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CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS SERES VIVOS E COMPOSTOS INORGÂNICOS
2.2 Água (H2O)
A vida na Terra começou na água e, ainda hoje, a ela se associa. Só há vida onde há água. As propriedades da água que a tornam fundamental para os seres vivos se relacionam com sua estrutura molecular, constituída por dois átomos de hidrogênio ligados a um átomo de oxigênio por ligações covalentes. Embora a molécula como um todo seja eletricamente neutra, a distribuição do par eletrônico em cada ligação covalente é assimétrica, deslocada para perto do átomo de oxigênio.
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Na figura, temos uma molécula de água, na qual dois átomos de hidrogênio se ligam a um átomo de oxigênio. O ângulo aproximado entre as ligações covalentes da água é de 104,5°.
Ligação covalente
A molécula apresenta, na extremidade do oxigênio, um predomínio de cargas negativas (δ-), enquanto que, nas extremidades do hidrogênio, predominam cargas positivas (δ +), por isso a molécula de água é polar ou polarizada. Moléculas que não têm essa polaridade são chamadas de moléculas apolares – por exemplo, os lipídios.
Quando os átomos de hidrogênio da molécula de água (com carga positiva) se colocam próximos ao átomo de oxigênio de outra molécula de água (com carga negativa), estabelece-se uma ligação entre eles, denominada ligação de hidrogênio ou ponte de hidrogênio.
2.2.1 Coesão e adesão
Por causa das ligações de hidrogênio, as moléculas de água se mantêm fortemente unidas; essa importante atração é chamada de coesão. Ela é responsável por sua alta tensão superficial, em que as moléculas da superfície formam “uma rede” orientada em direção ao corpo do líquido e resistente à ruptura.
Por causa da tensão superficial, alguns animais são capazes de pousar e mesmo andar sobre a água sem afundar.
As moléculas de água, devido à sua polaridade, podem aderir a superfícies constituídas por outras substâncias polares. Essa atração é denominada adesão
A combinação entre as propriedades de coesão e adesão da água são importantes em muitos processos biológicos, como o transporte da seiva nos vegetais.
2.2.2 Capilaridade
É a capacidade da água de penetrar em espaços reduzidos. Isso permite, por exemplo, percorrer os microporos do solo, tornando-se acessível às raízes das plantas. Outro exemplo é quando a água “sobe” a parede de tubos muito finos, mesmo contra a força da gravidade. Na figura a seguir, vemos esse processo:
Forças de adesão
Capilar de vidro
Vidro
As ligações de hidrogênio, por manterem uma ligação estável entre as moléculas, são responsáveis por várias propriedades da água.
Moléculas de água
Forças de coesão
As moléculas de água prendem-se às paredes internas do capilar de vidro por adesão, e levam consigo outras moléculas por coesão. Quanto mais estreito for o tubo, mais alta será a coluna de água.
2.2.3 Poder de dissolução
A água é considerada como solvente universal porque tem grande poder de dissolver várias substâncias. Quando moléculas entram em contato com a água, ela tem a tendência de envolver as moléculas, separando-as.
As substâncias que se dissolvem são chamadas hidrofílicas (hidro = água; philus = amigo), e as que não se dissolvem são chamadas hidrofóbicas (hidro = água; phobos = medo).
As substâncias hidrofóbicas são apolares, enquanto as hidrofílicas são polares.
Molécula de água Íons solvatados Cristal de NaC contribuindo para diminuir o atrito nessas regiões. Além disso, nas reações de hidrólise, como ocorre no processo digestivo, a água tem participação indispensável na transformação das grandes moléculas orgânicas em outras moléculas menores.
2.2.6 Balanço hídrico
A água está dissolvendo os íons que formam o NaC , o sal de cozinha.
2.2.4 Calor específico e calor latente elevados
O calor específico consiste na quantidade de energia térmica necessária para aumentar a temperatura de uma substância em determinada quantidade. O calor específico da água é de 1 cal/gºC, maior do que qualquer outra substância (com exceção da amônia líquida). Isso significa que a água precisa absorver muita energia para aumentar sua temperatura, e também necessita liberar muita energia para baixar sua temperatura. Portanto, o alto calor específico é a causa da estabilidade térmica da água.
O calor latente é a energia necessária para a mudança de estado físico de uma substância em determinada temperatura. O calor latente de vaporização da água a 25 ºC é de 44 kJ/mol, o valor mais alto conhecido para líquidos. Grande parte dessa energia é utilizada para quebrar as pontes de hidrogênio entre as moléculas de água. Dessa forma, a evaporação da água exige a absorção de muita energia. Quando a temperatura do ambiente ultrapassa determinados valores, ou quando o corpo esquenta por causa de um exercício físico, nossas glândulas sudoríparas eliminam suor.
A água contida no suor evapora, eliminando o calor da pele e do sangue abaixo desta, o que impede que a temperatura se eleve muito. Assim, a água é um termorregulador.
2.2.5 Outras propriedades
Podemos dizer, ainda, que, por ter esse grande poder de dissolução, a água é um importante veículo de transporte de substâncias, permitindo o contínuo intercâmbio de íons e de moléculas entre os líquidos extra e intracelular. Nas articulações ósseas, a água exerce um papel lubrificante,
O balanço hídrico é essencial para a manutenção da vida, porque um ser vivo perde água continuamente para o ambiente. As principais vias de perda de água pela maioria dos animais são ar expirado, suor, fezes e urina, então deve-se repor a água perdida. As principais vias de ganho de água são a via exógena (a água que vem de fora), como a água ingerida e a presente em alimentos, mas há também a via endógena (a água que o organismo produz), proveniente das reações do metabolismo. Em um quadro de desidratação (perda de água), o organismo, para evitar a sua morte, busca diminuir suas perdas de água; por exemplo, uma criança desidratada urina pouco ou até mesmo não urina para evitar a desidratação excessiva.
2.2.7 Fatores que alteram o percentual de água
A quantidade de água varia de acordo com alguns fatores: Metabolismo: quanto maior a atividade química (metabolismo) de um órgão, maior o teor hídrico.
Quantidade de água em porcentagens do peso total em alguns órgãos humanos
92,0
83,4
77,8
70,9
70,9
48,2
12,0
Idade: o encéfalo do embrião tem 92% de água e o do adulto, aproximadamente 78%. A taxa de água em geral decresce com a idade.
Espécie: na espécie humana, há 64% de água e, nas medusas (água-viva), 98%. Esporos e sementes vegetais são as estruturas com menor proporção de água (15%).
A água e a taxa metabólica
Como veremos adiante, a água está envolvida em numerosas reações químicas presentes nos organismos vivos. O metabolismo é caracterizado pelo conjunto de reações químicas que ocorrem em um sistema vivo (reações de quebra e síntese).
Dessa forma, a quantidade de água em um organismo é diretamente proporcional à sua taxa metabólica. Tecidos com baixa atividade metabólica, como o tecido ósseo, têm pouca água quando comparados ao tecido nervoso, que apresenta elevada taxa metabólica.
Outro exemplo é o das sementes de vegetais, que têm baixa quantidade de água, permanecendo em estado de dormência até serem postas em contato com a água.
A quantidade de água em um organismo também varia de acordo com a idade: indivíduos mais jovens têm mais água no corpo do que indivíduos mais velhos.
Alguns seres vivos conseguem sobreviver quase totalmente sem água, por períodos mais ou menos prolongados. É o caso dos esporos bacterianos e dos cistos de protozoários. Esse fenômeno é chamado de anidrobiose (vida sem água) e corresponde a uma forma de vida latente, na qual as reações do metabolismo estão reduzidas ao mínimo necessário para a manutenção da vida.
2.2.8 Distribuição de água nos seres humanos
Nos seres humanos, a distribuição de água nos dois sexos é diferente. No homem, representa em média 60% do peso e, na mulher, 50%.
A diferença é atribuída ao conteúdo de gordura diferente nos dois sexos.
A água no organismo humano está distribuída em dois compartimentos principais: o intracelular (dentro das células) e o extracelular (fora das células). O maior é o intracelular, que corresponde a 2 3 da água total, sendo o restante presente no extracelular. O fluido extracelular é subdividido em dois compartimentos: o intravascular (dentro dos vasos sanguíneos) e o interstício (espaço entre as células). O interstício corresponde a 80%, e o intravascular, a 20% do fluido extracelular.
2.3 Sais minerais
Os sais minerais aparecem de três maneiras diferentes nos organismos: dissolvidos na forma de íons na água do corpo; formando cristais, como o carbonato e o fosfato de cálcio, encontrados no esqueleto; combinados com moléculas orgânicas, como o ferro na molécula de hemoglobina (que ajuda a levar o oxigênio para as células).
Os gráficos abaixo representam as distribuições de cátions e ânions no meio extracelular e no meio intracelular.
Meio extracelular
Meio intracelular
Na primeira coluna, temos a distribuição de cátions e, na segunda, a de ânions, nos espaços extracelular e intracelular, respectivamente.
Os sais minerais são divididos em:
• Macrominerais: assim denominados por serem necessários na dieta em níveis iguais ou superiores a 100 mg por dia. São eles: cálcio, fósforo, magnésio, enxofre, sódio, potássio e cloro.
• Microminerais ou elementos-traço (residuais): necessários em quantidades inferiores a 100 mg por dia. São eles: ferro, iodo, cobre, zinco, flúor, manganês, cobalto, cromo, selênio.
Nos seres vivos, os sais minerais desempenham algumas funções genéricas. Entre elas:
• Regulação da quantidade de água na célula: a água sempre se desloca do meio menos concentrado para o meio mais concentrado. Portanto, a concentração de íons nos meios intra e extracelulares definirá o sentido do fluxo da água. Esse fenômeno é conhecido como osmose e será discutido mais adiante.
• Equilíbrio elétrico da célula: devido a uma diferença na distribuição de ânions e cátions na membrana celular, a célula apresenta diferentes cargas elétricas em cada uma de suas faces. A membrana externa apresenta mais cargas positivas que a interna; assim, a última se torna relativamente negativa em relação à primeira. Essa propriedade é especialmente importante nas células do tecido nervoso.
• Equilíbrio ácido-base: vários íons colaboram para manter o pH sanguíneo neutro, condição importante para o equilíbrio e a constância das funções vitais (homeostase).
2.3.1 Principais funções dos sais minerais
A tabela abaixo resume os principais sais minerais e suas funções:
Sais Minerais Função/importância
Sódio (Na+)
Devido à ação da bomba de Na+ e K+, os íons sódio são bombeado para fora da célula e, por isso, tornam-se os íons mais abundantes do meio extracelular. Esses cátions atuam no equilíbrio osmótico do corpo, podendo participar da retenção de líquidos; são essenciais para a propagação do impulso nervoso.
Potássio (K+)
Cálcio (Ca2+)
Ferro (principalmente Fe2+)
Fósforo (principalmente na forma de PO4 3 )
Devido à ação da bomba de Na+ e K+, os íons potássio são bombeados para dentro da célula e, por isso, tornam-se os íons mais abundantes do meio intracelular. Participam, juntamente com o Na+, da condução do impulso nervoso.
É um componente fundamental na rigidez da estrutura de ossos e dentes. Nessas estruturas, o cálcio é encontrado principalmente na forma de hidroxiapatita [Ca10(PO4)6(OH)2]. Participam ainda da coagulação do sangue, contração muscular e da condução do impulso nervoso.
É um componente inorgânico do grupamento Heme da hemoglobina (proteína encontrada no interior das hemácias, que participa do transporte de gases respiratórios). O ferro também é encontrado na mioglobina, presente nas células musculares, e em enzimas encontradas nas mitocôndrias.
A molécula de ATP (trifosfato de adenosina), responsável pelo armazenamento e transferência de energia para as células, é formada pelos íons fosfato ( PO4 3 ). Esses íons também formam os ácidos nucleicos como o DNA e o RNA e, ainda, participam da formação de dentes e ossos.
Magnésio (Mg2+) Juntamente com o cálcio e o fósforo, participa da composição dos ossos. É o componente de muitas coenzimas, que atuam na síntese da molécula de ATP, e da propagação do impulso nervoso. Nos vegetais, o Mg2+ é encontrado na estrutura da clorofila, que participa da fotossíntese.
Iodo (I–) É o componente inorgânico dos hormônios da glândula tireoide. Esses hormônios participam do controle do metabolismo do corpo. É encontrado nos frutos do mar e no sal de cozinha iodado.
Zinco (Zn2+) Componente de muitas enzimas e hormônios participantes de importantes vias metabólicas, como as enzimas digestivas por exemplo. Atua no processo de cicatrização e tem ação antioxidante.
Cobalto (Co2+) Componente estrutural da vitamina B12, também conhecida como cobalamina, a qual é importante no processo de formação de hemácias (eritropoese).
Enxofre (S2–) Componente estrutural de proteínas na composição de importantes aminoácidos, como cisteína e metionina.
Flúor (F–)Constituinte dos ossos e dos dentes, atua na proteção contra as cáries.
2.3.2 Principais doenças carenciais
A carência do ferro acarreta a anemia ferropriva. A anemia é caracterizada pela diminuição do número de hemácias e/ou do seu teor de hemoglobina. Com isso, ocorrerá deficiência no transporte de oxigênio para os tecidos.
Para corrigir esse problema, é recomendada a ingestão de ferro, possível de duas formas: (1) forma Fe2+ (íons ferrosos), proveniente de alimentos de origem animal, e (2) forma Fe3+ (íon férrico), derivada de alimentos de origem vegetal. A forma de origem animal é mais bem absorvida do que a forma vegetal. Por isso, as fontes animais (carne vermelha, frango e fígado) são as mais importantes em termos de reposição de ferro.
Metabolismo do ferro
O ferro é, principalmente, absorvido no intestino na forma de íon ferroso (Fe2+). Por essa razão, agentes redutores ou antioxidantes, como a vitamina C, presentes na alimentação, facilitam a entrada de ferro. O Fe2+ absorvido no intestino será levado ao sangue, onde se ligará a uma proteína plasmática denominada transferrina. Essa proteína conduzirá o ferro até a medula óssea vermelha, onde esse íon será utilizado na formação do grupamento heme que compõe a hemoglobina, pigmento responsável pelo transporte de gases respiratórios nas hemácias.
As hemácias duram pouco tempo na circulação sanguínea, então o baço e o fígado estão encarregados de remover essas células velhas, processo chamado de hemocaterese. A parte orgânica do grupamento heme será oxidada em bilirrubina, enquanto o ferro retorna ao sangue. A quantidade de ferro reciclado na hemocaterese é muito maior do que aquela absorvida no intestino.
O excesso de ferro é armazenado em uma proteína presente, principalmente, no fígado, chamada ferritina.
A carência do iodo na alimentação causa o bócio endêmico ou “papeira”, identificado pelo aumento do volume da glândula tireoide, numa tentativa inútil de compensação por causa da diminuição dos hormônios por ela produzidos.