JORNAL DIGITAL
2ª Edição
EXPOSIÇÃO COMEMORATIVA DO
DE 1974
perava… “Esta é a madrugada que eu es e falta fazer” o que se fez, o que se faz e o qu
A partir do cartaz de Rute Ferreira/ESCT
Oficina de Cultura 21 de abril a 8 de maio de 2021
Jornal Digital 2.ª Edição | Exposição Comemorativa do 25 de Abril de 1974 | 1
2 | Exposição Comemorativa do 25 de Abril de 1974 | Jornal Digital 2.ª Edição
Coronel João Andrade da Silva, “Militar de Abril”:
“O 25 de Abril foi a festa da Liberdade”
No passado dia 17 de março, os alunos da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, da turma 12º AV da Escola Secundária Emídio Navarro estiveram à conversa o Coronel João Andrade da Silva, um “Capitão de Abril”, que no dia 25 de Abril de 1974, então jovem tenente, foi um dos protagonistas da revolução que, em Almada, no Cristo-Rei , levou ao nascimento do atual regime democrático.
2ª Parte
“A PIDE era uma organização criminosa que matava. No dia 25 de Abril, as únicas vítimas foram quatro mortos e dezenas de feridos pela PIDE” Jornal Digital 2.ª Edição | Exposição Comemorativa do 25 de Abril de 1974 | 3
Prof. Amélia Pires - A PIDE não se rendeu logo, pois não? Ainda foram disparados tiros e morreram pessoas, ainda houve muitos feridos. Aquela ideia de que não houve nenhum tiro não é real. Coronel João Andrade da Silva - A PIDE ficou meio confusa no meio de tudo isto. Na verdade, eles achavam que nós vínhamos no primeiro de maio, associaram muito isto aos movimentos de massa, ao primeiro de maio e ao comunismo. Mas a PIDE também parou, pois, no meio de tudo o que se estava a passar, falava-se muito no Spínola e associavam-no ao MFA, viam-no como ligação entre todos (PIDE, MFA). No entanto, ele era só um general. A PIDE matou, sim. As pessoas cercaram o quartel general da PIDE e foi aí que os agentes entraram a matar. Dispararam, mataram e fizeram vítimas, sim! Morreram quatro pessoas e houve vários feridos.Tem de se dizer as coisas de forma muito clara! A PIDE era uma organização criminosa que matava e ali deixou a sua marca, matando pessoas que estavam, naquele momento, somente a manifestar-se. Só não houve mais mortos, porque, entretanto, chegaram outras forças. Já agora, na sequência dessa sua pergunta. Nós, a escola da artilharia, estávamos na Calçada da Ajuda e começou a chover, uma chuva miudinha, (só para verem as dificuldades da altura) chegaram umas pessoas da António Maria Cardoso que nos informaram que a PIDE estava a matar, mas isto são coisas da tropa, portanto, não nos podemos mobilizar sem permissão. Há coisas que se contarmos à juventude de hoje nem acreditam. Nós tínhamos uns rádios, uma coisa muito grande que se chamava racal, mas quando chovia não funcionava. Portanto, não tínhamos comunicação com ninguém, era assim na guerra. A tropa tem sempre um comandante, queríamos comunicar através de um camarada nosso para pedir autorização, mas a atmosfera estava ionizada, não conseguimos estabelecer comunicação e não nos mobilizámos. Sim, a PIDE matou e mataria mais. Entretanto, os meus camaradas de Estremoz foram para lá, cercaram aquilo e foram desarmá-los. Depois, não foram julgados.
“Os julgamentos dos pides foram meras ficções. Havia muito cumplicidade. Aliás, o fascismo nunca foi julgado” Prof. Amélia Pires - Essa não sabia. Nunca foram a julgamento? Ainda mataram e feriram uma data de pessoas, não é? Coronel João Andrade da Silva - Tudo isto funcionou muito mal. Houve alguns julgamentos, mas foram meras ficções. Os processos estavam mal organizados e era tudo muito complicado. Eu assisti a uns julgamentos com o “chamado” Juiz Barata e ele dizia que não queria julgar, dizia: “Nem aqui, nem em parte nenhuma se pode julgar estes homens, porque os processos estão muito mal organizados.” Havia uma grande cumplicidade. Muitos dos juízes que lá estavam eram coronéis de antigamente, que estiveram na guerra de África e a polícia, a PIDE em África, era a polícia de informação do exército. Portanto, havia uma cumplicidade, não foram julgados, não foram punidos. Aliás, o fascismo não foi julgado e é, por isso, que ainda hoje, agora, neste preciso momento, querem pintar de novo estas coisas todas, até dizer que o Salazar foi um mito. Até há poemas que o retratam como um mito, que queria fazer o Quinto Império.
“Os jovens têm um papel importante em causas como a defesa do ambiente: É preciso conciliar a cultura, a festa e a cidadania” Mas há aqui uma coisa muito interessante que gostava de dizer aos mais jovens. Eu, quando estava na quarta classe, tinha um amigo chamado Marcelino. Vivia no Funchal. Eu era um aluno razoável e, às vezes, substituí os professores quando eles não estavam. E, então, o meu professor incumbiu-me de ser um género de explicador do meu colega Marcelino. Eu era um explicador rígido, a minha mãe dizia: “Oh pá! Tu és muito rígido”. E eu dizia: “É pá! mas ele tem que passar”. Afinal, Marcelino passou a quarta classe e até me ofereceu a melhor prenda da minha vida, um carro da verga feito com arames. Marcelino vivia numa furna com a sua família e ele até não era dos mais pobres. O seu pai era um homem com alguma importância, era um condutor de viaturas. Aqueles eram tempos muito complicados, muito difíceis.
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Manuel Silva - Apesar de já ter desenvolvido um pouco, como se sente quanto à participação política dos jovens na atualidade, em comparação com os tempos do 25 de abril?
ter vergonha do que viveram, porque também foram heroínas e não se deviam esquecer do muito que o 25 de Abril lhes deu, apesar das muitas injustiças que há.
Coronel João Andrade da Silva - Antes do 25 de abril, não tínhamos capacidade nenhuma, estávamos limitados. Agora, parece-me que nós temos de passar o testemunho e também me parece que os jovens têm um papel importante em causas como a defesa do ambiente.
“Há de facto desigualdade. Não é culpa do 25 de Abril, é sim produto do regime anterior”
Os jovens, hoje, têm uma atividade que nós não tínhamos, mas há alguns que andam um bocado distraídos e eu penso que é preciso conciliar a cultura, a festa e a cidadania. E a cidadania é também intervir, precisamente na defesa do ambiente, porque o “covid” é capaz de passar, mas a ameaça que nós estamos a fazer ao ambiente não vai passar. Eu acho que os jovens, comparados com os do meu tempo, têm uma intervenção muito maior do que nós tínhamos. Todos queremos que tenham mais intervenção, queremos que não se distraiam tanto e, se todos contribuírem, podemos fazer a diferença. Os jovens, hoje, em todos os pontos, quer do ponto da tecnologia, quer do ponto intelectual, quer do ponto da cidadania, quer do ponto de vista da intervenção política, estão muito mais longe do que nós. Nós tínhamos a escola e era muito limitada, os temas eram mais restritos, em casa não se falava de política. Eu sou filho de um capitão do exército, na minha casa e em algumas casas, só falávamos de Deus e da Pátria, a minha mãe era muito religiosa e o meu pai tinha uma característica muito importante, a honestidade.
“Muitas pessoas passaram uma esponja sobre aquilo que viveram e o mais grave é que muitas delas criticam os jovens” Bárbara Rodrigues - Gostaria de perguntar, como é que, na sua opinião, pessoas que viveram esse período de opressão e de fascismo, hoje vêm apoiar e tolerar um partido que tem muitos indícios de também ser fascista. Coronel João Andrade da Silva - É um problema incompreensível, julgo que muitas pessoas passaram uma esponja sobre aquilo que viveram e o mais grave é que muitas dessas pessoas criticam os jovens. Passaram por essa experiência e, hoje, até defendem determinadas “coisas”. Ontem, estive a ler um texto do bispo de Beja. Nos anos de 1960, dez pessoas morreram por falta de alimento. A mortalidade infantil era uma coisa terrível e há pessoas que se esqueceram disso. A minha crítica é muito severa em relação a essas pessoas, que deviam dar o testemunho daquilo que passaram e não
Há um esquecimento e há uma inversão da História. Há aqui também um fenómeno que se chama dissonância cognitiva. As pessoas passaram tão mal que, às vezes, algumas delas, têm alguma vergonha e algum receio de assumir aquela história e, por um processo de dissonância cognitiva, alteram e fantasiam um pouco. Há de facto desigualdade, mas também é preciso compreender que alguma desta desigualdade ainda é produto do regime anterior. Há muito a fazer, mas, felizmente, apesar das circunstâncias pandémicas que estamos a viver, se as coisas não tivessem mudado substancialmente, a desgraça, as tragédias familiares seriam muito maiores.
“O Padre António Vieira (séc. XVII) foi a primeira voz que denunciou a escravatura. Salazar que fez precisamente o inverso em África” Prof. Amélia Pires - Há bocado falou do Quinto Império. Acha que Salazar é visto, neste momento, numa perspetiva messiânica? Coronel João Andrade da Silva - Nós é que fazemos isso. Respondendo à professora, eu tenho uma paixão pelo Padre António Vieira e, de facto, nós os jovens, quando fizemos o 25 de Abril, pensávamos que, acabada a guerra, podíamos construir o Quinto Império. O Salazar não tinha nada a ver com o Quinto Império, era uma coisa muito mais objetiva. O Salazar tinha um medo terrível do comunismo. Portanto, ele entendia que a guerra colonial era a última fronteira para travarmos o comunismo. Salazar, ou não leu nunca o Padre António Vieira ou não percebeu nada do que o Padre escreveu. Vieira foi um grande herói, foi uma primeira voz que denunciou a escravatura, ao contrário de Salazar, que fez precisamente o inverso em África.
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Portanto, uma inversão de valores. Por acaso, um camarada meu, que fez o 25 de Abril, diz isso por uma coisa muito simples. Ele não compreendeu a descolonização. Nós, os jovens, pensávamos - os jovens pensam coisas muito interessantes - nós, “os putos” pensávamos que, acabada a guerra, íamos todos de braços dados por aí a fora, África e Portugal e que íamos fazer o Quinto Império. Sim, alterando aquela ditadura, acabava a guerra, acabava a exploração e nós, nos estados livres com autodeterminação, íamos ser o Quinto Império. Depois, as coisas não foram bem assim! Aconteceu tudo ao contrário, mas esse meu colega ficou revoltado com o processo da descolonização e, agora, ele é que está a fazer a mitificação do Salazar. O Salazar, e agora vou falar não só como cidadão, vou falar como psicólogo, era uma personalidade doente: o Salazar, o Hitler, o Mussolini e outros ditadores, precisavam de ser tratados em psiquiatria. São doentes, são doentes até porque como é que um indivíduo pode compreender a sociedade, se não saía daqueles palácios, não falava com ninguém, nunca foi a África? O Salazar e as pessoas que o rodearam, a maior parte das pessoas que o rodearam, era gente muito…
Se tivesse havido uma visão de futuro do Salazar, após a segunda guerra mundial podia ter-se alterado bastante, não teria havido guerra colonial e hoje podíamos estar a viver numa sociedade mais harmoniosa. Portugal e os países de expressão oficial portuguesa.
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Prof. Amélia Pires - Pequenina, acima de tudo, não é? Gente muito pequenina com uma mentalidade muito fechada. Coronel João Andrade da Silva - Sim! E muito dominada pelo seu DNA. O nosso DNA não é muito positivo, nós temos uma predominância de DNA para não sermos uns indivíduos terríveis, precisamos da socialização, da cidadania, de encontrar pessoas abertas e falar dessas coisas. Porque, senão, se nós formos só nós, teoricamente e acho que cientificamente, dizem, somos a parte inata e a parte adquirida. A parte inata é o DNA e dizem que tem uma predominância em cada um de nós que nem é bom nem é mau, é egoísta, é egocêntrico, que tem uma predominância em nós de 60%, portanto 60% de nós somos instinto e, então, queremos só o nosso interesse. Portanto, é a socialização, é a cidadania, é a fraternidade, é a solidariedade que nos humaniza, porque senão seríamos os leões da selva.
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Oficina de Cultura Av.ª D. Nuno Álvares Pereira, 14 M 2800 -174 Almada Oficina Tel.: 212 724 050 de Cultura
Horário
Av.ª D. Nuno Álvares Pereira, 14 M 2800-174 Almada Tel.: 21 272 40 50
Terça a sexta das 10h30 às 13h e das 14h às 18h Sábados das 10h30 às 13h Dia 25 de Abril das 10h30 às 13h Encerra aos domingos e feriados Horário Terça a sexta das 10h30 às 13h e das 14h às 18h
Em conformidade com a legislação e as recomendações Sábados das 10h30 às 13h da DGS as visitas ficam condicionadas a: 2
Limite de 30 Dia pessoas emabril simultâneo (nos às 300 m ) 25 de das 10h30 13h Marcação prévia para grupos limitados a 10 pessoas;
Encerra aos domingos e feriados
Em visita livre deve ser mantido o distanciamento social (2m em espaços fechados); Uso obrigatório de máscara no interior do equipamento
Em conformidade com a legislação e as recomendações da DGS as visitas ficam condicionadas a: Limite de 30 px em simultâneo (nos 300 m2) Marcação prévia para grupos limitados a 10 pessoas; Em visita livre deve ser mantido o distanciamento social (2m em espaços fechados); Uso obrigatório de máscara no interior do equipamento
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