EfkÓZ`Xj [f ;`X SANTA CATARINA Quarta-feira, 13 de maio de 2015
EDIÇÃO COMEMORATIVA
Fundado em 13 de maio de 1915, “O Estado” transformou-se, ao longo de quase um século, em referência cotidiana dos principais fatos e das grandes causas estaduais. Nesta edição especial, com 80 páginas divididas em dez cadernos, o Notícias do Dia relembra a história do jornal e de Santa Catarina por meio da memória daqueles que atuaram diretamente na criação de um ícone da imprensa.
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ESPECIAL
O ESTADO
EDITORIAL
Uma instituição de Santa Catarina
MARCO SANTIAGO/ND
O
Grupo RIC, por meio do jornal Notícias do Dia, recupera, neste caderno especial, a longa e excepcional trajetória de “O Estado”, fundado em 13 de maio de 1915, portanto, há 100 anos. O jornal não foi apenas um veículo de comunicação impressa. Muito mais do que isso, transformou-se, ao longo de décadas, numa referência cotidiana dos principais fatos, das grandes causas, comprometido com o progresso e a transformação socioeconômica catarinense. Aquilo que o Grupo RIC defende como uma de suas bandeiras atuais – os diferenciais de Santa Catarina no contexto brasileiro – esteve presente nas páginas de “O Estado”, com a valorização do povo catarinense, da nossa indústria, da nossa agricultura, das artes, dos esportes, do nosso modelo de desenvolvimento humano e econômico. “O Estado” talvez tenha surgido como só “mais um jornal”, num tempo em que a comunicação era muito restrita aos veículos impressos, o rádio ainda não tinha sido implantado no país, a televisão e a internet não eram nem sonhos futuristas, não estavam presentes sequer nas obras de ficção científica. A notícia, a opinião, os reclames – nome que se dava à publicidade – formavam o universo do jornal, da leitura, naquela província isolada que era Florianópolis, cuja ligação com o Continente ainda se dava por intermédio do transporte marítimo. A ponte Hercílio Luz só seria inaugurada em 1926. O jornal atravessou o século 20 trazendo em suas páginas o que se considerava mais relevante para a apreciação dos leitores. Da primeira guerra mundial à virada do milênio, “O Estado” cumpriu seu papel de maneira apaixonada e, às vezes, até engajada. Foi um jornal político-partidário, quando isso no Brasil era comum. Foi impresso em linotipo, quando essa era a tecnologia mais acessível. Ingressou na era offset quando, numa visão inovadora do diretor José Matusalém de Carvalho Comelli, entendeu que era chegada a hora de viver uma grande transformação, dando continuidade ao projeto de Aderbal Ramos da Silva. Lá se vão 43 anos desde que “O Estado” passou a ser impresso em offset. E foi apenas a primeira das revoluções gráficas e editoriais que o jornal encamparia nos anos seguintes, com uma nova e moderna impressora – uma verdadeira “locomotiva” gráfica – instalada na nova sede, um parque industrial na SC-401. Tempos depois, em 1996, e de novo devido à visão inovadora de seus diretores, ganhou completa
Mário J. Gonzaga Petrelli FUNDADOR E PRESIDENTE EMÉRITO
informatização, adequando-se às novas características da mídia impressa mundial. Tudo isso foi fruto de muito trabalho e perseverança, qualidades indiscutíveis daqueles que acreditaram na força de “O Estado” como o jornal-síntese da alma catarinense, circulando em quase todos os municípios, com uma tiragem recorde para a época, chegando a empregar diretamente 500 trabalhadores e, indiretamente, mais de 2.000 pessoas. Esta edição especial alusiva aos 100 anos de fundação de “O Estado” é uma homenagem do Grupo RIC aos empreendedores que construíram essa rica história. Comprometidos com Santa Catarina, com os ideais da livre iniciativa, com o desenvolvimento socioeconômico, com a informação correta e isenta, com o posicionamento editorial firme e sintonizado com as imensas demandas da sociedade, os dirigentes de “O Estado” legaram à história catarinense um extraordinário exemplo empresarial. Não apenas um negócio, do ponto de vista econômico, mas, em especial, um instrumento de comunicação que ajudou a formar gerações, a formar opinião e a engrandecer Santa Catarina. O Grupo RIC entende que a comunicação regional é o desafio a se enfrentar e realizar todos os dias. Pratica essa política editorial tanto nos veículos eletrônicos – a RICTV Record, a Record News e os portais RIC Mais e NDonline – quanto no veículo impresso, o nosso Notícias do Dia. O Estado fez isso durante décadas, valorizando o noticiário catarinense. E essa proximidade de propósitos nos dá a certeza do acerto em optarmos pelo foco regional. Portanto, neste 13 de maio, homenageamos o centenário do jornal, resgatando as grandes coberturas, os personagens que atuaram na redação e na administração, os temas mais destacados, os exemplos de garra, determinação e superação que marcaram a sua longa trajetória. Esta história só pode ser contada agora pela destacada atuação de centenas de profissionais sob o comando de José Matusalém Comelli, que levou o jornal à era moderna, alguns retratados nesta edição especial. Mas também graças ao apoio de anunciantes, das lideranças empresariais e políticas catarinenses e dos milhares de assinantes que acompanharam “O Estado” por décadas. As páginas de um jornal retratam a história de uma sociedade. E aqui está a nossa modesta contribuição, para que não se percam essas importantes referências que “O Estado” legou aos catarinenses. Marcello Corrêa Petrelli Presidente executivo do Grupo RIC em Santa Catarina
CADERNO ESPECIAL
Carlos Damião, Paulo Clóvis Schmitz, Edson Rosa, Stefani Ceolla
O ESTADO
TEXTOS
100 anos
Marcello Corrêa Petrelli PRESIDENTE EXECUTIVO RIC SC
Albertino Zamarco Jr.
Flávio Tin, Eduardo Valente, Bruno Ropelato, Marco Santiago, Arquivo pessoal Marco Cezar, Arquivo pessoal Rogério Junkes e Acervo OE FOTOGRAFIA
Cristiane Severino
DIRETOR ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO
PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO
Angela Muniz EDIÇÃO
Reynaldo Ramos
Marcelo Santos REVISÃO
DIRETOR SUPERINTENDENTE
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Joyce Reinert EDIÇÃO DE IMAGENS
Luís Meneghim
Lauro Cordeiro
DIRETOR DE REDAÇÃO
GERENTE COMERCIAL
Adriana Ferronatto
Hannah Mattos
EDITORA-CHEFE
GERENTE DE OPERAÇÕES
Con ra a edição multimídia em www.ndonline.com.br
Santa Catarina - 13 de maio de 2015.
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Entrevista. José Matusalém de Carvalho Comelli
“O Estado” foi uma grande escola, uma universidade aberta BRUNO ROPELATO/ND
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uase 45 anos à frente da direção de “O Estado”, uma vida dedicada ao jornal. Ele tinha 27 anos de idade quando recebeu a missão, dada pelo sogro, Aderbal Ramos da Silva. Assumiu a administração quando a empresa tinha apenas oito funcionários, redação deficiente, circulação restrita, maquinário antiquado. Nas três décadas seguintes, o jornal chegaria a quase 500 funcionários e dispunha de uma das mais modernas impressoras do mundo, capaz de imprimir 40 mil cadernos por hora. José Matusalém de Carvalho Comelli nunca imaginou, na sua juventude, que pudesse chegar tão longe, tornar-se o comandante de um império empresarial, do qual “O Estado” era apenas uma parte. Nascido em São José em 1938, teve uma vida de cigano na infância, porque o pai era coletor de impostos e mudava com frequência de cidade. Morou em Tubarão, Araranguá, Piratuba, Videira, Lages. Nesta, fez o ensino médio, o antigo cientí!co, no Colégio Diocesano. Buscou qualificação, ao mesmo tempo, como técnico em contabilidade. Deixou Lages para cursar direito em Florianópolis, onde chegou em 1957. Aqui cumpriu sua trajetória do ensino superior e acabou sendo destacado para cargos executivos no Grupo Hoepcke, presidido pelo sogro. “Foram experiências muito ricas em minha vida, ‘O Estado’ foi uma parte importante disso, o jornal ganhou minha extrema dedicação”, conta nesta entrevista, concedida em seu apartamento, no Centro de Florianópolis, no dia 4 deste mês.
O senhor veio para Florianópolis em 1957 para cursar direito. Como é que foram os primeiros tempos de vida na Capital? Vim estudar, escolhi a carreira de advogado. Ao mesmo tempo, comecei a trabalhar no Senai, por indicação de Celso Ramos (fundador e presidente da Fiesc – Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina), que meu pai conhecia. Lá fui subordinado de Alcides Abreu, que era também meu professor no curso de direito. Além de Alcides Abreu, quem foram os outros professores que marcaram sua passagem pela faculdade? Pedro Moura Ferro, Henrique Fontes, Ferreira Bastos, Osmundo Wanderlei da Nóbrega, Alves Pedrosa, Telmo Ribeiro, Othon Gama d’Eça, Aldo Luz, Edmundo Acácio Moreira, Paulo Blasi, Valdemiro Cascaes, José do Patrocínio Gallotti e João Baptista Bonnassis são alguns dos quais me lembro agora. Eram professores do mais alto gabarito, alguns fundadores da faculdade, que estava sendo federalizada e deu origem à UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).
Advogado por formação, Comelli comandou, modernizou e transformou o jornal numa instituição de Santa Catarina
Como começou o seu envolvimento com a política estudantil? Entrei para o Centro Acadêmico 11 de Fevereiro e acabei eleito presidente. Isso entre 1959 e 1960. Fui redator da Folha Acadêmica, aceitando convite de Márcio Collaço. Acho que porque já tinha uma experiência com jornal estudantil em Lages, “O Planalto”, que era um jornal diferente, ousado.
Cursei direito, z política estudantil e fui vicepresidente da UNE entre 1960 e 1961.
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ESPECIAL
O ESTADO
BRUNO ROPELATO/ND
Entrevista. José Matusalém de Carvalho Comelli
Me engajei na campanha de Celso Ramos ao governo e de Lott à Presidência, em 1960.
militância em Santa Catarina foi um passo para chegar à direção da UNE (União Nacional dos Estudantes)? De fato, participei de um encontro nacional de estudantes e acabei ingressando na chapa que tinha Oliveiros Guanais Aguiar como candidato a presidente. O pai do atual senador Lindbergh Farias (que também foi presidente da UNE nos anos 1990), Luiz Lindbergh Farias, era um dos vices. Fui eleito como outro vice-presidente, mas acabei exercendo a presidência durante grande parte do mandato, porque os dois eram estudantes de medicina e não tinham tempo para cuidar da entidade. Eu estudava direito, era mais fácil para mim. Nosso mandato foi exercido entre os anos de 1960 e 1961.
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O senhor foi um estudante de esquerda? Claro, se não fosse de esquerda, não entrava no movimento estudantil. Chegou a se vincular ao PCB, então na clandestinidade? Tinha simpatia pelo partido, ou eles tinham por mim, não sei. [Nota: a chapa da UNE resultou de um acordo entre estudantes ligados ao Partido Comunista Brasileiro, à Juventude Universitária Católica e esquerdistas independentes, entre os quais, Comelli.
O senhor se formou e já partiu para a advocacia? Sim, me formei em 1961 e em janeiro de 1962 fui para Campos Novos advogar. Fiquei lá até 1964. Casei em 1964 com a Sílvia. Aderbal Ramos da Silva era um político moderno para a época? Ele era um político liberal, progressista, um homem muito culto. Lia muito, tinha uma excelente biblioteca, preferia os livros de história e as biografias, estava sempre estudando, se informando. Dizem que depois de casar com a !lha dele, ele lhe tinha como um !lho. Dizem. Realmente ele me tratava com muito carinho, respeito e con!ança. Até na velhice, quando estava doente, sempre me procurava para conversar. Estava praticamente cego nos últimos anos de vida, ia todos os domingos na minha casa, conversávamos muito.
Doutor Aderbal era um homem muito culto, um político liberal, progressista, lia muito.
Quando estava na direção da UNE chegou a ir à União Soviética (hoje Rússia). Qual foi o evento lá? Fui a um congresso sobre Democratização do ensino superior. Durou uma semana. Era uma programação muito intensa, nunca tinha visto daquilo. Depois viajamos pelo Cáucaso. Quando estávamos na Europa, soubemos da renúncia do presidente Jânio Quadros [em agosto de 1961]. Jango [João Goulart, o vice-presidente] estava em Paris, foi uma confusão. Quando o senhor conheceu a filha de Aderbal Ramos da Silva, Sílvia? Eu estava engajado na campanha de Celso Ramos ao governo do Estado (1960), participava dos comícios, discursava como líder estudantil. Nos conhecemos num desses encontros. Inclusive discursei num comício do Marechal Lott [Henrique Teixeira Lott], candidato da coligação PSD-PTB à presidência, derrotado em 1960 por Jânio Quadros.
Um ano depois do casamento o senhor assumia a direção de “O Estado”. Como foi esse processo? Rubens de Arruda Ramos, o diretor desde a década de 1950, morreu em 1964. Em 1965, Aderbal me pediu para cuidar do jornal. Mas eu não assumi logo, não coloquei meu nome no expediente, era uma forma de prestigiar o Dominguinhos (Domingos Fernandes de Aquino), que também era muito ligado ao doutor Aderbal e ficou até 1967 exercendo o cargo. Mas eu trabalhava em “O Estado”, ia aprendendo e observando, me preparando para assumir a direção geral. Quando o senhor assumiu de fato? Em 1967. Era um jornal pequeno, quase todos os funcionários trabalhavam na gráfica, ainda era o processo de linotipo. Convidei alguns amigos para incrementar a redação, levei Marcílio Medeiros Filho, Luiz Henrique Tancredo, Raul Caldas Filho, Flávio Amorim, Amaral e Silva, Jair Francisco Hamms, Carlos Alberto Silveira Lenzi. Era um time, que contou com a participação do Amarelo [Osmar Schlindwein], ele já estava lá, era uma espécie de “faz tudo”. No início, a equipe trabalhou sem remuneração, o objetivo era dar uma nova cara ao jornal, eles acreditavam no projeto e eu tinha ido com carta branca do doutor Aderbal.
Assumi a direção de “O Estado” em 1967, era um jornal pequeno, ainda tinha a linotipo.
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ESPECIAL
O ESTADO
Entrevista. José Matusalém de Carvalho Comelli ACERVO OE/ND
Levei um grupo de amigos para me ajudar no jornal. Ninguém era remunerado, tínhamos um projeto.
lém do jornal o senhor atuava no Grupo Hoepcke? O doutor Aderbal quis me colocar como diretor quando era noivo da Sílvia, mas eu não quis. Queria atuar como advogado e fui advogado do grupo. Mas acabei, por insistência dele, sendo vice-presidente da fábrica de bordados. Mais tarde (1978), assumi a presidência do grupo, um período de forte expansão, construímos o Centro Comercial ARS, a nova fábrica de bordados no Roçado, uma fábrica de gelo e farinha de peixe em Governador Celso Ramos, a nova sede de “O Estado” na SC-401.
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A nova proposta do jornal “O Estado” levou quanto tempo para aparecer? Era um processo, fazia parte da expansão do próprio Grupo Hoepcke, o jornal era parte do crescimento do grupo. Já tínhamos o propósito de modernizá-lo não apenas quanto ao conteúdo, mas com nova tecnologia, a impressão offset, que era muito mais dinâmica, limpa, possibilitava uma apresentação gráfica melhor. Fomos avançando nesse objetivo, até 1972, quando finalmente o jornal mudou de forma radical. Aquele ano marcou a entrada na fase de offset e a mudança para a Felipe Schmidt. Qual a sua avaliação da experiência? Foi muito boa. Nós estávamos certos, optamos pelo melhor caminho para transformar o jornal, torná-lo grande. Trouxemos jornalistas do Rio Grande do Sul, todos experientes, acostumados a produzir jornais modernos. Em pouco tempo – cerca de cinco anos – a sede da rua Felipe Schmidt tornouse pequena, não havia espaço su!ciente para o que planejamos. Precisávamos de mais espaço, um parque industrial.
Mudança para a sede da SC-401 marcou a história do jornal ACERVO OE/ND
O Dr. Aderbal acompanhava essas mudanças de perto? Ele era ouvido, mas eu tocava, era o que eu mais gostava de fazer. O doutor Aderbal estava sempre presente, contribuindo, dando opiniões. A sede da Felipe Schmidt era muito próxima do escritório dele, ficava fácil esse contato. O parque industrial no Saco Grande correspondeu ao que os diretores e funcionários esperavam? O jornal deu um salto. A expansão que imaginávamos quando chegamos, em 1967, ocorreu a partir do momento em que nos transferimos para a SC-401, mais de dez anos depois. “O Estado” cresceu muito, tornou-se definitivamente estadual, circulava em todo o território catarinense, tinha sucursais nas cidades-polo, tinha muitos anunciantes e assinantes. Foi o auge, realmente o auge, entre o fim da década de 1970 e o fim da década seguinte. Virou realmente um jornal grande.
Detalhe da tapeçaria do artista Tirelli: sede da João Pinto
A antiga sede da João Pinto
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Entrevista. José Matusalém de Carvalho Comelli oltando um pouco no tempo: “O Estado” era conhecido como “jornal do PSD”. Como vocês, os jovens que assumiram em 1967, lidaram com isso? Quando assumi a direção de fato em 1967, tinha como meta, como proposta de inovação, a desvinculação da questão político-partidária. Precisávamos mudar conceitos. Até aconteceu um episódio interessante. Naquela época, houve um incidente com um ônibus e, por causa do transtorno causado, aquilo acabou virando notícia. O dono da empresa de ônibus foi se queixar: “Mas esse jornal não é nosso [do PSD]?”. Chamado para me explicar, eu respondi: “É nosso. E de muita gente”.
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Sem dúvida. O Fábio Comelli (filho), que era diretor executivo do jornal, abraçou essa missão. Foi uma luta dele, com apoio dos diretores, mas ele se empenhou, ele correu atrás, ele tornou possível. O jornal teve a sua quarta revolução, se contarmos o offset em 1972, a mudança para a SC-401 em 1977 e a compra da rotativa Uniman em 1983. Foi uma das maiores transformações pelas quais passamos, com um sistema de ponta (McIntosh, da Apple), o mais moderno daquela época.
O que mais lhe marcou na trajetória no jornal? Do jornal em si, o seu comprometimento com as grandes causas de Santa Catarina. Tenho certeza que deixamos esse legado, algo marcante, importante para Eram vínculos (ou vícios) difíceis de vencer, mas o Florianópolis e para o Estado. Adotamos bandeiras senhor levou esse propósito adiante? para a sociedade, derrubamos tabus. Das pessoas, Claro que não se poderia desconsiaquele contato com os funcionários, derar a história do doutor Aderbal, do que fazia parte da minha formação. PSD e de “O Estado”, tudo isso estava Eu orientava, estimulava, estava junmuito vivo na cidade. Mas era precito. Nunca ofendi um funcionário, não so seguir adiante. Na inauguração da repreendi ninguém na frente dos ousede de “O Estado” na Felipe Schmidt, tros. Tinha uma relação de respeito, Nossa proposta, entre com a presença do governador Colomafinal, eram eles que faziam o jornal bo Salles, eu citei uma frase clássica chegar às bancas e aos assinantes; da 1967 e 1972, era de Rui Barbosa durante meu discurso: limpeza à redação, do comercial ao modernizar o jornal, “A pátria não é ninguém; são todos”. industrial, todos eram importantes. inclusive implantar Completei: “Um jornal também”. Era o offset. isso que eu defendia, embora respeitasHouve alguns contratempos nesse a história de “O Estado”, do PSD, do sa trajetória. Poderia falar dessas próprio doutor Aderbal. dificuldades? Realmente, alguns erros foram coNo seu auge, o jornal chegou a ter metidos. Faltou readequação, faltou 500 funcionários, confere? capital para corrigir as deficiências. É verdade. Mas aquilo era um exagero, havia gente demais, não precisava tanta gente. Ao Alguma mágoa? longo do tempo fomos ajustando e chegamos ao número Nenhuma. Não guardo mágoas. ideal para o nosso tamanho: 300 funcionários. Saudade do jornal? Vivendo o auge na década de 1980, “O Estado” viu Naturalmente que sim. Saudade da rotina, dos emprediante de si um concorrente forte, o “Diário Catarinense”, gados, do pessoal mais simples ao pessoal da redação, lançado em 1986. Que tipo de abalo o jornal sofreu? dos bons papos, das histórias. Sempre convivi muito O abalo não estava no concorrente em si, mas no que bem com os funcionários. E saudade também da nossa ele trouxe por trás, a Globo. Era uma retaguarda imporpresença diária nas bancas e nas casas dos assinantes. tante, uma artilharia por trás. E eles vieram com muita Das grandes reportagens que marcaram época, as cosede de expansão, muita agressividade, tentaram comberturas das enchentes (Tubarão, Videira, Vale do Itaprar “O Estado” várias vezes, mas nós resistimos, aguenjaí), da cobertura do acidente da Transbrasil, campanha tamos, procuramos inovar na tecnologia, na redação, fidas diretas, eleições municipais ou nacionais, eleição de zemos a nossa parte. Tancredo, coberturas esportivas. Nós fizemos parte da história, nós fomos a história, nós somos a história. Para A informatização em 1996 foi um passo importanos jornalistas, o jornal foi uma grande escola, sempre te dessa resistência? foi uma universidade aberta.
Claro que tenho saudade do jornal, do seu comprometimento com Santa Catarina. Sinto falta da rotina dos funcionários.
www.tractebelenergia.com.br
A ADMIRAÇÃO DOS CATARINENSES PELO JORNAL O ESTADO É COMO ENERGIA RENOVÁVEL: NUNCA ACABA.
Uma homenagem da Tractebel ao jornal que estará para sempre no coração de Santa Catarina.
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Nilton começou a trabalhar como jornaleiro aos nove anos para ajudar os pais nas contas da casa
ESPECIAL
O ESTADO
BRUNO ROPELATO//ND
O Estadoooooo!!! O grito do jornaleiro ecoa na memória de uma época
O
dia começava cedo para Nilton da Silva, os irmãos Jucélio e Jair Carlos Pereira, vizinhos no morro da Igreja, no Maciço da Costeira do Pirajubaé, e tantos outros meninos entre 8 e 15 anos, que tagarelavam baixinho para romper o silêncio da madrugada, encolhidinhos sobre jornais velhos amontoados num dos cantos da parede. Apertada, era a única sala iluminada no galpão retangular que funcionava como garagem para diaristas e mensalistas em um dos primeiros estacionamentos privados do centro histórico da cidade, na hoje supervalorizada esquina das ruas Antônio Luz e João Pinto com a avenida Hercílio Luz. Para Nilton, a lida na rua começou em 1979, quando completara nove anos. O menino precisava trabalhar para ajudar pai e mãe nas contas da casa, e a rotina de jornaleiro lhe pareceu uma boa profissão. “Pouco ou muito, entrava dinheiro todos Aos 16 anos, Nilton os dias. Foi vendendo jornal que ganhei primeiro dinheirinho. A vantagem dos Santos assinou meu era fazer freguesia fiel, o que garantia contrato para quase sempre o mesmo valor”, diz Niltrabalhar durante ton, que durante vários anos manteve a de 40 a 50 exemplares vendidos um ano como garoto- média por dia. “Na época, dava para faturar propaganda uma féria aproximada de 18 mil cruzeiros no final da manhã”, diz. Na época, o jovem jornaleiro já se diferenciava dos demais por uma característica incomum e que mais tarde passou a ser copiada pelos demais. Aparentemente frágil, a voz final de adolescente em formação ganhou amplitude e o que no começo soava como um gritinho, aos poucos se avolumou e ainda hoje ecoa na memória de milhares de leitores da época. Surgia, assim, O Estadooooo, a marca de uma época que parecia próspera, mas que antecedeu as décadas de decadência e insolvência do “mais antigo” e, durante muitas décadas, mais importante jornal diário de Santa Catarina. Em 1986, o grito O Estadooooo virou, definitivamente, marca e marketing. Aos 16 anos, Nilton dos Santos foi levado pelo então gerente industrial Valmir Pires Lagoa à sala da direção do jornal, na sede da SC-401, e lá assinou contrato para trabalhar durante um ano como garoto-propaganda em campanha publicitária encomendada à agência AS Propague. O mote da campanha era fortalecer a marca do jornal na cidade e região e nas principais cidades do Estado, para fazer frente à concorrência que começava a se estabelecer em Santa Catarina. “Eu nunca tinha entrado em um estúdio antes. Mas deu certo, o grito O Estadooo pegou, e acabei conhecendo várias cidades do Estado nas viagens para divulgar a campanha publicitária”, diz. Nilton não se recorda exatamente quanto lhe rendeu o
contrato de garoto-propaganda, mas garante que correspondia, na época, a cem jornais vendidos por dia. “Foi um dinheiro importante”, diz Nilton da Silva, que nunca quis ser pescador, já foi dono da própria empresa e hoje presta serviços terceirizados na área da construção civil. É especialista em colocação de pisos, forros e outras obras em gesso. Filho de família pobre, mas honesta, o menino que cresceu nos morros da Costeira e conheceu cada uma das ruas a cidade velha, teve em “O Estado” o primeiro ganha-pão, seu primeiro emprego informal, sua primeira escola da vida. E não esconde que sente um aperto no peito sempre que trafega pela SC-401 e passa diante da antiga sede do jornal.
Rotina de jornaleiro Era diante da antiga ponte do Vinagre, no canalizado rio do Bulha, e ao lado da sede da Capitania dos Portos de Santa Catarina que os meninos esperavam, ansiosos, a chegada da primeira Kombi abarrotada de jornais ainda com resquícios do calor da impressora e cheiro forte de tinta. Invisíveis para a cidade adormecida, um a um eles saíam abraçados aos fardos de “O Estado” e, mesmo aqueles que mal sabiam ler, eram treinados para gritar a manchete e atrair, assim, o leitor das notícias do dia. Os pontos mais disputados de venda avulsa de “O Estado”, na época, estavam localizados exatamente no atual Centro Histórico, na praça 15 de Novembro e ruas do entorno. Nilton, Jucélio, Jair, Pedrinho, Gustavo e colegas percorriam as ruas João Pinto, Tiradentes, Saldanha Marinho, Felipe Schmidt, Conselheiro Mafra, Tenente Silveira, Francisco Tolentino, Mercado Público... Ninguém conhecia a cidade melhor que aqueles meninos, entre eles Nilton, Jucélio e, um pouco mais velho, Jair Carlos Pereira. Outros, equipados com bicicletas reforçadas com bagageiros dianteiros e traseiros, saíam pedalando para a entrega domiciliar aos assinantes do “mais antigo”. Para o corretor de seguros Jair Carlos Pereira, 55, o primeiro emprego informal como jornaleiro de “O Estado”, aos oito anos, não representou apenas o primeiro dinheiro que “botou em casa”. Serviu para conhecer desde cedo a cidade onde nasceu e a exercitar as relações interpessoais. “Muito importante, também, aprender a conversar, me relacionar com as pessoas”, diz Jair, que vendeu jornais de 1969 a 1976, e começou quando a sede ainda era na Conselheiro Mafra e acompanhou a mudança para a Felipe Schmidt. Jucélio, irmão seis anos mais novo de Jair, seguiu os mesmos passos do irmão mais velho, mas, como Nilton, aprendeu a soletrar as manchetes no galpão da João Pinto, onde durante muito tempo também funcionou a “redacinha”, base da reportagem na área central quando o jornal funcionava na até então remota SC401, no Saco Grande.
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ESPECIAL
O ESTADO
Santa Catarina - 13 de maio de 2015.
Mudanças de dono e endereço
A
primeira edição do jornal fundado por
Henrique Rupp Junior e Ulisses Costa, em 13 de maio de 1915, foi montada e impressa na tipografia ao lado da redação e da direção, no número 8 da rua Jerônimo Coelho, a caminho da zona portuária da cidade. Eram quatro páginas em tamanho standard compostas na linotipo, enorme máquina de ferro com teclado mecânico mantido em caixa de fontes de onde as letras caíam, uma a uma, em pequenas formas de chumbo efervescente e derretido para formar, uma a uma, as linhas que viravam parágrafos de extensas matérias e artigos. Na época, era a tecnologia mais moderna na indústria gráfica, e o jornal ainda não utilizava fotografias. O primeiro repórter foi Osvaldo Mello, que teve como redatores Oscar de Oliveira Ramos Primeira edição do e Joe Collaço, que valorizavam o noticiário standard com quatro local. Uma das primeiras bandeiras editoriais páginas foi montada de “O Estado” foi a defesa da manutenção da e impressa na rua Capital em Florianópolis, combatendo movimentos que naquela época já defendiam a Jerônimo Coelho, a transferência para uma das cidades do interior caminho da região com maior potencial econômico. O gerente portuária da cidade. era João Câncio de Oliveira. Ao lado da impressora alemã Kleo, utilizada pelo jornal até o início da década de 1970, títulos de tamanhos que variavam de acordo com a importância da matéria, eram compostos a mão. Sobrepostas pelo grá!co encarregado da montagem da página na bandeja de metal, as linhas de chumbo e tipos de ferro eram amarradas nas bordas com barbante escurecido pelas mãos sujas de tinta, antes de receberem calços de ferro e serem afixadas na mesa de impressão. O empreendimento durou apenas três anos e meio nas mãos de Rupp e Costa, que negociaram com o comerciante Augusto Lopes da Silva. As razões da venda nunca foram esclarecidas, mas o novo dono assumiu em 15 de novembro de 1918, com várias mudanças.
A primeira foi a mudança da própria sede, da Jerônimo para a rua João Pinto 13, ao lado do mar. A gráfica foi modernizada com novas caixas tipográficas, a circulação passou de matutina para vespertina e o noticiário local !cou em segundo plano. Seis anos e cinco meses depois, em março de 1925, a primeira mudança de direção com objetivos políticos. Victor Konder, ministro da Viação do governo Washington Luís, comprou “O Estado” e o entregou para ser administrado pelo professor e intelectual Altino Flores, avô do economista e vereador Afrânio Boppré. Tem início uma nova fase do jornal, que manteve-se com quatro páginas e passou a priorizar o setor comercial. A capa, por exemplo, começou a ser usada também para publicação de anúncios classificados, numa clara desvalorização do noticiário jornalístico. Cinco anos depois, a grá!ca ganhou o reforço da clicheria, sistema de gravação de imagens e gravuras em placas de zinco, e começam a ser utilizadas as fotogra!as. O jornalismo ganhou mais espaço, tendo como redatores Othon d’Eça e Cássio Abreu. O gerente era João Medeiros. Foi um período conturbado da política nacional. “O Estado” combatia abertamente as ideias de Getúlio Vargas, candidato à Presidência da República pela Aliança Liberal, e apoiava o governista Júlio Prestes, do Partido Republicano, que ganha a eleição mas é deposto por Vargas. Victor Konder vai para o exílio e Altino Flores assume, de vez, a direção de “O Estado”, que segue fazendo oposição a Getúlio Vargas até 1937, quando ocorre o golpe do Estado Novo, e resiste sob a ditadura e censura getulista até 1945. Em junho de 1945, nova mudança. Nas mãos de Moacir Iguatemy da Silveira, o jornal dobra o número de páginas, de quatro para oito, e começa a dar destaque aos noticiários nacional e internacional. Em março de 1946, Sidnei Nocetti, então testa de ferro do político Aderbal Ramos da Silva, é o quinto proprietário de “O Estado”. Este período de transição marca também a mudança da redação e da o!cina grá!ca para o casarão colonial da rua Conselheiro Mafra, velho pardieiro da antiga boca do lixo da cidade, com o professor Barreiros Filho na direção e Damasceno da Silva na redação.
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O ESTADO
No tempo da linotipo, a composição a quente uito antes dos processos modernos de diagramação, composição e impressão, os jornais adotavam um sistema industrial bastante rudimentar, mas que, em seu tempo, foi a melhor solução grá!ca, sucessora da tipogra!a. Enquanto nesta o trabalho era exaustivo, pois o tipógrafo montava as chapas de impressão utilizando tipo a tipo – algo impensável do ponto de vista econômico atualmente –, com a impressão a quente, os jornais e as editoras de livros e revistas ganharam velocidade de produção. Foi assim durante muitos anos, das primeiras décadas do século 20 até, no caso de “O Estado”, 1972. “Quando cheguei ao jornal, trabalhei primeiro como linotipista, o encarregado da digitação das matérias e dos anúncios de linha. Era, de fato, algo muito arcaico, mas era assim que os jornais ganhavam forma”, conta Hadilson Savi, que começou como grá!co e chegou a diretor industrial do “mais antigo”. Ele lembra que a linotipo teve o seu valor, como parte do esquema de produção do jornal. “Era demorado, trabalhávamos por turnos. Havia três máquinas dessas e mais a rotoplana (impressora). As matérias e os anúncios de linha eram compostos em blocos, de acordo com a diagramação; depois esses blocos eram montados na rama, um painel de metal, ajustados nos espaços corretos. As fotos e ilustrações eram produzidas em clichê, numa chapa de zinco, coladas numa base de madeira, com a altura certa para serem encaixadas nos locais próprios. A manchete e os títulos das páginas eram montados de forma tipográ!ca (tipo a tipo), porque não tínhamos a máquina especial para isso.” Hadilson guarda como “recordação” daquele tempo uma cicatriz, no pulso direito, resultado de um derramamento acidental de chumbo quente e a!rma: “Aquilo era muito perigoso, tínhamos que tomar muito cuidado. Um dia me distraí e aconteceu, !quei com a marca para o resto da vida”.
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Máquina inventada em 1890 deu velocidade a editoras e jornais, mas tornou-se obsoleta na década de 1970
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Uma linotipo que resistiu ao tempo está na Imprensa O!cial do Estado
Como funciona A linotipo é um aparelho de composição mecânica, com teclado muito semelhante ao de uma máquina de escrever. A composição é feita pela fundição dos caracteres que formam linhas inteiras (linhas tipográ!cas). O termo deriva da expressão “a line of type”, dita por seu criador, Mergenthaler, que patenteou a máquina em 1890. Posteriormente, surgiram outras compositoras mecânicas similares, mas o termo “linotipo” se tornou genérico para designar todas as máquinas semelhantes. O “Dicionário de Comunicação”, de Carlos Alberto Rabaça e Gustavo Barbosa, assim descreve o funcionamento: “O linotipista aciona o teclado (com cerca de 90 teclas de letras,
números e sinais especiais), fazendo deslizar o magazine (um depósito situado na parte superior da máquina), as matrizes desejadas, que passam a ocupar o seu lugar na linha, ao lado das anteriores. Formada uma linha, no tamanho previamente estipulado, esses tipos são levados a uma caldeira com chumbo derretido, onde a linha de matriz é fundida em uma só barra”. “Um distribuidor automático leva de volta aos seus compartimentos as matrizes utilizadas, onde poderão voltar a servir como moldes na fundição de novas linhas tipográ!cas. A linha fundida, já resfriada, desce e se reúne às demais, em uma bandeja colocada ao alcance do linotipista (galé).
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Projeto arquitetônico do novo prédio interligava redação, diagramação, arte nal e grá ca para facilitar o "uxo da produção diária
Sede moderna às margens da SC-401
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m maio de 1977, “O Estado” inaugurou sua sede de nitiva, no km 2 da SC-401 na época ainda não duplicada. O prédio horizontal, com jardim de inverno ao centro, foi projetado em forma de cruzeiro, ou trevo de quatro folhas, cada bloco abrigando setores interligados do jornal. Redação, diagramação, arte final e gráfica, por exemplo, estavam dispostos em corredores contínuos, para facilitar o fluxo da produção diária. Em dois outros blocos, os setores administrativo e financeiro estavam bem próximos do comercial, onde eram faturados anúncios, vendas avulsas e assinaturas. Para compensar a distância, praticamente 10 quilômetros em direção ao Norte da Ilha, foi manA “redacinha”, tida uma estrutura de apoio na área central cidade. A “redacinha”, como era chamaestrutura montada da da, funcionava junto ao galpão do estaciono Centro de namento particular em terreno da família Florianópolis, dava Hoepecke, na esquina da avenida Hercílio apoio para equipe Luz com as ruas João Pinto e Antônio Luz, de reportagem defronte à antiga Capitania dos Portos da Marinha do Brasil. com máquinas de Lá, em meio ao entra e sai de veículos, escrever e telex era mantida também estrutura de apoio para
circulação e departamento comercial. Antes de seguirem para a sede do Saco Grande, os repórteres passavam na redacinha, recebiam as pautas da chefia de reportagem e saíam para as entrevistas. Lá, dispunham de máquinas de escrever e aparelho de telex para elaboração e transmissão dos textos, ganhando tempo precioso na produção, antes da edição e processo industrial na nova gráfica. Pela redação de “O Estado” no Saco Grande passaram várias gerações de jornalistas, alguns ainda em plena atividade e que testemunharam a transição dos períodos românticos do jornalismo, misturado à boemia e consumo excessivo de álcool e tabagismo. Em meados da década de 1990, às vésperas do ano 2000, a informatização da redação e demais processos produtivos, novidade tecnológica que parecia chegar para consolidar o “mais antigo”, também como o melhor e mais abrangente jornal catarinense, representou exatamente o oposto. Encurralado pelas dívidas trabalhistas e fiscais e pela concorrência que começava a ganhar espaço no território até então exclusivo, “O Estado” dá início a doloroso processo falimentar e de fragmentação administrativa. Cai em descrédito com fornecedores, anunciantes e leitores, até fechar as portas, definitivamente.
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Serviços para terceiros A inauguração da era offset criou um novo mercado para “O Estado”, o primeiro diário de Santa Catarina a terceirizar os serviços da própria gráfica. A iniciativa foi fundamental para viabilização do Zero, o jornal laboratório da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Na época, o departamento de comunicação e expressão da universidade começava a reestruturar o curso de jornalismo, mas não dispunha de toda a estrutura necessária para viabilizar o processo industrial e materializar a teoria ensinada na academia. “O professor [Ricardo Barreto] levava os alunos, lá eles tinham as aulas de diagramação, acabavam de produzir suas matérias, edição e revisão do jornal. Acompanhavam todo o processo posterior na gráfica, como arte-finalização, impressão e encarte”, conta Valmir Pires Lagoa, na época gerente industrial do “mais antigo”. Lagoa lembra que a terceirização foi importante fonte de faturamento da empresa. Lá eram feitos pequenos jornais de cidades do interior, mas principalmente panfletos, informativos e periódicos de sindicatos da Grande Florianópolis. Em época de movimento sindical efervescente, com greves pipocando em setores públicos e privados, não faltava trabalho. “Assim, criei minha carteira de clientes. Até hoje os sindicatos são meus principais parceiros”, diz Lagoa, que soube aproveitar as amizades e a clientela feitas na época que administrava a gráca e criou a própria carteira de anunciantes.
Pioneiro, jornal usou seu parque gráfico para imprimir produtos externos
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Primeiro emprego deu rumo à vida profissional FLÁVIO TIN/ND
omo as demais empresas do Grupo Hoepcke, “O Estado” foi o primeiro emprego formal de muita gente em Florianópolis, responsável pela manutenção de famílias inteiras. Não foi diferente para o publicitário Valmir Pires, 56 anos, que teve a carteira assinada no dia 10 de fevereiro de 1984, na função de auxiliar administrativo, já na sede da SC-401, no bairro Saco Grande. Ele era o responsável pela emissão das faturas e as notas fiscais do setor financeiro. “No fim dos anos 1980, fui promovido a gerente e transferido para a rua Conselheiro Mafra para administrar a recém-comprada Valmir Pires, o “A Gazeta”, o maior concorrente de “O Estado”, fundada Lagoa, teve sua por Jairo Callado e na época carteira assinada pertencente à empresária Mapela primeira vez em ria Ináz Vaz. Com o fechamento de “A 1984, quando assumiu o cargo de auxiliar Gazeta”, ainda no sistema tipográfico, Lagoa voltou para o administrativo do Saco Grande para gerenciar o jornal “O Estado”. industrial. Foi quando implanDe lá, guarda tou a terceirização da oficina lembranças e a gráfica e passou a produzir sindicais ou periódicarteira de clientes. tabloides cos de cidades do interior. Foi nesta época que o manezinho, filho de rendeira e pescador da Lagoa da Conceição, ganhou o apelido que virou sobrenome no meio publicitário e de jornais impressos na Grande Florianópolis. Quem o batizou informalmente foi o então gerente administrativo, Valmir Martins, para evitar confusão no atendimento das ligações telefônicas.
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Apelido virou marca “As pessoas telefonavam para o jornal, pedindo para falar com o Valmir. Às vezes era para o Martins, mas a telefonista repassava a ligação para mim, e, às vezes, era para mim e repassada para ele”, lembra Pires. Até que um dia, Valmir Martins fez uma reunião entre ambos e as telefonistas e decretou: “A partir de agora, ele será o Lagoa, o Valmir Lagoa. Nunca mais houve confusão”, lembra. O apelido virou marca profissional e pessoal. “Hoje, eu agradeço ao Valmir Martins, porque Lagoa virou meu sobrenome, agreguei na minha identidade informal o nome de um dos cartões-postais de nossa cidade, um dos principais ecossistemas da Ilha. É assim que meus amigos me chamam e fiquei conhecido no mercado”, diz o publicitário, que na juventude trabalhou também na Hoepcke Veículos e Datafar, outras duas importantes empresas do grupo.
Passagens folclóricas dos tempos do “mais antigo” dariam para preencher as páginas de um livro
Publicitário tem “passe comprado” com promessa jamais cumprida
Suplemento só para crianças
Se parar para recordar passagens folclóricas dos tempos de “O Estado”, Valmir Lagoa garante ter matéria-prima para a edição de um livro. Uma delas, ele faz questão de lembrar. Lauro Cordeiro, atual gerente comercial do Notícias do Dia, começava a despontar no mercado publicitário e a formar carteira com bons anunciantes para o antigo “Jornal de Santa Catarina”, com sede em Blumenau e circulação do Médio Vale para baixo, até Itajaí, no Litoral Norte do Estado. O “Santa” na época brigava com “A Notícia”, de Joinville, pelo posto de segundo maior jornal catarinense. Sem fazer barulho, Lauro Cordeiro começou a incomodar a área comercial de “O Estado”. Perspicaz, o diretor Osmar Schlindwein, ao lado do gerente comercial Adriano Kalil, teve a sacada. Chamou Valmir Lagoa à sala da direção e lhe deu uma missão: convencer Lauro Cordeiro a trocar o “Santa” pelo “mais antigo”. A compra do passe de Lauro envolveu uma grande negociação, mantida sob absoluto sigilo
O Estadinho, suplemento infantil de quatro páginas, foi um dos marcos do jornal. Circulava aos domingos, com histórias em quadrinhos e joguinhos de colorir. Um dos destaques era a publicação de fotogra!as de crianças, pequenos leitores, em que os editores novatos se revezavam. “Não havia um editor fixo, era fácil de ser editado”, conta Chico Faganello, que se revezou na função, por exemplo, com Fábio Brüggemann e Fifo Lima. Na editoria de Variedades, aliás, todos faziam tudo na hora do fechamento. “Muitas vezes, a agência não enviava o horóscopo oficial do dia por um problema ou outro, e tínhamos de improvisar para resolver o problema”, conta. Neste caso, a solução mais rápida era recorrer a uma edição antiga, recortar e misturar os signos do zodíaco.
para não despertar a reação da direção do “Jornal de Santa Catarina”, principalmente na sucursal de Florianópolis, na época dirigida por Silva Junior. Para a compra do passe, Osmar orientou Lagoa a oferecer um ótimo salário, comissões e transporte gratuito (carro e moroista) para levar e trazer os !lhos de Lauro à escola. “O baixinho relutou um pouco, mas depois percebeu que seria um bom negócio também para ele. E aceitou o desa!o”, sorri Lagoa. Lauro está até hoje à espera dos benefícios prometidos na época da contratação. Hoje no Notícias do Dia, Cordeiro se diverte com a artimanha de Osmar e Lagoa. “Eles me levaram no Restaurante Lindacap, o mais caro da cidade na época. Serviram camarão pistola, dos maiores, prometeram uma tiragem fantástica, mas não cumpriram nada”, se diverte. Lauro entrou em “O Estado” em 1992 e foi o responsável pela criação da sucursal do Kobrasol, em São José. Orgulha-se também de ter emplacado o primeiro anúncio de capa colorido. “Era um caderno especial da Casas da Água”, diz.
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Capa de um dos livros do cartunista, com um de seus personagens populares
Uma vida marcada por humor e irreverência Bonson dedicou quase 25 anos de sua vida a “O Estado”, onde foi chargista, cartunista e ilustrador
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ormado em história pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), ativista político de esquerda durante a resistência à ditadura militar, Sérgio Luiz de Castro Bonson foi um excelente aluno de desenho durante o ensino médio, à época chamado de curso clássico. Seu traço voltado ao humor levou-o às páginas de “O Estado” como o mais célebre chargista que o jornal teve em toda a sua história. “Charge vem do francês, que quer dizer ‘carga’. Ou seja, o chargista ‘carrega nas tintas’, tem que ser corrosivo no traço e na piada”, disse o artista uma vez, em entrevista a Carlos Damião. Qualquer autoridade constituída acabava submetida à irreverência de Bonson: ele não perdoava nenhuma situação que pudesse render a charge do dia. Quando chegava à redação, logo procurava os editores para saber “o que está rolando”, o assunto do dia. Seu foco era, quase sempre, voltado à política, em tempos não muito diferentes dos atuais, porque a atividade dos políticos também era sofrível. O chargista chegou a “O Estado” em 1974, permanecendo no “mais antigo” por cerca de 25 anos. Seu traço se confundiu com a própria história da modernidade do jornal, pela presença sempre constante e pela identi!cação imediata dos tipos e situações que retratava nas charges e também nas tiras, publicadas no Caderno 2, depois Magazine. Tornaram-se lendários os personagens Soiza (“Tudo pelo Soizial”) e Waldirene AM, entre outros. Suas tiras acabaram sendo reproduzidas em livros. Ele protagonizou inúmeras situações difíceis para o jornal, como a charge, em pleno regime militar, retratando um “sorridente” cavalo, de rabo empinado, com quatro estrelas estampadas no lombo. Era o tempo do general-presidente João Figueiredo, o!cial da Cavalaria do Exército, que chegara a confessar, numa rápida entrevista, que “preferia o cheiro de cavalo ao cheiro de povo”.
son não se confessava um homem de esquerda, mas um artista atento a qualquer movimento político, da direita à esquerda, do centro ao in!nito. Entendia que a função da charge era ser, na essência, um “editorial” visual e crítico do jornal. Quem conviveu muito com ele sabe que o chargista era muito mais um anarquista, na concepção ideológica do termo, do que um militante de qualquer causa de ocasião.
Colecionando as charges Autoridades retratadas nas charges apressavam-se em adquirir os originais, para o prazer do artista, que também atuava como free-lance para incrementar o orçamento doméstico. Alguns, como Bulcão Viana, que foi prefeito (1990-1992), e Paulo Afonso Vieira, governador entre 1995 e 1998, compraram lotes das charges para guardar em seus acervos particulares. Outras autoridades e políticos agiam com desdém ou mau humor. Alguns processaram o jornal por causa de charges publicadas. Outros pressionavam os diretores para que exercessem uma vigilância direta sobre o trabalho do artista. Houve períodos de repreensões objetivas, e Bonson tinha que refazer a charge do dia. Esse papel, do relacionamento com o chargista, era exercido em geral pelo editor-chefe ou pelo editor de opinião. Os desenhos eram rascunhados a lápis e depois Bonson aplicava nanquim com um bico-de-pena, de!nindo bem seus traços muito peculiares. No !m da vida, atuando como free-lance em “A Notícia” e outros jornais, aprendeu a desenhar no computador, usando programas apropriados para isso. Mas não era sua praia, como dizia. Preferia mesmo o gra!te, o papel e o nanquim.
Aquarelas urbanas Além de chargista, Bonson foi um excelente e reconhecido artista plástico. Tão reconhecido que o prefeito da cidade francesa de Bonson convidou-o na década de 1980 para passar um período lá, desenhando e pintando suas belíssimas aquarelas, em geral de paisagens e casarios. No fim da década de 1990, descobriu outra forma de trabalhar com artes plásticas em Florianópolis. Com uma cadeira de praia desmontável, uma prancheta, lapiseiras e borrachas, instalava-se nas esquinas da Capital, desenhando a paisagem urbana, não apenas o patrimônio histórico, mas as características “puras” da cidade que via. Depois coloria esses desenhos com a técnica de aquarela. Produziu uma série de camisetas com as estampas, que eram vendidas nas bancas de jornais e revistas. Ele morreu em 2005, vítima de câncer, aos 56 anos.
Militância estudantil e prisão Não foi a única complicação que Bonson enfrentou com os militares no poder. Em 1967, quando Costa e Silva era o marechalpresidente do país, Bonson presidia o Grêmio Estudantil Professor José Brasilício, no Instituto Estadual de Educação. Costa e Silva tinha uma visita programada a Florianópolis, e Bonson, muito gentilmente, pichou muros da cidade repudiando a presença do severo oficial. Foi preso, junto a outros estudantes, e só liberado depois que o presidente deixou a Capital. Muitos anos depois, em entrevista à edição comemorativa dos 80 anos de “OE”, BonO artista no traço de outro artista, Clóvis Medeiros
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100 ANOS
1915 uGrif th lma O Nascimento de Uma Nação, primeiro longa-metragem com características modernas (cultura)
1917 uComeça a Revolução Russa uGreve operária para São Paulo
1918 uFim da Primeira Guerra Mundial, com a derrota da Alemanha e seus aliados
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Nereu Ramos, na foto o!cial de presidente da República: tio de Aderbal, o dono de “O Estado”
Mudanças políticas depois da Proclamação da República s primeiros anos da República em Santa Catarina foram confusos do ponto de vista da política. Entre 1889 e 1902, o Estado teve governadores provisórios, de mandatos curtos, como Lauro Müller (oito meses da primeira vez, pouco mais de dois meses da segunda vez), re!etindo o clima de instabilidade entre as diferentes correntes que derrubaram a monarquia no golpe de Estado de 15 de novembro de 1889. O governador que pela primeira vez "cou mais de três anos no cargo foi Hercílio Luz, entre 6 de janeiro de 1895 e 28 de setembro de 1898. Depois veio Felipe Schmidt, História da política entre 28 de setembro de 1898 e 28 catarinense se de setembro de 1902. Na sequênconfunde com a do cia, uma sucessão de interinos, com jornal “O Estado”, poucos dias ou meses no exercício que teve comando do cargo. É aí que surge a "gura de Vidal Ramos (1866-1954), o de personagens patriarca de uma linhagem de poimportantes do líticos que dominaria grande parte poder público da cena catarinense durante pelo menos oito décadas do século 20. Vidal José de Oliveira Ramos Júnior nasceu em Lages, casou-se com Tereza Fiúza Ramos, com quem teve 14 "lhos. Rachel, a mais velha, casou-se com Pedro Silva, desembargador, e morava com os pais no Palácio dos Despachos – que à época era também residencial –, hoje Palácio Cruz e Sousa. Ali nasceu, em 1911, o neto de Vidal, Aderbal Ramos da Silva, que igualmente viria a exercer o cargo de governador, entre 1947 e 1951, e foi o proprietário de “O Estado” até sua morte, em 1985. Mas Rachel não foi a única a participar diretamente da política catarinense, gerando um dos líderes mais influentes do século 20 em Santa Catarina. Seus irmãos Nereu Ramos, Celso Ramos, Mauro Ramos, Vidal Ramos Júnior e Joaquim Fiúza Ramos exerceram cargos políticos em diferentes ocasiões. Os que mais se destacaram foram Nereu Ramos, que, além de governador e senador, foi presidente da República por dois meses e 21 dias (entre novembro de 1955 e janeiro de 1956), e Celso Ramos, governador entre 1961 e 1966. No início do século, antes da Revolução de 1930, durante a chamada República Velha, os Ra-
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mos pertenciam ao Partido Liberal Catarinense, pelo qual Nereu se elegeu deputado federal. Governador eleito em 1935, tornou-se interventor durante todo o período do Estado Novo (1937-1945).
De olho no poder Durante a República Velha, as famílias Ramos e Konder chegaram a ser aliadas em determinadas situações históricas e políticas. Mas a rivalidade natural pelo exercício do poder acabou afastando os líderes, que ao longo das primeiras décadas do século 20 buscaram rumos diferentes. Adolfo Konder governou o Estado por pouco mais de um ano, entre 1926 e 1927. Na sequência, em 1930, Fúlvio Aducci venceu a disputa pelo governo, mas ficou três semanas no cargo e foi deposto pela Revolução de 1930. Em 1935, Nereu Ramos foi eleito e sua família continuou no poder até 1951. Neste ano, os Konder voltaram ao governo com Irineu Bornhausen, casado com Marieta Konder, sobrinha de Adolfo Konder.
Da República Velha a 1982 A família Ramos, de Aderbal Ramos da Silva, dividiu o poder com os Konder em Santa Catarina na República Velha (até 1930). Durante o Estado Novo, os Ramos mandaram no Estado. Com a redemocratização, continuaram no poder ao eleger Aderbal (1946). Os Konder seriam representados por Irineu Bornhausen (eleito em 1951), Jorge Lacerda (apoio), eleito em 1955, e Heriberto Hülse, vice de Lacerda que terminou o mandato. Os Ramos voltaram em 1961, com Celso no governo, e se mantiveram na eleição de 1965, com a vitória do candidato do PSD, Ivo Silveira. Exceto no período de Colombo Salles (1971-1975), seguiram influenciando a política até a primeira eleição direta para governador durante o período ditatorial, em 1982. A família apoiou o candidato vitorioso, Esperidião Amin. “O Estado”, que em seus primeiros anos de circulação tinha sido vinculado à família Konder, passou a ser o jornal do PSD após 1946. Era um jornal de partido, sem nenhum tipo de disfarce. Depois da extinção de PSD e UDN, passou a apoiar a Arena, sigla governista que sustentava o regime civil-militar instaurado em 1964. Curiosamente, em seus primeiros anos de circulação, o jornal tinha sido aliado da família Konder.
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O ESTADO FOTOS ACERVO INSTITUTO CARL HOEPCKE
A família Ramos em Lages, com quatro ex-governadores: o patriarca Vidal Ramos (ao centro, sentado), Nereu (o primeiro à esquerda), Celso (o antepenúltimo da !la de cima) e Aderbal (o primeiro à direita da !la de crianças)
Imprensa e rádio eram estratégicos derbal Ramos da Silva nasceu no Palácio do Governo em 1911. Neto do governador Vidal Ramos, era natural que crescesse num ambiente propício à atividade política. Cursou direito, trabalhou no escritório do tio, Nereu Ramos, e com 23 anos elegeu-se deputado estadual constituinte. O mandato seria interrompido, como todos os outros, em 1937, com o golpe do Estado Novo, que fechou todas as assembleias legislativas. Em 1936, o jovem deputado casou-se com Ruth Hoepcke, herdeira do poderoso conglomerado Hoepcke, fundado em 1884 por Carl Hoepcke, imigrante alemão, de quem era neta. Aderbal não participava diretamente da administração das empresas, que era tocada desde 1921 pelo barão Dietrich Aderbal Ramos da Silva von Wangenheim, nascido na Alemamas naturalizado brasileiro. comprou “O Estado”, nha,Com a entrada do Brasil na 2a Guer“A Notícia” e a Rádio ra Mundial, em 1942, o governo de Guarujá para fortalecer Getúlio Vargas implantou uma polítia Hoepcke e sua ca de terror e perseguição aos alemães carreira política e seus descendentes que moravam no país. Aderbal, que continuava trabalhando como advogado, cedeu aos apelos da esposa e outros familiares e assumiu a presidência do grupo Hoepcke em outubro daquele ano. O conglomerado era poderoso, com diversas indústrias, rede de lojas, companhia de navegação, entre outros negócios. Com Aderbal à frente da administração, continuou expandindo as atividades e incluiu, entre seus objetivos, a aquisição do jornal “O Estado”, então de propriedade do professor Altino Flores. Valeuse de um artifício, hoje conhecido como a utilização de “laranjas”, para comprar o matutino, que, sob a gestão de Altino, mantinha-se distante de discussões político-
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Pretensão a voos mais altos “O Estado”, “A Notícia” e a Rádio Guarujá formaram o segmento de comunicação do Grupo Hoepcke, muito mais pela vontade do seu presidente, do que dos acionistas das empresas. Aderbal tinha pretensão a voos mais altos em sua carreira. O primeiro passo era ser eleito para a Assembleia Nacional Constituinte de 1946. Foi vitorioso, depois de uma campanha exaustiva. “Corri o Estado todo, em três automóveis. Carros particulares”, contou certa vez numa entrevista, concedida em 1981. Sua participação na Constituinte era um passo para ampliar sua liderança no PSD e, ato contínuo, candidatar-se ao governo do Estado, 12 anos depois da última eleição direta, vencida por seu tio Nereu – que exerceu a administração do Estado até 1945.
partidárias. Moacir Iguatemy da Silveira e Sidney Nocetti fecharam o negócio com o professor, e “O Estado” passou ao controle indireto de Aderbal. Isso foi em 4 de junho de 1945, após o fim da guerra.
A fundação do PSD Político de nascença, advogado por formação, empresário por opção, Aderbal Ramos da Silva tinha pretensões de voltar à política como o quarto dos Ramos a se destacar no cenário estadual. A aquisição de “OE” fez parte de seu planejamento com esse objetivo, assim como a compra do jornal joinvilense “A Notícia”, do qual foi dono durante alguns anos, de 1945 a 1956. Os dois jornais, junto com a Rádio Guarujá, que Aderbal adquirira em 1948, viriam a ser porta-vozes oficiais do PSD (Partido Social Democrático), uma das siglas fundadas durante a redemocratização do Brasil. O PSD surgiu em maio de 1945, tendo o empresário como um dos líderes de sua criação em Santa Catarina, ao lado do tio, o ex-governador e ex-interventor Nereu Ramos. No mesmo mês, outro grupo político fundaria a UDN (União Democrática Nacional) em Santa Catarina, partido francamente adversário do PSD, que juntou os rivais da família Ramos, os Konder. A redemocratização nacional, depois de 15 anos de Getúlio Vargas no poder central, com oito anos de ditadura, produziram evidentes reflexos em Santa Catarina e seriam fundamentais para os anos seguintes, com a clara de!nição das disputas políticas entre as duas famílias mais tradicionais da política estadual.
Aderbal e Ruth: com a perseguição aos descendentes de alemães em Santa Catarina, ela pediu para o marido assumir o Grupo Hoepcke
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Aderbal Ramos da Silva: “O jornal é uma arma” Quando adquiriu “O Estado”, ARS considerava o jornal impresso o melhor meio de comunicação. E utilizou-o politicamente
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derbal Ramos da Silva (1911-1985) assumiu o controle de “O Estado” em 1946, mesmo ano em que se elegeu governador de Santa Catarina. A posse de “O Estado” era uma forma de garantir um jornal para seu partido político, o PSD (Partido Social Democrático), criado no processo de redemocratização do Brasil, iniciado em 1945, depois de 15 anos de Getúlio Vargas no poder – oito dos quais como o ditador do Estado Novo. Naquele tempo, os jornais em geral tinham vínculo com bandeiras político-partidárias. Em Florianópolis, o outro diário – A Gazeta – vinculouse à UDN (União Democrática Nacional), partido de oposição ao PSD. A estratégia de Aderbal no ramo da comunicação incluía também a propriedade da Rádio Guarujá, emissora fundada em 1943 por Ivo Serrão Vieira como um serviço de alto-falantes. Sob sua administração, a Guarujá foi modernizada e ganhou uma estrutura semelhante às grandes rádios do eixo RioSão Paulo, inclusive com programas de auditório e radionovelas produzidas na Capital. A resposta da UDN à força do PSD na área de comunicação viria apenas em 1955, com a fundação da Rádio Diário da Manhã (hoje CBN Diário), que se tornou conhecida como “emissora udenista”, em apoio ao governador Irineu Bornhausen, um dos fundadores da sigla, e, depois, a Jorge Lacerda, eleito com apoio da UDN.
Embora tenha sido um instrumento político ao longo das décadas de 1920 a 1940, operado por outros personagens da vida pública catarinense, “O Estado” ganhou força empresarial a partir de Aderbal Ramos da Silva, sem que ele nunca tenha participado da administração direta do veículo. Moacir Iguatemy da Silveira – pai do senador Luiz Henrique da Silveira – foi diretor do jornal, sendo substituído posteriormente por Rubens de Arruda Ramos, que comandou a publicação até sua morte, em 1964. Em seu lugar, assumiu José Matusalém Comelli, genro de Aderbal, que foi presidente de “O Estado” até 2009. O poder de Aderbal sobre o jornal e sobre a Guarujá (AM e FM, hoje com a denominação de Antena 1) prolongou-se até sua morte, em 1985. O ex-governador presidia o Grupo Hoepcke, complexo empresarial que incluía os veículos de comunicação e teve inegável in"uência nos rumos políticos catarinenses de 1946 a 1985. Esteve presente nas campanhas vitoriosas de Celso Ramos (1961-1965) e Ivo Silveira (1966-1971) e nas escolhas dos governadores indiretos Antônio Carlos Konder Reis (1975-1979) e Jorge Bornhausen (1979-1983). A ascensão do jovem político Esperidião Amin Helou Filho, prefeito nomeado de Florianópolis em 1975, também resultou do trabalho político de Aderbal. Ele atuou diretamente nas campanhas pela eleição de Amin à Câmara dos Deputados (1978) e ao governo catarinense (1982), sempre com apoio direto das emissoras de rádio e de O Estado, fato nunca negado pelo ex-governador.
FOTOS ACERVO INSTITUTO CARL HOEPCKE/DIVULGAÇÃO/ND
Jornal, jornalismo e política Con ra trechos de entrevistas concedidas por Aderbal Ramos da Silva nas quais o ex-governador menciona sua relação com os meios de comunicação (“O Estado” e Rádio Guarujá) e suas opiniões sobre o trabalho da imprensa: u Também foi nesta época (1936, quando começou seu envolvimento com a política) que comecei a participar de um jornal – A República – do qual fui diretor. Mais tarde adquiri “O Estado” e a Rádio Guarujá. (“O Estado”, 15/3/1975). u Há o jornaleiro, o que vende; há o jornalista, o que faz; e há o diretor do jornal, que sempre é jornalista. E há o dono do jornal. Já fui diretor de jornal. Fui um mau cronista. Muito moço ainda prestei meus serviços ao jornal “A República”. Fui então levado pela vida política, pois o jornal é uma arma. Naquele tempo, era o melhor meio
de comunicação. O rádio ainda era precário. Jornal talvez seja o meio mais e!ciente, é o que grava melhor. (A Notícia, 18/10/1981). u O jornal [“O Estado”] não passou diretamente para mim. O jornal foi originariamente de Vitor Konder (na verdade, Adolfo Konder), que passou para o Altino [Flores]. De repente, Altino cansou, mas o jornal tinha que evoluir. Dois amigos meus procuraram o Altino e ele passou o jornal. Acontece que atrás desses dois amigos estava eu. Foi a maneira que encontrei para comprar e melhorar o jornal. Não foi desonestidade. Foi um ato necessário, porque se eu aparecesse talvez ele não vendesse. (“O Estado”, 5/5/1982). u Num jornal é preciso distinguir a notícia da opinião. Tem que noticiar, não pode escamotear o fato, não deve esconder as notícias. Dar opinião é diferente. (“O Estado”, 5/5/1982).
O ex-governador, na redação de “O Estado”, com Osmar Schlindwein (esquerda), Luiz Henrique Tancredo (centro) e Marcílio Medeiros Filho (direita), jornalistas e gestores do jornal
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Conexões com o poder público jornal “O Estado” é lembrado ainda hoje pela proximidade com a sociedade. O leitor se via em suas páginas, o cotidiano era retratado. Era um jornal feito para as pessoas. Mas fazia, além disso, com que outras questões chegassem até elas de forma clara. Por isso a importância da conexão do jornal com o poder público. Notícias sobre política, ações que tramitavam nos tribunais, funções dos órgãos fiscalizadores eram constantes fonNotícias sobre tes de pauta para “O Estado”. O política, ações que jornal levava aos leitores notícias tramitavam nos que, se não fosse através dele, não dos meandros do poder e tribunais, funções dos sairiam chegariam ao cidadão. órgãos fiscalizadores O presidente do TRE-SC (Trieram constantes bunal Regional Eleitoral de Sanfontes de pauta ta Catarina), Sérgio Baasch Luz, para “O Estado” lembra que “o jornal ‘O Estado’ sempre representou a linha de pensamento político de Santa Catarina”. “Na parte de editoriais, pessoas conhecidas davam a linha do pensamento político dominante. Dessa forma o jornal sempre teve um papel na evolução política de Santa Catarina”, comenta. Ele avalia ainda ACERVO AE/ND
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Sérgio Baasch Luz: “‘O Estado’ tinha um papel na evolução política de Santa Catarina”
que “O Estado” “auxiliou o TRE catarinense no controle dos partidos políticos”. Para o presidente, esse papel desempenhado pela imprensa é de grande importância. “É peça fundamental na atuação dos tribunais. Divulga as atividades e dá transparência aos atos”, avalia. Luiz Roberto Herbst, presidente do TCE-SC (Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina), morou em Mafra, na região Norte do Estado, até o ano 2000. O jornal “O Estado” não chegava lá. Mas, em sua experiência como deputado estadual, em 1995, conheceu o periódico. “Lembro bastante das matérias políticas”, afirma. Para ele, “o jornal teve uma grande importância fiscalizadora”. Por meio de matérias como as apuradas por “O Estado”, surgem auditorias que resultam numa melhor aplicação dos recursos públicos. Ele lembra que era uma época em que o acesso a jornais era restrito, não chegava a todos os leitores, e que muitos se sentiam privilegiados por poder chegar àquelas informações. Para Herbst, mais que informar, o jornalismo tem a obrigação de ser um agente fiscalizador. “Os jornais colaboram muito para o controle externo. Quase que diariamente vemos irregularidades denunciadas nos jornais e as fiscalizamos”, avalia. E esta tendência que surgiu em Santa Catarina com “O Estado” perdura nos dias de hoje. Denúncias feitas por jornais, não raras vezes, resultam em ações investigadas por corpos técnicos dentro dos tribunais. Além disso, para o presidente do TCE, a área política também é diretamente afetada pelo bom jornalismo. “Faz com que políticos se sintam fiscalizados. Os jornais orientam suas condutas”, analisa. Herbst acredita que, se não fosse a imprensa, casos de corrupção, por exemplo, não seriam investigados da forma como são atualmente. É por isso que o Tribunal busca se aproximar constantemente da área. Em março deste ano, um encontro com jornalistas foi realizado na Capital em que as funções do TCE foram explicadas, assim como ações desempenhadas pelo órgão. “A população e até a própria imprensa muitas vezes não sabe como o tribunal funciona. É preciso aproximar”, acredita. Para facilitar o acesso ao trabalho do órgão, o TCE-SC vem utilizando vários instrumentos para dar mais transparência às atividades, como a transmissão das sessões do Pleno pela TV Assembleia Legislativa (TVAL) e pelo site do Tribunal, o próprio Portal da Instituição, com vários serviços e informações em diversas mídias, e o Diário Oficial Eletrônico, que agiliza a publicação das decisões e dos atos administrativos do TCE. “Controlar a gestão de recursos públicos em benefício da sociedade catarinense” é a missão do Tribunal.
Luiz Roberto Herbst: “o jornal teve uma grande importância scalizadora”
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Parceria com entidades para o desenvolvimento DÉBORA KLEMPOUS/ND
jornal “O Estado” também teve uma rela-
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ção muito próxima de entidades criadas para discutir o futuro de Santa Catarina. Uma delas é a Acif (Associação Comercial e Industrial de Florianópolis), criada no mesmo ano que o jornal por empresários preocupados com o desenvolvimento da Capital. Outra é o Sinduscon (Sindicato das Indústrias da Construção Civil), criado em 1980, na época de ouro do jornal, também com a missão de participar ativamente da discussão em torno do crescimento da cidade. De 1915, quando a Acif foi fundada, até 2015 – ano do centenário – Florianópolis mudou muito. A entidade sempre esteve presente, atuando com protagonismo: incorporou diversas bandeiras de interesse público, participou de lutas importantes e honrou o compromisso de dar voz ao setor produtivo da capital catarinense. Na sede da entidade, um quadro de Hassis mostra as origens econômicas da Capital. Engenho, produção de farinha, pesca e rendas de bilro dividem espaço com a ponte Hercílio Luz, ao fundo – símbolo do progresso. A história Com objetivos da entidade se assemelha à do jornal. Para o presidente da Acif, Sander de comuns, jornal e Mira, “o jornal “O Estado” conseguia conentidades mantinham ter uma empatia maior com as coisas locais. estreita relação Era um jornal manezinho”. Também maem benefício do nezinho, Sander conta uma história curiosa sua relação com o jornal. “‘O Estado’ desenvolvimento sobre tinha um encarte e uma publicação tinha da economia na capa bebês, e eu fui capa desse encarte”, conta. Depois de um telefonema para a mãe, con!rmou a data: 1974. Para ele, sua imagem nas páginas de “O Estado” re"etem o per!l do jornal. “Meus pais vieram para Florianópolis pouco tempo antes do meu nascimento. Não éramos uma família da cidade, não tínhamos nenhum tipo de tradição ou in"uência, e eu fui capa. O que mostra o quanto o jornal era acessível, representava todos”, avalia. Hoje ele preside a entidade criada no mesmo dia, mês e ano que “O Estado”. Em função das comemorações da Acif, um amplo resgate histórico foi feito. “Levantando algumas coisas da história da entidade, acabaram vindo referências ao jornal. Nas edições iniciais do jornal foram noticiadas as primeiras reuniões da entidade”, explica. “A Florianópolis de 1915 usava bonde, não tinha rádio, não tinha TV. As principais fontes de notícias eram o banco da praça e ‘O Estado’”, compara. Sander conseguiu fazer um mergulho na história avaliando estes registros. “A impressão que nos dá é de que o maquinário que veio para a criação do jornal era algo muito moderno para a Florianópolis da época, que tinha 40 mil habitantes no !nal da década de 1920”, concluiu. Essa relação da Acif com a imprensa perdura de forma estreita ainda hoje, o que, para o presidente, é fundamental para a ligação com a sociedade.
Sander de Mira: “‘O Estado’ conseguia conter uma empatia maior com as coisas locais. Era um jornal manezinho”
Construção da sociedade ARQUIVO/ND
Já o Sinduscon foi criado décadas depois, em 1980, por Olavo Fontana Arantes, então presidente da Associação Pro!ssional da Indústria da Construção Civil da Grande Florianópolis. Com uma sala cedida no edifício Hércules, no Centro de Florianópolis, a diretoria da época tinha o objetivo de ser porta-voz dos empresários do setor. A entidade começou com seis empresas que se uniram. A atual gestão, liderada por Helio Bairros, presidente do Sinduscon desde 2006, tem atuado em prol do associado, além de desenvolver programas voltados à saúde do trabalhador da construção civil. Bairros milita no sindicato desde o ano 2000, mas sempre teve uma relação muito próxima com Florianópolis, desde que chegou para cursar o ensino superior. Foi nesta época que conheceu o jornal “O Estado”. “Era aquele jornal grandão, como todos eram. Soltava a tinta com facilidade. Tinha uma abrangência grande. Era o veículo de comunicação que a gente via diariamente”, lembra. “Eu era acadêmico quando vim a Florianópolis e conheci o jornal. Sou de uma época em que estudante lia muito, e lia muito jornal. E naquela época a juventude também era muito crítica, e o jornal era formador de opinião. Se fosse muito tendencioso, era queimado. “O Estado” sempre foi referência em noticiar”, acrescenta. Como pro!ssão, Bairros escolheu uma área profundamente ligada ao desenvolvimento da cidade. “Quem puxou verdadeiramente o crescimento de Florianópolis a partir da década de 1980 foi a construção civil, impulsionada, principalmente, pelos argentinos que começaram a investir muito aqui”, ele a!rma. Um dos atrativos da época era o preço baixo dos imóveis. “Foi nesse período que as construtoras começaram a surgir, crescer, se consolidar”, recorda. O setor gerou muito emprego, o que fez com que
Helio Bairros: “a juventude era muito crítica, e o jornal, formador de opinião
muita gente viesse para a Capital. E o bom desempenho teve re"exo em outras áreas. “O comércio também era pequeno, se resumia ao centro antigo. Mas aí surgiram rodovias, shoppings. Tudo isso modificou a cidade, veio gente nova, oportunidades”, avalia. “O sindicato nasceu nesse boom, em 1980, porque empresários perceberam que podiam contribuir com o processo de discussão e planejamento da cidade”, conta Bairros.
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Florianópolis cresceu com qualidade. Recentemente, foi eleita a melhor cidade do Brasil para criar !lhos
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O berço do
Construção da ponte Hercílio Luz foi marco do processo de desenvolvimento da Capital e do Estado
“mais antigo” jornal “O Estado” nasceu na Capital catarinense. Florianópolis sempre teve vocação para crescer. Os índios, primeiros habitantes, tinham como atividade principal a agricultura, mas tiravam também da pesca e coleta de moluscos sua subsistência. No início do século 16, embarcações já chegavam à ilha, onde se abasteciam. A povoação pelo homem branco começou em 1675, quando Francisco Dias Velho, junto com sua família e agregados, deu início à povoação da ilha “O Estado” nasceu com a fundação de Nossa Senhora do Desterro. Era o segundo núcleo quando Florianópolis de povoamento do Estado, e ainda se !rmava como fazia parte da região de Laguna. centro administrativo Com o povoamento, foi intensicado o "uxo de paulistas e vicende Santa Catarina e passava por tistas, que ocuparam vários outros pontos do litoral. Em 1726, Nossa transformações Senhora do Desterro foi elevada à e crescimento categoria de vila, desmembrada de Laguna. Outro passo que resultou na ocupação foi a construção de fortes pelos militares, na década seguinte, o que tornou a ilha ponto importante de defesa do território. A partir de então, outras atividades, além da agricultura, prosperavam, e teve início a industrialização do local. A cidade ainda guarda registros dos antigos engenhos que eram responsáveis pela produção de farinha, além de outras atividades tradicionais, como a fabricação das rendas de bilro. Cresceu também a indústria manufatureira de algodão e linho. A pesca permaneceu, e permanece, forte.
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Capital da província Foi no século 19 que a vila virou cidade, e em 1823 se tornou capital da província de Santa Catarina. Com investimentos federais, o porto que havia na ilha passou por melhorias, prédios públicos foram construídos e tiveram início obras de urbanismo. Firmada como o centro administrativo do Estado, no século 20 a cidade só cresceu. A construção civil passou por incrementos, luz e água chegaram à população e foi construída a ponte Hercílio Luz, marco do processo de desenvolvimento da Capital e do Estado. A economia, desde então, passou a ser alicerçada pelo comércio, prestação de serviços públicos, indústria de transformação e turismo. Foi nesse cenário que, em 1915, “O Estado” surgiu. O prefeito Cesar Souza Júnior guarda lembranças do jornal. “Comecei a ler jornal com “O Estado”, todo dia pela manhã. Tive a oportunidade de visitar a redação ainda criança, pelo colégio, e fiquei fascinado com aquilo”, conta. Para ele, “O Estado” tem um valor na formação da identidade de Florianópolis. “Teve uma ligação muito forte com a cidade, colunistas identi cados, matérias de grande relevância. Tinha colunistas nacionais, lembro muito do Paulo Francis, mas conciliava bem a aproximação com as
coisas da cidade”, completa. Foi paralelamente ao surgimento do jornal “O Estado” que nasceu a Acif (Associação Comercial e Industrial de Florianópolis), que também completa um século em 2015. Em 21 de abril de 1915, uma comissão composta por comerciantes tradicionais reuniu-se na sede do Clube Doze de Agosto para criar a entidade. O associativismo mostrou que tinha força e era capaz de conseguir investimentos, obras e benefícios para o município. Até hoje, a Acif encampa iniciativas que visam não apenas atingir os empresários, mas toda a comunidade, como ações de revitalização dos fortes e luta por impostos mais justos.
Economia em desenvolvimento Em 1960, um grupo de comerciantes de Florianópolis reuniu-se na sede da Federação do Comércio e iniciou um importante capítulo na história do movimento empresarial catarinense. A criação do então CDL (Clube de Diretores Lojistas), que nasceu com o slogan “Unidos Serviremos Melhor” representou um marco para organização do setor no Estado. Foi a primeira entidade do gênero de Santa Catarina e sua fundação transformou-se em incentivo para a criação de CDLs nos principais municípios do Estado, fortalecendo o espírito associativista neste segmento tão importante para a vida econômica do país. Hoje, meio século depois, a maior associação de base do varejo catarinense tem mais de 4 mil associados. Ainda na década de 1960, a UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) foi criada, com atividades que se iniciaram no Centro. Hoje a sede é dividida em 11 centros de ensino e foi responsável pelo crescimento dos bairros que ficam ao redor, como Trindade, Carvoeira, Serrinha, Pantanal, Córrego Grande e Itacorubi. Estava firmada, também, a vocação educacional da cidade. A universidade foi responsável pela vinda de estudantes de todo o país, o que aumentou signi cativamente a população de Florianópolis, resultando também no crescimento da região. E a cidade cresceu com qualidade. “Fomos recentemente eleitos pela revista ‘Exame’ como a melhor cidade do Brasil para criar seus filhos. Isso se deve aos nossos índices em saúde, educação, renda, assistência social, segurança. Recebemos também do Ministério da Saúde o prêmio como a primeira capital brasileira a atingir 100% de cobertura do programa Saúde da Família. Outras premiações que havíamos recebido são de melhor saúde pública entre as capitais brasileiras, o melhor Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) nas séries iniciais, a maior cobertura em educação infantil entre todas as capitais brasileiras, a melhor capital do Brasil para se empreender”, destaca o prefeito Cesar Souza Júnior. Os índices atuais refletem na projeção de um futuro promissor. “Somos inegavelmente a melhor cidade do Brasil para empreender, criar os lhos. Que a gente siga avançando nesse aspecto e também na mobilidade urbana. Que a gente crie um sistema que faça o trabalhador deixar o carro em casa e usar o ônibus para trabalhar. Que se desenvolva com qualidade”, almeja o prefeito.
Teve ligação muito forte com a cidade. Colunistas identi!cados, matérias de grande relevância.
Cesar Souza Júnior, prefeito
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O ESTADO ARQUIVO/ND
ACERVO PAULO COSTA/ND
Rua do Príncipe, em 1913, dois anos antes de o “O Estado” circular na cidade
No mais importante polo econômico de SC s histórias de uma cidade que hoje atinge mais de meio milhão de habitantes, movida pela força de sua indústria e pelo trabalho árduo trazido por seus fundadores, também foram contadas nas linhas do jornal “O Estado”. Segunda maior riqueza de Santa Catarina, com um PIB (Produto Interno Bruto) de R$ 18,2 bilhões, Joinville tem no setor de serviços e no comércio suas principais atividades econômicas, acompanhadas pela indústria de transformação e pela crescente ascensão do trabalhador autônomo – reflexo da manutenção de vagas de trabalho e do empreendedorismo. Foi sempre assim. Colonizada por imigrantes europeus, a cidade de 164 anos começou sua expansão econômica a partir de 1920 – período em que “O Estado” já atuava em Santa Catarina. Nos anos 1950, já estava consolidada como a principal cidade empresarial do Estado. Estavam estabelecidas empresas das área metalúrgica e têxtil, além de madeireiras de grande porte. A história da Tupy, por exemplo, segue de perto os passos da industrialização do Brasil e da cidade de Joinville. Albano Schmidt, Hermann Metz e Arno Schwarz, que fundaram a empresa em 9 de março de 1938, descendiam dos primeiros imigrantes que chegaram ao local. Albano era um homem de negócios, e os sócios, pessoas que já se dedicavam a fabricar artefatos de ferro, utilizando conhecimentos rudimentares de fundição. Na década de 1940, as peças fabricadas por eles já eram consideradas semelhantes às estrangeiras. Com isso, a empresa conquistava o
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mercado. O crescimento fez com que se instalasse no que mais tarde se tornou o Parque Industrial do Boa Vista. Na década de 1950, a empresa começou a fabricar peças para a Volkswagen, além de criar uma escola técnica para preparar mão de obra. Na década seguinte, deu início ao processo de internacionalização. Outra empresa de destaque na cidade é a Tigre, que em 1950 iniciou a produção de tubos e conexões. Bastante ligada à área da comunicação, em 1959 a empresa foi pioneira no investimento em publicidade e propaganda. Em 1977, deu o primeiro passo rumo à internacionalização, com a instalação de uma unidade no Paraguai. A empresa não parou de crescer. Na área têxtil, a Döhler acompanhou o desenvolvimento de Joinville. Aos 133 anos, a empresa é destaque na área, com 3,2 mil colaboradores e uma produção de 1,4 mil toneladas por mês. Empresário de sucesso, Udo Döhler, hoje prefeito de Joinville, recorda as relações da cidade com o jornal O Estado. “O jornal “O Estado” desempenhou um trabalho de grande importância e de credibilidade na divulgação das informações de Joinville e da região Norte para toda Santa Catarina”, afirma. Em 1911, foi criada a Acij (Associação Empresarial de Joinville), quando a cidade contabilizava 25 mil habitantes. As reuniões aconteciam na casa de Hermann August Lepper, tradicional comerciante e primeiro presidente da entidade. Como hoje, discutia-se muito especialmente a questão dos impostos, que sofriam alterações constantes.
Tendência de crescimento continua Além do espírito empreendedor de seu povo, o município encontrou outras questões estratégicas para seu desenvolvimento. Uma delas é a localização, perto de portos, aeroportos e rodovias importantes que ligam o país. Com a instalação de empresas, que ajudaram a fortalecer o cenário econômico, o crescimento foi constante. Entre 2012 e 2013, por exemplo, aumentou em 52% o número de empresas do setor de serviços, de acordo com o estudo Cidade em Dados 2014, feito pela Prefeitura de Joinville. Os índices também subiram em relação ao comércio, indústria e profissionais autônomos e liberais. O número de postos de trabalho também sobe anualmente, atingindo um índice de 3,5% em 2013. E a tendência ainda é de crescimento. Em 2013, a norte-americana General
Motors instalou sua fábrica de cabeçotes e motores em Joinville. A alemã BMW implantou a primeira fábrica da América Latina em Araquari, cidade vizinha. Estes destaques mostram que mais que uma cidade isolada, Joinville integra uma região em plena expansão. Hoje, a cidade tem o maior parque fabril do estado, com 1,6 mil indústrias e 13,4 mil comércios. O PIB per capita é de R$ 35,8 mil. O município é destaque no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), ficando em 2013 como a 13a melhor do país, além de ser apontada como a sexta cidade que mais cresceu no Brasil em dez anos. Tem liderado o número de exportações e importações no Estado e acumula mais de 200 mil trabalhadores com carteira assinada.
Joinville começou sua expansão econômica a partir de 1920
O jornal ‘O Estado’ desempenhou um trabalho de grande importância e de credibilidade na divulgação das informações de Joinville.
Udo Döhler, prefeito de Joinville
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A força do interior ARQUIVO HISTÓRICO DE CHAPECÓ/ND
história de Chapecó coincide em muitos pontos com a história de “O Estado”. O município foi criado em 1917, dois anos depois do jornal. O auge econômico também se deu no mesmo período – entre as décadas de 1970 e 1980. A transformação que a cidade, principal polo econômico do Oeste catarinense, viveu naquela época é responsável pelos avanços colhidos ainda hoje. Foi naquele período que Chapecó se consolidou pelo agronegócio, setor que continua responsável pela movimentação financeira da região e evolução técnica e científica. E, graças às necessidades de adaptação, o desenvolvimento econômico não Auge econômico para. Colonizada no século anterior companhias e doações de terras de Chapecó se deu por do governo, a região foi habitada entre as décadas de por pessoas vindas do Rio Grande 1970 e 1980, mesmo do Sul. A terra fértil foi a principal período em que o fonte de riquezas. A produção da jornal “O Estado” área ganhou mercado com o transporte feito por meio de balsas pelos teve expressivo rios que cortam o Oeste. Já havia crescimento uma matriz econômica consolidada, fortemente ligada à terra. Mas era pouco. As companhias colonizadoras foram responsáveis pelo desenvolvimento. Uma delas, a empresa Colonizadora Bertaso, construiu estradas e instalou colonos nas terras. O extrativismo era uma importante atividade na época. A cidade cresceu ligada a isso. O desenvolvimento da indústria, setor de serviços e comércio foi consequência da força econômica que a cidade conquistou. Em 1940, um grupo de empresários decidiu instalar uma associação que os representasse política, econômica e socialmente. Fundada em 10 de maio de 1947, a Acic (Associação Empresarial de Chapecó) representa os setores da indústria, comércio, prestação de serviços e agronegócio e está filiada à Federação das Associações Empresariais de SC. O cooperativismo também teve importância. Na década de 1960, foi criada a Cooperativa Tritícola Oeste Catarinense Ltda, a primeira organização cooperativista em Chapecó. Mas seus trabalhos datam apenas do período de 1961 a 1964. Em 29 de outubro de 1967, é criada a Cooperchapecó – Cooperativa Mista Agropastoril de Chapecó Ltda, que em 1969 reativou as atividades da Incomasa, formando a Cooperativa Central Oeste Catarinense. Em 1974, a Cooperchapecó uniu-se à Cooperxaxiense, formando a Cooperalfa – Cooperativa Agroindustrial Alfa. Todo esse processo foi motivado por Aury Luiz Bodanese, Setembrino Zanchet e outros 35 agricultores. O principal ideal na criação da Cooperalfa deu-se em função das incertezas do mercado de grãos e, em seguida, do avanço da produção animal em Santa Catarina. Com o passar do tempo e a eminente expansão, a Cooperalfa passou a desdobrar inúmeras atividades e serviu de pilar para a ec losão de outras cooperativas e sociedades do
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mesmo gênero.
O jornal sempre foi destaque em coberturas regionalizadas, contribuindo para o desenvolvimento socioeconômico e o crescimento demográ co dos municípios do interior.
Associativismo como marca O associativismo resultou no crescimento, que teve seu auge nos anos 1970. Neste período, com incentivos vindos do governo e iniciativas dos empresários, a agroindústria se consolidou na cidade, representando uma revolução econômica na região. Este setor foi o grande responsável pelo desenvolvimento econômico e pelo processo de urbanização do município. Em uma década, a população da cidade triplicou. As agroindústrias conquistaram mercado e cresceram de maneira muito rápida, o
Companhias colonizadoras foram responsáveis pelo desenvolvimento da cidade e região
PREFEITURA DE CHAPECÓ/DIVULGAÇÃO/ND
A agricultura, fonte primária de renda na cidade, nunca perdeu força
que tornou necessária a busca por mão de obra. Na década de 1990, a expansão dessas empresas se tornou efetiva. Nascidas ali, elas se instalaram em outras regiões do Estado e do Brasil. A agricultura, fonte primária de renda na cidade, nunca perdeu força. O município continuou crescendo, tanto na área urbana quanto na área rural. E a população continua lutando por ações do poder público, como melhores rodovias e ferrovias, para escoar a produção. Os empresários também perceberam a necessidade de se adaptar às constantes mudanças do mercado. A Acic tem buscado parcerias com foco na geração de negócios. Exemplo disso são as missões internacionais promovidas pela entidade em parceria com o poder público municipal e com as universidades. Essas missões começam a dar resultados palpáveis para a diversificação da matriz econômica local, como a instalação de empresas na área de tecnologia.
Lembranças de “O Estado” José Caramori, prefeito de Chapecó
O prefeito de Chapecó, José Caramori, avalia que a cidade se transformou em uma referência para Santa Catarina, especialmente na última década. “Ao aproximarse dos cem anos de história, o cenário nos mostra uma cidade em plena sintonia entre capital e social, oferecendo melhor qualidade de vida e confiança aos chapecoenses”, analisa. Os números representam a pujança da Capital do Oeste. Segundo o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal, é a cidade número 1 entre os municípios acima de 100 mil habitantes em Santa Catarina, e ocupa o 18o lugar no Brasil. Entre 0 e 1, Chapecó ostenta alto desenvolvimento – 0,8766, sustentado por elevados índices em emprego e renda, educação e saúde. Ele destaca também o aeroporto Sera!m Enoss Bertaso,
um dos que mais cresceram no interior do país. “Estamos na lista de prioridades da Secretaria Nacional de Aviação Civil para receber novos investimentos. Vamos construir um novo terminal de cargas e passageiros e buscar a internacionalização”, adianta. Chapecó investe também em uma nova matriz econômica com a consecução do Parque Cientí!co e Tecnológico Chapecó. “Comemoramos, mas o trabalho continua”, ele a!rma. Caramori era um entusiasta do jornal “O Estado”. “Foi durante muito tempo uma referência da mídia impressa em Santa Catarina, com circulação em Chapecó. O jornal ‘O Estado’ sempre foi destaque em coberturas regionalizadas, contribuindo para o desenvolvimento socioeconômico e o crescimento demográfico dos municípios do interior”, recorda o prefeito.
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Mineração transforma economia do Sul ARQUIVO PREFEITURA DE CRICIÚMA/DIVULGAÇÃO/ND
jornal “O Estado” também atuou em Criciúma, no Sul de Santa Catarina. Criada em 1880, a cidade se consolidou como a maior produtora nacional e segunda maior produtora mundial de pisos e azulejos. Criciúma é conhecida por ser rica em cultura e recursos naturais. E não se prendeu a uma única matriz econômica. É também o terceiro maior polo nacional na produção de jeans e uma das principais áreas de confecções de Santa Catarina. Mas foi de suas profundezas que brotou o desenvolvimento econômico da Criciúma recebeu a deAo !m da Primeira cidade. nominação de Capital Brasileira Guerra Mundial, do Carvão e do Revestimento Cequando o “O râmico e abriga uma das maiores Estado” começava reservas minerais do país em seu a ter visibilidade, a subsolo. As atividades ligadas à mineexploração do carvão ração surgiram junto com a funganhou força dação da cidade. No fim do sécuem Criciúma lo 19, uma companhia britânica construiu uma ferrovia e explorava as minas na região. Cruzou diferentes partes do Sul até chegar a Criciúma. Sem mercado fora do país, a concessão para a exploração do carvão foi passada para indústrias cariocas, que desenvolveram a atividade. A exploração do carvão passou por diferentes fases e pontos altos. O primeiro deles veio ao fim da Primeira Guerra Mundial, quando o carvão importado se tornou muito caro e o produto daqui passou a ser procurado. As linhas ferroviárias aumentaram e novas mineradoras surgiram na época. Segundo o Cedric (Centro de Documentação e Rede de Informação do Carvão), em 1917 entrou em operação a Companhia Brasileira Carbonífera Araranguá e, em 1918, a Companhia Carbonífera Urussanga. Na década seguinte, em 1921, surgiram a Companhia Carbonífera Próspera e a Companhia Carbonífera Ítalo-Brasileira, e, em 1922, a Companhia Nacional Mineração Barro Branco.
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O auge da mineração foi entre 1940 e 1950. Na década de 1970, o número de mineradoras já havia caído PREFEITURA DE CRICIÚMA/DIVULGAÇÃO/ND
Auge do crescimento Tinha o maior número de assuntos e repercutia muito na vida da população. Era um grande jornal. É uma pena que não exista mais.
Márcio Búrigo, prefeito de Criciúma
O segundo ciclo do carvão aconteceu no governo de Getúlio Vargas, com o decreto determinando o consumo do carvão nacional e com a construção da Companhia Siderúrgica Nacional. A obrigatoriedade da utilização do carvão nacional foi estabelecida em 10% em 1931, aumentando esta cota para 20% em 1940. A CSN foi construída em 1946. O auge do setor em Criciúma se deu entre 1940 e 1950. Na década de 1970 o número de mineradoras já havia caído, e o mercado ficou basicamente na mão de empresários locais. Neste período, a área chegou a ter um novo boom, com a crise no petróleo, que fez com que o mundo voltasse os olhos novamente ao carvão. O mercado já estava consolidado e, apesar das crises, não deixou de ser forte na cidade. Em meio à expansão do setor, na década de 1940, um grupo de empresários de Criciúma reuniu-se para criar uma entidade que os representasse. A exemplo do que já vinha acontecendo em algumas capitais do Brasil, Criciúma queria ter uma associação comercial, com o papel de buscar novos horizontes e perspectivas econômicas para uma cidade que crescia pela demanda do carvão produzido na região. Foi ao redor da praça Nereu Ramos que a associação nasceu. O comércio girava em torno da praça, onde em 1917 fora edificada a igreja São José. Em 1932, foi criado o Hospital São José, no mesmo ano o primeiro grupo escolar. A comarca da cidade data de 1944. Os empresários da cidade, que movimentava sua economia pela extração do carvão, buscavam agências bancárias e necessitavam de uma estrutura comercial para que as empresas instaladas tivessem força para crescer. Então, no dia 18 de junho de 1944, lideranças políticas, empresariais e convidados assinaram a ata de fundação da Associação Comercial de Cresciúma, nome da cidade até então. A assembleia foi presidida pelo então prefeito, Elias Angeloni, e o local escolhido foi o cine Rovaris. Em 21 de janeiro de 1952, a entidade trans-
formou seu nome para Associação Comercial e Industrial de Criciúma. Aquele adendo garantia a entrada outros setores, além do carvão, que começavam a ganhar força no setor produtivo, em especial a cerâmica. O prefeito Márcio Búrigo recorda que o período de ouro do jornal “O Estado” acompanhou o desenvolvimento da economia local. “Lembro muito bem do jornal. Meu pai assinava e eu era leitor. Era o jornal mais importante de Santa Catarina”, lembra. “Tinha o maior número de assuntos e repercutia muito na vida da população. Era um grande jornal. É uma pena que não exista mais”, lamenta. Búrigo enaltece também a capacidade produtiva e empreendedora da população criciumense. “Graças ao trabalho, é a quinta maior economia do Estado atualmente”, exemplifica. Conta ainda que empresários estão investindo fortemente na ampliação do parque fabril. Em Criciúma, para ele, a crise não chegou.
Hoje, Criciúma é a quinta maior economia do Estado
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Tubarão cresce às margens do rio
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tir da década de l940, a qualidade e quantidade de empregos. Na década de 1950, a Cia. de Cigarros Souza Cruz se instalou ali, o que incrementou a agricultura e economia da região. A empresa exerceu forte in"uência na melhoria das técnicas agrícolas dos lavradores. Atualmente, além da indústria, comércio e serviços, Tubarão investe na instalação de um polo tecnológico. A cidade aposta na capacidade de quali!car mão de obra, já que conta com o Instituto Federal de Santa Catarina e é sede da Unisul (Universidade do Sul de Santa Catarina). No ano passado, tiveram início as obras do Centro de Inovação, o inova@SC, na cidade. O empreendimento custa mais de R$ 7 milhões. O centro faz parte do Programa Catarinense de Inovação. O objetivo é promover ações que tragam melhorias à economia do Estado, com a capacitação de pessoas e empresas, para aumentar a competitividade. O edifício ficará na rua Espanha, no Bairro Revoredo, próximo à BR-101, e terá 3.800 metros quadrados de área construída. O poder público também tem investido em ações que fomentam o empreendedorismo.
Além da indústria, comércio e serviços, Tubarão investe na instalação de polo tecnológico
PREFEITURA DE TUBARÃO/DIVULGAÇÃO/ND
Na década de 1950, a Cia. de Cigarros Souza Cruz se instalou em Tubarão, o que incrementou a agricultura e a economia da região
lém de Criciúma, no Sul catarinense, o jornal “O Estado” também atuou em Tubarão, cidade que faz parte da região carbonífera e cresceu impulsionada pela indústria, comércio e serviços. A cidade surgiu em 1774, nas margens do rio que leva seu nome, com a doação de terras ao capitão João da Costa Moreira, seu fundador. O local era ponto de parada para os tropeiros que desciam da região serrana com mulas carregadas de queijo, charque e outros produtos. Na região, a carga era trocada por produtos como o sal, peixe seco, farinhas e tecidos transportados pelos navios que partiam do porto de Laguna. Tubarão !cava na rota entre Lages e a área portuária. Foi às margens do rio que Tubarão se originou e cresceu focada no comércio, sendo que as mercadorias eram transportadas, inicialmente, em barcos. Em 27 de maio de 1870, o território foi desmembrado de Laguna, e o município, criado. A partir disso, foram para o local os primeiros imigrantes portugueses, seguidos por italianos e alemães. A interferência estrangeira também resultou no desenvolvimento econômico da cidade e região. Em 1875, foi criada a Cia Inglesa The Donna Thereza Cristina Railway Co Ld. A ferrovia foi o primeiro e principal agente de mudanças econômicas e sociais no município, junto com a exploração do carvão e a imigração europeia. O historiador Amadio Vettoretti conta que três empresas foram fatores básicos nas transformações econômicas e sociais no município e região Carbonífera: a Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, condição única para viabilizar a exploração do carvão (inaugurada em l884); a Cia. Siderúrgica Nacional, que instalou em Capivari a Usina de Bene!ciamento de Carvão (conhecida por Lavador do Capivari); e a Usina Termelétrica que entraram em operação em l945. O Lavador encerrou suas atividades em l99l. Da Termelétrica originou-se a Usina Jorge Lacerda Sotelca (l957) depois Eletrosul, hoje Gerasul. “Este empreendimento mobilizou a região carbonífera, sacudiu as estruturas econômicas e culturais. Além de polpudos salários, oferecia aos seus empregados uma assistência social invejável. Qualquer cargo funcional nesta estatal transmitia ao seu detentor grau de status muito valorizado pelos tubaronenses”, conta Vettoretti, em artigo sobre a cidade. A cidade de Tubarão foi beneficiada por estar instalada no entroncamento principal de onde partiam ramais para o sul catarinense, fator que incrementava o comércio. Pesava, a par-
PREFEITURA DE TUBARÃO/DIVULGAÇÃO/ND
Tubarão teve crescimento expressivo nos anos 1940, quando o jornal “O Estado” já estava consolidado
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ESPECIAL
O ESTADO
Da colônia agrícola à forte indústria têxtil
m Blumenau, o desenvolvimento econômico passou por várias vertentes ao longo de sua história. Criada em 1850, com a chegada do filósofo alemão Hermann Bruno Otto Blumenau, que obteve terras para instalar uma colônia agrícola, a cidade evoluiu rapidamente. Ainda neste ano, chegaram os primeiros imigrantes que tornaram Blumenau um dos maiores empreendimentos colonizadores da América do Sul, com importante centro agrícola. Em 1880, o cenário industrial já começava a crescer ali, quando a colônia foi elevada à categoria de município. Blumenau tornou-se cidade em 1928, quando o jornal “O Estado” já estava em atividade em Santa Catarina e passou a contar também sua história, marcada por altos e baixos. Os registros destacam enchentes na cidade desde 1880. Um dos desastres adiou inclusive a instalação do Blumenau tornou- município. Desde lá, a superação se cidade em 1928, é símbolo de seu povo. Na década de 1930, o território de Blumequando o jornal “O nau chegava a 10 mil quilômetros Estado” já estava em quadrados. Regiões passaram, no atividade em Santa entanto, a se desmembrar, até que Catarina e passou a a cidade de tornasse uma estrutuúnica, com atuais 519 quilômecontar também sua ra tros quadrados. história, marcada por O associativismo se iniciou na altos e baixos cidade motivado ainda pela agricultura. No final do século 19, a entidade associativa mais forte de Blumenau levava o nome de Kulturverein e reunia agricultores preocupados com a qualidade dos produtos cultivados na região. Com o crescimento da cidade, o comércio e a indústria ganhavam importância no desenvolvimento econômico, social e político. Por isso um grupo de comerciantes e empresários fundou, em 5 de novembro de 1901, a Associação Comercial do Vale do Itajaí, atual Associação Empresarial de Blumenau (Acib). Desde o início da industrialização, produtos manufaturados e a indústria têxtil mostraram força na cidade. A segunda é, ainda hoje, sua principal atividade econômica, responsável por 70% da arrecadação do município. As maiores companhias mantêm fábricas na cidade, como a Hering, a Karsten e a Teka. Há ainda a Cremer, a Artex e a Sul Fabril, além de outras indústrias de tecidos. Elas são reconhecidas internacionalmente pela qualidade dos materiais e pela inovação dos produtos, com artigos de cama, mesa e banho. Criada como Tricotwaren Fabrik Gerbruder
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Hering, a trajetória desta empresa mescla-se com a saga dos irmãos Hermann e Bruno Hering. Integrantes de uma tradicional família de tecelões da Alemanha, eles decidiram encarar o desafio de empreender no Brasil. O primeiro a tomar a decisão foi Hermann, que deixou família no país natal e veio para a colônia desconhecida recémcriada na América do Sul. Em 1880, a empresa já atuava e a família seguiu para Blumenau. Na década de 1990, consolidada na área fabril, a Hering inovou ao abranger o varejo. Hoje são 827 lojas no Brasil e no exterior e cerca de 8 mil colaboradores.
Economia ganha força A criação da Karsten se deu na mesma época, com uma pequena fiação e teares adquiridos na Alemanha. Era um negócio familiar que se especializou na fabricação de toalhas de mesa. Na década de 1940, com o fim da Segunda Guerra Mundial, houve um salto tecnológico, impulsionado pela aquisição de novos teares importados. Em 1970, começou a abertura para o mercado internacional. Desde então, a inovação na linha de produtos foi constante. Mas a economia blumenauense não ficou restrita à área têxtil. Recentemente, ganhou força o mercado de desenvolvimento de programas e sistemas da informação. São cerca de 80 empresas que atuam na área, criadas nos últimos 15 anos. Mais uma vez, tornaram a cidade referência no assunto. As belezas naturais também movem Blumenau, aliadas a sua cultura. A cidade abriga a maior festa alemã do Brasil, a Oktoberfest, e importantes cervejarias artesanais que já conquistaram o mercado nacional. A cidade segue bem ranqueada quando o assunto é geração de empregos. Após os dados divulgados pelo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) apontarem a liderança blumenauense no ranking catarinense e quarta colocação no ranking nacional, um levantamento feito pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico mostrou que, dentre as primeiras colocadas, Blumenau vence em algumas áreas. Blumenau lidera a geração de emprego em setores como a construção civil, por exemplo, com saldo de 218 vagas. Além disso, pula da quarta para a segunda colocação nas áreas de comércio, com saldo de 119 e setor de serviços, com 1.174 vagas.
MARCELO MARTINS/DIVULGAÇÃO/ND
ARQUIVO HISTÓRICO DE BLUMENAU/ND
Rua XV na década de 1930, época em que o território de Blumenau chegava a 10 mil quilômetros quadrados
Economia blumenauense ganha força no mercado de desenvolvimento de programas e sistemas da informação
Se Blumenau fosse um Estado, hoje ocuparia a sétima colocação na geração de empregos, o que mostra que a cidade parece andar na contramão da crise.
Edson Kestering, diretor de Desenvolvimento Econômico do município
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Entre as muitas riquezas da Serra
O
povo lageano é considerado “em-
preendedor por natureza”. Teve na agropecuária sua principal atividade econômica, mas aprendeu a diversificar suas matrizes. Tem também na madeira e no comércio, setores responsáveis pelo surgimento do povoado que deu origem ao município, suas grandes fontes de renda. Na maior cidade da Serra Catarinense, “O Estado” também atuou e fez parte de seu crescimento. O prefeito Toni Duarte recorda a atuação do jornal. “O Estado deixou sua marca registrada nos anais da história de Santa Catarina. O jornal cobriu acontecimentos importantes e por muitos anos levou a informação diária e precisa “O Estado” acompanhou a muitos lares do nosso estado. Deseme fez parte do crescimento penhou com pro!ssionalismo e ética, de Lages e região, que teve deixando impresso o seu papel junto à seu auge econômico nas sociedade catarinense”, comenta. Habitada até o século 18 por índios décadas de 1970 e 1980 caingangues e xoclengues, começou seu desenvolvimento econômico com a construção da estrada ligando as províncias do Rio Grande do Sul e de São Paulo. Em seguida, alguns colonos iniciaram fazendas de gado e de exploração de erva-mate e madeira. Isso fez surgir con"itos entre índios e colonos ocasionados pela disputa dos pinheirais. Os pinhões de araucária e animais eram a fonte básica de alimento dos índios. A localidade, fundada em 1766 pelo bandeirante paulista Antônio Correia Pinto de Macedo, servia inicialmente como estalagem para a rota comercial entre o Rio Grande do Sul e São Paulo, principalmente na passagem do gado dos campos gaúchos para abastecer os
trabalhadores da extração de ouro em Minas Gerais, o que mostra sua ligação com a história do país. Em 1860, o povoado foi elevado à categoria de cidade. A araucária, descoberta como fonte de madeira de alta qualidade, impulsionou uma grande expansão da construção civil no local e abriu comércio, já que era preferida por empresas que se instalavam no país. Essa conexão melhorou quando o governo federal construiu uma estrada de rodagem entre Porto Alegre e São Paulo, a BR-2. Então, Lages, mais uma vez, privilegiada por sua posição geográ!ca, foi escolhida para sediar o 1o Batalhão Ferroviário do Exército, encarregado de construir esta estrada. A construção de Brasília também impulsionou a economia da cidade, que fornecia madeira para a obra. Nesta época, a BR-116, antiga BR-2, ficou pronta. O município já era forte economicamente, o que atraiu ainda mais investimentos. Lages tornou-se um polo de imigração de descendentes italianos radicados no Rio Grande do Sul, que fundaram serrarias e criaram grandes empresas. Nas décadas de 1970 e 1980, Lages ganhou teatros, cinemas e novos hotéis. Nesta onda de progresso, instalaram-se as empresas Papel e Celulose Catarinense e a Olinkraft, fabricantes de papel e celulose. Atualmente, ambas formam a Klabin S.A, e geram muitos empregos na cidade. Estes foram os anos dourados e, também, os anos de desperdício de Lages, pois, os pinheirais não eram intermináveis. Em consequência, muita gente deixou a cidade, as estradas do interior foram abandonadas, e o Batalhão do Exército também foi embora, agravando a taxa de desemprego.
Atividades diversificadas A Lages dos anos 1970 não era diferente das demais cidades do seu porte, faltavam investimentos, sobravam problemas. Chegaram os anos 1980, desmembraram-se de Lages os distritos de Correia Pinto e Otacílio Costa. Como resultado, perdeu-se também, a significativa arrecadação de impostos dessas papeleiras. Desde então, ela aposta na diversi!cação como alternativa. Metalmecânica, autopeças, polo petrolífero, produção de alimentos e desenvolvimento de software são alguns segmentos que ganham espaço e importância no contexto atual. A economia em Lages tem um crescimento 3% maior que a taxa de crescimento do Estado, e a cidade é detentora de US$ 95 milhões, em média, em exportações ao ano. É conhecida pelo trabalho do homem do campo, mas não se restringiu a isso. A indústria corresponde hoje a 60% do movimento econômico do município, com destaque para as indústrias alimentícias e o crescimento do setor metalmecânico. Na pecuária, a região de Lages é uma das maiores produtoras de gado do Sul do país. Uma parcela consi-
derável dos produtores tem dado ênfase no melhoramento genético para a produção de leite e carne. O turismo também ganhou força. Um exemplo é a Festa do Pinhão, realizada no inverno, que atrai visitantes de todo o país. A cidade também incentiva o empreendedorismo. O Programa Empreender Lages, da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Renda, auxiliou os contribuintes com a abertura de 706 empresas na modalidade Microempreendedor Individual no segundo semestre de 2013, e realizou, gratuitamente, 28 declarações do Imposto de Renda neste mesmo período, com atendimento total somado em 1.626. Em 2014, de janeiro a maio, houve 430 aberturas de negócios pelo MEI, 2.853 declarações de Imposto de Renda e 3.630 atendimentos no total. Somando as aberturas de empresas nestes dois períodos, chega-se a 1.136. Atualmente, 3.280 empresas estão enquadradas no programa, beneficiadas com a isenção de impostos, taxas de vistorias, expedição de alvarás e declarações de IR.
PREFEITURA DE LAGES/DIVULGAÇÃO/ND
PREFEITURA DE LAGES/DIVULGAÇÃO/ND
Nas décadas de 1970 e 1980, Lages ganhou teatros, cinemas e novos hotéis
A indústria corresponde hoje a 60% do movimento econômico do município
O Estado deixou sua marca registrada nos anais da história de Santa Catarina. Desempenhou com pro ssionalismo e ética, deixando impresso o seu papel junto à sociedade catarinense.
Toni Duarte, prefeito de Lages
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Em torno do porto ARQUIVO HISTÓRICO DE ITAJAÍ/ND
s primeiros homens brancos a se instalarem nas terras às margens do Rio Itajaí foram ao local em busca de ouro e outro metais preciosos. Mas a extração de madeiras tornouse outro negócio bastante promissor. Foi um dos motivos para ali, nas margens do rio, ter surgido o porto. As madeireiras eram, como conta o historiador Edison D’Ávila, movidas por escravos. A exploração, no entanto, foi desenfreada, o que prejudicou a região. Mas as riquezas naturais, além da pesca e da terra fértil, continuavam motivando as pessoas a seguirem para aquela área, o que proporcionou seu crescimento. No começo do século 19, como conEm 1938, ta o historiador, intensificou-se o coque os moradores de Itajaí faquando o jornal mércio ziam com comerciantes de várias vilas “O Estado”já do litoral catarinense. Foi numa desatuava, o porto sas viagens de negócio que Agostinho passou por obras com Alves Ramos pela primeira vez veio a construção à Foz do Itajaí-Açu. Ele é considerado o fundador da cidade. Comerciando primeiro te conhecido da região do Desterro, o trecho de cais português identificou um bom ponto para expandir seus negócios e fundou o povoado ao conseguir a criação de um Curato, em 1824. Com a criação do Curato do Santíssimo Sacramento, estava fundada Itajaí. A posição geográfica, o porto que já existia e a instalação da vila chamaram ainda mais moradores de outras regiões do país. Ao mesmo tempo, além dos açorianos, também alemães, italianos e poloneses se instalaram ali. A assembleia Provincial de Santa Catarina, pela Resolução no 464, de 4 de abril de 1859, criou o Município de Itajaí, que só foi instalado em 15 de junho de 1860.
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Importância desde o século 19
Jandir Bellini, prefeito de Itajaí
Exploração da madeira foi o primeiro grande impulso econômico de Itajaí NELSON ROBLEDO/ND
‘O Estado’ era um jornal mais tradicional, de credibilidade, e deixou saudade.
Relatos históricos mencionam a importância do Porto de Itajaí desde o século 19, não somente no que se refere ao ingresso de colonizadores estrangeiros, mas também ao forte comércio fluvial que acontecia em Itajaí. Segundo estudiosos, o porto “mobilizava os sujeitos ao redor do comércio informal, havendo daí a evolução para atividades de exportação e importação”. Em 1938, quando a cidade já estava consolidada como uma das maiores de Santa Catarina – e o jornal “O Estado” já atuava – o porto passou por obras com a construção do primeiro trecho de cais. Em 1950, foi ampliado. Em 1956, teve início a edificação do primeiro armazém frigorífico do porto. O empresário Jandir Bellini, atual prefeito de Itajaí, lembra da atuação de “O Estado” na cidade. “Era um jornal muito lido. Nós tínhamos dois jornais na nossa região, que traziam as notícias do Estado. Era um deles. “O Estado” era um jornal mais tradicional, de credibilidade, e deixou saudade. Era uma época em que as notícias chegavam apenas através da mídia escrita”, recorda. O crescimento da cidade foi constante. Em 1996, o Porto de Itajaí foi considerado porto organizado. Na década seguinte, foi erguido o prédio administrativo do porto. As operações nesta época eram alavancadas pelas cargas de madeira, trazidas das regiões Oeste, Meio-Oeste e Planalto de Santa Catarina e exportadas por Itajaí. Na década de 1960, o comércio deste material teve queda. Mas em 1970, a movimentação recomeçou, com a grande indústria catarinense se preparando para conquistar e ampliar sua participação no mercado externo.
Economia se diversifica A partir de então, o Porto de Itajaí passou a diversificar suas operações. Começou a operar cargas de açúcar, de produtos congelados e, logo em seguida, os contêineres, que hoje são o carro-chefe da movimentação. Na década de 1990, o município assumiu a gestão do porto. Isso possibilitou o recebimento de investimentos em equipamentos e modernização. Muitos problemas foram enfrentados. O porto sofreu duas grandes crises, provocadas pela destruição parcial de sua estrutura por duas grandes enchentes, uma em 1983 e outra em 2008. Mas a recuperação ocorreu. Na história recente, as principais mercadorias movimentadas pelo Porto de Itajaí foram: madeira e derivados; frangos congelados (maior porto exportador do Brasil); cerâmicos; papel kraft; máquinas e acessórios; tabacos; veículos, têxteis; açúcar e carne congelada. Merece destaque a movimentação de contêineres, que coloca o Complexo Portuário de Itajaí na segunda posição do ranking nacional, atrás apenas do Porto de Santos. Hoje, Itajaí tem o 29o PIB (Produto Interno Bru-
to) nacional e o 1o no Estado de Santa Catarina. “A economia de Itajaí está bastante diversificada. É claro que a atividade portuária é o setor principal, mas temos a logística, a indústria, turismo, prestação de serviço também fortes”, pontua o prefeito. “Na construção civil, estamos entre as principais cidades do Estado. A pesca, o comércio e a universidade, também são muito importantes”, completa. Para ele, “o potencial de Itajaí está na sua localização geográfica, acompanhado de sua atividade portuária”.
Cidade tem hoje o 29o PIB (Produto Interno Bruto) nacional e o 1o no Estado de Santa Catarina
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O ESTADO
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33 EDUARDO VALENTE/ND
Aos 18 anos, o jovem que sonhava se tornar jogador de futebol encontrou emprego nos classificados de “O Estado”
Publicidade ganhou força no “O Estado”
O
jornal “O Estado” foi o início do jornalismo impresso catarinense. Nele eram publicadas as primeiras reportagens, as primeiras fotos. Era nele que a sociedade se via. Mas foi mais do que isso. Abriu mercado e foi também o berço da publicidade catarinense. Para as empresas, era importante ter seu anúncio veiculado no jornal. A relação com “O Estado” era sinônimo de qualidade. Presidente da Abap-SC (Associação Brasileira de Agências de Publicidade de Santa Catarina), o publicitário Daniel Araújo, 50 anos, tem sua história estreitamente ligada com a de “O Estado”. Aos 18 anos, o jovem que sonhava se tornar jogador de futebol entrou na faculdade de administração, casou e começou a procurar um emprego mais estável. Foi nos classificados de “O Estado” que encontrou uma vaga de contato comercial para trabalhar em uma agência de propaganda. “Me apaixonei pelo que estava fazendo e achei que podia começar meu próprio negócio. Comecei como ‘eu agência’. Eu era o criativo, o atendimento, o produtor, e aos poucos fui crescendo, de forma gradativa, sustentável, sempre com os pés no chão”, conta Daniel. Foi também em “O Estado” que estreou na mídia impressa. “Tem um pouco de nostalEstreia na mídia gia da minha parte, porque a minha primeira impressa aconteceu mídia paga foi no jornal ‘O Estado’. Era um anúncio de compra e venda de ouro”, ele lemcom um anúncio bra. E narra a história em detalhes: “Eu estade compra e va caminhando pela rua Felipe Schmidt, em venda de ouro 1983, e me deparei com uma menina entregando folhetinho de ‘vendo e compro ouro’. Nem sei se existe essa atividade ainda na praça. Aí pensei que a pessoa estava limitando essa atividade a quem passava por ali, que se anunciasse no jornal atingiria muito mais gente. Fui até o endereço, conversei com o proprietário e fiz a proposta”. O anúncio, recorda Daniel, fez muito sucesso. “Ele chegou a pedir para tirar o anúncio porque não estava dando mais conta. Era uma sala pequena, ele tinha uma secretária. Se mudou, foi para um espaço maior e montou uma espécie de joalheria. Foi o primeiro momento que eu percebi a força da comunicação”, a!rma o publicitário. Desde então, sua relação com “O Estado” foi bastante próxima. “Peguei o auge do jornal e acompanhei todo o processo de desativação. Trabalhei muito forte para que se mantivesse, mas eram muitas di!culdades. O jornal !cou muito desgastado. A marca ficou desgastada”, lamenta. Mas guarda lembranças dos bons tempos: “Era um jornal que retratava muito o dia a dia da cidade. As pessoas se identi!cavam ao ler o jornal. Embora fosse estadual, ele sempre foi identi!cado como local. Você abria o jornal e via as pessoas daqui. Em termos de matéria, de conteúdo, não existe mais essa relação que havia com ‘O Estado’. Perdeu aquele charme de ser aquele jornal bem local, de você ver as fotos e reconhecer as pessoas”. A existência de “O Estado” se tornou importante para o mercado publicitário. “A gente gostava de impressionar os clientes e os levava até a sede do jornal. Eles ficavam encantados, aquilo animava os próprios anunciantes. Viam a redação, a sala de revelação das fotos, as chapas. Era um trabalho muito artístico, muito artesanal”, narra. Na época, cerca de 30 anos atrás, o meio de comunicação mais popular era o rádio. Os anúncios eram mais baratos, o alcance quase que garantido. Mas o jornal surgia como uma aposta forte. “Jornais são formadores de opinião. Quando você queria passar a imagem de marca
consolidada, forte, tinha que anunciar no “Estado”. Era fundamental ter sua marca ligada ao nome do jornal”, afirma o publicitário. Com saudosismo, Daniel lembra que “o jornal era lindo de ver”. “Todo aquele processo, muita gente trabalhando. Ele marcou uma época e vai ficar na memória de todos que iniciaram seus negócios e tiveram a oportunidade de anunciar lá”, garante. “O Estado” fez parte da história da publicidade catarinense, mercado que se modi!cou muito nas últimas décadas. “Eu lembro como eram os anúncios, era muito diferente. Usava ‘letra 7’, fotocomposição. Era uma arte preparar um anúncio”. Guarda lembranças de árduos trabalhos realizados em uma época em que a tecnologia ainda não havia avançado. “Teve um aniversário do Mercado Público que !zemos um anúncio com uma poesia. Levou muito tempo. Mas quando foi publicado no jornal “O Estado”, as pessoas queriam fazer quadros daquilo”, recorda.
Estilo “barriga no balcão” Na época em que começou na área, Daniel conta que havia cinco agências fortes na Capital e outras duas surgindo – entre elas a D’Araújo, da qual é proprietário. Destas, ele a!rma, restaram três. “É um mercado difícil de manter”, analisa. Mas muitas outras continuam surgindo e se profissionalizando. Daniel aprendeu ao estilo “barriga no balcão”, como de!ne. Aos 18 anos, quando não havia faculdade de publicidade e propaganda, aprendia-se fazendo. Estudou administração, fez especializações e foi se adaptando ao mercado. “Quando queríamos qualificar um pouco o departamento, tínhamos que importar do Rio Grande do Sul, de São Paulo. Principalmente do Rio Grande do Sul veio uma turma grande, mas veio gente de todo o Brasil, até do exterior”, conta. Foi a partir dos anos 2000 que os cursos na área passaram a ser oferecidos. Com isso, o mercado ganhou quali!cação e se consolidou no país. Em Santa Catarina, isso também ocorreu. Aliado com o empreendedorismo e iniciativa de empresários de se manter no Estado, ganhou força. “Minha identidade com Florianópolis é muito grande. Tanto que ao longo desse período eu recebi três convites muito grandes para ir para São Paulo, mas decidi !car, não queria me separar de Florianópolis, e não me arrependo de nada. Conseguimos nos consolidar no mercado nacional estando aqui”, ressalta. Há três décadas na área, Daniel percebe que não só a Capital conseguiu vencer as di!culdades e garantir um mercado publicitário forte. “A publicidade sempre acompanhou os grandes centros, então eram as metrópoles que concentravam mais agências. Mas a partir dos anos 2000, os pro!ssionais começaram a ir também para outros mercados. Em Chapecó, Criciúma, Joinville, Blumenau, temos bons centros. É o retrato da economia do nosso Estado”, opina o publicitário. Para ele, essa descentralização dos negócios é um diferencial de Santa Catarina. E o mercado continua em constante evolução. “O momento é outro, temos que ter olhos para essa nova forma de se comunicar com o consumidor”, a!rma, ao citar a internet. “Essa coisa de criar só para as mídias tradicionais não existe mais. Nas agências, os tradicionais tiveram que se adaptar, e a gente não pode deixar de contratar essas pessoas que já nasceram com um tablet na mão. Temos jovens na agência que sabem muito bem lidar com esses meios. Talvez não saibam como nós, jurássicos, o que falar através deles. Há uma união de conhecimentos para ter um melhor resultado”, exempli!ca.
Era um jornal que retratava muito o dia a dia da cidade. As pessoas se identificavam ao ler o jornal.
Daniel Araújo, publicitário
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ESPECIAL
O ESTADO
Passado, presente e futuro FLĂ VIO TIN/ND
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residente do Sinapro-SC (Sindicato das AgĂŞncias de Propaganda de Santa Catarina), a publicitĂĄria Rosa Estrella, 44 anos, do Grupo FĂłrmula, chegou a Santa Catarina 22 anos atrĂĄs, quando o jornal “O Estadoâ€? vivia um outro momento. “NĂŁo era mais uma referĂŞncia como tinha sido durante muitas dĂŠcadas. Apesar disso, ainda era muito respeitado, o nome tinha muito peso, os pro!ssionais tinham orgulho de ter passado por lĂĄ. Sei das tentativas de empresĂĄrios locais de fazer com que o jornal retomasse seus melhores anosâ€?, conta. O mercado publicitĂĄrio se consolidava em Santa Catarina, jĂĄ havia outros jornais impressos e a tecnologia estava em formação. Natural do EspĂrito Santo, a profissional com formação em jornalismo jĂĄ veio para o Sul impulsionada por oportunidades de trabalho. Lembra que o mĂŠtodo de criação era muito diferente naquela ĂŠpoca. “Quando comecei a trabalhar HĂĄ 22 anos, em agĂŞncia, toda a criação era feita manualmente. Os quando chegou a layouts eram todos feitos a mĂŁo, ilustrados. Todas as agĂŞncias tinham que ter obrigatoriamente um bom ilusFlorianĂłpolis, Rosa trador. E a partir do momento que o cliente aprovava, o Estrella encontrou processo era muito complexoâ€?, recorda. Sobre os anĂşnum mercado pouco cios em jornais impressos, eram sempre uma surpresa. sabia ao certo o que ia sair no jornalâ€?, diz. quali cado. Hoje, “NinguĂŠm Apesar dos avanços tecnolĂłgicos, o fundamental nĂŁo estĂĄ consolidado mudou. “Hoje deixou de ser artesanal, mas a essĂŞncia continua a mesma: ter boas ideiasâ€?, enfatiza a publicitĂĄria. Rosa recorda que quando chegou ao Estado, o mercado era bem diferente do de hoje. Havia poucas agĂŞncias, poucos anunciantes. “Mas jĂĄ existia um esforço do mercado para manter as grandes contas aqui em Santa Catarinaâ€?, lembra. Nestes 20 anos, o cenĂĄrio mudou e o mercado se consolidou. â€œĂ‰ muito mais profissional, estruturado pela condição que a tecnologia nos propicia. Hoje a gente pode ter agĂŞncias em qualquer lugar. No Oeste, regiĂŁo de ChapecĂł, temos agĂŞncias maravilhosas, bem estruturadas. No Vale do ItajaĂ, Joinville, Sul tambĂŠm. Em todo o Estado temos agĂŞncias com profissionais qualificados, com formaçãoâ€?, ela analisa. Uma di!culdade era a qualificação, jĂĄ que nĂŁo havia cursos na ĂĄrea. Hoje, segundo Rosa, hĂĄ bons cursos, com bons professores e conteĂşdo adequado. “AlĂŠm disso, somos um mercado muito atraente para pro!ssionais de Estados vizinhos, em função da qualidade de vida. A economia tambĂŠm favorece – Santa Catarina continua em uma curva ascendente, diferente do Rio Grande do Sul e ParanĂĄ. Santa Catarina vive um momento muito bom, temos uma realidade diferenciada. Isso acaba refletindo em todos os negĂłcios, na publicidade tambĂŠmâ€?, opina. Mas o setor precisa se adaptar Ă s constantes mudanças. “A publicidade estĂĄ vivendo um momento de muitas mudanças, porque nĂŁo temos mais como pensar a marca do cliente sem estar onde o consumidor estĂĄ hoje. E o consumidor continua consumindo televisĂŁo, que tem grande alcance, o rĂĄdio, que em Santa Catarina tem uma importância muito grande. O que mais mudou foram as mĂdias impressas, que tiveram que se adaptar e
Publicitåria destaca os avanços tecnológicos e o papel das agências
estĂŁo se adaptando a um meio eletrĂ´nico, que ĂŠ mais barato, mais rĂĄpido, mais completoâ€?, pontua. “NĂŁo vejo como algo ruim, vejo como algo natural. A evolução ĂŠ assim. As agĂŞncias tambĂŠm precisam se adaptar, como as empresas de todos os segmentosâ€?, completa. Com duas dĂŠcadas de experiĂŞncia no mercado publicitĂĄrio catarinense, Rosa consegue traçar um panorama entre passado e presente. “Quando cheguei, o desafio era conseguir se tornar um mercado maduro em termos de capacidade de produção, de atendimento aos clientes. Hoje, a gente continua tendo como desafio quali!car a ponta, que ĂŠ o cliente. Conseguir fazer o cliente entender a importância da comunicação ĂŠ um desafio nosso. Porque Santa Catarina ĂŠ um Estado extremamente desenvolvido economicamente, tem um PIB (Produto Interno Bruto) muito alto, e como investimento publicitĂĄrio, ainda somos um Estado pequeno. O nosso maior desafio ĂŠ esse: crescer em representatividade.â€? Para ela, as facilidades tecnolĂłgicas de hoje favorecem o crescimento do setor. “Hoje, um pro!ssional recĂŠm-formado reĂşne quatro ou cinco amigos, cada um com um tipo de talento, e com a tecnologia que a gente tem hoje ele pode atender clientes de qualquer lugar do mundo. Isso facilitou demais a vida das empresas. E, alĂŠm disso, a gente tem uma economia crescendo, uma formação em crescimento, e a tendĂŞncia ĂŠ que a gente cresça em quantidade e qualidadeâ€?, projeta. “A propaganda, a publicidade, tem mercado em qualquer tamanho de cidade. O mundo mudou muito, e a comunicação sem dĂşvida nenhuma foi uma das ĂĄreas desse novo mundo que mais se modificaram, e vai continuar se modi!cando porque ela ĂŠ um retrato da sociedadeâ€?, pondera. Para Rosa, â€œĂŠ um mercado que continua oferecendo muitas oportunidadesâ€?.
O jornal era respeitado, o nome tinha muito peso, os pro ssionais tinham orgulho de ter passado por lĂĄ. Sei das tentativas de empresĂĄrios locais de fazer com que o jornal retomasse seus melhores anos.
Rosa Estrella, publicitĂĄria
Não existe tecnologia e inovação sem pessoas. É a capacidade de transformar dos trabalhadores da indústria que a torna mais competitiva e preparada para o futuro.
Santa Catarina - 13 de maio de 2015.
TEMOS MAIS EM COMUM QUE UMA HISTÓRIA CENTENÁRIA. 100 ANOS-JORNAL O ESTADO
Em 2015, o Colégio Catarinense celebra 110 anos de contribuição na missão de educar e evangelizar em Florianópolis. Nesse clima de reconhecimento e celebração, homenageamos outra instituição que teve papel importante na formação da opinião e na construção do caráter do nosso povo: o jornal O Estado. Dois protagonistas de uma história que o tempo não apaga.
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ESPECIAL
O ESTADO
Cultura em pauta “O Estado” passou do simples registro de eventos em Florianópolis à divulgação das ideias e das artes de vanguarda
s jornais sempre foram um poderoso instrumento de difusão da produção cultural. “O Estado” passou do simples registro de eventos em Florianópolis à divulgação das ideias e das artes de vanguarda, quando elas se impuseram, dobrando o conservadorismo característico da cidade. Tanto a literatura quanto as artes visuais custaram a abandonar a tradição acadêmica – tarefa facilitada pelo advento do Grupo Sul, em 1947, que trouxe os conceitos que mais de 20 anos antes haviam dado vida à Semana de Arte Moderna, em São Paulo. De lá para cá, tudo mudou, e a Capital catarinense abriga hoje tanto os pintores de paisagens e os poetas de rima pobre quanto artistas afinados com a contemporaneidade e escritores reconhecidos fora de Santa Catarina. Por meio de “O Estado”, Salim Miguel, Eglê Malheiros, Aníbal Nunes Pires e Silveira de Souza, entre outros, começaram a forçar as barricadas que jornalistas apegados ao passado, incluindo o polêmico Altino Flores, construíram e defendiam a todo custo. Com o respaldo do ex-governador Jorge Lacerda e uma determinação sem precedentes, eles chacoalharam certezas tidas como inabaláveis. A Revista Sul foi a primeira oportunidade de levar a uma ampla gama de leitores poemas e contos para gente como o próprio Salim e Nunes Pires, mas ali também havia
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textos de autores de outros Estados e países – alguns dos quais chegaram ao topo, em prestígio e vendas, anos depois. Em “O Estado” de 4 de abril de 1950 pode-se observar a temperatura da polêmica entre os “novos” (Grupo Sul) e os “velhos” (a chamada Geração da Academia). Para Altino Flores, os novatos cultivam a “arte moderna” por serem incapazes de compreender e praticar a “verdadeira” arte. A resposta é demolidora: “O Sr. Flores, por mais copioso e arguto que seja, vive em 1900. Por isso não vale a pena discutir com ele as correntes literárias posteriores a esta data”. As estocadas vêm de um lado e de outro. “A ironia de Altino Flores encontra a irreverência dos moços de Sul e do choque resultam agressões mútuas, verbalmente violentas”, escreveu a professora Lina Leal Sabino no ensaio “O Grupo Sul na literatura catarinense”. Com o Grupo Litoral, já próximo da virada para os anos 60, foi parecido. O jornal criou um caderno semanal cuja parte cultural era coordenada pelo futuro presidente da Academia Catarinense de Letras Paschoal Apóstolo Pitsica. Carlos Ronald Schmidt, Iaponan Soares, Manoelito de Ornellas, Pedro Paulo Vichietti, Franklin Cascaes, Rodrigo de Haro e Paulo Lago puderam mostrar ali as suas criações. Naqueles tempos, artistas como Ernesto Meyer Filho, Martinho de Haro e Hassis já se impunham como a vanguarda local. MARCO SANTIAGO/ND
Nos anos 1940, Eglê Malheiros e Salim Miguel já lutavam pela qualidade da cultura
Destaque à produção de artistas Um espaço fixo para as coisas da cultura veio com o Caderno 2, criado nos tempos da rua Conselheiro Mafra. Editado por Luiz Henrique Tancredo, trazia crônicas de Jair Hamms, Holdemar Meenzes e Raul Caldas Fo, e artigos e ensaios de Salim Miguel e Péricles Prade. Também comparecia Rodrigo de Haro, com desenhos e poemas. Ainda na base da linotipo, o caderno incluía uma página com a programação cultural da cidade. Depois, já na rua Felipe Schmidt, e com o sistema offset, a cultura passou a ser editada por Paulo da Costa Ramos, contando com três a quatro páginas diárias de informações, crônicas, colunas de variedades e reportagens especiais de Raul Caldas, que já se ocupava do planejamento urbano de Florianópolis e de !guras importantes da cidade. “Fiz uma entrevista com o arquiteto Luiz Felipe Gama d’Eça que preconizava a ‘cidade moderna’, com uma ligação com o continente pelo Sul da Ilha”, recorda Caldas. Se o plano diretor de Gama d’Eça nunca saiu, uma reportagem sobre o abandono das esculturas de Franklin Cascaes num galpão da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) tirou o folclorista do ostracismo e permitiu, por via indireta, o resgate de sua obra e o reconhecimento que merecia. Depois da matéria de duas páginas no Caderno 2, a universidade editou obras a seu respeito, desenhos e textos que havia escrito, recuperando um legado que corria o risco de ser lamentavelmente esquecido. Raul Caldas Fo era um dos mais ativos jornalistas daquele período, e com Marcílio Medeiros, Paulo e Sérgio da Costa Ramos, entre outros, acompanhou e divulgou a produção local na literatura e nas artes em geral. Os anos 1960 e 1970, em plena ditadura, foram marcados pela vinda de grandes espetáculos do Teatro O!cina e pela realização do filme “Prata Palomares” na Ilha. As presenças de José Celso Martinez Corrêa e de um elenco que incluía Ítala Nandi e Renato Borghi mexeram com a cidade. A irreverência dessa trupe estremeceu a pacata e conservadora Florianópolis daqueles anos.
Os anos 1970 foram de transformações técnicas importantes na imprensa escrita de Santa Catarina, mas as mudanças também se fizeram sentir na relação dos jornais com o mundo. O escritor Nei Duclós ajudou a criar o “Jornal de Santa Catarina”, em Blumenau, e chegou a fazer parte, por quatro meses, da equipe de “O Estado”, em Florianópolis, como editor de Nacional e Internacional, quando o offset foi implantado. Ele diz, contudo, que muitos jornalistas vieram de fora – foi também o seu caso – porque já se fugia de centros como Porto Alegre e São Paulo, onde “a barra era mais pesada por causa do regime”. Nei morou com outros jornalistas no Bairro Itaguaçu, um recanto isolado e de belo visual, tendo o cantor Luiz Henrique Rosa como vizinho e amigo. Depois voltou a São Paulo, de onde viera, porque lá o mercado de trabalho era mais farto. Trabalhou nas áreas de economia e política, em grandes veículos da imprensa brasileira, mas acabou voltando nos anos 1990, quando viu que Santa Catarina era um destino mais seguro – ainda que ingrato para um escritor como ele. O jornal “O Estado” era uma referência, um ponto de discussão das tendências da arte e da política num momento de intolerância e de repressão das ideias libertárias. “A gente escrevia e conversava muito, mas não tinha como publicar”, diz Nei Duclós. O jeito era mandar os textos – poemas, contos, resenhas – para as revistas alternativas de outros Estados. A produção era meio marginal, típica da província, que não vivia a efervescência dos grandes centros, mais preparados para afrontar os limites impostos pela ditadura. Naquele tempo, migrantes como Nei se integraram à “república do Itaguaçu”, que reunia jornalistas, escritores, músicos e artistas dispostos mais a curtir a natureza do que polemizar e desafiar o regime. Faziam isso por meio da arte, que, contudo, não repercutia como desejavam, pelo isolamento de Ilha e do Estado. “Ainda hoje me chamam de escritor gaúcho”, reclama Nei, que não renega suas origens, mas que traz e replica por meio da literatura a bagagem de quem andou pelo mundo.
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Tempo de glórias Período de grande atividade cultural de Santa Catarina teve espaço generoso nas páginas de “O Estado”
tempo era de glórias para os amantes da boa música. A Pró-Música de Florianópolis, comandada por Darcy Brasiliano dos Santos, trazia grandes instrumentistas do mundo inteiro e atrações como a Orquestra Sinfônica de Moscou para o Teatro do CIC, depois batizado de Ademir Rosa. O grupo Engenho surgiu como uma revelação que tinha admiradores em todo o Sul do país, e o Expresso Rural, depois apenas Expresso, também chacoalhou os palcos catarinenses. E lá estava “O Estado” dando páginas inteiras, em formato standard, para quem era novidade, desde que houvesse talento, criatividade e inspiração. Era a primeira metade dos anos 1980, e o grupo Armação trouxe o diretor paranaense Oraci Gemba para comandar “Zumbi”, um espetáculo de proporções gigantescas para os padrões de Florianópolis. O jornal deu páginas e páginas à peça, acompanhando a preparação dos cenários, os ensaios e a estreia, com pompa e circunstância, no Teatro Álvaro de Carvalho. “Tínhamos boa cobertura e um excelente retorno das reportagens publicadas”, diz Édio Nunes de Souza, ator do Armação, que depois estreou “Os órfãos de Jânio”, apresentada em diferentes espaços cênicos da cidade. No 2o Caderno, editado por Paulo Clóvis Schmitz, estavam os repórteres Everson Faganello, Fifo Lima,
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Raquel Wandelli, Joca Wolff, Monique Vandressen, entre outros que, nos anos 1980, passaram pela editoria. E críticos de música, teatro, cinema, artes plásticas e literatura. E cronistas como Flávio José Cardozo, Silveira de Souza, Sérgio da Costa Ramos, Holdemar Menezes e Márcio Camargo Costa. E colunistas como Beto Stodieck, Cacau Menezes, Miro, Zury Machado e Urbano Salles. Essa equipe, e as que se seguiram, ajudaram a viabilizar, por exemplo, a Cinemateca Catarinense e o Funcine (Fundo Municipal de Cinema de Florianópolis), ao dar voz aos produtores, diretores, técnicos e atores que se reuniam para pedir mudanças na forma como o Estado e o município tratavam a produção cinematográfica. “Uma boa geração de cineastas colocou a cidade no mapa do cinema nacional”, diz Zeca Pires, o mais destacado membro dessa constelação. E “O Estado” reproduzia as reivindicações e noticiava as conquistas que tornaram o cinema um porta-voz dos sonhos de uma nova geração. Gisa Franz, editora do caderno Magazine entre 1991 e 2004, destaca que os tempos não eram, como ocorre hoje, de culto às celebridades, que a mídia impõe para depois esquecer. Em todos os fins de semana, o encarte trazia 12 páginas de arte, literatura, gastronomia, moda e coisas da cidade.
Conquistas por meio do jornal O poeta Alcides Buss ainda morava em Joinville quando “O Estado” começou a expandir o número de sucursais e ganhar o status de um jornal estadualizado de verdade. Depois, quando veio para Florianópolis, no início da década de 1980, e passou a lecionar no curso de Letras da UFSC, muitos dos livros que lançou foram objetos de pautas do periódico. Ainda mais recorrentes eram as reportagens sobre o Varal Literário, instrumento que criou para levar a poesia para as ruas e praças e abrir espaço aos novos autores. A mesma receptividade ele encontrou quando dirigiu a Editora da UFSC, a partir de 1991, em substituição a Salim Miguel. Como chegava a todo o Estado, ter uma matéria publicada no jornal era certeza de que haveria repercussão. Um dos eventos de que Alcides se lembra é o 2o Congresso Nacional de Escritores, em São Paulo, em 1985, tema que “O Estado” explorou falando das contribuições que Santa Catarina levaria para a discussão de melhores políticas para o livro no país. “Hoje, os escritores estão mais distantes dos cadernos, e o fenômeno ocorre no Brasil inteiro”, avalia. O aprofundamento que o formato standard permitia pode ser uma explicação, mas ele também acha que os leitores passaram a buscar outros tipos de informação no dias de hoje. No teatro, além da cobertura farta, também havia a crítica, papel que durante vários anos coube a Mário Alves Neto. Ele fez isso entre 1969 e 1971, transferiuse para o Rio de Janeiro e retornou em 1981, retomando e mantendo a atividade até 1992. Além das artes
cênicas, escrevia sobre cinema, balizando o gosto de muitas pessoas. “Os textos eram bem recebidos, para a minha surpresa, não só na área do teatro, mas também por pessoas que me abordavam comentando as opiniões que dava no jornal”, conta. O ator e diretor Édio Nunes também destaca a importância e a isenção das críticas publicadas em “O Estado”. E cita um episódio que o marcou: “Um dia, folheando rapidamente o jornal, vi por alto a citação de ‘Os órfãos de Jânio’. Olhei com mais atenção e vi que era um texto de Eliane Lisboa, a quem não conhecia. Foi uma das críticas mais elogiosas que o grupo Armação já recebeu”. A professora Eliane Lisboa escrevia sobre teatro com regularidade no Caderno 2 do jornal. O cineasta Zeca Pires, diretor de “Manhã”, “Procuradas” e “A Antropóloga”, entre outros filmes, destaca as “matérias consistentes” que o jornal publicava sobre cinema. E ressalta que seu pai, o professor e escritor Aníbal Nunes Pires, foi privilegiado pelo espaço editorial concedido por “O Estado” ao Grupo Sul e aos seus membros, nos anos 1940 e 1950. No caso do cinema, houve uma luta, especialmente a partir dos anos de 1990, por recursos destinados pelo governo do Estado à produção audiovisual, que é cara e sofre com os problemas de distribuição no Brasil. “Os editais e as leis de cultura são resultado dessas batalhas, e a imprensa foi importante para tornar públicos os nossos pleitos”, diz Zeca Pires.
Zeca Pires: “O Estado” reproduzia as reivindicações e noticiava as conquistas que tornaram o cinema um porta-voz dos sonhos de uma nova geração
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Mais espaço e valorização para os nomes locais FLAVIO TIN/ND
m dos principais animadores culturais da Ilha, o pintor João Otávio Neves Filho, o Janga, sempre conciliou a criação com a luta por mais espaço e valorização dos artistas locais. Nessa missão, tinha portas abertas em “O Estado”, em reportagens e por meio de textos críticos, para dizer o que pensava. E, como o jornal tinha circulação estadual e era lido em todas as regiões, chegou a se tornar um balizador das artes visuais catarinenses. “Chegaram a me pedir autógrafos em eventos realizados no interior, em função das críticas e opiniões emitidas nas páginas do jornal”, conta. O protagonismo nesta área fez com que Janga fosse conduzido à presidência da Acap (Associação Catarinense dos Artistas Plásticos), que promovia exposições e eventos concorridos no espaço da antiga Alfândega. E aí também a cobertura era generoComo o jornal tinha sa, porque a associação utilizava circulação estadual e critérios rigorosos para definir sua era lido em todas as programação e as mostras que rearegiões, chegou a se lizava. A Acap promovia mostras itinerantes que repercutiam bastornar um balizador tante num Estado que lutava por das artes visuais se integrar, dada a existência de catarinenses “ilhas” econômicas e culturais que mais rivalizavam do que complementavam umas às outras. Janga também tinha um espaço semanal de crítica que era lido com avidez por artistas, colecionadores e galeristas – e também por gente que não era do ramo, mas que apreciava a postura exigente do autor. Ao mesmo tempo, a associação apoiava as reivindicações de suas congêneres do teatro e da música, por exemplo, porque a luta era contra as políticas oficiais equivocadas para a área da cultura. Certa vez, todas as correntes se levantaram contra a colocação de painéis de Rodrigo de Haro nas paredes do Teatro Álvaro de Carvalho, sob os auspícios do governo do Estado. As páginas de cultura, mais uma vez, deram ao episódio uma repercussão tão grande que o projeto foi abortado. O jornal afirmou, no título da matéria, que “o acontecimento cultural não foi no palco, mas no foyer do teatro”, se reportando ao protesto dos artistas em forma de performance contra a falta de critérios claros para o apoio a este ou aquele projeto cultural. Em outra ocasião, o tapeceiro Pedro Paulo Vecchietti questionou a escolha das obras de um escritor – que também pintava – pelo governador Antônio Carlos Konder Reis. Com o passar dos anos, o próprio “Estado” foi arrefecendo as críticas e dirigindo o foco, sobretudo, para a produção artística. “Na época, esse trabalho relativo à política cultural !cou mais com o Anexo, o caderno cultural de ‘A Notícia’”, afirma a ex-editora Gisa Franz.
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“Caderno 2” fez história Nos anos 1980, o Caderno 2 de “O Estado” trazia uma reportagem de capa, crônicas de autores já consagrados e com livros publicados, colunas sociais, programação cultural e informações menores acerca de eventos na Capital e região. As pautas iam das novidades na música e na literatura a matérias de comportamento, passando pelo acompanhamento dos movimentos e pressões que a classe artística fazia, porque os governos, com raras exceções, nunca tiveram uma política cultural clara, criteriosa, bem planejada. Ainda não haviam surgido em Santa Catarina as leis de incentivo, baseadas na renúncia fiscal, e era comum diretores de teatro, músicos e escritores baterem à porta dos governantes para pleitear recursos para seus projetos. Às vezes, tinham êxito, deixando os outros para trás. A edição do caderno, depois de 1987, passou por Zeny Rates, Liliana Reales, Monique Vandresen e Giza Franz. Com Giza, as edições de fim de semana passaram a merecer destaque especial, com as 12 páginas do caderno Magazine, que “inspirou muita gente no circuito da arte”, segundo suas palavras. Ela própria virou repórter e crítica de gastronomia, e se realizava vendo pessoas consultando o encarte antes de escolher um bom lugar para jantar. Na equipe estavam, entre outros, Martha Scherer e Carlos Hee, que depois seguiu carreira em São Paulo, na imprensa e na literatura. O editor Mário Pereira, es-
critor com afinado gosto artístico, dava força para as novas ideias que a equipe levantava. “Sempre presente, ele era nosso guru”, lembra Giza. “Em ‘O Estado’ tive meu melhor emprego e minha melhor experiência jornalística”, afirma Giza. O Magazine incorporou O Estadinho, voltado para o público infantil e ao incentivo à leitura desde cedo. A equipe também produziu cadernos especiais sobre literatura, atendendo a um público letrado que pedia esse tipo de conteúdo.
Revelações dos anos 1980 Foi nesse período que a música revelou a banda Dazaranha, e a dança catarinense se projetou nacionalmente a partir das coreografias do grupo Cena 11. Nas artes, Juarez Machado ganhou Paris e o mundo. A produção cinematográ!ca catarinense cresceu, embora nem sempre o dinheiro dos editais fosse repassado nos prazos, atrasando as produções e estreias e exasperando diretores, técnicos e elencos. A Pró-Música trazia instrumentistas geniais, cantores, óperas e orquestras de ponta do Brasil e do mundo, lotando o Teatro do CIC a cada sessão. Ao mesmo tempo, foi se impondo a qualidade da Camerata Florianópolis, com concertos em diferentes palcos da Capital e fora dela. Rejane Wilke, jornalista especializada em música clássica, dava o toque erudito ao caderno.
Janga: “Chegaram a me pedir autógrafos em função das críticas e opiniões emitidas nas páginas do jornal”
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Aula prática no escuro do laboratório udo começou na escuridão do laboratório. Em meio aos químicos indispensáveis para a revelação fotográfica e ao lado de profissionais como Tarcísio Mattos, Marco Cezar, Lourival Bento, Alcebíades Muniz e Rivaldo Souza, entre outros tantos perdidos na memória traiçoeira do quase cinquentão. Na época, o cineasta Everson José Faganello, 48, ainda era o Chico da vovó, o menino sonhador que aos 17 anos partiu de Seara, no velho oeste, cheio de coragem para estudar jornalismo na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Quem o levou para “O Estado”, nos anos 1980, na redação da SC-401, foi o fotógrafo Tarcísio Mattos, com quem Faganello haNos anos 1980, Chico via trabalhado na edição de revista esFaganello passava seus pecializada em bicicross e motocross. Já cursava o primeiro semestre do curdias cercado de produtos so de jornalismo, e passava o resto do químicos, revelando tempo “socado no laboratório, aquele lmes fotográ cos quartinho escuro com cheiro dos pro-
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dutos químicos no ar”. Entre as tarefas diárias, ele e Carlinhos, o outro laboratorista, preparavam e distribuíam os rolinhos de filmes aos fotógrafos. Na volta das pautas, já no fim do dia, começava a corrida contra o tempo. “Eles chegavam com uma montanha de filmes para revelar e fazer o contato (amostra em miniatura dos fotogramas revelados) que era repassado aos editores”, explica. Para acelerar o processo e não atrasar trabalho de edição e diagramação, aprendeu alguns truques com fotógrafos mais experientes. Um dos segredos era soprar e apressar a secagem do filme, sem a mínima noção dos riscos que representava a falta de equipamentos de segurança no ambiente insalubre do laboratório. “Era preciso pressa na revelação”, diz. Neste caso, era comum enfiarem as mãos na bacia com a mistura química para esfregar o filme. “Sem luvas ou máscara”, completa ele, que se lembra de outro detalhe curioso na trajetória fotográfica do jornal. “Cada fotógrafo tinha direito a um filme para a publicação de uma foto colorida por semana.” FOTOS ARQUIVO PESSOAL/ND
Foca e veteranos lado a lado na redação A experiência com fotos e fotógrafos experientes no laboratório foi fundamental para Chico Faganello conhecer de perto os meandros operacionais da redação de “O Estado”. Aprendeu, por exemplo, a ter paciência para receber material internacional enviado por agências do exterior, como France Press. Eram dois aparelhos, um de radiofoto e outro de telefoto, e muitas vezes a linha caía. O noticiário nacional e internacional era transmitido pelas agências pelos velhos aparelhos de telex. O arquivo fotográ!co, segundo Chico Faganello, não era dos mais organizados, mas tinha conteúdo. Logo o garoto que chegou do Oeste disfarçando a timidez virou repórter, com passagem obrigatória pelas editorias de Polícia e Geral antes de escrever sobre política e para a extinta editoria de Justiça. Faganello era um dos coringas e aprendeu a editar na página do noticiário internacional, até ser promovido a assistente no caderno de Cultura e Variedades – as oito páginas editadas na época por Paulo Clóvis Schmitz, o PC. Aos 48 anos e com prioridade pessoal à produção de cinema, Faganello aponta uma diferença básica entre o jornalismo atual e o que era feito em sua época de redação. “Sinto, basicamente, falta de amor pela notícia, não vejo mais vontade de investigar e de apurar. Hoje, falta jornalismo de denúncia”, avalia. Na redação, Faganello conviveu com nomes importantes na trajetória de “O Estado” e do jornalismo local. Cita, por exemplo, Antoninho Kowalski, Wilson Libório, Laudelino Sardá, Mário Pereira, o diagramador Eron Domingues e o desenhista Fábio Veiga, hoje um dos publicitários mais importantes de Santa Catarina. Em seus últimos anos na redação da SC-401, já a caminho dos anos 1990, teve como editor-chefe um baiano que lhe chamou atenção por uma peculiaridade: mascava alho o dia inteiro e impregnava a redação com o cheiro nem sempre agradável.
Grandes reportagens e parceria com joirnalistas de peso
Aos 17 anos, Faganello deixou o Oeste de Santa Catarina para estudar jornalismo em Florianópolis
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Uma intensa e apaixonada
cobertura esportiva Se o jornal é o reflexo do dono, “O Estado” correspondeu ao intenso amor de Aderbal Ramos da Silva pelos esportes
ACERVO INSTITUTO CARL HOEPCKE/DIVULGAÇÃO/ND
Desde sempre, Aderbal foi um apaixonado pelo futebol e pelos esportes náuticos
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Pedro Paulo foi um dos pioneiros da crônica esportiva em Santa Catarina, tanto que ajudou a fundar a Acesc, associação que, desde a década de 1950, reúne os cronistas esportivos do Estado. Com apenas 23 anos, foi editor-chefe de “O Estado Esportivo”. Surdo desde a infância, trabalhou como alfaiate e sapateiro, depois atuou na Imprensa Oficial e, enfim, chegou a “O Estado”, onde se dedicou durante décadas a cuidar da missão que lhe foi confiada pelo dono do jornal. E ele não apenas escrevia sobre esportes, como também jogava futebol amador e acompanhava de perto as disputas dos três clubes náuticos da Capital – Aldo Luz, Riachuelo e Martinelli –, nuns tempos em que o remo era uma paixão tão forte quanto o futebol em Florianópolis. Pedro Paulo Machado confundiu sua história de vida com a história de “O Estado” em todo o período em que esteve lá, dedicando-se integral e apaixonadamente à cobertura esportiva. Costumava dizer que aqueles eram tempos heroicos, de recursos escassos, pouca gente para trabalhar, mas o jornal cumpria sua missão de informar as torcidas e os aficionados do remo e da vela. Não havia serviços fotográficos. Quem escrevia tinha que “se virar nos 30”, caprichar na descrição de um gol, no clima das partidas, quase sempre disputadas no Campo da Liga (Estádio Adolfo Konder), na região da Praia de Fora, onde hoje é o Beiramar Shopping. Mas foi inegável o esforço de Aderbal Ramos da Silva e do jornal para valorizar prática de esportes, noticiando e estimulando as torcidas.
Pedro Paulo Machado: uma lenda da cobertura esportiva catarinense, começou em “O Estado” em 1946 ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO/ND
ornal político por excelência desde que Aderbal Ramos da Silva assumiu o controle da publicação, em 1945, “O Estado” também se destacou, ao longo do tempo, pela cobertura esportiva. Não só porque o esporte sempre esteve entre as preferências nacionais no século 20, mas porque o próprio dono era apaixonado pelo tema. Torcedor e sócio benemérito, foi presidente do Avaí Futebol Clube e da Federação Catarinense de Desportos (hoje Federação Catarinense de Futebol), e sempre esteve envolvido com o futebol. E não apenas: Aderbal valorizou também o remo (seu clube era o Aldo Luz) e a vela. Tinha cadeira cativa no Iate Clube Veleiros da Ilha. No livro “Doutor Deba – Poder e Generosidade”, o jornalista Luiz Henrique Tancredo assinala: “Aderbal gostava de futebol desde criança. Quando garoto, chegou a adquirir alguma intimidade com a bola, participando de peladas de fundo de quintal. Mais tarde, no Ginásio Catarinense, continuou praticando o esporte. Jamais, entretanto, demonstrou qualquer brilho capaz de chamar a atenção de quem quer que seja. Em momento algum revelou um futuro promissor nessa área”. A paixão pelo Avaí era tão intensa que Aderbal participou diretamente não só da administração do clube, mas até da montagem de times competitivos. Foi o caso da esquadra de 1944, também referida no livro de Tancredo, que teve ajuda direta do presidente do Grupo Hoepcke e de seu tio, o pecuarista (e depois governador) Celso Ramos, também avaiano fanático. Aderbal levou sua paixão pelo futebol adiante. Apesar de declaradamente avaiano, quando governador (1947-1951) ajudou outros times catarinenses – o próprio Figueirense, adversário clássico do Avaí, recebeu ajuda pessoal dele. O Palmeiras, de Blumenau, foi outro auxiliado pelo político e empresário. Em retribuição, o estádio levou seu nome. Claro que as paixões declaradas de Aderbal pelo futebol, remo e vela refletiram-se nas coberturas de “O Estado”, com a valorização do noticiário a partir do momento em que o empresário assumiu o controle da publicação. Muito antes da profissionalização das redações, os jornais tinham poucos redatores e editores. Havia os mais dedicados à política, à literatura e à sociedade; outros, à economia, vida bancária, ciências, polícia, religião, assuntos femininos; e, claro, aqueles que se empenhavam em atualizar o noticiário esportivo. Era o caso, nos primórdios da gestão de Aderbal, de Pedro Paulo Machado, o único que não era um jornalista “genérico” ou eclético. Sua missão era cuidar exclusivamente do esporte, em especial o futebol. Morto em 2013, aos 92 anos,
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Qualificação da editoria de Esportes ARQUIVO PESSOAL DE ROGÉRIO JUNKES/ND
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edro Paulo Machado fez história na cobertura esportiva de “O Estado” ao longo de quase 30 anos. “Era um sujeito forte, tinha um físico impressionante, porque além de jornalista era remador”, lembra o ex-diretor-presidente do jornal, José Matusalém de Carvalho Comelli, que conviveu mais de cinco anos com Pedro Paulo na redação da Conselheiro Mafra. “Fazia tudo na área esportiva, era um pro!ssional completo, o único que tinha uma editoria especí!ca”, completa Comelli. Mas Pedro Paulo era um personagem da era da linotipo. Seu estilo foi vencido pela modernização do jornal, implantada em 1972. Quando recebeu o título de Comendador do Esporte, em 2009, um reconhecimento ao seu papel nas coberturas esportivas e na fundação da Acesc (Associação dos Cronistas Esportivos de Santa Catarina), disse que sentiu, em 1972, que era hora de se aposentar. “Os alegres rapazes que chegaram mudaram tudo para melhor”, disse, referindo-se à turma de gaúchos convocada para produzir o novo “O Estado”. Na equipe que chegava, o destaque era Mário Medaglia, que passara pelo Jornal de Santa Catarina entre 1971 e 1972 e vinha para participar do processo de implantação do sistema offset, com uma nova concepção de cobertura esportiva. Junto com ele, o lendário Bodinho, como era conhecido Mauro Pires, "orianopolitano, já enturmado na turma formada por Comelli.
Equipe de cobertura dos Jogos Abertos de Joaçaba, em 1988 ACERVO DE MARCO CEZAR/ND
Uma nova era A mudança radical de 1972 representou o ingresso de “O Estado” em uma nova era, um salto de qualidade e modernidade. Avaí e Figueirense, que já tinham cobertura nos tempos de Pedro Paulo Machado, ganharam setoristas, pro!ssionais dedicados a cada um dos times, especi!camente. Ao longo do tempo, integraram a equipe nomes como os de Evory Pedro Schmidt – hoje assessor parlamentar – e Nelson Rolim de Moura, atualmente diretor da editora Insular. Foram dezenas de jornalistas convivendo com o novo formato do esporte, que não focalizava só o futebol. Havia coberturas especiais dos Jogos Abertos de Santa Catarina em quase todos os anos entre as décadas de 1970 e 1990; futebol de salão, automobilismo (com Wilson Libório de Medeiros cobrindo inclusive as provas de Fórmula 1 no Brasil); remo, vela, ciclismo, vôlei, tudo ganhava espaço reforçado nas páginas esportivas de “O Estado”. Em determinado período, nos anos 1980, o jornal saía às segundas-feiras com edições totalmente dedicadas ao esporte. Só mais tarde é que passou a circular com edições normais no primeiro dia útil da semana (antes, circulava de terça aos domingos).
Carinho especial com os Jogos Abertos
Equipe de cobertura dos jogos abertos de Criciúma
Os Jogos Abertos de Santa Catarina, que começaram em 1960, sob a coordenação de Arthur Schlösser, foram um capítulo à parte na história de “O Estado”, que passou a dar atenção mais ampliada à competição a partir da entrada na era offset. Com o tempo, os Jasc mereceram um tratamento ainda mais especial: o jornal formava equipes, com repórteres, fotojornalistas e editores, para a cobertura do grande evento esportivo anual de Santa Catarina. Hadilson Savi, ex-diretor industrial, lembra que o material era impresso em formato tabloide, com oito ou 16 páginas – dependendo da quantidade de anúncios –, era rodado e enviado para a cidade onde se realizavam os jogos. “Era uma grande logística, mobilizava muita gente, mas era importante e recompensava o esforço. Hoje, com a internet, não teríamos tanto trabalho, e os custos certamente seriam menores”, conclui.
A força da imagem esportiva Grandes profissionais da fotografia ganharam força com a ampliação da cobertura de esportes, porque as atividades – não apenas o futebol – proporcionavam imagens muito bonitas, plásticas, diferenciadas. Por causa disso, lembra José Matusalém de Carvalho Comelli, “o esporte estava sempre destacado nas capas. A boa imagem reforçava a chamada, despertava a atenção do leitor”. Orestes Araújo, Rivaldo Souza, Paulo Dutra, Sérgio Rosário, Lourival Bento, Tarcísio Mattos, Marco Cezar e Hermínio Nunes, foram alguns dos fotojornalistas que atuaram ao longo dos anos nas coberturas esportivas, dos clássicos de Avaí x Figueirense às provas de Fórmula 1, do remo às competições de vela ou dos Jogos Abertos. Na entrevista que concedeu no dia 4 deste mês, o expresidente do jornal observou que “O Estado”, depois que foi modernizado, concentrou – ou valorizou mais – suas coberturas com base nas editorias de Esporte, Política e Geral. “Eram as mais lidas, que despertavam mais interesse”, disse Comelli, sem menosprezar os assuntos sociais, de economia ou cultura.
Rogério Junkes, como motorista, e Marco César preparados para cobrir a disputa de ciclismo nos Jogos Abertos em Joaçaba, em 1988
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Em campo com os principais clubes
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vory Pedro Câmara Schmitt, ou simplesmente Pedrinho, 60 anos, coordenador de imprensa da bancada do PMDB na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, entrou na redação do “mais antigo” em junho de 1976, ainda no prédio da Felipe Schmidt. Só saiu em dezembro de 1984, quando o jornal já funcionava na SC-401. Trabalhou sempre na editoria de Esportes, formada pelo editor Mário Medaglia, o subeditor Mauro Pires, o repórter Aldírio Simões, setorista do Figueirense. Pedrinho era setorista do Avaí e Em oito anos de reportagem, cobriu treinos e jogos no Pasto do Bode, como era conhecido o Pedro Schmitt testemunhou velho estádio Adolfo Konder, a consolidação do estádio na esquina da avenida Mauro Orlando Scarpelli, a Ramos com a rua Bocaiúva, transferência do Avaí para a onde hoje funciona o Beiramar Ressacada e a ascensão dos Shopping. Nos oito anos de reportatimes do interior gem, Pedrinho teve a oportunidade de ver de perto grandes jogadores e grandes jogos. Testemunhou a consolidação do novo endereço do Figueirense, o estádio Orlando Scarpelli, no Estreito, a construção do estádio Aderbal Ramos da Silva e a transferência do Avaí para a Ressacada, a ascensão dos times do interior, principalmente do JEC e do Criciúma. Cobriu jogos em Joaçaba, São Miguel do Oeste e Palmitos, por exemplo. Como a cobertura, a circulação de “O Estado” também abrangia praticamente todas as principais cidades catarinenses. O jornal chegava todos os dias a bancas e setores estratégicos da administração pública, no litoral, no Sul, no Norte, no Planalto e até em São Miguel do Oeste. Para esta viagem de 800 quilômetros de ida e mais 800 de volta, o jornal disponibilizava duas caminhonetes para levar o jornal, que só chegava à tarde ao destino. As caminhonetes se revezam – uma delas saía de madrugada da Capital e só voltava à tarde, enquanto a outra fazia o caminho inverso.
Permuta garantia passagens aéreas No campeonato Nacional, Pedrinho Schmitt cobriu jogos de Avaí, Figueirense e, é claro, o JEC durante seu longo período de hegemonia. “Foi um período de transição. Houve um tempo de vacas magras para o futebol da Capital”, diz. A cobertura esportiva, lembra Pedrinho, fez de “O Estado” referência em todo o território catarinense, e nas principais cidades onde havia times do Campeonato Brasileiro. “Nossa cobertura era no campo. Conheci praticamente todo o Estado com as viagens com a equipe do jornal. Certa vez fomos recepcionados com churrascada pelo prefeito de Palmitos, no Oeste. Também trocávamos figurinhas com os colegas de jornais de outros Estados, durante o Brasileiro”, conta. As passagens aéreas eram bancadas por permuta entre o setor comercial e a Transbrasil. “Era publicidade em troca das viagens. Isso, por si só, explica a influência do jornal”, reforça. Comprometida e renovada, a redação mantinha-se integrada, com reuniões de pauta dentro e fora do jornal. O trabalho ia noite adentro e, quando saíam, jornalistas emendavam a conversa regada a cervejas e conhaques nas mesas do Kibelândia e outros bares da cidade, de onde saíram muitas ideias para
grandes reportagens. Praticamente três décadas depois de sua passagem pela editoria de Esportes, Pedro Schmitt não tem dúvidas de que a inércia administrativa e a falta de visão empresarial e jornalística foram fatores preponderantes para a derrocada de “O Estado”. “O jornal parou no tempo, foi engolido pela concorrência”, avalia, sem deixar de lamentar a falta que o jornal faz ao mercado de trabalho e ao jornalismo catarinense.
Bate e volta para jogos no interior Souza, o Macarrão, motorista da reportagem, que em 1987 viu seu Figueirense cair para a segunda divisão do Campeonato Catarinense, também conheceu várias cidades de Santa Catarina graças à cobertura esportiva de “O Estado”, sempre ao lado do Alvinegro. E, obviamente, do Avaí, time de coração de Aderbal Ramos da Silva e do último presidente do jornal, José Matusalém Comeli, que chegou a presidir, também, o Conselho Deliberativo do clube. Souza diz que em determinada época, quando
a BR-101 era de pista simples em todo o trajeto, em jogos em Criciúma, no Sul do Estado, o fotógrafo de “O Estado” !cava apenas os primeiros 15 minutos. “Era preciso garantir as fotos no começo, e voltar correndo com o !lme para Florianópolis, para revelar a tempo de ir para edição e impressão”, conta. Em Tubarão, também no Sul, e Itajaí, no Litoral Norte, cidades próximas da Capital, era possível fotografar todo o primeiro tempo, com retorno no intervalo.
Pedro Schmitt: “Nossa cobertura era no campo. Conheci praticamente todo o Estado com as viagens com a equipe do jornal”
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ESPECIAL
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Sob o rigor do AI-5, Santa Catarina era quali cada como uma região de alto risco para o trabalho dos jornalistas
Repórter cresce com reação à ditadura ob o rigor do AI-5, o ato institucional que suspendeu as garantias constitucionais e a liberdade de imprensa, a redação de “O Estado”, ainda no casarão dos altos da rua Conselheiro Mafra, era um sonho para o jovem idealista. Foi lá, em meio a informes que chegavam dando conta da violência e atentados praticados contra os jornalistas no Brasil e no restante da América Latina, mas com o entusiasmo do jovem repórter, que Aldo Granjeiro, 64 anos, deu os primeiros passos na “guerra surda contra a censura imposta pela ditadura militar”. Aos 46 anos de profissão e com a Em meio à violência serenidade de sempre, ao olhar para contra jornalistas, Aldo Granjeiro deu os trás neste momento em que “O Estado” completaria um século de circuprimeiros passos na lação, Granjeiro reafirma uma con“guerra surda contra vicção pessoal. Segundo o veterano, a censura imposta a combinação das circunstâncias, pela ditadura militar” para quem, como ele, era iniciante na vida profissional naqueles tempos bicudos, assume uma dimensão especial. “O jornalismo em ‘O Estado’ não foi, para mim, uma questão de teoria, mas de opção de vida, uma questão de estilo. Nenhum outro período revelou tão bem esse ponto de vista. A!nal, como nos recorda esse centenário de “O Estado”, a polêmica continua: a liberdade de expressão é ou não um valor universal e absoluto?”. Foi um tempo de arbitrariedades e muita violência, com perseguições, torturas e assassinatos dentro e fora das redações. Era tempo, também, de reação dos profissionais engajados na missão de informar ao resto da população o que realmente estava acontecendo nas ruas e nos porões da política nacional. “Para que se tenha uma ideia mais clara das di!culdades à época, desde a década de 1970 até 1993, quando começamos a vislumbrar a liberdade durante o processo de impeachment de Fernando Collor de Mello, muitos pro!ssionais foram retirados de com-
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“O jornalismo do qual participei viu-se forçado a se dirigir à população de maneira mais clara”
bate”, diz. Com base nos números apresentados em janeiro de 1993 no 1o Fórum de Jornalistas sobre Direitos Humanos, em San José da Costa Rica, Granjeiro lembra que pelo menos 360 colegas foram assassinados e 149 estavam desaparecidos na América Latina e no Caribe. “Naquele período, a nossa região era qualificada como a de mais alto risco para o trabalho dos jornalistas”, ressalta. Era o tempo do “nada a declarar”, recorda Granjeiro, que participou da reação que começou a fazer diferença nas redações em Santa Catarina. “O jornalismo do qual participei viu-se forçado a sair da sua confortável cápsula de assepsia e neutralidade, de poucas trocas, de poucas problematizações do presente, para se dirigir à população de maneira mais clara. No exercício da cólera contra a ditadura, éramos obrigados a negociar, brigar e ocupar os meios de comunicação disponíveis para fazer chegar a melhor informação possível ao leitor”, avalia.
1919 uAssinatura do Tratado de Versalhes uFundação das Ligas das Nações
1922 uMussolini chega ao poder na Itália uRealização da Semana de Arte Moderna em São Paulo (foto)
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Temas proibidos eram como bombas Época de censura foi de intensa monotonia política e absoluta escassez de informações
m “O Estado”, o jovem Aldo Granjeiro compartilhou a velha Olivetti com vários outros novatos e um time respeitado de jornalistas experientes. Ele recorda das reuniões de pauta pela manhã, regadas a café, onde a pergunta comum era “o que temos para hoje?”. Foi numa dessas ocasiões que, após a leitura do material que o jovem repórter trazia à redação, o editor Sérgio da Costa Ramos, com os olhos arregalados, disparou “essa é bomba”, “é nitroglicerina pura”. Tratava-se da divulgação de um documento do governo Colombo Salles – que era uma manifestação do regime militar contra as oligarquias – que determinava ampla reforma na estrutura política e mudava os personagens da política local. Aliás, era um dos tantos assuntos que não podia frequentar a pauta política, conforme determinava a censura vigente. “Tudo precisava ser feito na surdina, longe dos olhos do povo. Pois o jornal “O Estado”, propriedade do poderoso ‘doutor Aderbal’ (ex-governador Aderbal Ramos da Silva), um dos oligarcas que o ‘governo técnico’ declarava guerra, decidiu não apenas publicar a reportagem, como se dedicar a repercutir o caso. “Hoje, quando busco explicações para os motivos que me levaram ao meu primeiro grande furo de reportagem, a conclusão é a mesma que tem pautado meu trabalho de jornalista há quase cinco décadas: o objetivo de um repórter é conseguir uma notícia antes dos outros, para publicá-la em primeira mão”, diz. A época sob censura vivenciada por Granjeiro na redação de “O Estado” foi de intensa monotonia política e absoluta escassez de informações, submetendo jornalistas a longas jornadas de espera em antessalas de gabinetes e órgãos públicos em busca de declarações das autoridades, sempre muito cuidadosas e reticentes no uso das palavras com a imprensa.
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Aldo Granjeiro foi o primeiro repórter a mostrar o trabalho de Franklin Cascaes
“Vivíamos ainda sob o golpe de 1964, regime que submeteu o Brasil a ditadura militar até 1985”. O repórter competente, contudo, antevê a notícia e sabe superar os obstáculos para contá-la com isenção. Em sua carreira de jornalista em “O Estado”, Aldo Granjeiro recorda como foi o primeiro repórter a mostrar o trabalho de Franklin Cascaes. “De alguma forma descobri e mostrei Cascaes para a comunidade. Ele era uma pessoa modesta, professor da Escola Técnica Federal, que fazia da sua reclusão um espaço criativo com seus bonecos, seus desenhos.” Ele destaca ainda outra reportagem que !cou na história: a dos “Brasiguaios” – agricultores brasileiros que invadiam terras do Paraguai em busca de melhor sorte.
Primeira experiência em jornal grande
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1924 uSão Paulo sofre bombardeamento aéreo durante a revolta tenentista de 1924 uComeça a Coluna Prestes
ACERVO PAULO DUTRA/ND
Da nova geração de repórteres com passagem pela ampla redação da SC-401, a itajaiense Renata Rosa também guarda momentos memoráveis. Graduada pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), a jornalista – que lançou, recentemente, na Lagoa da Conceição, o livro “Alfredo Pescador”, de crônicas de Alfredo J. Rosa (in memoriam) – trabalhou em “O Estado” entre 1993 e 1996. Renata atuou nas editorias de Geral e Economia e conheceu, por exemplo, a Costeira do Pirajubaé antes do aterro da Via Expressa Sul, onde aparece em foto de Hermínio Nunes. “Naquela época, o mar batia no muro da Avenida Jorge Lacerda”. Na editoria de economia, cobriu a inauguração do McDonald’s em Florianópolis. A chegada da principal marca americana do lanche rápido, o símbolo da suposta supremacia dos Estados Unidos, foi tratada como um grande evento na cidade na época da consolidação da abertura democrática. Renata reconhece que, apesar das di!culdades estruturais, a passagem pela redação de “O Estado” foi fundamental para seu amadurecimento profissional. Dela e de diversos novos repórteres formados entre os anos 1980 e 2000 em Santa Catarina, e tantos outros que chegaram do interior e de outros Estados.
Renata Rosa: “Apesar das dificuldades estruturais, a passagem pela redação foi fundamental para seu amadurecimento pro ssional
1926 uHirohito torna-se imperador do Japão
1927 uLindenberg realiza a primeira travessia aérea do Atlântico uStálin assume o poder na União Soviética
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Morreram 23 dos 30 passageiros, entre eles, os três políticos catarinenses do partido defendido editorialmente por “O Estado”
Acidente mata políticos
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hovia forte no dia 16 de junho de 1958, uma segunda-feira. O senador Nereu Ramos, o governador catarinense Jorge Lacerda e o deputado federal Leoberto Leal, todos do PSD (Partido Social Democrático), embarcaram às 15h30min no Convair PP-CEP, no voo 412 da Cruzeiro do Sul, para o Rio de Janeiro. Uma das mais modernas e seguras da época, a aeronave tentou aterrissar em Curitiba, apesar do mau tempo, mas espatifou-se no chão. Morreram 23 dos 30 passageiros, entre eles, os três políticos catarinenses do partido defendido editorialmente por “O Estado”. Ligado umbilicalmente ao PSD, o “mais antigo” deu cobertura de capa, na edição de 17 de junho, que tinha o número 13.364. Diante da comoção, “O Estado” tirou duas edições extras no dia seguinte, 18, com os números 13.365 Avião que caiu levava e 13.366. A primeira repetiu o noticiário de o senador Nereu capa, mas ampliou a cobertura para as páRamos, governador ginas subsequentes; a segunda edição teve outra capa, com destaque para a chegada dos catarinense Jorge corpos de Jorge Lacerda e Leoberto Leal à Lacerda e o deputado Capital. O senador Nereu Ramos foi enterrafederal Leoberto Leal do no Rio de Janeiro. Curiosamente, a edição do dia 17, que noticiou o acidente aéreo e a morte dos políticos, trouxe na última página, 12, as informações sobre a convenção do PSD, realizada no sábado anterior, no auditório do Cine Ritz, na época um dos mais confortáveis da cidade, no Largo da Catedral Metropolitana de Florianópolis. Nereu, que veio a Santa Catarina exatamente para participar do encontro partidário, aparece em fotos saudando correligionários. Na primeira edição extra do dia 18, “O Estado” publicou na página 2 fotos de Nereu Ramos, Jorge Lacerda e Leoberto Leal no momento do embarque no Convair da Cruzeiro do Sul. Ainda sem a objetividade das coberturas modernas, o noticiário detalhava as circunstâncias do acidente e as biografias de cada um deles, mais os textos apaixonados de políticos e correligionários lamentando a
perda das lideranças do PSD. O assunto teve destaque nas edições seguintes, com repercussão política do desastre que mudou a história de Santa Catarina.
BR-101: luta antiga nas páginas de “O Estado” Desde a construção do primeiro trecho, ainda na década de 1960, a BR-101 e, mais tarde, a necessidade de sua duplicação foram temas de destaque nas reuniões de pauta de “O Estado”. A presença editorial do “mais antigo” na mobilização nacional por mais segurança não só para motoristas, mas também para moradores das comunidades que se desenvolveram às suas margens, é marcada por meio de reportagens especiais e pela cobertura de acidentes e suas consequências, obras de recuperação, manifestações da sociedade e ações políticas – principalmente nas etapas que antecederam a duplicação, a partir dos anos 1970, quando a rodovia começou a dar os primeiros sinais de que saturação para o trânsito cada vez mais crescente de carros e caminhões. Neste período, muitas tragédias foram retratadas nas páginas de “O Estado”. No dia 21 de agosto de 1989, por exemplo, entre os destaques da capa estava a chamada, com foto, de acidente envolvendo carreta e um ônibus de romeiros que retornava da festa religiosa de Azambuja, na cidade de Brusque, no Vale do Itajaí. Entre as vítimas presas às ferragens retorcidas, 19 pessoas estavam mortas. “O Estado” deu ampla cobertura, também, às mobilizações de parlamentares – deputados federais e senadores – catarinenses junto ao governo federal, em Brasília. Tratativas de entidades de classe, como Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina), Aemflo (Associação Empresarial da Grande Florianópolis) e Fecomércio/SC (Federação do Comércio de Santa Catarina) também tiveram abrigo nas páginas de “O Estado”. Mobilização que garantiu o andamento da obra, hoje nas etapas finais do trecho Sul – entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Tragédia há 35 anos tem tiragem recorde Uma das maiores coberturas de “O Estado” mobilizou 45 profissionais, há 35 anos. A queda do Boeing 727 da Transbrasil na encosta Oeste do Morro da Virgínia, entre Ratones e Saco Grande, causou a morte de 54 pessoas, por volta das 21h no dia 12 de abril de 1980. Ouvido a quilômetros de distância, na localidade do Canto do Moreira, de onde partiram as equipes de resgate da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros e da FAB (Força Aérea Brasileira), o estrondo foi seguido de uma bola de fogo e aterrorizou moradores do bairro. “Parecia uma bomba”, lembra o agricultor Dilvo da Silva, 76 anos, um dos moradores que mostraram aos socorristas os melhores pontos para abertura de trilhas até o local do acidente. Foi, também, um dos primeiros a chegar à clareira aberta entre árvores da mata atlântica e rochas de granizo, entre pedaços retorcidos de fuselagem, bagagens chamuscadas e corpos carbonizados, alguns despedaçados. Foi este cenário que fotógrafos e repórteres de “O Estado”, entre eles Celso Martins, mostraram nas reportagens publicadas na segunda-feira, 14 de abril, e edições seguintes. A cidade comoveu a cidade, e moradores da região ficaram o resto daquela noite de sábado e o domingo inteiro acompanhando o resgate de feridos e corpos, de helicóptero, até uma base montada no aterro da baía sul. “O Estado” realizou naquele fim de semana uma das maiores coberturas jornalísticas de suas oito décadas. Entre jornalistas e pessoal de apoio, 45 profissionais trabalharam incansavelmente, e três edições foram impressas no curto intervalo de 15 horas – a edição regular de domingo, que já estava pronta e nada trouxe sobre o acidente; outra edição dominical, com cobertura apenas na capa; e uma terceira, que circulou na segunda-feira, dedicada exclusivamente ao acidente. Foram retirados da impressora 35 mil exemplares, recorde de tiragem na época e de vendas avulsas na Capital e nas principais cidades do interior. Leitores formaram filas diante das bancas de jornais e revistas de Florianópolis. A tragédia com o Boeing da Transbrasil, que comoveu Santa Catarina, 35 anos depois, ainda dei-
xa algumas questões obscuras. Uma delas é o paradeiro de lote de joias recolhidas junto ao cadáver do empresário João Nascimento, desaparecida após ser recolhida à sala de um delegado da Polícia Civil. Lacradas em uma caixa de isopor, as peças preciosas foram substituídas por macadames, e o jornal “O Estado” também noticiou o mistério. A cobertura colocou em prova, também, a agilidade da redação. Pouco mais de 15 minutos depois de o acidente ser confirmado por uma rádio local, o editor Antônio Kowalski tratou de organizar a distribuição da reportagem e fez os primeiros contatos com São Paulo. Enquanto isso, o chefe de redação Laudelino Sardá, o editor Wilson Libório e os fotógrafos Orestes Araújo e Lourival Bento se embrenharam na marta atlântica, na encosta do Morro da Virgínia, ao lado da primeira equipe de salvamento, ainda em busca dos destroços do aparelho. A caminhada foi longa e dolorosa, com a trilha sendo aberta a facão pelos militares, com ajuda de agricultores de Ratones. Vários curiosos se misturaram aos voluntários e não faltaram casos de quedas, algumas graves, como a que causou ferimentos em Miriam Schmidt, na época uma das jovens que tentaram desafiar as armadilhas da natureza para ver de perto a enorme clareira e os restos de fuselagem e corpos mutilados. Por alguns momentos, Orestes Araújo deixou de lado o equipamento fotográfico e virou um dos heróis da tragédia. Ao perceber que a moça não resistiria à noite na mata, ele a pegou nos braços e a carregou pela trilha até um local onde o helicóptero da FAB pôde içá-la para um lugar seguro.
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Praça 15 em guerra ACERVO OE/ND
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ercada pela cavalaria da Polícia Militar, a Praça 15 de Novembro parecia uma praça de guerra. A confusão se estendia pelas ruas do entorno, principalmente nos primeiros quarteirões da Felipe Schmidt, até a esquina com a Trajano e nos fundos do atual Museu Cruz e Sousa, o antigo Palácio Rosado do Governo de Santa Catarina, ponto de partida para a “Novembrada”. Os desdobramentos do movimento popular que desafiou a arrogância do general João Baptista Figueiredo, o último presidente militar do Brasil depois do golpe de 1964, e apressou o processo de redemocratização da política nacional, também foram estampados com destaque nas páginas de política de “O Estado”. A cobertura foi a manchete de 1o de dezembro de 1979. Vivia-se o período da “abertura” e cogitava-se que o general Figueiredo seria sucedido na preMovimento popular sidência por um civil escolhido pela via indiredesafiou a arrogância ta. No dia anterior, ou seja, 30 de novembro, o Figueiredo visitou Florianópolis para do general João general participar de solenidades oficiais, como o desBaptista Figueiredo, cerramento de uma placa em homenagem ao o último presidente Marechal Floriano Peixoto na praça 15. Além conheceria o projeto de criação de uma militar do Brasil disso, indústria siderúrgica com recursos financeiros depois do golpe do governo federal para posterior implantação. de 1964 Um dos fatos mais marcantes na história contemporânea da política nacional, curiosamente, a Novembrada ocorreu depois da promulgação da anistia aos perseguidos políticos do regime de 1964. A comitiva presidencial contava também com o ministro das Minas e Energia, César Cals. Foi traçado um paralelo entre o regime militar de Figueiredo e as prática arbitrárias de Floriano Peixoto. Embora a placa em homenagem ao marechal tenha sido o estopim da revolta, manifestantes deixaram claro na época que o descontentamento era mesmo contra a ditadura e os constantes aumentos do custo de vida, em especial dos combustíveis e dos alimentos. Após a recepção no Palácio, onde apareceu na sacada e fez um gesto ofensivo à multidão que protestava na praça 15, Figueiredo, Bornhausen, César Cals e assessores foram para o “Senadinho”, no Ponto Chic, tradicional ponto de encontro na esquina da Felipe Schmidt com a Trajano. Na praça, Figueiredo e comitiva foram recepcionados por uma manifestação estudantil, com cerca de 4 mil pessoas, organizada pelo DCE (Diretório Central dos Estudantes) da UFSC
(Universidade Federal de Santa Catarina). A manifestação foi abafada pela Polícia Militar, resultando em muita confusão e violência e na prisão de sete estudantes, indiciados na Lei de Segurança Nacional, mais tarde absolvidos em julgamento realizado na 5a Região Militar, com sede em Curitiba, no Paraná. A cobertura de “O Estado” seguiu nas semanas seguintes, quando várias manifestações foram organizadas exigindo a libertação dos estudantes presos. Alguns protestos no Centro de Florianópolis reuniram mais de 10 mil pessoas, número relevante na época, e emissoras de televisão [Cultura e Barriga Verde] tiveram material apreendido e coberturas censuradas. A Novembrada virou curta-metragem nas mãos do cineasta Eduardo Paredes, que também foi repórter e editor de “O Estado”.
Episódio conhecido como Novembrada apressou o processo de redemocratização da política nacional
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Imagens que
marcaram época Durante quase um século, as páginas do jornal “O Estado” mostraram, acompanharam e fizeram parte de acontecimentos que mudaram a vida dos catarinenses
FOTOS ACERVO OE/ND
Em 1983, a enchente de Blumenau deixou 100 mil pessoas em risco
Lançamento do Opala, em 1968, mostrava os avanços da indústria automobilística
Conquista da Lua. Uma odisseia quase irreal, surpreendeu o mundo em 1969
Em 1983, Avaí foi campeão da Taça Governador do Estado
1979 !cou marcado como o ano em que os catarinenses mostraram sua revolta contra a ditadura. Ao visitar Florianópolis, o então presidente João Figueiredo e comitiva foram recepcionados por uma manifestação estudantil, com cerca de 4.000 pessoas
Enchente de Tubarão, em 1974, transformou a Cidade Azul em lugar de dor e desespero. Mais de 10 mil desabrigados e cinco mortos
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Homenagem. Zury Machado DÉBORA KLEMPOUS/ARQUIVO/ND
Homem de sorriso tímido, solteiro, natural de Tijucas, Zury teve sua trajetória pessoal confundida com a própria história de “O Estado”
Zury reinou nas páginas do jornal por 60 anos Mais badalado colunista social de Santa Catarina começou em “O Estado” no ano de 1946
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e há alguém que podia se orgulhar da condição de funcionário mais antigo do jornal “O Estado”, esse alguém era Zury Machado, nascido em 7 de setembro de 1922 e morto em 21 de agosto de 2014, aos 91 anos de idade. Zury trabalhou 60 anos no “mais antigo”, mantendo uma coluna social diária, em que comentava assuntos e publicava fotos de acontecimentos relacionados ao high society de Santa Catarina. Homem de sorriso tímido, solteiro, natural de Tijucas, Zury teve sua trajetória pessoal confundida com a própria história do jornal, acompanhando todos os processos de mudanças editoriais e grá!cas. Educado, fino, elegante, de voz pausada e suave, tinha traços de extraordinária humildade, espírito solidário e sempre jovem. Morreu no interior do Imperial Hospital de Caridade, onde prestava serviços há décadas, como voluntário. Depois que largou as atividades jornalísticas passou a se dedicar diariamente às atividades no IHC, cuidando de setores do hospital e confortando doentes e familiares.
Baile Branco marcou época Sua estreia como colunista foi em “A Gazeta”, concorrente de “O Estado”, mas ficou pouco tempo nesse jornal, aceitando o convite de Aderbal Ramos da Silva, em 1946, para dedicar-se a uma nova missão profissional. Em 1949 criou o lendário Baile Branco, baile de debutantes do Clube 12 de Agosto que tornou-se o sonho de todas as meninas de 15 anos da sociedade florianopolitana. Paralelamente à coluna, trabalhava na Assembleia Legislativa, onde atuou durante muitos anos como chefe do cerimonial. Em 2009, o jornalista Luiz Henrique Tancredo lançou o livro “Zury Machado – Em Sociedade Tudo Se Sabe”, contando a história de vida e de jornalismo do colunista. Em 2012, amigos realizaram uma grande festa em homenagem aos 90 anos do jornalista, completados em 7 de setembro daquele ano. Foi sua última festa, ele que, apesar de modesto, viveu sempre rodeado de amigos e admiradores em eventos sociais.
Entrevista aos 90 anos Con ra alguns trechos da entrevista que Zury Machado concedeu ao jornalista Carlos Damião, publicada pelo Notícias do Dia, quando completou 90 anos, em 2012: Paralelamente ao emprego na Assembleia Legislativa, você desenvolvia atividades de colunismo social em O Estado... Zury – Não só em “O Estado”. Eu também !z TV, na TV Cultura, com Marisa Ramos, tendo na equipe o Mauro Júlio Amorim e o César Struwe. O programa “Eles & Elas” era apresentado aos sábados, com entrevistas, desfiles e decoração (Gerber). E a rotina no jornal? Zury – Nunca !z a coluna no jornal. Sempre escrevi no meu gabinete, na Assembleia. Mandava datilografar e enviava para o jornal, onde alguém organizava as fotos e a diagramação. A quem você deve a sua revelação como colunista social? Zury – Meus amigos Sálvio de Olveira e Layla Freyesleben incentivaram para começar a coluna no jornal “A Gazeta”. Tomei gosto e !quei dois anos no jornal, onde a coluna era semanal. Depois fui para “O Estado”. A coluna passou a ser diária. Nunca mais trabalhei em outro jornal, só em “O Estado”, onde me aposentei. Qual seu maior orgulho? Zury – Sou de origem muito humilde. Meu pai foi sapateiro, mas frequentava a sociedade. Minha mãe nasceu no Brasil, mas viveu em Nápoles, na Itália, depois voltou para Tijucas. Meu avô paterno tinha um engenho de farinha. Meu avô materno era alfaiate. Éramos uma família simples. Cheguei muito longe, tendo apenas cinco anos de estudo. Imagine ser chefe do cerimonial da Assembleia! O que é elegância? Zury – Elegância é momento. Há pessoas que já nascem elegantes, mas é o momento. Um exemplo de elegância? Zury – Dona Ruth Hoepcke da Silva, esposa do governador Aderbal Ramos da Silva, já falecida. Ela foi um modelo de elegância para Santa Catarina. E você, qual o segredo de sua elegância? Zury – Nunca vesti uma camisa vermelha, nunca usei meia branca, nunca usei calça jeans desbotada. Posso achar bonito nos outros, mas nunca usei. E isso tem muita relação com os cargos que ocupei, em especial na Assembleia.
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Homenagem. Mário Pereira ROSANE LIMA/ARQUIVO/ND
Incentivo à cobertura do cotidiano das cidades Editor que entendia as agruras e vaidades dos repórteres e lidava como ninguém com as virtudes e as limitações de cada um.
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ulto, delicado, dono de texto irreparável, escritor com assento na cadeira número oito da ACL (Academia Catarinense de Letras). Ao mesmo tempo, o editor que entendia as agruras e vaidades dos repórteres e lidava como ninguém com as virtudes e as limitações de cada um, tratava de forma igual novatos e profissionais experientes. Este foi Mário Pereira, literato e jornalista, que transmitia vibração e encorajava com espaços generosos a boa cobertura do cotidiano da cidade. Em especial, da editoria de Polícia, carro-chefe da reportagem a partir da década de 1990, quando assumiu a chefia da redação com a missão de manter e ampliar as vendas avulsas para enfrentar a concorrência que se estabelecia. Mário Pereira costumava dizer que jornalismo é profissão para quem não teme desafios, não permite acomodações nem rotina no dia a dia. Uma cachaça, para alguns, mais do que vício, para Mário Pereira, ser jornalista é ter a capacidade de transformar o cotidiano em palavras. O papel do repórter, costumava repetir, é investigar, perseguir o inusitado, o que está escondido, seja para produzir uma nota de pé de página, seja para uma grande reportagem. “Profissão extenuante, em que se trabalha sempre no limite, em interminável corrida contra relógio”, escreveu em artigo para o Caderno Especial dos 80 anos de “O Estado”, em maio de 1995. “Compartilhar o ambiente de uma redação é mergulhar em uma aventura que se renova sempre”, disse naquela ocasião. Acreditava que entre os maus hábitos que cultivam, os jornalistas têm um especialmente persistente: falar mal da própria pro!ssão enquanto fazem planos para abandoná-la de vez. “Raros são os que passam de intenção à ação. Embora esta seja uma pro!ssão extenuante, ela tem um facínio especial, algo inde!nível, que só os que estão imersos são capazes de descrever.” Mário Pereira desembarcou em Santa Catarina em 1989, depois de trabalhar em diversos jornais e redações de televisão do país. Era um momento difícil, ou mais um entre tantos momentos de instabilidade nos anos derradeiros de circulação do “mais antigo”. “O Estado”, na visão dele, chegou aos 80 anos porque soube manter a identi!cação com a cidade e a região, sem deixar de ver o que estava acontecendo no mundo.
Valorização das novas gerações “O Estado” foi, acima de tudo, escola. Mário costumava valorizar as novas gerações, os jovens repórteres, alguns ainda tímidos, recém-saídos da UFSC ou, mais tarde, das outras três universidades da região, todas privadas. Participou das últimas etapas de mudanças grá!cas e editoriais, deixando o jornal apto a enfrentar o mercado cada vez mais competitivo, do ponto de vista editorial. No artigo que escreveu na edição em comemoração às oito décadas do periódico, Mário afirmou que, desde sua chegada, sabia que o “O Estado” era diferente. “Ninguém chega impunimente aos 80 anos, nem conse-
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gue tamanho grau de identi!cação com sua terra se não cultivar algumas saudáveis diferenças que destacam dos demais. E são essas diferenças que tornam “O Estado” um jornal tão atraente para os que nele trabalham e, tenho certeza, para os seus fiéis leitores.” Na gestão de Mário Pereira, “O Estado” criou novos produtos, como os suplementos Domingo Magazine, verdadeira revista cultural; e Carro e Mercado, este com a importante participação do também falecido Vilson Libório de Medeiros. Para consolidar sua presença junto a leitores, assinantes e mercado publicitário, convenceu a direção a retomar a circulação às segundas-feiras, e se manteve fiel às características editoriais com ênfase na cobertura local. “Não foi fácil. Aliás, nada é fácil quando se trata de mexer em um jornal com tanta tradição e credibilidade, dois patrimônios que só o tempo e a dedicação constroem. Para não falar nas di!culdades materiais enfrentadas. Mas todos os obstáculos foram superados, com muito esforço, mas também com muito bom humor.” Aos jovens que começavam na editoria de Polícia, ensinou, por exemplo, a destrinchar casos polêmicos de polícia, os crimes insolúveis. Sem banalizar a violência urbana que crescia na cidade.
1933 uNew Deal tem início nos EUA uHitler torna-se o 1° ministro alemão (foto)
Mário a!rmava que jornalismo é pro!ssão para quem não teme desafios, pois não permite acomodações nem rotina no dia a dia
1936 uGuerra Civil Espanhola uRoosevelt é reeleito uPrimeira transmissão televisiva, na Inglaterra (foto)
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Homenagem. Cláudio Hahn da Silva (Miro) ARQUIVO PESSOAL/ND
O colunista na Joaquina, um de seus lugares favoritos em Florianópolis
Das passarelas para uma coluna “sociológica”
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ulheres bonitas, em belas imagens registradas nas praias ou nas rodas sociais por Marco Cezar ou Paulo Dutra, frequentaram a coluna do Miro durante cerca de 17 anos. Miro era o apelido de Cláudio Hahn da Silva, um homem alto e bonito, de porte atlético, ex-modelo de passarela, divertido e bon vivant. Miro chegou a “O Estado” com a saída do colunista Cacau Menezes, convocado para trabalhar no “Diário Catarinense”, em 1986. Filho do ex-vereador Lúcio Freitas da Silva, criado na Avenida Trompowsky, a mais aristocrática de Florianópolis, o novo colunista foi “inventado” pela direção de “OE” para suprir a ausência de Cacau. Contribuiu para isso o fato de que Miro tinha ótimos relacionamentos, conhecia bem a sociedade e a cidade. Sabia quem poderia ser colunável ou não. Não fez apenas uma coluna social, mas sociológica, como dizia seu parceiro de colunismo em “OE”, Beto Stodieck. Ou seja, muito além de promover beldades ou socialites, Miro cutucava autoridades, órgãos públicos, casas noturnas, divulgava informações exclusivas e, claro, notas “maldosas”, provocativas, também chamadas de fofocas. Em depoimento publicado na edição comemorativa dos 80 anos do jornal, ele observou: “Os informantes fazem parte do dia a dia do colunismo e devem estar in!ltrados nos mais diversos lugares, principalmente órgãos públicos. Uma boa informação pode valer um furo nos concorrentes, mas uma informação duvidosa pode dar muitas dores de cabeça, pedidos de desculpas e até processos”. “E, por falar em processos, só para vocês terem uma ideia, nos últimos três anos (1992-1995) eu respondi a 13, e todos foram arquivados, depois de con!rmadas as informações publicadas. Mas o sufoco foi grande”.
Boas fotos, a base de tudo Miro enfatizou também que não era muito fácil fazer a coluna de meia página todos os dias, o que lhe exigia muito jogo
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de cintura e disposição, “mas acaba se tornando uma cachaça, um vício. O mais engraçado acaba ficando por conta das fotos publicadas, o que gera uma disputa entre os fotógrafos da cidade. Todos querem porque querem emplacar as suas fotos nas colunas. Bom para o colunista, porque se vê sempre abastecido de boas e variadas fotos. A disputa maior fica entre o irreverente Paulo Dutra e Marco Cezar, que possuem os estúdios mais requisitados da cidade”.
O prestígio de ser colunista Sobre os critérios para publicação das imagens, Miro explicou: “Difícil é recusar os pedidos diários, por telefone, de velhos amigos que querem ver suas pimpolhas nos jornais. Quando dá sorte de ser uma menina bonita e a foto estar boa, tudo bem; agora, quando pinta aquela ‘feinha’, é de lascar. Haja paciência”. Miro frequentava a sociedade, saía praticamente todos os dias, ia às festas, o que lhe dava a certeza de fazer uma coluna sempre atual, com informações quentes para os leitores. “Posso dizer que realmente a coluna dá um prestígio muito grande, e tem sempre aqueles que gostam de aparecer. Esses paparicam mesmo, causando algumas situações constrangedoras. Mas o tempo e a experiência nos fazem tirar isso de letra”, disse.
Bem apessoado, simpático, sempre sorridente, uma imagem que ficou para a cidade
A morte aos 46 anos De espírito sempre jovem e disposto, Miro morreu em janeiro de 2004, aos 46 anos de idade, vítima de câncer. Querido pela cidade, fez parte das turmas do Kioski e da Chácara do Espanha, dois grupos de amigos que se divertiam até altas horas, curtiam muito rock e pop, iam à praia e às festas juntos, davam um astral descolado à cidade nos severos tempos do regime militar. Além de colunista em “OE”, foi também funcionário público do governo do Estado, trabalhando durante muitos anos na Casa Civil.
1937 uJaponeses ocupam Pequim, Xangai e Nanquim uPicasso pinta Guernica (foto) uInstalação do Estado Novo
MARCO CEZAR/ARQUIVO PESSOAL/ND
Cláudio Hahn da Silva (Miro) entrou para “OE” em 1986, substituindo outro Cláudio, o Cacau Menezes
1939 uHitler invade a Polônia: começa a Segunda Guerra Mundial
1940 uParis é ocupada pelos alemães
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ESPECIAL
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Homenagem
Intelectuais e políticos assumem a direção ACERVO OE/ND
“O Estado” teve sua história escrita por homens como Adolfo Konder, Rubens de Arruda Ramos e Moacir Iguatemi da Silveira
n uente intelectual, homem ligado às letras e servidor público, o professor Altino Flores foi diretor entre 1925 e 1930, e proprietário de “O Estado” até 1945. Longevo e polêmico, morreu em 1982. Ao lado do escritor regionalista Tito Carvalho, defendeu a valorização da cultura local e entrou em polêmica com grupo de artistas ligados ao Grupo Sul, o Círculo de Arte Moderna, responsável pela implantação do modernismo em Santa Catarina duas décadas depois da eclosão do movimento em São Paulo. Assim como Altino Flores, o centenário de criação da marca “O Estado” remete à história escrita por homens da importância de Adolfo Konder, um dos primeiros políticos a comprar o jornal; ou Rubens de Arruda Ramos, irreverente e corajoso defensor das causas do PSD. A lista segue com Moacir Iguatemi da Silveira, pai de Luiz Henrique da Silveira, dono “laranja” que representava os interesses do poderoso Aderbal Ramos da Silva.
I
Marcas da irreverência Nome o"cial da principal avenida de Florianópolis, a Beira-Mar Norte, Rubens de Arruda Ramos deixou uma das principais marcas de “O Estado”: o jovem arqueiro, herdado da coluna “Frechando”, espaço para enaltecer os ideais do antigo PSD (Partido Social Democrático) e, principalmente, criticar os adversários da UDN (União Democrática Nacional) e trocar farpas com o irmão Jaime de Arruda Ramos, udenista que escrevia em “A Gazeta”, o concorrente de Jairo Callado. Irreverente e polêmico, Ju, como era chamado pelos amigos, criou o pseudônimo Guilherme de Tal para al"netar políticos adversários e lidar a política com humor. A coluna “Frechando” fez história e, mais tarde, o bonequinho arqueiro foi imortalizado como a principal marca do jornalismo de “O Estado”. Lageano, Rubens de Arruda Ramos começou em “O Estado” nos anos 1940, quando Aderbal Ramos da Silva, eleito governador do Estado, levou o professor Barreiros Filho, que era diretor do jornal, para sua assessoria no palácio. Em 1947, assumiu a direção com a missão de consolidar a linha editorial e conciliar os interesses comerciais, mesmo sendo porta voz do PSD, na Ilha provinciana que só engatinhava à condição de cidade. No fim da década de 1950, foi ele quem iniciou a fase de pro"ssionalização de “O Estado”, transformado em veículo de comunicação estadual. Levou à redação nomes como Silveira Lenzi, Jair Francisco Hamms, Antônio Fernando do Amaral e Silva, Flávio Amorim, Péricles Prade, entre outros intelectuais da época. Rubens morreu em 17 janeiro de 1965, mas deixou seu legado e sua marca para “O Estado”. Outra marca inconfundível foi o grito “O Estadoooo”, repetido incansavelmente pelos jornaleiros ao amanhecer, a partir da década de 1980, nas ruas centrais e, principalmente, na praça 15 de Novembro. Comprado o jornal, a leitura normalmente era feita em um dos bancos do entorno da "gueira, como cantou o poeta Zininho em um dos versos do Rancho de Amor à Ilha. O criador do grito, segundo o ex-funcionário Valmir Pires Lagoa, 57, foi um jornaleiro chamado Nilton, morador da Costeira do Pirajubaé. “Foi uma campanha publicitária, e nós fomos os garotos propaganda. Durante a gravação, o Nilton soltou ‘O Estadoooo’, e não parou mais”.
Altino Flores foi diretor entre 1925 e 30, e proprietário de “O Estado” até 1945
Rubens Ru de Arruda Ar Ramos deixou de uma das da principais marcas ma de “O Estado”: o jovem ar arqueiro, he herdado da coluna “F “Frechando”, es espaço para en enaltecer os ideais do an antigo PSD
Adolpho Konder O ex-governador Adolpho Konder (1884-1956), foi um dos primeiros donos do jornal, que o adquiriu por razões políticas. Formado em Direito em São Paulo, em 1908, era filho do professor e comerciante Marcus Konder, imigrante alemão que se fixou no Vale do Itajaí. Muito ligado a Hercílio Luz, ele assumiu o governo do Estado em 1926 e procurou integrar o Estado, até então formado por regiões estanques, sem ligações entre si. Promoveu melhorias nos portos catarinenses, estimulou a produção do trigo e da erva-mate e construiu a Penitenciária do Estado, na Capital. Em Santa Catarina, muitas ruas, praças e avenidas foram batizadas com o seu nome. Também o antigo estádio do Avaí F.C., em Florianópolis (localizado onde fica hoje o Beiramar Shopping), tinha o nome de Adolpho Konder. A partir de seu governo criou-se a linhagem dos Konder-Bornhausen, de grande importância na política catarinense do século 20.
Moacir Iguatemy Moacir Iguatemy da Silveira, pai do ex-governador Luiz Henrique da Silveira, foi informalmente dono de “O Estado” antes que Aderbal Ramos da Silva, então impedido, pudesse adquirir o veículo. Esse
episódio, no entanto, foi eventual e não interferiu na carreira de jornalista de Iguatemy, que também se destacou como timoneiro do Clube de Regatas Aldo Luz. Em seu currículo como atleta, se destacam as participações, entre 1951 e 1954, no Campeonato Catarinense de Remo, na Regata das Forças Armadas do Brasil, da 34a Regata Internacional de Montevideo, no 41o Campeonato Brasileiro de Remo e no 3o Campeonato Sul-americano de Remo.
Bento Silvério Assim como Sérgio Lopes, um dos mais destacados comentaristas políticos da história do jornalismo impresso em Santa Catarina, Bento Silvério também exerceu com destaque a função de analista dos fatos e da vida política no Estado. Todos os profissionais que passaram pela editoria reafirmam a importância do jornalista, que morreu precocemente, mas deixou um legado relevante para os repórteres da área e para os demais colegas da redação de “O Estado”. O comentarista sempre defendeu a liberdade de expressão e incentivava os repórteres a não abrirem mão de suas ideias na hora de escrever. Trabalhou no jornal num período marcado pela volta da democracia ao país, após mais de duas décadas de predomínio da ditadura.
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Homenagem. Beto Stodieck
Irreverência cosmopolita MARCO CEZA/ND
Por cultivar vínculos com metrópoles onde a vanguarda pulsava na arte e nos comportamentos, sempre esteve à frente da maioria.
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ascido em 1946, o colunista Beto Stodieck viveu uma Florianópolis que ficou para trás, pacata e provinciana, que ele amava, mas que queria mais cosmopolita como Nova York e São Paulo, cidades que frequentava com assiduidade e desenvoltura. Com amigos como Luiz Paulo Peixoto, Rômulo Coutinho de Azevedo, Max Moura e Valdir Agostinho, agitou o ambiente acanhado da urbe, estimulou a renovação nas artes e trouxe ideias e conceitos mais afinados com a modernidade para o dia a dia ilhéu. Foi em “O Estado” e no “Jornal de Santa Catarina” que Beto Stodieck exercitou um colunismo inquieto, inteligente, provocador. A coluna que fazia era um espaço de crítica que não poupava nem os amigos quando uma boa nota se mostrava mais importante que as relações sociais. Políticos, autoridades de todos os calibres, burocratas, gente com visão limitada das coisas – todos eram vítimas de sua ironia rebuscada. Ele combateu muitas transformações urbanas que descaracterizam a Capital e, certa vez, lamentou que imigrantes do Sul “amarrassem o cavalo” na ponte Hercílio Luz e começassem a dar ordens na cidade. O começo da carreira foi em 1971, em “O Estado”, depois que o colunista se formou em Direito e ensaiou os primeiros passos como jornalista no Rio de Janeiro. Em 1983, ele criou o “Jornal do Beto” e, um ano depois, foi para o “Santa”, com sede em Blumenau. De lá, voltou ao “Estado”, onde teve uma fase brilhante, embora já acossado por problemas de saúde.
Figura humana ímpar A morte do jornalista, em 6 de agosto de 1990, deixou Florianópolis órfã de um observador acurado de suas glórias e mazelas. Para muitos leitores, nunca mais o colunismo catarinense gestou um protagonista tão ardiloso e inteligente. Nos anos em que desempenhou essa tarefa, e antes ainda, agitando a vida cultural da cidade com o Studio A2, galeria de arte caracterizada pela ousadia e pelo pioneirismo, Beto demolia as certezas de um lugar muito dado a conveniências e compadrios. O jornalista Mário Pereira, que o conheceu ainda no Rio de Janeiro, em meados dos anos 1970, escreveu sobre Beto no encarte publicado quando “O Estado” completou 80 anos, em maio de 1995: “Além de uma figura humana ímpar e calorosa, Beto Stodieck foi dono de um dos melhores e mais inteligentes textos que já conheci. Digo, sem medo de errar, que ele criou um estilo. E tanto assim foi que muitos tentaram imitá-lo sem êxito. Por um motivo muito simples: Beto era extremamente bem informado, lia muito e sabia escrever. Manejava o português como poucos, era quase obsessivo em relação à correção. Ia à loucura com os erros de revisão em sua coluna. Não hesitava em telefonar para dissipar dúvidas quanto à grafia de certas palavras ou à construção de algumas frases. (...) Seu estilo irônico, seu humor ferino, seu jeito de ressaltar detalhes que aos outros costumam passar despercebidos, a rapidez do seu raciocínio transformaram sua coluna num ‘must’ do jornalismo catarinense”. Em texto publicado na revista “Mural”, do fotógrafo Marco Cezar, Cacau Menezes definiu Beto Stodieck como mais que um colunista: “Era o guru da Ilha. Influenciava seu séquito a
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1942
1941 uAtaque japonês a Pearl Harbour precipita a entrada dos EUA na Guerra
ser mais ousado nas roupas e no comportamento. Odiava caretas. Ninguém tinha mais importância na quebra de preconceitos do que esse cara. (...) Sacava tudo, por todos os lados. E não abria mão de dizer com quem queria andar, com quem queria namorar, com quem queria sair ou viajar. Elitista assumido, oriundo de família nobre, sempre cultivou o bom gosto, tanto à mesa quanto no guarda-roupa. Era chique e, ao mesmo tempo, jovem e relaxado, podendo chegar nas festas com calça jeans e camiseta Hering, ou com um Armani ou Gualtier. Gostava de grifes, de bons restaurantes, de gente bonita por perto e casa grande. Era mesmo classe A e não fazia nenhum esforço para ser popular”.
uBrasil entra na Segunda Guerra
A mort morte rte do jornalista deixou Florianópolis órfã de um observador acurado de suas glórias e mazelas
1944 uDesembarque aliado na Normandia
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Glauco José Côrte
Pastor Anísio Chagas FLÁVIO TIN/ND
ROSANE LIMA/ARQUIVO/ND
Desde os anos 1980, o atual presidente da Fiesc publica artigos sobre a conjuntura econômica
Pastor foi um dos colaboradores mais assíduos das últimas décadas de vida de “O Estado”
Evolução da economia
Interesses da população
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atual presidente da Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina), Glauco José Côrte, foi um dos mais respeitados colaboradores de “O Estado”. Desde os anos 1980, ele publica artigos sobre a conjuntura econômica do país, os desa!os do setor industrial brasileiro e os problemas que afetam a indústria catarinense. De maneira propositiva, Côrte vem fazendo ainda hoje, em outros veículos, e sempre com equilíbrio, análises baseadas no contato com seus pares e na observação das tendências da economia. Nos últimos anos, a educação tem merecido sua especial atenção, por acreditar que com ela será possível queimar etapas rumo ao desenvolvimento nacional. Glauco Côrte diz que desde o início da carreira pro!ssional, como funcionário do grupo Sotelca, em Tubarão, vem colaborando com a imprensa escrita dentro e fora do Estado. Quando morou no Rio de Janeiro, os artigos eram mais esparsos, mas ele nunca perdeu o vínculo com os espaços de opinião dos Aquele foi um período jornais catarinenses. Em “O Estado”, os textos eram datilografados em máquina de escrever e entregues rico. Ao terminar um semanalmente, em laudas, na portaria do jornal, totexto já começava a das as sextas-feiras à tarde. Com o advento do fax, as pensar no próximo. coisas !caram mais fáceis, e mesmo de férias ou em viagem, as colaborações chegavam à redação. “Só parei quando ‘O Estado’ encerrou as atividades”, conta. “Aquele foi um período rico, embora corrido, e ao terminar um texto já começava a pensar no próximo”, relata Côrte. Ligado ao setor privado, como funcionário do grupo Portobello e membro da diretoria da Fiesc, ele diz que guarda grandes recordações dos primeiros textos e que chegou a guardar o material publicado, quem sabe pensando numa coletânea a ser lançada no futuro. O fato de haver sido colega de turma do superintendente do jornal, Marcílio Medeiros Filho, no curso de Direito, abriu-lhe as portas de “O Estado”.
Sucessão de planos econômicos O período em que Glauco Côrte escrevia semanalmente foi marcado pela sucessão de planos econômicos, pela in"ação elevada e por instabilidades de todos os tipos, incluindo as incertezas quanto à retirada efetiva dos militares da cena política brasileira. Seus artigos re"etiam as ações, os acontecimentos e receitas das áreas econômica e tributária para o crescimento do país. Sem a quantidade de jornais locais de hoje em dia, “O Estado” era lido em todas as regiões catarinenses e tudo o que saía tinha repercussão superlativa, pela credibilidade e respeito que conquistou. “Era o grande jornal estadual, e os colunistas tinham boa leitura em todos os lugares”, a!rma. Atualmente, as grandes questões no âmbito da economia são a competitividade, a produtividade e o tema da educação. “Se fosse recomeçar hoje, elegeria a educação como fator de transformação da sociedade”, ressalta. A própria Fiesc criou o movimento A Indústria pela Educação, voltado para a transformação estrutural do setor, a partir de parceria entre a iniciativa privada e o poder público. “Estou cada vez mais convencido de que acertamos na escolha do tema”, diz Côrte, ciente de que se houver investimentos, Santa Catarina sairá na frente na corrida pela competitividade. As di!culdades de sintonia com o setor público decorrem, muitas vezes, das diferenças de ritmo na comparação com a área privada. A indústria tem pressa em eliminar os gargalos de infraestrutura – transporte, energia, logística –, ao passo que os governos nem sempre têm essa visão de curto prazo. “Negociar com eles exige muita determinação”, informa Côrte, a!rmando que alguns avanços vêm sendo alcançados. “Somos ouvidos em muitas tomadas de decisão, mas nós temos mais urgências do que o governo”.
O
pastor Anísio Chagas alinha-se entre os colaboradores mais assíduos das últimas décadas de vida de “O Estado”. Mais do que temas de ordem religiosa, ele sempre procurou tratar de assuntos de interesse das pessoas, do povo, da comunidade. “Como pastor, tenho a mente voltada para as coisas espirituais, mas também abordei temáticas que sugerissem uma vida melhor e a superação das crises que afetam os seres humanos”, afirma. Até pessoas sem religião davam-lhe o retorno esperado: aprovaram o que escrevia e pediam para que não parasse de publicar seus textos no jornal impresso. Leitor contumaz de jornais, o pastor continua mandando seus artigos para as redações, já não mais com as laudas do passado, mas via internet. E mantém há 30 anos o programa Gotas de Fé na TV Barriga Verde, todos os dias, além de um espaço (Análise do Fato) na rádio Novo Tempo FM, baseado nas ideias que prega e nos preceitos da Igreja O jornal é algo Adventista. Ao lado de um padre católico, esteve no lançamento e abençoou o surgimento do jornal importante, algo do Notícias do Dia, em março de 2006, na rua Deoqual ninguém deveria doro, Centro de Florianópolis. abrir mão. Desde “O Estado”, os artigos do pastor tendiam para a exortação da justiça, o bem-estar comunitário e a crítica à violência – que cresceu de lá para cá. “O mundo está cada vez mais complexo, e as agressões, os furtos, os assaltos, as guerras crescem a olhos vistos”, pondera. Por isso, nos textos e nos programas que comanda, fala da atenção que é preciso dar às mulheres, às crianças e aos idosos, sempre mais vulneráveis à violência urbana no Brasil. Membro do Conselho Estadual do Idoso, como representante da comunidade evangélica, ele sempre toca na questão da terceira idade no programa da rádio Novo Tempo. É pelas ondas do rádio que espalha suas mensagens, muitas vezes repercutindo o que lê nos jornais diários.
Um militante do jornalismo Aos 87 anos, o pastor Anísio Chagas também escreve para periódicos de outros Estados e confessa que desejou cursar jornalismo, mas a teologia era no mesmo horário na Faculdade Cásper Líbero, em São Paulo, onde estudou. Vindo do interior de Minas Gerais, depois de concluir o ensino superior, ele !xou-se, 33 anos atrás, na Grande Florianópolis, onde aos poucos se tornou conhecido e passou a encaminhar artigos para as redações locais. Por isso – e por apreciar o campo das relações públicas –, diz que se sente um militante do jornalismo, ainda que de maneira informal. Nas frases que constrói, nas opiniões e entrevistas, sempre embute capítulos e versículos de um profeta, como o que diz: “E o conhecimento se multiplicará” (Daniel, 12, 4). O conhecimento, a!rma, passa pelo jornalismo. A sua esperança é que exortações como as que faz nos textos e programas levem a uma redução dos problemas sociais e da violência, que existem desde Noé, mas que recrudescem no mundo. Menos mal, diz ele, que a própria sociedade cria barreiras legais, como a Lei Maria da Penha, para refrear as agressões contra as mulheres, por exemplo. De sua parte, faz o que pode para “construir um mundo melhor” – e a comunicação pode ser um valioso instrumento nesta direção. “Deus quer que as comunidades se comuniquem”, ressalta. “O mundo é grande, mas se torna pequeno pela tecnologia, virando uma aldeia global. Trabalho por outra realidade, que melhore a vida de todos. Neste sentido, o jornal é algo importante, algo do qual ninguém deveria abrir mão”.
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Entrevista. Celso Vicenzi
Difusor de informações relevantes Os anos 1970 e 1980 foram muito produtivos, com a elaboração de grandes reportagens.
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er trabalhado durante cinco anos e meio em “O Estado” foi o su!ciente para que Celso Vicenzi admita ter sido essa uma de suas mais prodigiosas experiências de vida. Entre 1980 e 1985, ele atuou na área de Geral, sempre como repórter, excetuando a edição de alguns cadernos especiais. “Foi um período de grande aprendizado e, ao mesmo tempo, de muitas experimentações, na maneira de escrever e editar as notícias”, a!rma. “Época em que se escrevia muito, em que os espaços editoriais eram fartos, sobretudo num jornal standard”. Celso era um aglutinador que mais tarde assumiu a presidência do Sindicato dos Jornalistas Pro!ssionais de Santa Catarina e mudou radicalmente a relação da entidade com a classe patronal na área da comunicação no Estado. Para ele, não é possível falar sobre o que aconteceu no século 20 em Santa Catarina sem mencionar com destaque “O Estado”. Entre maio de 1915 e dezembro de 2008 (na verdade, no !nal, como era um semanário, a última edição foi de 29 de dezembro de 2008 a 4 de janeiro de 2009), atuou ali um grupo destacado de pro!ssionais que também trabalhou em importantes veículos de comunicação de outros Estados, vários deles como correspondentes dos principais jornais e revistas do país. É por isso que existe quase uma unanimidade: antes da criação do curso de Jornalismo da UFSC, “O Estado” foi a escola de muitos jornalistas. O jornal passou por várias mudanças tecnológicas ao longo de nove décadas, e sua coleção completa, ainda que mal conservada em algumas bibliotecas públicas, é fonte de consulta obrigatória para entender a história de Santa Catarina e do Brasil, e também a história do jornalismo catarinense. “Os anos 1970 e 1980, sobretudo, foram muito produtivos, com a elaboração de grandes reportagens”, ressalta Vicenzi. O jornal chegou a ter sucursais em todas as principais cidades do território catarinense, 32 mil assinantes e venda avulsa de mais 10 mil jornais em bancas.
Liberdade aos pro!ssionais Celso Vicenzi trabalhou nas sucursais de “O Estado” em Brusque, inicialmente, e depois em Blumenau, de maio de 1978 a abril de 1979. Morava em Blumenau e se deslocava diariamente para Brusque de ônibus, no período da manhã, retornando ao meio-dia. Chegou a Florianópolis em fevereiro de 1980 e durante um breve período também publicou uma frase de humor diária, intitulada “Seção Sem Sal”. Antes de “O Estado”, foi redator de humor na rádio Blumenau, onde começou aos 16 anos, e mais tarde foi transferido para o Departamento de Jornalismo da emissora. Foram dois períodos: de março de 1974 a março de 1976 e de março de 1977 a janeiro de 1978. No intervalo entre os dois contratos, trabalhou no Departamento de Jornalismo da rádio Nereu Ramos, também em Blumenau, de março de 1976 a março de 1977. Reportando-se aos anos de “O Estado”, ele destaca que o jornal dava muita liberdade aos pro!ssionais e era onde se podia propor muitas pautas e viajar com frequência ao interior para fazer reportagens especiais. “Apesar de meios mais precários, em todas as áreas, principalmente tecnológica – quando comparado com os dias de hoje –, havia uma equipe muito unida e disposta a fazer jornalismo de qualidade”, diz ele. Neste sentido, o jornal foi um difusor de informações relevantes para todo o Estado, ajudando a integrar e a divulgar as diferentes regiões. “Esse intercâmbio permitiu aos leitores conhecer um pouco mais sobre a nossa gente, seus hábitos, sua cultura, sua força econômica, suas atividades esportivas e as belezas naturais, entre outros assuntos constantemente em pauta”. Em sua carreira, Celso conquistou vários prêmios de jornalismo. O mais importante deles, o Prêmio Esso de Informação Cientí!ca ou Tecnológica, em 1985, foi resultado de uma série de reportagens sobre espécies raras ou peculiares existentes na Ilha de Santa Catarina. Foi a primeira vez, em 30 anos, que o mais importante prêmio jornalístico do país concedeu uma premiação na categoria nacional para um jornalista de um veículo de comunicação fora do eixo Rio-São Paulo. No mesmo ano, ele ganhou o Prêmio Região Sul do 4o Concurso Nacional de Reportagens da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas e Bicicletas. Em 1984, havia obtido o primeiro lugar no Prêmio Jerônimo Coelho de Reportagem, sobre os 150 anos do Poder Legislativo em Santa Catarina. Em 1983, venceu o Prêmio de Reportagem sobre a Ilha de Anhatomirim, promovido pela UFSC. Antes disso, em 1981, !cou com o primeiro lugar num concurso de reportagens sobre a ponte Hercílio Luz. Em “O Estado”, Celso publicou muitas matérias sobre a luta do movimento feminista. Numa delas, em 1983, debruçou-se sobre os chamados “crimes passionais”. Um homem matara a mulher, com quem teve cinco !lhos em sete anos de casamento. A alegação do homicida era de que ela se negava a manter relações sexuais e não o queria mais porque tinha outro homem. “Acompanhei o julgamento no Tribunal do Júri de Palhoça para destacar quais argumentos eram utilizados pelos advogados de defesa ou pela promotoria para julgar o que seria um comportamento adequado ou inadequado para uma mulher”, recorda.
Título da matéria: “Em julgamento, os papéis do homem e da mulher na sociedade”. Ainda quando estudante de Jornalismo, o seu TCC foi sobre o machismo na Igreja Católica. Tão logo entrou, Celso viu-se envolvido naquela que seria, talvez, a maior cobertura feita pelo jornal: o acidente com o voo 303 da Transbrasil, que caiu no topo do Morro da Virgínia quando se preparava para aterrissar no aeroporto de Florianópolis, em abril de 1980. Dos 58 ocupantes da aeronave, apenas três sobreviveram. Lembra que na data de seu aniversário foi escalado para acompanhar a chegada dos corpos a Instituto Médico Legal e a intensa movimentação de familiares naquele local. Foi a primeira e única vez em que todos os funcionários que participaram, de todos os setores do jornal, tiveram seus nomes publicados num expediente na capa. Mas há também as histórias engraçadas, os fatos inusitados. Ele conta um dos casos: “Certa vez um gato, não se sabe como, entrou no forro do jornal. Ninguém percebeu, até que uma das placas cedeu e ele caiu em cima de uma máquina da composição. A moça que estava digitando se assustou e o gato !cou ainda mais assustado. Saltava pelas paredes, tentando fugir da sala, até que alguém abriu a porta e ele desapareceu, sem entender bem o que tinha acontecido”.
Comentário politicamente incorreto No tempo em que as notícias eram encaminhadas por telex, era comum, após o envio, o jornalista fazer algum comentário, geralmente para passar alguma instrução ao editor. Certa vez um deles fez um comentário politicamente incorreto sobre um governador catarinense, em pleno exercício do cargo. Por descuido, a composição redigiu isso junto com a notícia e assim foi publicado, no dia seguinte, para desespero do repórter e do jornal. O governador !cou quieto, fez de conta que não era com ele e tudo terminou bem. Passado o susto, rendeu boas risadas. Ele mesmo leu com espanto, certa vez, ao !nal de uma notícia que enviara, um “muito obrigado!” As premiações que obteve e a capacidade de articulação e liderança deram a Celso Vicenzi o respaldo para assumir a candidatura à presidência e levar o Movimento de Oposição Sindical dos Jornalistas de Santa Catarina à sua primeira vitória na disputa pelo sindicato da categoria. Na primeira tentativa, em 1984, liderada pelo professor Ayrton Kanitz, a categoria foi derrotada. Mais organizada, a oposição venceu em 1987, e Celso foi reconduzido três anos depois, organizando intensos debates sobre a pro!ssão, realizando eventos e levando o piso salarial do Estado, então o segundo pior do país, a um patamar bem mais aceitável. Havia reuniões, assembleias e até greves na luta por melhores salários e condições de trabalho. “Com o curso de Jornalismo e as mudanças implementadas no sindicato, cresceu a consciência política, debateu-se o papel do jornalismo e dos pro!ssionais de comunicação, exigiu-se o cumprimento da legislação, lutou-se por trabalho decente e bons salários, os jornalistas se solidarizaram e apoiaram movimentos reivindicatórios de outras categorias de trabalhadores, en!m, tornaram-se protagonistas de uma ideia de sociedade mais plural, mais crítica, mais democrática, mais justa e menos desigual”, diz Celso. Hoje, ele lamenta que do ponto de vista simbólico os veículos de comunicação “governam” o Brasil, têm mais in#uência que a própria religião, ditam estilos de vida e são uma ameaça à democracia, na medida em que estão concentrados em poucas mãos e impõem a agenda política, econômica e social do país.
É impossível falar sobre o que aconteceu no século 20 em Santa Catarina sem mencionar com destaque “O Estado”
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ESPECIAL
O ESTADO
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Entrevista. Mário Petrelli
O valor do contraponto
O ESTADO
100 ANOS
MARCO SANTIAGO/ND
Aderbal impulsionou o jornal, e Rubens de Arruda Ramos cercouse de moços competentes que seguiram na redação até os anos 1980.
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o falar dos 100 anos de “O Estado”, o empresário Mário Gonzaga Petrelli ressalta a figura do ex-governador Aderbal Ramos da Silva, responsável pela compra do jornal no período conturbado do Estado Novo, durante o governo de Getúlio Vargas. A administração do diário, na época, coube a Sidney Nocetti, com Barreiros Filho como diretor e A. Damasceno da Silva na tarefa de comandar a redação. Mais tarde, eleito para o governo, Aderbal colocou Rubens de Arruda Ramos na chefia do jornal. Foi Ju, como Rubens era chamado, quem deu peso ao veículo, de cores assumidamente pessedistas. “Aderbal impulsionou o jornal, e Rubens de Arruda Ramos cercou-se de moços competentes que seguiram na redação até os anos 1980”, afirma Petrelli, fundador do Grupo RIC. Ele destaca que o político, neto de Vidal Ramos, foi um homem público e empresário desbravador que adquiriu o jornal para que ele não deixasse de existir, transformando-o num ativo porta-voz do PSD. Já “A Gazeta”, que apoiava a UDN, tinha no jornalista Jairo Callado o seu sustentáculo. E o “Diário da Tarde”, de propriedade de Adolpho Konder, era o periódico que circulava todos os dias após o almoço. No rádio, o PSD contava com o respaldo da Guarujá, enquanto a UDN tinha a seu favor as ondas da Diário da Manhã. No início dos anos 60, “O Estado” adquiriu uma rotoplana e montou uma equipe que tinha figuras importantes do jornalismo como Gustavo Neves, Osvaldo Melo, Ilmar Carvalho, Pedro Paulo Machado, Fernando Souto Maior, Paulo da Costa Ramos, Silveira Lenzi, Lázaro Bartolomeu e Zury Machado. Com a morte de Arruda Ramos, José Matusalém Comelli assumiu a direção do jornal e investiu o que pôde para modernizá-lo. Aí entraram mais profissionais, como Marcílio Medeiros Filho, Luiz Henrique Tancredo, Sérgio da Costa Ramos, Jair Hamms e Osmar Schlindwein. Outra fase de grandes progressos foi a dos anos 1970, no governo de Colombo Machado Salles, quando o sistema passou a offset, e a redação foi novamente ampliada, em instalações mais adequadas, na rua Felipe Schmidt. Hoje, diz Mário Petrelli, “O Estado” deve ser homenageado porque marcou época e impediu, durante anos, que a mídia impressa dependesse de apenas um veículo. “O monopólio é sempre negativo para a sociedade”, justifica ele. Neste sentido, o surgimento do Notícias do Dia, do Grupo RIC, assume idêntica importância. “Temos orgulho de haver substituído ‘O Estado’ nesse papel”, ressalta. Além desse particular, os dois grupos – o comandado pela família Petrelli e o capitaneado por José Matusalém Comelli – mantiveram uma parceria por meio da TV O Estado, que foi desfeita na prática, mas garantida no campo do respeito e das afinidades. Mário destaca que seu filho Marcello Petrelli também é contra o monopólio e por isso criou o ND, que atende, sobretudo, as regiões da Grande Florianópolis e de Joinville. “A pluralidade existe para a defesa da sociedade, assegurando a dualidade de opiniões, na política e fora dela”. O fim de “O Estado” pode ser explicado, entre outros fatores, pela redução do número de jornais em todas as capitais e grandes cidades do país. É só observar, salienta Petrelli, o fenômeno da sobrevivência de dois ou três grandes periódicos nas capitais e o aumento deles no interior, atendendo à demanda crescente por informações locais. José Matusalém Comelli saiu da TV O
Estado para salvar o jornal, mas não conseguiu. Para Petrelli, esse gesto é digno de louvores, porque ele tentou manter a empresa e a competição entre concorrentes na área da comunicação. Nem o surgimento de outras plataformas de comunicação impedirá a sobrevida do jornal impresso, mesmo sendo operacionalmente uma atividade de baixos resultados, entende o empresário. “Ainda que sem o volume de antigamente, ele existe e existirá por muitas décadas, no mundo inteiro”, vaticina. Uma das razões é a multiplicação de pequenos jornais nas cidades de menor porte; outra é mostrada pela permanência das revistas semanais, com a sua força e influência. “Nos Estados Unidos, por exemplo, há alguns poucos grandes veículos e milhares de periódicos de menor porte em cidades de tamanho médio e pequeno”, afirma.
1946
1945 uMorte de Roosevelt coloca Truman na presidência uFim da guerra na Europa uEUA explodem bombas atômicas no Japão uVargas renuncia à presidência
uJuan Domingo Perón é eleito na Argentina
Homenagem ao “O Estado”, que marcou época e impediu, durante anos, que a mídia impressa dependesse de apenas um veículo
1947 uEUA lançam o Plano Marshall Independência da Índia e Paquistão
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ESPECIAL
O ESTADO
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Entrevista. Luiz Henrique Tancredo
O fim do provincianismo
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FLÁVIO TIN/ND
“O Estado” passou por uma sucessão de melhorias técnicas e, aí sim, consolidou um quadro de jornalistas de primeira linha.
ara Luiz Henrique Tancredo, editor-chefe na fase mais importante de “O Estado”, a história do jornalismo impresso de Santa Catarina divide-se entre o antes e o depois do diário que completaria, hoje, 100 anos. A partir dos anos 1970, sobretudo, ele foi um divisor de águas, porque pôs !m a um jornalismo provinciano, absolutamente partidário, feito por idealistas, “muitos dos quais verdadeiros talentos cuja história de vida merece ser reverenciada”, como Rubens de Arruda Ramos, Altino Flores e Barreiros Filho. A época áurea começou a ser gestada na primeira metade da década de 1960, quando José Matusalém Comelli assumiu o comando do jornal e, aos poucos, formou uma equipe que viria a se tornar a mais talentosa que passou pelo veículo. Vencida essa etapa de transição, “O Estado” passou por uma sucessão de melhorias técnicas e, aí sim, consolidou um quadro de jornalistas de primeira linha. Foi quando o periódico se !rmou como um jornal inovador, independente, avançado. “Tenho plena convicção de que, levando-se em conta as diferenças tecnológicas entre o passado referido e os últimos anos de vida do jornal, ‘O Estado’ não encontrou substituto à altura em Santa Catarina”, a!rma Tancredo. Para chegar a esse patamar, o jornal instalou sucursais nas cidades-polo do Estado, permitindo uma cobertura completa e e!ciente dos fatos mais marcantes que ocorriam em todas as regiões. Isso ajudou a integrar um território eivado de disparidades de toda ordem. Antes do jornal se interiorizar, os habitantes do Oeste e Meio-Oeste, especialmente, só eram servidos pelo “Correio do Povo”, de Porto Alegre. Isso reforçava ainda mais os usos e costumes trazidos pela colonização gaúcha e pela proximidade com o Rio Grande do Sul. “Essa situação começou a mudar com a penetração de um jornal genuinamente catarinense em todos os cantos do nosso Estado”, diz ele.
No ritmo das grandes coberturas Foi nesse ritmo que “O Estado” passou a fazer grandes coberturas dos Jogos Abertos de Santa Catarina. Esse evento anual mobilizava a atenção de todos, e o jornal instalava na cidadesede uma equipe que cobria todas as modalidades em disputa. Para fazer os cadernos diários com resultados e a performance dos melhores atletas em cada categoria, o jornal superava as di!culdades da época, porque o material vinha por via rodoviária, na maioria das vezes, ou por telex, e precisava ser diagramado, digitado e revisado antes de ir para as páginas e para a impressão final. Contudo, a repercussão e o retorno que esse trabalho dava ao jornal compensavam todo o esforço. Uma cobertura que Luiz Henrique Tancredo nunca esqueceu foi a do prédio que ruiu em Balneário Camboriú, porque o jornal acompanhou as horas de angústia que marcaram a retirada das pessoas presas aos escombros, algumas delas sem vida. “Estive no local com alguns colegas e constatei o drama vivido por todos que, como eu, presenciaram cenas chocantes, sentindo-nos como se fôssemos as vítimas do desastre”. O curioso é que quando a equipe voltava de Camboriú, a capela do Colégio Catarinense pegou fogo. “Em termos de desgraças, a edição do dia seguinte de ‘O Estado’ foi pródiga”, ressalta. Apesar da tradição do vínculo partidário, algo que acometia todos os jornais até o início dos anos 1960, a transição para um novo modelo marcado por maior independência foi pací!ca em “O Estado”. Não houve ingerências externas e o presidente José Comelli manteve sua prática de não interferir na linha editorial. “Naturalmente que alguns membros da redação, entre os quais me incluo, conheciam o pensamento político de Aderbal Ramos da Silva e, assim sendo, procuravam acompanhá-lo, sem, contudo, deixar de noticiar fatos que nem sempre se coadunavam com os seus pontos de vista”, explica o jornalista.
Ex-governador passava diariamente no jornal Nesse ponto, Tancredo faz questão de externar um fato que sempre manteve sob reservas. “No ocaso de sua vida, praticamente todos os !nais de dias úteis o ex-governador dava uma passada no jornal. Por enfrentar sérios problemas de visão, permanecia no automóvel e Zininho, seu motorista, entrava para informar que ‘o chefe’ chegara. Na maioria das vezes, era a
Conversas com “o patrão” antes de fechar a edição durante a ditadura
mim que ele esperava para um papo descontraído. Mal eu saía da redação, algumas vozes diziam que o ‘patrão-mor’ me chamava para pautar a edição do dia seguinte. Na verdade, ele poderia sugerir o que bem entendesse para ser publicado. Poderia, igualmente, dar alguma orientação quando fatos de maior relevância, principalmente de natureza política, estivessem na ordem do dia. Acontece que nunca, em nenhum momento, partiu de sua boca qualquer determinação nesse sentido. Falávamos sobre o que estava acontecendo e eu, muitas vezes, sabendo da sua memória privilegiada, puxava conversa sobre episódios pretéritos, pedindo-lhe detalhes sobre os mesmos. Dessas conversas, aliás, extraí muitas preciosidades para a biografia que escrevi, da qual ele foi o personagem central”. Mesmo sem ter em seus quadros militâncias ideológicas capazes de provocar perseguições por parte dos censores, “O Estado” não passou incólume o período em que vários assuntos não podiam estampar as páginas dos jornais brasileiros. Houve casos em que a edição já estava fechada e um militar aparecia com a ordem de que determinada matéria não poderia ser publicada. Até a demissão de um ministro da Agricultura (Cirne Lima) e o surgimento de um surto de meningite no Rio de Janeiro tiveram a divulgação vetada. Ainda em relação ao regime, Tancredo recorda de um episódio ocorrido na segunda metade dos anos 1960. “Certo dia, um representante da maior unidade militar da região Sul do país apareceu com uma nota para ser publicada, com destaque, intitulada ‘Terceiro Exército comunica’. Não se sabe se por cochilo ou por maldade de alguém, na edição do dia seguinte a nota saiu com o texto correto, mas tendo por título ‘Terceiro Exército comunista’. A censura ainda não havia mostrado suas garras. O que existia era uma liberdade vigiada, o su!ciente para que a cautela fosse companheira de todos. O episódio não teve maiores consequências”. No !nal das contas, o saldo da passagem por “O Estado” foi positivo. Havia um grande entusiasmo que envolvia a equipe e facilitava a produção de um jornal de qualidade. “Tínhamos orgulho de ser parte dessa história e todos estávamos imbuídos dos esforços para melhorar sempre”, ressalta o jornalista. Para Tancredo, que entrou em 1965, apenas com a experiência de uma passagem pelo setor de imprensa do Gabinete de Relações Públicas do governo Celso Ramos, ter permanecido durante 26 anos, até 1991, foi um diferencial. Diz que o jornal foi uma grande escola que moldou sua vida pro!ssional, assim como a de centenas de outras pessoas que passaram por ali.
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O ESTADO
Entrevista. Laudelino José Sardá BRUNO ROPELATO/ND
Jornalista participou de período importante do periódico
Incentivador da integração Não foi pouca coisa, num período em que as comunicações eram mais precárias, e raras eram as rodovias asfaltadas, o jornal ter mil assinantes em Chapecó e em Tubarão, por exemplo, e 600 em Nova Trento.
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edator-chefe na melhor fase de “O Estado”, Laudelino José Sardá testemunhou os grandes momentos pelos quais passou o jornal nos anos 1970 e 1980. E guarda na memória todos os episódios, as coberturas espetaculares e detalhes do processo que transformou o veículo numa referência do jornalismo impresso de Santa Catarina. Não foi pouca coisa, num período em que as comunicações eram mais precárias, e raras eram as rodovias asfaltadas, o jornal ter mil assinantes em Chapecó e em Tubarão, por exemplo, e 600 em Nova Trento, pequena cidade do Vale do Rio Tijucas. “Foi o último jornal de caráter estadual que tivemos”, aponta ele. A estadualização foi uma empreitada que teve o suporte do diretor comercial Osmar Schlindwein. Foi quando a cobertura do que acontecia em São Miguel do Oeste se equiparava, em termos de importância, aos fatos que mexiam com os municípios da Grande Florianópolis. É desse tempo a rede de sucursais que tinha em seus quadros figuras como Marcos Bedin (Chapecó), Nei Manique, Adelor Lessa (Criciúma), Arthur Monteiro (Blumenau), Olivetti Salmória, Ionice Lorenzoni (Lages) e outros que traziam as notícias de Itajaí, Joinville e Tubarão, além dos correspondentes em municípios de médio porte. A implantação e a estruturação das sucursais levaram quatro anos para serem concluídas. O material chegava por telex à mesa da editora Maristela Wagner, durante vários anos a responsável pela página de Interior. “Só o ‘Jornal de Santa Catarina’ e ‘A Notícia’ tinham dimensão parecida, porque também eram estaduais”, ressalta Sardá. Blumenau, que sempre alimentou uma forte rivalidade com a Capital, era onde “O Estado” tinha milhares de leitores. O fato de existirem bons jornais em Joinville e Blumenau não impedia de haver ali um grande número de assinaturas e acentuada venda avulsa. “Os empresários do Vale tinham raiva de Florianópolis, assim como os do Norte”, relembra Sardá. “Hoje, essas cidades são mais cosmopolitas”. Um episódio que demonstra o peso de “O Estado” foi o salseiro provocado pela denúncia de que o ex-prefeito Pedro Ivo Campos havia fretado um ônibus e pagado a dezenas de moradores de rua de Joinville para que se mudassem para Florianópolis. O jornal estampou uma manchete falando da transferência dos indigentes, e a repercussão, pela importância e circulação que tinha à época, foi estrondosa. Pedro Ivo ligou para Sardá, xingou-o de todos os jeitos e ameaçou processá-lo, mas nunca chegou a fazer isso. Outra matéria de denúncia foi a da pneumoconiose que acometia e matava os mineiros de Criciúma e dos municípios vizinhos que extraíam carvão do subsolo. Empresários e sindicatos do setor foram para cima do jornal, mas este estava muito bem calçado, e as informações haviam sido exemplarmente apuradas. A Sidersul, siderúrgica de Imbituba que nunca chegou a funcionar, também foi objeto de várias reportagens do jornal. “Era um jornalismo diferenciado, fundamentado, profundo”, diz Sardá. “Os repórteres incomodavam tudo mundo, inclusive o dono do jornal”. Um dia, pediram a Gervásio Luz, repórter em Blumenau, que fizesse uma matéria sobre como os descendentes de alemães brincavam o Carnaval. Ele mostrou os casais dançando polca, numa reportagem divertidíssima. Nas enchentes de Tubarão, em 1974, e Blumenau, em 1983 e 1984, o jornal não apenas cobriu, como fez campanhas de doações para socorrer a população desalojada de suas casas. “‘O Estado’ quebrou o gelo com todas as regiões de Santa Catarina”, atesta Sardá. “O Oeste era muito afastado e se identi!cava mais com Porto Alegre e Curitiba. Um caminhão ia todos os dias até o Extremo-Oeste para levar os jornais, e isso mudou aos poucos o quadro vigente”. O acidente com o avião da Transbrasil, em 20 de abril de 1980, no morro da Virgínia, foi a maior tragédia aérea da história de Santa Catarina, porque matou 55 pessoas, incluindo empresários,
autoridades, sindicalistas e !guras de destaque na sociedade. Sardá !cou sabendo do ocorrido às 19h do sábado, dia da queda, por meio do colega Antônio Kowalski Sobrinho. Saiu de casa meia hora depois e chegou ao morro, próximo a Ratones, às 22h, junto com bombeiros e policiais. O fotógrafo Orestes Araújo ia junto, e ao toparem com a cena do acidente, outro fotógrafo da casa, Lourival Bento, também estava chegando. O avião ainda estava queimando, havia corpos espalhados, cabeças e braços jogados para todo lado. “Políticos, empresários, médicos, todos estavam queimados da mesma maneira, sem distinção de posse e classe”, fala o jornalista. Ele desceu depois das 14h de domingo, mas enquanto esteve no morro a equipe de redação abortou a edição do !m de semana e fez outra já trazendo a notícia e fotos da tragédia. “Todo mundo correu para ajudar”, recorda Sardá. “O jornal não tinha a edição de segunda-feira, mas naquele dia saiu recheado de fotos e matérias sobre o acidente. Não sei se hoje se faria isso de novo”. Na ocasião, o antigo DAC (Departamento de Aviação Civil) subiu com seus homens de terno, e Sardá se in!ltrou entre eles, descobrindo que quem estava no comando da aeronave era um tenente-coronel da Aeronáutica que não fez a rota correta para descer no aeroporto Hercílio Luz. Se estivesse 80 metros acima, o avião não teria colidido com o morro. Por causa dessa informação, o jornal foi posteriormente processado pelo Ministério da Aeronáutica.
Cobertura das enchentes Entre as grandes coberturas, ele cita a da enchente de Tubarão, que deixou 199 mortos, e as cheias de Blumenau, nas quais, além da informação, o jornal trouxe o drama das pessoas, histórias humanas e a dramática situação das famílias que perderam tudo o que tinham pela força das águas. No caso de Tubarão, foi alugado um helicóptero para dar conta da cobertura, porque as duas pontes da cidade ruíram e tudo !cou embaixo d’água. “O Estado” também fez um grande trabalho na Novembrada, outro episódio que demonstrou a capacidade de mobilização da equipe. Essa cobertura rendeu ao jornal o reconhecimento e prêmios nacionais de jornalismo. Aos 19 anos, Laudelino José Sardá já era editor-chefe do “Diário Catarinense”, jornal do grupo Diários Associados che!ado por Alírio Bossle e que funcionava na esquina das ruas Jerônimo Coelho e Vidal Ramos, no Centro de Florianópolis. Sua precocidade, no entanto, fez com que aos 14 anos começasse a trabalhar no jornal “Comércio”, no bairro Estreito, para ajudar a família, já que seu pai teve a aposentadoria cassada pelos militares. No “mais antigo”, Sardá começou na rádio-escuta, na sede da rua Conselheiro Mafra, em 1971. Um ano depois, a empresa se mudou para os altos da rua Felipe Schmidt, e com isso também chegaram o offset e uma nova leva de jornalistas que mudaram para sempre a história do jornal. Nesse ínterim, formou-se em Letras pela UFSC. As edições de fim de semana de “O Estado” saíam com até 130 páginas standard e pelo menos cinco grandes reportagens – sendo que, assinadas, só as melhores. Em seus anos de jornal, Sardá fez a última entrevista com o sociólogo Paulo Freyre, em Genebra, antes deste retornar do exílio, e da conversa extraiu uma manchete provocadora, com base em frase do entrevistado: “O povo brasileiro é autoritário por natureza”. Ele também viabilizou a vinda do jornalista e escritor Salim Miguel, que estava no Rio de Janeiro, para a Editora da UFSC – e para as páginas de “O Estado”, como o único colaborador remunerado do jornal. Uma vez, saiu o nome do Nobel de Literatura lá pelas 20h – um poeta grego cujo nome era impronunciável para a maioria. Por telefone, Salim passou a ficha do escritor. “O Estado” foi um dos poucos jornais do Brasil a dar uma matéria completa no dia seguinte. “Salim mobilizou a cultura de Florianópolis”, relembra Sardá.
Santa Catarina - 13 de maio de 2015.
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Entrevista. Marcílio Medeiros Filho
Vínculo com o jornalismo começou cedo No começo, sobretudo, o jornalismo era feito de maneira artesanal e não constituía um meio de vida. Foi com “O Estado” que isso se tornou possível.
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arcílio Medeiros Filho tem um longo vínculo com o jornalismo, que começou com a idade de 12 a 13 anos, quando ia de bicicleta comprar a “Folha de S. Paulo” para o pai, juiz de direito, na banca da rua 15 de Novembro, em Blumenau. Na Capital, onde passou a residir quando entrou na universidade, foi redator do serviço de imprensa do gabinete de Relações Públicas do governo do Estado e teve a oportunidade de escrever uma coluna – Política & Desenvolvimento – para o jornal “A Nação”, dos Diários Associados. Este fato levou-o a “O Estado”, onde manteve uma coluna por três anos. Depois, como funcionário, permaneceu por outros 24. Ter passado tanto tempo no velho periódico dá a Marcílio a condição de discorrer sobre suas diferentes fases com desenvoltura. Ele lembra muito bem do chamado “pardieiro” da rua Conselheiro Mafra, da mudança para os altos da rua Felipe Schmidt, onde a estrutura já era melhor, e da transferência de!nitiva para a SC-401, em 1977. A produção artesanal do diário foi dando lugar a um jornal tecnologicamente afinado com os novos tempos e preocupado em cobrir todos os fatos relevantes no Estado, independente da região onde ocorressem. “Se os anos de ouro do jornalismo brasileiro foram as décadas de 1940 e 1950, com a ‘Última Hora’, ‘O Globo’, o ‘Jornal do Brasil’, o ‘Correio da Manhã’, a ‘Folha’, a ‘Gazeta Esportiva’ e o ‘Correio do Povo’, por aqui o melhor período foi após a mudança de ‘O Estado’ para o bairro Saco Grande”, a!rma Marcílio. Ele também trabalhou como correspondente do “JB” e das agências United Press International e Associated Press. “Foi um período que marcou profundamente minha vida e minha personalidade”, diz o jornalista acerca do tempo em que !cou no “Estado”. No começo, sobretudo, o jornalismo era feito de maneira artesanal e não constituía um meio de vida, uma atividade pro!ssional à qual alguém pudesse se dedicar integralmente. Foi com “O Estado” que isso se tornou possível, pelo menos em Florianópolis – porque o “Jornal de Santa Catarina” já nasceu moderno, com offset, em 1972. Mas foi na Ilha que Marcílio conheceu “o melhor time que o jornalismo catarinense viu entrar em campo”. Nos tempos de Blumenau, recorda Marcílio Medeiros Filho, ele também teve contato com a “Última Hora”, do Rio de Janeiro. Foi no jornal de Samuel Wainer que aprendeu a ler e admirar Nelson Rodrigues, Sérgio Porto (o Stanislau Ponte Preta), João Saldanha, o cronista Antônio Maria, o colunista social Jacinto de Thormes e o jornalista Maneco Müller, neto do ex-governador catarinense Lauro Müller. No Vale, Marcílio publicou suas primeiras linhas no jornal “A Nação”, a convite do jornalista Nagel Milton de Mello. Eram notas sobre a música e os artistas da Jovem Guarda que abasteciam a coluna de Nagel.
Da burocracia à redação A mudança para Florianópolis, em 1961, para estudar Direito e servir o Exército, marcou a entrada – após um período de trabalho burocrático numa repartição pública – no meio jornalístico, a começar pelo já citado gabinete do governo estadual, onde havia !guras como Salim Miguel, Ilmar Carvalho, Hélio Kersten da Silva, Jorge Cherem e Iara Pedrosa, e mais tarde Raul Caldas Filho e Luiz Henrique Tancredo. O ambiente era propício para a troca de ideias e para o debate intelectual, porque esse grupo tinha amigos que iam ali para conversar sobre cultura, literatura e artes em geral. Já enturmado, ele passou a frequentar a redação de “O Estado”, na sede que !cava na esquina das ruas Conselheiro Mafra e Pedro Ivo. As lembranças dali incluem os acordes da Sociedade Musical Filarmônica Comercial, instalada numa casa em frente. Os ensaios e a a!nação dos instrumentos no cair da tarde coincidiam com o horário de fechamento do jornal. “Lá pelas tantas a a!nação terminava, dando lugar ao ensaio musical às veras”, conta o jornalista, admitindo que a saída do “pardieiro” deixou todos sentidos, pela perda do contato diário com a banda. Em “O Estado”, cujo redator-chefe era o futuro desembargador Antônio Fernando do Amaral e Silva, Marcílio Medeiros Filho e Raul Caldas criaram uma coluna de crônicas apelidada de Vitral, que tinha a arte feita pelo pintor Rodrigo de Haro. Depois, ele foi convidado para ser o o!cial de gabinete de Celso Ramos, função que desempenhou ao longo dos quatro anos de mandato do governador. Formou-se em Direito, ingressou nos quadros da OAB e em seguida retomou as lides de jornalista, ao mesmo tempo em que exercia a atividade de advogado. Com a morte de Rubens de Arruda Ramos, então no comando de “O Estado”, a redação passou a ser che!ada pelo gerente Domingos Fernandes de Aquino, o Dominguinhos, ainda no tempo da linotipo. Ali, os funcionários bebiam muito leite para se desintoxicar, porque “a fumaça de chumbo das linotipos fazia a o!cina envolver-se num fog ensombrecido diretamente absorvido pelos pulmões do pessoal grá!co”, conta Marcílio. Logo depois disso, o gerente comprou uma impressora rotopla-
na que, embora usada, representou um salto tecnológico e um ganho signi!cativo de qualidade para o jornal. Atendendo a anseio do governador Aderbal Ramos da Silva, o advogado José Matusalém Comelli, então seu genro, assumiu a direção do jornal e se encarregou da tarefa de torná-lo um veículo de circulação estadual. A redação foi aumentando a ponto de já não haver máquinas de datilogra!a para todos os jornalistas da casa – o que forçava um revezamento no uso das Olivetti disponíveis. Em 1971, Medeiros tornou-se correspondente do “Jornal do Brasil” em Florianópolis – e a paixão pela “Última Hora”, que já havia fechado as portas, mudou para o diário carioca, que tinha em seu quadro ícones como Armando Nogueira, Zózimo Barroso do Amaral e Carlos Castelo Branco, o Castelinho, além do grande cronista José Carlos de Oliveira. Na época, o “JB” tinha como diretor de redação ninguém menos do que Alberto Dines. Em 1972, “O Estado” foi transferido para os altos de rua Felipe Schmidt, num galpão construído para acomodar melhor a equipe e a estrutura administrativa e de redação. Foi então que José Comelli comprou uma máquina rotativa off-set que representou um novo avanço nas operações do “mais antigo”. Aquele foi o período em que ao pessoal que veio da Conselheiro Mafra se juntaram os jornalistas gaúchos que ajudaram o periódico, então com quase seis décadas de vida, a se tornar um nome estadual. O crescimento da empresa foi rápido, assim como os custos, mas a circulação aumentou muito e em pouco tempo o jornal passou a chegar até a fronteira com a Argentina, ajudando a integrar um Estado formado por diversas ilhas econômicas e culturais. A mudança para a SC-401, em maio de 1977, representou a consolidação de!nitiva do jornal como produto informativo de longo alcance. Ali, José Matusalém Comelli construiu um prédio confortável e instalou todos os setores de maneira e!ciente e funcional. A impressora Uniman, importada da Alemanha, ocupou um amplo salão e impressionava até os mais experientes pro!ssionais técnicos e os jornalistas veteranos. O advento do telex foi outro salto que permitiu conexão direta com as agências e a possibilidade de dar notícias nacionais e internacionais que nos velhos tempos saíam com alguns dias de atraso. O jornalista também destaca que pelas páginas de “O Estado” passaram grandes colunistas. O mais revolucionário de todos foi Beto Stodieck, que no começo morava no Rio de Janeiro e mandava seus textos – que saíam eventualmente – por avião. Depois, ele passou a escrever diariamente e se tornou um sucesso sem precedentes no colunismo catarinense. Outro nome importante foi o de Cacau Menezes, que começou timidamente e evoluiu a ponto de se transformar no colunista mais lido do Estado. Miro, que o substituiu, também gozou de prestígio entre os leitores de “O Estado”. Falando dos “anos dourados” do jornal, Marcílio Medeiros Filho lamenta que a esse período rico e criativo se sucederam a decadência e o encerramento das atividades de “O Estado”. Mas ele prefere lembrar da fase áurea, quando estava por lá e atuou ao lado do “melhor time de pro!ssionais da história do jornalismo catarinense”.
Produção artesanal do diário foi dando lugar a um jornal tecnologicamente afinado com os novos tempos
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ESPECIAL
O ESTADO
Entrevista. Mário Medaglia
De amador a profissional
O ESTADO
100 ANOS
BRUNO ROPELATO/ND
Não criei, mas implantei aqui a !gura do setorista, que cobria diariamente as atividades dos times locais.
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a primeira metade dos anos 1970, os torcedores de Avaí e Figueirense iam ver os jogos de seus times, nos estádios Adolpho Konder e Orlando Scarpelli, vestidos com camisas dos clubes do Rio de Janeiro e São Paulo. Ver as arquibancadas manchadas pelas cores do Flamengo, Fluminense, Santos e Palmeiras incomodava o recém-chegado Mário Medaglia, que acabara de implantar, com outros gaúchos em início de carreira, o “Jornal de Santa Catarina”, em Blumenau. O mesmo fenômeno acontecia nas rádios de Florianópolis, que dedicavam a maior parte do espaço ao futebol de outros Estados. Essa condição de !lial carioca, contudo, extrapolava o esporte. “Os periódicos mais lidos na cidade eram ‘O Globo’ e o ‘Jornal do Brasil’”, conta o jornalista. Ao assumir a editoria de Esportes de “O Estado”, Medaglia tratou de mudar esse quadro. O jornal ainda não era estadual, como se tornou depois, e era preciso valorizar as coisas de Santa Catarina. Com base na experiência de repórter na “Zero Hora”, em Porto Alegre, onde cobrira os times do Cruzeiro e do São José, de menor expressão, com algumas incursões na rotina da dupla Grenal, ele passou a mandar uma equipe acompanhar os treinos da dupla da Capital. “Não criei, mas implantei aqui a !gura do setorista, que cobria diariamente as atividades dos times locais”, conta. Foi um choque, porque as rádios, em vez de fazer o mesmo, preferiam desmentir o noticiário do jornal – até que não tiveram outra saída que não a de adotar prática idêntica. Para executar a contento o que planejara, Medaglia contava com um repórter de primeira linha. Mauro Pires, vascaíno doente, era do tipo que subia em árvores, ficava atrás de portas e espiava pelo buraco da fechadura para apurar a melhor informação. “Foi um dos melhores repórteres com quem trabalhei”, a!rma o jornalista. Pires morreu num acidente de carro, na década de 1990, em Florianópolis. “O Estado” também abriu espaço para modalidades como o remo e o ciclismo, então relegadas à condição de “esporte amador”, mas que rivalizavam com o futebol na preferência dos "orianopolitanos. Formado na PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica), em Porto Alegre, a vinda de Mário Medaglia para Florianópolis foi uma obra do acaso. Ele trabalhava no “Santa” (que saíra às ruas pela primeira vez em setembro de 1971), em Blumenau, e veio passar um fim de semana na Capital, cidade que não conhecia, a convite de um amigo, o jornalista Ayrton Kanitz. Um passeio no iate do também jornalista Adolfo Ziguelli mudou os rumos de sua carreira. “Me encantei com a cidade, com seu céu de brigadeiro, com os camarões em balde oferecidos no barco, em frente ao Tritão, hoje Trintão, em Coqueiros”, recorda. Ficou sabendo que “O Estado” estava implantando o sistema offset e procurou seus diretores atrás de uma vaga. Deu certo, e ele chegou em março de 1972, deixando para trás o Vale do Itajaí, onde tinha sido até paginador. No mesmo ano, o jornal fez a primeira grande cobertura dos Jogos Abertos de Santa Catarina, em Itajaí. Com Jorge Escosteguy (então chefe de reportagem) como editor, repórter e diagramador, a equipe cobriu todas as modalidades – e Medaglia e o fotógrafo Orestes Araújo tinham a responsabilidade de produzir um tabloide diário de oito páginas. O material vinha de carro, diagramado e com as fotos dentro das laudas, para Florianópolis. “O Estado” também implantou a cultura das grandes coberturas. Quando o Figueirense se tornou o primeiro clube catarinense a participar do Campeonato Brasileiro, em 1973, uma equipe do jornal acompanhou o elenco em todos os jogos – o que se repetiu nos anos seguintes com o Avaí e a Chapecoense. Medaglia, inclusive, chegou a morar durante três meses em Chapecó para cobrir os treinos e viajar com o time da cidade no Brasileiro, no final dos anos 70. “Isso foi possível porque Osmar Schlindwein, o diretor comercial, tinha essa compreensão e nos dava cobertura”, a!rma. “Ele conseguia passagens e hotéis e dava respaldo para as viagens e também para a cobertura dos Jogos Abertos, durante vários anos”. Um episódio inusitado marcou a cobertura que “O Estado” fez da !nal do Campeonato Catarinense de 1977 entre Chapecoense e Avaí. O repórter Luiz Lanzetta, hoje radicado em Brasília, precisou se esconder e saiu da cidade do Oeste sentado no fundo de um fusca, no dia seguinte à decisão, vencida pelo time da casa por 1 a 0, dada a rivalidade entre os dois clubes. Naquela partida, o fotógrafo Orestes
Esporte catarinense passou a ser valorizado
Araújo foi atingido com um rojão na cabeça e, mesmo sangrando, levou sua tarefa até o fim. O que gerou a fuga desabalada do repórter foi o fato de haver descrito em detalhes a batalha que foi o jogo, que deu o primeiro título estadual à equipe do Oeste. Além dos lances da partida, a edição do avaiano Mauro Pires destacou os foguetes e garrafas voando em direção a quem parecesse ser da Capital, embora não tivessem poupado nem a arbitragem de Alvir Renzi, morador de Blumenau. Ao lerem o jornal, os torcedores se enfureceram e foram para cima de Lanzetta, que não teve outra reação a não ser se jogar no fusca e pedir ao motorista para sair dali o quanto antes. Ele nunca soube que estradas percorreu, nem quantos quilômetros rodou – sabe apenas que o fundo do carro foi sua redenção. Um fato ocorrido dois anos antes já havia ameaçado a integridade da equipe de esportes de “O Estado”. Cobrindo os Jogos Abertos de 1975, o repórter Aldírio Simões mostrou as precárias condições do alojamento da delegação de São Joaquim, no pavilhão da Efapi. Com o título “São Joaquim está abrigada num estábulo”, a reportagem repercutiu muito mal em Chapecó, a ponto de o pessoal do jornal – que incluía Ubaldo Balthazar e J.B. Telles – precisar pedir garantias de vida às autoridades da polícia local. A compensação foi ter como sede, para a cobertura, a casa do empresário Heitor Pasqualotto, que depois foi presidente da Chapecoense e vice-presidente da Federação Catarinense de Futebol, com estrutura completa de telex, telefoto e todo o conforto para realizar o melhor trabalho possível. Medaglia chegou a trabalhar ao mesmo tempo no “Estado”, na sucursal da Caldas Júnior e como correspondente da revista “Placar”. Sempre produziu muito, e por isso acredita que o jornalismo atual, dominado pela tecnologia, tornou os pro!ssionais mais preguiçosos e menos envolvidos com o métier. “Acho que falta curiosidade aos repórteres, que costumam aceitar a versão o!cial dos fatos”, dispara.
1949
1948 uCriação do Estado de Israel
uSoviéticos explodem sua primeira bomba atômica (foto) uChina torna-se comunista uSimone de Beauvoir lança O Segundo Sexo uAssinado o Tratado do Atlântico Norte (Otan)
1950 uComeça a Guerra da Coréia uGetúlio Vargas é eleito presidente
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Entrevista. Orestes Araújo FLÁVIO TIN/ND
Fotojornalista atuou em “O Estado” por quase 20 anos, desde a linotipo. Sua melhor lembrança: o companheirismo na redação
Flagrantes para a capa Atuávamos como fotógrafos free-lance, com a missão de produzir a foto do dia, sempre publicada na capa. Era algum fato do cotidiano, um !agrante.
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m dos pro!ssionais que conheceram o processo de linotipo, acompanhando a extraordinária transformação grá!ca que viria em 1972, o fotojornalista Orestes Araújo trabalhou quase 20 anos em “O Estado”. Entrou em 1968, quando o jornal ainda era impresso no sistema a quente. “O Paulo Dutra já estava lá, atuávamos como fotógrafos free-lance, com a missão de produzir a foto do dia, sempre publicada na capa. Era algum fato do cotidiano, um "agrante”, lembra Orestes, conhecido no meio como “Velho”. Havia imensas di!culdades técnicas, por causa da linotipo, que era um meio muito rudimentar de impressão de jornais. Mas já havia sinais de que “O Estado” participaria da revolução da imprensa brasileira nos anos seguintes. “Foi uma coisa natural. Todos os grandes jornais evoluíram tecnologicamente, migrando para o offset”, diz. Orestes recorda que a empresa já vinha investindo em pro!ssionais de conteúdo, jornalistas que se formaram dentro da redação (a faculdade surgiria muito tempo depois, na UFSC). Trabalhavam na redação nomes como Sérgio e Paulo da Costa Ramos, Marcílio Medeiros Filho, Laudelino Sardá, Sérgio Lopes, entre outros. Eles formavam o “time” escalado pelo diretor José Matusalém de Carvalho Comelli, que assumira o comando da publicação em 1965. “Havia uma preocupação em se fazer um jornal sério, voltado aos interesses da cidade e de Santa Catarina. Esse grupo preparou a chamada pro!ssionalização de “O Estado”, que ganhou força com a mudança para o offset, em 1972”, a!rma Orestes.
Um aprendizado constante Editor de fotografia de “O Estado” durante muitos anos, Orestes Araújo teve formação autodidata, o que era muito comum à época. “Lia muito sobre fotogra!a, estudava, buscava orientação, !z cursos em São Paulo e Porto Alegre. A capital gaúcha tinha os melhores jornais do Sul na época, uma verdadeira escola, aprendi muito lá.” O primeiro grupo de fotógrafos de “O Estado”, já na fase de offset, era formado por Orestes, Paulo Dutra, Gastão Guglielmi, Lourival Bento e Sérgio Rosário. “Uma equipe de peso, o jornal precisava caprichar na sua apresentação grá!ca, com a
1951 uPrimeiro computador comercial, UNIVAC I, é lançado nos EUA
boa utilização da informação fotográ!ca.” Depois vieram outros bons nomes, como Marco Cezar, Rivaldo Souza e Tarcísio Mattos, sempre com a preocupação de fazer uma cobertura competente e profissional dos principais fatos. Cobertura que não se restringia à Capital. Orestes trabalhou, com a equipe, cobrindo grandes acontecimentos, como a enchente de Tubarão (1974), as enchentes do Vale do Itajaí e Norte do Estado (1983-1984), a Novembrada (1979), o acidente da Transbrasil (1981), a campanha das diretas (1984), entre outros. “Sem falar no cotidiano, o noticiário de Geral, Polícia e Esportes. Escalado para cobrir a Fórmula 1 em duas ocasiões, em Interlagos (SP) e Buenos Aires (Argentina), acompanhando o repórter Wilson Libório de Medeiros, Orestes não gostou das experiências, “do ronco dos motores e do cheiro de óleo. Não era meu chão”, diz.
“Hoje escrevo mais do que fotografo” Além de “O Estado”, Orestes Araújo atuou como fotojornalista correspondente da “Veja” e da “Placar” durante 12 anos, entre as décadas de 1970 e 1980. Descontente com os rumos do jornal, deixou “O Estado” em 1985, sendo um dos primeiros a sair naquele ano, quando houve um grande processo interno de reformulação pro!ssional e editorial. Com o gosto pelo jornalismo sempre presente em sua vida, fundou em 1991 o “Jornal de Barreiros”, publicação mensal que, nos três primeiros anos, foi impressa nas oficinas de “O Estado”. O “JB”, como é conhecido, continua circulando normalmente no bairro de mesmo nome, em São José. “Nunca parei, nem estou parado. E hoje escrevo mais do que fotografo”, diz o veterano jornalista. Quanto a “O Estado”, ele diz que é apenas uma boa lembrança em sua vida: “O companheirismo de redação é algo que me marcou profundamente, em especial nos anos 1970. Nós éramos uma grande família, uma redação unida. Não existe mais esse clima nas redações modernas. E “O Estado” foi uma nuvem que passou e o vento Sul levou”, conclui.
1954 uGetúlio Vargas comete suicídio
1955 uComeça a Guerra do Vietnã
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ESPECIAL
O ESTADO
Entrevista. Hadilson Savi FLÁVIO TIN/ND
Gráfico acompanhou todas as transformações Tive apenas dois empregos na vida: os dois em jornal.
ma história pro!ssional resumida a dois empregos, os dois em jornal. Hadilson Savi, conhecido no meio como Padre (porque foi seminarista), acompanhou toda a evolução tecnológica de “O Estado” entre 1971, último ano da linotipo, até o ano 2000, quando se desligou de!nitivamente. Antes havia trabalhado no Correio Riograndense, de Caxias do Sul, publicado pela Associação Antoniana (católica) e que chegou a ter, na década de 1960, uma tiragem superior a 50 mil exemplares diários. “Eu vim para Florianópolis para trabalhar na Imprensa O!cial, como linotipista, mas acabei sendo chamado para o jornal “O Estado”, que ainda tinha oficina e redação na Rua Conselheiro Mafra”, recorda. Ele participou de todo o processo de migração da linotipo para o offset. “Ajudei a montar a rotativa, uma Goss Comunnity, depois passamos um longo período fazendo testes antes da inauguração o!cial. Cheguei a passar 72 horas seguidas no jornal, era preciso deixar tudo bem ajeitado”, conta Hadilson, que cumpriu praticamente todas as funções do setor grá!co, de impressor a diretor industrial, nos 30 anos de “O Estado”. A rotativa foi ativada pelo então governador Colombo Machado Salles, uma das autoridades presentes à solenidade que marcou o início da era offset, em 1972. “Era tudo novo no jornal, era na verdade um novo jornal, moderno, bonito, a rotativa só parava aos domingos, rodávamos até no sábado à noite”, observa, lembrando que desde o início a empresa investia em inovação, com as tecnologias mais avançadas para a época. Havia coisas, como o PMT (Process Machine Transfence), que jornais grandes, de outros Estados, ainda não tinham. Em Santa Catarina, “O Estado” foi pioneiro também na utilização de radiofoto, durante a Copa da Alemanha de 1974. “Imagina só o jornal trazer na capa uma foto do jogo do dia anterior: foi um grande feito, uma grande novidade. Eram esses avanços que colocavam “O Estado” muito à frente de outras publicações.”
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A chegada da concorrência Das várias fases do jornal, Hadilson destaca em especial a transformação da linotipo para offset, posteriormente a mudança para a SC-401, onde se instalou num grande parque industrial; e a nova rotativa – uma Unniman/2 alemã – comprada em 1983, capaz de imprimir 40 mil cadernos por hora. “Chegamos a rodar 33 mil exemplares das edições de domingo na década de 1980, que foi a melhor década do jornal, com as contas em dia, recheado de anúncios. A chegada do concorrente [DC] mudou esse panorama, não estávamos mais sozinhos no mercado”, diz.
Jornal teve o seu tempo Depois de sair do jornal em 2000, Hadilson Savi passou por um período emocionalmente difícil, porque tinha
O ESTADO
100 ANOS
1957 uUnião Soviética dá largada à corrida espacial, lançando o Sputnik
que superar a perda, uma fase da vida que se encerrava. “Dediquei minha vida a “O Estado”. Era natural que sentisse um pouco de tristeza, aquilo era a minha segunda casa, passava mais tempo no jornal do que com a família. Em 2000, já havia sinais muito claros de que a empresa não resistiria por muito tempo. Uma pena, para um jornal que chegou a circular na Argentina, tinha assinantes em Brasília, no Rio, São Paulo, Porto Alegre, Curitiba. Foi mesmo uma potência.” O ex-diretor industrial guarda ótimas lembranças de toda a sua trajetória. “Minha vida foi marcada pela vivência em “O Estado”, com grandes companheiros na área industrial, na redação, no administrativo e na circulação. Passou, teve o seu tempo.”
1959 uCastro lidera a Revolução Cubana
Contratado em 1971, ainda na fase linotipo, Hadilson Savi !cou 30 anos no jornal: de operário a diretor industrial
1960 uJuscelino Kubitschek inaugura Brasília
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Entrevista. Rogério Junkes FLÁVIO TIN/ND
Ex-bancário, Rogério Junkes entrou para “O Estado” no processo de transformação para o offset, há 43 anos
Tempos heróicos em uma nova fase “Fiz de tudo na área grá!ca, da diagramação ao conserto de máquinas.
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ogério Junkes testemunhou uma das muitas transformações de “O Estado”. Aos 21 anos, bancário, sem nenhuma experiência na área gráfica, atendeu a um chamado publicado na capa do jornal em fevereiro de 1972. “OE” estava selecionando funcionários para compor a equipe que atuaria na migração do sistema de impressão a quente para a impressão a frio, o sonhado offset, muito mais moderno, ágil e bonito. Ele conta que chegou atrasado, as inscrições estavam terminando, mas fez as duas provas, de datilografia e conhecimentos gerais. Foi o primeiro colocado. Desistiu da vida de bancário, porque, muito jovem, estava disposto a vivenciar novas aventuras. Logo em seguida começou, junto com outros classificados, o treinamento dado por técnicos da IBM, em máquinas MT72, que seriam utilizadas no novo processo industrial. Tudo era novo na vida de todos, inclusive dos que ficaram da era da linotipo. Redação pequena e um cronograma de trabalho muito rígido, porque a preocupação com a qualidade do conteúdo tinha que caminhar junto com a agilidade: o jornal ampliava sua circulação para os lugares mais distantes do Estado. “Nas primeiras semanas, o trabalho era muito exaustivo, cheguei a ficar 72 horas dentro do jornal, tínhamos que dar conta de tudo”, lembra Rogério, que desde o início envolveu-se com a área de diagramação, ensinado pelos gaúchos – a turma de jornalistas que “OE” trouxe de Porto Alegre para profissionalizar o trabalho. “Foi um período de muita entrega, de grandes dificuldades, mas queríamos que tudo funcionasse de acordo com os esquemas industriais. Isso tudo na sede da empresa que ficava na rua Felipe Schmidt.” Fora as dificuldades internas, o jornal ainda convivia com um problema grave: a falta de seriedade das transportadoras de papel. Os caminhões demoravam a chegar
1961 uJânio Quadros renuncia à presidência
1962 uCrise dos mísseis envolve EUA, União Soviética e Cuba
e, muitas vezes, Rogério e o diretor Osmar Schlindwein (o Amarelo) tinham que sair pela BR-101 à procura das cargas, brigando com os motoristas para que fossem mais ágeis na entrega. “Foram tempos heróicos, ‘OE’ entrara numa nova fase, era preciso garantir o jornal nas bancas da região, na casa dos assinantes, no interior do Estado”, lembra.
Conhecia de jornal como poucos O jornal cresceu muito rapidamente, a sede da rua Felipe Schmidt ficou pequena. Logo – 1977/1978 – teve que se mudar para um novo prédio, na SC-401, um verdadeiro parque industrial, espaçoso, com melhor logística para todos os processos de trabalho, da redação ao despacho dos pacotes para o interior. Nesse tempo, Rogério Junkes fez de tudo. Não era só diagramador, entendia e consertava as máquinas quando pifavam, redigia e revisava matérias, ajudava no past-up (processo de colagem dos textos e anúncios nas páginas, antes da impressão), se virava “nos trinta”, sempre presente a tudo. “Até cobertura de esportes eu fiz”, recorda. Conhecia de jornal como poucos. Sua relação com “OE” durou 20 anos e oito meses, acompanhando novas mudanças tecnológicas, ao mesmo tempo em que trabalhava também (entre 1982 e 1992) na EBN (Empresa Brasileira de Notícias), antiga Agência Nacional, como redator. Foi convidado para atuar no “Diário Catarinense” e em “A Notícia”. Recusou o primeiro convite e, e no segundo, chegou a prestar assessoria na área gráfica durante quase um ano. “Foi uma fase muito rica da minha vida, mas senti, em 1992, que estava na hora de mudar”, diz. Montou uma empresa (Estúdio 4) e passou a dedicar-se a serviços gráficos em geral. “Continuo no ramo, hoje menor, mas com clientes fixos e muito trabalho”, finaliza.
1963 uJohn Kennedy é assassinado nos EUA
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ESPECIAL
O ESTADO
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Entrevista. Cláudio Prisco Paraíso FLAVIO TIN/ND
Repórter de terno e gravata uando Cláudio Prisco Paraíso chegou à “redacinha”, posto avançado do jornal na Avenida Hercílio Luz, era um jovem introspectivo que destoava da maioria – repórteres e fotógrafos um tanto negligentes no vestir – pelos ternos impecáveis que trajava. Em Florianópolis, ao contrário da maioria das capitais no país, para não falar dos grandes veículos pelo mundo afora, usar roupas sociais nunca foi praxe nas redações. Prisco entrou em 1980 e ficou cinco anos na reportagem, a maior parte do tempo na editoria de Política. Depois, teve uma segunda passagem por “O Estado”, entre 1999 e 2003. Ele entrou no jornal pelas mãos do jornalista Mauro Bento Pires, que era subeditor de Esportes e fazia parte da equipe de Mário Medaglia. “Trabalhávamos juntos na antiga Fundação Catarinense do Trabalho, pilotada pelo ex-deputado Orlando Bértoli”, conta Prisco Paraíso. Na fundação, Mauro era assessor de imprensa e ele atuava como chefe de gabinete. Como convinha a um iniciante, Prisco começou como repórter de Geral, ou Cidade, dependendo da época e de cada redação. “Tive como chefe de reportagem Luiz Fernando Arzua Bond, profissional competente”, recorda. Depois, passou a atuar como setorista do governo do Estado, na administração de Jorge Konder Bornhausen. “Tive o privilégio de integrar a editoria de Política, convivendo com profissionais de alto gabarito como Sérgio Lopes, Aluízio Amorim e Bonifácio Thiesen”, destaca. Àquela altura, o Brasil ensaiava uma abertura, após 21 anos de uma ditadura ferrenha. Alguns meses antes, Florianópolis fora palco da Novembrada, episódio em que o presidente João Baptista Figueiredo se envolveu numa confusão nas ruas centrais da cidade, junto com alguns de seus ministros. Para muitos analistas, o evento apressou o desembarque dos militares do poder no país. Prisco não pegou a pior fase, em que a mídia sofria com a censura e com os limites de manifestação impostos pelo regime.
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No entanto, na rotina da redação, ficou sabendo que o ex-governador Aderbal Ramos da Silva costumava passar todas as tardes no jornal, ficando no seu próprio carro, onde conversava com dirigentes e editores do “mais antigo”. Um dos jornalistas que costumavam falar com Aderbal era Luiz Henrique Tancredo, que neste caderno, em depoimento, nega ter alguma vez ouvido do ex-governador pedidos para censurar qualquer tipo de matéria. Sobre o período de “O Estado”, Prisco Paraíso faz questão de ressaltar, além de Sérgio Lopes e Aluízio Amorim, que muito o ensinaram, o aprendizado facultado pela convivência com Laudelino José Sardá, o redator-chefe (com funções de editor-chefe). Não menos experientes, considera “mestres” também Antônio Kowalski Sobrinho e Mário Medaglia, que estavam na redação desde a década anterior. Outro fator que o faz ter boas lembranças do jornal era o ambiente saudável e de amizade, “sem essa história de hierarquia ou arrogância”. Marcílio Medeiros Filho, Luiz Henrique Tancredo e Osmar Schlindwein, além do próprio Sardá, interagiam com muita naturalidade, diz ele. Não menos significativa era a convivência fora da redação, porque o grupo realizava encontros informais após o expediente ou em ocasiões especiais, “quase sempre abrilhantados pelo atilado repórter Carlos de Carvalho Neto”, destaca. Mesmo que as principais coberturas de “O Estado” tenham sido das tragédias climáticas que castigaram Santa Catarina nos anos 1980, Cláudio Prisco Paraíso se lembra especialmente de fatos que envolveram a sua editoria. “Destaco o restabelecimento das eleições diretas para os governos estaduais e a primeira eleição nas capitais depois que a Revolução aboliu o voto direto, respectivamente em 1982 e 1985”. Atualmente, ele mantém o Blog do Prisco, onde publica informações, artigos, entrevistas, áudios e vídeos do programa que apresenta no programa “SBT Meio-Dia”. O blog tem a participação do também jornalista Fabian Lemos.
1964 uJoão Goulart é deposto do poder pelos militares
Jornalista começou como repórter de geral, mas a identi!cação maior foi com a política
1966 uComeça a Revolução Cultural na China
1968 uProtestos estudantis em vários países
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ESPECIAL
O ESTADO
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Entrevista. João dos Passos Martins Neto
Entre o jornalismo e o direito MARCO SANTIAGO/ND
Minha passagem pelo jornal foi uma experiência muito rica, transformadora.
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ormado em jornalismo e direito, João dos Passos Martins Neto, atual procurador-geral do Estado, começou sua vida profissional nas redações. Primeiro no “Diário Catarinense”, na fase de implantação do jornal em Santa Catarina, entre 1986 e 1989. Migrou para “O Estado” neste último ano, a convite de Mário Pereira, que deixou o “DC” para ser o editor-chefe do “mais antigo”. “Foi uma experiência muito rica, um novo desafio para minha carreira, assumindo o posto de chefe de redação. Mário fora chamado por José Matusalém Comelli para promover uma reformulação total em “O Estado”, tornando o jornal mais popular, com foco no noticiário policial e comunitário”, conta João dos Passos. A mudança incluiu uma reforma gráfica importante, com a implantação da diagramação “em bloco”, ou seja, com as matérias alinhadas geometricamente, proporcionando uma apresentação mais leve para a leitura. “Chegamos a escrever um manual de diagramação com 60 artigos, orientando os diagramadores quanto a essa nova sistemática”, lembra o procurador-geral. Ele destaca também a criação do Domingo Magazine, suplemento especial que circulava nos fins de semana, com matérias de fundo cultural e também de entretenimento e comportamento. O projeto gráfico diferenciado foi desenvolvido por Fábio Veiga, hoje empresário do ramo publicitário (Neovox). “Tínhamos também uma coluna chamada Janela Indiscreta, cujo propósito era revelar por inteiro o pensamento e o estilo de vida de algumas celebridades locais. A primeira entrevista foi feita pelo Beto Stodieck com a modelo Roberta Pereira”, diz João dos Passos. Ele recorda também o acompanhamento, passo a passo, das investigações em torno do assassinato do colunista social Norton Batista da Silva, ocorrido em 15 de julho de 1989. O Caso Norton, como ficou conhecido, nunca foi solucionado.
De olho no telex Outro fato de repercussão – este, no plano internacional – foi a Guerra do Golfo, que estourou em 2 de agosto de 1990. João dos Passos e o editor-executivo, Toninho Kowalsky, acompanhavam as agências de notícias e tinham a percepção de que, naquela noite de 2 de agosto, começaria o conflito entre os Estados Unidos e o Iraque. Ficaram de plantão no jornal até o início da madrugada, esperando a chegada de um telex (não havia internet) anunciando a guerra. Não deu outra: por volta das 2 horas da madrugada, uma das máquinas – “O Estado” tinha uma sala com cinco aparelhos de telex – começou a funcionar. “Era um texto curto, basicamente um lead (o início de uma matéria), confirmando a guerra. Foi a manchete do jornal – e essa era a nossa intenção, bater de frente com a concorrência (DC). Como não tínhamos foto, optamos por reproduzir a mensagem da agência de notícias na capa. Não tenho dúvida que fizemos uma edição histórica”, observa.
A morte de Beto Stodieck João dos Passos Martins Neto desistiu do jornalismo em 1992. “Já tinha aprendido bastante. “O Estado” tinha de!ciências crônicas em sua estrutura, percebi que aquilo não me serviria mais, mas foi uma experiência muito rica, ao lado do Mário Pereira, da Ludmila Souza, Deborah Almada, João Carlos Mendonça Santos, Ângelo Medeiros, Moacir Pereira, Fábio Veiga, Bonson, Janine Koneski, entre outros.” O jornalista acompanhou a agonia do colunista Beto Stodieck, em 1990, que morreu vítima de AIDS. “Muito doente, sem condições de trabalhar, ele insistia em fazer a coluna, que era praticamente a sua vida.
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Mas não resistiu e acabou nos deixando um vazio, abrindo uma grande questão: como substituí-lo?” Foi nessa ocasião que “O Estado” buscou o jornalista Urbano Salles, transformando-o em colunista. “Foi a estreia do Urbano como colunista, ficou muitos anos na função. Hoje atua em assessoria de imprensa e tem uma coluna no jornal ‘Imagem da Ilha’”. Deixando “O Estado” em 1992, João dos Passos fez concurso para a Procuradoria-Geral do Estado e para a UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), onde leciona, entre outras, a disciplina de Liberdade de Expressão, no curso de Direito. “É lecionando essa disciplina que ainda me sinto um pouco jornalista”, finaliza.
1969 uHomem chega à Lua
1973 uAllende é derrubado por Pinochet no Chile
Atual procuradorgeral do Estado, João dos Passos Martins Neto começou a vida pro ssional como repórter
1974 uRichard Nixon renuncia
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ESPECIAL
O ESTADO
Depoimento. Paulo da Costa Ramos (*)
Crítica política, sem ofensas
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BRUNO ROPELATO/ND
Ali cabia tudo. Desde a última fofoca política até a pesada critica de teor político.
em anos... Seu diretor, Rubens de Arruda Ramos, esteve à frente da redação desde os anos 40 até sua prematura morte, em 1965. Era meu pai. Jamais o vi escrever à máquina. Só à mão. Tinha uma letra delicada, !rme, com que preenchia diariamente as resmas de papel em que manifestava sua opinião, seja através de artigos de fundo, sueltos ou brincadeiras como o ‘Buscapé’. Mas sua grande criação foi o “Frechando”, onde assinava como “Guilherme Tal”. Ali cabia tudo. Desde a última fofoca política até a pesada critica de teor político. Nunca li nenhuma ofensa nas suas linhas. Lembro-me de uma ocasião em que o principal artigo, publicado na primeira página, abordava um aspecto qualquer da administração vigente, a de Irineu Bornhausen. Pois nesse dia quiseram os fados que meu pai sentisse forte dor de dentes e logo corresse ao Dr. Moenick. Lá chegando, encontrou um cliente na sala de espera, lendo avidamente o seu artigo, que desdenhava a estrada do Rio do Rastro ou a preferência de Cabeçudas pela Capital, coisa assim. Terminada a leitura, o cliente voltou-se e deu de cara com seu algoz. Tratava-se de ninguém menos do que o governador, também a"igido por uma crise dentária. A saia justa demorou uma meia hora, perpassada por um silêncio tumular. Meu pai dava pouca importância à administração física do jornal, que !cava a encargo de Domingos Fernandes de Aquino, o “Dominguinhos” – mas não abria mão do controle editorial. Os colaboradores eram da melhor estirpe. Barreiros Filho, Othon Gama D’Eça, Renato Barbosa, Oswaldo Cabral (que escrevia escondido pelo pseudônimo de Egas Godinho) e tantos... Gama D’Eça era, sobretudo, um colaborador divertido. Subia as rangentes escada do prédio da Conselheiro Mafra escandindo o seu bordão: “Mataram um homem no mercado”. A quem desejasse detalhes, era cruel: “ Doze facadas”. Um jovem repórter, vindo do Nordeste, era um tipo peculiar. Sempre de terno e gravata, Fernando Souto Maior jamais percebia a “boutade” do escritor e desabalava para o Mercado Público à procura do cadáver. Voltava decepcionado. Ia chorar a mágoa com o gerente: “Mas seu Domingos, esse escritor não é um homem sério, tão conceituado, como pode fazer uma coisa dessas...”. Nunca aprendeu a lição: dez vezes Gama D’Eça ia a jornal, dez vezes Fernando corria para o mercado esperando encontrar o morto esfaqueado...
Getúlio e o Anjo Negro Quando acordei para o mundo, “O Estado” encontrava-se em frente ao Clube Doze de Agosto, na rua João Pinto. Era então um “jovem” de 35 anos. Depois mudou-se para a Praça 15, nos altos do Restaurante Rosa. Ali, com 10 anos de idade, presenciei da sacada o prenúncio de uma cena que iria se repetir, quatro anos depois, com o presidente Getúlio Vargas, com contornos profundamente dramáticos. Era a visita do candidato a Santa Catarina, que tanta confusão provocou no mundo político – mas eu queria me referir à confusão que ocorreu debaixo das minhas vistas. Getúlio vinha num carro aberto, praticamente empurrado pela multidão, subindo a praça em direção ao Palácio do Governo. Nesse momento, apareceu um homem a cavalo, de botas e bombachas, tentando se aproximar do carro, distribuindo chicotadas em quem estivesse pela frente. O “Anjo Negro”, que seguia o cortejo, deu-se conta da ameaça e partiu para cima do cavaleiro. Embora a diferença de porte, Gregório tomou o bridão do animal, segurou seu condutor e puxou-o para o chão, onde o entregou aos agredidos, que praticamente o lincharam. Tenho a impressão de que Getúlio nem notou – assim como quatro anos mais tarde não observou a atuação do seu guarda-costas, que acabou lhe custando mais do que o mandato – custou-lhe a própria vida.
Dá pena que tenha morrido Comecei a trabalhar no “Estado” aos 16 anos. Antes tinha feito uma cobertura esportiva singular, apenas para agradar o meu professor de latim, o Padre Ernesto. O Colegial, time amador do Colégio Catarinense, jogava uma vez por semana. E lá estava o jovem repórter, aos 14anos, para registrar e melhorar sua nota de latim... Ainda bem que o time ajudava — pra começar, o goleiro, imbatível, era Marcio Collaço.
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100 ANOS
1981 uCientistas isolam o vírus da AIDS
Depois, nas eleições de 1958 e de 1960, já alçado ao posto de editor, !z a cobertura [evidentemente tendenciosa} das eleições – ocasião em que inventei o clichê de duas folhas de zinco. Para desespero de Doralécio Soares, arrendatário da clicheria, programei uma bela foto de um comício do candidato Celso Ramos a governador. Ordenei que a foto fosse ampliada. Daí a necessidade de duas folhas. A capa de “O Estado” foi o ponto de virada do pleito. A imprensa do governo !cou duas semanas tentando desquali!cá-la, ora era falsa, ora era um truque fotográ!co. O comício de Tubarão acabou entrando na história da eleição de 60, em que Celso Ramos derrotou Irineu Bornhausen. Afastei-me do jornal em 1961, para voltar em 1972, quando o jornal passou a ser impresso em offset. Veio daí uma geração dos melhores jornalistas de Santa Catarina, começando por Marcilio Medeiros Filho, seu editor-chefe, e continuando com Sergio da Costa Ramos, Luiz Henrique Tancredo, Sergio Lopes, Paulo Dutra, Orestes Araujo – todos debaixo da supervisão de Osmar Schlindwein, o “Amarelo”. Dá pena que tenha morrido. (*) Jornalista, foi repórter, editor, cronista e colunista de “O Estado”
1983 uInternet é criada
Em 1972, quando o jornal passou a ser impresso em offset, veio a geração dos melhores jornalistas de Santa Catarina
1985 uTancredo Neves morre após eleição
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Entrevista. Sérgio da Costa Ramos BRUNO ROPELATO/ND
Política, censura, esporte e Caderno 2 foram alguns dos desa!os enfrentados
Um menino curioso na redação Na época, a política era exercida por gente mais digna e a atmosfera era de respeito, embora houvesse o banditismo e as fraudes.
uando alguém diz que Sérgio da Costa Ramos começou de calças curtas em “O Estado”, não está sendo cínico ou exagerado. Antes dos 17 anos, !lho de Rubens de Arruda Ramos, diretor do jornal, ele já estava na redação, primeiro como curioso, depois na condição de revisor, e só não passou a escrever crônicas porque o pai, cauteloso, achava que ainda era cedo para voo tão ousado. Aquele era o tempo da rádio-escuta e do gillette-press, jargão do jornalismo que pode ser entendido como a cópia – ou melhor, o recorte escancarado – de notícias de outros veículos para publicação não autorizada, no caso, num jornal local. Hoje, aos 67 anos, ele ri dos tempos em que, quando os aviões não desciam no Hercílio Luz por causa do mau tempo, o gillette-press dava vez à rádio-escuta: os técnicos ouviam a Nacional, a Mayrink Veiga, a Globo, a Tupi e a Bandeirantes, com toda a atenção possível, para produzir os noticiários. Na Guarujá, eles cortavam textos dos jornais cariocas, os preferidos dos leitores da Ilha, e mandavam o material para o outro lado da praça, mais precisamente o “pardieiro” da rua Conselheiro Mafra. Quando não havia jornais, as emissoras de fora é que salvavam os redatores de plantão. A primeira grande inovação foi o advento do telex, já no início dos anos 70. A UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) foi a responsável pela novidade. Levados por Moacir Pereira, assessor da instituição, Sérgio e alguns colegas foram ver, na antiga reitoria da rua Bocaiúva, o “novo milagre da instantaneidade”, com teclas que “trabalhavam” sozinhas a partir de impulsos vindos de longe. Os textos das agências de notícias chegavam prontinhos, organizados, dentro dos padrões, com lead e todas as regras do jornalismo objetivo, que ganhava corpo. “Era uma época romântica, de gente amadora, mas com talento, de homens de letras e estudantes de !loso!a, sociologia e direito que circulavam nas redações”, conta Sérgio. Neste sentido, “‘O Estado’ foi uma grande universidade de jornalismo”. A manufatura era a arqueologia, feita na linotipo, com as páginas chumbadas a quente. Como revisor, ele lia títulos, anúncios e matérias de cabeça para baixo nas provas, e também se submetia à toxicidade do chumbo, que obrigava os operadores a tomarem muito leite para não !carem doentes.
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Com o offset, que também veio com os anos 70, o jornal tinha um horário mais rígido para o fechamento. “Apagávamos as luzes do saguão para dar a entender que a edição estava fechada”, conta Sérgio. “A PF não gostou daquele espaço em branco, mas realmente tínhamos um horário, pelos limites da rotoplana. Mudamos a rotina dos agentes”. Mesmo assim, lamenta o jornalista, a pressão sobre as redações se estenderia por muito tempo: “A ditadura era para terminar em seis meses e durou 21 anos”. Em sua passagem pelo “mais antigo”, Sérgio também fez esporte e trabalhou no Caderno 2, com Marcílio Medeiros Filho e Raul Caldas Filho, colegas que depois o acompanharam no “Jornal da Semana”. Trabalhou ainda no “Jornal de Santa Catarina” e foi correspondente da “Veja” no Estado. Quando morou na Inglaterra, cobriu para revistas semanais o casamento do príncipe Charles e Diana. E, já no “Diário Catarinense”, acompanhou as duas posses de Bill Clinton nos Estados Unidos e a Copa da França, em 1998. Revisar publicações legais e a programação de cinema às avessas estava longe da provação que seria a relação problemática de Sérgio da Costa Ramos com a Polícia Federal. Por causa de três crônicas – “Por que morre Edson Luís?”, sobre o estudante morto no restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro; “Por quem os sinos dobram?”, sobre o enterro do mesmo estudante; e “Arthur e eu na calada da noite”, referência do general-presidente Arthur da Costa e Silva – cujo teor foi informado ao SNI (Sistema Nacional de Informações), em Brasília, ele foi considerado subversivo e !cou preso durante seis meses em Florianópolis e outros seis em Curitiba. A prisão ocorreu em 8 de dezembro de 1968, poucos dias antes da edição do AI-5, quando a linha dura dos militares conseguiu impor um recrudescimento do regime. Até então havia uma relativa liberdade de imprensa, mas o afrouxamento durou pouco e o Ato Institucional revogou a Constituição e as garantias e direitos individuais. “Perdi um ano na faculdade de Direito por causa da prisão, e depois mais um ano porque não me deixaram sair para fazer a prova”, relata Sérgio. “E ninguém quis ser meu advogado de defesa”. Quando sua ex-mulher, professora da UFSC, foi fazer um curso em Londres, Sérgio aproveitou para sair de cena, porque a atmosfera aqui era adversa para o exercício do jornalismo. Havia uma nova ordem, e os jornalistas foram vítimas de perseguições e ameaças.
“Os jornais eram uma espécie de Senadinho”
Tempos áureos da política
O jornal “O Estado” foi comprado por Aderbal Ramos da Silva no !nal da década de 1940 e se tornou o porta-voz do PSD (Partido Social Democrático). Não havia tantas agremiações partidárias assim, e elas se serviam do jornalismo para difundir suas ideias. Rubens de Arruda Ramos, a!nado com Aderbal, !cou até junho de 1964, concorrendo com “A Gazeta”, que respaldava a UDN (União Democrática Nacional). “Os jornais eram uma representação popular, uma espécie de Senadinho”, a!rma Sérgio. Até ali, os periódicos continham mais notas internacionais, informações de serviço e algumas notícias da cidade. Com o golpe de 1964, veio a censura. O jornal era visitado pelos agentes da Polícia Federal e o Ministério da Justiça arrolava os assuntos proibidos, uma lista negra de temas – em suma, um “index”. Por causa disso, um dia a página de Política saiu em branco, uma forma de protesto contra a ação dos censores. Na manhã seguinte, a cidade inteira queria saber o que acontecera, opinava sobre as razões daquele espaço vazio, fazia conjecturas e especulações. Não demorou para todos saberem que os agentes da PF andaram visitando a redação.
Falando dos tempos românticos do jornalismo, Sérgio ressalta que havia muitas questiúnculas partidárias que colocavam amigos e até irmãos uns contra os outros. Foi o caso das disputas entre os irmãos Rubens e Jaime de Arruda Ramos, um no PSD, outro na UDN. Contudo, à parte das diferenças políticas, eles se davam bem. Mesmo assim, os pessedistas não reconheciam as obras de Irineu Bornhausen, o governador da UDN. Quando este pavimentou a serra do Rio do Rastro, “O Estado” dizia que a obra era uma !cção udenista. Depois, falando da “caravana da vitória” do PSD, disse que ela passou pela estrada – já não mais uma ficção, porque palmilhada pelos próceres do partido! “A política era exercida por gente mais digna, correta, e a atmosfera era de respeito”, destaca Sérgio. Já o bom jornalismo deu um exemplo no episódio da Novembrada, a que o “Jornal da Semana” batizou de “batalha do calçadão”. Com os fotógrafos Orestes Araújo e Paulo Dutra nas ruas, o semanário não só mudou a capa e fez “uma edição espetacular” (com dez páginas sobre o evento), como, por telefone, abasteceu o repórter Luiz Mir, catarinense que estava no “El País”, da Espanha. O jornal madrilenho trazia na manchete a informação bombástica de que o presidente João Baptista Figueiredo havia levado um tapa em praça pública.
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ESPECIAL
O ESTADO
Entrevista. Raul Caldas Filho
Riqueza intelectual no OE FLÁVIO TIN/ND
O veterano jornalista como leitura obrigatória.
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studantes catarinenses das últimas duas décadas com certeza tiveram que aprender muito com (e sobre) Raul Caldas Filho. O veterano jornalista teve seu livro “Oh Que Delícia de Ilha” incluído no vestibular da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) como leitura obrigatória. Obra de crônicas, best-seller indiscutível do autor, com cinco edições, mais de 7.000 exemplares vendidos, uma proeza em se tratando de literatura do Estado. Mas não é só isso: Raul é autor de outros dez livros, desde “Delirante Desterro” (1980) até “A Ilha dos Ventos Volúveis” (2011), e prepara o lançamento do 12o, “Assassinato ao Luar”, para julho deste ano. Jornalismo e literatura se confundem permanentemente na trajetória de vida desse escritor inquieto, nascido em São Francisco do Sul há 74 anos, mas radicado em Florianópolis desde a adolescência. Raul é de uma geração que, nas redações, vivia em constante ebulição criativa. As reportagens eram vividas e escritas com paixão, os repórteres tinham o que se pode chamar de “imaginação literária”, caprichando muito na estruturação dos textos. Ele conheceu um período intenso do jornal “O Estado”, de seu ingresso como free-lance, ainda nas fase da linotipo, em 1963, até a saída definitiva em 1995, “com idas e vindas que levaram o diretor Osmar Schlindwein a dizer, certa vez: ‘não assino mais a tua carteira’”. Raul nem lembra quantas vezes foi admitido e, depois, se demitiu em busca de outros projetos – como um período de dois anos no Rio de Janeiro, onde foi redator e repórter da célebre revista Manchete.
Grandes reportagens Além das grandes reportagens – algumas delas incluídas no livro “O Solitário das Galés” –, Raul Caldas Filho foi também repórter político e de Geral de “O Estado”, nuns tempos de escassa mão de obra especializada, muito antes da profissionalização que viria com a fase offset (1972) do jornal. Mas ele confessa que se realizava com as grandes reportagens, matérias especiais sobre temas e personagens bacanas de Santa Catarina, um tipo de jornalismo diferenciado dos anos 1960 a 1980 e mais raro hoje em dia. Era o repórter transformando boas pautas em textos de imensa riqueza literária e jornalística, muitos deles atemporais, outros, muito assemelhados ao gênero da crônica. A crônica, a propósito, esteve presente quase sempre na carreira de Raul em “O Estado”, com publicações semanais ou, às vezes, esporádicas. Em geral, tratando de temas muito caros a Florianópolis e ao litoral catarinense: personagens típicos, histórias engraçadas ou tragicômicas, tudo aquilo que acabou despertando o gosto do leitor médio. Isso explica por que, ao longo de mais de 30 anos, os livros do jornalista e escritor alcançaram tanto sucesso de público.
Dedicação à literatura “Fiz de tudo em “O Estado”, do copidesque (função de reescrever textos), à reportagem, à redação, à edição, colunas, crônicas. Fui editor do Caderno 2, que circulou entre as décadas de 1970 e 1980, com grandes reportagens e muitas matérias e colunas culturais. Somando todas as idas e vindas, fiquei mais de 30 anos no jornal,
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100 ANOS
1989 uQueda do muro de Berlim uFernando Collor de Mello é eleito presidente
tínhamos uma relação de muito carinho e proximidade, “O Estado” era o jornal de Florianópolis, uma instituição da cidade, desde os tempos do Velho Pardieiro (casarão onde funcionava na rua Conselheiro Mafra) à sede definitiva na SC-401”, lembra Raul. Em sua memória, conserva momentos extraordinários vividos dentro da redação, como a agonia de Tancredo Neves, em 1985. “Naquele ano, estava como free-lance na editoria política, justamente a que acompanhava o caso de Tancredo. Passamos madrugadas inteiras à espera do desenlace, era raro sairmos cedo da redação”, conta. Depois que saiu de “O Estado” em 1995, Raul passou a dedicar-se apenas à literatura. Que continua sendo a maior paixão, para alegria da sua imensa legião de fãs.
1991 uFim da União Soviética
O escritor e jornalista prepara seu 12o livro, de contos
1992 uFernando Collor de Mello renuncia
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Entrevista. Marco Cezar BRUNO ROPELATO/ND
Considerado um “fotógrafo de madames”, Marco enfrentou o preconceito e elevou o nível do fotojornalismo
Forasteiro de peso Com os melhores equipamentos, dinheiro e ousadia para fazer a diferença.
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uando Marco Cezar chegou a Florianópolis, em meados de 1980, precisou de força de vontade e muito amor próprio para vencer a resistência dos colegas de pro!ssão, que dominavam a área e o chamavam de “fotógrafo de madames”. Mas foi essa recepção hostil que alimentou seu desejo de provar que era bom e que poderia passar por cima de qualquer obstáculo. “Fiquei mordido”, admite hoje, e pouco tempo depois já inspirava a admiração dos pares e o temor dos concorrentes, fosse no fotojornalismo, fosse com quem também clicava madames para colocá-las nas colunas sociais. Aos 68 anos, mas aparentando bem menos, ele e o !lho Caio Cezar mantêm na Ilha um estúdio que ainda produz muitas fotos e a revista “Mural”, já na 66a edição, com tiragem de 5.000 exemplares. Foi também com descon!ança que os pro!ssionais da fotogra!a de “O Estado” o receberam, porque chegou com os melhores equipamentos, dinheiro e ousadia para fazer a diferença. O fato de não saber o que era um “boneco” (jargão jornalístico que designa a foto de uma pessoa em que aparecem apenas o rosto e parte do tronco) e a inexperiência com o dia a dia de redação custaram-lhe caro, mas logo o forasteiro que ainda hoje fala “entendeu, mano?”, com sotaque paulistano, deu a volta por cima. Sem falsa modéstia, diz que “em seis meses já tinha passado por todos eles”. A primeira cobertura marcante foi a da enchente de 1983 em Rio do Sul, onde chegou de helicóptero, acompanhado pelo jornalista Aluízio Amorim, cujos parentes moravam na região. “Fomos jogados num morro da cidade e andamos a pé, de carroça e de barco para chegar onde o cenário era de devastação”, conta Marco Cezar. “Fomos a única equipe de jornal que desceu no município. O equipamento era pesado e usávamos !lmes, que tivemos de trazer dias depois para Navegantes, pelo ar, e daí por terra para Florianópolis. As fotos foram para o mundo inteiro, mas Aluízio, com problemas de ouvido, sofreu muito com o barulho do helicóptero, chorando copiosamente a viagem inteira”. A ideia inicial de Marco Cezar era conhecer algumas capitais brasileiras para depois, dependendo do que encontrasse, se estabelecer numa delas. Seu pai era um fotógrafo bem-sucedido em São Paulo, onde atendia grandes empresas e clientes de outros Estados, ganhando o su!ciente para comprar cinco carros de cada vez, quando fosse a hora de renovar a frota. Depois, com um sócio, Marco trabalhou em Curitiba, onde também fez capital e pensava até em comprar um avião. Ao chegar à Ilha, encantou-se com a paisagem, com o barulho das tábuas das pistas de rolamento da ponte Hercílio Luz e com o vão do Mercado Público, onde ainda passavam carros e havia uma loja com dezenas de gaiolas de passarinhos. Depois de cobrir as festividades do centenário de Criciúma, evento que lhe rendeu bom dinheiro por causa dos álbuns que vendeu, foi atrás de trabalho na Capital, procurando “O Estado”, “A Gazeta”, “A Ponte”, “A Ilha”, o “Jornal da Semana” e as sucursais de “A Notícia” e “Jornal de Santa Catarina”, entre outros periódicos. Eram muitos jornais para uma cidade só, mas custou para surgir uma vaga. Começou a concorrer com os fotógrafos de eventos sociais, área também loteada, onde pontuavam Paulo Dutra, Walmor Oliveira, Édio Mello e Alemão Bayer. Alugou um estúdio na avenida Beira-Mar Norte, pagando seis meses adiantado, mas ninguém procurava seus serviços. Quando passou a circular com o colunista Beto Stodieck, a quem já conhecia dos tempos de São Paulo, sua sorte começou a mudar. Outro amigo, Cacau Menezes, entrou em “O Estado” no lugar de Beto, mas a oportunidade foi concretizada quando o premiado fotógrafo Renato Souza espatifou a máquina que usava, num ato de protesto, no piso da redação, e saiu da empresa. A vaga estava prometida a outro pro!ssional, mas Marco foi chamado pelo diretor presidente do jornal, José Matusalém Co-
melli, para fazer uma foto alusiva ao Dia dos Pais, junto com o filho Fábio e a filha Luciana – e aí o jogo virou. Bem depois dos 30, arranjou seu primeiro emprego com carteira assinada. Uma vez admitido, Marco Cezar foi para as ruas atrás de fotos que ainda não havia tentado fazer. Na primeira semana, foram várias capas com suas imagens, para surpresa geral. Num clássico entre Avaí e Figueirense, quis ir sozinho, cumprindo o plantão, sob o temor dos colegas de que não daria conta das armadilhas que as partidas noturnas reservam para os fotógrafos. Depois de 20 anos fazendo fotos de debutantes, usando sempre o recurso dos jogos de luz, e munido de uma lente especial, pegou o pontapé inicial e o gol mais rápido do campeonato, numa sequência que após 15 minutos de bola rolando chegou à redação. O !lme parou nas mãos do revelador Carlos Silva e o resultado eliminou qualquer dúvida sobre a capacidade do fotógrafo. Outro desa!o foi cobrir a farra do boi em Governador Celso Ramos, sem ser avisado de que máquinas fotográ!cas não são bem-vindas por aqueles lados. Com a repórter Beth Karam, Marco correu atrás do boi ao lado dos farristas, até que uma chuva de limões deu o primeiro alerta. Em seguida, ele descobriu um caranguejo e areia da praia dentro de sua bolsa de trabalho. E quase desmaiou quando alguém avisou a turba de que seu Fiat 147 estava à beira da praia e que poderia ser empurrado para o mar. Por !m, o chamado “caso Norton” envolveu-o até a medula num episódio marcante da cidade. Pelo telebip, ancestral do telefone celular, foi avisado, enquanto fotografava um casamento no clube Doze de Agosto, que o colunista Norton Batista da Silva sofrera um acidente na avenida Hercílio Luz, a 50 metros dali. Correu e chegou na hora em que os policiais isolavam a área para a perícia. Ainda assim, fez algumas imagens e depois registrou a chegada do corpo sem vida ao hospital. “Ele estava todo furado pelos tiros”, relembra. Marco chegou a ser arrolado no processo como suspeito, porque chegou logo depois que o crime (supostamente um latrocínio) aconteceu, mas o relatório da central de telebip o isentou de culpa. E ele ainda saiu por cima, com imagens exclusivas.
Defesa da categoria O inconformismo com as condições de trabalho fez com que Marco Cezar brigasse pela criação de um setor de transporte no jornal “O Estado” – até então, os fotógrafos recebiam o equivalente a 600 litros de gasolina por mês e entravam com carro e equipamentos. Ele mostrou aos colegas e à direção que aquilo era um mau negócio para todos, e conseguiu que a empresa comprasse cinco Gol “chaleira” que resolveram, pelo menos por um tempo, a situação. Também lutou pelo direito de os fotógrafos terem sua imagem creditada não apenas na capa, mas em todas as páginas do jornal. Nas coberturas diárias, quando os carros atrasavam, ele aproveitava o tempo para ler. “Adorava chá de banco, porque lia pelo menos um livro por semana”, brinca. Quando os salários começaram a atrasar, o fotógrafo – dono de um dos melhores vencimentos da redação – achou que não deveria !car para apagar as luzes e foi embora. Ainda manteve a coluna Foto Legenda em “O Estado”, de página inteira e com liberdade para publicar o que quisesse, mas depois de um ano desistiu e foi tocar o estúdio, sempre com muito trabalho. “Fascinante” é o adjetivo usado por Marco Cezar para de!nir os anos que passou por lá. “Um dia andava de carro, outro de barco, outro de avião, outro a pé, outro de carroça”, recorda. “Um dia estava no Palácio do Governo, e outro, na favela. Era uma surpresa atrás de outra. Não queria outra coisa, outro mundo. Tornei-me amigo de políticos, deputados, vereadores. Conheci gente como Paulo Dutra e Orestes Araújo, que logo reconheceram meu potencial. ‘O Estado’ foi a melhor escola da minha vida”.
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ESPECIAL
O ESTADO
Entrevista. Moacir Pereira FLAVIO TIN/ND
Memória de um período efervescente Imaturo e inexperiente, arrisquei-me demais e fui convidado a ‘passar na Tesouraria.
formação humanística devo à família na infância e aos padres jesuítas durante a adolescência no Colégio Catarinense. A educação em Direito e Ciência Política veio da Faculdade de Direito da UFSC. A consciência crítica se aprimorou na presidência do Sindicato dos Jornalistas durante o regime militar. Mas o aprimoramento profissional, com injeções de energia na paixão pelo jornalismo aconteceu na redação do “O Estado”. Vivi fases distintas na redação do “mais antigo”. Na primeira, com apenas 21 anos, subindo as escadas de madeira do velho casarão da rua Conselheiro Mafra para assinar a coluna “Grande Florianópolis”. Imaturo e inexperiente, arrisquei-me demais e fui convidado a “passar na tesouraria”. O talentoso Marcilio Medeiros Filho, o editor-chefe, recebia-me com o título de “Pereira, o sutil”. A segunda registrou-se já depois de alguma experiência no jornalismo impresso. Marcilio convidou-me para a série “Moacir Pereira entrevista”. Todos os domingos o jornal publicava uma ou duas páginas tamanho “standard” com as principais celebridades nacionais e estaduais. Nesta época, o jornal funcionava na rua Felipe Schmidt, ao lado da Assembleia de Deus. E a terceira, mantida durante décadas, a coluna na página 2, seguindo o modelo da “Coluna do Castelo”, no “Jornal do Brasil”: um comentário de abertura, 10 a 12 notas e algumas telegrá!cas. Aí, já na moderna sede da SC-401. Um período efervescente, em que repórteres, redatores e colunistas suavam a camisa para enfrentar o “Jornal de Santa Catarina”, pioneiro em offset e o
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principal concorrente. Uma saudável disputa, em que o leitor era sempre o maior beneficiado. Entrevistas, reportagens, edições primorosas, muita criatividade e o resultado final de um trabalho coletivo marcado pelo profissionalismo e pela solidariedade. Com uma retaguarda técnica e logística, formávamos todos uma grande família, em clima de amizade e companheirismo. Nenhuma sugestão de pauta era desprezada, e todas as idéias eram avaliadas e discutidas pelo grupo. A palavra de ordem era “surpreender” sempre... e todo dia. Repórteres, editores e colunistas desdobravam-se em matérias, temas, personagens da Capital e do Estado para produzir as melhores matérias. Uma redação irriquieta que procurava se superar todos os dias, questionando e inovando sempre. Tudo ainda muito distante da era digital, com máquina de datilografia, radiofoto, depois telex, mais tarde a revolução do fax. Mas ainda sem as maravilhas da internet. As únicas ferramentas que ficaram: a caneta e o bloquinho de anotações. Um período em que jornalista trabalhava 24 horas por dia, dormia pensando nas reportagens do dia seguinte, aprimorava o trabalho no contato direto com as fontes, testemunhava os fatos, pesquisava nas bibliotecas e arquivos, estudava a pauta das entrevistas, reescrevia o texto várias vezes e, dicionário Aurélio ao lado, selecionava com precisão as melhores palavras para mostrar a realidade. Nas décadas de 1980 e 1990, “O Estado” não se projetou apenas com o melhor jornal de Santa Catarina. Transformou-se numa usina de ideias e fermentador de ideais, formando na prática os melhores pro!ssionais de jornalismo impresso na história.
1994 uFernando Henrique Cardoso é eleito presidente
Nas décadas de 1980 e 1990, “O Estado” se transformou numa usina de ideias
1999 uCientistas escoceses produzem clone de uma ovelha
2000 uBug do milênio uGeorge W. Bush é eleito presidente dos Estados Unidos
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Entrevista. Cacau Menezes
Polêmica e irreverência Crazy People: foi a minha melhor época, dos 17 aos 30.
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laudio de Menezes, o Cacau, filho do jornalista e ex-deputado estadual Manoel de Menezes, figura polêmica na Ilha, aos 13 anos de idade foi o mais jovem locutor esportivo do país. Narrava para a rádio Jornal A Verdade, do seu pai, que teve que pedir uma audiência especial no Rio de Janeiro ao juiz de Menores Ari Cavallieri. Ele autorizou Cacau, por ser menor, a transmitir naquela noite, no Maracanã, o jogo Botafogo x Metropol, de Criciúma, pela Copa do Brasil, fato que repercutiu na mídia carioca e nacional. Depois, aos 17 anos, já em outra, mudou a característica: de criança para adolescente, do futebol para o rock, apresentando programas de rádio, promovendo festas, grandes eventos musicais, esportivos e sociais. Entrou para a TV em 1979, e até hoje, 36 anos depois, continua no mesmo horário, canal e programa, o Jornal do Almoço, apresentando um quadro que tem “de tudo um pouco”, nome do seu programa com a filha Maria Claudia na TV COM. Na juventude, criou, com Ricardinho Machado, o primeiro jornal alternativo da cidade, “Rock, Surfe e Brotos”, com tiragem de 5.000 exemplares. Era o início das mulheres de biquínis nos jornais e da revolução de usos e costumes na cidade, que trocava de nome: Florianópolis passou a ser Floripa. E o Kioski passou a ser a Bahia. “Crazy People: foi a minha melhor época, dos 17 aos 30. A cidade era simplesmente nossa, sensacional, ia dormir ao som de Bob Marley, Black Sabbath, Steve Miller Band, Jim Morrison, Jethro Tull, Peter Frampton... Rolling Stones”, conta Cacau.
“Sorte rapeize. E boa tarde”
Cacau chegou ao “O Estado” com a responsabilidade de substituir Beto Stodieck
Testado no rádio e tevê – e colhendo os louros do jornal underground –, Cacau acabou colunista. Começou no “Jornal de Santa Catarina”, passou pelo “Jornal da Semana”, de Paulo da Costa Ramos, e chegou a “O Estado” com a responsabilidade de substituir Beto Stodieck num ambiente que ele aprendeu a conhecer e a gostar, o mundo da cultura pop: !ores, sorrisos e guitarras eram as armas daquela geração de cores e atitudes. “Minha época no jornal “O Estado” foi inesquecível. Você chega para substituir o melhor, cheio de fãs? E agora? Encarei. Precisava e gostava daquele emprego. Eu estava na TV, já era o mais conhecido da cidade, o ‘sorte rapeize e boa tarde’ virou mania estadual. Deu tudo certo, graças a Deus, até hoje. E muito agradeço ao Comelli, Marcílio, seu Osmar (o Amarelo), e a todos os colegas, a verdadeira nata do jornalismo catarinense, com quem trabalhei naqueles anos dourados. Eu jamais os esquecerei. Muitos já se foram”. Depois de “O Estado”, em 1986, Cacau foi para o “Diário Catarinense”, onde está até hoje, com duas páginas diárias.
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Entrevista. Zurildo Luiz Ferreira
Condutor da equipe de reportagem Os 22 anos em “Estado” dariam um livro, pelas histórias que ouviu, testemunhou ou protagonizou.
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á não se lembra de muita coisa, mas centenas de jornalistas se recordam dele – e com carinho. Os 22 anos de Zurildo Luiz Ferreira em “O Estado” dariam um livro, pelas histórias que ouviu, testemunhou ou protagonizou. Afinal, tanto tempo carregando repórteres e fotógrafos, viajando por estradas de todos os tipos, entregando jornais nas bancas e, depois, servindo de motorista ao diretor presidente José Matusalém Comelli é matéria-prima suficiente para isso. Nascido na Colônia Santana, em São José, há 65 anos, ele está aposentado, mas segue trabalhando e continua brincalhão, falando alto e pronunciando frases tão atropeladas que só quem o conhece bem pode entender. Zurildo começou conduzindo uma Kombi, depois pegou uma Toyota Bandeirante, cortou o Estado com um Gol “chaleira” e com um Fiat Uno de cor branca. A memória o trai bastante, mas se lembra de colegas como Zé Rios, Jairo, Evair e Adelaido (sempre só o primeiro nome), com quem se revezava nas maratonas que a chefia de reportagem inventava para manter a qualidade e a cobertura estadual do jornal. E cita "guras que o ajudaram, como Osmar Schlindwein, Edmundo Comelli e Marcílio Medeiros Filho. E boas-praças como Mário Cesar, Carlos Neto, Cláudio Prisco Paraíso, Antônio Kowalski Sobrinho e Mauro Pires. Ao sair, tentou, sem sucesso, a atividade de servente de pedreiro. Hoje, complementa a renda como motorista particular. As viagens pelo Estado eram mais frequentes em tempos de Jogos Abertos e de partidas de Avaí e Figueirense pelo Campeonato Catarinense. Ia a Itajaí, Blumenau, Brusque e Criciúma, de onde às vezes voltava no intervalo para trazer o filme com as imagens da primeira metade do jogo. Lourival Bento, Sérgio Rosário e J. Müller eram os fotógrafos mais escalados para essas jornadas. Em tanto tempo na empresa, Zurildo diz que nunca sofreu um acidente, mas que cansou de dirigir carros ve-
lhos, com pneus carecas e pouco combustível no tanque. Atendeu também a circulação do jornal e chegou a chefe do transporte. “Sempre trabalhei muito, ia do meio-dia até a madrugada”, relata. Apesar disso, diz que foi bom ter trabalhado no jornal, ocupação que lhe permitiu ter uma vida digna e criar dois "lhos. Um momento dramático da “carreira” de Zurildo Ferreira foram os três dias que passou embarcado num navio da Marinha na costa de Laguna. Com o repórter Carlos Steggemann e o fotógrafo J. Müller, acompanhou a soltura de golfinhos vindos da Antártica e que foram recolhidos pouco tempo antes. O mau tempo impediu a volta, e a embarcação ficou à deriva, com um dos motores avariados, sendo jogada para os lados, para cima e para baixo, inapelavelmente, como uma canoa de madeira. Só um sargento e o fotógrafo de “O Estado” passaram incólumes. Os demais o"ciais e os jornalistas de outros veículos ficaram mais de 70 horas sem comer e dormir – e vomitando até o que não tinham ingerido. “Nunca mais quero passar por aquilo”, a"rma Zurildo, quando perguntado sobre o episódio. O navio estava cada vez mais longe da terra e todos pediam clemência ao comandante, que nada podia fazer por eles. Quando o tempo melhorou e eles puderam pisar em terra "rme, foi um alívio geral. “Graças a Deus, estou no céu!”, foi o que disse o motorista. Outro problema que ele enfrentou foi numa reportagem com a repórter Lena Obst e o fotógrafo Marco Cezar no Sertão do Valongo, município de Porto Belo. Marco e Zurildo têm versões antagônicas acerca de quem quis botar o carro no atoleiro e ir em frente: o fotógrafo diz que o motorista insistiu em seguir adiante, e este culpa o outro por querer passar no lamaçal. Afinal, eles já estavam retornando e queriam chegar o quanto antes na redação. “A junta homocinética do Gol quebrou ali e Lena voltou numa carroça cheia de bananas, enquanto nós andamos 13 quilômetros a pé até o primeiro ponto de ônibus”, conta o motorista. O carro só foi guinchado três dias depois.
As viagens pelo Estado eram mais frequentes em tempos de Jogos Abertos e de partidas de Avaí e Figueirense pelo Campeonato Catarinense
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Entrevista. Ângelo Medeiros FLÁVIO TIN/ND
De repórter policial a chefe da redação O jornal mantinha ligação umbilical com parcela considerável da sociedade catarinense.
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aparência sempre calma disfarçava a adrenalina que corria nas veias do jovem repórter, ávido por casos polêmicos, crimes insolúveis e boas histórias para contar. Ângelo Medeiros, 50, atual chefe da Comunicação Social do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, trabalhou em “O Estado” entre 1988 e 1992. Foi repórter de Geral/Cidade e teve passagem marcante na Edipol, a Editoria de Polícia, ao lado de João Carlos Mendonça e Paulão Vieira. Mais tarde, com a saída de Luiz Henrique Tancredo, assumiu a titularidade da coluna Informação Geral, uma das mais importantes da época. Algum tempo depois, com a saída de João dos Passos, atual procurador-geral do Estado, Ângelo Medeiros foi guindado ao cargo de chefe de redação, período em que passou a trabalhar diretamente com Mário Pereira. Manezinho com orgulho, Ângelo destaca uma característica singular de “O Estado”. O jornal, segundo ele, mantinha ligação umbilical com parcela considerável da sociedade catarinense e se relacionava com os ilhéus, em particular. “Esta lacuna, difícil de ser preenchida, foi conquistada ao longo de décadas de bons serviços prestados por profissionais daqui e d’alhures – estes últimos já devidamente catequizados na doutrina mané”, enfatiza. Para o ex-chefe de redação, o desaparecimento de “O Estado”
representa perda para o jornalismo e para a sociedade. “Perdemos todos. Evidentemente que vivemos o mundo globalizado e restam outros sotaques na praça. Porém, sem dúvida, o ‘mais antigo’ ainda tinha seu espaço na nossa aldeia”, sorri, com saudade dos tempos do tilintar da máquina de escrever e das velhas laudas rasuradas.
Lado a lado com a cultura e vibração de Mário Pereira Ainda jovem, Ângelo Medeiros teve a oportunidade de trabalhar com grandes nomes do jornalismo catarinense. Entre eles, Mário Pereira, imortal da cadeira número 8 da Academia Catarinense de Letras. “Foi um grande privilégio e diferencial em minha carreira pro!ssional. Culto, experiente, sagaz. Aprendi muito com ele”, conta. Ângelo Medeiros lembra que, na fase em que “O Estado” buscava leitores diretamente nas bancas, para incrementar vendagens, Mário Pereira apostou seriamente na cobertura policial. “Tanto garantia a necessária infraestrutura, como abria espaços generosos para a editoria, a qual também tive o prazer de integrar”, afirma. Entre as principais características de Mário Pereira, Medeiros destaca a vibração com a cobertura dos casos mais polêmicos. “Orientava a linha editorial, apontava fontes. Enfim, ‘O Estado’ me proporcionou também a companhia de um grande jornalista, um profissional que marcou sua passagem por Santa Catarina.”
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Saudade dos tempos do tilintar da máquina de escrever e das velhas laudas rasuradas
2001 uAtaque terrorista ao World Trade Center, em Nova York; ao Pentágono, em Washington; e à Pensilvânia uEUA e o Reino Unido iniciam ataques aéreos à capital do Afeganistão, Cabul,
e aos redutos do Taleban Candahar e Jalalabad; A TV Al Jazeera, do Qatar, divulga vídeo em que Bin Laden convoca muçulmanos à “guerra santa” contra os EUA
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Entrevista. Fábio da Silva Comelli
Momento de investir
na modernização
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BRUNO ROPELATO/ND
A história de “O Estado” se confunde com a história de Santa Catarina.
uito jovem, chamado pelo pai para aprender os ofícios básicos da administração do jornal, Fábio da Silva Comelli acabou ficando 14 anos em “O Estado”, desde o primeiro cargo – encarregado de planejamento e controle – até a direção executiva. “Cresci no jornal, foi meu primeiro emprego, meu primeiro desafio profissional”, conta Fábio, que hoje continua vinculado à área de comunicação, mas em rádio (Guarujá/Antena 1). Fábio Comelli considera a experiência como gerente industrial a mais enriquecedora de sua vida no periódico. “Foi o melhor aprendizado, tanto na área técnica quanto no relacionamento com as pessoas, trabalhadores simples, que, em geral, tinham a atividade no jornal como um bico noturno.” Em sua vivência, sem querer parecer apenas o “filho do diretor”, o jovem empresário dedicou-se com determinação a todas as tarefas que encarou internamente. Uma delas, com a participação dos outros diretores, foi a implantação do sistema de informática de “O Estado”, em 1996. “Optamos pelo que havia de mais moderno no mercado, a linha específica desenvolvida pela Apple, que tinha a marca McIntosh, com programas adequados a todos os processos do jornal, da redação das reportagens ao setor industrial. Foi uma experiência riquíssima. Até a chegada do sistema, trabalhávamos com máquinas de escrever e processos antiquados de confecção industrial. Vivemos uma verdadeira revolução, com ganhos em termos de custos e agilidade.” Ele observa que a informatização era o “caminho natural”, que não tinha volta, a grande revolução do jornal na passagem de seus 80 anos. “Internamente, todos sentiram, porque foi uma mudança muito radical, superando tudo aquilo que se tornara arcaico. Participei de tudo, porque precisávamos estimular a modernização, junto com a qualificação das pessoas e do conteúdo. Era uma tecnologia diferente e isso mexeu com a equipe. Muitos resistiram durante algum tempo, mas cederam”.
Uma nova realidade empresarial Hoje, quando os processos digitais indicam novos rumos para os jornais em todo o mundo, “O Estado” certamente estaria adaptado a essa nova realidade, observa Fábio Comelli. “Nós conhecemos diversas situações que, ao longo dos anos, foram sendo substituídas por processos mais fáceis ou dinâmicos do ponto de vista tecnológico. Dois exemplos: o telex, a telefoto e a radiofoto. Eram tecnologias muito antigas. No caso da telefoto (transmissão de imagens por meio de ondas, via telefone) era algo caro e complicadíssimo, porque dependia até das condições meteorológicas”, lembra. O empresário conta que pegou esse tempo e conheceu essas tecnologias, superadas com os processos de informatização dos jornais, que ocorreram muito rapidamente durante a década de 1990. “O ‘Diário Catarinense’ e ‘A Notícia’ também investiram na informática, não havia alternativa para os jornais. O que era antigo, defasado, logo foi superado. Em pouco tempo, logo após a mudança de 1996, ‘O Estado’ já assinava agências de notícias via internet, recebendo imagens diretamente. Foi realmente uma revolução”, enfatiza.
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Trabalho sério e de credibilidade
Fábio Comelli cresceu dentro do jornal e participou da grande revolução interna que foi a informatização, em 1996
Sobre o centenário do jornal, neste 13 de maio, Fábio Comelli a!rma que esta é uma data muito especial, porque “O Estado” se confunde com a própria história de Santa Catarina. “Foi um dos pilares do jornalismo catarinense, uma escola para muita gente, por lá passaram alguns dos nomes mais importantes da comunicação. Esses nomes ajudaram a tornar o jornal o que acabou sendo: uma referência de jornalismo sério, com credibilidade”.
2002 uLuiz Inácio Lula da Silva é eleito presidente do Brasil
uBrasil é pentacampeão na Copa do Mundo de futebol no Japão e Coreia do Sul
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Entrevista. João Carlos Mendonça Santos, o Cachorrão BRUNO ROPELATO/ND
Roubo a banco como batismo “O aumento da violência foi mais evidente quando a cocaína chegou à cidade e pegou os filhos de gente rica.
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m crime no Centro de Convivência da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), em 1986, no qual os ladrões vestiram-se de garis para assaltar a agência bancária que funcionava no térreo do prédio, foi uma espécie de batismo de fogo para o jornalista João Carlos Mendonça Santos. Ele estava no chamado Básico, sede dos cursos da área de comunicação e expressão, quando soube do caso e, munido de caneta e papel, levantou os dados e ligou para Carlos de Freitas, o já então veterano chefe de redação de “A Gazeta”, informando sobre o que tinha apurado. No diário da rua Conselheiro Mafra, aquela seria sua primeira reportagem de polícia recebeu elogios do chefe e marcou o início de uma trajetória que teve várias fases, ali e em outros jornais catarinenses. João Carlos, o Cachorrão, como é mais conhecido, passou pela sucursal de Florianópolis do “Jornal de Santa Catarina”, para onde foi levado por Osmar Schlindwein, antes de chegar a “O Estado”. Na sede do “Santa”, na avenida Rio Branco, conheceu e dividiu máquinas, mesas e cadeiras – incluindo as do bar – com a diagramadora Jucélia Fernandes e com os jornalistas Fátima Mafra, Rosimery Laurindo, Bonifácio Thiesen, Ângelo Medeiros e Bonifácio Bertholdo, além do colunista Beto Stodieck. Ficou no jornal até 1987. Na sequência, João Carlos passou a integrar a equipe de reportagem do “O Estado”. Teve Cesar Valente e Mário Pereira como superiores na hierarquia da redação, e quando entrou na editoria de Polícia, a equipe era comandada por Paulo Goeth. Além da formatura em jornalismo, outro sonho se concretizava – trabalhar no principal diário impresso catarinense. “A criminalidade era outra”, lembra, hoje, ao referir-se à cobertura policial dos anos 1980 e 1990. “Quando se apreendia um quilo de maconha, dava capa. Hoje, uma tonelada rende uma nota de pé de página”. Cachorrão teve duas passagens por “O Estado”. A primeira, mais longa, entre 1987 e 1994, foi interrompida quando o jornalista transferiu-se para a sucursal de “A Notícia” na Capital. A segunda temporada foi de 1996 a 1999, com Mário Pereira como editor-chefe. Foi ali que ele consolidou a carreira iniciada em 1982, aos 18 anos, período em que a cidade vivia o boom dos jornais alternativos. Num deles, o “Galera da Ilha”, onde trabalhou com o fotógrafo Bido Muniz (que depois também passou por “O Estado”), Cachorrão deu os primeiros passos como repórter. Era a experiência de que precisava antes de alçar voos maiores. Ele havia feito o curso de redator auxiliar no Instituto Estadual de Educação, tendo Paulo Brito entre os professores. O pequeno jornal tinha colaboradores como Túlio Carpes, Luiz Henrique Rosa e Abigail Barreto, figuras tradicionais da cidade, e trazia como diferencial um encarte com desenhos de artistas da Ilha de Santa Catarina.
Carreira na área segurança Em 1985, Cachorrão foi para “A Gazeta”, onde seu pai havia trabalhado. Ele entrou como revisor no veículo, que até ser fechado usava a composição a linotipo. Ali estavam a diretora Maria Iná Vaz, o editor Carlos de Farias e o cronista Jairo Callado, que também escrevia e publicava uma coluna de esportes. A tentativa de fazer jornalismo fracassou porque João Carlos não passou no primeiro vestibular da UFSC, em 1978, e abraçou a segunda opção, Letras português/francês. Em janeiro de 1992, entrou como comissionado na SSP (Secretaria de Segurança Pública), onde imaginava !car seis meses – e está há 23 anos. Após sair de “O Estado”, João Carlos ainda passou algum tempo no Notícias do Dia, convidado por Hélio Costa para ajudá-lo a escrever a coluna diária e editar as notícias policiais. Ali trabalhou até sair e abandonar de!nitivamente a rotina de redação. Como repórter e, depois, na função de editor, a cobertu-
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ra policial de “O Estado” sempre foi generosa, lembra João Carlos. O dia a dia era de cobertura factual, e nos !ns de semana saíam as matérias especiais de duas páginas. A coluna Vias de Fato, cheia de humor, fazia muito sucesso. “O aumento da violência foi mais evidente quando a cocaína chegou à cidade e pegou os !lhos de gente rica”, lembra João Carlos. Depois, surgiram as primeiras organizações criminosas, e chegou um tempo em que sair à noite passou a !car perigoso. “Até então, a gente andava muito a pé, porque não tinha dinheiro para o táxi”, conta. Esse tempo de bares após a jornada na redação foi ficando para trás. Há mais de uma versão para o apelido Cachorrão. Uma delas dá conta de que o editor Paulo Goeth inventou a alcunha. Outra fala do delegado Renato Hendges, o Renatão, que o comparou a um cão de guarda que não abandonava a porta do gabinete atrás de informações diferenciadas. Rumoroso foi o “caso Norton”, que chacoalhou a Capital. Norton Batista da Silva era um colunista muito conhecido, lido e citado em todas as rodas da sociedade "orianopolitana. Ele foi morto em 15 de julho de 1989, aos 43 anos, na avenida Hercílio Luz, dentro do Escort conversível que dirigia, supostamente por alguém que estava atrás de drogas ou dinheiro. “A cobertura de ‘O Estado’ foi diferenciada”, assegura João Carlos. A começar pelo registro da cena do crime, pelo fotógrafo Marco Cezar, que estava numa festa no clube Doze de Agosto e chegou ao local poucos minutos depois do disparo contra o colunista. “Norton trabalhava em tevê, rádio, tinha coluna em jornal e foi o nosso primeiro multimídia”, conta Cachorrão. Também o fotógrafo Olívio Lamas acompanhou parte do processo relativo a esse crime. Aos 51 anos, Cachorrão diz que hoje há pouca informação de qualidade e que as redes sociais substituíram em parte o jornalismo impresso. O espaço para as notícias policiais foi reduzido e o nível geral da cobertura piorou. “Os jornais estão mais bonitos que nos anos 1970 e 1980, mas têm pouco conteúdo”, declara. Perguntado se faria tudo de novo, ele a!rma que sim. “Principalmente por causa de ‘O Estado’, que foi uma escola para muita gente”.
Comparado a um cão de guarda, que não abandonava a porta do gabinete atrás de informações diferenciadas, jornalista ganhou apelido de Cachorrão
2004 uEUA prendem Saddam Hussien
uNave Columbia explode e mata sete astronautas
uGeorge W. Bush é reeleito nos EUA uSonda Mars Express detecta presença de água congelada e de gelo de dióxido de carbono na superfície do planeta Marte
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Entrevista. Celso Martins da Silveira Júnior
Aprendizado de ética e técnica
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Fui um privilegiado, porque a gente não só cobria os fatos, mas interferia.
epórter por excelência, Celso Martins da Silveira Júnior conta nos dedos para saber quantas vezes entrou e saiu de “O Estado” – e não arrisca-se a errar a soma. Junto com o “AN Capital”, as passagens pelo “mais antigo” constituem o eixo de sua carreira, embora nos últimos anos o blog “Daqui na Rede” tenha se tornado sua razão de vida e seu ganha-pão. “A gente trabalhava com gosto e vontade, mais do que pelo salário”, chega a dizer. Foi no diário que faria 100 anos agora que ele aprendeu, “com ética e técnica”, a fazer jornalismo. “Fui um privilegiado, porque a gente não só cobria os fatos, mas interferia”, destaca, ressaltando que esse quadro se tornou possível após a abertura democrática. Estava no jornal quando aconteceu a Novembrada, e acompanhou tanto os fatos no Centro de Florianópolis quanto o ato público que ocorreu dias depois, em 4 de dezembro, em protesto contra a prisão de cinco acusados de incitar a manifestação contra o ex-presidente João Baptista Figueiredo. “O Estado” recebeu prêmios pela cobertura do episódio, cuja dimensão foi tão grande que não havia como ocultar os fatos. Os anos de chumbo ainda vigiam, mas o jornal cumpriu bem o seu papel. Desses anos, ele lembra da equipe de fotogra!a montada por Orestes Araújo, que tinha !guras como Lourival Bento, Rivaldo Souza e Sérgio Rosário. E de pro!ssionais que marcaram os anos de ouro de “O Estado”, como Laudelino José Sardá, Mário Medaglia, Antônio Kowalski, Luiz Henrique Tancredo, Mauro Pires, Carlos Ady Vieira, Orlando Tambosi, Marcos Heise, Pedro Schmitt, entre tantos outros. Na editoria de Polícia, trabalhou com Luiz Carlos “Baby” Espíndola. “Saí e voltei tantas vezes que nunca dei baixa na carteira pro!ssional”, conta. Fora da mídia impressa, Celso passou pela TV Barriga Verde e pela produção da rádio Guarujá. Em 1992, estava em “O Estado” outra vez. E, em 1997, voltou para o “AN Capital”, onde encerrou seu período de repórter do dia a dia em jornais impressos.
Currículo valorizado Nascido em Laguna e radicado em Florianópolis desde os três anos de idade, os primeiros passos de Celso Martins no jornalismo foram em fevereiro de 1976 nos Diários Associados, que mantinham na cidade o “Diário Catarinense”. Depois, ele passou pelo “Jornal de Santa Catarina”, sucursal de Florianópolis, por “A Gazeta”, com o veterano editor Carlos de Freitas, e pelo semanário “Bom Dia, Domingo”. Um fato importante foi a ida para Joinville, em 1980, quando, recémcasado, apostou numa nova empreitada pro!ssional. No entanto, !cou só um mês no jornal, mudando para a sucursal de Joinville de “O Estado”. No Norte catarinense, também trabalhou no jornal “Extra” durante quatro anos. Ao voltar para a Capital, fez muitas matérias especiais, já com a bagagem trazida do curso de História que fez na Udesc. Mas foi antes, em “O Estado”, que a carreira decolou, porque o jornal já era estadual e contava com a melhor equipe de redação de Santa Catarina. Ali, passou por várias editorias e chegou a cobrir as atividades da Assembleia Legislativa e do Palácio do governo. De 1992 a 1997, foi chefe de reportagem e editor e também fez matérias para a Geral. Quando chegou a informatização, esforço derradeiro para dar sobrevida ao jornal, acabou se mudando para o “AN”, período em que conheceu ainda melhor a cidade onde cresceu, acompanhou o crescimento e a balbúrdia urbana e as questões ambientais que se mostravam cada vez mais prementes. Ali também trabalhou com Edson Rosa, a quem considera “um baita chefe de reportagem”. Antes de sair, participou de uma paralisação da redação de “O Estado” por causa da falta de pagamento do 13o salário, que deixou toda a equipe sem dinheiro antes do Natal. “Era chefe de reportagem de manhã e editor à tarde, o pessoal ameaçou parar e eu apoiei”, conta.
Mergulho na profissão Para entrar no jornal “O Estado”, Celso Martins passou por um teste. O editor Carlos Ady Vieira mandou-o fazer uma matéria sobre os salva-vidas na Praia da Joaquina. Ele se atirou no costão, atraiu os agentes e conseguiu, com essa estratégia, as melhores imagens para Rivaldo Souza, o fotógrafo que o acompanhava. A Joaquina parou e a edição do dia seguinte trouxe uma página inteira com imagens sobre o trabalho dos salva-vidas. Outra situação inusitada foi a invasão da TV Cultura, em 1986, por um soldado que, armado, interrompeu um debate esportivo da emissora. O caso gerou uma tensão sem precedentes, porque ninguém sabia o que poderia acontecer com os jornalistas que participavam do programa. Celso e o fotógrafo Marco Cezar estavam na Lagoa da Conceição para fazer uma reportagem sobre a passagem do cometa Halley. De lá, voltaram de madrugada para a redação, onde seriam descarregadas as fotos. Souberam do problema na TV, correram para lá e conseguiram emplacar a matéria no dia seguinte. Hoje, Celso Martins mantém o portal de notícias “Daqui na Rede”, que cobre tudo o que acontece no Sambaqui, Santo Antônio de Lisboa, Barra do Sambaqui e Cacupé, e também coisas de fora (incluindo artigos), quando for do interesse dos moradores desta parte do Norte da Ilha de Santa Catarina. Ali, pratica o chamado microjornalismo, que tem a vantagem de abarcar um universo especí!co e a desvantagem de mexer com comunidades onde quatro ou cinco famílias tradicionais ainda dão as cartas, como no passado.
De repórter a autor de grandes reportagens Entre 2003 e 2007, para suprir a falta de formação acadêmica, Celso Martins fez o curso de História na Udesc. Tinha em mente, também, escrever livros de memória e história. Com formação marxista, ele chegou a militar clandestinamente e foi !liado ao PCB (Partido Comunista Brasileiro), que pregava a luta sindical e ajudou a formar o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), atual PMDB. A academia deu-lhe a possibilidade de transformar seu interesse pela história em livros importantes, que modestamente chama de grandes reportagens. Publicou “Os quatro cantos do sol” e “Aninha virou Anita”, já com os critérios e a metodologia que aprendeu no curso. Seu trabalho de conclusão foi sobre o coronelismo, focado na !gura de José Fabrício das Neves – o homem que matou o coronel João Gualberto, que veio do Paraná para enfrentar os revoltosos – e no combate do Irani, um dos capítulos não suficientemente explorados da Guerra do Contestado. O start foi o chamado “processo do Irani”, documento de 518 páginas que lhe foi fornecido pelo professor
Paulo Pinheiro Machado, da UFSC, que estava na banca de seu TCC. Os CDs incluíam o inquérito e o julgamento dos envolvidos. A partir deles, Celso tornou-se o primeiro historiador a trabalhar em cima do valioso documento. “Fabrício das Neves é uma !gura nula na historiogra!a catarinense”, lamenta o jornalista, que lembra de ter visto o processo citado apenas pelo historiador Maurício Vinhas de Queiroz, com base em anotações de Joaquim Ribas, de Porto União. O material estava no fórum de Palmas, no Paraná, que nunca o liberou para pesquisa e consulta. Esse tema resultou no livro “O mato do tigre e o campo do gato – José Fabrício das Neves e o combate do Irani”, obra que deu vida aos personagens do episódio, entre eles antigos maragatos que haviam fugido do Rio Grande do Sul no fim da Revolução Federalista. Outros livros de sua autoria são “Os Comunas – Álvaro Ventura e o PCB catarinense”, “Farol de Santa Marta – A esquina do Atlântico”, “Tabuleiro das águas – Resgate histórico e cultural de Santo Amaro da Imperatriz” e “Os quatro cantos do sol – Operação Barriga Verde”.
De mergulho na Joaquina a invasão da TV Cultura
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ESPECIAL
O ESTADO
Entrevista. Paulo Dutra
Fotógrafo que fez história
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ARQUIVO PESSOAL/ND
Divertido, atento e curioso, Paulo Dutra protagonizou inúmeras histórias que entraram para o anedotário da imprensa catarinense.
lemente Paulo Dutra. Ou só Paulo Dutra – ele não gostava muito do primeiro nome. Ou Negão, o apelido que o acompanhou a vida inteira. Pouco importa como o conhecemos, mas sim o seu incrível talento para a fotografia e para cultivar amigos. Talento que frequentou as páginas de “O Estado” desde os tempos da linotipo, quando o jornal em geral publicava apenas uma foto – a “foto do dia”, sempre na capa. Paulo Dutra foi descoberto por Salim Miguel, na década de 1950, durante as filmagens de “O Preço da Ilusão”, projeto cinematográfico do saudoso Grupo Sul, que acabou fracassando porque sua montagem nunca foi concluída. O filme era bem ruim, mas um grande desafio para o grupo de jovens modernistas catarinenses, um marco histórico. Retratava a Florianópolis da época, suas paisagens e personagens, com um enredo fraco e sem muito apelo. Paulo Dutra era um moleque, criado no Morro do Céu, de onde saía todos os dias para acompanhar o movimento das filmagens. Sua presença constante e sua curiosidade pela logística cinematográfica despertaram a atenção de Salim. Nasceu ali um companheirismo e uma amizade que perdurou por toda a vida, até a morte de Paulo, em 2012, aos 72 anos. O fotógrafo aprendiz acabou chegando a “O Estado”, onde, segundo consta, foi o primeiro profissional do gênero a prestar serviços constantes (o jornal também utilizava material dos fotógrafos comerciais, como Anacleto e Cid Junkes, este do Foto B). Orestes Araújo, que trabalhou com Paulo Dutra em “O Estado”, acredita que ele tenha sido o primeiro a ter a carteira profissional assinada.
Causos divertidos contados nas mesas de bar Divertido, atento e sempre curioso, como qualquer bom repórter, Paulo Dutra protagonizou inúmeras histórias que entraram para o anedotário da imprensa catarinense. O primeiro topless na Praia da Joaquina, por exemplo. Há quem diga que o flagrante na verdade foi produzido por Paulo, que teria contratado duas moçoilas da sociedade local para posarem meio de lado, com parte dos seios à mostra, na praia vazia. Ele nunca confirmou, mas ria muito quando alguém, numa mesa de bar, lembrava o caso. Outro episódio foi relacionado a um suposto disco voador que teria aparecido no interior do Estado. De novo, reza a lenda, Paulo Dutra recorreu à produção: arranjou uma tampa de panela de alumínio, atirou-a no ar e fotografou-a como se fosse o tal disco voador. Não se sabe se a foto chegou a ser publicada, mas é outra história com a qual ele se divertia. O apelido de Pasto do Bode dado ao Campo da Liga – o estádio Adolfo Konder, no quarteirão entre a Mauro Ramos, Germano Wendhausen, Altamiro Guimarães e Bocaiúva, onde hoje é o Beiramar Shopping – foi obra de Paulo da Costa Ramos, editor do jornal na década de 1970. O campo andava maltratado, o mato crescia a olhos vistos. PCR encomendou a Paulo Dutra uma imagem para a capa do jornal. Criativo, o fotógrafo foi ao Morro do Céu, onde moravam seus pais, “alugou” uns bodes e levou-os para pastar no estádio. E a foto ganhou destaque merecido em “O Estado”.
Da província para o Rio de Janeiro A carreira de Paulo Dutra ganhou força com a entrada de “O Estado” na fase offset, em 1972. Fotografava tanto para o noticiário geral quanto para o
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esporte e as colunas sociais. Foi um dos fotógrafos favoritos de Zury Machado e Beto Stodieck, depois Cacau Menezes, Miro e Urbano Salles. Na década de 1970, foi para o Rio de Janeiro, a convite de Salim Miguel, e trabalhou durante algum tempo para a revista Manchete, a mais importante do país à época. De volta a Florianópolis, atuou na Agência Nacional (hoje EBC) e, depois, foi transferido para a assessoria de comunicação da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), de novo sob o comando de Salim. Gostava da noite e seu drinque favorito era o Cuba Libre, que bebia moderadamente, sempre na companhia de uma legião de amigos. A praia preferida, claro, era a da moda, e que nunca saiu de moda para várias gerações, a Joaquina. Era um bon vivant assumido.
Acredita-se que ele tenha sido o primeiro a ter a carteira pro ssional assinada em “O Estado”
2005 uCirurgiões franceses realizam o primeiro transplante parcial de rosto
uMorre o papa João Paulo II e Joseph Ratzinger é eleito o 265º papa da história da Igreja Católica e tornou-se Bento XVI
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Entrevista. Cesar Valente FLÁVIO TIN/ND
A grande escola de “O Estado” Impresso precariamente, a aparência do “O Estado” não era das melhores. Mas a vitalidade dos jornais dos centros maiores parecia estimular os jornalistas daqui.
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or mais que tenhamos lido e escrito sobre o jornal “O Estado”, muito ainda falta dizer. Traumatizados com seu !m melancólico e, apesar da idade, precoce, talvez tenhamos passado muito tempo tentando entender como isso foi possível e buscando causas, esquecendo-nos de outros temas igualmente importantes. Há vários momentos importantes, na história do jornal, sobre os quais se tem falado pouco. Um deles, que foi fundamental, a meu ver, para que todo o restante da história se desse da forma como ocorreu, é a chegada dos jovens bacharéis à redação na década de 1960. Quando o também jovem José Matusalém Comelli assumiu a direção do jornal, conseguiu convencer alguns amigos e conhecidos a fazer parte da equipe. O time principal era composto por Marcílio Medeiros Filho, Luiz Henrique Tancredo e Sérgio da Costa Ramos. Na área operacional, trazido pelo diretor anterior, Domingos de Aquino, outro estreante, Osmar Schlindwein. Impresso precariamente, numa velha rotoplana, e composto em linotipo, a aparência do jornal “O Estado” não era das melhores. Mas a vitalidade dos jornais dos centros maiores, como o então inovador “Jornal do Brasil”, parecia estimular os novos jornalistas de “O Estado”. Mas sabemos muito pouco sobre o que aconteceu no jornal durante os anos que antecederam a grande reforma de 1972. Seria muito útil, para a construção de uma história da imprensa catarinense melhor contada, ouvi-los sobre aquele período.
Agilização da reforma grá!ca Quando foi surpreendido pelo lançamento do “Jornal de Santa Catarina”, impresso em offset e com um nível de pro!ssionalização que ainda não tinha sido visto por aqui, Comelli teve que acelerar o passo e implantar “pra ontem” as mudanças que talvez estivesse pensando para depois de amanhã. E essa operação, que foi o grande marco da história de “O Estado”, foi conduzida por aquele quarteto, reforçado pelo Paulo da Costa Ramos, o PCR. A ligação de “O Estado” com a imprensa dos grandes centros não !cava apenas na admiração. Marcílio Medeiros Filho foi correspondente do “Jornal do Brasil”, Sérgio da Costa Ramos, da “Veja”, e Tancredo e PCR acompanhavam tudo o que se publicava no Brasil e no exterior. Quando surgiu a oportunidade de liderar a reforma do jornal, eles esta-
vam prontos. Com seus diplomas de Direito deixados momentaneamente de lado, compunham, sem querer, a primeira turma formada pela grande escola de jornalismo em que “O Estado” se transformaria a partir dali.
Talentosos convocados à redação Osmar Schlindwein chegou a registrar essa impressão, em depoimento de 2011, incorporado à tese de doutorado da Leani Budde (Jornadas Impressas: “O Estado” e Florianópolis – 1985 a 2009). Osmar conta que quando o jornal começou a se pro!ssionalizar, em 1972, “não tinha o curso de Jornalismo, e o jornal precisou formar uma redação. Tanto na rua Conselheiro Mafra como depois, na sede da rua Felipe Schmidt. Pegava-se pessoas com talento, em geral estudantes de Direito ou Letras, dava treinamento e ele virava repórter.” O que no início era feito por necessidade, pela escassez da mão de obra, depois acabou sendo incorporado ao dia a dia. Não como uma característica especial de “O Estado”, mas porque, na década de 1970, as redações da maioria dos jornais eram assim. Aprendia-se muito nas redações. E em “O Estado” não foi diferente. Há uma geração de jornalistas que lembra com gratidão e saudade da vivência que teve quando passou por lá. E é provavelmente essa troca de experiências, essa sensação de que, mais do que um local de trabalho, “O Estado” foi um local de aprendizado, que faz com que, há cinco anos, um grupo grande de ex-funcionários se reúna periodicamente, para confraternizar e se divertir. Os jornais passam, mas o que a gente aprende fica para sempre. * Cesar Valente iniciou no jornalismo em 1970, no jornal “O Estado”. Em 1979, fez parte da comissão que criou o Curso de Jornalismo da UFSC. Durante os 45 anos de carreira, foi repórter, redator, cronista, ilustrador, cartunista, designer gráco, professor universitário, coordenador de curso universitário, editor, chefe de redação, webmaster, secretário de redação, consultor e sócio-proprietário de empresa jornalística. Atuou em Florianópolis (Governo do Estado, jornal “O Estado”, UFSC e revista “Empreendedor”), Porto Alegre (TV Gaúcha, Rádio Gaúcha e “Diário do Sul”), Brasília (EBN do Ministério da Justiça e “Gazeta Mercantil”) e São Paulo (Companhia de Notícias e “Gazeta Mercantil”). Atualmente, presta serviços de design grá co, consultoria editorial e de comunicação.
Muito antes da faculdade, o jornal recrutava estudantes de Letras ou Direito, que eram treinados e atuavam na redação
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ESPECIAL
O ESTADO ÁLBUM DE FAMÍLIA/DIVULGAÇÃO/ND
Homenagem. Toninho Kowalski
Mestre jornalista, profissional completo O jornalista, na visão bemhumorada do artista Fossari
No contexto geral da pro ssionalização do jornal, destacaram-se os jornalistas que tinham o jornal como “bico” e os que, apesar do pouco tempo passado na redação, se transformaram em verdadeiras feras.
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a trajetória da redação de “O Estado” é preciso separar seis momentos básicos: os primeiros tempos da era Aderbal Ramos da Silva, a partir de 1946; a presença de Rubens de Arruda Ramos na direção, até 1965; a nova gestão, com José Matusalém de Carvalho Comelli, a partir de 1967; a fase offset, que trouxe os jornalistas gaúchos a partir de 1972; a mudança para o parque industrial da SC-401, em 1977; a informatização total, a partir de 1996. Entre 1946 e 1972, os profissionais que atuavam na redação eram geralmente estudantes universitários ou recém-formados em Letras ou Direito, convocados pelos gestores do jornal. Depois, vieram os “de fora”, em geral gaúchos, formados e experientes. A faculdade de Jornalismo da UFSC só seria fundada em 1979. No contexto geral da pro!ssionalização do jornal, que teve início sob a supervisão de Comelli, destacaram-se vários tipos de jornalistas: os que tinham o jornal como “bico” e os que, apesar do pouco tempo passado na redação, se transformaram em verdadeiras feras da redação, entendendo e praticando todos os processos – da reportagem ao copidesque, do copidesque à edição e revisão. Nem todos tinham esse gabarito, de profissionais completos, capazes – se fosse necessário – de fazer um jornal inteiro, sem ajuda de ninguém. Um nome se destacou entre os pro!ssionais que atuaram no primeiro período de Comelli como gestor, justamente entre 1967 e o ingresso na era do offset, em 1972. Admitido no quadro de “O Estado” em 1969, Antônio Kowalski Sobrinho era um polaco alto, nascido e criado na rua Conselheiro Mafra, bem perto do jornal, bonachão e divertido, sempre solidário com os colegas menos experientes, de uma competência indiscutível. Fábio Comelli, que foi diretor de “O Estado”, não chegou a conviver muito tempo com Toninho na redação da SC-401, mas resume numa frase o que pensava: “Toninho era a alma do jornal”.
Visão técnica e rigorosa Rigoroso com a língua portuguesa e com as regras gerais do jornalismo, que aprendeu na prática (era for-
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mado em Direito, carreira que nunca seguiu), Toninho Kowalski dominava a redação como poucos. Acompanhou quase todas as transformações do jornal, só perdeu a última, a informatização integral, porque morreu cinco anos antes (28 de junho de 1991), deixando inconsoláveis os familiares e uma legião de amigos e colegas de pro!ssão. Ele tinha a visão técnica do jornal, não se envolvia com as questões institucionais ou políticas, cumpria os ritos internos que interessavam para que o leitor tivesse à sua disposição, no dia seguinte, um bom produto, com conteúdo de qualidade. Atuou em várias frentes, da reportagem à edição, contribuindo em praticamente todas as áreas (editorias), embora durante a maior parte de sua carreira tenha sido um pro!ssional “de cozinha”, como eram conhecidos aqueles que !cavam mais na redação, a retaguarda do jornal. Quando morreu, era o editor-executivo do jornal, faltava um degrau apenas para alcançar o posto de editor-chefe. Wilson Libório de Medeiros, que conheceu Toninho na Conselheiro Mafra e trabalhou com ele em todas as fases até a mudança para a sede da SC-401, lembrou na edição de 80 anos do jornal “O Estado”, em 1995: “Sou daqueles que conheceram o Toninho pouco mais que menino, o adolescente inquieto, sempre polemista e extremamente gozador. Vivia jornalismo 24 horas ao dia. En!m, convivi com ele, brinquei e também briguei com ele, enfrentamos boas paradas juntos, umas perdidas, outras vencidas. Toninho foi um grande amigo e um grande exemplo”.
Profissional premiado Além da redação de “O Estado”, Toninho atuou também na área de comunicação do governo do Estado e foi o mais jovem presidente do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, com apenas 27 anos de idade. Foi ainda correspondente de “O Globo” em Santa Catarina e participou do primeiro grupo de trabalho da UFSC para a criação do curso de jornalismo, em 1973. Em 1977, recebeu um dos prêmios mais importantes da comunicação catarinense, o “Prêmio Jerônimo Coelho de Jornalismo”.
2006 uPCC cria onda de violência em São Paulo (foto) uLula vence Alckmin no segundo turno
2009 uMichael Jackson morre aos 50 anos (foto) uBarack Obama, o primeiro presidente negro dos EUA, toma posse
Fontes: História do Brasil (Bóris Fausto), Brazil (Thomas Skidmore), Brasil História - Texto e Consulta (Antonio Mendes Jr et. al.), Dicionário Ilustrado Folha, Encyclopaedia Britannica, Oxford Encyclopedia of World History, The Timetables of History (Bernard Grun), http://www.hyperhistory.com.
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Entrevista. Raul Sartori
Tinha a certeza de que seria a pro ssão da minha vida e precisava dela para me manter, pelo menos naqueles anos.
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Um bloco na mão e muitas pautas na rua
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a redação de “O Estado”, Raul Sartori tinha a fama de andar pela cidade sem pautas e voltar com uma ou duas matérias dignas de abrir uma página standard do jornal. Ou de sair com um tema préde nido e trazer outros dois a mais do que o chefe de redação havia determinado. Se isso causava algum ciúme entre os colegas, obrigando-o a fazer tudo com a máxima discrição possível, deixava feliz da vida o chefe de reportagem, Aldo Grangeiro, que fazia questão de falar isso aos seus superiores. Com humildade, Raul atribui essa virtude à educação que recebeu, voltada para o trabalho correto e e ciente. Já fazia isso na roça, em Nova Trento, manuseando a enxada várias horas por dia. “Depois, tinha a certeza de que seria a pro ssão da minha vida e precisava dela para me manter, pelo menos naqueles anos”, explica. Há 40 anos, os recursos eram menos pródigos do que hoje, embora re"etissem o que era visto como “moderno” na época. As máquinas de escrever Remington e Olivetti, manuais e depois elétricas, eram o que são os atuais computadores. “Peguei o tempo em que a modernidade nas comunicações era o telex”, relembra. A lentidão era compensada pelo funcionamento perfeito da redação e pelo êxito nos resultados. Na editoria de Cidade, onde atuou, existia pouca ingerência externa. “Só havia um cuidado especial para não ferir suscetibilidades, ou seja, abordar assuntos que envolvessem negócios (e eram muitos) do dono do jornal, o ex-governador Aderbal Ramos da Silva”, diz. Um fato relevante é que o jornal não media esforços para fazer grandes coberturas. Um dos momentos marcantes foi a enchente de Tubarão, em 1974, que matou quase 200 pessoas. Uma equipe ficou semanas na cidade do Sul do Estado para registrar os desdobramentos da tragédia. Outra cobertura inesquecível foi a das enchentes em diversas regiões do Estado em 1983, que num determinado momento deixou mais de 1,5 milhão de pessoas fora de suas casas. Sartori entrou em “O Estado” em 1973, dois anos após vir de Nova Trento para fazer o curso de Ciências Sociais na UFSC. Tinha o projeto de ser pesquisador na área de opinião pública e de mercado, algo que começava na época, e se sustentava dando aulas numa escola pública da Capital. Também trabalhou como técnico de raio-X, durante três meses, no hospital Celso Ramos, mas não se adaptou à rotina de lidar com pessoas acidentadas. Foi quando o jornal criou um concurso para universitários destinado a preencher vagas de “jornalista”. Ele era um dos 144 candidatos e acabou sendo um dos 12 pré-selecionados após responder a 100 perguntas de conhecimentos gerais. Alguns dias depois, o jornal chamou o grupo para uma entrevista.
De repórter a editor-chefe A redação cava na Felipe Schmidt e, dez dias após a conversa, ele foi chamado, com mais três pessoas, para trabalhar como repórter. “Comecei no dia 2 de maio de 1973 e permaneci até 1986”, conta ele. De repórter passou a repórter especial, coordenador do Interior (onde o jornal chegou a ter 23 sucursais e correspondentes), editor de várias áreas e, por cinco anos, editor-chefe da edição de segunda-feira. “‘O Estado’ não só foi meu primeiro emprego de fato como foi ele que me abriu caminhos para outros empreendimentos”, conta Raul. A experiência adquirida no “mais antigo” o transformou em um colunista respeitado, muito ajudado pelas fontes de informação conquistadas durante anos. Fazendo um balanço de sua passagem pelo “Estado”, Raul Sartori chega a dizer que o jornal salvou sua vida. “Certamente não teria encontrado pro ssão melhor. Caiu do céu por acaso e representou uma espécie de prêmio, uma vez que desde criança, morando no meio do mato, literalmente, em Nova Trento, tinha um grande interesse por informação. Ouvia, com outros irmãos, noticiários de todo tipo – o Repórter Esso era um dos preferidos –, de emissoras de rádios brasileiras e estrangeiras. A rádio Voz da América era outra sintonizada, e sobre o que os jornais brasileiros publicavam de mais importante, “ouvíamos” críticas e comentários logo de manhã cedo, no programa “O Trabuco”, com Vicente Leporace, nas ondas da rádio Bandeirantes de SP. Hoje, 42 anos após o primeiro dia de trabalho em “O Estado”, Raul se ocupa de uma coluna diária para vários jornais do interior e da edição do semanário “O Trentino”, em Nova Trento. Acredita que o jornalismo impresso, se tomar como
parâmetro o seu jornal, ainda vai sobreviver por muitos anos. “A estratégia que uso no semanário é dar total cobertura a assuntos locais, cobertura esta que nem rádio, TV e redes sociais fazem”, a rma. Para isso, prioriza a absoluta isenção e a independência. Com tantos anos de casa, Raul Sartori também lembra de episódios marcantes, ainda que nem sempre com nal feliz. Um exemplo foi a cobertura da Festa Nacional da Maçã, em São Joaquim, no nal dos anos 1970. Deslocado para a Serra, ele topou com o prefeito da cidade, Rogério Tarzan da Silva, uma espécie de Odorico Paraguaçu, da novela “O Bem Amado”. Sempre metido em confusões administrativas, ele era alvo permanente de matérias no jornal. Naquele ano, quem esteve lá era o então presidente João Figueiredo. Raul foi cedo à prefeitura para esclarecer algumas denúncias contra Tarzan. Quando entrou no gabinete, este disse que não falaria nada, e trancou-se lá dentro, com chave – e mais, foi embora, deixando lá o repórter sem ninguém mais, já que ele havia decretado feriado. “Como não havia telefonista, tive que abrir a janela e gritar para as pessoas que passavam me tirarem dali”. Meia hora depois, antes do general chegar, apareceu um rapaz dizendo: “o prefeito agora mandou soltar o senhor”. Naqueles anos, “O Estado” tinha uma postura políticopartidária clara, expressa nos seus editoriais. No noticiário cotidiano isso pouco aparecia ou era discretamente disfarçado. “Havia uns bate-bocas entre repórteres esquerdistas e editores de política de vez em quando, mas todos se sentiam respeitados”, recorda o jornalista. “Esse engajamento, hoje, seria muito difícil pelo grau de informação das pessoas, com acesso amplo às redes sociais. O jornal não teria mais credibilidade, a não ser que zesse sua opção política de forma claríssima”. No caso de “O Estado”, a maior diferença estava no conteúdo e na aposta em grandes reportagens. Eram tão completas e extensas que ocupavam páginas numa única edição ou eram distribuídas nas edições seguintes.
“O Estado” tinha uma postura político-partidária clara, expressa nos seus editoriais
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