstâncias em que se vive presentemente. Um teatro que aposta em espaços não convencionais, em novos autores e em experimentar novas formas, em mostrar novas concepções do mundo e das suas coisas, em recuperar velhos temas que voltar a estar na ordem do dia, ainda que travestidos noutras roupagens. Um tipo de teatro que se concentra em pequenas salas, com escassos ou nenhum apoio oficial, e onde para se sobreviver os elementos se desmultiplicam em funções. Cada produção tem que ser mais do que a criação de um espectáculo, tem que ser um projecto de animação diversificado capaz de mobilizar a comunidade, para esta e outras acções no futuro. Num tempo em que os problemas morais escasseiam será oportuno levantar questões sobre qual será o verdadeiro papel de cada um de nós no mundo de hoje, bem como a responsabilidade da Igreja perante cada comunidade. Quando somos atacados por todos os lados, mesmo sem balas nem bombas, saberá cada um de nós o que há-de fazer? São questões e dúvidas como esta, que queremos partilhar. Quando ninguém nos protege e somos apenas um número, há que buscar a esperança. Este é também o nosso trabalho.
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A Missão
FICHA TÉCNICA Texto: criado a partir do livro de Ferreira de Castro Concepção, dramaturgia e direcção: Deolindo L. Pessoa Elenco: Bruno Costa (Hortelão e Coro), Carlos Alberto Cunha (Superior), Daniel Fernandes (Bagatelle e Capitão), Daniel Gaspar (Bertant e Coro), F. Capinha Lopes (Michaux), Fernando Campos (Brissac), José Cação (Roussin), José Couceiro (Megret e Coro), Luís Pedro (Villiers e Coro), Manuel Carraco (Ecónomo e Coro), Quim Zé Carraco (Lafargue), Rui Couceiro (George Mounier), Rui Gaspar (Dumesnil e Coro). Mendigos: Carlos Cabido, Judite Maranha, Pedro Santana e Telmo Pinão Crianças: Bárbara Costa, Beatriz Charro, Constança Pelicano, Inês Torrão, Maria Leonor Neves e Simão Santa Rita. Figurinos e Adereços: Judite Maranha | Desenho de luz: João Raimundo | Direcção musical: Bruno Costa | Direção Técnica: José Pedro Sousa | Montagem e operação técnica: Hugo Maranha, João Raimundo, José Pedro Sousa e Rui Pessoa | Costureiras: Carmina Fernandes, Conceição Campos, Lucília Neto e Né Pessoa | Direcção de Cena: Judite Maranha Design gráfico: Ana Luísa Ferreira | Comunicação: Ana Luísa Ferreira e João Lobo | Fotografia: Jorge Valente | Vídeo: Projecto Videolab (Sérgio Gomes e José Vieira) | Divulgação sonora: Henrique Maranha | Frente de casa: Isabel Capinha | Produção Executiva: F. Capinha Lopes e Vasco Neves Produção: CITEC 2013 Agradecimentos: António Alves, Correia & Roque Lda, Hugo Lopes, Junta de Freguesia de Montemor-oVelho, Maria Elisa Oliveira, Pedro Maranha
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Mário Nunes*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 95 - 98
A Família Oliveira Guimarães
“Não é a vida que cria a imortalidade: é a morte” (Luís Oliveira Guimarães)
Uma das famílias mais respeitadas e prestigiadas da Vila do Espinhal, do concelho de Penela e da região, é a Família Oliveira Guimarães. Uma família cujos ramos mais antigos da árvore genealógica remontam ao século XVI, graças às alianças matrimoniais das famílias Alarcão, Velasquez e Sarmento, oriundos da fidalguia castelhana e que vieram para Portugal nos reinados de D. Manuel I e D. Sebastião e que se fixaram (descendentes), depois no Espinhal, e de outra família da burguesia portuguesa, Oliveira Guimarães, século XIX, natural de Guimarães e que veio para Coimbra, tendo um dos descendentes, posteriormente Juiz na Comarca de Penela, casado na família Alarcão e aqui passando a ter residência. Logo, a atual família Oliveira Guimarães, galardoada pelo MuniBrasão da família Alarcão cípio de Penela no passado dia 29 de Setembro de 2012, nas comemorações do feriado municipal, é herdeira e sucessora de famílias de prestígio, saber e poder, cujo ex-libris ancestral está espelhado na frontaria do palacete, com quinta anexa, tendo sobrepujado, na porta principal, o brasão. Este, esquartelado exibe as armas dos: I/Alarcões; II/ Vellasquez; III/ Correias; IV/ Sarmentos. O timbre é dos Alarcões.
* - Mário Nunes (Historiador e ex-vereador da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra). Nota do Coordenador Técnico: O Dr. Mário Nunes faleceu a 28 de Junho de 2013. Entregou este texto dias antes de falecer. Em sua memória, publica-se a título póstumo, até pela importância que informa.
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Mário Nunes
Palacete da família Oliveira Guimarães, em Espinhal.
Olhando o palacete, “Casa do Castelo”, situado no centro histórico da Vila do Espinhal, na rua do Castelo, e interpretando o brasão, facilmente se conclui do valor desta família, graças aos lugares que desempenhou, às iniciativas que organizou e concretizou e ações que produziu, abrangentes nos domínios políticos, culturais, sociais, religiosos, económicos, humanísticos e de jurisprudência. Gerações que sublimaram a família e honraram e continuam a honrar e valorizar os pergaminhos dos seus antepassados. Referir que o palacete, residência temporária dos descendentes de Oliveira Guimarães, reproduz as caraterísticas do tipo dos nossos grandes solares pombalinos. Recebeu nos seus aposentos, figuras de elevada estirpe nacional, exemplo do Rei D. João VI, do general Rainier, comandante de Massena nas invasões francesas, de Maria Amália Vaz de Carvalho, intelectual, e de uma plêiade de personalidades de várias áreas da sociedade portuguesa e estrangeira. Mandado construir naquela época “custou 1.621$000 réis e foi alindado pelo fidalgo D. Vicente Velasquez Sarmento e Alarcão, Freire Capitular da Ordem de Santiago. Herdado pelos sobrinhos D. Vicente e D. Francisco de Alarcão Velasquez Sarmento, que ali viveram até ao falecimento” (João Manuel Saraiva de Carvalho, in, Espinhal – 800 Anos de História). E, sucessivamente chegou à atual família Oliveira Guimarães.
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A Família Oliveira Guimarães
Apresentadas, em síntese, as raízes da família e o seu grandioso percurso, detemo-nos, agora, nos séculos XIX e XX, quando o jovem António Alves de Oliveira Guimarães entrou na família pelo casamento com D. Maria da Glória de Alarcão Velasquez Sarmento, filha do proprietário da Casa do Castelo e patrono familiar, D. Luiz Cardoso de Alarcão Velasquez Sarmento e de sua esposa, D. Maria Francisca de Alarcão Velasquez Sarmento, naturais do Espinhal e moradores no referido palacete. António Alves de Oliveira Guimarães nasceu em Coimbra, na freguesia de S. Bartolomeu, em 20 de Maio de 1858, era filho de Domingos Alves Guimarães, e como referimos anteriormente, o pai era natural de Guimarães e veio residir em Coimbra, sendo casado com D. EngráD. Luiz Alarcão cia de Oliveira Guimarães natural de Aveiro. António formou-se em Direito pela Universidade de Coimbra, em 1870, exerceu a advocacia e, mais tarde, optou pela carreira da Magistratura como Delegado do Promotor da República no Funchal e no Porto, ascendendo ao cargo de Juiz na Comarca de Penela, que lhe deu oportunidade de conhecer e casar com D. Maria da Glória. Promovido a Desembargador atingiu a alta categoria de Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, embora não exercesse as funções, porque veio a desempenhar as de Ajudante do Procurador - Geral da República. Aposentado em 1929, retirou-se para o Espinhal, aqui falecendo em 13 de Janeiro de 1945. Escreveu diversas obras de jurisprudência. Amigo dedicado do político do Partido Progressista no período republicano, José Luciano, foi mais de uma vez deputado pelo círculo de Coimbra. Benemérito das gentes do Espinhal viu reconhecido o seu valor e humanismo na casa que tem o seu nome “Casa de Beneficência Conselheiro Oliveira Guimarães”. António de Oliveira Guimarães acompanhava o sogro, D. Luiz de Alarcão, nas lides políticas, pois este era um dos grandes homens da política do concelho de Penela, logo do círculo eleitoral. A freguesia de Espinhal votava sempre com ele. De extraordinária capacidade administrativa e política foi um humanista, um empregador de mão-de-obra, partilhando todas as ações e obras da freguesia e mesmo do concelho, exemplo das capelas, da igreja matriz, dos caminhos públicos e foi fundador da Filarmónica do Espinhal. Um espinhalense de enorme prestígio concelhio e nacional. Do casamento do Conselheiro António Oliveira Guimarães e de D. Maria da Glória Alarcão nasceu no Espinhal, em 19 de Abril de 1900, o filho primogénito, Luiz de Abreu Alarcão de Oliveira Guimarães, batizado na Vila pelo pároco Manuel Parada de Eça, em 16 de Julho daquele ano. Frequentou, na terra, a instrução primária, concluiu, em Lisboa (onde os pais então residiam), o curso liceal, matriculou-se em Direito na Universidade de Coimbra e concluiu-o em Lisboa, em 1929. Ingressou na Magistratu-
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ra, tendo sido Delegado do Procurador da República, peregrinou, profissionalmente, em muitas comarcas do país e chegou a Secretário do Ministro da Justiça. A carreira jurídica durou uma década e meia. Exerceu com total sucesso a sua profissão no Ministério Público. Seguira, portanto, a tradição familiar, mas não quis continuar, embora tivesse, ainda, Banca de advogado. Seduziram-no outras paixões, outros desejos de criatividade e irreverência que vinham, já, da juventude. As musas das letras eram causas de outra dimensão como interveniente na sociedade. Passou a ser cronista do seu tempo, das modas, dos costumes, dos ditos de espírito das anedotas do quotidiano, ficando conhecido como o espírito da época, o maior pensador sobre o humorismo que existiu em Portugal. Jornalista, escritor da ironia vocacionado para a crónica e o conto. Dramaturgo com numerosas obras publicadas sobre teatro. Conferencista de centenas de intervenções, dominando a palavra e incutindo-lhe a arte de bem falar. Foi crítico de teatro. Fundador da Sociedade Portuguesa de Escritores e depois Sociedade Portuguesa de Autores de que foi Presidente. Ressuscitador do Grupo dos Humoristas foi divulgador do Direito ao Riso. Obteve diversos prémios na área do teatro. Escreveu 51 obras sobre diferentes temas, especialmente teatro. Na política era republicano. Recusou ser Presidente do Município de Penela, Governador Civil e Deputado. Dizia que “a política é uma mascarada”. Casou aos 32 anos com D. Maria Adelaide de Oliveira Matos Sequeira, filha de uma prestigiada personalidade das letras, Dr. Gustavo Matos Sequeira e de D. Beatriz Carolina Rosado Oliveira Sequeira, na capela daquela família, em Lisboa. Faleceu em Lisboa, em 5 de Junho de 1998. Figura incontornável da cultura escreveu: “recordar não é mais do que acordar o esquecimento”. Do seu matrimónio nasceu o Doutor António Luís de Sequeira Oliveira Guimarães, que cursou Direito, atingiu a Magistratura até ao mais elevado grau, ou seja, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça. Dotado das qualidades herdadas do avô e do pai, marcou a jurisprudência nacional. Casou com uma jurista, Drª. Maria Leonor Loureiro Gonçalves que juntou Oliveira Guimarães, senhora que ascendeu a alto cargo no Ministério da Segurança Social e desempenha hoje diversos lugares culturais e sociais em Lisboa, Penela e Espinhal. Do casamento nasceu uma filha, Drª. Paula Alexandra de Oliveira Guimarães, que cursou Direito, sendo alto quadro do Montepio na área social. Contraiu casamento com o Dr. Renato Amorim Damas Barroso, que cursou Direito, e é Juiz no Tribunal do Porto. Todos fazem estadas na Vila do Espinhal e ajudam o progresso da Vila do Espinhal e do concelho de Penela. Enfim, neste resumo, demos uma panorâmica do valor e prestígio da Família Oliveira Guimarães, meus prezados amigos desde há dezenas de anos.
Júlio Delfim Torrão*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 99 - 105
Caça e Caçadores
Embora este tema seja de interesse relativo para alguns leitores, insistimos na sua manutenção, além do mais porque é diferente dos restantes artigos que preenchem esta Revista Municipal, imprimida e divulgada desde Abril de 2006, a qual referencia coisas importantes da história de Montemor-o-Velho e suas gentes, bem como do meio ambiente e de outras condições especiais. Como temos anotado, a caça é um bem natural escasso, mas sustentável, cuja gestão pertence ao Estado e a diversas entidades regionais e locais, com objetivos comuns, mas dispondo de meios diferentes, em parte escassos e passíveis de correções. O Estado, pelo Ministério da Agricultura, emite leis e regulamentos de carater geral; os serviços regionais mantêm a supervisão e controlo sobre os processos de licenciamento; as associações e clubes de caçadores locais regem-se pelos estatutos e regulamentos internos, compatíbilizados com a lei geral vigente e com os seus objetivos específicos; as federações, regionais e nacionais, têm funções de agregação e de apoio aos seus federados. * - Júlio Delfim Torrão (Advogado em Montemor-o-Velho).
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Júlio Delfim Torrão
Por sua vez, os municípios interferem em assuntos das respetivas zonas e têm um “conselho cinegético”, que reúne quando é necessário, emitindo pareceres orientadores, não vinculativos, sobre cada processo de licenciamento e suas renovações. O nosso país, com reduzida dimensão, mas configuração geográfica diversificada, não dispõe de amplas serranias, nem de grandes herdades, mas tem muitos recantos, com microclimas e paisagens diferenciadas. A região alentejana, tem algumas condições semelhantes à vizinha Espanha. Mas, o clima é diferente e, os recursos hídricos e outros, são escassos para atrair e manter algumas espécies cinegéticas, que abundam do outro lado da fronteira. As batidas e montarias, que atraem e motivam caçadores nacionais e estrangeiros, proporcionando receitas e bons troféus, realizáveis em algumas zonas do interior, perderam a tradição e o interesse, em Portugal, também por causa do excessivo fracionamento da propriedade rústica. Na Espanha, algumas herdades, outrora ocupadas por grandes rebanhos e manadas de gado bravo, têm sido reconvertidas, agora, acolhendo várias espécies cinegéticas de grande porte, como javalis, veados, muflões, gamos e corsos, que são vigiados, alimentados e tratados com técnicas apropriadas para garantir contingentes adequados e troféus de elevada qualidade. Em Portugal, essa conversão alargada, não é possível nem desejável, pelos motivos e condições naturais acima referidas. Portanto, temos mantido, e bem, reservas nacionais, em locais específicos de criação e resguardo, para algumas espécies nativas e de arribação, que constituem pequenos redutos de preservação inestimável. Mas, temos criado muitas e pequenas “zonas associativas de caça”, municipais e particulares, cuja gestão e resultados deixam muito a desejar! Aliás, a dimensão e delimitação da maior parte destas pequenas “zonas associativas de caça”, são complicadas e prejudiciais! Não só para a procriação e preservação de algumas espécies cinegéticas, que requerem maiores espaços, mas também para orientação e segurança dos próprios caçadores. Por outro lado, também não servem os reais interesses dos agricultores e de outros titulares que, às vezes, não sabem como e a quem devem atribuir responsabilidades por eventuais prejuízos causados pela caça. Também privam alguns caçadores de vigiar as propriedades e muitos espaços vizinhos do local de residência, não podendo caçar e conviver com alguns amigos e companheiros de outros tempos.
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Caça e Caçadores
Em cada uma destas pequenas “zonas associativas de caça”, escasseiam meios técnicos, de gestão e outros, para planificar e rentabilizar os respetivos recursos cinegéticos, de modo a garantir bons resultados em cada campanha, e manter o suficiente para o futuro. Também há dificuldades em prever e prevenir invasões da caça grossa, proveniente de zonas vizinhas, mais ou menos distantes, cujas espécies, como os javalis, lobos, etc., têm um território mais lato e indefinido, causando prejuízos inesperados. Atualmente, em face da redução das atividades agrícola e florestal, os matos bravios e desordenados, crescem e ocupam amplos espaços, onde algumas dessas espécies invasoras se acoitam e até procriam, desordenadamente, sem vigia nem controlo necessários. E, esta situação, também dificulta as ações regulares de repovoamento, profilaxia e controlo de espécies nativas, menores, cuja sobrevivência se altera e atinge a extinção, em alguns locais, por efeito predatório dessas espécies de grande porte, como são os javalis, lobos, raposas e certas aves de rapina. Por outro lado, em muitos desses locais, também acontecem perseguições, abates abusivos e desordenados, em tempo de caça e de defeso, sem métodos legais e sem critérios de contenção e preservação, que servem, apenas, para alimentar “vícios e comezainas de uns tantos atrevidos/oportunistas”, à revelia do interesse e da maioria dos associados cumpridores e dos titulares prejudicados. Combater e melhorar a proliferação de “zonas associativas de caça sem adequada dimensão”, também não é tarefa fácil! Apesar de ouvirmos, com frequência, comentários sobre esses abusos e ações de má vizinhança, também por escassez de espaço e sinalização deficiente. Portanto, o capricho mesquinho e a vontade de muitos clubes e associações locais, que gostam de criar e manter a “sua quintinha de caça”, pobre e mal gerida, tem imperado sobre a justa apreciação dos que preferem zonas mais amplas, com melhores espaços, favorecendo a segurança dos caçadores e de outros interessados, bem como a procriação e preservação das espécies cinegéticas. Por outro lado, o Estado beneficia com o custo e o número elevado dos respetivos processos de licenciamento, cada vez mais caros e complexos. Portanto, seria desejável rever e melhorar o ordenamento territorial, em termos de planeamento e defesa dos reais interesses da caça, de quem a pratica e alimenta, copiando alguns exemplos, possíveis e de sucesso, da vizinha Espanha. Como sabemos, todos os anos, o nosso meio ambiente é afetado, com incêndios estivais, também e em grande medida, por falta de vigia e empenhamento, preventivos.
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Este flagelo depauperante, deve preocupar tudo e todos, no sentido de fazermos mais e melhor pela defesa da floresta e dos nossos recursos naturais! E, onde existem zonas bem organizadas, há vigilância permanente, para prevenir os incêndios estivais, para detetar caçadores furtivos e ladrões de gado, para superar outras anomalias que, infelizmente, vão acontecendo por todo o lado e com demasiada frequência, entre nós! Parece evidente, também, que as dificuldades económicas, financeiras e sociais que nos afligem, atualmente, aconselham mais e melhor aproveitamento do nosso património rural e natural, que herdamos e temos o dever de fruir e preservar. Podemos cultivar mais e melhor preferindo, sempre que possível, os nossos produtos hortícolas e outros, que já foram suficientes, em tempos idos, para a nossa subsistência e alguma exportação. E, assim, poderemos garantir trabalho a muita e boa gente que, apesar de tudo, se acomoda com subsídios escassos e temporários, nos meios citadinos, não procurando recursos complementares que, valha a verdade, o meio proporciona. Nunca foi nem será “desonra”, participar nas fainas das vindimas, apanha de fruta e produtos hortícolas, da cortiça, amanho das vinhas e pomares, ou de qualquer outro trabalho agícola e florestal! Aliás, mais searas e melhor ordenamento da floresta propiciam, também, benefícios para alimentação, vigia e contenção da caça que, também ela, pode garantir ocupação, desporto, turismo e outros proventos. Infelizmente, a maior parte das nossas comunidades rurais, do interior, estão depauperadas e decadentes, por falta de jovens residentes e de trabalhadores, enquanto a vivência citadina se vai tornando cada vez mais difícil, por causa do encerramento da fábricas, estabelecimentos comerciais e de muitos serviços. Os portugueses, apesar de tudo, sempre tivemos engenho e arte para lutar, vencer e progredir! Portanto, temos que dizer basta a tudo o que nos prejudica, deprime e aflige, procurando novos caminhos e outras soluções possíveis. Mas, voltemos ao nosso tema “caça e caçadores” realçando, também, a capacidade e acção humanas, sobre outros seres, que nos têm servido, em casa e nos campos, desde os primórdios da nossa existência. Os nossos antepassados, capturaram, abateram, comeram, mas também souberam transformar bastantes seres bravios em “animais domésticos”, como o cão, o gato, o cavalo, o boi, o burro, cabras, ovelhas, galinhas, patos, pombos, falcões e tantos outros, demonstrando a nossa inteligência e capacidade, superiores, apesar de termos perdido algumas aptidões originais. 102
Caça e Caçadores
Com efeito, os cavalos cães, galinhas e outros animais, conseguem ver e ouvir, com alcances elevados, não só pela sua capacidade especial mas também pela permanente concentração e vigia. Diz-se, que as galinhas, na capoeira, durante a noite, conseguem ouvir e dar sinais de alerta, sobre a ocorrência de terramotos e tempestades! O galo da nossa capoeira, ou do vizinho, parece que canta todas as madrugadas, às mesma horas, sem relógio nem ampulheta para medir o tempo! Pelo faro e ouvido apurados, os cavalos e outros animais, apercebem-se e podem alertar-nos, também, da aproximação de seres estranhos e porventura perigosos, prestando-nos inestimável auxílio. Também nós, humanos, tivemos outra concentração, capacidades especiais, mais apuradas, quando vivíamos isolados, nas cavernas, grutas e cabanas campestres, sujeitos aos perigos das intempéries e de outros inimigos naturais. A concentração nos povoados e cidades, rodeados de vários meios de segurança e conforto, servidos por outros seres domesticados, fez-nos esquecer e perder muitas aptidões rudimentares, indispensáveis na vivência nómada primitiva. Como nos artigos antecedentes, vamos citar uma espécie interessante, que existe no estado doméstico e no estado selvagem, anotando caraterísticas semelhantes e diferenças, para podermos distinguir a sua presença e passagem, nem sempre ponderadas e, portanto, passíveis de imprevidências ou enganos, pelos caçadores menos experientes.
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OS POMBOS CORREIOS Estas aves domésticas, com elevado alcance e rapidez de voo, são capazes de regressar de pontos longínquos, trazendo mensagens e outras indicações interessantes, em poucas horas.
Há muitas pessoas que cultivam e praticam a colombofilia, como desporto e atividade salutar, no nosso país. Estas aves, parecem iguais aos seus parentes bravios “pombos turcazes”, como evidenciamos nos desenhos que antecedem, mas têm caraterísticas diferentes. Alguns pombos correios adquirem aptidão especial e, portanto, têm valores estimativo e venal elevados! Portanto, devemos ter muita atenção e cuidado, como caçadores, quando nos aparecem, em voo rasante, atravessando zonas de caça, geralmente aos domingos de manhã, no seu regresso apressado ao pombal doméstico. Embora parecidos com os pombos bravos, no tamanho e na cor da plumagem, voam de modo diferente. Deslocam-se com rapidez, em voo mais baixo, em constante bater e zumbir das asas. Os pombos bravos, se não forem nativos do local de caça, voam mais alto, mais devagar, em permanente observação, evitando a passagem sobe os caçadores não camuflados, ou escondidos em locais de espera. No entanto, se houver vento forte e chuva, os pombos bravos também se deslocam em voo apressado, mais baixo, em constante bater e zumbir das asas, nas suas passagens periódicas e de arribação, evitando as zonas urbanizadas..
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Caça e Caçadores
Como seres humanos superiores e previdentes, devemos observar e tentar conhecer, também e sempre que possível, as caraterísticas e reais potencialidades dos animais domesticados. Com alguma frequência, ocorrem acidentes causados por gatos, cães e por outros animais, aparentemente inofensivos, que atacam crianças e outras pessoas, nos momentos do cio, do parto, da luta, da alimentação e noutras circunstâncias especiais, que devemos ponderar. Aliás, alguns humanos, também se comportam de forma estranha ou irracional! E, as vezes, ouvimos dizer:- Parecia uma pessoa bondosa e exemplar, mas praticou tamanho crime! Como foi possível? Portanto, todos os animais, incluindo os humanos, são potenciais agressores, embora se mantenham, habitualmente, serenos e pacíficos. Estas anotações, aparentemente despropositadas, no tema “caça e caçadores”, podem parecer fora de contexto! Mas, anda mal avisado, quem pensa que pode destruir, alterar e transformar coisas e seres vivos, à sua vontade e capricho, sem critério e sem cuidados essenciais, alheio às reais e múltiplas consequências! Quando tentamos amestrar e manter em ambiente doméstico, certos felinos e outros animais bravios, corpulentos e manhosos, corremos o risco de sermos surpreendidos com ataques violentos, às vezes fatais! Por outro lado, quando perseguimos, caçamos e abatemos tudo o que mexe, ultrapassamos o limite racional, pois a natureza e o meio ambiente, desejáveis, aconselham-nos a respeitar e a preservar coisas e seres indispensáveis para a nossa própria segurança e normal sobrevivência. Tal como a água que bebemos, tornaremos escassos muitos bens e seres essenciais, se não soubermos cumprir métodos e regras de consumo adequados.
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Carlos Manuel Gomes Henriques*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 14, 2013, 107 - 118
Breve História da Taça Lisboa
A Taça Lisboa em Remo disputa-se desde 1904 é portanto a competição mais antiga que ainda se efectua em Portugal. Pretendemos explicar como nasceu e as suas primeiras disputas, assim como algumas peripécias em seu redor. No início do século XX as regatas que despertavam mais interesse eram as efectuadas em guigas de quatro e seis remos. Mas devido à imperfeição de regulamentos existentes (cada agremiação possuía o seu), falta de uniformidade nas embarcações, fundamental para a realização de provas, as vitórias alcançadas muitas vezes não representavam o verdadeiro mérito dos vencedores. A nomenclatura, normalmente adoptada, de guigas de primeira e segunda classe, colocava a guiga da Real Associação Naval, Alice, inrigger de tabuado trincado e bancos fixos a competir com a do Real Clube Naval, Albertina, inrigger de tabuado liso mas de bancos móveis. As discussões sobre a jurisdição em regata aumentada quase sempre pelo clubismo exagerado, eram constantes, ou era o tiro de chegada à meta que era dado antes de tempo, os barcos que se abalroavam ou o da outra equipa que largava antes, as questões atingiam por vezes uma violência tal que o resultado era, muitas vezes, a quebra de relações entre os clubes competidores.
Este era o estado do Remo em Portugal por altura do Congresso Marítimo Nacional, organizado pela Liga Naval Portuguesa em 1902. Como as associações náuticas foram convidadas para o evento, muitos desportistas admitiram que dessa colaboração resultaria uma nova era no desenvolvimento, entendimento e coordenação de empenhos entre os clubes existentes, de que viesse também a resultar a criação de prémios de estímulo e a fundação de novas Sociedades de Remo nos centros fluviais marítimos e albufeiras do país onde não existissem. O que aconteceu foi a criação de uma nova sociedade, em Lisboa, onde já existiam cinco. O Grémio do Sport Náutico da Liga Naval. Como tal, por iniciativa de Joaquim Leotte, os clubes da capital e alguns desportistas, pensaram na organização de um Campeonato Nacional, a disputar anualmente, que * - Carlos Manuel Gomes Henriques (Treinador de Remo).
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Carlos Manuel Gomes Henriques
servisse também de pretexto à aprovação de um Regulamento único de Regatas, e ao reatamento das boas relações entre as principais associações náuticas incutidas do espírito de que a união faz a força e que sem ela o remo não iria por bons caminhos. Foi formada uma Comissão composta por Francisco de Sousa Magalhães e Virgílio da Costa representantes da Real Associação Naval, Joaquim Leotte e Alberto Peixoto de Gimenez do Real Clube Naval, Correia Pereira e José Estêvão de Campos França do Clube dos Aspirantes de Marinha e Albino de Meneses Leal e Júlio Ferreira Cabral delegados do Clube Naval Madeirense. Assim nasceram a Taça Lisboa, para a qual todas as associações náuticas da capital concorreram e a Convenção que se lhe seguiu e que foi assinada a 20 de Abril de 1904. No novo regulamento, moldado a partir do francês, várias disposições foram incluídas de carácter imperativo na tentativa de defender os interesses dos clubes e dos seus remadores, os destes principalmente, tendo ficado garantidos os critérios imparciais na classificação e decisão das provas e que os resultados não dependessem, como até aí, de processos que não fossem exclusivamente do esforço das tripulações, da técnica ou do estilo da sua remada. Depois de assinada, a Convenção mereceu de toda a imprensa os maiores elogios. Após a aprovação das Bases da Convenção pelas Assembleias Gerais dos Clubes signatários, começaram imediatamente a tratar da organização da primeira Regata da Taça Lisboa, o primeiro campeonato de quatro remos instituído em Portugal. A corrida realizou-se ao longo da muralha da Junqueira, a 29 de Maio de 1904, e ficou vencedora a tripulação da Real Associação Naval constituída por Carlos Sá Pereira a timonar, Francisco Duarte à voga, Fernando Correia a sota-voga, Álvaro da Fonseca a sota-proa e Luís Rembado à proa que remaram na guiga D. Maria Pia, embarcação que repousa agora no Museu de Marinha. Foram convidadas as melhores ourivesarias da época para o concurso do desenho da obra de arte, ficando vencedora a firma Teixeira & Cª Comta.. O pagamento foi efectuado em duas prestações de 100 Mil Réis.
A esta Convenção deve-se o rápido desenvolvimento que o Remo atingiu nos anos que se lhe seguiram, tanto no número de provas que passaram a realizar-se, para a disputa de novas Taças, como também no aperfeiçoamento do estilo de remada, na uniformidade do material adquirido, no desaparecimento de protestos e de questões que nunca se solucionavam. Os clubes estavam obrigados, no início de cada época, a enviar o nome e a classificação dos seus remadores, timoneiros ou patrões, às sociedades assinantes da Convenção. 108
Breve História da Taça Lisboa
Mas nesta primeira edição, da Taça Lisboa, tendo a Real Associação Naval adquirido uma guiga, especialmente para a prova, três atletas do Real Clube Naval mudaram-se para vencer a prova contra o seu anterior clube, foram eles Francisco Duarte, Carlos Sá Pereira e Luís Rembado. O problema dos “trânsfugas” não estava solucionado.
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Carlos Manuel Gomes Henriques
A segunda edição da prova realizou-se a 28 de Maio de 1905 pelas 13h30, no mesmo local e saiu vencedora a guiga Ínsula, do Clube Naval Madeirense, timonado por Pereira Dias, com Ricardo Del Negro à voga, Jorge Aldim a sota voga, Cândido Silva a sota proa e Gustavo de Sousa a proa. A guiga foi também adquirida para a participação na regata e comprada com o dinheiro do jogo que o CNM administrava. Os Del Negro e Jorge Aldim mudaram-se também do Real Clube Naval para o Madeirense com o intuito de remar numa embarcação mais competitiva. Numa das regatas complementares, desta prova, em que competia a guiga de seis remos Alice, o proa inscrito era o mesmo que já tinha competido na prova principal, como a regata tinha sido bastante dura, o remador mal se tinha em pé, o que provocou um episodio sui generis que relatamos utilizando as palavras de Carlos Sá Pereira num jantar de confraternização da ANL: “Perdoem-nos o arrojo duma descrição, (…) recordar o passado é sempre agradável e salutar (…), a corrida foi dura, foi mesmo suficientemente violenta para prostrar um homem o proa da ANL que daí a alguns minutos devia fazer nova corrida, como proa também da guiga de seis remos Alice. Em vão lhe foram ministrados todos os cuidados, em vão lhe infiltraram as palavras mais excitantes e entusiásticas que possam imaginar. Decididamente a ANL não podia contar com o seu proa. Apelou-se para o recurso da substituição. A decepção foi grande os adversários não permitiam a substituição do tripulante inutilizado. Acentuou-se então, num momento de desânimo geral, a energia de um verdadeiro português, de um genuíno e valoroso trasmontano, apesar do seu nome inglês H. Dagge. Dagge tinha grande prática de remo, era instrutor, gozava de muita autoridade, era como um comandante a bordo. Teve uma decisão pronta: - Rapazes! É preciso que corramos os 5 apenas; vejam lá como se portam! Para os adversários nem um comentário, nem uma palavra de censura! A velha Alice encaminhou-se para o local de partida com os seus 5 remadores nos respectivos lugares. Ouve-se uma observação dos adversários: - O barco segundo os regulamentos, precisa ter a bordo os 6 remadores que lhe competem. Sobe de ponto a tensão de nervos dos briosos tripulantes da Alice, e, recuando para terra, embarcam o proa inválido, o qual tem de ser estendido no fundo do barco, por se não poder manter sentado. H. Dagge escolhe bem o momento para actuar sobre a sensibilidade dos seus consócios com palavras repletas de coragem exaltada e energia indomável. Mas ainda desta vez não está tudo em ordem. Mais fazem notar os adversários que falta a bordo o remo da proa.
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Breve História da Taça Lisboa
Enquanto se satisfazia a última exigência dos competidores, houve quem finalmente perdesse a paciência. Ainda bem que não estavam perto delicados e mimosos ouvidos… A voz de H. Dagge, convicto, fervoroso, admirável, actua novamente para serenar o tumulto: - Quanto mais segura a certeza da derrota, maior deve ser a nossa coragem na luta. Havemos de resistir quanto pudermos quaisquer que sejam os contratempos. E todos inflamados, irritados, sem confiança na vitória, mas estonteados pelo orgulho de quem cumpre nobremente um dever sagrado, esperam com impaciência o momento da largada. Durante os primeiros duzentos metros ainda as forças dos homens da Associação Naval se equilibraram com as dos seus competidores; mas dai por diante a Associação Naval começou a atrasar-se, apesar de toda a energia, de toda a força de vontade e de todo o heroísmo dos 5 exaltados que puxam, puxam loucamente. Até na própria ocasião de passar a meta, quando os vencedores descansavam já, ainda a bordo da Alice, havia esforço, exaltação e energia, como se tratasse da disputa da vitória. À voz de arvorar remos (saudação usual de então), os 5 remadores exaustos, ofegantes, completamente esgotados, não conseguiram desta vez cumprir o seu dever. Somente um remo se aprumou; foi o remo do proa que este, trémulo e comovido, ergueu como se desfraldasse o dístico: Eu não pude remar! Foram só 5 a correr! Foi assim que a Real Associação Naval perdeu a regata de 6, na velha Alice em 28 de Maio de 1905.
No terceiro ano de organização do troféu a prova realizou-se também em Lisboa, ao longo da muralha da Junqueira no dia 26 de Maio de 1906, voltou a vencer o Clube Naval Madeirense na Ínsula.
Mas a historia da prova neste ano começou uma semana mais cedo, a 20 de Maio, realizou-se a regata num dia muito cinzento, com vento forte vindo da barra, o mar picado, alinharam os quatro clubes e o único que chegou à meta foi o Clube Naval mas a organização decidiu anular a regata, só depois da prova terminar o que provocou alguma celeuma jornalística. A primeira eliminatória foi entre a Real Associação Naval e o Clube dos Aspirantes de Marinha, tendo-se virado esta última tripulação. Em seguida correram as tripulações do Real Clube Naval e o Madeirense e estes também se viraram devido ao estado do mar, houve quem dissesse que a embarcação do Clube Naval devia ter parado para prestar auxílio aos náufragos, mas em reunião da 111
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Comissão de Organização foi deliberado que o barco do CNL nada poderia fazer e uma embarcação de apoio prestou o socorro necessário. A 15 de Julho de 1906, devido ao problema dos trânsfugas, bateram-se em duelo junto ao Farol da Guia, Alberto Totta e Carlos Sá Pereira, o duelo foi ao Sabre e “Cessaria ao primeiro sangue”. O primeiro assalto foi interrompido por os sabres terem tocado no chão. Ao terceiro assalto nenhum dos duelistas estava fatigado ou disposto a ceder. Então Alberto Totta foi ferido na prega do cotovelo numa extensão de dez centímetros e verificou-se também que Carlos Sá Pereira recebera um ferimento na parte antero-inferior do ante-braço na extensão de cinco centímetros. Os médicos foram de parecer que o combate não podia continuar. Consta da respectiva Acta que os adversários demonstraram a maior coragem durante o encontro.
O quarto ano de realização da Taça Lisboa, por proposta da Real Associação Naval, foi realizado em inrigger de quatro remos mas com slides, foi disputada a 30 de Maio de 1907 pelas 16h48 no mesmo local e o CNL venceu na Celeste, uma Guiga Racer. Para esta edição da Taça o Clube Naval foi obrigado a adquirir essa embarcação expressamente para corridas o que ia contra o rumo do Clube que privilegiava o uso de embarcações robustas para passeio e encalhe na praia e nas margens. A sete de Junho de 1908, pelas quinze horas e sete minutos decorreu a quinta edição da Taça Lisboa tendo vencido, no outrigger Tejo a Real Associação Naval. Neste ano, novamente por proposta da Associação Naval e acordo de todos os clubes concorrentes a corrida foi efectuada em outrigger pela primeira vez. No ano seguinte venceu o Clube Naval no outrigger “D. Manuel II”. A regata efectuou-se a 6 de Junho de 1909 à 1h40 da tarde. No ano de implantação da república, venceu a Associação Naval no “Tejo”, a prova realizou-se às 13h10. Em 1911 sendo a Associação Naval detentora do troféu, competia-lhe a organização e, como costume no dia da regata da Taça Lisboa, disputavam-se regatas complementares. A Associação Naval elaborou o seu programa de regatas na qual havia corridas de inriggers e convidou os outros clubes a participarem, o CNL inscreveu a sua tripulação da Taça e Lisboa e inscreveu a sua guiga Celeste, “a racer”, a Associação que não possuía barco da mesma qualidade e que o considerava desigual dos que possuía rejeitou a inscrição o que originou um grande burburinho e os dois clubes cortaram as relações, tendo a Associação abandonado a organização da prova e entregue a Taça ao Clube Naval, desligando-se da Convenção de 1904. O Clube Naval sozinho e querendo disputar a Taça nesse ano e não o podendo fazer
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só, convidou os clubes da Figueira a virem a Lisboa competir pela Taça, como na Figueira só remavam em inrigger, nesse ano a Taça disputou-se outra vez nesse tipo de embarcação. Tendo contudo o Clube Naval cedido as suas melhores embarcações aos convidados e pela primeira vez um clube de Lisboa não ficou de posse da Taça, saindo vencedor a Associação Naval 1º de Maio, na inrigger “Celeste” com a seguinte tripulação: 1 – José Ferreira 2 – Patrício Dias 3 – Henrique Varange 4 – David Viana Timoneiro – Augusto Carvalho. Ficou portanto a Associação Naval 1º de Maio encarregue da organização da regata em 1912, mas o clube figueirense, alegando dificuldades financeiras, não cumpriu e pela primeira vez não houve regata da Taça Lisboa. Em 1913, devido aos esforços de Mauperrin Santos, Presidente da S P E F N (Sociedade Portuguesa de Educação Física Nacional) futuro COP, que reuniu os Presidentes do Real Clube Naval e da Real Associação Naval, num jantar tendo conseguido que as pazes fossem consumadas e, por ocasião, das festas da cidade, em Junho de 1913, o regulamento foi reformado e feitas novas Bases de disputa da Taça. A regata da Taça Lisboa realizou-se então no dia 10 de Junho, na pista da Junqueira, saindo vencedora a tripulação da Associação Naval de Lisboa, no outrigger “Tejo”. No ano seguinte, em 1914, venceu o Clube Naval de Lisboa, no outrigger “Liz”. A prova teve lugar em Lisboa ao longo da muralha da Junqueira no dia 5 de Julho pelas 11h00 da manhã. A tripulação da ANL era muito experiente e portanto favorita, o Clube Naval tinha três atletas novos, mas à voga estava o experientíssimo Jorge Ferro, a Associação largou com calma do lado de terra e o Clube largou, como de costume fortíssimo, do lado do mar, a ANL embala e o Clube mantém a sua remada forte e “com muito estilo”, ouviase entre a assistência, passado pouco tempo a Associação perde o avanço conquistado e tomada de surpresa é vencida pelo Clube Naval. A Associação denotava falta de treino, prova-se mais uma vez que não há vencedores antecipados. Em 1915 e 1916 venceu a ANL, e no ano seguinte não se realizou devido aos acontecimentos anormais que levou à mobilização de muitos remadores o que foi considerado pela comissão de organização, da qual faziam parte os três clubes instituidores, (ANL, CNL, CNOCA). Em 1918 voltou a vencer a ANL perfazendo três vitórias consecutivas, pela primeira vez, o que dava direito a um diploma da Comissão Organizadora. Neste ano a curiosidade da prova deveu-se a estar incluído na equipa vencedora o nadador muito conhecido, Rodrigo Bessone Basto.
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Por altura de Maio de 1915 já havia grande celeuma relativamente à organização da Taça Lisboa, porque normalmente a comissão organizadora da Taça, eleita entre os clubes fundadores, colocava em disputa outras provas de outriggers juniores e inriggers seniores e juniores, mas neste ano ainda não havia programa para a prova. Segundo o jornal “Sport de Lisboa” o problema prendia-se com novamente com a utilização da guiga “Celeste” do CNL e da guiga “D. Afonso” da ANL que eram duas “racers” e nenhum dos clubes queria correr contra elas pois o restante do seu material não rivalizava com as duas embarcações, portanto ninguém dos dois clubes aceitava competir contra estes barcos. No dia 13 de Junho de 1915, pelas 13h05, realizou-se então a prova ao longo da muralha da Junqueira num percurso de 2000 metros de Belém para Santo Amaro, com a chegada próxima dos depósitos da Vacuum Oil C.º, a 11ª edição da Taça Lisboa. O CNL era favorito pois tinha vencido no ano anterior e possuía uma experiente e forte tripulação, mas a ANL através de uma remada mais comprida e bem apoiada no final, levou de vencida por sete comprimentos e com o tempo de 5´56´´30. Jorge Ferro no CNL, talvez o melhor remador daquele tempo, não teve uma tripulação à altura para a defesa do título, vencendo o melhor treinador, Carlos Sá Pereira, segundo rezam as crónicas jornalistas da época.
O júri de regata era composto em Terra por um Presidente – um juiz de chegada e um fiscal de mira. No mar – Umpire – Starter – vogal –. A chegada era marcada por um tiro, içando-se em seguida o galhardete do clube vencedor. O juiz do mar funcionou a bordo do “Altair”, embarcação de Armando Soares Franco – o Presidente da ANL. O CNL correu do lado do mar e a ANL de terra, largaram a uma grande distância um do outro mas depois do começo da prova os timoneiros aproximaram-se e a luta desenvolveu-se taco a taco, nos primeiros trinta segundos o Clube deu 21 remadas e a Associação 20, para no final do minuto o CNL ter uma voga de 40 e a ANL de 38. A remada da Associação era contudo mais comprida, ao contrário do que vinham remando ultimamente, e as pernas trabalhavam bem o que aos primeiros quinhentos metros já lhe davam um comprimento e meio de avanço. O clube Naval respondia aos ataques da ANL mas sem aparente resultado pois aos 1000 metros já havia uma diferença de três comprimentos. Foi uma vitória fácil para a ANL que apesar de ter três elementos novos, conseguiu levar de vencida uma tripulação mais experiente mas menos treinada.
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Breve História da Taça Lisboa
A 18 de Junho de 1916 pelas 13h20, entre a doca de Belém e a doca de Alcântara disputou-se a regata da Taça Lisboa, com a vitória da ANL por seis comprimentos. O Clube Naval de Lisboa era favorito mas a não comparência do seu voga Jorge Ferro à última da hora por doença, obrigou a sua substituição por Carlos Sobral, o que tornou a equipa mais fraca e fez com que a tripulação da Associação constituída por José Serra, Joaquim Vital, Alberto Portugal e José Duarte à voga vencesse. A corrida principiou renhida mas a ANL que corria do lado de terra, melhor treinada, venceu o CNL com um remador de recurso à voga que mesmo a remar com grande estilo notava-se, no entanto, a sua falta de treino. Em 1917 como disse não houve corrida da Taça Lisboa. No ano seguinte voltou a vencer a Associação tendo-se considerado três anos seguidos o que, pelo regulamento, a ANL teve direito a um diploma. 1919 Foi outro ano sem a realização da Taça Lisboa, a maioria dos atletas de competição estavam mobilizados, havendo inclusive a participação, em França, da 1ª Selecção Nacional de Remo nos Jogos Pershing. A partir da fundação da Federação de Remo a Taça Lisboa foi integrada nos Campeonatos Nacionais e a tradição do Vencedor ser o organizador da prova no ano seguinte quebrou-se e no nosso ponto de vista perdeu-se um pouco o mediatismo e o simbolismo da prova mas talvez se tenha ganho em competitividade e universalização do evento. Os Campeonatos Nacionais de 1920 realizaram-se no Porto e a vitória sorriu pela primeira vez a uma equipa do norte – Sport Club do Porto. O timoneiro era Pedro Brito que não participaria contudo em 1922 e 1923. No ano seguinte a ANL voltou a vencer o Troféu continuando a ser a agremiação com mais vitórias conquistadas. A tripulação era composta por João Silva, Fernando Spratley, Rodrigo Bessone Basto, Augusto Talone à voga e José Faria a timonar.
Em 1922 e 1923 venceu novamente o Sport Clube do Porto com a seguinte tripulação: António Santos, António Castro, M. Ribeiro da Silva, Nicolau DÁlmeida e Fernando Barbedo a timonar. Dois atletas desta equipa representaram pela primeira vez Portugal num campeonato da Europa em Shell 2 com timoneiro.
Durante os anos de 1924, 1925 e 1926 o Clube Naval de Lisboa treinado por um dos melhores treinadores portugueses de sempre, Leopoldo Lehrfeld, venceu ininterruptamente recebendo o Diploma de Honra oferecido aos clubes que conseguissem vencer a Taça Lisboa durante três anos seguidos. Esta equipa conquistou também o direito de representar Portugal nos Campeonatos da Europa em Lucerna nas provas de Shell de 4 com e 4 sem timoneiro. Curiosamente o filho do instituidor da Taça 115
Carlos Manuel Gomes Henriques
Lisboa fazia parte da tripulação do CNL que era composta por: Samuel Martins, Cardoso Leitão, Francisco Leotte, Mário Garcia à voga e a timonar Estevam da Silva. No ano de 1927 foi o Clube Naval Setubalense que inscreveu, pela primeira vez, o seu nome no restrito círculo dos vencedores da prova mais importante do Remo Nacional. A equipa era formada por: Francisco Guerreiro, António Baptista Gonçalves, Victor Simplício, Alfredo Duarte e António Rosa a Timonar.
Com a Figueira da Foz como capital do Remo impunha-se uma vitória Figueirense e o Ginásio aproveitando o facto de correr em casa venceu nos dois anos seguintes 1928 e 1929. Continuando a organização dos Campeonatos Nacionais na Figueira em 1930 um outro Clube – O Clube Fluvial Portuense – ganhava o direito de entrar para a lista dos vitoriosos da Taça Lisboa e consequentemente levou consigo para a cidade do Porto a organização da prova em 1931. Nesse ano o Fluvial estava muito forte mas a Associação Naval de Lisboa foi à Capital do Norte estragar a festa e venceu categoricamente a prova com a seguinte tripulação: À proa Mendo Saraiva Lobo, a dois Belo Santos, Sota – Voga José Coutinho, à Voga Carlos Vila e a Timonar seguia Vítor Silva, a equipa ficou conhecida como os “papo secos”. Em 1932 as provas voltaram à Figueira da Foz e o CFP venceu a Taça Lisboa pela 2ª vez. Mantendo-se a organização dos Campeonatos Nacionais na Figueira, dado o apoio fornecido pela Comissão Municipal de Turismo e do amor dos figueirenses pelo Remo, a Naval 1º de Maio aproveitou bem o facto de correr em casa e venceu nos anos seguintes 1933 e 34. Seguidamente foi a vez do Ginásio Clube Português, em 1935, escrever o seu nome no clube dos vencedores da Taça Lisboa. Sem secção de Remo há muitos anos o 2º Clube mais antigo de Portugal e nesta altura já muito ligado à Ginástica, aproveitou uma dissidência do Clube Naval de Lisboa com o seu treinador de longos anos – Leopoldo Lehrfeld – e inscreveu também cinco atletas saídos desse clube: os remadores Parreira da Cruz, Fernando Pires, Guilherme Capelo, Saúl Pires e Costa Júnior indo roubar a Taça aos Figueirenses, que logo no ano seguinte reconquistaram o Troféu desta vez por intermédio da Naval, – Edmundo Rodrigues, João Camarão, Arlindo Reis, António Reis e Afonso Boanova a timonar foi a tripulação vencedora – não se coibindo de conquistar também o troféu nos anos imediatos – em 1937 e 1938.
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Breve História da Taça Lisboa
1939, 1940 e 1941 foram anos de domínio de Caminha através do Sporting Clube Caminhense. Foi o início do Reino das gentes do Minho, que ao longo dos anos foram depois somando vitorias na Taça sendo presentemente os recordistas de vitórias na prova. A equipa era composta por António Fernandes - o Feio, José Fernandes, João Fernandes, Luís Cunha e o timoneiro José Andrade – O Sá. Sobre esta tripulação dizia-se, com alguma piada, que os quatro remadores do Shell 4+ remavam com tanta gana e velocidade porque iam a fugir do timoneiro “Sá”, guarda-fiscal de profissão… Outra história escutada em Lanhelas envolvendo António “Feio” prendia-se com a detenção, em Espanha, de um amigo também contrabandista, às mãos da “Guardia Civil”. Inconformados com a prisão do companheiro, deslocaram-se até à margem contrária, seguiram até ao local onde ele se encontrava à guarda dos carabineiros, subiram ao telhado, destelharam-no e retiraram o prisioneiro através dele, sem que os guardas, entretidos a jogar às cartas, tivessem dado por nada. Em 1942 foi a vez de mais um histórico do Remo Português iniciar-se nos triunfos da Taça Lisboa – O Clube dos Galitos – a partir daqui os homens de Aveiro escreveriam páginas de ouro nos Campeonatos Nacionais, Campeonatos da Europa e Jogos Olímpicos onde conseguiram um 4º lugar. Lemos aqui uma notícia de Jornal escrita por Mendo Saraiva Lobo:
1943 Foi o ano em que a Naval 1º de Maio se interpôs na luta de galos entre os aveirenses e as gentes de Caminha e venceu briosamente a Taça Lisboa. Desde essa data e praticamente até aos anos setenta a luta para a vitória na Taça seria entre os gigantes de Caminha e Aveiro, só interrompido pelo Clube Fluvial portuense nos anos 69, 70 e 72 e pelo Grupo Desportivo da CUF em 1971. Acabaria apenas por destacar a vitória, em 1980, da Associação Naval de Lisboa, o único triunfo de um Clube do Sul na Taça Lisboa até hoje depois da vitória da CUF do Barreiro. Brilharam também na conquista da Taça equipas fantásticas do Infante D. Henrique, valoroso clube de Valbom – Gondomar e durante alguns anos o A.R.C.O. e o Náutico equipas de Viana do Castelo guardaram na sua Sala de Troféus, a famosa Taça. Em 1954 fez cinquenta anos e em 2004 por minha iniciativa com o apoio de André Correia, Presidente da ANL e Fernando Estima Presidente da FPR os clubes fundadores existentes CNL, ANL e o CNOCA realizaram uma extraordinária Regata em
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Lisboa para comemorar o Centenário da Prova. A Vista Alegre apoiou oferecendo uma obra de arte que foi conquistada pelo Clube Náutico de Viana. Esta prova foi o reinício das grandes Regatas em Lisboa e serviu de estímulo para a realização da Lisboa Classic Regatta, excelentemente organizada pelo André Correia e Gonçalo Correia.
Mário José Costa da Silva*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 119 - 132
MANLIANENSES ILUSTRES IX Dr. Joaquim Alves de Sousa (1825-1892) “Homem que de nascimento humilde soube elevar-se a um ponto bastante elevado na sociedade, ajudado apenas pelo seu indefesso trabalho, estudo e honestidade de caracter.”1
Hebraísta, filólogo e autor didático, Joaquim Alves de Sousa nasceu na vila de Montemor-o-Velho, a 6 de Janeiro de 1825. Filho legítimo de José Alves de Sousa, sacristão da igreja da Madalena, e sua mulher Maria Pires, ambos residentes na freguesia da Madalena, foi batizado a 23 de janeiro do mesmo ano pelo padre Bento de França Campos, pároco e prior da mesma igreja, tendo por padrinhos Joaquim Rodrigues Moreno, da freguesia da Madalena, e Maria Alves de Sousa, da freguesia de Maiorca, e por testemunhas o pai do batizado e Francisco Marques da Costa, criado do prior da Madalena. Igreja de Santa Maria Madalena (2013) [© Mário José Costa da Silva].
* - Mário José Costa da Silva (Licenciado em História e Mestre em História Moderna pela Universidade de Coimbra.) 1 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1892-1893), fls. 11v.-13.
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Mário José Costa da Silva
Neto paterno de José Alves de Sousa, da vila de Alcobaça, e Angélica de Sousa, da freguesia de São Miguel, e materno de José Pires Correia do Amaral, da freguesia de São Martinho, e Maria de São José Negroa, da freguesia da Madalena, Joaquim Alves de Sousa teve os seguintes irmãos:2 António. Nascido a 26 de janeiro de 1820, foi batizado a 13 de fevereiro do mesmo ano, na igreja da Madalena, pelo prior Bento de França Campos. Foram seus padrinhos António Alves de Sousa, da freguesia da Madalena, e Maria Rita, da freguesia de Maiorca, ambos tios do batizado. Na ausência de Maria Rita “tocou com procuração” António Soares do Rio, da freguesia da Alcáçova. Serviram como testemunhas Manoel Pires, da freguesia do Salvador, e Joaquim Pereira, criado do prior da Madalena3. Acabaria, no entanto, por falecer no ano seguinte, a 11 de agosto de 1821, sendo sepultado na igreja da Madalena4; Luísa. Nascida a 28 de outubro de 1821, foi batizada a 9 de novembro do mesmo ano, na igreja da Madalena, pelo prior do Salvador, Pedro António Mendes Barreto, por especial autorização do prior da Madalena. Foram seus padrinhos João Miguéis e Luísa Parreira, da freguesia de S. Martinho. Na ausência de Luísa Parreira “tocou com procuração” António Alves de Sousa, tio paterno da pequena Luísa, morador na freguesia da Madalena. Serviram como testemunhas Manoel Pires, da freguesia do Salvador, e Manuel Cavaleiro, criado do prior da Madalena5; José. Nascido a 30 de novembro de 1826, foi batizado a 10 de dezembro do mesmo ano, na igreja da Madalena, pelo prior Bento de França Campos. Foram seus padrinhos José da Silva de Carvalho, da freguesia de S. Martinho, e Margarida de Sousa, da freguesia da Madalena. Serviram como testemunhas o pai do batizado, sacristão da igreja da Madalena, e António Dias, criado do prior da Madalena6; Dionísia. Nascida a 18 de junho de 1830, foi batizada a 7 de julho do mesmo ano, na igreja da Madalena, pelo prior Bento de França Campos. Foram seus padrinhos Francisco Galvão, da freguesia do Salvador, e Dionísia Amélia, da freguesia de S. Martinho. Na ausência de Dionísia Amélia “tocou com procuração” João Miguéis, morador na freguesia de S. Martinho. Serviram como testemunhas o pai da batizada, sacristão da igreja da Madalena, e o padre António de França Campos, sobrinho do prior da Madalena7; António. Nascido a 25 de fevereiro de 1833, foi batizado a 17 de março do mesmo ano, na igreja da Madalena, pelo padre António de França Campos, com licença do prior da Madalena. Foram seus padrinhos António Fernandes, do Casal Novo do Rio, 2 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850), fl. 49. 3 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850), fl. 37v. 4 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Óbitos (1809-1859), fls. 14-14v. 5 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850), fl. 40. 6 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850), fl. 53. 7 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850), fl. 60v.
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Manlianenses Ilustres IX - Dr. Joaquim Alves de Sousa
freguesia da Alcáçova, e Ana Monteira, da freguesia da Madalena. Na ausência de Ana Monteiro, “tocou por ella”, com procuração, seu pai, Luís Ferraz Monteiro, da freguesia da Madalena. Serviram como testemunhas Manuel Nunes da Serra, sacristão da igreja da Madalena, e seu filho António Nunes da Serra8. Tendo-se formado em Medicina (1852-1857), depois de ter frequentado, como “obrigado”, Matemática (1849-1851) e Filosofia (1849-1852), António Alves de Sousa viveu e trabalhou muitos anos em Castelo de Vide. Foi médico do Hospital da Misericórdia de Castelo de Vide a partir de 1863, mas também do partido médico municipal, igualmente desta vila, lugares que obteve por concurso público. Casou com grande solenidade na capela do Paço Episcopal de Coimbra, em 30 de agosto de 1860, com Antónia Teresa Cândida de Lemos, natural da freguesia de Troviscoso, do concelho de Monção, de quem houve dois filhos: Luís Alves de Sousa Lemos e Lucinda Alves de Sousa Lemos. Foram padrinhos do seu casamento Maria do Cloreto Cabral Pereira de Menezes e o marido José Maria de Abreu, do Conselho de Sua Majestade, diretor geral de instituição pública, lente catedrático da Faculdade de Filosofia, o Dr. Francisco Ferreira de Carvalho, lente jubilado da Faculdade de Direito, e o Dr. Joaquim Alves de Sousa, seu irmão. Dr. António Alves de Sousa (séc. XX)
Tomou parte muito ativa na vida social de Cas[© Fonte da Vila]. telo de Vide, que muito estimava e onde gozava de grande consideração, chegando a ter o seu retrato na sala das sessões da câmara municipal, e o seu nome num dos largos da vila, o tradicionalmente chamado do Montorinho. Foi neste largo que morou e onde lhe nasceu, a 14 de julho de 1864 (b. 26.08.1864), o filho Luís. Desempenhou, certamente entre outros, o cargo de presidente da Junta de Paróquia das freguesias de São Tiago e de São João Baptista, escrevendo durante esse período a obra Memória de Hidrofobia Rábica (1867). Teve uma questão com um seu colega no Hospital da Misericórdia, o Dr. José Rodrigues Amado, e nos fins da década de 1870 também com a administração da Misericórdia, questões estas que não afetaram o seu prestígio como médico e como cidadão. Este diferendo com a Misericórdia motivaria um opúsculo intitulado Santa Casa da Misericórdia de Castelo de Vide e o seu Facultativo António Alves de Sousa (1880).
8 - AUC, Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850), fl. 65v.
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Mário José Costa da Silva
Viveu e trabalhou depois em Portalegre, acumulando o exercício da prática médica com o cargo de “thezoureiro pagador” do distrito e, mais tarde, com funções na delegação do Banco de Portugal naquela cidade. Clínico distinto fazia da sua profissão um sacerdócio, não se negando nunca a visitar um enfermo, e chegando mesmo a pagar da sua bolsa muitos medicamentos, o que lhe valeu ser conhecido como “médico dos pobres”. Faleceu naquela cidade, onde deixou descendência, a 26 de abril de 1921, com 88 anos. A viúva morreria poucos anos depois, também na cidade de Portalegre. Em 1925, a edilidade portalegrense inaugurou num dos largos da cidade, com a presença da Banda União Artística de Castelo de Vide, o busto do Dr. Alves de Sousa, busto esse que ficaria a recordar o homem bom que ele tinha sido9. Nascido de pais humildes, Joaquim Alves de Sousa frequentou em Montemor-o-Velho as primeiras letras e o curso de Gramática, “começando logo na escola de instrucção primaria a dar provas de um talento não vulgar” pela sua aplicação ao estudo, e tão notoria foi ella que pessoas bem colocadas e bondosas tomaram á sua conta a creança, protegendo-a em Coimbra”10. De facto, por recomendação do seu professor e auxiliado pelo seu tio e padrinho de batismo, Joaquim Rodrigues Moreno, e pelo Dr. Maximiano de Freitas Mascarenhas Leal, vai para Coimbra, tinha então apenas 11 anos, cursar os estudos preparatórios, “onde egualmente causou admiração”, sendo aí auxiliado pelo Dr. Francisco António Rodrigues de Azevedo, lente na Faculdade de Teologia, e pelo Dr. José Manuel de Lemos, lente de Teologia, vogal do Conselho de Instrução Pública, vice-reitor da Universidade de Coimbra, vigário capitular da diocese de Coimbra e futuro bispo de Bragança e Miranda (1853-1855), Viseu (1856-1858) e Coimbra (1858-1870)11. Impressionado com tão “notável inteligência”, o Dr. José Manuel de Lemos decide fazer “vir para sua casa aquella creança tão esperançosa, e incumbiu-se da sua educação.” Durante a sua permanência no Paço Episcopal (freguesia do Salvador) realiza os estudos preparatórios, indispensáveis para a matrícula na Universidade, tendo obtido em todas as cadeiras a aprovação “nemine discrepante”, ou seja, “por unanimidade”: Gramática Latina (24.10.1837), Filosofia Racional e Moral (16.10.1839), Catecismo (13.07.1840), Retórica e História (13.07.1840) e Geometria (29.07.1840)12.
9 - In http://fontedavila.org/personalidades, de Diogo Salema Cordeiro [Consultado a 08.09.2011]. 10 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1911-1913), fls. 144-145v.; O Conimbricense, 8 de março de 1892. 11 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1892-1893), fls. 11v.-13. 12 - AUC, Livro dos Exames de Gramática Latina (1837), fl. 80v.; id., Livro dos Exames de Filosofia Racional e Moral (1839), fl. 102; id., Livro dos Exames de Catecismo (1840), fl. 261; id., Livro dos Exames de Retórica e História (1840), fl. 207; id., Livro dos Exames Geometria (1840), fl. 142.
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Manlianenses Ilustres IX - Dr. Joaquim Alves de Sousa
Concluídos os estudos preparatórios, “tendo-se comportado muito bem moral e politicamente, e dando mesmo sinaes de vocação para o Estado Ecclesiastico”13, mostra estar “livre de culpas” (o correspondente ao registo criminal dos nossos dias), e matricula-se, a 24 de outubro de 1840, no 1.º ano da Faculdade de Teologia14. Durante o seu percurso universitário, foi possível apurar o seguinte trajeto: 1841. A 4 de junho é admitido à “Primeira Aula de Gramatica Grega” no Liceu Nacional de Coimbra15; no mesmo dia é aprovado Nemine Discrepante no exame das disciplinas do 1.º ano do curso de Teologia16; e, a 5 de outubro, matricula-se no 2.º ano de Teologia17; 1842. Sai do Paço Episcopal e passa a residir no Seminário Episcopal, na freguesia da Sé. A 28 de maio, na “sala pública”, sendo presidente o Dr. Joaquim Pereira Ferraz, é aprovado Nemine Discrepante no exame das disciplinas do 2.º ano de Teologia18; a 18 de junho é admitido na cadeira de Gramática Hebraica, lecionada no Liceu Nacional de Coimbra19; e a 5 de outubro matricula-se no 3.º ano de Teologia20; 1843. Fixa residência junto aos Arcos de S. Bento, n.º 11. A 9 de junho, na “sala pública”, sendo o júri presidido pelo Dr. José Xavier Cerveira e Sousa e pelo Dr. José Ernesto de Carvalho e Rego, é aprovado Nemine Discrepante no exame das disciplinas do 3.º ano de Teologia, obtendo o grau de bacharel21; e a 4 de outubro matricula-se no 4.º ano de Teologia22; 1844. A 1 de julho, na “sala pública”, sendo presidente o Dr. João Tomás de Sousa Lobo, é aprovado Nemine Discrepante no exame das disciplinas do 4.º ano de Teologia, obtendo a formatura23; e a 15 de outubro matricula-se no 5.º ano de Teologia24. 13 - AUC, Petições de Matrícula da Faculdade de Teologia (1838-1843), Joaquim Alves de Sousa (1.º ano de Teologia – 1840). 14 - Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1840 para 1841, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1840, p. 3; AUC, Livro de Matrículas da Universidade de Coimbra (1840-1841), fl. 2v. 15 - AUC, Matrículas do Liceu Nacional de Coimbra (1840-1841), fl. 32v. 16 - AUC, Atos e Graus de Teologia (1825-1848), fl. 9. 17 - Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1841 para 1842, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1841, p. 4; AUC, Livro de Matrículas da Universidade de Coimbra (1841-1842), fl. 5. 18 - AUC, Atos e Graus de Teologia (1825-1848), fl. 40v. 19 - AUC, Matrículas do Liceu Nacional de Coimbra (1841-1842), fl. 73. 20 - Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1842 para 1843, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1842, p. 5; AUC, Livro de Matrículas da Universidade de Coimbra (1842-1843), fl. 10v. 21 - AUC, Atos e Graus de Teologia (1825-1848), fl. 67. 22 - Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1843 para 1844, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1843, p. 6; AUC, Livro de Matrículas da Universidade de Coimbra (1843-1844), fl. 12. 23 - AUC, Atos e Graus de Teologia (1825-1848), fl. 90. 24 - Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1844 para 1845, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1844, p. 7; AUC, Livro de Matrículas da Universidade de Coimbra (1844-1845), fl. 20.
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1845. “Tendo sido Repetente no anno lectivo proximo passado, sem que podesse fazer os respectivos Actos” solicita “a matricula d’apresentação” no ano letivo de 18451846, matriculando-se, a 27 de outubro, no 6.º ano de Teologia. Apesar de chegar “a frequentar o anno de repetição, não se doutorou.”25 Embora inicialmente os seus estudos se destinassem à carreira eclesiástica, que nunca chegaria a abraçar, acabaria por seguir o rumo do ensino secundário, estabelecendo-se, durante algum tempo, como professor de latim no Colégio da Formiga, em Ermesinde, “indo d’alli para Lisboa, a fim de educar os filhos do conde de Thomar.”26 Depois de ter lecionado no Colégio da Formiga, concorreu e foi provido, por carta régia (12.12.1849), no lugar de professor vitalício da cadeira de Gramática e Língua Hebraica no Liceu Nacional de Coimbra27. No entanto, só virá a tomar posse efetiva desse lugar a 6 de maio de 1851, começando a lecionar a cadeira a 5 de julho do mesmo ano28. Em 1854, residia então na rua do Cabido, n.º 1, faz uma incursão na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, matriculando-se, a 5 de outubro, no 1.º ano da mesma.29 Ao que foi possível apurar, tratou-se da única matrícula que realizou naquele curso. Escritor “aprimorado, classico, de raro saber”, deu à estampa “varias publicações que tiveram uma aceitação extraordinaria, como o provam as numerosas edições que d’ellas se fizeram.”30 Entre essas obras, poderemos destacar: Grammatica Elementar da Lingua Latina para uso das escholas, Coimbra, Livraria de J. Augusto Orcel, 1857; Analyse da Grammatica Nacional e da Portaria que a impoz ás escholas, Coimbra, Livraria de J. Augusto Orcel, 1865; Curso de Themas Graduados segundo as regras da Grammatica Elementar da Lingua Latina, Coimbra, Livraria de J. Augusto Orcel, 1867; Tradução do Curso Elementar de Philosophia, composto em francez pelo rev. Padre E. Barbe, 2.ª ed., Paris, 1871; Curso de Philosophia Elementar, comprehendendo Psychologia, Logica, Metaphysica, Moral, Direito Natural e Historia da Philosophia, para uso das escholas, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1871; e Resposta a um critico ou exame de algumas asserções do Sr. Augusto Epiphanio da Silva Dias sobre a Grammatica Portugueza e Latina, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1873. 25 - Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1845 para 1846, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1845, p. 7; AUC, Livro de Matrículas da Universidade de Coimbra (1845-1846), fl. 26; AUC, Petições de Matrícula da Faculdade de Teologia (1827-1850), Joaquim Alves de Sousa (6.º ano de Teologia – 1845). 26 - O Conimbricense, 8 de março de 1892. 27 - ANTT, Registo Geral de Mercês de D. Maria II, liv. 34, fls. 288-289. Inaugurado em 1845, o Liceu Nacional de Coimbra foi um dos primeiros liceus criados em Portugal, na sequência da reforma da instrução secundária decretada, por Passos Manuel em 1836 (Diário do Governo, n.º 275, de 19 de novembro de 1836). 28 - AUC, Liceu de Coimbra. Serviços dos Professores (1848-1852), fls. 54 e 76. 29 - Relação e Indice Alphabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra e no Lyceu. Anno Lectivo de 1854 para 1855, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1854, p. 7. 30 - O Conimbricense, 8 de março de 1892.
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Grammatica Elementar da Lingua Latina para uso das escholas (1892) [© Mário José Costa da Silva].
Polemista temível, pelo “vigor logico da sua argumentação”, Joaquim Alves de Sousa chegou ainda a colaborar com Bento José de Oliveira, na sua Grammatica Elementar da Lingua Portuguesa, “e em grande parte a isso se deve a fama que adquiriu essa Grammatica.”31 Durante o ano de 1867, surge como secretário e relator do “Relatorio da Commissão Especial juncto do Lyceu Nacional de Coimbra, sobre os exames feitos no mesmo Lyceu em Junho e Julho 1866” (23 de junho) e do “Relatorio da Commissão Especial juncto do Lyceu Nacional de Coimbra, sobre os exames feitos no mesmo Lyceu em Junho, Julho e Outubro de 1867” (30 de novembro). Em 1871, morava ao tempo na rua das Covas, n.º 11, surge já como professor regente da 10.ª cadeira de Filosofia Racional e Moral e Princípios de Direito Natural do Liceu Nacional de Coimbra, lugar para o qual viria a obter nomeação definitiva, por carta régia, a 24 de fevereiro de 188132. De acordo com a imprensa da época, terá também lecionado a cadeira de Filosofia Racional no Seminário Episcopal33.
31 - O Conimbricense, 8 de março de 1892. 32 - Annuario do Lyceu Nacional de Coimbra no anno lectivo de 1871 para 1872, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1871, p. 6; ANTT, Registo Geral de Mercês de D. Luís I, liv. 34, fl. 162. 33 - O Conimbricense, 8 de março de 1892.
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A 26 de outubro de 1876, nova carta régia concede-lhe o aumento do terço de ordenado, por diuturnidade, como professor do Liceu de Coimbra34. Senhor de um “caracter immaculado e austero no cumprimento dos seus deveres”, sendo “notabilissimo em todas as línguas, era preferido nas mortes, que conhecia como poucos ou nenhuns, caracteres d’uma honestidade inquebrantável e saber profundo”35, participou ativamente, pela mão do conselheiro Martens Ferrão e ao lado de outro ilustre pedagogo, António José Viale, professor de Literatura Clássica no Curso Superior de Letras, na instrução secundária (1874-1883) do príncipe D. Carlos e de seu irmão, o infante D. Afonso, lecionando-lhes Lógica e Retórica (1876), bem como “Filosofia Racional e Moral, e História Sistemática da Filosofia”, como preparação para o “estudo de Direito Natural ou da Filosofia do Direito” (1878). Durante este período, coube-lhe ainda a responsabilidade de ministrar ao príncipe, aos domingos, lições de História do Cristianismo, bem como orientá-lo na leitura dos Evangelhos36. No desempenho destas funções, “ouve-se por tal forma que grangeou não a estima dos egregios pupilos mas de seus pais que tinham por elle mais que estima, veneração, vendo-se em dia de seus annos obrigado a acceitar das mãos do rei a Comenda de Christo com que elle n’aquelle dia o quis honrar.”37 Quem não vê com bons olhos a presença de Joaquim Alves de Sousa junto dos príncipes, é Ramalho Ortigão que, em “As Farpas”, não se coíbe de criticar, de forma corrosiva, o seu método de ensino, bem como os conteúdos lecionados. Valerá a pena saborear o texto: “Acaba de ser nomeado professor de Lógica e de Retórica de Suas Altezas os Príncipes o senhor Joaquim Alves de Sousa, antigo professor de Hebraico no Liceu de Coimbra. O senhor Alves de Sousa é um homem baixo, extremamente cabeludo e metafísico. (...) Sempre que antigamente era preciso fazer na Universidade um daqueles discursos latinos que tinham obrigação de não exprimir nenhum pensamento, nenhuma ideia, nenhuma opinião, e de roncarem todavia por um determinado espaço de tempo entre um repique tangido nos sinos e o hino académico flauteado nas charamelas, o senhor Alves de Sousa era chamado como especialista destes casos. O ilustre humanista comparecia então com a sua filosofia e o seu léxicon; e começava a operação. Punha diante de si os palavrões ciceronianos, do alto estilo, colocados por 34 - ANTT, Registo Geral de Mercês de D. Luís I, liv. 29, fl. 249v. 35 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1911-1913), fls. 144-145v. 36 - RAMOS, 2006, pp. 38-40; Correspondência de Coimbra, 4 de março de 1892. 37 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1911-1913), fls. 144-145v.
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sua ordem: primeiro, os verbos ao pé dos respectivos advérbios com os seus competentes graus, positivo, comparativo e superlativo; depois, os nominativos com todos os seus casos; em seguida, os adjectivos com as suas três partes, masculina, feminina e neutra; etc. Assim dispostos os elementos constitutivos da oração, o ilustre alquimista dos filtros retóricos das solenidades académicas puxava o verbo ao campo do papel almaço aplicando-o com os grossos bicos da sua pena de peru rangente e sorna. Depois, acavalavalhe o sujeito concordante em número e pessoa e revestido de um adjectivo apropriado; arrabichava o acusativo, enxalmava os necessários advérbios, afivelava as proposições, acolchetava as vírgulas nos seus respectivos furos, e exonerava o ponto final. Passava então ao período seguinte, e assim prosseguia, remunerado pelos interessados com bocetas de ameixas de Santa Clara e com pencas de manjar branco, até haver preenchido com o seu bastardinho venerável o espaço de papel votado pelos usos universitários à lúgubre convulsão galvânica das línguas mortas. Tal era junto da Universidade a missão científica do senhor Alves de Sousa: ingerir pencas de Santa Clara e doce de Celas, produzir o latim campanudo, orquestrante, de carrilhão, destinado a petrificar o cérebro dos recipiendiários, no momento de se lhes colocar a borla doutoral, com a mesma solenidade expressiva com que se baixa o apagador litúrgico sobre o círio pascal. (...) Este curioso estado de perfeição no abstracto levou-o a fazer uma gramática latina em que as regras são tiradas dos exemplos e os exemplos são tirados das regras. As regras gramaticais de uma língua morta só podem ser tomadas dos documentos escritos que nos deixaram os povos que falaram essa língua. Virgílio, Cícero e Horácio concordavam o adjectivo com o substantivo em género, número e caso; logo, em latim o adjectivo concorda com o substantivo em género, número e caso. Esta é a regra, de que será exemplo um ou mais trechos de Virgílio, de Cícero, de Horácio. O senhor Alves de Sousa não o entendeu assim, e no seu compêndio nota-se que, sendo a regra feita por ele, por quem imaginam que será feito o exemplo? O exemplo é também feito por ele! Assim a doutrina deste sábio é ao mesmo tempo o efeito e a causa de si mesma. Se não estivesse inventada a serpente com a cauda na boca, símbolo egípcio da imobilidade, a teoria deste filósofo ocuparia o lugar desse símbolo! É o senhor Joaquim Alves de Sousa que vem ensinar Suas Altezas os Príncipes – a raciocinar! Os leitores conhecem o mestre, imaginem o que será a lição e o que virá a ser o discípulo. (…) O senhor Alves de Sousa, que vem agora, é um retórico, é um gramático, é um sofista, é um mágico.
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Aguardamos com viva curiosidade zoológica o fausto momento em que houver de se patentear sobre o trono dos lusos o caro objecto saído desta retorta de Wagner.”38 Talvez fosse assim, mas Alves de Sousa e Viale, professores de Humanidades, eram sem dúvida os mais habilitados para dar aos príncipes uma boa formação clássica, que continuava a ser a base da educação do cavalheiro ilustrado. Entretanto, “a sua vida sedentaria concorreu para ter doenças muito graves, sendo necessário sujeitar-se por varias vezes a operações dolorosíssimas”39. Nos últimos anos de vida, procura um clima mais saudável, sendo visita assídua da casa de seu irmão, o médico António Alves de Sousa, em Portalegre (freguesia de São Lourenço), cidade onde foi reconhecido como grande benemérito40. A 29 de fevereiro de 1892, tinha então 67 anos, morre em casa de seu irmão, pelas 7 horas da manhã, vitimado por uma “anemia consecutiva”, deixando viúva e filhos, quatro deles ainda vivos em 1913. Por alvará do Governo Civil do distrito de Portalegre, datado de 1 de março, é autorizada a viagem dos seus “restos mortais” até ao cemitério da Conchada, na cidade de Coimbra, “terra que sempre amou com entranhado affecto”41 e onde contava com “amigos muito dedicados em todas as classes sociaes”42. No dia 2 de março, o corpo chega a Coimbra, “sendo esperado na estação do caminho de ferro pelo cabido, capellães da Sé, professorado do Lyceu e Seminario d’esta cidade”. Daqui o préstito fúnebre seguiu para a capela do cemitério da Conchada, onde “foi cantado á chegada do corpo um responso pelos cantores da Sé Cathedral”43. Findas as cerimónias religiosas, por volta das 10 horas da manhã, o seu corpo é inumado no mausoléu de D. José Manuel de Lemos, seu antigo protetor, aí permanecendo durante três meses44. Nos dias seguintes, os ecos da sua morte continuar-se-iam a escutar um pouco por toda a imprensa coimbrã e sempre no sentido de realçar que as “Lettras” acabavam de perder “um dos dedicados cultores, sendo considerado pelos competentes como um dos mais notáveis humanistas.”45 A 5 de março, por proposta do comendador Dr. José Maria de Góis Mendanha Raposo, presidente da câmara municipal de Montemor-o-Velho, toda a vereação presta
38 - ORTIGÃO, vol. 4, 2007, pp. 1162-1167. 39 - O Conimbricense, 8 de março de 1892. 40 - SILVA, 1981, pp. 77-78. 41 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1911-1913), fls. 144-145v. 42 - Correspondência de Coimbra, 4 de março de 1892. 43 - Correspondência de Coimbra, 4 de março de 1892. 44 - Em 1909, as suas ossadas foram exumadas e trasladadas para o jazigo da família (CMC, Livro de Enterramentos (1891-1893), fls. 148v.-149). 45 - Correspondência de Coimbra, 4 de março de 1892.
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“homenagem e tributo de respeito pela memoria d’um dos filhos mais illustres d’esta villa”, o Dr. Joaquim Alves de Sousa, deixando exarado em ata um voto de profundo pesar pelo seu falecimento46. Mesmo alguns anos passados sobre a sua morte, e apesar de sempre ter vivido longe da terra que o vira nascer, os montemorenses jamais olvidariam tão insigne pedagogo. Prova do que se acaba de afirmar, foi a deliberação tomada a 5 de abril de 1913, por “aclamação” e em resposta a um ofício de D. Francisco de Noronha, pela Comissão Administrativa Republicana de Montemor-o-Velho, presidida por Augusto Ferreira de Andrade, de atribuir o nome do Dr. Joaquim Alves de Sousa ao antigo Largo do Outeiro47, um dos largos mais importantes desta vila, a par com os largos da Praça (Praça da República), dos Anjos e da Ponte da Alagoa, “para que a todo o tempo se atteste que a terra não o esqueceu de todo em sua gratidão, fazendo justiça as suas virtudes e serviços patrios.”48
Largo Dr. Alves de Sousa (2013) [© Mário José Costa da Silva].
46 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1892-1893), fls. 11v.-13. 47 - Hoje, o Largo Dr. Alves de Sousa confronta com as seguintes artérias: Largo de S. Martinho; Rua Conselheiro Mendes Pinheiro; Travessa Dr. Alves de Sousa; e Largo de Santa Marta. 48 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho (1911-1913), fls. 144-146; GÓIS, 2012, pp. 171 e 174-176.
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FONTES MANUSCRITAS ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA (AUC) Atos e Graus de Teologia: 1825-1848. Liceu de Coimbra. Serviços dos Professores: 1848-1852. Livros de Matrículas da Universidade de Coimbra: 1840-1841; 1841-1842; 18421843; 1843-1844; 1844-1845; 1845-1846. Livros dos Exames de: Gramática Latina (1837); Filosofia Racional e Moral (1839); Catecismo (1840); Retórica e História (1840); Geometria (1840). Matrículas do Liceu Nacional de Coimbra: 1840-1841; 1841-1842. Petições de Matrícula da Faculdade de Teologia (1827-1850), Joaquim Alves de Sousa (6.º ano de Teologia – 1845). Petições de Matrícula da Faculdade de Teologia (1838-1843), Joaquim Alves de Sousa (1.º ano de Teologia – 1840). Registos Paroquiais de Montemor-o-Velho (Madalena) – Batismos (1799-1850); Óbitos (1809-1859).
ARQUIVO MUNICIPAL DE MONTEMOR-O-VELHO (AMMV) Livro das Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho: 1892-1893; 1911-1913.
ARQUIVO NACIONAL TORRE DO TOMBO (ANTT) Registo Geral de Mercês de D. Luís I, liv. 29 e 34. Registo Geral de Mercês de D. Maria II, liv. 34.
CEMITÉRIO MUNICIPAL DE COIMBRA (CMC) Livro de Enterramentos: 1891-1893.
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FONTES IMPRESSAS Annuario do Lyceu Nacional de Coimbra no anno lectivo de 1871 para 1872, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1871. Correspondência de Coimbra, 4 de março de 1892. Diário de Coimbra, 2 de março de 1984. Diário do Governo, n.º 275, de 19 de novembro de 1836. O Conimbricense, 8 de março de 1892. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1840 para 1841, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1840. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1841 para 1842, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1841. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1842 para 1843, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1842. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1843 para 1844, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1843. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1844 para 1845, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1844. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra no Anno Lectivo de 1845 para 1846, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1845. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra e no Lyceu no Anno Lectivo de 1851 para 1852, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1851. Relação e Indice Alfabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra e no Lyceu no Anno Lectivo de 1852 para 1853, Coimbra, Na Imprensa da Universidade, 1852. Relação e Indice Alphabetico dos Estudantes Matriculados na Universidade de Coimbra e no Lyceu. Anno Lectivo de 1854 para 1855, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1854. Relatorio da Commissão Especial juncto do Lyceu Nacional de Coimbra, sobre os exames feitos no mesmo Lyceu em Junho, Julho e Outubro de 1867, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1868. 131
Relatorio da Commissão Especial juncto do Lyceu Nacional de Coimbra, sobre os exames feitos no mesmo Lyceu em Junho e Julho, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1866.
BIBLIOGRAFIA A Santa Casa da Misericordia de Castello de Vide e o seu facultativo Antonio Alves de Sousa, Coimbra, Imprensa Litteraria, 1880. CONCEIÇÃO, Augusto dos Santos, Terras de Montemor-o-Velho, 2.ª ed., Montemor-o-Velho, Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1992. GÓIS, Correia, “Montemorenses ‘ilustres’ na toponímia da vila”, in Monte Mayor. A Terra e a Gente, n.º 12, Montemor-o-Velho, CMMV, abril de 2012, pp. 171-176. ORTIGÃO, Ramalho, As Farpas Completas. O País e a Sociedade Portuguesa, ed. de Ernesto Rodrigues, vol. 4 (tomo VIII, “Os nossos filhos – Instrução Pública”, cap. XVII, “A educação dos príncipes – O professor de Lógica e Retórica se Suas Altezas”, março, 1876), Lisboa, Circulo de Leitores, 2007, pp. 1162-1167. PIMENTEL, Cristina Sousa, “O latim nas literaturas portuguesa e francesa: instrumentos, métodos e agentes de ensino”, in Ágora. Estudos Clássicos em Debate, n.º 3 (2001), pp. 183-245. RAMOS, Rui, D. Carlos (1863-1908), Lisboa, Círculo de Leitores, 2006. SEQUEIRA, Francisco, Dr. António Alves de Sousa: traços biográficos, Portalegre, O Distrito de Portalegre, 1928. SILVA, Luísa Felizardo Lopes da, Roteiro e subsídios para a história da cidade de Portalegre, Portalegre, ed. autor, 1981. SOUSA, António Alves de, Memoria sobre a Hydrophobia Rabica, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1867.
José Carlos da Silva Duarte*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 133 - 139
“Ora et Labora” A doçaria conventual
Em altivo morro, imponente, Ao cálido Mondego, sobranceiro, Na vila-mirante, altaneiro Entre o velho burgo envolvente, Polvilhado com um formigar de gente De mãos dadas com séculos de história Avulta com a sua coroa de glória, Nos alegres campos e verdes arvoredos Guardiões de ancestrais segredos Manuscritos nos livros da memória. Com a sua magnitude e grandeza, Coroado de ameias e torres em seu redor, Apresenta-se com todo o esplendor. Dos “Montes-Maiores”, outrora fortaleza, De monarcas, infantas, a realeza Dum Portugal medieval, E além desta joia ancestral Preservados pela tradição e pelo tempo Por necessidades e algum provento Os legados da doçaria conventual.
* - José Carlos da Silva Duarte (Natural de Santo Varão, Prémio Literário Afonso Duarte, 2010).
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José Carlos da Silva Duarte
Em terras de tão nobre passado, Este é o reino da doçaria Desde tempos da monarquia, Que ele é rei idolatrado Pelo povo o seu reinado consagrado. Com príncipes e princesas em seu redor, A sua rainha irradia de esplendor No seu castelo, outrora bastião, O seu hino de louvor e consagração São as espigas doces de Montemor. Já El-Rei D. Manuel de Portugal, Grande apreciador e amante da doçaria Às soberbas queijadas de Pereira se referia, “Um petisco para o seu paladar real”. E para a “villa”, elemento vital Para a sua sustentação, Mas foi a partir da fundação Do Real Colégio das Urselinas Inspiradas por leis divinas, Incentivaram a sua divulgação. Segredos confinados De saberes e sabores Entre as orações e os labores, Em conventos enclausurados A sete chaves fechados. Os pastéis de Tentúgal não foram excepção Transmitidas de geração em geração As receitas então sigilosas Das várias ordens religiosas, Doces de requintada composição.
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Poesia
Porém, aquando do empobrecimento Das comunidades, mudaram-se as regras, A troco de umas míseras moedas Para viabilizar o seu sustento Quebrou-se o jejum do isolamento, Indo parar às rodas das portarias Uma forma de equilibrar as economias Mas graças, da “marchanta” e das “recoveiras” As últimas guardiãs, as herdeiras, Arribaram os segredos, até aos nossos dias Na vasta “paleta” da gastronomia, As origens perdem-se no tempo Esfumaram-se ao sabor do vento. Os pecados da gula da doçaria Encerram este capítulo com mestria. Ressuscitados da penumbra do passado, Os papos de anjo, as papas de moado, As espigas doces, barrigas de freira, O arroz doce, as queijadas de Pereira, Os confeitos, o açúcar cristalizado, De Tentúgal os pastéis e as queijadas, A marmelada, o doce de chila, de cabaço, De frutos, ameixa figo, maçã e damasco, A mecha de calda, as pêras passadas, As meias luas, os palitos, as arrofadas, Os beilhós, pães-de-leite, os coscorões, O biscoito do carreiro, degustados aos serões, Os licores de ginga, cidra, os folares Uma miscelânea de paladares Doces pecados, divinas tentações
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José Carlos da Silva Duarte
Rábula das Lavadeiras (Homenagem às lavadeiras do Mondego)
Palmira Bên dia Conceição Isso é que foi madrugar Já tens a roupa a corar Conceição Não te devo nenhuma satisfação Nem pedi a tua opinião Por isso, bên dia Palmira E daqui ninguém me tira Palmira Campastes, ainda estou para ver Quando por ai aparecer A minha comadre Alzira Palmira Queres saber uma novidade… Mas perante mim tens de jurar Como em frente ao Cristo no altar Conceição Juro. Por mim nada se sabe Sabes bem que é verdade Mas depressa tens de me dizer Ai com catano, já estou toda a tremer Palmira Olha, parece que o filho do sacrista Aquele meio alevantado da crista Atrás dum rabo de saia anda a correr Conceição Mas ele parece-me tão atilado À noite trabalha de padeiro E ao Domingo ajuda o barqueiro
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Poesia
Palmira Pois é. Mas dizem que o safado Pela filha da Rosa anda embeiçado Conceição Ai socorro que eu grito Ai que eu morro, eu não acredito Ele que era doido pela minha filha Palmira Era até lhe furar a bilha Conceição Raios abrasassem esse maldito Conceição Eu até estou atarentada Palmira Olha, vem ali a Guilhermina Por isso agora põe-te é fina Conceição E eu consigo lá estar calada Ai a minha filha que está desgraçada Guilhermina Bêns dias, Palmira, Conceição Alta vai a discussão Ainda não vinha no empedrado Já vos ouvia do outro lado Conceição Não me venhas também dar sabão Palmira Ela não sabe nada da nossa história Conceição Não, está-se mesmo a ver Aqui o corno fui eu, que fui a última a saber Guilhermina Não te armes em finória Faço-te o mesmo que fiz à Vitória Conceição Ah cachopa, sei que estás danada Também queres andar à chapada Guilhermina Sei que pensas que tenho medo E já todos sabem o teu segredo Por isso está mas é calada Conceição Que triste sorte a minha Tudo de ruim me acontece Guilhermina Cada qual tem aquilo que merece Ele gostou mais da galinha da vizinha Porque era a mais gordinha 137
José Carlos da Silva Duarte
Conceição Ele vira é frango depenado Quando eu lhe der cabo do noivado Ai a minha rica filha Palmira/Guilhermina A quem o frango debicava a bilha Conceição Eu esgano esse desgraçado Guilhermina Isto ainda vai azedar Olha para ali óh Palmira Não é a tua comadre Alzira Palmira É e já vem a barafustar A Conceição roubou-lhe o lugar Conceição Aqui não há lugar marcado Quando cheguei este estava desocupado Alzira Bêns dias, Palmira, Guilhermina e tu óh Conceição Sai já dai meu grande coirão Ou vais até à Figueira a nado Palmira Óh Alzira, anda para aqui para ao pé de mim Alzira Roubar-me a pedra! Isto é o cúmulo Hás-de levá-la para o túmulo Juro pela alma do mê Jaquim Guilhermina Raios ta partam. Óh Alzira não fiques assim Alzira Maldita a hora que escolhi para vir lavar Mas óh Conceição ainda mas vais pagar Palmira Quando ela for mijar, aquilo passa Conceição Isso gozem, sabe Deus a minha desgraça Com quem agora vai a minha filha casar Alzira Logo ela que é tão prendada Pode casar com o filho do ferreiro Que lá por ser cocho é rapaz solteiro Palmira Mas ela não sabe fazer nada Os dias passa-os deitada Alzira Com uma mãe assim não é para admirar Mas o que é que eu estou a escutar 138
Poesia
Guilhermina Eu já ando um bocado surda Alzira Ai que o santíssimo nos acuda Parecem chocalhos a chocalhar Conceição Valha-me o santíssimo sacramento que aflição Óh Alzira, eu hoje estou enervada, desculpa Mas o malvado do Padeiro é que teve a culpa Alzira Para que não digam que tenho mau coração Desta vez até te desculpo óh Conceição Por me teres roubado a pedra e o coradouro Conceição Mas ele desgraçou a minha filha Guilhermina/Palmira/ Agora o ferreiro que lhe ferre a bilha Alzira Conceição Arre pífaro, longe vá o agouro Barqueiro Arreda, arreda que vem lá touro
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Maria Bernardes* e Maria Oliveira**
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 141 - 153
Gatões, a Memória do Seu Povo (Dramatização Teatral) Gatões, Agosto de 1993
1ª CENA Teatro de sombras com a lenda da Senhora das Candeias. Enquanto são projetadas, na tela, imagens de Gatões, um narrador lê a lenda:
LENDA DE Nª SENHORA DAS CANDEIAS DE GATÕES Gatões é uma pequena aldeia situada no baixo Mondego. Já contava o meu avô à minha mãe que esta terra tinha tido o seu início por causa da devoção a Nossa Senhora das Candeias, como vou contar. Em tempos que já lá vão, as águas que circundavam o Mondego não tinham represas, andavam soltas, sujeitas a marés e tempestades. Ao que parece, os povos aqui à volta viviam da pesca, e acontecia, não raras vezes, haver tempestades e nevoeiros. Os pescadores sentiam-se então perdidos e, nas suas preces, começavam a chamar por Nª. Sª. das Candeias. Segundo conta a lenda os pescadores viam então uma luz que os guiava e conduzia a porto seguro. A constância do lugar onde era avistada a luz levou as pessoas a frequentá-lo e a desenvolver um ritual, considerando esse lugar como sagrado “por obra e graça de Nª. Sª. das Candeias”. O nome de Gatões, segundo contam os antigos, está intimamente ligado a esse acontecimento. * - Maria Adelaide Oliveira Bernardes (Natural de Montemor-o-Velho. Autora da peça Gatões, A Memória do Seu Povo). ** - Maria Adelina Loureiro de Oliveira (Natural de Montemor-o-Velho. Autora da peça Gatões, A Memória do Seu Povo).
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Maria Adelaide Bernardes e Maria Adelina Oliveira
Nesse tempo o dono deste lugar seria um fidalgo de origem espanhola com o nome de D. Catão. Esse fidalgo vivia na Quinta de D. João, em Quinhendros. Ao saber da devoção das pessoas dos seus condomínios, terá doado essas terras “bravias na altura” a Nª. Sª. das Candeias. Assim, terá sido D. Catão quem deu o nome à nossa terra, sofrendo este nome, ao longo dos anos, várias transformações: Catão, Gatão, Gatones e, finalmente, Gatões…Isto dizia o meu avô à minha mãe… Na Igreja de Gatões, que já tem mais de 400 anos, está um navio gravado na parede, é possível que seja o confirmar desta história sobre Gatões.
Fecha-se o pano.
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Gatões, a Memória de Seu Povo
2ª CENA Em cena está uma avó, uma tia velha e uma neta. Ocupam um canto do palco, com dècor de sala, estando sempre em cena. A roupa: A avó e as tias vestem blusa com fralda de fora, saia comprida com um pouco de roda e grande avental de riscado. O cós do avental é talhado em godés. Na cabeça trazem cachené chinês e um chapéu de pano aveludado (como o das gandarêzas).
NETA – Ó avó, que bonita é a lenda de Gatões! Quem a terá inventado? AVÓ – Eu não sei netinha, esta lenda foi sendo contada de geração em geração, até que chegou aos nossos dias. O meu avô até dizia à minha mãe que em Santa Olaia havia grandes argolas, para os pescadores prenderam os navios. NETA - Conte-nos coisas do seu avô e da sua juventude, avó! AVÓ – O meu avô Elísio começou a trabalhar com 10 anos (depois de aprender a ler). Ele até fez um exame de instrução primária em Montemor, na escola Conde Ferreira. TIA – É verdade! Mas as dificuldades eram mais que as mantas e teve de ir trabalhar. Então o padrinho dele, que era feitor na Quinta de Belveia, em 1887, deu-lhe trabalho, a guardar os pássaros do trigo e os corvos das favas. O tio contava que, logo de manhã, era rufar num latão para afugentar a passarada, que todos os dias o vinham cumprimentar. NETA – E quanto é que ele ganhava? AVÓ – 120 reis, minha neta! Trabalhava sete dias por semana. Mais tarde foi promovido a guardador de porcos.. A bolota assada e as capôas serviam muito bem para encher o bucho, a qualidade não era problema desde que a barriga estivesse bem cheia…Mais tarde foi trabalhar para Lisboa, mas essa história fica para outro serão. Nós ficámos sempre por cá e o nosso trabalho era nos campos… NETA – Quando a avó era nova que é que se cultivava no campo? AVÓ – Olha, netinha cultivava-se bastante milho, tanto no campo como no monte. Mais tarde, e à medida que se iam desbravando os terrenos mais pantanosos, é que se começou a cultivar o arroz. O primeiro descasque de arroz aqui de Gatões data de 1917 e o segundo de 1929, mais ou menos.
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Maria Adelaide Bernardes e Maria Adelina Oliveira
TIA – E quando nós íamos para o campo da Borralha sachar o milho? Tínhamos de passar pela praça para sermos contratados pelos patrões. Quem oferecesse mais dinheiro é que ficava com o pessoal. Ganhava-se 3 escudos por dia!!Mas também dependia da quantidade das pessoas que se oferecessem para trabalhar. NETA – Então, e como é que iam para o trabalho? AVÓ – Íamos a pé! Os campos de Montemor eram tão longe que pareciam que ficavam no fim do mundo!! E ainda tínhamos que levar o farnel, a sachola e uma foice, não fosse ser preciso… NETA – Então e era só esse o trabalho que tinham? AVÓ – Não! Os homens iam para a Borda-d’água e algumas mulheres também. As que tinham filhos ficavam cá para os criar. A safra durava seis meses. O que lhes valia eram as cartas e os mimos que as famílias despachavam pela Páscoa. Mandavam pelo comboio. Era ver os caramelos, cheios de alegria, a levantarem os cestos na estação mais próxima! NETA – (riu-se admirada) CARAMELOS? AVÓ – Caramelos era o nome que chamavam aos homens destes sítios que iam trabalhar para a Borda-d’água. Cada região do país tinha uma alcunha; por exemplo os de Viseu eram conhecidos como Gaibéus, e os Caramelos chamavam Cães-brancos aos homens do Ribatejo. TIA – É verdade! Depois trabalhava-se até doer a pele da barriga…para se poupar alguns tostões para o sustento da família que ficava cá na terra. Só podia ser assim, para se ganhar a vida honradamente. Tínhamos que dar o corpo ao manifesto. Cá na terra chamavam malteses a todos os que fossem trabalhar para Borda-d’água. Tinham alcunhas lá e tinham alcunhas cá…. AVÓ – Deixa lá, também havia muita alegria! Quando regressavam a casa era um cantar d’alma!! Até parece que os estou a ver chegar.
Entram em cena duas mulheres, duas ou três crianças. Estão na rua. A Maria está à espera do marido que chega da Borda-d’água. As outras são vizinhas e o marido de uma foi esperar o Maltês. As mulheres vestem saia com pouca roda, avental comprido, lenço atado atrás e blusa de chita. Os homens vestem camisa de riscas, colete preto e calças de cotim. Na cabeça Têm boné, chapéu de palha ou barrete.
MARIA – Ai o meu rico António que nunca mais chega! O comboio às tantas vem atrasado! 144
Gatões, a Memória de Seu Povo
FILHA – (puxando o avental à mãe) Ó mãe, o pai nunca mais vem? MARIA – Ele já vem filha, está quase a chegar. Deus queira que ele não venha muito cansado. Ainda bem que o teu Manel o pôde ir esperar, para o ajudar a trazer a malta. VIZINHA – Então e para é que servem os vizinhos? Eles, pelo tempo, devem estar a chegar ao Cabeço da Tocha. MARIA – (Olhando ao longe) Ai que vem lá o meu rico homem!
(O António entra em cena com o vizinho, chega e dá um abraço à mulher e às filhas)
ANTÓNIO – Vinha cheio de saudades, mulher! E os pimpolhos têm-se portado bem? Tragam para aqui a malta rapazes, e cheguem-se para cá!
(Entram todos, carregados de cestos, garrafões e enxadas. A Maria vai buscar bancos)
MARIA – Sentem-se, para descansarem um pouco. A jornada foi um pouco comprida. ANTÓNIO – Ó Maria, vai buscar jeropiga para os meus amigos limparem o pó da garganta! MARIA – (Diz para a filha) Vai lá minha filha, que eu quero ficar a conversar com o teu pai. Então António, tu vens tão magrinho! Mas olha que eu já fiz a panela de cozinha para a ceia. Passaste por lá uns maus bocados, não foi? ANTÓNIO – (Vai dando de beber aos seus amigos) Não! A gente cansava-se, é certo, mas também não era assim tão mau! Quando dávamos para cantar, lá se iam as saudades. Queres ouvir algumas das nossas cantigas? Ó Caramelos vamos a isto.
levantaram-se e começaram todos a cantar: •
“O cegonho e a cegonha”
•
“Abalei do Alentejo”
Quando acabam de cantar saiem de cena e recomeça o diálogo entre a avó e a neta.
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Maria Adelaide Bernardes e Maria Adelina Oliveira
3º CENA NETA – Ó avó, como é que se divertiam as pessoas no seu tempo? AVÓ – Sabes minha neta, cada tempo tem a sua beleza, o que é preciso é sabermos como aproveitá-la. Quando eu era nova não havia rádio nem televisão, mas nem por isso deixávamos de nos divertir. Quem tivesse uma sala grande emprestava-a; e bastava uma sanfona e uma guitarra e logo se fazia um bailarico. TIA – E ao som do gramofone do senhor Mamede? Ainda te lembras do que a gente dançava? Até tinha uma cantiga das freiras de Santa Clara. AVÓ – Tinha, mas eu não gosto dela. TIA – Também havia fados bonitos! Ainda me lembro de dois, mas não os sei cantar. Parece que os estou a ouvir…
Entra em cena a fadista que canta: •
“Azenha velheinha”
•
“Fado de Montemor-o-velho”
Sai de cena quando acaba de cantar.
AVÓ – Mais tarde aconteceram coisas muito importantes para nos divertirmos. Foi fundada a associação em 1930. TIA – E a formação da tuna, com os rapazes a tocar que era uma beleza. AVÓ – E os pavilhões? NETA –Pavilhões? AVÓ – Olha, era um sítio em redondo, ou quadrado, cercado com tábuas, todo enfeitado, para as pessoas dançarem, ao ar livre, no verão. TIA – Aqui em Gatões, até se faziam dois ao mesmo tempo! Havia tantos rapazes e raparigas que dava para encher os dois. Um fazia-se no Arneiro e outro no casal de S. João. AVÓ – Mas havia muitas rivalidades, por vezes até se insultavam. Ao pavilhão do arneiro chamavam-lhe o das cricas, e ao de S. João, o das Vacas, devido à feira que aí 146
Gatões, a Memória de Seu Povo
se realizava, todos os dias 8 de cada mês. TIA – Parece que estou a ouvir as músicas tão bonitas que o conjunto Tivoli de Montemor tocava. AVÓ – O que eu gostava muito, era de ir em marcha no dia de Quinta feira de Ascensão, com os outros rapazes e raparigas, até à fonte do coelho, merendar e apanhar a espiga. A tuna também ia, era uma alegria!
Entram em palco as raparigas e os rapazes com o traje de dia de festa, marchando e cantando. O cesto com a merenda no braço, acompanhados pela Tuna, cantam : •
“Marcha de Gatões”
•
“Ladeira de Gatões”
…saiem de cena a marchar e a cantar
4º CENA NETA – Ó avó, e onde é que faziam as compras? Iam ao super-mercado? AVÓ – (rindo-se) Não! Nesse tempo não havia Super Mercado, tínhamos lojas e as feiras. Levavámos 5 escudos e fazia-se um feirão. Dava para comprar uns tamancos, as sardinhas, uma esteira, tremoços e talvez ainda um bocado de tecido. Mas a fartura não era como nos dias de hoje. As dificuldades eram muitas. TIA – Pois, pois! Os homens que vendiam ferramentas andavam carregados até mais não, e ainda tinham que ter fôlego para apregoar os serrotes, martelos, cofos das vacas, correntes, cordas, era um nunca mais acabar. AVÓ – E os homens que vendiam “gesarol”, elástico, pentes, molas da roupa e sabonetes! TIA – E o cego que pedia esmola e vendia folhetos! NETA - O que eram os folhetos? AVÓ – Eram uns papéis grandes, cheios de versos, que falavam de desgraças de amor e de outras coisas. Depois as pessoas cantavam-nas com a música que muito bem lhes parecesse.
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Maria Adelaide Bernardes e Maria Adelina Oliveira
TIA – Depois mais tarde, começaram a aparecer nos folhetos as cantigas da rádio e assim já os catavam como devia ser…Era uma grande festa, até parece que estou a ver as feiras de antigamente.
Em cena aparecem duas mulheres a vender galinhas, coelhos, e vão oferecendo a quem passa. Várias pessoas vão desfilando como que procurando alguma coisa. Guarda roupa – as mulheres vestem saia comprida, lenço na cabeça ou pelas costas. O homem das ferragens, com os cofos na cabeça, as correntes pelas costas e o resto das coisas nos braços (a sua roupa é toda velha). Outro homem traz um tabuleiro à frente da barriga, pendurado ao pescoço; veste calça, camisola rota e boné. O cego traz vestido umas calças e um casaco velho, uma bengala na mão, e uma saca de pano a tiracol. O cego traz as bandas do casaco cheias de alfinetes e folhetos que apregoa. Entra no palco guiado por um moço, segurando num pau entre um e outro, utilizando ainda outro pau como se fosse uma bengala para se equilibrar. Depois entram os vendedores.
CEGO – (quando entra em palco vai a cantar) Trinta cegos/trinta moços/trinta mil acorcunbados/fizeram uma contradança/na terra dos aleijados! HOMEM das ferramentas – (apregoa a sua mercadoria) comprem martelo, serrotes, correntes, cofos para as vacas! HOMEM do elástico – (apregoando) é sabonetes elástico, pentes e gesarol. Mata toda a bicharada, mata pulgas percevejos, baratas, formigas, tudo mata! E se não gostarem, venham cá que eu recebo! CEGO – (apregoando) Comprem folhetos, foi uma grande desgraça! Maria José morreu de amores. Anabela encontrou três lobos! Um rapaz enganou uma rapariga! COMPREM!
Uma rapariga compra um folheto, e começa a ler. O cego sai de cena e o moço também, mas ainda se vai ouvindo ao longe a canção ao longe. Entretanto vai vender os folhetos para plateia…
RAPARIGA – Mas eu sei esta cantiga!! (começa a cantar) •
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“Anabela”
Gatões, a Memória de Seu Povo
5ª CENA NETA – E foi sempre assim da mesma maneira, avó? AVÓ – Não! A partir do momento em que se começou a desenvolver os campos de arroz, e com as fábricas de descasque, aqui em Gatões as coisas mudaram. Foi uma beleza, porque havia muito trabalho para as pessoas. Já não era preciso ir para a Borda-d’água. TIA – Sim, porque, primeiro, o arroz era só semeado, depois começou a ser semeado em viveiro e depois plantado noutro sítio. Era preciso muita gente a trabalhar! NETA – E a partir de que idade é que começavam a trabalhar nos campos? AVÓ – Mal saíam da escola lá iam com o tirone à cabeça. Chegava a haver ranchos com 100 pessoas ou mais, na Quinta de Foja. Depois, à sexta-feira, vinha o apontador fazer o preço. NETA – O Preço? TIA – Era o dinheiro que cada pessoa ganhava! Porque não era igual para todos. Havia um preço para os adultos e depois ia descendo consoante a idade e o tamanho da pessoa (ri-se). Parece que estou a ver, quando chegava o apontador, isto é que era fazer rolhões de arroz, ou de monda, para meter debaixo dos pés, assim pareciam maiores, e talvez podessem ganhar um preço mais alto. NETA – E não era demais para as crianças? AVÓ – Era demais, sim! Chegavam à noite muito cansadas. Trabalhavam desde que o sol nascia até ele se pôr. Mas ao menos, era uma alegria, cantava-se todo dia. Aqueles campos enchiam-se de cantigar. TIA – Até mesmo pelo caminho, não parávamos de brincar e de cantar. E gostávamos tanto de chatear as Gandarêzas, que passavam por aqui por Gatões! É que nós tínhamos a mania que éramos meninas “finas” em relação a elas; já vestíamos de uma maneira mais “moderna”…. AVÓ – Sabem uma coisa? Está-me a fazer tão bem recordar isto…melhor do que ir ao médico!
Entram as raparigas de Gatões em cena, com os tirones à cabeça como se fossem a caminho do campo. Entretanto entram as Gandarêzas. São várias Gandarêzas e mais um Gandarêz. 149
Maria Adelaide Bernardes e Maria Adelina Oliveira
São várias raparigas de Gatões e vários rapazes. Guarda- roupa – As Gandarêzas vestem saia comprida com bastante roda; algumas têm aventais bordados; as blusas são de naylon (larone) com as mangas tufadas. Usam um lenço atado no cimo da cabeça. Duas delas levam cestas redondas à cabeça.As outras levam chapéus de palha ou de pano. As raparigas de Gatões vestem saias curtas e justas. O avental é pequeno, com pouca roda. O lenço é atado atrás; xaile traçado ou pendurado no braço; tirone à cabeça com o rolo da roupa para vestir no trabalho feito com um saco, todas levam chapéu no braço. Todos os intervenientes vão descalços.
As raparigas de Gatões começam a fazer chacota, e uma delas diz: RAPARIGA – Ei lá Menel, já foste e vieste e inda aqui me guerras-te!! GANDARÊS – (chateado) Não tens vergonha de trazer uma saia tão curta!? Quase tens a …coisa…à mostra!! RAPARIGA – E vocês? Têm as saias tão compridas que dá para esconder um homem lá debaixo!!
As Gandarêzas saiem de cena e as de Gatões começam a cantar: •
“Mondadeiras”
•
“O lagarto”
•
“O caracol é vadio”
•
“A minha avó laró”
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Gatões, a Memória de Seu Povo
6º CENA NETA – Ai avó, como era bonito viver no seu tempo! AVÓ – (Rindo-se) É como eu já te disse, todos os tempos têm a sua beleza, é preciso é sabermos tirar partido coisas, enfrentarmos as situações com boa disposição…se não, temos o caldo entornado! NETA – E o trabalho no campo durava todo o ano? AVÓ – Os trabalhos do arroz não. Mas pouco tempo sobrava. Começava-se em Março a preparar os viveiros do arroz. Quando estava a meio crescimento, andava um rancho na arranca e outro a plantar o arroz. A seguir vinham as mondas, que duravam até fins de Julho. Dizíamos que acabava a safra. Depois, no último dia das mondas era a adiafa, que era a festa que se fazia para celebrar o último dia de trabalho. Despegava-se mais cedo, e as raparigas iam vestidas com a roupa de trabalho, até à Quinta de Foja, a cantar a Marcha, a dar vivas aos patrões…Depois de chegarmos à Quinta era cantar e dançar até às tantas, era uma alegria! Depois ficava-se algum tempo sem trabalho, mas nem sequer pensávamos nisso. TIA – Depois, em Setembro, começavam as ceifas; com muito trabalho nas eiras, as palhas , e por aí fora até chegar ao tempo da azeitona, isto já no mês do Natal. AVÓ – A pobreza em que vivíamos não nos impedia de sermos bastante alegres, era essa a nossa grande riqueza. Ai que saudades desses nossos tempos…parece que estou a ver o rancho de mondadeiras em marcha no dia da adiafa.
Termina a cena com as raparigas e rapazes entrando em palco, a cantarem, com o guião à frente (uma faia, que se apanhava de propósito para esse fim, enfeitada com as prendas para o capataz): •
“Ceifeiras”
•
“Nós somos ceifeiras”
•
“Marcha da Quinta de Foja”
FIM
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Maria Adelaide Bernardes e Maria Adelina Oliveira
Participantes na peça de teatro “Gatões, a memória do seu povo” (1993) Encenação: Adelina Oliveira e Adelaide Bernardes Cenografia: Graça Figueiredo Atores: Adelina Oliveira, Zélia Cardoso, Cátia Rodrigues, Alexandra Ramos, Filipa Ângelo, Patrícia Ângelo, Ofélia Canteiro, Rosália Santos, Alexandra Marques, Cátia Freitas, Marla Azul, Sónia Azambujo, Dorinda da Conceição, Sílvia Silva, Carlos Lobo, João Lobo, Pedro Neto, Pedro Marques, Luís Carlos Marques, Artur Jorge, João Santos, Fátima Aveiro, Maria José Santos, Nuno Pereira, Mário Pereira, Vitor José Zambujo, Tony Azambujo e Filipe Custódio.
PS: Esperando não me ter esquecido de ninguém, quero manifestar o meu agradecimento a todos aqueles que ajudaram a levar à cena, em 1993, esta peça de teatro. Muito obrigada!
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Gat玫es, a Mem贸ria de Seu Povo
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Correia Góis*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 155 - 168
O “Hospício”1 dos Carmelitas Descalços em Montemor
A historiografia montemorense cuida e confirma da existência na vila dos extintos conventos, mosteiros e oratórios (Nossa Senhora dos Anjos, Nossa Senhora de Campos e S. Luís) onde viveram e morreram frades e freiras em obediência à Regra de S. Agostinho de Hipona e S. Francisco de Assis.2 Porém, o “arqueológico” e devido a uma morosa e pertinente investigação revela a existência na vila de frades carmelitas, denominados de “Carmelitas Descalços” um ramo advindo da obra de S. Elias no monte Carmelo e cujas vivências breves são bem tratadas por José Carlos Vechina.3 (anexo 1). A documentação disponível informa o espírito e funcionalidade carmelitana estar em Montemor nos finais do Séc. XVI e primórdios do XVII. No ano de 1604, os frades do Colégio de Coimbra, Fr. José de Jesus Maria e Fr. José de S. João estão em Montemor a pregar eloquentes sermões, a exercer um conjunto de práticas espirituais passíveis de apaziguar “bandos e ódios” e busca do bem das Almas. A informação foi lavrada em 1657 por Fr. Belchior de Santa Ana na “Crónica dos Carmelitas Descalços” (anexo 2). * - Correia Góis (Licenciado em História de Arte e Graduado em Arte do Renascimento pela Universidade de Coimbra). 1 - O Hospício é uma casa religiosa destinada à hospedagem de viajantes e peregrinos, por vezes com carácter de permanência de pobres, órfãos, abandonados, velhos, doentes incuráveis, etc., etc. a funcionarem como albergaria, hospital, albergue ou até mercearia. Os conventos e mosteiros orientais pautados pela Regra de S. Bento, S. Parcónio, S. Basílio, S. Bernardo e outros deviam deter um hospício de forma a substituir o lar longínquo do viandante e neles teria de haver cama, mesa, roupa, médico, enfermagem, etc., absolutamente gratuitos. Em Portugal o Hospício deu origem aos asilos de inválidos, órfãos, entrevados, cegos, militares, surdos-mudos, etc., etc.. 2 - Alguns cronistas opinam ter existido um convento beneditino (Regra de S. Bento) em sítio próximo da igreja de S. Martinho. 3 - Dicionário de História Religiosa de Portugal, Circulo de Leitores, 2000.
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Correia Góis
Nos primórdios do Séc. XVII os Carmelitas Fr. José de Jesus Maria e Fr. José de S. João de parceria com outros deslocam-se frequentemente a Montemor desprovidos de modéstia, desprezo do temporal, humildes e afáveis a laborar na plenitude das propostas de S. Elias de tal forma que a Câmara local em sessão de 16 de Abril de 1604 tomou a decisão de enviar uma carta ao Prior Geral da Ordem em Lisboa a solicitar edificação de um convento carmelitano na vila e para o feito podiam ceder “casas arruinadas”4 construídas pelo infante D. Pedro (Senhor de Montemor) e disponibilizar alguns proventos (anexo 2). Assinam esta carta Feliciano Soares5 (vereador mais velho), Simão Travassos, Pedro Gomes de Abreu Diogo Faria de Novais. Esta carta e outras foi levada ao Capítulo Geral pelo Reitor do Colégio de Coimbra no ano de 1605. Os congregados analisaram as razões e propostas da Câmara; mas, entenderam não ser momento oportuno, urgia dotar e aperfeiçoar convenientemente as casas em construção (Évora, Bussaco, Lisboa, etc.). Adiada a instalação de uma casa de Carmelitas em Montemor, o movimento não foi abandonado e de tal forma que em 1636 noticia-se a presença de um frade carmelita provindo do convento de Santa Cruz do Bussaco ao aboletar-se em casa de amigos para cuidar de “cezões” (anexo 3).6 A missão amplia-se de forma a motivar o ingresso na Ordem do Carmo dos jovens das melhores famílias montemorenses, algo em concorrência com a “praxis” de no seio de cada família nobre existir pelo menos um padre a funcionar como capelão da Capela ou Morgado. É nesta ambiência que Domingos da Cunha de Eça (nascido em 1649), filho de Domingos Correia da Fonseca (capitão mor da vila) e D. Maria da Fonseca ingressa no convento carmelita de Aveiro a tomar o nome de Fr. Domingos de S. Antão onde morreu de proveta idade. Os carmelitas, embora não sediados em Montemor mantiveram a presença e o espírito do Carmelo e os montemorenses não abandonaram a ideia de uma dia deter na vila um convento, um mosteiro ou simplesmente um hospício da ordem do Carmo. O “querer” materializou-se em meados do Séc. XIX, mais concretamente a partir de
4 - Localizar as casas edificadas pelo infante D. Pedro no Séc. XXI é algo complicado dado não ser prática em passado remoto aquando da recuperação de imóveis usar memórias descritivas. O topónimo “Largo do Paço” funciona como indicador residencial do “Paço do Senhor” da vila. Este indicador acrescido das estruturas e envolvências do actual edifício que serve de residência de estudantes e Federação Portuguesa de Canoagem poder ser o local das então casas edificadas pelo infante, logo o Paço, residência do Senhor e Adminstradores da vila. 5 - Feliciano Soares, é filho de Tristão Soares, (cavaleiro do hábito de S. Tiago, almoxarife, juís dos direitos reais, ouvidor dos reguengos e vereador da Câmara de 1570 a 1581) e D. Filipa de Pina, filha de Álvaro de Pina, o trovão e D. Leonor Mascarenhas de Sá. Feliciano Soares, casou em Azeitão com D. Brites Ferreira, filha de Pedro Nunes Ferreira, escrivão da Câmara dos Duques de Aveiro. 6 - A busca da região por frades carmelitas para cura das maleitas observa-se em 1796 (6 de Fevereiro) onde Fr. José de S. Bruno pede licença ao Bispo de Coimbra para “pregar e confessar” em Abrunheira. O vigário de Reveles, José Dias da Silva, informou “...o suplicante assiste no lugar de Abrunheira há mais de sete mezes com licença do seu Definitório illimitado ao arbítrio do Médico, por cauza de moléstia chrónica, que padesse...”.
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O “Hospício” dos Carmelitas Descalços em Montemor
1758 (20 de Agosto) quando os padres carmelitas residentes no hospício da Senhora do Carmo na vila de Montemor pedem ao Bispo de Coimbra7 licença para “edificar um Oratório privativo para poder celebrar o Santo sacrifício da missa sem andarem pelas Parochias e igr.as da Vª por lamas e chuvas...”. A prova do afirmado reside na consulta, leitura, transcrição e análise de dois documentos oitocentistas reservados nos Arquivos da Universidade de Coimbra (Cabido e Câmara Eclesiástica de Coimbra) tombados após longos meses de busca, mas passíveis de confirmar teses, animar investigador, fazer e maximizar História de Montemor.8 A 20 de Agosto de 1763, os padres Carmelitas Descalços do Hospício de Montemor enviam uma petição à Câmara Eclesiástica de Coimbra a solicitar autorização para edificar capela, manifestando existir demanda com frades franciscanos de S. Luís e sentenças do Juís de Fora, Relação do Porto e Caza da Suplicação de Lisboa. Os termos da petição são os seguintes:
Brasão dos Carmelitas Descalços (Bussaco)
“...Ex.mo e R.mo Sr. = Dizem os Padres Carmelitas Descalços do Hospício de Monte mor o velho, q. eles padessem hum grd.e detrimento em não terem Capela no mesmo, em q. celebrem principalm.te no tempo de Inverno, emq. lhe he percizo andarem p.las Parochias e mais Igrejas da dª Vª por lamas e chuvas, alem do pouco recolhim.to q. lhe resulta das ditas sahidas, o q. não tem pertendido evitar em rezao dos Padres do Oratório de S. Luís da Ordem de S. Francisco da dª Vª, os terem demandado sobre a edificação, e assistência dos suplicantes na dª Vª, cujo pleito se acha decidido finalm.te, a favor dos suplicantes como se faz certo da certidão junta, e porq. querem evitar o referido dano com fazerem Capela no seu Hospício para nela celebrarem, o q. não podem fazer sem licença. P. a V. Exª seja servido concederlhe licença pª poderem erigir Capela no dº Hospício, e nele dizerem missa. E. R. M....”.
7 - Ao tempo é bispo de Coimbra. D. Miguel de Anunciação, Cónego Regrante de S. Agostinho de Santa Cruz (Coimbra). 8 - AUC – Instituições Pias, XIII (27) e Câmara Eclesiástica de Coimbra, IIID-1-6-2-8 (doc. 15)
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Correia Góis
Petição (manuscrito) dos padres Carmelitas Descalços a solicitarem ao Bispo de Coimbra licença para edificar Capela no Hospício do Carmo
A demanda com os franciscanos, a sentença do Juíz de Fora (24 de Dezembro de 1760) confirmação da Relação do Porto (29 de Agosto de 1761), reconfirmação da Caza da Suplicação a 4 de Fevereiro de 1763 e petição dos Padres Carmelitas exigia 158
O “Hospício” dos Carmelitas Descalços em Montemor
certidão de provas por parte do Promotor da Câmara Eclesiástica, Manuel Rodrigues Teixeira. Para o feito solicitou ao Juís de Fora e vereador mais velho de Montemor, Egídio de Pina Melo a mandasse passar ao tabalião Bernardo de Sousa. A 30 de Julho, Bernardo de Sousa certificou o seguinte: “...em comprimento do despacho supra que he de Egídio de Pina de Mello, Fidalgo da Caza Real e veriador da Câmara desta villa de Montemor o velho e nella e seo termo juís de fora pela ordenasão e porto fee eu Bernardo de Souza tabalião do Publico judicial e notas que sirvo nesta villa e seo termo em como para efeito de passar a prezente Certidão revi as sentensas de que pertilhão retro faz menão e em meo poder e Cartório se achao e na qual veio da Rellação do Porto nesta se acha emcluida a deste juízo que he da forma seguinte // vistos aquelles autos Pertenssão justificativa do Síndico dos Religiosos do Hospício de Sam Luís da ordem de São Francisco comtestando os reos justificados mais provas e documentos juntos e alega-se por parte dos justificantes no mes de Abril de mil sete centos e cincoenta e oito emtrarão a consertar as cazas que herao do Doutor Antonio Cardozo Seara e que depois do dito conserto entrarão a dizer que era Hospício vivendo nelles com hum leigo chamado Francisco prometem nove sermois que haviao definidos a dia de Nossa Senhora do Carmo cuja imagem celebrao na igreja da Mizericórdia daquella vila no entanto que não faziao Capella no dito Hospício que já regullão por tal defendendose os reos justificados com a matéria de sua contestação o que tudo visto com o mais dos autos e disposiçaõ de direito em tal cazo como por parte dos justificantes senão alega nem prova falta algum pelo qual se fasa serta a edificação do hospício e menos terem posse do empedimento sem (...) edificações por renda de facturas requesitos essenciais para poder ter lugar o porsedimento e interdicto intentado na dita petissão folhas duas julgava carecer doação o justificante e absolvia os justificados e paga as custas os justificantes em que o condenava. Monte mor vinte e coatro de Dezembro de mil e sete centos e secenta //Jozé de Mello Coutinho Garrido. E não se continha mais em dita sentença deste juízo que sendo esta apelada pelos justificantes para a Rellassão do Porto neste se porferio a sentensa do theor seguinte: = Bem julgado foi pelo juíz de fora de Monte mor em julgar caresia o apelante do interdito intentado confirmo sua sentença por alguns dos seus fundamentos e o mais dos autos e cometo ao apelante nas custas deles. Porto vinte e nove de Agosto de mil sete centos e secenta e hum// Sáa, Abreu, Doutor Sequeira. E não se continha mais em a dita sentença da Relassão Corte cidade do Porto, a qual hindo para a Caza da Suplicassão da Corte da cidade de Lisboa nesta se conferio a sentença do theor seguinte: = Bem julgado foi pelos Dezembargadores dos Aggravos da Relassão do Porto em julgarem carecer aos apelantes sua sentença por seus fundamentos e o mais dos autos pague o agravante as culpas. Lisboa coatro de Fevereiro de mil sete centos e secenta e tres // Mattos, Borrea, Doutor Sequeira. E não se continha mais em a dita sentença de confirmassão pedida com as mais das próprias sentensas que ficao em meo cartório a que me reporto e esta conferi e consertei com as próprias e com outro oficial de justiça comigo abaixo asignado em fee de que me asigno em Publico e razo. Montemor o velho trinta de Julho de mil sete centos e secenta e tres. Bernardo de Souza // Jozé da Silva Cunha (tabaliam)...”. 159
Correia Góis
Elaborados os autos na Câmara Eclesiástica pelo padre Jerónimo Saraiva dos Santos (escrivão da Câmara) e antes de serem presentes ao Senhor Bispo para concluzão, mereceram análise e despacho do Promotor, Manuel Rodrigues Teixeira nos seguintes termos: “...pertendem os R.Rd.os os Supp.es erigir hua Cappª no seo Hospício da Vª de Monte mor o vº pª nella celebrarem os off.os Divinos e evitarem sahir fora do dº às igr.as da mesma Vª a dizerem missa, calcando lama e experimentando outras incalamid.es principalm.te no tempo de inverno. Porém pª haver de se deferir a sua suplica hé percizo q. declarem se a dª Cappª há de ser publica com porta pª a rua ou p.ar, e sendo publica com porta pª a rua declararão o lugar, aonde a pertendem edificar pª se mandar abalizar e examinar se fica em sítio desente...”.
A 27 de Outubro de 1763 o Provizor Eclesiástico, Miguel da Silva Oliveira, depois de ouvir os padres carmelitas informa o seguinte: “...após ouvir os padres suplicantes, estes declararam que o Oratório, que querem erigir hade ser particular, sem sino, nem porta para a rua em húa caza desente que não hade servir para outro algum ministério...”.
Em 1764, os frades carmelitas perante a morosidade da licença, insistem com nova petição (20 de Março de 1764) o que levou o Promotor, Manuel Rodrigues Teixeira por comissão (anexo 4) a solicitar informação sobre os apontamentos e sítio da capela em referencia. A 7 de Abril de 1764, o vigário de S. Martinho, António Ferrão depois de analisar os apontamentos e visita o Hospícia afirma o seguinte: “...apontamentos da Cappª q. se pertende fazer no Hospício do Carmo da Vª de M.or o Vº. Pertendesse fazer a dª Cappª em húa das cazas do dº Hospício q. fica no olival da rua publica q. he hua das principais da terra chamada a rua direita de sima na qual esta a parede que caie pª a mesma rua em que se ha de fazer a porta principal e publica da mesma Cappª q. fica no seu comprimento com vinte e sette palmos e na largura vinte q. deve ser repartida com hú arco pª formar a Cappª mor e forrada e bem rebucada e com o altar desente e por baixo solhada e com os mais paramentos nr.os e com hú confissionario em cada hua das ilhargas do arco...”. “...Fui ao Hospício aonde se pertende fazer a Capella e ocullarmente ví o sítio q. se tem destinado pª a mesma, e fazendose a dª Cappella na forma dos apontamentos, que se me aprezentarão, e remetto com esta, que vai por por mim asignada: acho que a referida Cappella fica m.to desente, e com bast.e area perfeição, e a sua porta principal pª a rua publica, de que nos mesmos apontam.tos se fas menção e alem de asim o exeminar pessoalm.te me informei também com pessoas devottas, e intellig.tes, que concordam em tudo o q. tenho informado a V. Exª e q. affirmei in verbo sacerdotis e v.ta do q. V. Exª mandará oq. for servido. Montemor o Velho de Abril, 7 de 1764. O mais Rever.te e humilde súbdito, o vig.rio António Ferrão...”.
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O “Hospício” dos Carmelitas Descalços em Montemor
Perante os apontamentos e nota da visita do padre António Ferrão, os autos entraram na Câmara Eclesiástica a 12 de Abril de 1764 e dois dias depois (14) após despacho favorável do Bispo de Coimbra é passado o Alvará “de licença pª erecção da Capella no sítio e na forma, q. se declara nos apontam.tos pª depois de feita, recomendo aos R.dos Supl. tes pª se mandar benzer sem o q. não poderá celebrar-se nella o S.to Sacrifício da Missa...”. O tratamento acima descrito permite inferir e provar a presença e funcionalidade dos Carmelitas Descalços na vila de Montemor-o-Velho, contudo os vestígios “in loco” são inexistentes. As tentativas exaustivas para localizar a casa/Hospício “nos olivais numa das ruas principais da vila chamada direita de sima” foram infrutíferas (até ao momento). O certo é que o Hospício do Carmo ficava na rua que liga o Castelo ao Outeiro. As pesquisas continuam, as ajudas agradecem-se.
Anexo 1 – Carmelitas Descalços9 “...No século XII os cruzados instauraram na Síria e na Palestina o Reino Latino de Jerusalém, formado por pequenos territórios subordinados ao rei de Jerusalém. Os muçulmanos encontraram a salvação na fuga e os cruzados fundaram pequenos territórios dependentes da Igreja latina. Em vários lugares da Palestina instalaram-se pequenos grupos de pessoas que queriam levar uma vida austera. O mesmo aconteceu no monte Carmelo, onde se reuniu um pequeno grupo que pretendia viver o espírito de Elias. Passado algum tempo, estes eremitas do monte Carmelo decidiram organizar-se juridicamente. Quando o Carmelo estava ainda sob jurisdição da diocese de Cesareia, os eremitas dirigiram-se ao legado papal e patriarca de Jerusalém, Alberto de Vercelli, residente em Acre, para que lhes desse uma regra, como forma de vida. Entre 1206 e 1214, data da sua morte, escreveu a regra pela qual se deviam orientar os eremitas do Carmelo, esta regra foi dirigida já ao superior, de nome Brocardo. Em 1215, o Concílio de Latrão procurou estabelecer uma ordem na proliferação dos institutos religiosos. Os futuros fundadores deviam adoptar uma das regras já existentes canonicamente aprovadas. Os Carmelitas tiveram alguma dificuldade em ver aprovada a sua regra. Em 1226 conseguiram a confirmação pelo papa Honório III, na carta Ut vivendi normam. Desta carta podemos deduzir que os Carmelitas insistiam afirmar que a sua regra era anterior ao concílio. Três anos mais tarde, Gregório IX confirmou a aprovação do seu antecessor reconhecendo a 9 - VECHINA, José Carlos, in Dicionário de História Religiosa de Portugal, Circulo de Leitores, 2000, pp.297300v
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legislação de Alberto como <<regra>>. No dia 9 de Abril de 1229, o mesmo papa colocou a ermida do Carmelo sob a protecção da Sé de Roma, permitindo que se pudesse celebrar o culto divino a portas fechadas, em tempo de perseguições. Não se pode estabelecer com certeza o tempo em que o primeiro prior, Brocardo, exerceu o seu cargo, mas o seu sucessor terá sido Bertoldo. Este, juntamente com muitos irmãos, sofreu a morte à mão dos infiéis, sendo enterrado no Carmelo. Depois que começaram a surgir as perseguições dos muçulmanos, muitos eremitas pensaram deixar a Palestina e regressar às suas terras de origem. O papa Inocêncio IV escrevia: “ As incursões dos pagãos obrigaram aos nossos queridos filhos, os eremitas do monte Carmelo, não sem grande aflição de espírito da sua parte, a deixar aquele lugar e passar a terras de cá do mar (Paganorum incursus)”. Por volta do ano de 1238 os Carmelitas começaram a emigrar para a Europa e a primeira fundação, fora da Palestina, surgiu no deserto de Fortamie em Chipre, seguindo-se Messina, na Sicília, Aylesford e Hulne na Inglaterra e Les Aygalades, próximo de Marselha. Com a expansão da ordem no Ocidente, continuava também a devoção a Nossa Senhora sob a invocação do Carmo devido à raíz do monte Carmelo. Por isso, eram conhecidos como Irmãos de Nossa Senhora do Monte Carmelo. Na Europa, os Carmelitas pretendiam seguir à vida eremita que viviam no monte Carmelo, mas, devido às dificuldades desse modo de viver, pediram ao papa a adaptação da sua regra às novas condições de vida. Um documento de 1421 coloca a chegada dos primeiros Carmelitas a Portugal, vindos de Malta, no ano de 1251, para Moura. Durante mais de um século este convento foi único, chegando a ter uns 60 religiosos, até que surgiu o Convento do Carmo de Lisboa fundado pelo imortal Beato Nuno Álvares Pereira, em 1397, onde viveu com o nome de Nuno de Santa Maria. No dia 1 de Outubro de 1247, na carta Quae honorem conditoris, Inocêncio IV publicou a regra carmelita com as modificações introduzidas. Estas modificações foram as seguintes: as fundações não seriam necessariamente nos desertos; as refeições eram tomadas em comum; era obrigatória da recitação do ofício divino (antes só se recitavam os salmos); o tempo de silêncio rigoroso era reduzido desde completas até à hora de prima; a abstinência era mitigada a favor dos religiosos itinerantes e mendicantes. A partir desta adaptação os Carmelitas assumiram manifestamente a sua dimensão de vida activa. Esta modificação realizou-se no meio de grandes dificuldades; a ordem estava a passar por uma grave crise de identidade, ao ponto de alguns elementos, de relevo não se sentirem identificados com este novo estilo de vida, acabando por abandonar a ordem. Foi neste contexto de indefinição e de procura de identificação que surgiu São Simão Stock, geral da ordem, recorrendo à Virgem do Carmo. Segundo a tradição, teve um aviso em que Ela lhe entregava o escapulário como sinal de protecção não só para a ordem, mas também para todos aqueles que o usassem. Com o decorrer da história o papa Sisto IV concedeu a cada uma das quatro ordens mendicantes uma grande bula, chamada Maré Magnum, que reunia e confirmava todos os privilégios anteriores e concedia muitos mais. Com estes privilégios, o fervor religioso entrou em decadência; a negligência na observância religiosa acentuou-se no século XV. O enfraquecimento do espírito da ordem foi evidente em três aspectos fundamentais: a vida de oração, a prática da pobreza evangélica e a observância da vida comum. A vida de oração 162
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tornou-se muito difícil, porque havia excessivas visitas que entravam facilmente nos conventos, onde comiam e bebiam nos dormitórios e celas dos religiosos, com grande algazarra e alarido, importunando o retiro e ambiente propícios à vida de oração. Muitos religiosos saíam de manhã cedo para passear e vaguear pela cidade. Do meio desta relaxação surgiu a voz profética de João Soreth, geral da ordem e reformador do século XV. No entanto, esta reforma desejada por João Soreth não produziu os frutos pretendidos, porque em Fevereiro de 1432 o papa Eugénio IV introduziu na ordem a regra mitigada com a bula Romani Pontificis. Esta mitigação veio num momento em que a vida espiritual da ordem estava muito baixa. João Soreth constatava, com desgosto, que havia uma autêntica necessidade de dispensa, porque uma doença geral invadia não só o corpo, mas o espírito; a caridade de muitos tinha arrefecido. Por toda a parte faziam com que os religiosos renovassem os votos e recorressem a novos estatutos. Neste tempo, os conventos passavam por momentos difíceis devido ao número excessivo de religiosos e à consequente miséria. Decorrentes disso, os noviços passavam as noites em casa dos pais ou familiares onde poderiam encontrar alguma coisa para matar a fome. Algumas províncias não foram ao capítulo geral de 1539, entre elas a província portuguesa, por causa dos tempos turbulentos da reforma protestante...”.
Anexo 2 – Crónicas Carmelitas Descalços em Montemor-o-Velho10 “...O admirável exemplo de virtude, que o nosso Colégio de Coimbra resplandecia, estendeo com a admiração também a deuação de todos os lugares comarcãos. E como a virtude he de ser tam amauel, procurarão todos levar a pregar ás suas igrejas aquella gente do Ceo, para que com seu feruor, assi do púlpito, como no confissionario despertasse aos fieis da tibieza, com que acodem ás cousas da saluação. Hião os Padres mais vezes á Villa de Montemor o Velho, que como na grandeza excede aos mais pouos circunuisinhos a Coimbra (da qual dista quatro legoas) na deuoção aos nossos Religiosos fazia a todos notauel ventagem, acompanhandoa com largas esmollas e nella estiverao por uavrias vezes os Padres Fr. Jozeph de Jesus Maria, mui zelozo de ganhar almas para Deos, confessando; e Fr. Joseph de S. João insigne Pregador: os quaes estando a terra diuidida em bandos e ódios de graue prejuízo; tanto trabalharão em os extinguir, que nenhum uisinho ficou mal com outros; sendo a maior parte para conseguir este bem, e outros do serviço de Deos os sermões, e praticas espirituaes, que fazia o Padre Fr. Joseph de S. João, assi em publico na igreja, como em particular na connversação de cada hora, porque era tal sua graça, eloquência, 10 - Fr. Belchior de Santa Ana, Crónica dos Carmelitas Descalços, 1657, Tomo 1, livro 2º, Cap. XV, pag. 431-433
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força nas palauras, e feruor de espiritu, que não pretendia persuadir cousa algúa para bem das almas, que não persuadisse facilmente, montando muito para isto o respeito reverencial, que todos lhe tinhao, pollo grande exemplo de sua vida. Entrarão estes, e outros Padres naquella villa com tão bom pé, e fizerãose com sua modéstia, desprezo do temporal, trato humilde, e affauel, tam grande lugar nos coraçoens de todos, que a Câmara, desejando ter hum conuento nosso, offereceo á Religião húa fundação e pedio para ella Religiozos ao Capítulo geral, celebrado neste anno, escreuendo lhe a carta seguinte, que hoje se conserua no archiuo do Convento de Lisboa... ...Prégar, como se sabe, o mundo hoje hum raro exemplo de santidade, nascido de illustres obras, em que as quaes os Religiosos dessa Congregação se exercitao, nos faz quasi invejosos, pois somos parte delle, a procurallos, tendo em mais a falta sua, que o atrevimento nosso. E assim fiados nelle a publicamos a vossa Paternidade, esperando bastar, posto que o mais faltasse, para sem receo de desejar consedernolo. A esta Villa este anno vierao dous Frades do Collegio da cidade de Coimbra, na qual fizerao obras tão aceites a Deos, e a ella, que ditas bastava bem para se nos ter o mal, o poder a lembrança dellas. Da qual obrigados tratamos de com seu parecer fazer nella hum Convento, mostrandolhe para isso todos os sítios, em que melhor se pudesse fazer e os Religiosos viver a seu modo. Entre os quaes forao húas casas grandes, já com algúas ruínas, feitas pello infante D. Pedro, cujo Senhorio he hoje o Duque Dom Álvaro de Lencastre, e devem valer com o sítio dez mil cruzados, e mais. A traça sua hé, segundo á vista se julga, mais para aposento de Religiosos, que morada de Seculares. Nellas no que hoje são se podem recolher os que V. P., lhe parecer, parecendolhe, ser justo, o que a justiça nos não nega, para assim como fauor de V. P. e seu as pedimos ao Duque, pedindolhe juntamente seja desta obra padroeiro. E quando o não aceitar como confiamos, pello que nisso interessa, ficará á côta desta Villa, e a Câmara della, dará em dez annos ao Convento, em cada hum anno cem cruzados, que com as muitas esmollas, que esta villa costuma fazer, com que se faz illustres, devem bastar para se acabar de todo muito cedo. E porque havia obra desta qualidade, merece bem igual satisfação, a esperamos, obrigando nos com o fauor divino, de que alem de sempre sobejar a sustentação aos Religiosos, o Ceo se alegre com as muitas almas, que terá por meio della. Feita em Câmara de Montemor a 16. de Abril de 1604 . Feliciano Soares; Simão Travaços; Pêro Gomes de Abreu; Diogo faria Nouais... Esta carta mandou a Capítulo geral, o Padre Prior de Lisboa, acompanhada de outras do Reytor do Colégio de Coimbra, e de outros Prelados da Província, em q. todos pediao a licêça, para se fazer aquella fundação, alegando as excelêtes qualidades da villa, q. a queriao em nenhúa inferior ás mais do Reino, ainda q. em numero de visinhos he menor, q. as mayores della, porq. não passa de setecêtas casas. Estimarão os nossos Padres côgregados em Capítulo, como era razão, o bom nome, e credito, q. naquella illustre villa tinha a ordem e o affecto, com que pediao os vreadores e Câmara della, Religiosos para fundarem; mas pareceolhes, q. convuinha por então dilatadas o despacho da petição para tempo, em que a província, tendo acabado as casas, q. estavao principiadas, pudesse dar princípio, e perfeiçoar aquella que se lhe pedia...”.
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O “Hospício” dos Carmelitas Descalços em Montemor
Capa de rosto da crónica dos Carmelitas Descalços por Fr. Belchior de Santa Ana
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Anexo 3 – 1636, Crónica de um caso em Montemor-o-Velho11 “...Na villa de Montemor o Velho se curava certo religioso de humas cezoens em casa de hum amigo seu, que melhor curtira na sua Religiam, e cella, assistido, e servido de seus irmaons; antevendo como devia, a contingência de algú perigo mortal, de mayor risco fora da casa. Ao tal enfermo pelo século, pela Ordem, e pelo posto q. do presente occupava pessoa de respeytosa authoridade visitavam quotodianamente os principaes da terra, aliviando-o com jogos; e conuersações seculares. Succedeu travarem-se huma tarde a prática acerca dos Carmelitas Descalços, que a mesma villa, sem effeyto, havia diligenciado levar para sua companhia e fazerlhes alli caso como dissemos em outro lugar, e mais por extenso escreve o P. Frey Belchior de S. Anna. Explicarão-se os seculares no apreço q. faziam dos nossos Religiosos assim pela grande reformação que nelles viam, como por passarem com a continuada penitencia de não comerem carne em toda a vida, ou querendo mostrar-se gracioso, parte de que sobre outras se jactanciava, começou de motejar aos circunstantes de singelos; persuadindo-os a que não crescem (...) pois a elles lhes constava, que os Padres fora da casa usavam de alimentos de carne e com voracidade tanto mayor, quanto mais apertadamente viviam privados della nos Conventos. Replicaram os deffenssores, que sabiam de muytos, como na verdade passava quanto disiam; sinalamente, no de Bussaco, onde era tal o rigor, e mortificação de seus moradores, que nem usavam de peyxe fresco, passando muytos dias cõ frutas verdes, ou secas, segundo o tempo lhes permittia. Proseguio e enfermo, que não fossem de tanta sinceridade, pois nas mattas do Bussaco se creava muyta caça, que não sahia para fora, e lá se consumia dentro, onde também ella fora Ermitam, pelo proveyto de os acompanhar na mesa. Escandalizados os ouvintes das ímpias proposiçoens do enfermo instaram em reduzillo á verdade referindo-lhe que muytos delles tinham na religiam parentes, que agasalhando-se algumas veses em suas casas, e podendo nellas, confiadamente tomar licença de comer carne, de nenhum haviam notado, que se desmanda-se da sua Regra. Que o mesmo acharia na voz dos povos circunvisinhos, pois discorrendo os Padres aquelles campos no exercício de pedir esmolla, não ouvira de pessoa alguma que os visse desviar desta sua obrigação. Disputou-se o pôto de parte com razoens e vozes; mas tornando a Deos na mayor força do argumento pela hora de seus servos, quando o enfermo trabalhava mais em trazer á sua opiniam, ou delírio aos circunstantes, notaram elles, que enorme e repentinamente se lhe hia a boca pondo á orelha. Aterrorisados de que fosse algum accidente apopletico, fizeram chamar o Médico á pressa; mas entêdendo delle não ser o succeso natural o atribuíram a castigo de Deos. Como o ferro faça conhecer o erro, e a pena a culpa; cahindo o enfermo na causa do effeyto, e doido da consciência, pedia a Deos perdam com grandes
11 - Tomo 2, livro sexto, Capítulo II, pp. 572-576
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indícios de arrependimento. No mesmo ponto em que se começou a retratar da sua demasiada, e dannosa prosia, lhe foy a boca tornando a seu lugar pouco a pouco, para que desembaraçadamente podesse restituir o credito e honra aos prejudicados. Confessou depois em presença dos mesmos ouvintes, que allucinado da payxam rompera naquelle excesso, cujo escandolo lhe perdoassem pelo amor de Deos; pois de coraçam lhe pezava, de injustamente haver denigrado á clara fama de huma tão authorisada Religiam observantissima do seu santo instituto como sempre confessaria...”.
Anexo 4 – Comissão do Promotor Manuel Rodrigues Teixeira12 “...faço saber que Sua Excelência foy aprezentada a petição do theor seguinte = Excellentíssimo e Reverendíssimo Senhor – Dizem os Padres do Hospício do Carmo de Montemor o Velho deste Bispado que elles suplicantes padecem grandes inconvenientes, e mais quotidianamente celebrar o santo sacrifício da missa fora do dito Hospício e porquanto V. S. Excelência Reverendíssima lhe pode conceder licensa para erigirem hum Oratório publico em que posam celebrar e evitar os inconvenientes supra ditos. Pedem a Vossa Excelência Reverendíssima lhe conceda dita graça. E recebera mercê. E quando se continha na dita petição que Sua Excelência mandar autuar na Câmara e dar vista ao Reverendo Doutor Promotor – este deu a resposta seguinte = Ex.mo e R.mo Snr. – Para se deferir ao requerimento da petição para informar o Reverendo Parocho com juramento do contheudo nella e se he desente o sítio em que a Cappella se pertende edificar, ficando com porta para a rua publica e a vista da informaçam se deferir o que tiver lugar. Porém, sempre Vossa Excelência detreminará o que for mais justo. Promotor Miguel da Sylva. Segundo se continha na dita resposta com a qual proferio o despacho do theor seguinte. Pasese ordem na forma que requer o Reverendo Doutor Promotor na sua resposta = lugar (+) de hum rubricado Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor – Dom Miguel, Bispo Conde = Porbem do que se passou a presente pella qual lhe mando observe o risco o que se contem na resposta do Reverendo Doutor Dezembargador Promotor e do que achar por pesoas de inteira fee e credito e vistoria pela ocular e dar nas costas desta sua individua informação que em carta fixada remeterá ao Reverendo escrivão da Camara. Dada em Coimbra sob meu signal, aos vinte e três de Março de 1764 e eu P. Jerónimo Saraiva dos Santos, escrivão da Câmara Eclesiástica a sobscrevi. //M.el Roiz Teix.ra”
12 - Câmara Eclesiástica de Coimbra, IIID-1-6-2-8 (doc.15)
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Carta da C창mara de Montemor-o-Velho de 16 de Abril de 1604
Sandra Lopes* e Correia Góis**
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 169 - 177
As “Memórias” Setecentistas de Montemor-o-Velho e seu concelho IV
Este trabalho pretende dar continuidade à publicação das “Memórias Paroquiais de 1758”, também conhecidas por Dicionário Geográfico, promovidas por Sebastião José de Carvalho e Melo (Marquês de Pombal), ministro de D. José I a 18 de Janeiro de 1758, algum tempo depois do terramoto de 1755. Neste sentido, disponibiliza-se agora a transcrição respeitante às freguesias de Reveles, Verride e Vila Nova da Barca. Os critérios de transcrição adoptados foram apresentados no nº 12 da revista Monte Mayor, p. 60.
[fl. 419] “Revelles1 Rio Torto [f ]eita em Gouvea S. Romão Senhor Revelles fica na Provincea da Beira pertençe ao Bispado de Coimbra e á sua Comarca; he termo de Montemor o Velho por isso é freguezia de Nosa Senhora da Expectação cita no mesmo lugar. A Mitra de Coimbra he a donataria e no seo dizer que sempre o era e ainda ao prezente o he. * - Sandra Lopes (Técnica Superior de Arquivo - A.M.M.V.) ** - Correia Góis (Licenciado em História de Arte e Graduado em Arte do Renascimento pela Universidade de Coimbra). 1 - Arquivos Nacionais da Torre do Tombo, Reveles, Memórias Paroquiais, 1758 – Vol. 31, nº 74, fls. 419 a 422.
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Tem esta terra e freguezia duzentos e setenta e seis vizinhos novecentos e vinte pesoas. Esta cituada em hum monte e della se descobre a villa de Montemor o Velho que dista desta terra hūa legua; a Vinha da Rainha dista hūa legua; Lavos que dista duas leguas; a Figueira que dista duas legoas e meya; o Payam que dista legoa e meya; o lugar de Barra freguezia do Payam que dista hua legoa; Verride que dista hum quarto de legoa; Villa Nova da Barca que dista meya legoa; Villa Nova de Anssos que dista duas legoas. Nam he termo mas sim pertençe ao termo de Montemor o Velho como asima digo no primeiro interrogatório. A Parochia esta cita no mesmo lugar de Revelles na mayor […]2nencia do monte e tem mais o lugar do Val Grande; Val Pequeno; metade do lugar de Abrunheira porque metade deste lugar pertençe a freguezia de Verride com quem comfina. Como tambem tem metade do lugar de Peres Alves e encosto do mais lugar pertençe a Verride tem mais o lugar do Carril e do Chafaris. O Orago desta Igreja de Revelles he Nosa Senhora da Expectacam; tem sinco Altares; o Altar mor em que esta o Santisimo [fl.420] Sacramento; e o do Senhor Jesus; o de Sam Sebastiam, o de Sancto Antonio e das Almas; não tem naves mas tem duas Irmandades hūa do Sanctissimo Sacramento e outra a das Almas do Purgatorio. He o Parocho Vigário he (Sic.) apresentado pello Bispo de Coimbra a quem pertençe a apresentação da Igreja; e tem de renda pouco mais ou menos cento e setenta mil reis. Não tem beneficiados porque não ha na Igreja benefícios alguns. Não tem conventos alguns. Não tem hospital. Não tem Caza da Misericordia. Tem tres Ermidas a saber a da Senhora da Saude, fora do lugar de Revelles; a de Sam Joam no lugar da Abrunheira; e a de Santo Antonio no mesmo lugar da Abrunheira; esta pertençe a Joze Caetano de Ornellas e Gambôa e as duas primeiras ao Povo. A Ermida da Senhora da Saude acode romajem em dois dias no decurso do anno a saber na primeira outava da Pascoa da recurreisão; e no dia de Sancta Anna dia em que se fas a festa a dita Imagem da Senhora. Os fructos que ha nesta terra em mayor abundancia, e sam trigo e vinho.
2 - Ilegível.
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As “Memórias “Setecentistas de Montemor-o-Velho e seu concelho IV
Tem Juis Ordinário; tres vereadores e hum procurador que costuma confirmar o Ouvidor da Mitra de Coimbra; o que não fes este [fl. 421] anno de mil settecentos sincoenta e outto, por lho prohiber o Corregedor da Comarca de Coimbra. Pertençe esta terra ao Coutto de Cerroventoso que he cabeça de Concelho. Desta terra ou freguezia foi natural o Doutor Joam Rodrigues Biato varam e letrado em letras e de assumptos de procedimento; foi Reitor do Colegio Real de Sam Paullo de Coimbra; foi deputado do Sancto Officio; Conego doutoral da Sé de Viseu; rejeitou muitas vezes o ser Bispo fora do Reino; e pella sua grande licteratura era consultado de grandes pessoas deste Reino e actendido de Senhor Bispo Inquisidor Geral Dom Veríssimo de Lancastre; e do Bispo de Coimbra Dom João de Mello e de Nuno da Cunha de Ataíde que ao dipois foi Cardeal e do Marquez de Alegrote. Faleceu em Agosto do anno de mil seiscentos e noventa e sinco; jaz sepultado na Capella de S. Pedro no Coutto de Verride, cuja Capella he da Irmandade dos Clerigos a que elle deu principio. Não tem feira nenhūa. Não tem correyo; porem serve se do de Montemor o Velho que dista desta terra hua legoa. Dista esta terra de Lysboa capital do Reino trinta e duas legoas; e de Coimbra capital do Bispado sinco legoas. Não tem privilegios alguns antiguidades nem couzas dignas de memoria. Não ha na terra nem perto della, fonte ou lagoa celebre. Não he porto de mar. [fl.422] Não he murada nem prassa de Armas; nem tem Castello ou Torre Antiga. Não padeceo ruína no terremoto do anno de 1755 exceptas duas moradas de cazas de pouca concideração, de que senão fes cazo e ainda senão reparara. Estas sam as particularidades que ha desta terra e não outras que por isso senão respondeo aos mais Interrogatorios do papel incluzo Revelles 15 de Abril de 1758 (Assinatura): Manoel da Croz Salgueiro”
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Verride3 [fl. 853] “Verride Concelho Coimbra O Padre Cura da freguezia de Verride dá resposta e satisfação aos interrogatórios que Sua Magestade que Deos guarde lhe enviou pelo Reverendo Doutor Provizor do Bispado de Coimbra da maneira seguinte Interrogatório 1º Resposta 1ª Que Verride esta no Provincia da Beira no Bispado de Coimbra, na Comarqua Cível da Ouvidoria da Univercidade da dita cidade, no termo criminal da villa de Montemor o Velho, e constituie em si freguezia. 2. He da jurisdição cível da Univercidade de Coimbra emquanto as justiças com quanto (sic.) aos direitos dominicais he do Real Mosteiro de Santa Crus da dita cidade de Coimbra, que percebe (sic.) da dita terra dízimos, reçoens, laudemios. 3. Tem duzentos e dos vezinhos e outosentas pessoas de hum e outro sexo. 4. Está situada em hum monte delle se discobre o lugar de Abrunheira, que dista meia legoa, e Villa Nova da Barqua, que dista a terceira parte de huma legoa, o Couto de Mayorqua, que dista huma legoa, Montemor o Velho, que dista huma legoa, Tentúgal que dista tres legoas, Alfarellos que dista huma legoa. 5. Tem termo seo no cível e nelle comprehende sinco aldeias; a saber parte de Abrunheira, que tem trinta e outo vezinhos, Outeiro da Moura, que tem dezoito vezinhos. Ereira que tem trinta vezinhos, Marujal, que tem quinze vezinhos. 6. Tem Verride parochia dentro no lugar e tem a freguezia alem do lugar principal parte da Abrunheira, parte de Peres Alves, parte da Caixeira, Outeiro da Moura e Moinhos. 7. Tem orago de Nossa Senhora da Conceição e tem a igreja parochial seis altares, o primeiro do orago, o segundo do Santíssimo Sacramento, o terceiro da Senhora do Rozario, o quarto do Santíssimo nome de Jezuz, o quinto das Almas, o sexto da Senhora dos Remédios. Tem a igreja huma so nave, tem tres irmandades, a primeira do Santíssimo Sacramento, a segunda das Almas, a terceira da Senhora da Conceição. 8. O Parrocho he cura da aprezentação do Prior Geral de Santa Crus da cidade de Coimbra e tem de renda setenta mil reis. 3 - Arquivos Nacionais da Torre do Tombo, Verride, Memórias Paroquiais, 1758, vol. 39, nº 145, fls. 853 a 856.
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9. Nam tem beneficiados. 10. Nam tem conventos. 11. Nam tem hospital. [fl. 854] 12. Nam tem Caza de Mizericordia. 13. Tem dentro do lugar a Ermida de Nossa Senhora do Rozario, que pertence e administra a Irmandade das Almas; tem Sam Pedro, que pertence e administrão os clérigos pobres com alguns leigos da dita terra e suas vezinhanças; tem Santo Antonio, que he e pertence a Francisco Xavier de Macedo; e fora do lugar tem Sam Sebastiam e o Senhor Jezus do Adro, que pertence ao povo. 14. Nam acode as ditas Ermidas romagem de concideração alguma. 15. Os frutos desta terra he trigo, milho, vinho, feijoens, legumes e azeite e ferteliza se com maior abundância em milho, trigo e vinho. 16. Tem juis ordinário com jurisdição cível subjeito a Ouvidoria da Univercidade de Coimbra, tem câmara, vereadores, procurador do concelho, e a jurisdição criminal he da villa de Montemor o Velho. 17. He couto e cabeça de concelho, terra como se dice e jurisdição cível da Univercidade de Coimbra. 18. Nam há memoria que della sahissem ou nella se lançassem homens insiguos em virtudes, letras e armas. 19. Nam tem feira em dia algum do anno. 20. Nam tem correyo, serve se do correyo da villa de Montemor o Velho, que dista huma legoa. 21. Dista esta terra da cidade de Coimbra cappital do bispado, sinco legoas e de Lisboa metropoli do Reino trinta e tres legoas. 22. Nam tem privilégios, nem anteguidades ou outras couzas dignas de memoria, em que se especialize. [fl. 855] 23. Nam há nella nem no seo circuito (sic.) fonte, nem lagoa que qualefiquassem suas agoas com virtude especial. 24. Nam he porto do mar.
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25. Nam he terra murada, nem praça de armas, nem nella tem no seo distrito hum castello, nem torre antigua. 26. Nam padeceo ruína alguma no memorando terramoto de mil e settesentos e sincoenta e sinco. 27. Não se deviza nesta terra mais notabelidade alguma digna de memoria. Aos 16 de abril de 1758 (Assinatura:) O Padre Cura Manuel Lopes”
Vila Nova da Barca4 [fl. 1413] “Satisfazendo ao que se manda nos interrogatórios do folheto digo o seguinte 1 Que Villa Nova da Barca fica na provincia da Beyra Baixa Bispado de Coimbra, Comarca da mesma cidade, e termo da villa de Montemor o Velho e he freguezia. 2 He de donatário, que he do Excellentissimo Duque de Aveyro. 3 Tem cento e quarenta e dois vizinhos e pessoas quinhentas e vinte e sete pequenos e grandes. 4 Esta cituada em hum monte, delle se descobre Vila Nova de Anços distancia de uma legoa, Alfarellos a mesma distancia, Tentúgal distancia de tres legoas, Means e Carapinheyra distancia de duas legoas, Montemor o Velho distancia de uma legoa, Verride distancia de um quarto de legoa, Revelles distancia de uma legoa, Aborunheyra distancia de meia legoa, Carvalhal distancia de meia legoa, Cercal distancia de meia legoa. 5 He termo da villa de Montemor-o-Velho. 6 A parochia esta dentro no lugar, tem a freguezia tres lugares, Caixeyra, Marujal e Cazais. 7 O seu orago he da Senhora da Conceipçam, tem tres altares, o altar mor, em que esta collocado o Padre Eterno, Sam Joze [fl. 1414] e a Senhora da Conceiçam; outro altar em que esta collocado Sam Sebastiam, Santo Antonio e Sam Jacinto; outro altar esta collocada a Senhora do Rozario, Santa Luzia e Santa Catharina, e nam tem naves, nem irmandades. 4 - Arquivos Nacionais da Torre do Tombo, Vila Nova da Barca, Memórias Paroquiais, 1758, vol. 40, nº 236, p. 1413 a 1418.
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8 O parocho he cura aprezentaçam do prior de S. Miguel de Montemor o Velho, e rendera quinze mil reis. 9 Nada. 10 Nada. 11 Nada 12 Nada. 13 Tem quoatro irmidas, no lugar de Villa Nova da Barca a da Senhora da Conceiçam, e esta dentro do lugar, Sam Joam e esta fora do lugar, a da Senhora da Boa Viagem na Caixeyra, dentro do lugar, a de Santa Leocadia, no Marujal, e esta dentro do lugar, a de Sam Miguel, nos Cazais, e esta dentro do lugar, e todas sam pertencentes desta freguezia, e a da Senhora da Conceiçam esta nella ereta a Irmandade das Almas. 14 As tais capellas nam acodem romagens so se festeja Sam Joam no seu dia, em que accode bastante gente. 15 Os frutos que os moradores recolhem em mais abundância sam vinhos, milhos e trigos, feijoens e legumes. 16 Tem juis pedaneo e está sogeito ás justiças da villa de Montemor-o-Velho. [fl. 1415] 17 Nada. 18 Nam há memoria ouvesse neste lugar homens na forma do item, que floressessem em armas, virtudes, ou letras. 19 Nada. 20 Nada, digo nam tem correio, serve se do correio da villa de Montemor o Velho, distancia de uma legoa. 21 Dista da cidade capital do Bispado quoatro legoas, e da de Lisboa trinta e tres. 22 Nada. 23 Nada. 24 Nada. 25 Nada. 26 No terremoto de setecentos e cincoenta e sinco nam padeceo ruína alguma. 27 Nam há cousa de que se possa dar noticia digna de memoria. 175
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Neste monte I Há pedras de cantarias. II Há nelle criaçoens de ovelhas, vacas, caças de coelhos, perdizes, lebres, e nam há mais que se possa dizer.
No que respeita aos rios 1 Chamasse ho Rio Mondego e há noticia que nasce na Serra da Estrella, corre todo o anno. 2 Sempre corre caudellozo, e corre todo o anno. 3 Entram nelle o Rio de Soure, no sitio chamado obra do rio pequeno. [fl. 1416] 4 He navegável e capaz de barcos, quarito (?) do danno. 5 Nam he de curso arebatado em alguma parte do anno, por toda a sua distancia. 6 Corre do Nascente para o Poente. 7 Cria peixes, mugens, barbos, inguias, rouvacos, e estas de maior abundância. 8 Todo o anno se pesca nelle. 9 As pescarias pagam renda aos rendeiros do Excellentissimo Duque de Aveyro como senhor do dito rio. 10 As suas margens cultivam se e em partes tem arvores silvestres. 11 As suas agoas tem virtude para alguns achaques, e nelle se tomam banhos no veram. 12 Sempre conserva o nome de Rio Mondego, e nam há memoria tivesse nunca outro nome. 13 Morre no mar e entra pela barra da Figueyra foz do mesmo Mondego. 14 Tem algumas insoas pelo meio que se lavram e dam frutos. 15 Nam tenho noticia tenha se nam a ponte da cidade de Coimbra, de cantaria. 16 Nada. 17 Deste nam tenho noticia. 176
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18 Os povos nam uzam das suas agoas se nam para beber, os que estam próximos delle. [fl. 1417] 19 Da Figueyra the Coimbra tem o rio sete legoas, dahi para cima nam sey a sua distancia. Fica lhe a hum lado a cidade de Coimbra, Taveyro, Arzilla, Amial, Pereyra, Sam Veram, Fermozelhe, Montemor, Caixeyra, Verride, Samfins, Lares e Figueyra, e todas estas terras lhe ficam aos lados. Vila Nova da Barca o ultimo de Março de 1758 (Assinatura:) O Padre Cura Jozé Ferreira Lobo”
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Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 179 - 188
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Introdução Marcada pelo misticismo das lendas e histórias, Montemor-o-Velho é também uma terra de forte tradição religiosa. Celebrando festas em honra de S. Brás, S. Sebastião, Santo António, S. João e S. Pedro, entre outras, é a Procissão dos Passos que, hoje em dia, se reveste de grande aparato e devoção. No entanto, outras procissões desempenharam um papel relevante na vida cristã da vila, tais como a procissão do Anjo Custódio, a visitação de Santa Isabel, Ressurreição, Nossa Senhora das Candeias e, sobretudo, a procissão de Corpo de Deus ou Corpus Christi. Foi sobre esta última procissão que nos debruçámos neste trabalho, procurando entender qual a sua origem, fundamentos e tradições, no reino de Portugal, mas, sobretudo, na vila de Montemor-o-Velho.
I. A Origem da Procissão de Corpo de Deus e sua realização em Portugal Realizada na quinta-feira depois da oitava de Pentecostes, em honra do mistério da Eucaristia, a Festa do Corpo de Deus foi instituída em Liège, na Bélgica, pelo Bispo Robert de Thorete, no ano de 1246. A 8 de setembro de 1264, com a Bula Transiturus, o Papa Urbano IV estendeu a sua realização a toda a Igreja, ainda sem a procissão1.
* - Mónica Santa Rita (Técnica Superior de Arquivo - A.M.M.V.) 1 - Enciclopédia Luso Brasileira da Cultura, Lisboa, Ed. Verbo, 1967, Vol. 5, pp. 1843 – 1844.
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Em Portugal, foi com o rei D. João I que a Procissão ganhou notoriedade e obrigatoriedade, como agradecimento pela ajuda de S. Jorge na Batalha de Aljubarrota. Neste sentido, em 1387, o monarca mandou incorporar na procissão a imagem de S. Jorge, a cavalo, vestido de guerreiro2.
Imagem de S. Jorge3
Este costume foi adotado em várias cidades do reino, como Porto e Coimbra4, tendo a imagem um lugar de destaque. Foi, contudo, em Lisboa que a procissão do Corpo 2 - Invocação do Santo Mártir, por D. João I, no campo de Aljubarrota, a 14 de Agosto de 1385: “- Avante, S. Jorge, S. Jorge, avante, que eu sou rei de Portugal -; e em signal deste tropheu mandou o santo condestável, D. Nuno Álvares Pereira, tronco da esclarecida casa real, fundar um templo no meio d’aquelle campo, consagrado ao invicto martyr S. Jorge, alferes da igreja catholica, debaixo de cujo patrocínio reedificou o castello de Lisboa o senhor rei D. João I, (…) que o nomeou por seu titular (…) e ordenou que o dito santo fosse na procissão do corpo de Deus, a cavallo, sendo a primeira vez que se executou no anno de 1387 (…)”. In OLIVEIRA, Freire de, “Elementos para a História do Município de Lisboa”, t. I, pp. 441-442, nota, apud Fortunato de Almeida, História da Igreja em Portugal, Barcelos, Livraria Civilização, 1968, Vol. I, p. 472. 3 - Pelote de D. João I: pormenor com S. Jorge, peça pertencente ao Museu de Alberto Sampaio. Fotografia retirada de http:/www.matriznet.dgpc.pt. 4 - O Regimento da Procissão de Coimbra, do primeiro quartel do século XVI, definiu: “Primeiramente os forneiros, e carniceiros, e teleiros, e caeiros, e lagareiros da Cidade, e termo sam obrigados a fazer a judenga, com sua toura (…). Os ferreiros e seralheiros da Cidade e termo hamde dar o Segitorio bem concertado, e huma bandeira (…) Os Carpinteiros da Cidade e termo são obrigados de dar a Serpe, com huma silvagem grande, todo bem corregido, e terão huma boa bandeira. (…) Os cordoeiros, e albardeiros, e odreiros e tintureiros, (…) são obrigados a darem quatro cavalinhos fuscos bem feitos e pintados(…). Os Barqueiros da Cidade e termo seram obrigados de fazerem hum S. Christovão muito grande com hum Menino Jesus ao pescoço (…). As regateiras, e Vendedeiras do Pescado, e vendedeiras de fruita, sam obrigadas a fazerem duas pelas (…) Os Oleiros som obrigados de fazerem huma boa dansa (…). Os pedreiros e alvanees da Cidade e termo sam obrigados de terem huma bandeira rica, e levarem todos os Castelos nas maons (…). Os alfaates, e alfaatas, e tecedeiras de tear baixo da Cidade e termo, sam obrigados de fazer hum Emperador e Emperatriz (…). Os çapateiros da Cidade e termo (…) huma mourisca e Santa Crara (…). Os tecelaens, e tecedeiras de tear alto da Cidade sam obrigados de fazer Santa Catherina (…) Os corrieiros sam obrigados de fazerem S. Sebastiam (…) Os cereeiros sam obrigados de fazerem Santa Maria da asninha (…) Os ataqueiros som obrigados de fazer S. Miguel, e dous diabos grandes (…) Os espingardeiros da Cidade e ermo sam obrigados de hirem na prociçam em pelotes (…) Os Barbeiros, e ferradores sam obrigados de fazerem huma bandeira rica, e nella hamde levar S. Jorge pintado (…) As armas da Cidade, que vam com huma moça fermosa coroada (…) as padeiras da Cidade sam obrigadas de fazerem huma fogassa” e “No meio da Crelesia ham de hir huns Órgãos, e a Cidade paga ao tanjedor delles”. ALMEIDA, Fortunato de, ob. cit., vol. II, pp. 559-560.
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de Deus adquiriu maior representatividade, graças à presença do rei e do príncipe, que seguravam as varas do pálio, debaixo do qual o patriarca conduzia a custódia. No resto do reino, esta honra cabia à Câmara Municipal e seus oficiais, sendo a sua presença obrigatória. Era também à Câmara que competia a ordenança e regimento da festa de Corpo de Deus, incluindo na mesma pessoas de todas as classes sociais, as quais só se podiam recusar a participar se tivessem carta em nome de El-Rei e seladas com o selo real5. Ao longo do século XVI, a festa do Corpo de Deus continuou a realizar-se com grande aparato, no entanto, com o excesso de exibições extravagantes, queixas e abusos, o monarca viu-se obrigado, já no século XVII, a legislar no sentido da moderação das manifestações, estabelecendo, em 1621, o regimento da mesma. Nos dois séculos seguintes, os regimentos locais foram sendo alterados até que o monarca, a 26 de junho de 1905, deliberou considerar a procissão do Corpo de Deus encargo exclusivo das Câmaras Municipais, as quais foram deixando de a realizar.
II. A Procissão do Corpo de Deus em Montemor-o-Velho entre 1552 e 1900 A Procissão do Corpo de Deus, em Montemor-o-Velho, era, à semelhança de outras localidades do país, revestida de grande solenidade. Contando com a presença da Câmara Municipal é, através de um documento da mesma, a ata de 14 de maio de 15526, que temos conhecimento do seu regimento, elaborado, como lhe competia, pela mesma edilidade. Neste documento determinava a Câmara que todas as bandeiras “serao de seda e [ne]nhua sera de menos de seya covados com seus curdoys e franjas de seda e sera a cada hum dado llugar honde hyran nas purçyçoys da Camara”7. Assim, acordaram que os alfaiates levariam uma bandeira amarela, os tecelães uma branca, os sapateiros uma vermelha, os pedreiros e carpinteiros uma verde, os oleiros e tafoneiros uma bandeira azul e os almocreves uma bandeira parda, “as quays (…) darao feytas pera a festa de Corpus Christi con pena de dez cruzados a metade pera as obras do concelho e a outra metade pera quen hos acusar”8. Também os moradores do termo eram obrigados a trazer uma bandeira, de cores diferentes das da vila.
5 - CAMPOS, Aires de, “Índice Cronológico dos Pergaminhos e Forais da Câmara de Coimbra, p. 47, apud Fortunato de Almeida, ob. cit., pp. 472-474. 6 - Cf. Anexo I. 7 - AMMV, Manuscriptos, 1552-1553, fl. 46v. 8 - Ibidem, fl. 47r.
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Havia, contudo, outras aspetos a ter em conta. Assim, os careiros9 deviam dar quatro diabretes com suas máscaras, os forneiros a serpe10 pintada, os barqueiros e pescadores uma barca e os canastreiros e tanheiros(11) uma toura12. Não encontrámos, todavia, qualquer referência à imagem de S. Jorge13. Em sessão de 1 de julho de 1552 estabeleceu a Câmara o lugar que competia, na Procissão, aos diversos ofícios: “hos allfaayates lloguo no couce com as tres Maryas e que hos qarpynteiros e pedreyros vaao lloguo no segundo llugar/ e hos teçellays vaao lloguo no terceyro llugar con seu hofyçyo/ e os pesqadores e holleyros vaao no quarto llugar/ e hos allmocreves vaao diante con seus cavallynhos fustos e por que avia deferença se hos pedreyros e carpynteiros tinhao no premeyro llugar por rezao dos [fl. 64r.] qastelo que llevao se asentou que querendo hos ditos pedreyros e qarpynteiros fazer hum castello de madeyra que sao as armas desta vylla e ysto muyto acabado e hobra de marçenarya feyta per mao de quen ho souber bem fazer e do tamanho que quatro homens ho ajao de llevar lhe den por rezao das ditas armas da vylla yrao no coucenco as ditas armas e encanto ysto nao fyzeren yrao da maneyra açyma dito ho que cumprao com pena de çynquoenta cruzados e dous anos de degredo pera as partes dalem (…)”14. A comparência na procissão era, como vimos, obrigatória, recusando-se a participar apenas aqueles que tinham carta do rei. Assim, em caso de falta, reunia-se a Câmara com os juízes e determinavam a pena a aplicar. Foi o que aconteceu em 1664, quando, a 11 de junho, os trombeteteiros contratados para a festa faltaram à mesma: “Na dita ouverao por brado o previlleio que esta Camara tinha dado aos tronbeteiros Francisco Gonsalves e Antonio Francisco por coanto(?) faltao a festa do Corpo de Deus e mandarao fozen prezos en paresendo te vespera de Sam Ioao entretanto(?) suas molheres e por se irem se lisensa e faltaren nesa(?) festa tan solene os aviao por condenados en des tostois cada hu”15. A 21 de junho de 1832 encontramos inclusivé a condenação, a três dias de prisão, do bacharel José Maria de Santiago e dos juízes pedâneos e procuradores das varas de Figueiró, Granja, Gesteira, Carvalhal, Brunhós, Vila Nova, Palhais, Amieira, Vila Franca, Moinho da Mata, Gatões e Carapinheira, por não terem comparecido na Procissão16.
9 - Supomos que se tratem de Caretos: homem que dançava à volta das povoações vestido de diabo. 10 - Serpente. 11 - Seriam, talvez, os artesãos que se dedicavam à produção de esteiras, visto que, à época, o termo “tanho” pode designar esteira e/ou custos para cereais. 12 - O Pentateuco. 13 - No concelho de Montemor-o-Velho sabemos que, na Procissão de Corpo de Deus em Tentúgal, era costume levar a imagem de S. Jorge. A Capela de S. Jorge, nesta localidade, era contígua ao Solar dos Gavichos e foi mandada construir em 1687. Cf. http://www.cm-montemorvelho.pt/ patrimonio_historico. 14 - AMMV, Manuscriptos, 1552-1553, fl. 63v. 15 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1661-1664, fl. 275v. 16 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1832-1834, fls 121r.-121v.
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Também na vila de Montemor-o-Velho se registaram alguns abusos na procissão, chegando a Câmara a representar ao Rei17, queixando-se do Padre António Alvarez, vigário da Igreja Matriz de Alcáçova. Recusando-se o dito padre a dar as atenções devidas à Câmara, resolveu o monarca, a 22 de outubro de 1746, que a mesma ficaria desobrigada de acompanhar as funções religiosas18. Apesar disso, no século XIX, mais propriamente em 1832, a Câmara continuava a participar na procissão, elegendo as pessoas que deviam levar as varas do pálio, as lanternas e o estandarte, assim como as pessoas que deviam proceder à construção dos arcos. Como tal, neste ano, levaram as varas do pálio o Capitão Luís Galvão Peixoto Lobato, o doutor Alexandre da Costa Pessoa, o doutor Joaquim Duarte da Cunha, o doutor Abílio Maria Mendes Pinheiro e o doutor José Joaquim Guardado; as lanternas por António Duarte Vellarinho, António Joaquim Nogueira, António Maria da Silva Matos e Francisco António Melro; para levar o estandarte foram eleitos Joaquim Gomes Parreira e o vereador António Mendes Barreto; e, finalmente, para a concepção dos arcos, o Padre Cadima, Angélica Nobre, Joaquim Mota, Rosa de Coimbra, Ana Monteiro e Luiz Monteiro19. Em 1840, a 27 de maio, a Câmara deliberou a constituição da Procissão nomeando, para levar as varas do Pálio, Adelino Baardo Pinheiro, Maximiano de Freitas, António Mendes Barretto, Francisco Xavier de Faria Cardoso, Augusto Maria Mendes Pinheiro e Francisco Maria de Gouveia; e para levar as lanternas, António Duarte Vellarinho20, António Marques, António Soares e Domingos José de Carvalho. Procedeu-se também nesta altura à feitura dos arcos, para a qual foram nomeadas as pessoas responsáveis, definindo-se os locais onde os mesmos seriam colocados. Assim, António Cardoso e Teresa Pessoa deviam construir um arco e colocá-lo à porta de José da Silva Carvalho; José Rodrigues Azenha e Joaquim Rodrigues Loureiro, à porta da Rua das Pradinhas(?), vindo da Rua do Loureiro; António Mota e Maria Ignacia de Quadros, à quina do Hospital da parte do norte; Maria Motta velha e Mariana Ribeira, no meio da praça; Anna Cordeira e António Denis Branco, à porta da botica de José Simões; José Vieira da Rainha Santa e a criada de D. Antónia(?) de Lemos, à porta de José Vieira; Joaquim Rodrigues Faria e José Damas, à porta de Ana Albertina; João Lopes e José Alves de Sousa, à porta do Teatro; António de Oliveira e Luís Monteiro à porta de António Carvalho; e, o décimo e último arco, à porta de Luiza Rosa, elaborado por Ana Monteira e Ana de Matos21. Contudo, a 2 de junho de 1841, foram apenas mandados elaborar cinco arcos que se localizariam na Praça, feitos por José Ribeiro e
17 - Cf. Anexo II. 18 - AMMV, Livro de registo dos Acórdãos, privilégios e provisões régias, 1739-1755 , fls. 10v-12v. 19 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1832-1834, fls. 118v.-119r. 20 - António Duarte Vellarinho foi, a 6 de Junho de 1840, escuso de levar a lanterna, sendo nomeado para a levar, em seu lugar, António Rodrigues. AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1838-1841, fl. 117r. 21 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1838-1841, fls. 115r.-115v.
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Bento Luís Pinto; um na quina do Hospital, elaborado por Ana Moleta e Manuel Liceia Júnior; um à porta do Albino, da responsabilidade de Maria Ignacia de Quadros e Luís Monteiro; António Cardoso Manso e José Ramos(?), à porta de António José da Silva; e, à porta de João Lopes, pelo mesmo22. Através da leitura da ata da sessão de 29 de maio de 1841, podemos concluir que qualquer contenda com o pároco de Alcáçova já estaria sanada, pois a mesma resolveu que “se oficiasse ao Parocho de Alcassova perguntando-lhe qual a igreija e a que hora deve sahir a mesma Procissão afim de se providenciar o que a tal respeito se acha a cargo da Câmara”23. Resolvidas as questões com a Igreja, a Câmara foi convidada, a 19 de maio de 1900, pelo “Reytor Arcypreste d’esta freguezia Augusto Pereira Cardote”24 a ocupar o seu lugar de honra, na função de Corpo de Deus que se realizaria no dia 22 de junho. A Câmara resolveu, então, fazer a procissão na forma do antigo costume, procedendo à elaboração de um orçamento suplementar para pagamento das despesas inerentes à mesma, inscrevendo a quantia de sessenta mil reis. Esta quantia foi utilizada para pagamento da condução de cadeiras e outras; com a Filarmónica e Tropa, incluindo comida e dormida; vinte dúzias de fogo do ar25; e, ainda, com a Filarmónica de Verride26.
Conclusão Podemos assim concluir que, no período estudado, a Câmara Municipal de Montemor procurou, desde sempre, cumprir e fazer cumprir as disposições régias referentes à realização da Procissão do Corpo de Deus. Envolvendo-se na preparação e regulação de todos os aspetos fulcrais da procissão, articulou esforços com a Igreja e os moradores da vila, não deixando, contudo, de apresentar ao rei sempre que se sentiu diminuída na sua autoridade e nas suas competências. Tentou conferir-lhe, principalmente, um mínimo de decência e solenidade, e, com maior ou menor verba disponível, foi elaborando orçamentos suplementares para fazer face às despesas que não estavam contempladas, assegurando, dessa forma, a realização de tão solene procissão.
22 - Ibidem, fl. 151v. 23 - Ibidem, fl. 151r. 24 - AMMV, Livro de Atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1900-1903, fl. 3v. 25 - Ata de 30 de Junho de 1900. Ibidem, fl. 11v. 26 - Ata de 15 de Setembro de 1900. Ibidem, fl. 24v.
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Bibliografia Fontes Manuscritas AMMV – Manuscriptos, 1552-1553. AMMV – Livro de atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1661-1664. AMMV – Livro de atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1832-1834. AMMV -– Livro de atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1838-1841. AMMV – Livro de atas da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1900-1903. AMMV – Livro dos Acórdãos, Privilégios e Provisões Régias da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho.
Bibliografia Enciclopédia luso-brasileira da cultura. Lisboa: Verbo, 1967. ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Barcelos: Livraria Civilização. 1968. COUTO, Luís de Sousa – Origem das Procissões da Cidade do Porto. Porto: Câmara Municipal do Porto, 1971.
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Anexos I –AMMV – Manuscriptos. 1552-1553. Ata de 14 de maio de 1552. Sabado quatorze dias de Mayyo do ano de myll e quynhentos e cynquoenta e dous anos na vylla de Montemor ho Velho na camara della forao juntos ho licenciado Gaspar Teyxeira de Maçedo juiz de fora e dos direytos re[a]ys por ho duque Nosso Senhor com allcada d’Ell Rey Nosso Senhor e Vasco Anes Portugall ho licenciado Diogo do Caso e Agostynho Negrao vreadores e Gaspar Martyns procurador do Concelho e fezerao hos acordos sygentes. (…) [fl. 46-v.]E lloguo na dita camara acordarao que todos hofyçyays maqaniqos façao bandeyras pera as porçyçoys e todos se ajuntaram asy ho da vylla com hos do termo de maneyra que todos tinhao bandeyras boas e de reçeber has qays bandeyras serao de seda e [ne]nhua sera de menos de seys covados com seus curdoys e franjas de seda e sera a qada hum dado llugar honde hyran nas purçyçoys na camara. Item hos allfaytes darao hua bandeyra amarela Item hos teçellays darao hua bandeyra branca Item os çapateiros llevaram hua bandeyra vermelha Item os perdreyros e qarpynteiros darao hua bandeira verde com seus cordoys e franja. Item hos holleyros e tafoneyros hua bandeyra azuuull con sua franja e cordoys e mallegeyros e barqueyros. Item hos allmocreves llevarao hua bandeyra parda com seus condoys e franja. [fl. 47-r.]As quays bandeiras darao feytas pera a festa de Corpos Cryste com pena de dez cruzados a metade pera has hobras do Concelho e a outra metade pera quen hos acusar. E lloguo na acordarao que todos ho moradores e juyzes das vyntenas do termo desta vyntanas do termo desta vylla tragam cada hua sua bandeyra de seda com suas franjas e cordoys e as bandeyras serao de seys covados ao menos e non sera a seda menos que de tayeta pera ryba e as darao feytas ate dia de corpos Cryste hes[te] premeiro que vem com pena de dez cruzados a metade pera as hobras do Concelho e a houtra pera ho allcayde hou quen hos acusar as quays ho juyzes as mandarao fazer so a dita pena pera ho tenpo acyma dito e ysto da cadea. Item a Grayya e Gravyellos por seren lugares pequenos darao hua bandeyra a vos de dous e hos procuradores(?) dos ditos llugares trarao qua hum seu ano e asy que hum 186
A Procissão do Corpo de Deus em Montemor-o-Velho: 1552-1900
trara hum ano e o houtro so a mesma pena ho que foy lloguo notefycado aos juyzes [fl. 47-v.] .scillicet. Allfarellos e Granja e Gravyellos e Fygeyro que presentes estavao. Item as bandeyras que fyzeren as vyntenas serao qarteadas de cores defyrentes das da vylla e a seda naao sera menos de tajeta dobrado pera çyma e ho asynarao. (Assinaturas) Gaspar Teyxeira Diogo do Caso Vasco Anes Portugall Agostinho Negrao
II – AMMV – Livro dos Acórdãos, Privilégios e Provisões Régias. 17391755. Provisão régia sobre as procissões de Montemor-o-Velho, de 29 de julho de 1746 [fl. 10v.] Registo de hua provizão que a Camara desta Villa alcansou a seo (?) e para fazer as suas festas na Igreja que quizese eleger. Dom Joam por grasa de Deoz Rey de Portugal e doz Algarves daquem, e dalém mar em Africa, Senhor de Guiné, e da Conquista Navegasam Comersio da Ethiopia Arábia Pérsia, e da India digo de Guine etc. Faso saber a voz Juis de Fora, offesiaes da Camera da villa de Montemor o Velho que se vio a vosa conta em que me reprezentastes que fazendo huma petisam a esa Camara o Padre Antonio Alvarez vigario da Igreja Matris de Alcasovas pera que se obrigase ao marchante a fazer novo contracto em que se lhe puzese lhe ouvese de dar da melhor vaca que se cortase no asougue, e por se lhe nam actender, nem se lhe dar asento na mesma Camera, como pertendia, e em dia de Corpo de Deoz voz consebera tal odio que em todas as occazioens que podia nam faltava [fl. 11r.] em o dezempenhar, procurando nas conversasoenz discomporvoz, e muyto mais nas funsoenz em que a Camera eia asestir à sua Igreja às festas que a Ley manda tractandoa com desprezos, nam lhe deytando agoa benta per si, nem pelos seoz Econimoz, a que he obrigado pelo sescario(?) que por este obzequio recebiam, como tambem fazendoa esperar na mesma Igreja, da coal sahia muytas vezes pera sua Caza e voltava coando lhe paresia e vendo que prudentemente disfarsaveiz estas desactensoens se resolvera Domingo do Anjo do ano pasado, indo na procisam debaycho do Palio, a nam querer que a mesma pase por huma rua por onde a Camera ordenava por ser muy principal, razam por que iá no ano antecente se tinha encaminhado a do Corpo de Deoz digo emcaminhado por ella a do Corpo de 187
Deoz, pretendendo que a mesma procisam que ia eia estendida em grande distansia pela dita Rua retrosedese, e por nam o poder conseguir, se rezolvera a ir só com o Palio por onde pertendia, com geral escandalo, de que resentidoz voz rezolvereiz a ir fazer as festas a outra Parrochia, que emcontrara o dito Vigario, mandando notheficar a todoz oz Parrochoz, e clerigos desa villa pera que nam consentisem, nem asestisem a ellas com pena de excomunham mayor; Pedindo juntamente aoz rellegiozos desa Villa que nam asestisem, e ainda pagara a tal exceso que escondera hum rellegiozo castelhano que nesa villa se achava, pera não benzer a cera da festa da Purificasão que pera se fazer com o vigario de S. Martinho, a quem nam estava notheficada a excomunham, por se recolher de fora da terra, fora persizo pera devestir(?) dous clerigoz que na Sachristia da dita Igreja estavam de escolta pera haverem de o notheficar, prenderes lhe alguma da sua famillia que logo despoiz de feyta a funsam se soltara, e por que estes factoz eram totalmente contrários ao cervizo de Deoz, e muyto prejudesiaez ás consiensias os punhiz(?) na minha real prezensa pera dar a providensia que fose cervido; e visto o maiz que referistes, e resposta do Procurador da minha Coroa a quem se deo vista e o que Constou por imformasam do Provedor desa Comarca de Coimbra; Fuy cervido por minha Real Rezolusam de vinte e sinco de junho proximo pasado mandar escrever pela via a que toca ao Bispo de Coimbra que mande chamar à sua prezensa ao dito Vigario Antonio Alvarez, e o repreenda asperamente pelos excezos e desturbioz que tem cometido e que estranhe ao Seo vigario geral a imprudensia com que oz tem fomentado com as suas conguras(?); e voz advirto que nam voz intrometais nas ordens das procisoens, por serem da jurisdisão ecleziastica, mas se nellas se voz faltar às onrras costumadas voz haverey por dezobrigados de as acompanharez; Tendeo asim intendido: El Rei Noso Senhor o mandou por seo expesial mandado peloz Doctores Manoel de Almeida, e Carvalho e Manoel Gomes de Carvalho amboz de seo Conselho e seoz Dezembargadores do Passo, Manoel Ferreyra Serram a fez [fl. 11v.] A fez em Lisboa a vinte e nove de Julho de mil e setecentos coarenta e seis anoz; Pedro Norberto de Aucurt, e Padilha a fez escrever// Manoel de Almeyda e Carvalho// Manoel Gomes de Carvalho// Por Rezolusam de S. Magestade de vinte e sinco de julho de setecentos coarenta, e seis em consulta da meza do Dezembargo do Paso; E nam se conthem na dita provizam que aqui tresladey bem e fielmente da própria que fica em meo poder e cartorio a que me reporto sendo necesario em fe de que me asigney de meo signal razo de que uzo; Montemor o Velho de outubro vinte e dous de mil e setecentos coarenta e seis anoz e eu Francisco de Figueyredo e Lima escrivam proprietario da Camera que o escrevi, e asigney. (Assinatura) Francisco de Figueiredo e Lima
Correia Góis*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 14, 2013, 189 - 196
Mosteiro de Nossa Senhora de Campos (Montemor-o-Velho, 1503-1691) SUBSÍDIOS HISTÓRICOS III Introdução O “histórico-vivencial” do mosteiro de Nossa Senhora de Campos em Montemor-o-Velho, mobiliza nossas atenções no inerente à “busca” permanente de novos elementos passíveis de maximizar o “sítio e as gentes” que ali viveram e morreram. Em nótulas anteriores deu-se a conhecer o documento oficial da fundação, a Bula de 1503 (9 de Novembro) outorgada pelo papa Alexandre VI concedendo a D. João de Castro e D. Izabel de Azevedo autorização para o feito. A Bula então concedida materializa um processo algo moroso com génese provável no ano de 1475 com a doação de casas e pumares “junto à ermida de Nossa Senhora de Campos”. Trata-se de uma questão a cuidar de seguida, bem como a concessão de Alvarás régios visando ampliar a instituição com proventos para assegurar a sustentabilidade (compra de propriedades e carniceiro privativo).
A questão geo-temporal (sítio, aquisição, etc.) O “sítio” (casas e terras) no Campozel “extra-muros da villa de Montemor o vº” cedido por D. João de Castro e D. Isabel de Azevedo para edificação de um mosteiro de freiras franciscanas pode advir da contenda entre o D. Afonso V (rei de Portugal) e o infante D. Pedro (duque de Coimbra) na funesta batalha de Alfarrobeira a 20 de Maio de 1449. A derrota das tropas e partidários do infante D. Pedro, motivou confisco dos seus bens, rendas e foros a distribuir pelos vitoriosos, ou seja os apoiantes de D. Afonso V. As terras do Infantado foram confiscadas, bem como os títulos da fidalguia da Casa do Infante, entretanto restituição de alguns após perdão régio. * - Correia Góis (Licenciado em História de Arte e Graduado em Arte do Renascimento pela Universidade de Coimbra).
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É nesta ambiência que em 1475 (20 de Março) que “casas e pumares junto à hermida de Nossa senhora de Campos com quem parte e das outras com caminho publico” são doadas por escritura feita na cidade de Évora por Álvaro Afonso (tabalião do rei)1 a Pedro Silva, filho de Diogo da Silva2 (fidalgo da casa de El-Rei) e D. Guiomar Borges. No mesmo ano, Pedro Silva vende o conteúdo da doação a D. João de Castro3 (filho de D. Fradique de Castro4) e D. Isabel de Azevedo.5 É desta forma que as “casa e pumares” confiscados aos partidários do infante D. Pedro e entregues a um dos partidários do Rei (Diogo da Silva) vão ser compradas por D. João de Castro e mulher a Pedro Silva (filho de Diogo da Silva) para edificar em Montemor-o-Velho um convento de freiras franciscanas.6
1 - AUC- pergaminho, V-III-Mov. 4 – Gav.7 2 - Diogo da Silva é um dos filhos bastardos do alferes mor de D. João I e Senhor de Vagos, João Gomes da Silva. O infante D. Pedro doou-lhe bens moveis e de raiz confiscados a Afonso Eanes, Contador da cidade do Porto “por haver servido e prejudicado o Reino”. Embora partidário de D. Pedro, esteve em Alfarrobeira ao lado de D. Afonso V, a quem compensou com avultados bens e títulos com ênfase para a “herdade de almoinha do rei em Montemor-o-Velho, com rendas, foros, pertenças, jurisdição”. Diogo da Silva, casou com Guiomar Borges, irmã do camareiro-mor do rei D. Duarte (Duarte Borges), de quem teve três filhos: Pedro Silva, o Relé; D. Isabel casada com Gil Vaz da Cunha, senhor da Quinta do Calharis e D. Catarina da Silva, mulher de Fernão de Albuquerque, senhor de Vila Verde. 3 - D. João de Castro, filho de D. Fradique de Castro e D. Beatriz de Vasconcelos, de alcunha o “Tagarote” deixou poucas notícias; mas, sabe-se ter feito várias viagens a África, ser fidalgo de El-Rei, fruir da condição da Casa, “rendas e bens” dos pais a casar com D. Isabel de Azevedo, de quem não teve filhos, o que justifica o uso dos bens próprios na compra do “sítio” e edificação do mosteiro de Santa Maria de Campos. 4 - D. Fradique de Castro, fidalgo da Casa do infante D. Henrique, é filho de D. Pires de Castro, senhor de Alcáçovas e Maia Lobo, integrou a expedição a Tânger em 1437com os irmãos (D. Pedro, D. Álvaro e D. Fernando). Simpatizante do infante D. Pedro, acompanhou-o às Cortes em Lisboa em 1439, em Alfarrobeira junta-se às tropas de D. Afonso V onde vai ser compensado com os bens confiscados a Rui Dias de Tentúgal, partidário do Infante. O rei concedeu-lhe outros benefícios com destaque para os moinhos de Anobra “com rendas e direitos” e nomeação de vedor das obras da ponte em Coimbra no ano de 1453. D. Fradique casou em 1ª núpcias com Catarina Dias, viúva de Luís de Ataíde (cavaleiro da Casa do infante D. Pedro); 2ª núpcias com D. Beatriz de Vasconcellos (filha de Joane Mendes de Vasconcelos, senhor de Soalhães) a quem assassinou e de quem teve duas filhas freiras e D. João de Castro “o Tagarote”. casou em 3ª núpcias com D. Mécia da Silveira, filha do escrivão da puridade de D. Duarte (Nuno Martins da Silveira) de que não teve filhos. D. Mécia da Siveira, foi casada em 1ª núpcias com Vasco Martins da Cunha. 5 - D. Isabel de Castro é filha de Lopo de Azevedo, fidalgo da Casa do infante D. Pedro, alcaide-mor de Penela e senhor das terras e castelo de Aguiar da Pena. Pelejou com D. Pedro em Alfarrobeira, confiscado os títulos e senhorios, foi objecto de perdão régio e restituição da fidalguia. D. Lopo foi casado com Iria de Brito, colaça do rei, filha de Martins Vaz de Sequeira e Leonor Gonçalves. D. Isabel de Azevedo é irmã de D. Maria de Azevedo, mulher de João de Meneses, alcaide mor de Braga. 6 - É frequente opinar-se o mosteiro ser construído em 1503 nos terrenos junto a casas de D. João de Castro e D. Isabel de Azevedo, o que não deixa de ser exacto, apenas com a nuance de o casal haver em 1475 procedido à compra das “casas e pumares junto à hermida de Nossa Senhora de Campos”.
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Mosteiro de Nossa Senhora de Campos
Alvarás/Provisões (compra de propriedades, carniceiro e profissão de votos) Após a fundação (1503) observou-se uma ocorrência massiva de candidatas a noviças e freiras ao novel mosteiro de Montemor-o-Velho, provindas da vila e “seo termo” bem como de outras localidade do País. Em princípio, o mosteiro apenas devia perfazer o número de 33 (conforme anos de Cristo); porém no decorrer do tempo e fruto das pressão de jovens a querer professar religiosamente, principalmente “gente da nobreza” e como consequência da epopeia ultramarina (órfãs e viúvas) o número foi alargado e daí a necessidade de proventos para a sua sustentabilidade. As despesas com a edificação da estrutura foi morosa, custosa e os dotes revelaram-se insuficientes Uma das soluções era aumentar os rendimentos por meio de compra de propriedades, o que só era possível com prévia autorização dos reis do Reino, Superior da Ordem ou Bispo diocesano. É neste contexto que o rei de Portugal D. Sebastião (1557-1578) a 15 de Outubro de 1566 concede Alvará para poderem comprar propriedades, após consulta e aprovação do Provedor da Comarca de Coimbra de 10 Agosto. O documento foi feito em Lisboa por Diogo Fernandes e registado na Chancelaria régia nos seguintes termos: “...Dom Sebastião por Graça de Deos, Rey de Portugal e dos Algarves, daquém e dalém mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação, Comersio de Etiópia Arabia Percia e da índia. Faso saber aos que esta carta virem que a Abbadesa e Freiras do Mosteiro de Nosa Senhora de Campos da villa de Monte Mor o Velho me fizeram a petisão seguinte: - Dizem a Abbadeça e Freiras do mosteiro de Nosa Senhora de Campos da villa de Monte Mor o velho da ordem de Sam Francisco da terceira Regra que ellas tem comprado no termo da villa sertas propriedades de raíz para ajuda da sostentação do dito Mosteiro e freiras della as quais propriedades são as seguintes: - humas terras que compraram a Álvaro Rodrigues e sua molher ja defuntos que custarão sincoenta e sinco mil reis rendem sincoenta e sinco alqueires de trigo e asi comprarão a Acenço Rodrigues defunto trinta alqueires de trigo e hum carneiro = humas propriedades que ouverão de João Vas goarda e de sua molher ja defuntos que custarão seis mil reis e rendem sem alqueires de trigo = e asi comprarão a Acenço Rodrigues defunto trinta alqueires de trigo de renda que custarão trinta mil reis = e toda esta fazenda lhe custou sento e outenta e sinco mil reis e iso vale pouco mais ou menos toda junta sento e outenta e sinco alqueires de trigo e hum carneiro, e as ditas propriedades não são em reguengo de Vossa Alteza e são somente dízimo a Deos e por que as não podem pesuir sem lisensa de Vossa Alteza // Pedem a Vosa Alteza haja por bem que ellas as tenhao e pesuão em pose sem embargo de qualquer ordenação que o defenda = E Receberá Merce: E havendo respeito o que a dita Abbadeça e Freiras na dita petisão dizem e vista a informação que meu mandado se houve do Procurador da Comarqua de Coimbra e seu parecer aserca do comtheudo na dita petição, e querendo lhes fazer graça e mercê, por esmola, Hey por bem e me pras que a dita Abbadessa e Freiras do dito Mosteiro
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Correia Góis
Entrega da doação (29 de Maio, 1563)
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de Nosa Senhora de Campos que hora são e pelo tempo forem posao daqui em diante ter e pesuir para sempre as propriedades que na dita petisão fazem menção que dizem que tem compradas as pessoas nella nomiadas e isto sem embargos de ordenasão do livro segundo titulo outo que defende aos mosteiros que posao pesuir bens de raíz por mais que por espaso de hum anno / comtanto que as ditas propriedades não estam em terras de Reguengo nem jogadeiras nem a mim obrigadas em algum foro ou tributo, e mando ao Contador7 da minha fazenda na Comarqua e Contadoria da dita Cidade que faça registar esta carta no livro dos meus próprios da dita Contadoria para se por ella saber como dei esta licença a dita Abbadeda e Freiras de que o dito Contador passara sua Certidão nas costas desta carta feita pelo escrivão dos coutos da dita Contadoria e assignada por ambos e sem a dita certidão lhe não será guardada esta carta que mando se cumpra inteira mente como se nella comtem. Diogo Fernandes a fez em Lisboa a dezasseis dias do mes de Março, Anno do Nasimento de Noso Senhor Jezus Christo de mil quinhentos e seis = Baltazar a fez escrever, com a rubrica do Cardial Infante...”.8
Uma outra carta /Alvará concedido às freiras de Campos promulgado por D. João IV, rei de Portugal (1640-1656) a 3 de Julho de 1643 diz respeito à cedência de licença para o mosteiro deter carniceiro particular visando necessidades monacais. Ao tempo, o mosteiro precisava de semanalmente abater “duas rezes” para satisfazer a população residente e a carne dos açougues da vila era insuficiente e os preços pouco convidativos. A questão foi levada ao conhecimento de Sua Alteza Real por petição, que após consultar o Corregedor da Comarca e oficiais da Câmara de Montemor-o-Velho, D. João entendeu fazer “mercê e esmola às freiras de Campos, concedendolhe autorização a poder ter carniceiro particular e semanalmente poderão matar duas vacas e a sobrante poder ser vendida nos assougues públicos da villa e gente do povo conforme padrões aferidos na villa...”. Esta carta/alvará foi escrita por Gaspar da Costa Maís (escrivão do Rei), mandada pelos doutores Sebastião Cazar de Meneses e João Ribeiro (Dezembargadores do Passo) registada por Domingos Pereira de Barros (escrivão da Câmara de Montemor-oVelho) a 19 de Outubro de 1641 é do teor seguinte: “...Dom João por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves da quem dalém mar em África Senhor da Guiné e da Conquista Navegação Comercio da Ethiopia Arábia Pérsia e da Índia. Faso saber aos que esta minha carta virem que a Abadessa e Religiozas do Mosteiro de Nossa Senhora de Campos da Villa de Monte Mor o Velho me fez a petição seguinte: - Dizem a Abbadeça e Reli-
7 - É Contador da Fazenda na cidade de Coimbra, António Gomes. Esta carta foi registada no livro dos coutos a 16 de Setembro de 1567. 8 - AUC- Mosteiro de Nossa Senhora de Campos de Sandelgas, Alvarás e Provisões (maço)
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giozas do Mosteiro de Nossa Senhora de Campos da ordem terceira do Padre São Francisco sito na villa de Monte Mor o Velho que ellas padecem muitas necessidades por não terem carniceiro obrigado ao dito Convento para lhe dar carne, e cada semana hão de mister duas rezes pouco mais ou menos sem as quais não poderão remediar suas necessidades = Pedem a Vossa Magestade que havendo respeito ao sobredito lhes dê licença para o que posao tomar hum Carniceiro particular que se obrigue a lhes dar carne para o dito Convento, e a poder comprar livre mente, com declaração que crescendolhe algumas das ditas duas rezes a posao vender pelo preso da terra a outras pessoas sem penna alguma como Vossa Magestade tem feito mercê às Religiozas do Convento do Carmo da villa de Tentúgal e reseberão esmola e mersê = E visto seu requerimento e a informação que aserca disto mandei tomar pelo Corregedor da Comarqua da Cidade de Coimbra em que ouvio os oficiais da Câmara e seu parecer por que consta que por a dita villa não ser bem provida de carnes padesem as ditas Religiozas muito detrimento e necessidade della, e por lhes fazer mercê por esmola: hei por bem e me apraz que ellas posao ter hum carniceiro separado particular que se obrigue a lhe dar cada somana duas vacas para mantimento do dito Mosteiro e em cazo que dellas lhe cresa alguma carne a posao vender pelos presos da terra nos Asougues públicos da mesma villa a gente do Povo pelos presos aferidos pelos Padrois para o que se dará juramento em Câmara como aos mais carniseiros do Povo e asy me apras que o dito Carniceiro posa comprar as ditas duas vacas livre mente: Pello que mando ao dito Corregedor o oficiais da Câmara e mais justisas a que o conhecimento disto pertencer que cumprao inteira mente esta carta como se nella contem...”.9
Acto de profissão a Religiosa Observadas as normas constantes do Capitulo II da regra de S. Francisco e após um ano de noviciado, a Madre Mestra de Noviças propõe à Abadessa a noviça/pupila estar em condições de professar, ou seja prestar juramento dos votos (pobreza, obediência e castidade) e passar à condição de freira. A Abadessa e demais Madres (Vigária e Discretas) informam Superior da Ordem/Província e Bispo diocesano para o efeito, o qual indigitará o dia, hora e local. Numa pesquisa rápida, entre os anos de 1574-164310, observamos em alguns casos estas entidades presidirem às cerimónias ou quando não presentes passavam Comissão a um sacerdote dos mais acreditados da vila (Vigários de S. Martinho e S. Miguel, Reitor de Alcáçova, Prior de Nossa Senhora dos Anjos). Os actos de profissão decorriam na igreja do Mosteiro na presença da Abadessa, Madres do Governo e de toda a Comunidade. Questionava-se a noviça
9 - AUC – Mosteiro de Nossa senhora de Campos de Montemor-o-Velho/Sandelgas, III-1ªD-10-1-62 10 - Um assunto a tratar com mais cuidado em momento oportuno.
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Mosteiro de Nossa Senhora de Campos
candidata a freira das perguntas de estilo ditadas pelo Concílio Tridentino e todo o cerimonial constava de autos lavrados por escrivão nomeado para o efeito (nunca confessor ou capelão), uns autos a variar nos termos em contexto. Para ilustração e conhecimento dos leitores ousamos trasladar o auto de perguntas e profissão em 1656 de Maria do Espírito Santo, filha de Manuel Cabral e Brites de Azevedo de Tavarede: Ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil e seis centos e sincoenta e seis anos, em este Convento de Nossa Senhora de Campos, cito extramuros da Vila de Montemor-o-Velho e igreja do dito Convento grades do coro dele aonde o licenciado Domingos de Barros, Vigário da igreja de S. Martinho desta vila e comigo o padre Manuel Henriques por comissão dos Senhores do Cabido da Sé Catedral da cidade de Coimbra fis perguntas a Madre Maria do Espírito Santo na forma do sagrado Concílio Tridentino, comissão cometida ao dito Vigário e lhe perguntou se era a dita Madre Maria do Espírito Santo contente de professar no dito Convento e guardar a Regra da Religião e tudo o mais no Sagrado Concílio Tridentino. Sobre esta matéria declarada e se por medo força e constrangimento de alguma pessoa fazia a dita profissão dos três votos, castidade, pobreza e obediência se obrigava às mais Regras da Ordem, do que a dita Madre Maria do Espírito Santo, filha de Manuel Cabral e Brites de Azevedo do lugar de Tavarede, disse que ela de sua livre vontade era contente fazer a dita profissão para mais comodamente nesta Religião servir a Deos, e que a isso não compelia força nem medo ou constrangimento de pessoa alguma. E por esta ser sua inteira vontade pedio ao Reverendo Vigário mandasse aqui fazer este termo que assinou estando presente a Madre Abadessa Sebastiana da Glória e a Madre Vigaria, Maria de S. José que aqui assinarão e a dita noviça e eu o padre Manuel Henriques fis este termo por mandado do Reverendo Vigário escrevi. Sebastiana da Gloria (Abbª), Mª de São Jozeph (vigaria da casa), Mª do Espírito Santo, Domingos de Barros, Manuel Henriques, Natália dos Anjos (escrivã do conv.to).11
11 - AUC – Mosteiro de Nossa Senhora de Campos de Montemor-o-Velho/Sandelgas, DIII-1ªD-10-1-56
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Autos de profissĂŁo de votos de Maria do EspĂrito Santo
Mem贸rias do Tempo
Sandra Lopes*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 201 - 204
120 Anos de História da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho
No passado dia 17 de junho de 2013 fez precisamente 120 anos que teve lugar a primeira Sessão de Câmara no atual edifício dos Paços do Concelho. Convém lembrar que o edifício dos Paços do Concelho foi construído nos finais do século XIX, na actual Praça da República, que naquela altura era denominada Praça Príncipe D. Carlos. Em 1887, foi discutido pela Câmara o estado de ruína do edifício e foi decidido destruir o que existia e construir um novo. Nesta altura, era Presidente da Câmara o Dr. José Augusto de Almeida Ferreira Galvão, que foi um dos principais impulsionadores desta obra. O autor do projeto foi o Engenheiro Chefe de Secção Estevam Eduardo de Parada Silva Leitão e a obra foi arrematada a 13 de Janeiro de 1889, por Francisco dos Reis Sapim, pedreiro, e António Fernandes, carpinteiro, ambos da Figueira da Foz, que ficaram obrigados a realizar a obra num prazo de três anos. Foi concluída a 9 de Abril de 1892, mas só no dia 17 de junho de 1893 se realizou a primeira Sessão de Câmara no novo edifício. A Ata transcrita começa assim: “Sessão de 17 de junho de 1893 Aos desassete dias do mez de junho de mil oitocentos noventa e tres, nesta villa de Montemor-o-Velho, Paços do Concelho e sala das sessões da Câmara, presentes os vereadores Pessoa – Castro Guimaraens e Cantante Guardado – sob a presidencia do Illustrisimo Adrião Pereira Forjaz de Sampaio constituiu-se a câmara, e ocupados os respectivos lugares, abriu o mesmo a sessão. Eram 12 horas do dia. (…)”. Foram tratados vários assuntos, respeitantes ao normal funcionamento do Município, nomeadamente, colocação em hasta pública para arrendamento de algumas receitas municipais (antiga casa do açougue de Verride, um terreno baldio no Zambujeiro e
* - Sandra Lopes (Técnica Superior de Arquivo - A.M.M.V.)
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Sandra Lopes
a passagem do barco do porto de Formoselha); a Câmara tomou conhecimento da correspondência recebida; a Comissão dos Festejos de S. João da vila de Montemor-o-Velho foi autorizada a utilizar a Praça Príncipe D. Carlos para os festejos, bem como cravar alguns postes no chão para a colocação de arcos e outras decorações; deliberou ainda a requisição de vacinas, para serem distribuídas por todos os facultativos (médicos), de forma a realizar-se a vacinação de todo o Concelho. “Deliberou mais que se mandasse lavar e caiar a antiga casa que servia de paços do concelho, denominada casa dos frades, para se entregar a chave a seus donos no fim do corrente mês, e que tambem se pagasse o semestre em tal dia vencido e que tanto essa despeza de lavagem e caiação, como a de mudança das diferentes repartições para o novo edifício dos Paços do Concelho fosse paga pela verba nº 56, T.º 11, artº 1 do orçamento, por não haver verba especial. (…)” Como era hábito naquele tempo, as atas eram muito resumidas, focando apenas as deliberações propriamente ditas, não registando as considerações dos vários vereadores. A Ata termina da seguinte forma: “Em seguida sendo hoje o primeiro dia de sessão no novo edifício dos paços do concelho, deliberou a câmara encerrar a sessão, como signal de grande regozijo. (assinaturas:) Adrião Pereira Forjaz de Sampaio João Augusto de Mello Ramalho José António Monteiro da Costa José de Sá Coelho Pessoa Manuel Maria Castro Guimarães”. Em 120 anos, o Município engrandeceu e sofreu grandes mudanças, sendo a mais importante os símbolos heráldicos.
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120 Anos de História da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho
Das armas da Vila de 1893 não existe documento escrito que nos indique o início do seu uso, mas já António Correia da Fonseca e Andrade, no início do século XVIII, as descrevia da seguinte forma: “Tem por armas esta villa hum castello d’ouro, em campo vermelho, posto no meio de duas flores de liz, vêem se estas armas nos dous chafarizes que há na villa, hum na praça e outro no Convento dos Anjos. No castello se calefica o memorável valor, com que se deffendeo dos mouros, ficando eterno thropheo esta memoria do mais plauzivel triumpho, que por estupendo admirou o mundo. Sendo de ouro pelos quilates, em que se exagera a nobreza de seus descendentes. E no campo sanguíneo, denota o mar vermelho, em que se afogou o paganismo pois foram tantos os barbaros, que pereceram que a milhares se contaram. Das flores de liz se pode conjecturar seria alguma das Inffantas, que foram Senhoras desta Villa, a que as mandasse por, e motivo teria para o fazer, porem a anteguidade por descuidada, tem a culpa de que agora se ignore, o que era digno se soubesse. Na Coroa se pode entender de notar se o ter sido esta villa antiquíssimo património das Senhoras Infantas, prerrogativa em que excedeo a todoas as mais do Reyno. Quando nam fosse pela razam de merecer se coroase hum castello, que na gloria de se deffender nam teve segundo, pois equivocado o asombro, o appelida primeiro.” As armas atuais advêm da implantação da República em 1910 e têm como base um parecer apresentado por Affonso de Dornellas à Comissão de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses e aprovado em sessão de 23 de outubro de 1935. Alteração das armas do Concelho de Montemor-o-Velho, com o Parecer da Associação dos Arqueólogos Portugueses, datado de 23 de Outubro de 1935. Affonso de Dornellas, após tecer várias considerações sobre as fundamentações históricas para a existência de, pelo menos, três desenhos diferentes sobre as armas da vila, a inclusão ou não das flores de liz e a escolha das cores, apresentou no seu parecer como deveriam ficar ordenadas as armas, a bandeira e o selo de Montemor-o-Velho. “Armas – de púrpura com um castelo de ouro aberto e iluminado de negro. A torre central carregada por uma quina de Portugal antigo. O castelo acompanhado por duas flores de liz de ouro. Em contra-chefe três faixas ondadas, duas de prata e uma de azul. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco com os dizeres “Vila de Monte Mór-o-Velho” de negro. Bandeira – esquartelada de amarelo e de negro. Cordões e borlas de ouro e de negro. Haste e lança douradas. Selo – circular, tendo ao centro as peças das armas sem indicação dos esmaltes. Em volta, dentro de círculos concêntricos, os dizeres “Câmara Municipal de Monte Móro-Velho”. Em 1893, a Câmara encontrava-se num grande desequilíbrio orçamental, devido à construção dos Paços do Concelho e o aumento de outras despesas correntes. Em termos de orçamento, a receita correspondia a 4.487$790 reis e despesa 5.856$600 reis, 203
existindo um défice de 1.368$810 reis, tendo a Câmara deliberado que algumas das despesas consideradas adiáveis, seriam apenas pagas no ano seguinte. Demorou ainda alguns anos até que a Câmara conseguisse restabelecer o equilíbrio orçamental. Em termos estruturais, a Câmara tinha cerca de 11 serviços e 60 funcionários, acumulando algumas funções que atualmente pertencem à Administração Central, nomeadamente, a educação (pagamento a 19 professores de instrução primária), a assistência médica (pagamento a médicos), segurança (polícia rural e cadeia da comarca). Por todos os motivos apontados, este dia foi assinalado com grande regozijo pelo atual Executivo, em sessão de 17 de junho de 2013, para que daqui a 120 anos se faça novamente a História do Município de Montemor-o-Velho.
Sandra Lopes*
Monte Mayor - A Terra e a Gente, Nº 15, 2013, 205 - 216
António Correia da Fonseca e Andrade e a História Manlianense - 14
De forma a dar continuidade à publicação da História Manlianense, Cronologica, Epithomatica, Bellica, Genealogica e Panegírica, na qual a curiozidade descifra successos que admiram, progressos que asombram e dezenganos que aproveitam…, disponibiliza-se agora a transcrição do livro sexto, capítulos quinto a sétimo desta obra de considerável importância para o Concelho de Montemor-o-Velho. Os critérios de transcrição adoptados1 foram apresentados no nº 1 da revista Monte Mayor, pp. 108-109.
“[fl. 142-v.] Livro 6º Cap. 5º Em que se toca a fundaçam do Real Convento de Santa Cruz de Coimbra, de Cónegos Regrantes de Santo Augustinho, e algumas noticias curiozas 35 Gloriozo foi o dia de vinte e sinco de Julho do anno de 16042 em que as bandeiras catholicas se viram ornato das Torres do Castello de Coimbra, que depois de sete mezes sitiada, a reduzio o magnânimo Rey D. Fernando a sua obediência, fazendo mais plauzivel a victoria, o grande enfado que se avia tido na campanha. Que nunca o que se estimou muito, custou pouco, por andar ao barato annexo o desprezo, pois do que he vulgar nunca se fez cazo, fazendo se si grande do difficultozo. Que o perigo do que se escapou no campo, he que faz mais gloriozo o triumpho, sendo as feridas que se recebem na batalha, as que celebra a fama a boca cheia, que pretender prémios sem precederem trabalhos, he injuriar merecimentos e inhabilitar para os aplauzos.
* - Sandra Lopes (Técnica Superior de Arquivo - A.M.M.V.) 1 - Na transcrição deste documento procurámos, na generalidade, seguir Avelino de Jesus da Costa, Normas Gerais de transcrição e publicação de documentos e textos medievais e modernos, 3ª edição, Coimbra, 1993. 2 - Segue-se à margem: Deverá ser 1064.
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36 Retirado El Rey para a Corte, recomendou o governo da cidade, e mais terras desde Lamego athe o mar ao Conde Dom Sisnando para que povoase e reedificase como fica dito, cujas memorias chegam ate o anno [fl. 143-r.] de 1092, e nesses vinte e oito annos lograriam estes povos a fortuna de serem governados por hum sogeito merecedor do mayor aplauzo, tam vegilante nas suas commodidades, que nam admetia o menor descuido. Sendo no que tocava a si ao secular, como eccleziastico muito circunspecto. 37 Fundou como he de prezumir a Igreja de Santa Maria de Alcáçova, com a qual liberizaria rendas, para que o Parrocho se sustentasse e ás suas obrigaçoens accudise. Por quanto vemos que dahi a secenta e sete annos desde o de 1064 athe o de 1131, era Prior de Santa Maria da Alcáçova hum fidalgo, chamado Dom Sisnando, pesoa de grandes respeitos, e hum dos doze companheiros mais insignes que no principio teve Arcediago Dom Tello, quando a vinte e oito de Julho, véspera dos gloriozos Apóstolos Sam Pedro e Sam Paulo do anno de 1131 lançou a primeira pedra no Convento de Santa Cruz, sendo os mais companheiros Sancto Theotonio, sobrinho do Bispo de Coimbra Dom Cresconio. Dom Miguel Prior da Sé Dom Honório Prior da Igreja de Santiago de Coimbra, Dom Gudinho Zaleme, Prior da Igreja de Sacto Thomé de Mira, filho de Zaleme Gudinho, Senhor de Mira, Joam, cognominado Peculiar, que depois [fl. 143-v.] de lograr muitas dignidades, chegou a de Arcebispo de Braga, Primaz das Hespanhas. Odorio Prior da Igreja Matriz de Vizeu, a quem o clero e o povo aclamaram por seu Bispo, no anno de 1120. Dom Mendo, que depois foi Bispo de Lamego. Dom Pedro Seguino, que foi Bispo de Orense. Dom Pedro Babal diz que foi Bispo do Porto. E outro Dom Mendo que foi Bispo de Lima (?). Todos estes varoens illustravam o seo sangue com os esmaltes da virtude, sendo muito exemplares na sanctidade, de que se colhe que logo no berço, teve a Igreja de Alcáçova tantas estimaçoens, que o seo Prelado foi dos mais illustres do Reyno e correspondendo sempre a sua origem, foram os seus vigairos em todo o tempo, como o sam hoje, de bom nome, que o milhor he o que da o zello e virtude. Que se esta falta ao Parrocho, he como edifício sem alicerce, sendo nelle tudo sombras, que encobrem o realce das tintas, mas publicam as suas manchas, que faltar nos que tem obrigaçam de luzir, sam como eclypses no sol, que se nam podem occultar. 38 Foi Dom Tello natural da própria cidade de Coimbra, naceo aos três de Mayo do anno de 1070, seis annos depois de ser ganhada aos Moiros por EL Rey Dom Fernando, o Magno. Foi filho de Odorio [fl. 144-r.] telles, fidalgo dos que se acharam na tomada da dita cidade, Senhor de algumas terras de Cantanhede e Arouca, e de sua mulher Dona Eugenia, que era irman do Conde Dom Sisnando, Senhor de Coimbra, e netto paterno de Tello, fidalgo muito conhecido, e que sempre sérvio nas guerras a El Rey Dom Fernando, e em todas as do seo tempo. Foi grande letrado e muito virtuozo, cujo préstimo se fez publico no tempo do Conde Dom Henrique, sendo entam Arcediago da Sé, e naquella jornada, que o dito Conde Dom Henrique fez a Hyeruzalem pelos annos de 1103, o acompanhou o Bispo Dom Maurício, que levou 206
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comsigo o Arcediago Dom Tello, nam só para governar a sua caza, mas também para ter cuidado na família do Conde. Passados três annos, em que o Conde com outros Príncipes a Baldovino a acrescentar o seu estado, ganahando a cidade de Cezarca, e outras praças se partiram para Portugal e se detiveram seis mezes em Constantinopla, donde o Emperador Alexio os hospedou com grandeza, que se esperava, e embarcando se para este Reyno, chegaram a elle no fim do anno de 1107. Sendo em Coimbra o Bispo e Arcediago, recebidos com grandes festas, medindo se o contentamento pelo que tomou [fl. 144-v.] grande saudade avia custado, que o prazer se fez maior, quando se desvanecem os motivos de sentir. 39 Bem conheceo o venerável Arcediago Dom Tello, os enganos com que rinda o mundo, pois para o vencer, fugio, que o estar a pé quedo, he arriscado, e dar lhe as costas nam he desdouro. Que se a valentia no século he pelejar cara a cara com o inimigo, com este esta no deixar lhe o campo. E asi edificou na Corte a todos a sua rezoluçam, pois desprezando honrras, nam fez cazo de esperanças e vencidas algumas contradiçoens, se trabalhou em tal forma no convento, que em vinte e quatro de Fevereiro do anno de 1132 o Bispo Dom Bernardo disse a primeira Missa na Capella Mor e lançou o habito aos doze companheiros, fazendo mais solene o dia a asistencia do Príncipe Dom Affonso com os fidalgos de sua Corte, e eram taes as virtudes destes varoens appostolicos, que affeiçoado o Príncipe, tomou a sua conta as obras do Convento, mostrando ser empenho da sua grandeza o accrescentar aquella caza. E passados noventa e seis annos, que a Igreja foi fundada a sagrou em sete de Junho do anno de 1228 o Cardeal Dom Joam Frois (?) natural de Coimbra e Cónego Regrante, que avia sido de Sancta Cruz [fl. 145-r.]. E asi pelo tempo adiante, cresceo de sorte em edifícios, que veio a ser hum dos que tem maior nome na Hespanha, sendo hum Seminário (?) de varoens illustres em sanctidade, que quais luzidas estrellas, se nestas se admira a luz, nelles as virtudes. 40 Continuou depois de Rey, o Príncipe Dom Affonso aquella estimaçam que se fez sempre do Convento de Santa Cruz, e na mesma seos successores, que as virtudes prendem com cadeias tam fortes, que sendo fuzis os agrados, se tem os rendimentos por alvitres o que se vio em Dom Sancho o primeiro, que coroou logo suas acçoens no principio, mandando dar a obediancia ao Papa Urbano Outavo, e lhe recommendou por huma carta o Convento de Santa Cruz. Dom Affonso segundo no anno de 1203, nacendo lhe o Príncipe Dom Sancho, o fez baptizar em Sancta Cruz pelo Prior Dom Gonçalo Dias, e depois de Rey tomou este Convento debaixo de sua protecçam Rial. Dom Diniz no anno de 1282 aos vinte e três de Abril lhe confirmou todas as rendas e jurisdiçoens. O mesmo fez seo filho Dom Affonso o quarto, o qual atribuía de oraçoens destes relligiozos o bom successo da memorável Batalha do Salado, que se ganhou em trinta de Outubro do anno de 1340, donde entam levou emprestada a espada del Rey [fl. 145-v.] Dom Affonso Henriques. Dom Joam o primeiro, quando em Coimbra celebrou Cortes no anno de 1385 foi ao Mosteiro e pedio aos Relligiozos encommendassem a Deos o bom successo. EL Rey Dom Affonso Quinto, indo 207
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a Coimbra com seo tio e tutor o Infante Dom Pedro, em o mez de Maio do anno de 1446 foi ao Mosteiro, donde o Prior Dom Gomes Ferreira o recebeo com grande solenidade, e el Rey por mostrar a grande estimaçam que fazia daquelles reelegiozos os abraçou a todos com muito agrado. E depois de se ouvir Missa quis ficar no Mosteiro, comeo no refeitório com seo tio o Infante Dom Pedro, benzeo a meza o Prior Dom Gomes, e vindo o Dia do Corpo de Deos por estar indisposto o Bispo Dom Luiz Coutinho fez o Pontifical na Sé por ordem del Rey o dito Prior de Sancta Cruz Dom Gomes Ferreira e levou o Santíssimo Sacramento na procisam da cidade, em que foi o mesmo Rey. El Rey Dom Joam Segundo continuou no honrrar aos padres e ao Prior e tanto que sabendo que o Prior Dom Joam de Noronha, filho do primeiro Marquez de Villa Real Dom Pedro de Menezes dezia Missa nova, veio de Lisboa a Coimbra, e se achou a Missa que foi em vinte e outo de Agosto de 1485. E o Rey Dom Manoel fez a mesma estimaçam que seo antecessor, porque sabendo [fl. 145-v.] que o Cardeal Nepote (?) pedia ao Papa Júlio Segundo o Priorado, que avi vagado por morte de Dom Joam Noronha, El Rey o atalhou de sorte, que nam teve effeito. El Rey Dom Joam Terceiro lhe fez grandes honras, e quando mudou a Universidade de Lisboa para Coimbra, fez ao Prior de Sancta Cruz Cancellario perpetuo da mesma Universidade. E indo a Coimbra em seis de Novembro do anno de 1550, se agazalhou nas hospedarias daquelle Convento, com que todos os Reys tiveram sempre tam grande conceito dos Relligiozos desta caza, que na estimaçam precediam aos mais, sendo em todos os tempos dignos do mayor aplauzo, merecendo se venerem por seo exemplo. 41 E como huma das pedras fundamentaes deste grande edifício fosse do Castello desta villa de Montemor o Velho, no Prior de Santa Maria de Alcáçova Dom Sesnando se fez esta memoria, por nam privarmos a terra de lembrança tam honrada, pois fora crime indisculpavel para a obrigaçam, se se ometise, o que era digno se escrevesse que como lhe cabe parte em obra tam heróica, era precizo se publicasse a gloria que lhe resulta. Que quando para o bem se concorre, sempre se merece, sendo toda a acçam digna se venere. E como as deste grande Prelado, como as dos mais companheiros [fl. 146-v.] fosem em tudo singulares, ficou o Convento de Santa Cruz hum ceo com tantas luzes, que delle sahiram astros a produzirem outros hemisférios, occupando no Reyno e fora delle muitos Bispados, sendo aquella caza manancial origem de virtudes, pois della com impetuoza corrente, se admiravam em toa a parte.
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Cap. 6 Em que se faz memoria de algumas das muitas acçoens heroycas do Magnânimo Capitam Hespanhar (?) Bernardo del Carpio, credito da própria nacam e inveja das mais 42 Nos tempos em que reinavam em Leam os Reyes Dom Affonso Segundo, cognominado o Casto, Dom Ramiro e Dom Ordonho primeiro do nome e Dom Affonso Terceiro o Magno, fizeram como fica dito, varias entradas na Luzitania, já tomando terras, já dando batalhas, tirando do injusto poder dos bárbaros tantas almas catholicas, quantas se viam oprimidas da insolência com que eram tyrannizadas. Servio a estes Príncipes em todas ellas o singular e illustre Capitam Bernardo del Caprio, era este filho da Infanta Donna Ximena, irmam del Rey Dom Affonso o Casto, e de Dom Sancho Dias, Conde de Saldanha, que clandestinamente se aviam ca[fl. 147-r.] zado. Que as acçoens, o que fomenta o delírio de um affecto, acham no estrago a seo castigo. E asi o Rey para satisfaçam da offensa feita ao Sagrado da Magestade, meteo a Infanta Trisa (?) no Convento de Santa Anna de Oviedo, e ao Conde mandou tirar os olhos, para que de todo nam tornase a ver o objecto, que o chegara a cegar, sendo o preço porque comprou o gosto tam claro, que como elle se nam vio outro, e metido em áspera prizam no Castello de Luna, foi para elle esta cheia de desgraças para toda a vida, tendo taes mingoantes, que so avia sobras de enfado, que este he o fruto, que colhe o que procede inadvertido, sem mais attençam, que ao que lhe pinta o agrado, que tanto que a razam falta, a desgraça se aprofinqua. E asi nam tropeçará, o que antevir o que pode succeder, porque quando o nam faça, só poderá appelar para o sentir, nam tendo mais alivio que o chorar. 43 Era Dom Bernardo rico de dotes da natureza, que avia andado tam liberal que na gentileza do corpo excedia aos mais, e todos eram menos nas prendas, pois nellas nam avia quem o igualase, tendo tal afabilidade, que geralmente se avaliava o rendimento por alvitre, fortuna grande fazer prizoens dos agrados, para separar alsedrias (?). E[fl. 147-v.]ra nas forças hum Hércules sem ficçoens, pois obrava com tanta valentia, que parece o que sonhava se fazia. Servia a el Rey Dom Affonso seo tio, sendo que pelo trato, com que o avia criado, teve prezunçoens de que era seo filho, mas dezenganado por huns parentes, soube que seo pai, nam so estava prezo, mas era cego, que he tal a clase dos mofinos3 que so lembram por acazo. 44 Vio Dom Affonso nam tinha filhos, e que com guerras o apartavam os Mouros, rogou ao Emperador Carlos Magno o socorrese, e que lhe deixaria o Reyno por sua morte, e como sem conselho fez a proposta, sabido por seus vassallos, se rezolveram a quererem antes morrer, que em tal couza consentir. E asi obrigaram ao Rey mandase ao Emperador escuza e quando o nam fizese, buscariam a quem os governase. 3 - No fundo da página: Esta palavra não está bem inteligível no original, mas julgo ser como aqui se escreveu.
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Andava naquelle tempo o Emperador com cruéis guerras com os Mouros, mas nam lhe serviram de embaraço, para que deixase de formar hum escrito logo, que a conveniência arrasta em tal forma, que consegui la, he so o que disvela (?). Aceitou mal o Emperador a embaixada, e asi ameaçando com ferro e fogo, partio para Hispanha com intento de a dominar ou destruir. Porem Dom [fl. 148-r.] Affonso ajuntando hum exercito, governado por Dom Bernardo venceo e matou os doze Pares de França, e o Emperador vendo o estrago fugio com tanto medo, que retirado a Alemanha, chorando a sua desgraça, viveo pouco. Que o sentimento quando he grande, tira a vida e apreça a morte. Ao tempo deste successo ignorava ainda Dom Bernardo o lastimozo citado, em que o Conde seo pay esta posto, cuja noticia o afligio tanto, que vestido de luto pedio a El Rey, que em satisfaçam de seos serviços, mandase soltar seo pay. El Rey ouvio a proposta, mandou lhe nam tornase a fallar em tal matéria jurando lhe nam daria nunca liberdade. Nam esfriou o zelo neste Príncipe tam dezabrida e inhumana resposta, antes acreditou a sua fidelidade com a obediência, pois se retirou com tanta sumisam e brandura, que merecia no perdam boa correspondência, porque experimentar bom termo, no que esta agravado, he por dezuzado, dificultozo, e sendo hum acazo, para as espheras de heroyco, procedimento tam raro. Pois das inclinaçoens próprias, se alcança o melhor triumpho, por estas persuadirem ao contrario que o vencer o natural h tam custozo, como o remar contra a maré no rio, vadear a corrente sem enfado, querendo a pe enxuto pasar o pejo, meter no incêndio sem ris[fl. 148-v.] co, e precipitar do Olimpo sem danno. 45 Ficaram os Francezes pelo estrago que tiveram com tam grande ódio, que so no beberem o sangue aos Hespanhoes teriam o seo regalo, e asi acezos n vingança vieram com hum exercito, cujo general era Dom Bredo, homem tam valerozo, como nas guerras experimentado, em cujo valor, se animava a sua esperança, para que nam ficase pedra sobre pedra, e pasando os Alpes foi tal o estrago que fazia nos povos, que tudo era sangue, ferro e fogo. O que sabido por Dom Bernardo o foi buscar com seo exercito ao caminho, e no lugar e Oreyon tiveram tal encontro, que foi huma das bem disputadas batalhas, que se contam nas historias, pois eram as mortes tantas, que apenas avia corpos sem feridas, e já no fim da batalha encontrando se Dom Bernardo com Dom Bredo, peleijaram corpo a corpo, athe que morto o General contrario, ficou Dom Bernardo com o triumpho, e os francezes destruídos escaparam poucos. 46 Alcançada esta victoria, pedio Dom Bernardo a El Rey que em premio de seos serviços lhe mandase soltar seo pay, pois lho avia prometido antes da batalha, mas como El Rey se via já livre da afliçam lhe respondeo com tanta aspereza, que sobre a culpa de [fl. 149-r.] de faltar a palavra lhe offendeo a sua modéstia. No que se ve he a necessidade liberal no prometer, mais difficultoza no cumprir. Em quanto a tormenta dura tudo sam promesas, porem como chega a bonança, nem dellas há lembranças, que a jurisdiçam dos ingratos sempre se estende, ainda dos benefícios a fazer crime. Sentio se Dom Bernardo de sorte, que por muitos dias, se nam tornou a por a cavallo, nem foi ao Paço, tendo tanta força a sua magoa, que para qualquer exceso poderia 210
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aver desculpa, que quando a sem razam obra sempre a paciência desmaia. 47 Nam pasou muito tempo, que dous exércitos de Árabes entrasem em Galiza, e devedidos, era o seo divertimento destruir e queimar tudo, porem indo Dom Bernardo contra elles, rompeo e destruio hum dos exércitos junto ao luagr Naion, e com inimitável deligencia voltando as armas sobre o outro, o venceo junto as Ribeiras de hum Rio chamado Aneio, e nam bastaram tantas proezas maravilhozas, para que El Rey dese liberdade ao Conde, que como se vio já dezafrontado do inimigo, de quem o avia livrado, nam fazia cazo, sendo este o procedimento que a golpes de magoa enfraquece o gosto de servir, pondo em termos a fidelidade de faltar, que quando se apertam [fl. 149-v.] os cordéis a paciência, he perigoza a conservaçam da vida, e se podia fazer galla se perdela, porque experimentar desprezos em satisfaçam de serviços he a malina dos affectos, e será quazi milagrozo que hum coraçam nam pasme, quando assim a sam razam o confunde. 48 Depois de tanto triumpho conseguio outro, destruindo aquelle ingrato Mouro, a quem El Rey avia recolhido em Galiza, que de Córdova avia fugido a buscar o seo amparo. Que os ingratos satisfazem, como afrontos, os benefícios e esquecido dos favores que avia recebido, se revellou contra Dom Affonso, e com grande sequito de Árabes, lhe começou nas terras a fazer dano. Que os traydores sempre pagam como sam e quem delles se fia, só na desgraça se dezengana. E levantando se com o Castello de Sanra Christina, delle sahio poderozo a destruir aos mesmos, que o chegaram a amparar, que a traiçam só entam se calefica, quando offende com mais força. E caminhando com grande poder de Bárbaros, o encontraram os catholicos, e apitancados por Dom Bernardo, e dando a batalha, ficaram sincoenta mil bárbaros na Campanha, tomado o Castello, e cortada a cabeça do inimigo, a offereceo a EL Rey pelo melhor prato quando a vista de serviços tam heróicos, se podia prometer que EL Rey Dom Affonso [fl. 150-r.] seo tio lhe puzese os olhos para que se deminuise a sua queixa e uzase com o Conde seo pay de mizericordia, foi Deos servido leva lo, e como lhe succedese no Reyno Dom Ramiro, e depois Dom Ordonho, ambos primeiros nos nomes, foram notáveis as guerras que tiveram com os Mouros, e posto os historiadores fosem descuidados de referir as proezas, que em seo serviço fizese Dom Bernardo, he de prezumir, nam estivese nunca ociozo, pois o seo valor intrépido nam admitia no servir a seos Príncipes socego, o que se verefica, porque succedendo no Reyno Dom Affonso Terceiro o Magno, quando junto ao Douro venceo aos Mouros Tolledanos, lograra este triumpho ajudado de grande vlor do excellente Capitam Dom Bernardo del Carpio, e que nesta, como em outras batalhas, obrara maravilhas, e como em remuneraçam de seos serviços, lhe pedio mandase soltar seo pay, pois era velho, e avia tantos annos que estava prezo, lhe nam differio El Rey a isto, e asi estimulado das sem razoens, que com elle se avia uzado, fundou no districto de Salamanca hum Castello, chamado Carpio, donde confederado com os Mouros fazia guerra a El Rey Dom Affonso, e desta dezuniam naceo que os Árabes começaram a fazer grandes entradas pelas Comarcas de Astorga e Leam, e esta [fl. 150-v.] foi a cauza para que el 211
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Rey desse liberdade ao Conde, e se reconciliase com Dom Bernardo, obrando entam a necesidade, o que poderia ter feito a razam, que o favor para que se avalie por tal, nam deve chegar a termos, que se possa desluzir, porque huma vez perdidos os quilates, com que obriga, sempre a vontade fica com quebra. Fiados os Bárbaros na multidam, dividiram em dous corpos o exercito. A hum venceo El Rey junto ao Rio Orbigo, e ao outro o destruio Dom Bernardo junto ao Val de Moro, sendo tal a felicidade dos catlholicos, que dos dois exércitos, nam escaparam duas dúzias para que levasem as novas. Socorreo a El Rey Dom Affonso, estando cercado em Zamora, donde fez tal estrago nos Mouros, que os mais delles foram feitos em pedaços, e asi conjecturamos que este grande Capitam como sérvio sempre a seos Reyes, e estes entrasem muitas vezes na Luzitania forçozo era viese por estas terras, e pelas nam privarmos de tanta gloria, faremos delle esta lembrança, avaliando a a nosa obrigaçam por divida, pois o trabalhar por pagar, sempre acredita, posto que de todo se nam satisfaça, e com tam grande Heroe illustraremos a nosa historia, pois foi este Capitam domador da Naçam gálica, terras e espanto da mourisma, e adornado de immortal fama no anno de [fl. 151-r.] 876, pagou o comum tributo a natureza, tendo de idade oitenta e dois annos. Está sepultado no Mosteiro de Aguilar de Campo. 49 He digno de maior reparo, que tendo Dom Bernardo tanta fortuna, que podia appelidar se primogénito della, pois as suas acçoens eram taes, que apenas puxava a espada para os inimigos, a golpes os fazia em pedaços, e que sendo suas proezas o milhor emprego da fama, sem que nella tivese que dar dentadas a calunia, admirando todos geralmente, nam poder aver hyperboles, com que cabalmente se aplaudise, para que se vereficase nam avia dia sem nuvem, nem sol sem eclypse, fez os heróicos serviços, que temos visto a seo tio EL Rey Dom Affonso o Casto, sem que jamais quizese perdoar ao Conde, e o que mais he para pasmar, que nos succesores experimentase Dom Bernardo a mesma repugnância, pois servindo a todos com tanta fidelidade, achou nelles por prémios, motivos de que se doesse, sendo insuperável valentia do fado, que o Conde nam fose solto, avendo crimes, que posto horrendos, se visem perdoados. Mas este fidalgo andou sempre a braços com o desgosto, athe que ficou despojado do enfado que quando a desgraça se empenha para acabar, he o único remédio o morrer. [fl. 151-v.] 50 Vio se em Dom Bernardo os extremos a que obriga o amor do filho, que por mais que por suas proezas merece, aplaudido, porque as obrigaçoens do sangue como se anteponham a tudo, só o que acode a ellas he honrrado. Muito o foi Dom Bernardo, pois como elle nam ouve outro, porque qual ouro na fragoa, se este lúcido elle ficou acreditado, mostrando que as esquivanças com que o tratavam, se eram ultrajes do seo respeito, as avaliava empenhos para servir de novo. Singular modo de obrigar, esquecer do que offende, e isto se o faz hum animo tam illustre, que os que o nam sam logo mostram o descontentamento ainda no mais leve descuido, sendo se lhe no semblante o seo enfado, que só o que he pendente, sabe portar se de sorte, que rendendo graças por agravos, he o que merece bom nome. Servir sem satisfaçam, he 212
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credito da vontade de obedecer, defficultozo he praticar estillo tam contrario ao gosto, mas desta máxima foi Dom Bernardo fatal exemplo, fazendo pasmar aos mesmos, que o penalizavam de prepozito, mas assim avia de ser, para que no templo da estimaçam tivese o melhor, e mais elevado lugar, porque fazer os que os mais fazem, nam merece se aplauda, porem se com singularidade se obra, isso he o que admira pois o que se nam uza asombra. [fl. 152-r.] Cap. 7º Em que sumariamente se escrevem os heroycos progresos e maravilhozas acçoens del Rey Dom Sancho o primeiro do nome, e o segundo entre os Monarchas Luzitanos 51 Dom Sancho primeiro de nome, e o segundo Rey de Portugal, succedeo a seo pay o grande Dom Affonso Henriques naceo na cidade de Coimbra, illustre berço dos Monarchas Luzitanos, e domecilio preclaro de Príncipes Portuguezes, aos onze de Novembro do anno de 1154. Logo nos primeiros annos teve por ensaios os exercícios militares, e asi sahio tam destro nas armas, que quando descipulo, era já mestre nellas, com que sublimou tanto nas fortunas, como admiraram suas proezas, cortando lhe os aplauzos as palmas, para as coroarem de victorias, que quando o valor nace, nam necesita de tempo para que obre, porque principiando com heroycidade, sam taes os progresos, que a mesma admiraçam se confunde. Que o animo generozo logo quando começa a obrar da huns longes do que vira a ser, sendo as meninises hum prognostico das acçoens adultas, com que se há de illustrar.4 52 Testemunhas foram de suas valentias os Bárbaros de Sevilha, donde ao entrar pela porta de Triana foi o seo Rey pasado a cutello, e desbaratado todo o exercito Mahometano, e quando triumphante se [fl. 152-v.] recolhia a Portugal, sabendo estava Beja sitiada de Mouros, lhe foi aprezentar batalha, e ainda que peleijasem com esforço cederam a valentia de seo braço, ficando bem castigado seo bárbaro atrevimento, como a gritos publicava o mesmo estrago. 53 Nos campos de Arganal teve guerras com os Leonezes, em que ficaram desbaratados, que como o nosso Príncipe se avia criado nestes illustres exercícios, tinha por dezenfado estes trabalhos, que a criaçam suaviza desorte o enfado, que tira aquelle horror, que podia embaraçar o gosto, e asi parece se transforma em natureza que aviventa aquelle mesmo exceso que a gasta. 54 Rezestio valerozamente na Villa de Santarém ao perfiado cerco, com que Miranolim Emperador de Marrocos com treze reyes seos vasallos, apertou aquelle povo, e ferido de sua mam aquelle bárbaro, foi finalizar seos dias nas correntes do celebrado 4 - Segue-se a assinatura: Mamede. 1924.
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Tejo, donde de hum sorro (?) sedeo a morte, o que soberbo e insolente lhe parecia todo o mundo pequena parte, e o que athe li era horror dos viventes ameaçando estragos, ficou horrendo exemplo para dezenganos, podendo a vaidade desvanecer se, pois a grandeza cahe em hum instante. Que para que a estatua de Nabuco se desfizese, de huma pequena pedra gastou o golpe. 55 Começou a governar no anno de 1185, tendo de idade trinta e hum. Foi tam zel[fl. 153-r.]lozo do governo do seo reyno e favorecia a agricultura, que foi chamado o Lavrador, que como sejam estes os servos da Republica, sem elles nam se sustenta por ser imposivel se conserve, sem que deste sangue se anime, mostrando a experiencia que o mao trato que aos lavradores se dá, he ruína da conservaçam, crescendo o dano na falta de fructos, pois para os aver, estes sam os meios. Bem o preveniram os Reyes que tanto os preveligiaram, mas com a variedade dos tempos, se confundiram, sendo elles os necesarios, se tratam como escuzos, devendo favorecer se por todo o caminho, pois a todos sustenta o seo trabalho, porque nam avendo este, fica a terra inculta, e por infructifera nam aproveita, que se o arado a nam verga, nenhuma utilidade se espera. E asi de irremediáveis consequências sam origem os danos que lhe fazem, que quando sam urgentes as necesidades sempre confundem, sendo muito preciza a atençam, que com elles se avia de ter, pois o mais trato que se lhe da, he qual doença da Republica que se a medecina a nam atalha toma forças e malina. E se o favor que antigamente se lhe fazia, hoje se praticara, fora menos a pobreza, por ser qual planta, que reverdece se se rega. 56 Ganhou aos Mouros Silves, Palmela e Elvas, tomou a cidade de Tuy, e outros lugares a el Rey de Leam seo genro. Teve tençam de ir a conquista de Hyeruzalem, que como era este Reyno pequeno theatro para sua faça[fl. 153-v.]nhas, queria na Palestina asombrasem suas proezas, porem nam a executou por alguns respeitos convenientes a conservaçam de sua coroa, mandou contudo socorro aquella empreza, fazendo novas mercês aos cavalleiros do templo, e Hospital para os animar aquella sagrada guerra, que quando ao merecimento se percorre, sempre por novos serviços se espera, e se a boa correspondência falta, o mais ardente dezejo se esfria, por ser qual ao lume agoa que o apaga. 57 Foi muito liberal para todos, e com especialidade para as ordens militares, a de Santiago deo as villas de Alcacere do Sal, Palmela, Almada e Arruda, a de Anes Valhelas, Alcanhede, Alpedris e Juramanha. A do templo a cidade de Idanha. Fundou, ampliou e reedificou as Villas da Covilhã, Gouveia, Cea, Folgazinho, Pinhel, Penamacor, Sortelha, Vallença do Minho, Torres Novas, Penacova, Gondomar, Miranda, Covelinas, Souto, Figueiró, Penella, Coimbra e Montemor o Novo, illustre pátria do gloriozo Sam Joam de Deos, gloria nam so da província de Alemtejo, mas honra de todo o Reyno, cujas ecellentisimas virtudes, foram e seram asombro das idades. E desde este tempo há que se começou a chamar esta villa Montemor o Velho, por se differenciar do que avia pouco se tinha edificado, tendo nos premitivos séculos o nome de
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António Correia da Fonseca e Andrade e a História Manlianense - 14
Medobriga, [fl. 154-r.] depois andando os tempos o de Manliana, e agora caleficando a sua anteguidade, faz gloria de sua velhice, sendo hum dos primeiros povos, que na Luzitania conheceram os antigos, respeitaram os Romanos, venceram os Godos, e com elle asombraram os Sarracenos. As cidades de Vizeu, Bragança e Goarda foram testemunhas da sua grandeza. Refez também a celebre torre das cinco quinas do Castello de Coimbra, fabricada pela mam Herculea, com que apenas se achara povoaçam neste Reyno, que nam deu alguma attençam ao seo cuidado, pelo que foi chamado o Povoador, cognome que mais que todos illustra hum Príncipe, pois mostra e desvello de ampliar o domínio e de ennobrecer com edifícios o seo Reyno. 58 Apremeava os cavalleiros, amparava os pobres, favorecia aos necesitados, era inimigo do ócio, e com o exemplo incitava a todos o bom procedimento, com que era verdadeiro pay da pátria e tam illustre na virtude, que se tem delle opressioens de Santo (athe o diz Souza nas excellencias de Portugal) que quando o Príncipe se exercita em obrar o que deve, só assim grangea o melhor nome, que como he sol para que todos olhem, se o nam faz o perde. 59 Era de mediana estatura, membros avultados e nervos robustos, em seo [fl. 154-v.] retrato antigo, se ve com coroa sobre o elmo, ceptro na mam, espada cingida, armas ricas e manto de cramezim. Reynou vinte e seis annos, viveo sincoenta e sete, e morreo no de 1212. Jaz enterrado na Capella mor do Real Convento de Santa Cruz de Coimbra, em huma sumptuoza sepultura, que lhe mandou fazer El Rey Dom Manoel, o qual mandando lhe abrir a em que estava, se achou seo corpo incorrupto, avendo quatro […] que estava enterrado, prerrogativa que confirma a opiniam que se tinha de sua grande virtude e santidade, que este he o realce que mais que tudo illustra e ennobrece. 60 Foi cazado com a Raynha Dona Aldonça, sua parenta em quinto grão, princeza singular nos dotes que fazem esclarecida huma Raynha, serca lhe de immortal louvor o ter quatro filhas sanctas, a qual falleceo no anno de 1198. Jaz enterrada com El Rey seo marido. Foi filha de Dom Ramom Berenguer, quinto e ultimo deste nome, duodécimo Conde de Barcelona e dos proprietários o decimo Príncipe de Aragam e da Raynha Dona Petronilha. 61 Tirou El Rey Dom Sancho do escudo real que ordenou seo pay, todos os escudetes pequenos, deixando os cinco que formam a cruz, enlaçados nos mesmos cordoens. E nesta forma permanecem na família dos Eças estas [fl. 155-r.] armas, que lhas deo El Rey Dom Pedro primeiro, como a descendentes seos, querendo que nelles se continuasem as primeiras do Reyno, já que com os tempos as mudavam os Reyes. O primeiro que teve este appellido foi Dom Fernando d’Eça, por ser Senhor de Eça em Galiza, que lhe avia dado em tença esta terra, seo parente Dom Fadrique de Castro, Duque de Arina, e o dito Dom Fernando foi filho do Infante Dom Joam e de sua primeira mulher Dona Maria Telles de Menezes, e netto del Rey Dom Pedro o primeiro, e de sua molher a Raynha Dona Inez de Castro. E deste robusto tronco procedem muitos 215
e frondozos ramos, cujos fructos sam procedimentos heroycos, pois com estes se illustram os bem nascidos e os que nam devem tanto a fortuna, tendo os se fazem claros. Como se vio em EmĂlio Icauro, que tendo o nacimento obscuro, o ellegeram por principal do grande Senado. E Cornuello Seisa, que nacendo em Napolis de huma molher baixa foi sete vezes cĂ´nsul, outras tantas Capitam General, e as mesmas sete vezes Dictador. Viriato que de pastos de gados pasou a ser terra dos Romanos. Araces Rey dos Portos. Tholomeo Rey do Egypto e Sria. Iphierates Atheniense e Eumemes, Capitam de Alexandre, todos estes e outros muitos encomendaram as faltas com que naceram fazendo se illustres, com que obraram.â&#x20AC;?