O Tempo Dos Sohnos

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Sunfly Tjampitjin, 1916 – 1996 Balgo Hills N.T., Grande Deserto Arenoso, Kukatja Tingari - O Sonhar do Gato Na vo, 1988 Tingari- Na ve Cat Dreaming Tinta acrílica sobre tela

Respeitosamente informados aos leitores indígenas que esta publicação inclui obras de arte e imagens de pessoas falecidas. Indigenous readers are respec ully advised that this publica on includes works and images of and references to deceased persons.



CAIXA Cultural São Paulo



CAIXA Cultural apresenta O TEMPO DOS SONHOS: Arte Aborígene Contemporânea da Austrália, uma mostra internacional inédita na América La na, com obras originárias de um país tão distante e, ainda assim, com caracterís cas tão próximas às brasileiras.

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Realizada em parceria com a 2 Levels, a Ta ana Flores Produções e Coo-ee Art Gallery, a exposição traz uma seleção emblemá ca da arte contemporânea australiana produzida por ar stas aborígenes daquele país. Telas, esculturas e pinturas em materiais diversos ornam com primor as paredes das galerias, na CAIXA Cultural São Paulo, e proporcionam ao público o contato com uma cultura que se integrou e foi integrada à de seus colonizadores, promovendo uma reflexão sobre os diferentes modelos coloniais e seus impactos na arte e na cultura dos povos. Desta maneira, ao viabilizar este projeto, a CAIXA contribui com o pensamento crí co e com a formação do público, dando mais uma prova do seu compromisso com os brasileiros. Desde que foi criada, em 1861, ela tem atuado intensamente na melhoria da qualidade de vida da população. Além de seu papel como banco público e parceiro das polí cas de estado, a CAIXA apoia e es mula a cultura, especialmente na circulação de eventos pelas sete unidades da CAIXA Cultural. Não é fácil chegar a tantas pessoas e lugares, mas esse é um desafio que vale a pena. Afinal, para a CAIXA, a vida pede mais! CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

CAIXA Cultural presents OUT OF THE DREAMING: C o nte m p o r a r y A u st r a l i a n A b o r i g i n a l A r t , a n interna onal show visi ng La n America for the very first me and bringing artworks from a remote land which s ll shares common characteris cs with Brazil. Organized in associa on with 2 Levels, Ta ana Flores Produções and Coo-ee Art Gallery, the exhibi on features an emblema c selec on of contemporary Australian art produced by the Aboriginal ar sts from that country. Canvases, sculptures and pain ngs using various materials gracefully decorate the walls of the rooms at CAIXA Cultural Sao Paulo and provide visitors with an opportunity to experience a culture that integrated itself and was integrated into their se lers' culture. It also encourages a reflec on on the different colonial models and their impacts on art and the culture of the peoples. Hence, by making this project possible, CAIXA contributes to cri cal thinking and educa on of the people, thus proving again its commitment to Brazilians. Since its founda on back in 1861, its has been working hard to raise the quality of life of the people. In addi on to its role as a government bank and partner in the governmental policies, CAIXA supports and s mulates culture, especially to make the events tour the seven units of CAIXA Cultural. It is not easy to reach so many people and places, but this is a challenge that is worth facing. A er all, for CAIXA, life asks for more! CAIXA ECONÔMICA FEDERAL


Mão da ar sta da comunidade Mu julu. Imagem: cortesia de Wayne Quilliam, www.aboriginal.photography Ar st´s hand from the community Mu julu. Image: courtesy of Wayne Quilliam www.aboriginal.photography


Prefácio do Embaixador da Austrália

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arte indígena australiana ocupa um importante lugar de destaque na história da Austrália. De fato, ela pode reivindicar, de forma jus ficável, sua posição de arte da mais an ga cultura viva con nua do mundo. Esta exposição mostra e homenageia a riqueza dessa cultura e o modo como os povos aborígenes e do Estreito de Torres con nuam a pra car suas an gas tradições ar s cas, incorporando, inclusive, novos suportes contemporâneos.

As artes cria vas cons tuem um meio pelo qual os ar stas podem se comunicar, compar lhar suas histórias e culturas únicas com os povos do mundo inteiro. Esta exposição, que visitará várias cidades no Brasil em 2016, apresenta também obras de muitos dos melhores ar stas da Austrália de origem aborígene e do Estreito de Torres. Sua realização demonstra também o papel vital que galerias, consultores de arte e importantes ins tuições nacionais podem desempenhar como agentes nesse processo de comunicação. Esta exposição gera uma oportunidade para reflexão e um encontro de culturas. Espero que as obras tenham uma repercussão nos ar stas brasileiros e no povo deste país, que representa uma grande variedade de diferentes tradições culturais. Parabenizo e expresso minha gra dão à Caixa Cultural pelo apoio a esta maravilhosa exposição, o acervo mais significa vo de arte indígena australiana a ser exposta no Brasil. O prazer é maior ainda pelo fato de este fantás co evento estar acontecendo como uma parte importante do fes val Australian Now . Meus agradecimentos também à 2 Levels Exhibi ons e à Coo-ee Art Gallery, de Sidney, que trouxeram esta dinâmica exposição ao Brasil, e à Kangaroo Tours, à Miller & Co. e à Ta ana Flores Produções e a todos os curadores e assistentes ar s cos dos dois países que realizaram este projeto. Estou certo de que todos os visitantes da exposição serão bem recompensados e sairão dela enriquecidos pelo magnífico espetáculo visual da arte aborígene.

Forward by Australian Ambassador

Sr. John Richardson Australian Indigenous art has a most significant place in the history of Australia. Indeed, it can jus fiably claim to be the art of the oldest con nuous living culture in the world. This exhibi on pays tribute to and shows the richness of that culture and the way in which Aboriginal and Torres Strait Islander peoples con nue to prac ce their age-old art tradi ons, including in new contemporary mediums. The crea ve arts are means by which ar sts are able to communicate, to share their stories, histories and unique cultures with peoples from all over the world. This exhibi on, which will tour several ci es in Brazil during 2016, includes works by many of Australia's finest Aboriginal and Torres Strait Islanders ar sts. The realisa on of this exhibi on also demonstrates the vital role galleries, art consultants, and important na onal ins tu ons can play as brokers in that communica on process. This exhibi on creates an opportunity for reflec on and a mee ng of cultures. I hope that the artworks resonate with Brazilian ar sts and people, who represent such a range of different cultural tradi ons. I congratulate and express my apprecia on to the Caixa Cultural for suppor ng this wonderful exhibi on, the most significant collec on of Australian Indigenous art to be exhibited in Brazil. It is an added pleasure that this wonderful exhibi on has been arranged as an important part of the Australian now fes val. Thanks also to 2 Levels Exhibi ons and Coo-ee Art Gallery, Sydney, which have brought this dynamic exhibi on to Brazil, and to Kangaroo Tours, Miller & Co. and Ta ana Flores Produções and all the curators and arts workers in both countries that have supported this project. I am sure that everyone who visits will be well rewarded and enriched by this magnificent visual presenta on of Aboriginal art. Mr. John Richardson



I N T R O D U Ç Ã O INTRODUCTION

O TEMPO DOS SONHOS ARTE ABORÍGENE CONTEMPORÂNEA DA AUSTRÁLIA Out Of The Dreaming: Contemporary Aboriginal Art

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Clay D´Paula

Emily Kame Kngwarreye, 1916 – 1996 Utopia, Território do Norte, Deserto Oriental, Anmatjerre Oriental Sem Título, 1992 Un tled Tinta acrílica sobre tela

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It is our great pleasure to present in Brazil the first vigorous and diversified exhibi on displaying a variety of styles of the Australian Aboriginal art. Selected from the collec on of the Coo-ee Art Gallery and other collec ons in Australia, the ar sts range from Rover Thomas (1926 1998), who redefined the concept of the Australian landscape with earth pigments on wood, to Emily Kame 1 Kngwarreye (1916 - 1996), an ar st who defied the preexis ng fundamentals of tradi onal Aboriginal art by abandoning the iconography developed by the founding ar sts of the desert movement. Living ar sts at the height of their careers also par cipate in the project. Tommy Watson (1935 -) provides us with his incandescent and vibrant pale e, while ar st Abie Loy Kemarre (1974 -) bestows on us a piece characterized by the "depth of field" with small bright dots and a highly delicate and complex texture. The tle of the exhibi on, "Dream me", is the founda on of the Aboriginal culture and refers to the crea on of the universe, the beginning of knowledge and the source of the laws that govern the world. It is also the beginning of me, when supernatural beings of the past were born within their own eternity. (BARDON, 1991) This mythical concep on of the Dream me is vast, indeed, and may generate a number of interpreta ons in the fields of religion and anthropology.

1 - Emily Kame Kngwarreye começou a pintar aos 79 anos de idade e em um período de 7 anos conseguiu produzir nada menos que 5.000 obras de arte antes de sua morte em1996. Até hoje Kngwarreye é conhecida como a mais bem-sucedida e amada de todos os ar stas aborígenes. 1 - Emily Kame Kngwarreye started pain ng at the age of 79 and in a period of seven years she eventually produced nothing less than 5,000 works of art before her death in 1996. Un l today, Kngwarreye is known as the most successful and beloved of all the Aboriginal ar sts


............................. Rover Thomas, 1926 – 1998 Turkey Creek, Austrália Ocidental, Kimberley Oriental, Kukatja Solo Argiloso, Estrada de Canning Stock, 1985 Claypans, Canning Stock Route Pigmentos terrosos naturais sobre madeira

Tommy Watson, 1935 Wingellina, Território do Norte, Deserto Ocidental, Pitjantjatjarra Sem tulo, 2014 Un tled Tinta acrílica sobre linho belga

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Abie Loy Kemarre, 1974 Utopia, Território do Norte, Deserto Oriental, Alyawerre O Sonhar da Folha de Arbusto, 2008 Bush Leaf Dreaming Tinta acrílica sobre linho belga


Para nós, de outra cultura, podemos encontrar muita beleza e ter curiosidades sobre essa visão espiritual aborígene. E, na arte, vibra uma diversidade espiritual e uma complexidade visual. Na obra O Sonhar da Água, de Abie Jangala (Abie Jangala, 1919 – 2002) , o ar sta vem nos mostrar parte de sua cultura por meio do fascínio que ele tem com a chuva, nuvens e relâmpagos. Na sua fase adulta o ar sta par cipou de rituais para trazer a chuva. Os desenhos nas obras de Jangala nos faz lembrar exatamente as pinturas feitas no corpo dos par cipantes dessa cerimônia.

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No entanto, as obras aborígenes vão muito além do mundo espiritual, que aliás muitas vezes tal espiritualidade nos faz distrair da apreciação esté ca dos trabalhos criados pelos primeiros australianos. E ainda temos a limitação imposta, por grande parte de colecionares e do grande público, que é o esforço de apreciar as obras de dentro para fora, ou seja, decifrar o significado da iconografia adotada pelo ar sta. Com isso, a esté ca assume um segundo plano no contexto ar s co da produção de arte aborígene. Porém, antes de mais nada, não podemos nos esquecer da integridade e intensidade que os ar stas têm com os materiais u lizados durante o processo de criação da obra de arte. Gostaria de mencionar aqui que para alcançar a sua verdadeira função uma obra de arte deveria ser julgada por suas qualidades especiais (execução e uso de cores, apenas para citar algumas delas) e não pelo fato de ter sido trazida de uma cultura diferente da nossa. Manter essa integridade e qualidade é essencial para a produção da arte em qualquer lugar do mundo. Além disso, temos outro fator que não podemos deixar de levar em consideração na produção ar s ca dos ar stas: a maioria das obras criadas transmitem respostas sobre os horrores da colonização que os ancestrais desses ar stas enfrentaram – fatos transmi dos por meio de histórias às gerações mais novas. Portanto, podemos assumir que a arte aborígene é contemporânea por manifestar um reflexo dos acontecimentos do passado e momentâneos dentro da Austrália. Todos esses ar stas mantêm viva uma tradição ar s ca que, embora seja apreciada pelo Ocidente, nada tem a ver com a cultura eurocêntrica da arte. (MUNDINE, 2012) Djon Mundine elucida ainda mais essa questão para nós:

As to us, beings from a different culture, we can find much beauty and be curious about this Aboriginal spiritual vision. And a spiritual diversity and a visual complexity that vibrates in this art. In Water Dreaming, by Abie Jangala (1919 - 2002), the ar st shows us his body pain ng design represen ng with rain, clouds and lightning. Jangala was the ceremonial leader and senior custodian for these Dreamings. However, the Aboriginal works go far beyond the spiritual world. And, in fact, such spirituality o en makes us divert our a en on from the aesthe c apprecia on of the works created by the first Australians. Moreover, we have the constraint imposed by most collectors and the general audience and that is the effort to appreciate the works from the inside to the outside. To find the meaning of the iconography adopted by the ar st. Thus, aesthe cs shi s into the background in the ar s c context of the Aboriginal art. Nevertheless, we cannot forget the integrity and intensity these ar sts apply to the materials they use during their process of crea ng an artwork. I would like to men on here that, in order to achieve their actual func on, a work of art should be judged on its special quali es (making and use of colors, just to name a few of them) and not on the fact that it was brought from a culture different from our own. Keeping such integrity and quality is fundamental to the making of art anywhere in the world. Also, there is another factor that we cannot forget to take into considera on in the ar sts' produc on: most of the works created convey answers to the se lement horrors that the ancestors of these ar sts had faced - facts transmi ed by means of storytelling to the younger genera ons. Therefore, we can assume that the Aboriginal art is contemporary for expressing the effects of the past and momentary events inside Australia. All these ar sts keep alive an ar s c tradi on that, even though appreciated in the Western world, has nothing to do with the Eurocentric art culture. (MUNDINE, 2012) Djon Mundine elucidates this issue further:


Contemporânea não no sen do dos padrões de definição da arte criada no mundo Ocidental, tais como Modernismo, Pós-modernismo e dai por diante. Aliás, se o modelo e nomenclatura Ocidental devem ser citadas, a arte aborígene então é Pós-modernista e não Modernista. Isso porque a maioria das obras de arte aborígenes em coleções pelo mundo foram adquiridas depois da Segunda Guerra Mundial. E isso a faz muito contemporânea.

(MUNDINE, 2012)

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“Contemporary not in the sense of the standards defining the art created in t h e We ste r n w o r l d , s u c h a s Modernism, Postmodernism and so on. In fact, if the Western model and nomenclature should be cited, the Aboriginal art therefore is Postmodernist and not Modernist. This is so because the majority of the Aboriginal-art works in the collec ons across the world were acquired a er World War II. And this makes it very contemporary.” (MUNDINE, 2012)

Abie Jangala, 1919 – 2002 Lajamanu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri O Sonhar da Água, 1997 Water Dreaming Tinta acrílica sobre linho belga

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Os ar stas aborígenes u lizam materiais do mundo Ocidental, mas querem passar uma mensagem aborígene, específica de sua cultura. Eles não querem nos trazer uma ideia de Abstração, Minimalismo ou Expressionismo – a Europa não está no centro do universo deles. O que esses ar stas nos oferecem são obras que perpetuam a sua tradição, refle ndo a sua existência no mundo. Muitos deles, inclusive, atuam como a vistas na cena ar s ca australiana. O ar sta Richard Bell, representado na exposição pela obra Você não tem que men r!, 1993, chama a nossa atenção sobre as mazelas da colonização e invasão, inclusive aquela realizada pelos portugueses. De longe podemos ter a ilusão de que a obra foi criada com desenhos tradicionais aborígenes. No entanto, ao realizamos uma inspeção mais minuciosa, marrons e amarelos são desfigurados com referências históricas da mais forte conotação simbólica. The Aboriginal ar sts use materials of the Western world, but they want to convey an Aboriginal message, one that is specific to their culture. They do not want to draw an idea of Abstrac on, Minimalism or Expressionism - Europe is not in the center of their universe. What these ar sts offer us are works that perpetuate their tradi on and mirror their existence in the world. Many of them are also ac vists in the Australian ar s c landscape. Ar st Richard Bell, represented in this exhibi on by Ya Don't have ta! (lie), 1993, calls our a en on to the wounds le by the se lement and invasion of any country. This is equally true of the Portuguese colonizing Brazil. From a distance, we can have the illusion that this work was created with tradi onal Aboriginal designs. However, a er a careful examina on, browns and yellows are disfigured with historical references of the strongest symbolic connota on.

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Richard Bell, 1953 Charleville, Queensland, Queensland Ocidental, Kamilaroi Você não tem que men r!, 1993 Ya Don't have Ta! (lie) Técnica mista sobre tela

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Queremos com essa exposição levar o povo brasileiro a refle r sobre os povos indígenas na Austrália e no Brasil e sobre o impacto da colonização sobre todos eles. Reconhecer o potencial ar s co dos nossos ameríndios pode ser uma forma de reconciliação com o passado e trazer uma nova perspec va. A exposição apresenta trabalhos de ar stas aborígenes com múl plas vozes. As obras produzidas por eles emergiram de uma tradição cultural conhecida pelo mundo devido a sua complexidade religiosa e restrita por uma série de leis e fundamentos que apenas eles podem decifrar e e n t e n d e r, l o g o ta i s o b ra s s e d i sta n c i a m d o Eurocentrismo. Elas também nos fazem repensar uma nova forma de apreciar e de nos inspirar através da arte. As obras da exposição são parte música da sobrevivência e parte afirmação por meio das artes visuais sobre o que é ser indígena.

The inten on behind this exhibi on is to make the Brazilian audience think of the indigenous peoples in Australia and Brazil and the impact of se lement on all of them. Recognizing the ar s c poten al of our Amerindians can be a form of reconcilia on with the past and give rise to a new perspec ve. This exhibi on presents works of Aboriginal ar sts with mul ple voices. The works produced by them emerged from a cultural tradi on known in the world due to its religious complexity and restricted by a series of laws and founda ons that can only be decoded and understood by t h e m . T h u s , t h e s e w o r ks a r e d eta c h e d f r o m Eurocentrism. They also make us reconsider a new form of apprecia on and of being inspired through art. The works in this exhibi on are, on the one hand, a survival song and, on the other, affirma on by means of the visual arts based on what it is to be indigenous.

Bibliografia: MUNDINE, DJON. Chegando de Utopia. Art Monthly Australia, 2012. No. 250, p. 39. BARDON, Geoffrey, Papunya Tula, Arte do Deserto Ocidental, Penguin books Australia, 1991 p. 7. Bibliography: MUNDINE, Djon. Travelling from Utopia. Art Monthly Austrália, 2012. No. 250, p. 39. BARDON, Geoffrey, Papunya Tula, Art of the Western Desert, Penguin books Australia, 1991 p. 7.

........... Larry Spencer Jungarrayi, 1912 - 1990 Yuendumu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri O Sonhar dos Homens, 1980 Mens Dreaming Tinta acrílica sobre tela

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A AUSTRÁLIA BRANCA TEM UMA HISTÓRIA NEGRA White Australia has a Black History 1

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Djon Mundine OAM

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1 - Medalha da Ordem da Austrália. 1 - Awarded the Medal of the Order of Australia

Linda Syddick Napaltjarri, 1941 Papunya, Território do Norte, Deserto Ocidental, Pintupi Espíritos e Montanha de Areia, 2006 Spirits and Sandhill Tinta acrílica sobre linho belga


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mercado de Arte Aborígene Contemporânea é um constructo. Enquanto os ar stas aborígenes oferecem ícones, ideias e possivelmente uma persistência da memória moral, a valorização de sua arte pelos "estrangeiros" é essencialmente dirigida pelo mercado e baseada em um conceito histórico europeu.

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Sua aceitação envolveu a descoberta de que o con nente australiano abrigava muitas sociedades, línguas e formas de expressão cultural aborígenes diferentes. Muitos - se não a maioria - dos acervos públicos e privados refletem esse despertar gradual.

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A história da arte aborígene apresenta várias fases que se sobrepõem e de fronteiras indefinidas. Primeiramente, havia o período do começo dos tempos (49.999 anos BPI [Índice de Posição Ba métrica]) até o fim da Segunda Guerra Mundial, quando toda a arte aborígene, com certas exceções como o aquarelista Albert Namatjira (1902-1959), era vista como uma arte "primi va" feita por povos primi vos. A Segunda fase foi marcada pela "descoberta" das bark pain ngs (pinturas em entrecasca de eucalipto) da chamada Terra de Arnhem, no norte da Austrália, e a proposta de que a arte aborígene era arte com "A" maiúsculo e que possivelmente fosse arte contemporânea. O Art Gallery of NSW começou a colecionar essas pinturas a par r da década de 1950, marcando a passagem da arte aborígene da condição de a vidade de culturas ex ntas da etnografia para a de artes plás cas vivas.

The Contemporary Aboriginal art market is a construct. While Aboriginal ar sts offer up icons, ideas, and possibly a moral-memory insistence, the apprecia on of their art by 'outsiders' is essen ally market driven, and of European historical conceit. Its acceptance involved the discovering that the Australian con nent was home to many differing Aboriginal socie es, languages, and forms of cultural expression. Many if not most public and private collec ons mirror this awakening to degrees. The history of Aboriginal art has a number of overlapping, blurred-edge phases. Firstly there was the period from the beginning of me (49,999 year BPI) to the end of World War II when all Aboriginal art, with certain excep ons, such as the water colourist Albert Namatjira (1902-1959), was seen as 'primi ve' art made by primi ve people. The Second phase was the 'discovery' of bark pain ngs from what is called Arnhem Land in the north of Australia, and the proposi on that Aboriginal art is art with a capital 'A', and possibly that it is contemporary art. The Art Gallery of NSW began to collect these pain ngs from the 1950s, and this marked the Aboriginal art moved from ex nct cultures of ethnography to living fine art.


................................ Mick Kubarkku, 1922 – 2008 Maningrida, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Kunwinjku Os Espíritos Mimi e as Cobras-de-Java, 1957 Mimi Spirits and File Snakes Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto


A Terceira fase foi o início do movimento dos "pontos e círculos do Deserto Ocidental" com pinturas sobre tela produzidas em Papunya, a noroeste de Alice Springs, a par r do início da década de 1970.

The third phase was the beginning of the 'Western Desert dot and circle' movement with pain ngs on canvas produced at Papunya northwest of Alice Springs, from the early 1970s onwards.

A Quarta fase veio com o ressurgimento da arte do sudeste e do uso do termo "arte aborígene urbana" (que gerou uma forte polêmica entre os próprios ar stas) no começo dos anos 80.

The Fourth phase came in the re-emergence of the art of the southeast and the use of the term 'urban Aboriginal art' (hotly disputed by the ar sts themselves) in the early 1980s.

A Quinta fase, a par r da década de 1990, é quando os povos aborígenes começaram a fazer curadoria, escrever e conquistar uma pequena parcela de controle sobre a comercialização e a "leitura" de nossa própria cultura. Os resultados con nuam sendo confusos.

The fi h phase, from the 1990s is where Aboriginal people began to curate, write about, and gain a small glimpse of control over the marke ng and 'reading' of our own culture. This con nues to have mixed results.

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.............. Charlie Tjararu Tjungurrayi, 1925 – 1999 & Willy Tjungurrayi, 1936 Papunya, Território do Norte, Deserto Oriental, Pintupi Kintore, Território do Norte, Deserto Ocidental, Pintupi Ancestrais do Bandicoot Combatem um Incêndio em Taltanya, 1981 Bandicoot Ancestors Figh ng Over Fire at Taltanya Silk-screen



No romance épico "Capricornia" (1938), de Xavier Herbert, o autor previu que o futuro da sociedade australiana, e seus novos heróis, seriam aquelas pessoas de descendência mes ça de aborígenes e não aborígenes. Acredito que agora os australianos contam com pelo menos uma noção das muitas facetas da arte aborígene e da realidade, "com todos os seus defeitos", de nossa sociedade ainda não resolvida e nossa jornada comum juntos In Xavier Herbert's epic novel Capricornia (1938), he predicted that the future of Australian society, and its new heroes, would be those people of mixed Aboriginal and nonAboriginal descent. I think Australians now have at least an i n k l i n g o f t h e m a ny fa c e s o f Aboriginal art and the reality, 'warts and all', of our s ll unresolved society and our common journey together.

........................... Mick Kubarkku, 1922 – 2008 Maningrida, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Kunwinjku Os Espíritos Mimi e as Cobras-de-Java, 1957 Mimi Spirits and File Snakes Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto


............................... Ar sta Desconhecido Tokampini (Escultura Tiwi com um Único Pássaro) Tokampini (Tiwi Single Bird Sculpture) Escultura em madeira com pigmentos terrosos naturais

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............................... Paddy Fordham Wainburranga, 1941 – 2006 Beswick, Território do Norte, Katherine, Rembarrnga O Espírito de Balangjalngalan, c.1990 Balangjalngalan Spirit Escultura em madeira com pigmentos terrosos naturais



AUSTRÁLIA E BRASIL CULTURAS TECIDAS COM FIOS COLONIAIS COMUNS Australia and Brazil Cultures woven from common colonial threads

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Adrian Newstead OAM

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Lily Nungarayi Hargraves, 1930 Lajamanu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri O Sonhar das Mulheres, 1991 Women's Dreaming Tinta acrílica sobre tela

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1 - Medalha da Ordem da Austrália. 1 - Awarded the Medal of the Order of Australia


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Brasil é um país de mais de 200 milhões de habitantes de várias origens culturais. Sessenta por cento da população é composta de pessoas com ascendência africana, à qual se juntam os descendentes de imigrantes portugueses, italianos, espanhóis, alemães, japoneses, sírios e libaneses e, é claro, os habitantes na vos do Brasil, os indígenas. Todos eles cons tuem os fios do vibrante e colorido tecido mul cultural da sociedade brasileira.

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A Austrália, com uma população de apenas 25 milhões de habitantes, foi o lar de mais de 500 tribos na época da colonização britânica. Da mesma maneira, a composição de sua população logo foi preenchida por muitas culturas diferentes, que, depois de emancipadas, formaram uma sociedade caracterizada pela harmonia e pela igualdade. Os povos indígenas nos dois países viveram um passado violento e sangrento marcado pela tomada de suas terras pelos colonizadores à medida que expandiam seu domínio. Vieram também as doenças, os massacres, o veneno e a discriminação dos europeus. A polí ca do governo viu muitos dos sobreviventes "assimilados" na nova sociedade dominante. No Brasil, os ar gos "tradicionais" da cultura material foram vendidos como curiosidades e souvenir, artesanato e objetos decora vos em lojas para turistas e na beira das estradas. Na Austrália, não era diferente. Contudo, nos úl mos 60 anos, os ar stas aborígenes australianos criaram um movimento de arte contemporânea que ganhou reconhecimento no circuito internacional. Um movimento em que pinturas e esculturas são vendidas por centenas, milhares e mesmo centenas de milhares de dólares.

Brazil is a country of more than 200 million people drawn from many different cultures. Sixty percent of the popula on is composed of people with African ancestry. Intermixed are the descendants of Portuguese, Italian, Spanish, German, Japanese, Syrian, and Lebanese immigrants and, of course, the original inhabitants of Brazil, the Indians. All of these are threads in the vibrant, colourful mul cultural fabric of Brazilian society. Australia with a popula on of just 25 million, was home to more than 500 tribes at the me of Bri sh se lement. Its popula on too, was soon composed of many different cultures that became enfranchised into a society characterized by harmony and equality. Indigenous peoples in both countries experienced a violent and bloody past, as se lers spread and dispossessed them of their land. European diseases, massacres, poison and discrimina on followed, and government policy saw many of the survivors 'assimilated' into the new dominant society. In Brazil, 'tradi onal' items of material culture were sold as curios and souvenirs, cra s and trinkets in tourist shops and by the roadside. It was no different in Australia. Yet during the last 60 years, Australian Aboriginal ar sts have created a contemporary art movement that has become recognized interna onally. A movement in which pain ngs and sculptures sell for hundreds, thousands and even hundreds of thousands of dollars.


As obras apresentadas nesta exposição demonstram como a produção ar s ca se espalhou pelo con nente, incorporando novas mídias e es los regionais. O imaginário inclui as an gas histórias da criação contadas através da iconografia narra va desenvolvida pelos primeiros pintores do deserto, dos an gos desenhos cerimoniais, dos padrões de clãs tradicionais usados na pintura corporal e na arte rupestre, além de exemplos de arte polí ca urbana. T h e w o r k s i n t h i s ex h i b i o n demonstrate the way in which art produc on spread across the con nent encompassing new mediums and regional styles. The imagery includes ancient crea on stories told using the narra ve iconography developed by the early desert painters, age old ceremonial designs, tradi onal clan pa erns used in body pain ng and rock art, and examples of urban poli cal art.

........................... Johnny Mosquito, 1920 – 2004 Balgo Hills, Território do Norte, Grande Deserto Arenoso, Kukatja Bindi no Grande Deserto Arenoso, 1995 Bindi in the Great Sandy Desert Tinta acrílica sobre linho belga

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AS ARTES ABORÍGENES E SUAS MÚLTIPLAS FACETAS UM OLHAR A PARTIR DO BRASIL The Aboriginal arts and its multiple facets: a perspective from Brazil

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Ilana Seltzer Goldstein

Sunfly Tjampitjin, 1916 – 1996 Balgo Hills N.T., Grande Deserto Arenoso, Kukatja Tingari - O Sonhar do Gato Na vo, 1988 Tingari- Na ve Cat Dreaming Tinta acrílica sobre tela

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o Brasil, estamos acostumados a pensar (equivocadamente) em artefatos indígenas como artesanato barato, produzido em série, de caráter u litário. Provavelmente cause supresa, ao público brasileiro, descobrir que criações dos povos indígenas da Austrália vêm sendo cada vez mais valorizadas e reconhecidas como arte, ao longo das úl mas quatro décadas. Dois nomes emblemá cos do grau de inserção que alguns ar stas indígenas da Austrália a ngiram no sistema internacional das artes estão presentes na exposição “Tempo dos Sonhos”.

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Clifford Possum Tjapaltjarri, da etnia Anmatyerre, que vive no deserto australiano, teve uma tela leiloada por 2,4 milhões de dólares na Southeby´s, em julho de 2007. A obra foi arrematada pela Na onal Gallery of Australia. Trata-se de uma tela grande, produzida em 1977, que condensa diversos fragmentos mí cos. Já Emily Kame Kngwarreye, da mesma etnia, cujas telas são marcadas por largas pinceladas e por um croma smo refinado, esteve lado a lado com Mondrian, Miró e Kandinsky, no MoMa, em Nova York, em 2011. Evidentemente, nem todos os ar stas indígenas da Austrália estão no MoMA, nem são vendidos por valores milionários. Es ma-se que haja, atualmente, cerca de 7000 ar stas indígenas na Austrália (McCULLOCH, 2009) e que 50% dos ar stas australianos tenham origem indígena (NEALE, 2010). A produção ar s ca cons tui uma importante alterna va de trabalho e renda para grupos que, após o contato com os brancos, passaram a necessitar de dinheiro e assis ram ao esvaziamento de prá cas tradicionais como a caça e a pesca. Trata-se de algo que reúne diferentes gerações em torno de uma a vidade prazerosa, que permite contar histórias ancestrais, cantar, rememorar mitos. Além disso, em muitas situações, a produção ar s ca dá origem a ar culações polí cas (MORPHY, 2008).

In Brazil, we are used to (mistakenly) think of Indigenous ar facts as cheap func onal handicra of serial produc on. The Brazilian audience is likely to be taken aback by finding out that the output of the Australian Indigenous peoples have been increasingly more appreciated and recognized as an art form over the last four decades. Two emblema c examples of the level of recogni on that some Australian Indigenous ar sts have reached in the interna onal art landscape are present in the "Out of the Dreaming" exhibi on. Clifford Possum Tjapaltjarri, of the Anmatyerre ethnic group living in the Australian desert, had one of his works auc oned for 2.4 million dollars at Sotheby´s in July 2007. The canvas was bought by the Na onal Gallery of Australia. It is a large-sized piece painted in 1977 and condenses various mythical fragments. Emily Kame Kngwarreye, of the same ethnic group and whose works are marked by wide strokes and refined chroma cism, was hanging side by side with Mondrian, Miró and Kandinsky at the MoMa, in New York, in 2011. Of course not all the Indigenous ar sts from Australia are at the MoMA nor are sold by soaring prices. It is es mated that there are currently approximately 7,000 Indigenous ar sts in Australia (McCULLOCH, 2009) and that 50% of Australian ar sts are of Indigenous origin (NEALE, 2010). The ar s c produc on cons tutes a significant op on for employment and income for groups that, a er the first contact with the white men, fell into the need of money and saw their tradi onal prac ces, like hun ng and fishing, growing weaker. This is something that brings together different genera ons around an enjoyable ac vity and enables the Indigenous peoples to tell stories of their ancestors, sing, recall myths. Moreover, in many cases, the ar s c produc on gives rise to poli cal ar cula ons (MORPHY, 2008).


Se sabemos pouco sobre a Austrália, no Brasil, sabemos menos ainda sobre os povos indígenas que vivem nesse enorme e distante país. Por i s s o, a nte s d e co m e nta r algumas das obras de arte que compõem a mostra inaugurada na Caixa Cultural d e S ã o Pa u l o, e m 2 0 1 6 , convém oferecer informações introdutórias sobre eles. If we know li le about Australia, in Brazil our knowledge of the Indigenous peoples living in this huge and distant country is even more limited. Therefore, before moving on to the comments on some of the works of art that make up this show on display at Caixa Cultural Sao Paulo in 2016, an introduc on to those peoples seems appropriate.

.......................... Clifford Possum Tjapaltjarri, 1933 – 2002 Napperby, Território do Norte, Deserto Central, Anmatjerre O Sonhar do Cachorro Selvagem na Estação Napperby (O Sonhar de Possum), 1993 Dingo Dreaming at Napperby Sta on (Possum Dreaming) Tinta acrílica sobre linho belga


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OS POVOS INDÍGENAS NA AUSTRÁLIA E SUA INSERÇÃO NO SISTEMA DAS ARTES

The Indigenous peoples in Australia and their introduc on into the arts landscape

As populações das quais descendem os aborígines que hoje vivem na Austrália imigraram da Indonésia, de barco. Dois esqueletos encontrados no Lago Mungo, em New South Wales, atestam que já havia ocupação humana, ali, entre 40.000 e 60.000 anos atrás (ARTHUR e MORPHY, 2005). Atualmente, os povos indígenas correspondem a 2,5% da população australiana, e falam 145 línguas – 110 delas em risco de desaparecimento (TCHEKHOFF, 1989: 84).

The Aboriginals currently living in Australia are descended from peoples that immigrated from Indonesia on boats. Two skeletons found in Lake Mungo, in New South Wales, a est that the human being had already occupied the area from 40,000 to 60,000 years ago (ARTHUR and MORPHY, 2005). Today the Indigenous peoples account for 2.5% of the Australian popula on and speak 145 languages - 110 of them are endangered (TCHEKHOFF, 1989: 84).

De uma forma geral, os grupos aborígenes da Austrália parecem apresentar mais semelhanças entre si do que as populações ameríndias. A forte conexão com um território específico, no qual antepassados estão impregnados na paisagem, é um desses temas básicos. Outra recorrência são as histórias mí cas (dreamings) ocorridas no “tempo dos sonhos” (dream me), quando seres poderosos criaram os seres e as leis - não é por acaso que tantas telas trazem a palavra “dreaming” em seus tulos.

Generally speaking, the Australian Aboriginal groups seem to show more similari es among them than the Amerindian peoples. The strong bond with a specific territory, where their ancestors are embedded in the landscape, is one of these basic aspects. Another recurring element is the mythical tales (dreamings) taking place in the "dream me", when powerful beings created beings and laws - it is no coincidence that so many canvases have the word "dreaming" in their tles.

Porém, os modos de vida tradicionais e a ligação com as terras ancestrais sofreram grande revés com a chegada dos brancos. Desde o início da ocupação inglesa, em 1788, até os anos 1970, crianças na vas, principalmente as mes ças (half casts), foram removidas de suas famílias e adotadas por famílias brancas ou criadas em reformatórios. Es ma-se que entre 20% a 30% das crianças indígenas tenham sido raptadas, ao longo de quase 200 anos. Grande parte realizou trabalhos forçados ou sofreu abuso sexual (PASCOE, 2008). O fato é que línguas desapareceram, parentes se perderam, territórios foram tomados.

However, the tradi onal lifestyles and the bond with their ancestral lands suffered a major setback with the arrival of the white men. Since the beginning of the English occupa on in 1788 un l the 1970s, na ve children chiefly the half casts - were taken away from their families and adopted by white families or raised in reformatories. It is es mated that 20% to 30% of the Indigenous children were kidnapped over the course of nearly 200 years. Most part of them were subject to forced labor or suffered sexual abuse (PASCOE, 2008). The fact is that languages have disappeared, rela ves have been lost, territories were taken.


.............................. Clifford Possum Tjapaltjarri, 1933 – 2002 Napperby, Território do Norte, Deserto Central, Anmatjerre & Tim Leura Tjapaltjarri, 1934 – 1984 Kintore Território do Norte, Deserto Ocidental, Anmatjerre O Sonhar da Água no Monte Wedge c.1970 Water Dreaming at Mt.Wedge Tinta acrílica sobre tela


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Mudanças polí cas na Austrália coincidiram com o florescimento da arte indígena no país. Em 1972, a bandeira da “autodeterminação” passou a predominar, no lugar da “assimilação”, modificando o perfil de todas as polí cas públicas. “Audoterminação” significa que as decisões devem ser tomadas, sempre que possível, pelas próprias comunidades indígenas. No que concerne ao direito à terra, o ano de 1982 foi um marco, porque o primeiro processo do gênero foi ganho por uma comunidade indígena, no Estreito de Torres. O processo abriu precedente e, onze anos depois, foi publicado o Na ve Title Act, lei prevendo que grupos indígenas possam reivindicar a posse de terras pertencentes à União ou a par culares, junto a um tribunal específico, contanto que demonstrem ligações ancestrais com o local, e forneçam provas da con nuidade de prá cas e valores tradicionais (ARTHUR e MORPHY, 2005).

Poli cal changes in Australia coincided with the flourishing of Indigenous art in the country. In 1972, the idea of “self-determina on” began to overshadow the “assimila on”, thus modifying the profile of all the public policies. “Self-determina on” means that the decisions must be taken, whenever possible, by the Indigenous communi es themselves. As far as the right to the land is concerned, the year 1982 was a milestone because the first proceeding of the sort was won by an Indigenous community in the Torres Strait. The case set a precedent and, eleven years later, the Na ve Title Act was passed, whereby Indigenous groups were empowered to claim ownership of lands belonging to the Union or individuals via a specific court, provided they demonstrated ancestral connec ons with the site and produced proof of con nuity of the tradi onal values and prac ces (ARTHUR and MORPHY, 2005).

O governo do Primeiro Ministro Gough Whitlam, do Par do Trabalhista, criou o Aboriginal Arts Board em 1973. Composto por representantes indígenas, o órgão compraria, regularmente, durante vinte anos, obras para coleções públicas, algumas delas doadas para embaixadas e museus ao redor do mundo, outras inseridas em exposições nacionais e internacionais. O obje vo era abrir o mercado para essa produção, educando o olhar do público, de curadores e colecionadores.

The government of Prime Minister Gough Whitlam, of the Labor Party, created the Aboriginal Arts Board in 1973. Composed of Indigenous representa ves, the body would make regular acquisi ons of works for public collec ons over a period of twenty years. Some of them would be donated to embassies and museums around the world, while others were included in na onal and interna onal exhibi ons. The goal was to open the market for a produc on of this nature by educa ng the gaze of visitors, curators and collectors about it.

O início da década de 1970 também assis u à criação da coopera va ar s ca Papunya Tula (MYERS, 2002), cujo sucesso, na década seguinte, inspiraria a abertura de dezenas de coopera vas em outras comunidades indígenas. Um ar sta que fez parte da Papunya Tula desde o início foi Uta Uta Tjangala, da etnia Pintupi, presente na exposição.

The early 1970s also witnessed the crea on of the Papunya Tula ar st coopera ve (MYERS, 2002), the success of which in the following decade would inspire the opening of dozens of coopera ves in other Indigenous communi es. An ar st who was with Papunya Tula since the very beginning was Uta Uta Tjangala, of the Pintupi ethnic group, whose work is on display in this exhibi on.


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Queenie McKenzie, 1930 – 1998 Turkey Creek, Austrália Ocidental / Kimberley Oriental, Gija O Massacre de Horso Creek, 1998 The Horso Creek Massacre Serigrafia sobre papel


Os anos 1980 foram marcados também pela inauguração de alas para a exposição de arte indígena nos museus públicos australianos. Eles passaram, pouco a pouco, a dedicar algumas salas para a exposição permanente ou mostras temporárias de arte indígena e a contar com departamentos e curadores específicos para esse po de produção. A entrada da pintura aborígine em galerias comerciais nas grandes cidades australianas foi um outro divisor de águas, na década de 1980.

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Nos anos 1990 e 2000, ar stas e curadores de origem indígena, criados nas cidades, fluentes em inglês, cientes de seus direitos e, muitas vezes, formados em universidades, começaram a produzir trabalhos e discursos crí cos com tom polí co, influenciados pela discussão pós-colonial. Foi também no final do século XX que a internacionalização se consolidou. Não seria possível recuperar todos os meandros e nuances dessa história aqui. O que importa é deixar claro que se trata de um processo que levou algumas décadas, que só foi possível devido ao engajamento de uma série de pessoas e ins tuições e em razão da criação de polí cas públicas voltadas ao fomento da produção ar s ca indígena

................................................ Lorna Naparrula Fencer, 1920 – 2006 Lajamanu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri Batata Doce Australiana, 1999 Bush Potato Tinta acrílica sobre tela


The 1980s were years marked by the opening of wings for the exhibi on of Indigenous art in the Australian public museums. Gradually they began to have some rooms for the permanent exhibi on or temporary shows of Indigenous art and to set up departments and have curators specifically dedicated to this type of produc on. The incorpora on of Aboriginal pain ng in commercial galleries in the large Australian ci es was another watershed of that decade. In the 1990s and 2000s, ar sts and curators of Indigenous origin - raised in the ci es and fluent in English, aware of their rights and o en with a university degree - began to develop cri cal works and discourses with a poli cal tone under the influence of the postcolonial discussion. It was also in the late 20th century that the interna onaliza on process was consolidated. It is just not possible to retrieve all the intricacies and nuances of this part of history here. What ma ers is to make it clear that this is a process that took several decades, that was only feasible due to the engagement of a number of people and ins tu ons and the development of public policies aimed at fostering the produc on of Indigenous art.

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ALGUNS DESTAQUES DA EXPOSIÇÃO

Some highlights of the exhibition

Na impossibilidade de comentar todos os trabalhos presentes, selecionei algumas peças que permitem descor nar cenários e sen dos bem diferentes.

In view of the impossibility to comment all the works showcased, I have selected some of them that give us the chance to unveil very different landscapes and meanings.

Em primeiro lugar, não poderia deixar de mencionar uma bark pain ng, ou pintura sobre entrecasca de eucalipto, comum em Arnhem Land, no norte tropical. Feita com pigmentos naturais, nos tons ocre, branco, vermelho e preto, é conhecida desde o início do século XX. Atribui-se seu surgimento ao antropólogo Baldwin Spencer, que esteve no norte da Austrália, entre 1911 a 1921, em missões cien ficas e como representante do governo. Spencer viu que o povo Yolngu decorava tábuas que serviam como paredes nas cabanas e pediu para que produzissem mais peças daquele po, porém com novas imagens, inclusive algumas tradicionalmente executadas sobre rochas e sobre o corpo (CARUANA, 2003). Spencer levou consigo centenas de pranchas, que hoje pertencem ao Museu de Melbourne.

First of all, I could not go without men oning bark pain ng, or a pain ng on bark part of an eucalyptus tree, common in Arnhem Land, in the tropical North. Painted with natural pigments using tones of ochre, white, red and black color, it has been known since the early 20th century. Its emergence is a ributed to anthropologist Baldwin Spencer, who was in Northern Australia between 1911 and 1921 in scien fic missions and as representa ve of the Government. Spencer saw that the Yolngu people decorated boards that served as walls in the shelters and asked them to produce some more of that type, but with new mo fs instead, and to add a couple of those tradi onally painted on rocks and the body (CARUANA, 2003). Spencer brought hundreds of pain ngs with him and today they belong to the Melbourne Museum.

Executado com pincel de cabelos humanos, esse po de pintura ainda é bastante frequente, sobretudo em Arnhem Land, no norte tropical da Austrália, e carrega uma complexa simbologia, associada aos clãs e aos ancestrais (MORPHY, 2008). Em geral, as bark pain ngs são figura vas, verdadeiras narra vas visuais que contam passagens mí cas. A textura de fundo confere movimento à imagem, como se nota na pintura de Larrtjanga Ganambarr escolhida para a exposição. Existe certa con nuidade entre pinturas rupestres an gas e imagens executadas sobre entrecasca de árvore até hoje, como, por exemplo, na representação dos ossos e vísceras dentro dos corpos, como se fossem transparentes (CLARK apud ANDERSON, 2009). Esse es lo, chamado de “raio X”, pode ser observado na prancha pintada por Thompson Yulidjirri.

Painted with human hair brushes, this type of pain ng is s ll fairly common, especially in Arnhem Land, in the tropical North of Australia, and carries a complex symbolism associated with the clans and the ancestors (MORPHY, 2008). In general, bark pain ngs are figura ve, real visual narra ves that tell mythical passages. The texture in the background conveys movement to the image, as can be seen on Larrtjanga Ganambarr's pain ng selected for this exhibi on. To some extent, this is a con nuing art form un l today when it comes to ancient rock pain ngs and images painted on the tree bark as seen, for example, in the representa on of the bones and viscera within the bodies as if they were transparent (CLARK apud ANDERSON, 2009). This style, called “X ray,” can be appreciated on the work painted by Thompson Yulidjirri.


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.......................................... Thompson Yulidjirri, 1930 Oenpelli, Território so Norte, região ocidental da Terra de Arnhem, Kunwinjku Canguru, 1985 Kangaroo Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto



Em segundo lugar, é incontornável o nome de Rover Thomas. Nascido na região de Kimberley, Thomas foi responsável pela inserção de tábuas pintadas em cerimônias do povo Gija. Ele teve sonhos com uma parente falecida, em 1974, nos quais ela lhe ensinou um novo complexo de danças, cantos e histórias sagrados. No novo ritual, os dançarinos deveriam carregar sobre os ombros pranchas de madeira pintadas, depois descartadas. Rover Thomas passou quatro anos viajando por Kimberley para mostrar a todos o novo ritual. No início, quem fazia tais tábuas pintadas era a a de Rover Thomas, Queenie McKenzie. Aos poucos, o próprio Rover Thomas passou a pintar as tábuas cerimoniais. Nos anos 1980, tendo assis do à cerimônia com as pranchas, ba zada de Kurrir Kurrir, uma consultora de artes do governo, residente em Perth, encomendou pinturas aos os de Rover Thomas, e depois a ele próprio, dando origem a uma nova produção de pinturas para venda no povoado de Warmun, inspiradas nos objetos rituais. Pigmentos naturais con nuaram a ser u lizados, mas o suporte mudou para a tela de tecido (CARUANA, 2003). Os ar stas de Warmun optam por contornos feitos com pontos brancos ou pretos, formas planas, uso de tons terra ob dos de materiais orgânicos e a simplificação geométrica das formas. Rover Thomas foi convidado para a Bienal de Veneza, em 1990.

Secondly, it is inevitable to men on Rover Thomas. Born in the region of Kimberley, Thomas was responsible for the inclusion of painted boards in the ceremonies of the Gija people. He had dreams with a dead rela ve back in 1974, in which she taught him a new series of dances, songs and sacred tales. In the new ritual, the dancers would have to carry painted wooden boards on their shoulders and later discard them. Rover Thomas spent four years traveling around Kimberley to show everyone the new ritual. In the beginning, Thomas's aunt, Queenie McKenzie, was the one who painted the boards. Li le by li le, Thomas himself began pain ng the ceremonial boards. In the 1980s, a er a ending the ceremony with the boards, called Kurrir Kurrir, a Perth-based Government arts consultant commissioned some pain ngs to the uncles of Rover Thomas and later to Thomas himself. This resulted in a new source of pain ngs for sale in Warmun community inspired by ritual objects. Natural pigments con nued to be used, but the medium shi ed to the canvas (CARUANA, 2003). The ar sts from Warmun use planes defined by white or black dots, earth pigments obtained from organic materials and simplified geometric designs. Rover Thomas was invited to the Venice Biennale in 1990.

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Rover Thomas, 1926 – 1998 Turkey Creek, Austrália Ocidental, Kimberley Oriental, Kukatja Punmu - O Universo, 1995 Punmu - The Universe Silk-screen sobre madeira

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Gostaria de destacar igualmente o trabalho de Kathleen Petyarre, sobrinha de Emily Kame. Kathleen afirmou, em entrevistas, que suas pinturas são mapas mentais das regiões onde caminhou com seus pais, na infância. Suas três irmãs também são pintoras, mas Kathleen é a recordista em convites para exposições e em valores a ngidos, que chegam a U$ 80.000,00. Para além da originalidade de sua poé ca, convém ressaltar uma controvérsia que rondou a ar sta. Kathleen Petyarre ganhou o Na onal Aboriginal & Torres Strait Islander Art Award, em 1996. Seu ex-marido, pintor e marchand, Ray Beamish, alegou ter par cipado do processo de confecção da tela e sugeriu que ambos, portanto, mereciam o prêmio. Especialistas foram convocados para uma análise do quadro e concluíram que o es lo era coerente com o conjunto de sua obra e que, acima de tudo, a história mí ca con da na pintura pertencia a sua família. Kathleen e seus irmãos são os guardiões do sonhar (dreaming) do lagarto da montanha, narra va referenciada em todas as suas pinturas. Seu ancestral principal, Arnkerrth, é um lagarto que vive no deserto e muda de cores como um camaleão. Manteve-se, portanto, apenas o nome de Kathleen no prêmio e na atribuição de autoria do trabalho premiado.

Likewise, I would like to single out the work of Kathleen Petyarre, niece of Emily Kame. Kathleen stated in interviews that her pain ngs are mental maps of the regions where she had been with her parents in her childhood. Her three sisters are painters as well, but Kathleen holds a record in the number of invita ons to exhibi ons and prices achieved for her works, which go as high as US$ 80,000.00. In addi on to the originality of her poe cs, one should men on a controversy surrounding the ar st. Kathleen Petyarre won the Na onal Aboriginal & Torres Strait Islander Art Award in 1996. Her exhusband Ray Beamish, a painter and art dealer, claimed to have par cipated in the making process of the winning canvas and suggested that both, therefore, deserved the award. Experts were called to examine the pain ng and eventually concluded that the style was consistent with Kathleen's oeuvre and that, above all, the dream me story depicted in the pain ng belonged to her family. Kathleen and her brothers are the guardians of the Mountain Devil Lizard dreaming, the narra ve referenced in all her pain ngs. Her main ancestor, Arnkerrth, is a lizard that lives in the desert and changes colors like a chameleon. As a result, Kathleen's name is the only one appearing in the award and authorship of the winning work is a ributed to her alone.

................................... Kathleen Kweyetwemp Petyarre, 1934 Utopia, Território do Norte, Deserto Oriental, Alyawerre O Sonhar do Lagarto Espinhoso, 2009 Mountain Devil Lizard Dreaming Tinta acrílica sobre linho belga


Essa controvérsia lança luz sobre um aspecto problemá co, que não será abordado nesse texto, mas merece uma rápida menção: a apropriação indevida do repertório visual indígena. Infelizmente, não são poucas as situações em que isso ocorre, seja na produção de ar gos turís cos supostamente “autên cos”, seja na falsificação de telas ou na produção de tapetes com estampas que imitam desenhos aborígenes (JANKE, 2011).

This controversy turns the spotlight on a problema c aspect that will not be addressed in this ar cle but deserves to be briefly men oned: the improper appropria on of the Indigenous visual repertoire. Unfortunately, such situa ons are not hard to happen and they may include either the produc on of supposedly "authen c" tourism souvenirs or fake canvases or carpets mimicking mo fs of Aboriginal designs (JANKE, 2011).

Por fim, não poderia deixar de mencionar os ar stas “urbanos” representados na exposição. Richard Bell, de origem Kamilaroi, foi enviado aos 6 anos a um campo para crianças mes ças, onde recebeu rígida educação religiosa, longe dos pais. Jovem adulto, tornou-se um a vista em prol dos direitos das populações indígenas. Só começou a trabalhar com arte aos 36 anos, como forma de levar suas mensagens polí cas ao maior número possível de pessoas. Comba vo e provocador, domina com maestria a língua inglesa. Em 2003, Bell foi o vencedor de uma importante premiação anual para ar stas indígenas, patrocinada pela maior empresa de telecomunicações da Austrália: a Telstra. O trabalho se in tulava “Aboriginal art: it´s a white thing” (A pintura aborígene é uma coisa de branco). No texto-manifesto que o acompanhava, Richard Bell denunciava que antropólogos e brancos especialistas em arte construíram e dominam o campo da arte aborígine. Suas crí cas mais contundentes se dirigiam à folclorização de um aborígine necessariamente negro, “puro” e exó co, quase um bom selvagem.

Finally, I could not fail to men on the "urban" ar sts represented in the exhibi on. Richard Bell, of Kamilaroi ancestry, was sent to a field for half-cast children when he was six and there he was raised in a rigid religious se ng, away from his parents. As a young adult, he became an ac vist in favor of the rights of the Indigenous peoples. He only took art up at the age of 36 as a way to convey his poli cal messages to as many people as possible. Comba ve and provoking, he has a very good command of the English language. In 2003, Bell won an important annual award for Indigenous ar sts, sponsored by the largest telecommunica ons company of Australia: Telstra. The work was en tled “Aboriginal art: it´s a white thing.” In the text-manifesto displayed along with it, Richard Bell denounced the fact that anthropologists and white experts in art built and ruled the field of Aboriginal art. His most scathing cri cism was targeted at the folkloric treatment given to a necessarily-black, "pure" and exo c Aboriginal that would be a sort of noble savage.

O trabalho premiado de Bell gerou polêmica, porque o ar sta aceitou as honrarias e o dinheiro, apesar de cri car a ins tucionalização e a mercan lização da arte aborígene. Se por um lado faz sen do sua afirmação de que o sistema foi criado em grande parte por brancos e que seus consumidores são predominantemente brancos, por outro lado é possível notar que os ar stas aborígines têm conquistado cada vez mais formas de agência e vêm procurando se beneficiar dele. Além disso, sua a tude é excessivamente ofensiva, quando, por exemplo, Bell veste publicamente uma camiseta com os dizeres “garotas brancas não sabem trepar”

Bell's award-winning work aroused controversy because the ar st accepted the honors and the money, despite cri cizing the ins tu onaliza on and the commodifica on of the Aboriginal art. If on the one hand his statement that the system was greatly created by whites and their consumers are predominantly white is sensible, on the other hand it is no ceable that the Aboriginal ar sts have increasingly developed their agency and have sought to benefit from the arts system. Add to this Bell's overly offensive a tude when, for instance, he publicly wore a t-shirt emblazoned with the slogan “white girls can't hump”.

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Lin Onus, por sua vez, era filho de mãe escocesa e pai da etnia Yorta Yorta. Tendo falecido precocemente, deixou trabalhos com teor histórico, caracterizados pela figuração realista. Ficou famoso por uma série de pinturas retratando a vida de Musqito, chefe indígena que resis u à colonização inglesa e que foi enforcado em Sydney, em 1824. Na tela que integra a exposição que veio ao Brasil, Lin Onus se apropriou de imagens de diferentes origens. O cachorro lembra a realidade das comunidades indígenas remotas, na Austrália, em que vivem dezenas desses animais, herança do colonizador branco, e onde se encontram também cães selvagens conhecidos como dingos. O cão está coberto com as cores que simbolizam os povos aborígenes, na Austrália: preto, branco, ocre e vermelho. Ele parece surfar, porém, ao invés de uma prancha, tem sob suas patas uma arraia gigante, decorada com uma textura caracterís ca da bark pain ng tradicional. A arraia é um animal sagrado para vários povos, representa a sabedoria profunda, por baixo da super cie, já que se esconde sob o solo do oceano. O mar agitado, por sua vez, tem inspiração na xilogravura “A Onda”, de 1829, de Katsushika Hokusai. No original japonês, o mar é ameaçador com suas ondas gigantes, e os barcos, minúsculos, parecem prestes a ser tragados por ondas gigantes em forma de garras. Na recriação de Lin Onus, o cão surfa sobre a arraia sereno e equilibrado, apesar do perigo iminente. Talvez a tela, em seu conjunto, remeta à capacidade dos povos indígenas se reinventarem constantemente, se adaptarem às novas realidades e assimilarem influências de diferentes origens, sem necessariamente perder seu prumo.

Lin Onus, in turn, was the son of Sco sh mother and father of the Yorta Yorta ethnic group. Having died prematurely, he le works with historic content characterized by realis c figura on. He became famous for a series of pain ngs depic ng the life of Musquito, an Aboriginal resistance leader who fought against the Bri sh se lers and was hanged in Sydney in 1824. In the pain ng that is part of this exhibi on in Brazil, Lin Onus appropriated images of different origins. The dog evokes the reality of the remote Indigenous communi es in Australia, where dozens of these animals live, a legacy from the white se ler, and where wild dogs known as dingos are found. The dog is covered with the colors that symbolize the Australian Aboriginal peoples: black, white, ochre and red. It looks like surfing; however, instead of a board, it is riding on the back of a giant s ngray painted with the typical texture of the tradi onal bark pain ng. The s ngray is a sacred animal to various peoples for it represents deep wisdom, beneath the surface, as it hides itself under the ocean floor. The stormy sea, in turn, takes inspira on from the woodblock print "The Wave", 1829, by Katsushika Hokusai. In the Japanese original, the sea is threatening with its giant waves and the ny boats seem about to be swallowed by giant waves in the shape of claws. In Lin Onus's re-crea on, the dog surfs on an undisturbed and poised s ngray, despite the imminent danger. Perhaps the pain ng, as a whole, points towards the capability of the Indigenous peoples to constantly reinvent themselves, to adapt to the new reali es and to assimilate influences of different origins without necessarily losing track of their background.

.............................................. Lin Onus, 1948 - 1996 Cumeragunja, Vitória, Yorta Yorta Michael e Eu em Direção ao Bar, 2000 Michael and I are just slipping down to the pub for a minute Tinta pigmentada sobre fibra moldada Edição: 45/48


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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Final Comments

A arte contemporânea dos povos indígenas da Austrália ancora-se em prá cas e valores tradicionais, e, ao mesmo tempo, está inserida nas ins tuições e no mercado de arte. É inegável que existem efeitos perversos, como a exploração de ar stas indígenas por marchands brancos e a u lização do repertório indígena sem autorização. Além disso, a exposição e a comercialização de arte não resolveram todos os problemas dos grupos indígenas na Austrália.

The contemporary art of the Australian Indigenous peoples is anchored in tradi onal prac ces and values and, at the same me, is now an integral part of the art ins tu ons and market. Undeniably, there are perverse effects, such as the exploita on of the Indigenous ar sts by white dealers and the unauthorized use of the Indigenous repertoire. Addi onally, the exhibi on and marke ng of their art have not resolved all the problems of the Australia Indigenous groups.

Não obstante, a produção ar s ca é uma forma importante de geração de renda e reinvenção iden tária para as comunidades indígenas. Ajuda a conferir visibilidade a populações historicamente oprimidas e desvalorizadas. Certamente, não existem receitas a serem seguidas. Mesmo assim, conhecer as formas pelas quais se lida com a produção e a circulação das artes indígenas em outros países é uma forma de abrir novas perspec vas. Eis a importância dessa exposição e mesmo desse catálogo para o público brasileiro.

Nonetheless, art making is an important way to produce income and re-invent the iden ty of the Indigenous communi es. It helps give visibility to peoples historically oppressed and beli led. Certainly, there is no magic formula to be followed. Even so, learning the ways to handle the produc on and circula on of the Indigenous arts in other countries is the means for them to have new prospects. This is why this exhibi on is important, including this catalog, to the Brazilian audience.


Bibliografia:

Bibliography:

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A HISTÓRIA E A EVOLUÇÃO DO MOVIMENTO DE ARTE MODERNA ABORÍGENE The History And Development Of The Modern Aboriginal Art Movement

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Adrian Newstead OAM 1

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1 - Medalha da Ordem da Austrália. 1 - Awarded the Medal of the Order of Australia

Jimmy Pike, 1940 – 2002 Fitzroy Crossing, Austrália Ocidental, Grande Deserto Arenoso, Walmajarri Yakarn, 1990 Tinta acrílica sobre tela Coleção par cular, NSW


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epois de mais de 60.000 anos de ocupação con nua por seus habitantes aborígenes, a Austrália foi "descoberta" pelo Capitão James Cook em 1770. Dezoito anos mais tarde, o governo britânico enviou o Capitão Arthur Phillip (que havia passado sete anos na Marinha portuguesa) para tomar posse do con nente em nome da coroa inglesa. Ele fez uma parada no Rio de Janeiro vindo da Inglaterra para abastecimento e fazer contato com o conselho do Governador de Portugal, o Vice-Rei Luís de Vasconcelos, o sucessor de seu bom amigo e admirador, o Marquês do Lavradio.

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Ao chegar à Austrália, fundou um assentamento na enseada de Sidney, a par r de onde a coroa iria governar um país duas vezes o tamanho da Índia e apenas um pouco menor do que o Brasil. Os britânicos consideraram o país uma "terra nullius", uma terra vazia. Ao longo do século seguinte, os colonos se espalharam por todo o país desapropriando os primeiros povos de suas terras. Durante o século seguinte, os povos aborígenes foram "protegidos" por uma rigorosa rede de leis especiais que controlava seus movimentos, o casamento, o comportamento sexual, o des no de seus filhos, o emprego, suas economias e o consumo de álcool. Além da faixa costeira, a resistência aborígene à indústria pecuária em expansão nha sido em grande parte dominada na década de 1930. Mais da metade dos 500 ou mais clãs que exis am na época da chegada dos europeus viu-se reduzida devido à doença, à violência e sua remoção das terras tradicionais. Aqueles que sobreviveram a essa inves da violenta foram segregados em estações do governo, missões cristãs, reservas ou campos de concentração. A única atrocidade à qual os aborígenes australianos não foram subme dos foi a escravidão.

Following more than 60,000 years of con nuous occupa on by its Aboriginal inhabitants, Australia was 'discovered' by Captain James Cook in 1770. Eighteen years later the Bri sh government sent Captain Arthur Phillip (who had spent 7 years in the Portuguese navy) to take possession of the con nent on behalf of the English crown. He stopped in Rio de Janeiro en route from England, to provision and seek the council of the Portuguese Governor, Viceroy Luís de Vasconcelos, the successor of his good friend and admirer the Marquês do Lavradio. On arrival in Australia he established a se lement at Sydney Cove from which the crown would govern a country twice the size of India and only slightly smaller than Brazil. The Bri sh considered the country a 'terra nullius', an empty land. Throughout the following century, se lers spread across the country dispossessing the first peoples of their land. During the next century, Aboriginal people were 'protected' by an ever ghtening net of special laws that controlled their movement, marriage, sexual behaviour, the fate of their children, employment, their savings, and the consump on of alcohol. Beyond the coastal fringe, Aboriginal resistance to the expanding pastoral industry had been largely subdued by the 1930s, and more than half of the 500 or more clans that existed at the me of European arrival were no longer conspicuous due to disease, violence, and their removal from tradi onal lands. Those who had survived this onslaught were segregated on Government sta ons, Chris an missions, reserves, or deten on camps. The only outrage Aboriginal Australians were not subjected to, was slavery.


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............................ Peter Marralwanga, 1916 - 1987 Maningrida, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Kunwinjku Dja (O Sonhar do Sapo), 1975 Dja (Frog Dreaming) Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto


No início da década de 1930, a antropologia foi inserida como um campo de estudo nas universidades australianas. A par r desse momento, as autoridades missionárias atuavam após consulta com os antropólogos visitantes e colecionadores no que se referia à encomenda de obras de arte e artesanato. Os ar stas eram pagos por suas pinturas e esculturas com tabaco e outros bens de troca. Os pintores de peças em entrecasca de árvore aprenderam a antever as exigências dos colecionadores par culares. As primeiras bark pain ngs que nham sobrevivido, fossem colecionadas por antropólogos ou vendidas ao mercado em franco crescimento, eram, na verdade, produzidas como objetos para estudo ou souvenir, e não para alguma finalidade prá ca ou ceremonial. Não obstante, o acervo de bark pain ngs criado até a década de 1950 não chegou a mais de 500 peças.

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Em 1948, Charles Moun ord, (um antropólogo "amador" com o patrocínio do governo) liderou a Expedição Cien fica Americana Australiana à Terra de Arnhem, no extremo norte da Austrália. Ao mesmo tempo em que o primeiro macaco era lançado ao espaço, os cien stas começavam a estudar os descendentes da mais an ga cultura con nua na história do planeta Terra pela primeira vez. Reuniram milhares de implementos e armas aborígenes, centenas das fotografias e desenhos de pinturas rupestres, diversas centenas de bark pain ngs e trabalhos afins. O cinema manteve viva a história deste empreendimento "cientlífico" durante os anos 50 à medida que Moun ord e outros documentavam a arte da Terra de Arnhem, das Ilhas Tiwi e do deserto australiano, passando grande parte do material às galerias e aos museus do Estado e realizando palestras no exterior. A palestra pública de Moun ord no Ins tuto Smithsoniano, nos Estados Unidos, atraiu uma mul dão de mais de 4.000 pessoas para conhecer e ver filmes desses povos ainda "primi vos". A primeira exposição de bark pain ngs aborígenes foi realizada em Sidney no começo da década de 1960 e gerou ondas de alvoroço em todo o mundo da arte. Finalmente, as pinturas estavam acompanhadas de uma explicação detalhada de seu contexto social e conteúdo.

At the beginning of the 1930s, anthropology was established as a field of study at Australian Universi es and from this me onward mission authori es acted in consulta on with visi ng anthropologists and collectors when commissioning art and cra s. Ar sts were paid for their pain ngs and carvings with tobacco and other trade goods. Bark painters learnt to an cipate the requirements of par cular collectors. The early bark pain ngs that have survived, whether collected by anthropologists or sold to a steadily growing market, were actually produced as items for study or 'souvenirs', rather than for any prac cal or ceremonial purpose. Nevertheless, no more than 500 bark pain ngs had been collected prior to the 1950s. In 1948 Charles Moun ord, (an 'amateur' anthropologist with Government patronage) led the Australian American Scien fic Expedi on to Arnhem Land in Australia's far north. At the same me as the first monkey was launched into space, scien sts began studying the descendants of the longest con nuous culture in the history of the planet earth for first me. They collected thousands of Aboriginal implements and weapons, hundreds of photographs and drawings of cave pain ngs, several hundred bark pain ngs, and related cra s. Cinema kept the story of this 'scientlific' endeavor alive throughout the 1950s as Moun ord and others documented art in Arnhem Land, the Tiwi Islands and the central desert, gi ing much of the material to State Galleries and Museums and lecturing abroad. Moun ord's public lecture at the Smithsonian Ins tu on in America drew a crowd of more than 4000 people to learn about and watch footage of these s ll 'primi ve' peoples. The first exhibi on of Aboriginal bark pain ngs was held in Sydney in the early 1960s and produced ripples of excitement throughout the art world. At last the pain ngs were accompanied by detailed explana on of their content and social context.


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George Milpurrurru, 1934 – 1998 Ramingining, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Ganalbiŋu À Procura dos Ovos de Arseranas, 1999 Hun ng for Magpie Geese Eggs Litogravura sobre papel Edição: 9/92


Até a década de 1960, a "Polí ca da Austrália Branca" manteve as pessoas de cor (incluindo os asiá cos) fora do país. Os italianos e os gregos foram os primeiros da nova onda de imigrantes a ganhar entrada na Austrália em grande número. Aqueles "tocados com a escova de alcatrão" * eram rejeitados sociais. No início da década de 1970, vietnamitas, cambojanos e tailandeses passaram a integrar essa leva e, na década seguinte, chegaram os libaneses e outros migrantes do Oriente Médio. A Austrália moderna era agora vista do exterior como uma terra rica em recursos naturais e com um aspecto sico impressionante, com uma vibrante mistura de culturas étnicas. No entanto, na sua costa, seus povos na vos viviam em condições de Terceiro Mundo. Apesar de suas vastas riquezas sicas e culturais, a sociedade australiana da década de 1970 passava por um afastamento cultural profundo em relação a tudo que fosse europeu e por uma crise iden tária cultural dentro do país.

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[* mesmo tendo uma pequena quan dade de sangue aborígene – um termo adotado do uso de alcatrão para conter o fluxo de sangue de um cordeiro depois da tosa] O surgimento do movimento de arte aborígene moderna data desse período. Os primeiros sinais estavam entre os velhos homens da tribo no Deserto Ocidental e os jovens negros cultos no ambiente urbano. Juntos, embora distantes, escreveram o capítulo mais emocionante e transcendente da história da arte contemporânea australiana. No espaço de apenas 40 anos, os ar stas indígenas viriam a transformar a percepção de sua cultura de algo de interesse estritamente etnográfico em um dos grandes movimentos ar s cos de todos os tempos. A suposição de que suas culturas individuais es vessem em ruínas, com os úl mos remanescentes quase totalmente integrados à sociedade branca dominante, não encontrou respaldo diante do crescente status

Un l the 1960s the 'White Australia Policy' kept people with coloured skin (including Asians) out of the country. Italians and Greeks were the first of the new wave of immigrants to gain entry into Australia in large numbers. Those 'touched with the tar brush' * were social outcasts. By the beginning of the 1970s, Vietnamese, Cambodians and Thais had folded into the mix and over the next decade Lebanese and other Middle Eastern migrants arrived. Modern Australia was now viewed from abroad as being richly endowed with natural resources and physically awe inspiring, with a vibrant mix of ethnic cultures. Yet, on its shores its original peoples lived under Third World condi ons. In spite of its vast physical and cultural riches, Australian society of the 1970s had a deep cultural cringe toward all things European, and a crisis of cultural iden ty at home. [* having even a small amount of Aboriginal blood – a term adopted from the use of tar to stem the flow of a sheep's blood a er shearing] The emergence of the modern Aboriginal art movement dates from this me. It earliest rumblings were amongst old tribal men in the Western Desert and young educated blacks in the urban environment. Together, yet apart, they gave birth to the most exci ng and transcendent chapter in the history of contemporary Australian art. Within the space of just 40 years Indigenous ar sts were to transform the percep on of their culture from something of strictly ethnographic interest, into one of the great art movements of all me. The assump on that their individual cultures were in ruins, with the last remnants almost wholly integrated into the dominant white society, was blown apart by the rising status of Aboriginal ar sts.

............................................... Declan Apua mi, 1930 – 1985 Wuramiyanga, Território do Norte, Ilha Bathurst, Tiwi Pamajini (Braçadeiras para Cerimônias), c.1984 Pamajini (Ceremonial Armbands) Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto


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Essa surpreendente transformação de objetos etnográficos e produto turís co em arte contemporânea viu os ar stas indígenas u lizando uma variedade de suportes. A par r de materiais rela vamente baratos, frequentemente ob dos em seu entorno imediato - incluindo os pigmentos terrosos e restos de material de construção descartado até ntas de polímero de alta qualidade, linho belga importado e os mais finos papéis de arte -, a produção cria va de áreas urbanas e remotas resultou em obras de arte contemporâneas que abriram seu caminho para acervos de arte significa vos em todo o mundo.

This astounding transforma on from ethnographic objects and tourist product to contemporary art saw Indigenous ar sts u lize a range of mediums. From rela vely inexpensive materials, o en gathered in their immediate surroundings, including earth pigments and scraps of discarded building material, to high quality polymer paints, imported Belgian linen, and the finest art papers - the crea ve output from remote and urban areas resulted in contemporary artworks that found their way into significant art collec ons all over the world.

Contudo, se a valorização deste legado ar s co único vesse sido deixado por conta somente dos australianos, todo este empreendimento poderia muito bem ter fracassado. Sem o fascínio e o apoio dos europeus, principalmente dos colecionadores franceses, alemães e suíços junto com seus homólogos norte-americanos, o interesse pela arte aborígene teria definhado desde o princípio.

Yet, had apprecia on of this unique ar s c legacy been le to Australians alone, this en re venture may well have failed. Without the fascina on and support of Europeans, most notably French, German and Swiss collectors along with their North American counterparts, interest in Aboriginal art would have languished from the outset.

No começo dos anos 80, o rendimento anual total de todas as vendas de artesanato e arte aborígenes a ngiram US$ 2,5 milhões. No fim dessa mesma década, as vendas anuais de arte aborígene alcançaram o patamar de US$ 20 milhões, dos quais mais de 80% representava obras adquiridas por estrangeiros. O interesse na arte aborígene alcançou seu nível máximo.

At the beginning of the 1980s, the total annual revenue from the sale of all Aboriginal art and cra s sales had reached $2.5 million. By the end of the 1980s annual sales in Aboriginal art reached $20 million of which more than 80 percent was being purchased by people from overseas. Interest in Aboriginal art reached fever pitch.

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O NASCIMENTO DO MERCADO

The Birth of the Market

A difusão do movimento de pintura aborígene em todo o con nente deu-se como um fogo que lentamente foi abrindo caminho por uma trilha estreita no meio da pica gramínea Spinifex. Cada lugar incendiado por esse fogo via sua temperatura subir em um momento e arrefecer no seguinte, deixando um rastro negro carbonizado e de restolho com fumaça. Alguns tocos de árvore estranhos con nuaram com labaredas muito tempo depois que o fogo nha se alastrado. Mais tarde, surgiram os brotos novos em terreno fér l. A arte dos pintores mais importantes do movimento de arte aborígene foi assim. O ardor do fogo que ainda queimava muito depois do interesse nos ar stas de menos sucesso e no es lo regional que defendiam nha abrandado.

The spread of the Aboriginal pain ng movement across the con nent moved like a slowly moving fire along a thin line through the Spinifex grass. Each place it touched was hot one moment and spent the next, leaving in its wake black char and smoking stubble. A few odd tree stumps con nued to blaze long a er the fire had moved on and new shoots followed on fer le ground. The art of the most important painters of the Aboriginal art movement was like that. Blazing long a er interest in the less successful ar sts and the regional style they championed had waned.

Os pintores de bark pain ng da Terra de Arnhem foram os primeiros a conquistar a atenção do público. Até 1955, as obras de bark pain ng da Terra de Arnhem estavam sendo vendidas em lojas de arte nos Estados Unidos e em Londres pela primeira vez. Pouco tempo depois, a UNESCO desenvolveu um programa que patrocinou exposições de bark pain ngs aborígenes na Europa e nos Estados Unidos, assim como o acervo dessas obras para museus internacionais. À medida que aumentou a demanda por bark pain ngs e artefatos de qualidade ao longo da década de 1960, pequenas empresas de artesanato pipocaram por todo o 2 país. Em 1970, um jovem professor, Geoffrey Bardon, começou a trabalhar no assentamento remoto de Papunya, no coração do Deserto Ocidental. Quando procurou aconselhamento com os manobreiros, cozinheiros e vereadores aborígenes da cidade sobre um mural que as crianças queriam pintar na parede da escola, ele possivelmente não poderia ter imaginado o efeito es mulante que esse ocorrido teria sobre eles. Nem poderia ter previsto que esse mural provocaria uma revolução na pintura que teria seus efeitos sen dos em todo o con nente nas décadas seguintes.

Arnhem Land bark painters were the first to gain the public's a en on. By 1955 Arnhem Land bark pain ngs were being sold in art shops in the United States of America and London for the first me. Shortly therea er, UNESCO developed a program that sponsored exhibi ons of Aboriginal bark pain ngs in Europe and America, as well as the collec on of barks for interna onal museums. As the demand for bark pain ngs and quality artefacts grew throughout the 1960s, small cra enterprises sprang up around the country. In 1970, a young teacher, 2 Geoffrey Bardon, began working at the remote se lement of Papunya, deep in the Western Desert. When he sought the advice of the Aboriginal yardsmen, cooks, and town councilors about a mural the children wanted to paint on the school wall, he could not possibly have imagined the galvanising effect this event would have on them. Nor could he have an cipated that this mural would spark a pain ng revolu on that would resonate across the con nent for decades to come.

2 - Bardon, Geoffrey, Papunya Tula, Art of the Western Desert, Penguin books Australia, 1991 p 21. 2 - Bardon, Geoffrey, Papunya Tula, Art of the Western Desert, Penguin books Australia, 1991 p 21.


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................................ Cornelia Tipuamantumirri, 1940 Pulurumpi, Território do Norte, Ilha Melville, Tiwi Jilamara Design, 2015 Pigmentos terrosos naturais sobre linho belga


ARTE ABORÍGENE – SÍMBOLOS E ÍCONES ABORIGINAL ART SYMBOL AND ICONS

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1 - HOMEM - MAN 2 - MULHER - WOMAN 3 - CHUVA - RAIN 4 - LANÇA DE CAÇA - SPEAR 5 - ACAMPAMENTO - CAMPSITE 6 - LUGAR DE DESCANSO - RESTING PLACE 7 - DOIS HOMENS CONVERSANDO - TWO MAN SITTING 8 - POÇA DE ÁGUA - WATER HOLE 9 - LUGAR DE ENCONTRO - MEETING PLACE 10 - FUMAÇA, ÁGUA CORRENTE, RELÂMPAGO, INCÊNDIO FLORESTAL SMOKE, WATER FLOW, LIGHTINING OR BUSH FIRE 11 - ESTRELA - STAR 12 - PESSOAS REUNIDAS - PEOPLE SITTING 13 - POÇA DE ÁGUA LIGADA A ÁGUA CORRENTE WATER HOLES CONNECTED BY RUNNING WATER 14 - ARCO-ÍRIS, DUNAS OU NUVEM RAINBOW, SANDHILL OR CLOUD

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15 - ESCUDO - SHEILD 16 - GAMBÁ - POSSUM 17 - FORMIGUEIRO - HONEY AND SITE 18 - PEGADAS DE CANGURU MOVING KANGAROO TRACKS 19 - ENCONTRO DE QUATRO MULHERS FOUR WOMEN SITTING 20 - CAVANDO PARA ENCONTRAR CLAPSTICK (INSTRUMENTO MUSICAL ABORÍGENE QUE ACOMPANHA O DIDGERIDOO) DIGGING FOR CLAPPING STICKS 21 - PEGADAS NA AREIA OU TRILHAS DE ANIMAL FOOTPRINTS OR ANIMAL TRACKS 22 - LARVA DE MARIPOSA - WITCHETTY GRUB 23 - BUMERANGUE - BOOMERANG 24 - INHAME - YAM PLANT 25 - FORMIGAS - ANTS


Bardon descreveu mais tarde o momento glorioso quando o mural da escola foi concluído e várias pessoas aproximaram-se da parede e a tocaram mesmo antes de a nta secar. Ele escreveu: "os homens aborígenes viamse a sua própria imagem bem diante de seus olhos e em um prédio europeu. Algo verdadeiramente estranho e maravilhoso nha começado.”

Bardon later described the glorious moment when the school mural was completed and a number of men went up to the wall and touched it, even before the paint had dried. He wrote: “ the Aboriginal men saw themselves in their own image before their very eyes, and upon a European building. Truly something strange and marvelous had begun.”

À medida que os ar stas começaram a transpor seus desenhos para qualquer super cie que lhes chegasse às mãos (madeira compensada e folhas de Masonite, caixotes e ocasionalmente até vidraças an gas e chapas de ferro), o desejo de Bardon de libertar as pinturas da influência ocidental levou os ar stas a explorar uma gama de símbolos gráficos apropriados que poderiam ser vendidos para, ou vistos por, pessoas inexperientes. Enquanto uma forma em U poderia representar um homem, talvez um caçador, círculos concêntricos poderiam representar várias caracterís cas, incluindo colinas, locais dos corroborrees (encontros cerimoniais), olhos d'água ou infiltrações. As linhas paralelas inteiras poderiam representar nuvens quando tracejadas e alinhadas em pares, ou trajetos quando posicionadas entre locais específicos. Quando onduladas, viriam a representar água corrente. A presença e os deslocamentos de vários animais seriam demonstrados com figuras semelhantes a suas pegadas. A almofada redonda do pé cercada por pequenas marcas de dedos do pé simbolizava o dingo; um E mais plano, a trilha de um gambá. Um canguru era representado pela impressão dos pés estendidos como duas linhas curtas ou ques alinhados em ambos os lados de uma marca mais comprida que representa sua cauda achatada. Dessa maneira, desenvolveu-se um léxico inteiro de símbolos. Com o tempo, isso permi u aos ar stas contar as longas narra vas através da iconografia. O mais importante foi o fato de ter-lhes permi do registrar o movimento de um local a outro.

As the ar sts began to transpose their designs onto any surface that came to hand (plywood and Masonite boards, packing cases, and even occasionally panes of old glass and sheets of iron), Bardon's desire to free the pain ngs from Western influence, led the ar sts to explore a range of appropriate graphic symbols that could be sold to, or seen by, unini ated people. While a U shape could be a man, perhaps a hunter, concentric roundels could represent a variety of features including hills, corroboree grounds, waterholes or soakages. Whole parallel lines could represent clouds when truncated and aligned in pairs, or become travelling lines when posi oned between specific sites. When wavy, they came to represent running water. The presence and travels of various animals were shown by imita ng their footprints. The round pad of the foot surrounded by smaller toe marks was symbolic of the dingo, a fla er E the track of a possum. A kangaroo was represented by the imprint of the extended feet as two short lines or cks aligned on either side of a longer mark represen ng its fla ened tail. In this way an en re lexicon of symbols was developed. Over me this enabled the ar sts to relate long narra ve stories through iconography. More importantly it enabled them to record the movement from one site to another.

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Em 1980, a pintura sobre tela foi se espalhando como um incêndio ao longo de uma frente, a ngindo os Desertos Australiano, de Tanami e Ocidental. Na década seguinte, a popularidade da pintura do deserto ofuscaria completamente todas as outras manifestações de arte aborígene. Ao mesmo tempo, um número crescente de ar stas foram se aglomerando em torno de uma nova coopera va urbana, Boomalli, no subúrbio da cidade de Chippendale. Alguns dos ar stas do Boomalli nham frequentado a escola de arte, outros eram autodidatas. Fora de Boomalli, havia aqueles que nham aprendido a fazer arte na cadeia, com orientação vocacional, ou em centros comunitários nas cidades do interior. Por toda a Austrália onde o povo aborígene nha sido marginalizado, estavam descobrindo que a arte poderia ser a chave de sua libertação. Lin Onus começou como funileiro e pintor a pistola. Tracey Moffa fez home videos no quintal. Gordon Syron aprendeu a pintar sozinho enquanto cumpria pena de dez anos por um homicídio tribal. Outros pegaram formões e nta, dedicando seus primeiros trabalhos a parentes que nham falecido sob guarda da polícia, ou foram assassinados defendendo suas terras. By 1980, pain ng on canvas was spreading like a fire along a front across the Central, Tanami, and Western Deserts. Over the following decade popularity of desert pain ng would completely eclipse that of all other Aboriginal art. At the same me, a growing number of ar sts were coalescing around a new urban coopera ve, Boomalli, in the inner city suburb of Chippendale. Some of the Boomalli ar sts had been to art school, others were self-taught. Outside Boomalli there were those who had learned art in jail, in voca onal guidance, or community centres in country towns. All over Australia where Aboriginal people had been marginalized they were discovering that art could be the key to their libera on. Lin Onus began as a panel beater and a spray painter. Tracey Moffa made home movies in the backyard. Gordon Syron taught himself to paint while serving a ten-year sentence for a tribal murder. Others picked up chisels and ink, dedica ng their earliest works to rela ves who had died in police custody, or were shot down defending their land.

..................................... Jack Bri en, 1921 – 2002 Frog Hollow, Austrália Ocidental, Kimberley Oriental, Gija O Tempo dos Sonhos de Guarloring, 1995 Guarloring Dream me Pigmentos terrosos naturais sobre tela

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Gordon Syron, 1941 Nabiac, N.S.W., East Coast, Biripi/Worimi

O Casaco Vermelho Narcisista, 2010 The Narcissis c Red Coat

Tinta a óleo sobre tela


As primeiras placas de arte foram criadas no extremo norte da Austrália Ocidental por Paddy Jaminji e Rover Thomas, dois ar stas de East Kimberley, e apareceram para venda no início dos anos 80. Isso aconteceu após o boom da mineração em Kimberley durante a década de 1970 em meio a amargos confrontos entre a polícia e os manifestantes. O represamento do Rio Ord nha deixado grandes faixas de terra aborígene cobertas pelas águas do Lago Argyle, incluindo locais sagrados. Com a indústria pecuária em declínio, os anciãos Gija, influentes de East Kimberley, interpretaram a destruição de Darwin e arredores pelo ciclone Tracey, em 1974, como um aviso da Serpente Arco-Íris contra os modos do Gadiya (homem branco).

The first art boards were created in the far north of Western Australia by East Kimberley ar sts Paddy Jaminji and Rover Thomas appeared for sale during the early 1980s. This followed the genesis of the Kimberley mining boom during the 1970s amidst bi er confronta ons between police and protesters. The damming of the Ord River had le large swathes of Aboriginal land beneath the rising waters of Lake Argyle, sacred sites included. With the pastoral industry in decline, influen al Gija elders of the East Kimberley interpreted the destruc on of Darwin and surrounding countryside by Cyclone Tracey, in 1974, as a warning by the Rainbow Serpent, against the Gadiya (white man's) ways.

As primeiras pinturas carregadas sobre os ombros dos dançarinos nas cerimônias nham o obje vo de resgatar a cultura de Kimberley, nunca para a venda. Entretanto, no começo da década de 1980, essas obras nham se tornado objeto de interesse comercial. Desde o início, essas pinturas intensas e terrenas destacaram-se pelo diferencial aprecia vo das obras pon lhadas em acrílico policromá co mais conhecidas que estavam sendo criadas em Papunya no mesmo período. O isolamento da região de Kimberley incen vou um desenvolvimento à parte. Jaminji, e os outros que o seguiram, preferiu trabalhar apenas com os tradicionais tons de ocre, dispensando a nta acrílica como "lixo" do gadiya.3 Claypans, Canning Stock Route, c.1985, são picas pinturas de Rover Thomas do período. Pintadas em madeira compensada de material de construção descartado, a super cie altamente texturizada delineia os contornos reais do país e transmite a sensação de que os traços dos desdobramentos temporais dos acontecimentos estão incorporados à obra.

The earliest pain ngs carried on the shoulders of the dancers in ceremonies intended to revivify Kimberley culture were never intended for sale. However, by the early 1980s, they had become the subject of commercial interest. From the outset, these warm, earthy pain ngs stood out as appreciably different to the be er-known, mul -hued acrylic do ed works that were being created at Papunya during the same period. The remoteness of the Kimberley region encouraged a separate development, and Jaminji, and the others who followed him, chose to work only in tradi onal ochres, dismissing acrylic paint as gadiya 3“rubbish”. Claypans, Canning Stock Route, c.1985 is typical of Rover Thomas's pain ngs of the period. Painted on discarded builders plywood, the highly textured surface follows the actual contours of the country and imparts the feeling that the traces of events that unfolded through me are embedded in the work.

3 - Homem branco. 3 - White man

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O PROTAGONISMO DA ARTE ABORÍGENE

The Mainstreaming of Aboriginal art

Antes da década de 1980, o viés eurocêntrico do mundo da arte predominantemente branco raramente foi desafiado. Agora, porém, havia tanta a vidade cria va entre os ar stas indígenas que o direcionamento curatorial das principais ins tuições de arte da Austrália passou por uma mudança radical.

Before the 1980s, the Eurocentric bias of the predominantly white art world was rarely challenged. But now, there was so much crea ve ac vity amongst Indigenous ar sts that the curatorial direc on of Australia's major art ins tu ons experienced a radical shi .

Em 1981, as pinturas do Deserto Ocidental foram incluídas no Perspecta, na Art Gallery of New South Wales. Uma grande pintura de areia, criada por um grupo de anciãos de Lajamanu, foi o destaque da Bienal de Sidney em 1983, e para a segunda edição do Australian Perspecta, no AGNSW, foram selecionadas oitenta obras de Ramingining, na região central da Terra de Arnhem. Aqui, na vanguarda do mundo de arte branco, pela primeira vez as obras tradicionais foram instaladas sem a costumeira explicação cultural sobre as paredes brancas nuas da galeria. Posteriormente, essas obras viajaram com uma seleção de pinturas do Deserto Ocidental para par cipar da XVII Bienal de São Paulo, no Brasil.

In 1981, Western Desert pain ngs were included in Perspecta at the Art Gallery of New South Wales. A large sand pain ng, created by a group of by elders from Lajamanu, was a central exhibit at the Sydney Biennale in 1983, and for the second Australian Perspecta at the AGNSW eighty works from Ramingining, in Central Arnhem Land were selected. Here, at the cu ng edge of the white art world, tradi onal works were installed without the usual cultural explana on on the bare white walls of the gallery for the first me. They subsequently travelled with a selec on of Western Desert pain ngs to the XVII Sao Paulo Biennial, in Brazil.

O fluxo irreversível da espetacular arte aborígene exigiu reconhecimento nacional formal. Assim, em 1984, Margie West, curadora de arte aborígene do Museum and Art Gallery of the Northern Territory, realizou a primeira edição do Prêmio Nacional de Arte Aborígene. O vencedor foi Michael Nelson Tjakamarra, que havia acabado de concluir uma importante obra des nada ao foyer norte da Ópera de Sidney e um carro de corrida BMW M3 pintado à mão, colocando-se, assim, ao lado de ar stas como Robert Rauchenburg, Andy Warhol e Alexander Calder.

The unstoppable flow of spectacular Aboriginal art demanded formal na onal recogni on, and in 1984, Margie West, the curator of Aboriginal art at the Museum and Art Gallery of the Northern Territory, ini ated the first Na onal Aboriginal Art Award. It was won by Michael Nelson Tjakamarra, who had just completed a major artwork for the Northern foyer of the Sydney Opera House, and hand painted a BMW M3 racing car, thereby joining the likes of Robert Rauchenburg, Andy Warhol and Alexander Calder.


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........................... Ray Young, 1951 – 2009 Sidney, Nova Gales do Sul, Costa Leste Iº Prêmio de Arte Aborígene, 1984 First Aborignal Art Award Silk-screen sobre papel


O MERCADO EM DESENVOLVIMENTO No final da década de 1980, a efervescência voltou-se, mais uma vez, para a Terra de Arnhem, onde ocorria uma nova onda de inovação. A demanda do mercado por produtos diversificados levou à criação de esculturas em madeira de coníferas retratando figuras ancestrais totêmicas e espirituais. Diversos ar stas especializaramse no uso desse suporte, incluindo a entrecasca de árvore, como England Bangala, Mick Kubarkku e David Malangi, cujo desenho nha sido usado, sem sua autorização, na nota de 1 dólar australiano.

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Em meados da década de 1980, Alice Springs tornou-se o núcleo de uma rede de comunidades produtoras de arte. Contudo, a verdadeira movimentação ocorria entre os ar stas Warlipi de Yuendumu, os Kukatja de Balgo Hills e os ar stas de Anmatjerre Oriental em Utopia. Parecia haver aqui uma ênfase na luminosidade, em um uso mais livre das cores e da expressão. Se houve uma ar sta que exemplificasse essa mudança e elevasse a arte aborígene ao nível de protagonista no circuito de arte, ela certamente foi Emily Kame Kngwarreye que, aos 79 anos de idade, criou as primeiras 5.000 obras de sua produção nos úl mos sete anos de sua vida.

The Developing Market By the late 1980s the heat turned, once more, toward Arnhem Land, which was experiencing a new wave of innova on. The market demand for diversified product prompted the crea on of so wood sculptures depic ng totemic ancestor and spirit figures. Several ar sts specialised in this medium, including the bark England Bangala, Mick Kubarkku and David Malangi, whose design was had been used, without his permission, on the Australian $1 note. By the mid 1980s Alice Springs was becoming the hub that was ringed with art producing communi es. But the real ac on seemed to be amongst the Warlipi ar sts at Yuendumu, the Kukatja at Balgo Hills and the Eastern Anmatjerre ar sts at Utopia. Here there seemed to be an emphasis on luminosity, a freer use of colour and expression. If any one ar st exemplified this shi , and carried Aboriginal art into the mainstream art world it was surely Emily Kame Kngwarreye who, at 79 years of age, created the first of 5000 works she would paint over the last 7 years of her life.

Nota de $1 dólar australiano $1 dollar australian


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Alagadiços em Dhamala, 1999 Mud Flats at Dhamala

Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto

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David Daymirringu Malangi, 1927 – 1999 Ramingining, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Manyarrngu

Turkey Tolson Tjupurrula, 1938 – 2001 Kintore, Território do Norte, Deserto Oriental, Pintupi

Cerimônia de iniciação dos Homens, 1982 Men´s Ini a on Ceremony Tinta acrílica sobre tela


Com a chegada do fim da década de 1980, os ar stas indígenas australianos viram-se enaltecidos no cenário mundial. O clímax foi Dreamings - The Art of Aboriginal Australia, do Asia Society, cuja i nerância cobriu as cidades de Nova York, Chicago, Los Angeles, Melbourne e Adelaide. Segundo o antropólogo americano Fred Myers, “o público americano ficou absolutamente fascinado”.4 Dreamings atraiu um público de 27.000 visitantes ao Asia Society em Nova York, o maior de todas as exposições já realizadas ali na época. O acontecimento marcou a primeira ocasião em que a arte aborígene foi apresentada como uma forma de expressão das "artes plás cas" em um espaço fora de um museu de história natural. Isto foi uma inves gação bastante intelectual em torno do imaginário tradicional. Com curadoria de antropólogos brancos, explorou paralelos com a arte contemporânea 5 e foi recebida com 5 uma crí ca extraordinária.

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A ascensão da pintura acrílica nas artes plás cas6 foi sinalizada em resenhas nas principais publicações e periódicos, desde o New York Times e Time Magazine até o Art in America. Kaye Larson, crí ca de arte da New York Magazine, escreveu: "O Modernismo nos permi u compreender o ponto de vista aborígene... A força da arte aborígene, em sua melhor forma de expressão, é tão forte quanto qualquer pintura abstrata que eu possa imaginar. Fiquei me lembrando de Jackson Pollock, que também espalhou o peso emocional do pensamento e da ação em todos os espaços vazios de sua tela..." 7 A Europa também abraçou com grande entusiasmo a arte indígena no fim da década de 1980. Seis ar stas de Yuendumu par ciparam da exposição Magiciens de la Terre, no Centro Georges Pompidou, em Paris. Quando Rover Thomas e Trevor Nickolls expuseram na Bienal de Veneza em 1990, a arte aborígene claramente nha chegado ao circuito mundial e rumou inexoravelmente para as galerias da "caixa branca".

As the 1980s drew to a close Australia's Indigenous ar sts found themselves feted on the world stage. The climax was the Asia Society's Dreamings - The Art of Aboriginal Australia, which toured New York, Chicago, Los Angeles, Melbourne and Adelaide. According to American anthropologist Fred Myers, “American 4 audiences were absolutely spellbound”. Dreamings drew 27,000 visitors at the Asia Society in New York, the largest a endance of any exhibit ever held there to that me. It marked the first occasion that Aboriginal art was presented as 'fine art' in a venue that was not a natural history museum. This was a very intellectual inquisi on, based around tradi onal imagery. Curated by white anthropologists, it explored parallels with contemporary art and met with an extraordinary cri cal recep on.5 6

The ascent of acrylic pain ng to fine art was signaled in reviews in major publica ons and periodicals from the New York Times and Time Magazine, to Art in America. Kaye Larson, the art cri c for New York Magazine wrote, 'Modernism has allowed us to comprehend the Aboriginal point of view…Aboriginal art at its best is as powerful as any abstract pain ng I can think of. I kept remembering Jackson Pollock, who also spread the emo onal weight of thought and ac on throughout the empty spaces of his canvas.' 7 Europe also enthusias cally embraced Indigenous art during the late 1980s. Six ar sts from Yuendumu par cipated in the exhibi on Magiciens de la Terre at the Pompidou Centre, in Paris. When Rover Thomas and Trevor Nickolls' showed at the Venice Biennale in 1990, Aboriginal art had clearly hit the world stage and moved inexorably toward 'white box' galleries. A new era, dominated by 'art stars', had dawned.

Era o romper de uma nova era dominada por "estrelas de arte". 4 - Myers, F.R., Pain ng Culture, Duke University Press, EUA, 2002, p 206 (6 - Myers, F.R., Pain ng Culture, Duke University Press, USA, 2002, p 206). 5 - Com curadoria da Seção de Antropologia do South Australian Museum, foi acompanhado por um livro publicado por Peter Su on, com excelentes ensaios de Su on, Christopher Anderson, Philip Jones e Françoise Dussart. (5 - Curated by the anthropology sec on of the South Australian Museum, it was accompanied by a book edited by Peter Su on, with authorita ve essays by Su on, Christopher Anderson, Philip Jones and Francoise Dussart.). 6 - Myers, F.R., Pain ng Culture, Duke University Press, EUA, 2002, p 277 (6 - Myers, F.R., Pain ng Culture, Duke University Press, USA, 2002, p277). 7 - Larson, Kaye. 1988. Their Brilliant Careers. New York Magazine, 4 de outubro, 148-50 (7 - Larson, Kaye. 1988. Their Brilliant Careers. New York magazine, 4 October, 148-50)


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Andrew Wanambi Margalulu, 1959 – c.2012 Ramingining, Território do Norte, Terra de Arnhem Central, Djinang Abrigo do Yolngu, 1997 Yolngu Shelter Litogravura sobre papel


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GRAVURA ABORÍGENE

Aboriginal Printmaking

Apesar de um número reduzido de ar stas aborígenes terem trabalhado com gravura nos idos de 1965, esse suporte era de uso rigorosamente restrito aos ar stas urbanos até 1980. A par r daí, vários gravadores e ateliês trabalharam oportunamente com ar stas aborígenes em suas visitas a Camberra, Sidney e Melbourne. Em 1989, a exposição que marcou época, New Tracks Old Land, apresentou 91 trabalhos representando cada marco histórico na história da gravura aborígene até aquele momento, fazendo uma i nerância pela América do Norte.

Although a small number of Aboriginal ar sts had made prints as early as 1965, the medium had been strictly limited to urban ar sts un l 1980. Therea er several printmakers and studios worked opportunis cally with Aboriginal ar sts on their visits to Canberra, Sydney and Melbourne. In 1989 the landmark exhibi on New Tracks Old Land, comprised of 91 works represen ng every historical landmark in the history of Aboriginal printmaking to that me, toured North America.

A exposição abriu em Boston, em 1991. Foi um caso impressionante para o qual a ar sta mul mídia de Queensland Arone Meeks criou uma grande escultura site specific. O grupo de rock aborígene Yothu Yindi realizou um grande espetáculo na galeria antes de a exposição sair em turnê para Nova York, St Louis, Sea le, Santa Fé e outras cidades em todos os Estados Unidos entre 1991 e 1995. A revista de arte internacional Art In America publicou uma resenha sobre a exposição, que foi designada pelo Boston Globe como a 4a melhor exposição i nerante a visitar os Estados Unidos em 1992. Uma exposição paralela com o mesmo nome percorreu os 25 locais australianos no início dos anos 90. Nessa época, foram realizados os simpósios Ge ng Into Print, em Darwin e Alice Springs, contando com a par cipação de mais de 300 ar stas, coordenadores, administradores e gravadores. Esses eventos anunciaram o vibrante movimento de gravura aborígene contemporânea de hoje.

The exhibi on opened in Boston in 1991. It was a stunning affair for which the Queensland mul media ar st Arone Meeks created a large site-specific sculpture. The Aboriginal rock group Yothu Yindi held a major concert in the gallery before the exhibi on toured to New York, St. Louis, Sea le, Santa Fe and other ci es throughout the USA between 1991 and 1995. It was reviewed in the interna onal art magazine Art In America and nominated by the Boston Globe as the 4th best touring exhibi on to visit America during 1992. A parallel exhibi on of the same name toured to 25 Australian venues during the early 1990s. By this me Ge ng Into Print symposiums were held in Darwin and Alice Springs, and more than 300 ar sts, coordinators, administrators and printmakers par cipated. These events heralded the vibrant contemporary Aboriginal print movement of today.

........................................ Arone Raymond Meeks, 1957 Cairns, Queensland / Norte Tropical de Queensland, Kuku Midji Tiro no Escuro!, 1990 Shot in the Dark! Técnica mista Edição: 8/40


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O MERCADO FLORESCENTE

The Burgeoning Market

Entre 1980 e 1987, a quan dade de galerias de arte aborígene e lojas de artesanato aumentou rapidamente com a entrada de importantes galerias privadas nessa área. A indústria cresceu ver ginosamente, saltando de US$ 2,5 milhões para US$ 14 milhões até o final da década de 1980.

Between 1980 and 1987 the number of Aboriginal art galleries and cra shops increased rapidly as prominent privately owned galleries entered the field. The industry grew rapidly from $2.5 million to $14 million by the end of the 1980s.

A potência internacional Sotheby's sempre havia incluído bark pain ngs em suas vendas de arte tribal. Contudo, quando introduziu as primeiras pinturas de Papunya e Kimberley no fim dos anos 80, a casa de leilões viu uma autên ca virada de jogo no tocante à arte aborígene. O fato de a Sotheby's estar preparada para imprimir sua marca oficial nas obras aborígenes modernas foi um sinal ao mundo de que essas obras eram importantes e colecioná-las era uma a vidade séria, mesmo diante da falta ainda de um discurso crí co sobre a arte na época.8 Em 1995, quando a Sotheby's realizou seu primeiro leilão exclusivamente de arte aborígene na Austrália, as vendas saltaram para US$ 45 milhões por ano. As exposições individuais, um fenômeno raro antes, nham se tornado corriqueiras. Este período também marcou o surgimento das pintoras mulheres que se transformariam, no novo milênio, na mais potente força em um movimento que já nha sido quase totalmente dominado pelos homens. Uma oficina de pintura perto de Haasts Bluff, no Deserto Ocidental, abrigou as primeiras pinturas criadas por mulheres Pintupi, que viriam a causar um sucesso estrondoso no mundo da arte.

The interna onal powerhouse Sotheby's, had always included bark pain ngs in its tribal art sales, but when it introduced early Papunya pain ngs and Kimberley works in the late 1980s, it proved a genuine game changer for Aboriginal art. The fact that Sotheby's was prepared to add its imprimatur to modern Aboriginal artworks, sent a signal to the world that they were important and seriously collectable, even though there was s ll a lack of cri cal discourse about the art at the me. 8 By 1995, when Sotheby's held its first stand alone Aboriginal art auc on in Australia, sales had jumped to $45 million per annum. Solo exhibi ons, a rare phenomenon beforehand, had now become commonplace. This period also marked the emergence of women painters who would by the new millennium become the most potent force in a movement once almost totally dominated by men. A pain ng workshop near Haasts Bluff in the Western Desert saw the first pain ngs created by Pintupi women who would go on to take the art world by storm.

8 - Isso fica evidente hoje pelo desinteresse nas revendas de obras de arte de vários ar stas de enorme sucesso na época. Muitos agora foram relegados em status e colocados no âmbito do artesão repe vo ou produtores de obras sofis cadas para turistas. Dentre estes figura um número enorme de pintores de obras em entrecasca de eucalipto da Terra de Arnhem, bem como uma quan dade grande de ar stas de Papunya, Mount Allan, Napperby e Haasts Bluff, que, na época, apareciam entre os produtores mais prolíficos da arte do deserto. 8 - This is evidenced today by disinterest in re-sales of artworks by a number of ar sts who were highly successful at that me. Many, have now been relegated in status and consigned to the realm of the repe ous journeyman, or producers of high-end tourist works. Included amongst these are a great many Arnhem Land bark painters as well as a large number of ar sts from Papunya, Mount Allan, Napperby and Haasts Bluff, who were amongst the most prolific producers of desert art at that me.


Quando os Jogos Olímpicos foram realizados em Sidney no ano 2000, as vendas de arte aborígene superaram os US$ 100 milhões e a Austrália foi levada pelo Great Interna onal Art Bubble que assolou o mundo da arte até a chegada da Crise Financeira Global no final de 2007. Apesar do revés enfrentado pela arte aborígene juntamente com todo o mercado de arte, a recuperação veio em 2011 e hoje está tão forte como sempre foi. Atualmente em toda a Europa, de Madrid a Bordeaux, de Roma a Paris e de Miami a Sea le, colecionadores de arte aborígene australiana compar lham sua paixão com os outros. As exposições na Austrália e no exterior con nuam a comprovar o gênio cria vo de uma tradição de 60.000 anos de idade; uma tradição que, apesar das rápidas mudanças sofridas durante os séculos XX e XXI, con nua a resis r e iluminar aqueles que têm olhos para ver e o coração para se emocionar com sua beleza, sua an ga narra va e suas verdades eternas.

By the me the Olympic Games were staged in Sydney in 2000 sales of Aboriginal Art topped $100 million and Australia rode the Great Interna onal Art Bubble that raged across the art world un l the Global Financial Crisis hit in late in 2007. Though Aboriginal art experienced a setback along with the en re art market, it recovered by 2011, and today it is as strong as it has ever been. Today across Europe, from Madrid to Bordeaux, from Rome to Paris, and from Miami to Sea le, collectors of Australian Aboriginal art are sharing their passion with others. Exhibi ons in Australia and abroad con nue to a est to the crea ve genius of a tradi on that is 60,000 years old; a tradi on that in spite of the rapid changes brought during the 20th and 21st centuries, con nues to endure and enlighten those who have the eyes to see and the heart to be moved by its beauty, ancient narra ve, and eternal truths.

© Adrian Newstead Bondi Beach, February 2016

......................................... Ronnie Tjampitjinpa, 1943 Kintore, Território do Norte, Deserto Ocidental, Pintupi Tingari, 1999 Tinta acrílica sobre linho belga


............................ Jack Bri en, 1921 – 2002 Frog Hollow, Austrália Ocidental, Kimberley Oriental, Gija O Tempo dos Sonhos de Guarloring,1995 Guarloring Dream me Pigmentos terrosos naturais sobre tela

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............................ Lily Nangala Scobie, 1932 – c.2001 Lajamanu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri O Sonhar da Água, 1985 Water Dreaming Tinta acrílica sobre tela


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Tarpinpa, perto da Estrada de Canning Stock, 1992 Tarpinpa, Near the Canning Stock Route Tinta acrílica sobre tela

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Balba Napangar , 1924 – c.1994 Balgo Hills, Território do Norte, Grande Deserto Arenoso, Kukatja

Igna a Djanghara, 1930 – 1995 Kalumburu, Austrália Ocidental, Kimberley, Woonambal Wandjina, c.1985

Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto


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História do Purukapali /Tapara (Lua), 2001 Purukapali Story/Tapara (Moon)

Pigmentos terrosos naturais sobre tela

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Jean Bap ste Apua mi, 1940 – 2014 Wuramiyanga, Território do Norte, Ilha Bathurst, Tiwi

Milliga Napaltjarri, 1921 – 1994 Balgo Hills, Território do Norte, Grande Deserto Arenoso, Kukatja

Purrungu, perto de Kiwikurra no Grande Deserto Arenoso, 1993 Purrungu, Near Kiwikurra in the Great Sandy Desert Tinta acrílica sobre tela


............................ Bede Tungutalam,1952 Wuramiyanga, Território do Norte, Ilha Bathurst, Tiwi Tunumuni II, 1998 Gravura sobre papel

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............................ Dennis Nona, 1973 Ilha Badu, Queensland, Ilhas do Estreito de Torres, Kuku Lagaw Yah Naath (State I), 1993 Gravura sobre papel


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Nyarnkurn and Karna, 2002 Tinta acrílica sobre linho belga

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Loren & Myrtle Pennington, 1935-2008 Tjuntjuntjarra, Austrália Ocidental, Grande Deserto de Vitória, Pitjantjatjarra

Boxer Milner Tjampitjin, 1935 – 2009 Bililuna, Austrália Ocidental, Grande Deserto Arenoso, Kukatja Purkitji, 2005 Tinta acrílica sobre linho belga


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Pintura corporal para a cerimônia Pukamani, 2002 Pwoja Pukamani Body Marks Pigmentos terrosos naturais sobre linho

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Freda Warlipini, 1928 – 2003 Milikapi , Território do Norte, Ilha Melville, Tiwi

Millie Skeen, 1935 – 1997 Mullun, Território do Norte, Grande Deserto Arenoso, Kukatja

Kamiyarri, Grande Deserto Arenoso, 1996 Kamiyarri, Great Sandy Desert Tinta acrílica sobre linho belga


............................ Sally Morgan, 1951 Perth, Austrália Ocidental, Pilbara, Bailgu Mulheres Reunidas, 1987 Women Together Tinta acrílica sobre tela

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............................ Prince of Wales Midpul, 1938 – 2002 Belyuen, Território do Norte, Darwin, Larakia Marcas no corpo, 2000 Body Marks Tinta acrílica sobre tela


................................ Ar sta Desconhecido Tokampini (Escultura Tiwi com um Único Pássaro) Tokampini (Tiwi Single Bird Sculpture) Escultura em madeira com pigmentos terrosos naturais

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................................ Ar sta Desconhecido Tunga, 1986 Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto


.......................... Emily Kame Kngwarreye, 1916 – 1996 Utopia, Território do Norte, Deserto Oriental, Anmatjerre Oriental O Sonhar do Inhame, 1992 Yam Dreaming Tinta acrílica sobre tela

.......................... David Daymirringu Malangi, 1927 – 1999 Ramingining, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Manyarrngu

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Bagre e Cobra-de-Java (Witji e Yallurr), 1983 Ca ish and File Snake (Witji and Yallurr) Pigmentos terrosos naturais sobre entrecasca de eucalipto

.......................... Hector Jandanay Joongoorra, 1920 – 2004 & Adam Rish, 1953 Balgo Hills, Território do Norte, GrandeDeserto Arenoso, Kukatja, Sidney, Nova Gales do Sul, Costa Leste O Úl mo Espetáculo, 1996 The Late Show Pigmentos terrosos naturais sobre linho belga


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Buracos nas Rochas na Estrada de Canning Stock, 1990 Rockholes, Canning Stock Route, Austrália Ocidental Tinta acrílica sobre tela

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Ena Gimme Nungurayi, 1955 – 1991 Balgo Hills, Austrália Ocidental, Grande Deserto Arenoso, Kukatja

Wimmitji Tjapangar , 1924 – 2000 Balgo Hills, Território do Norte, Grande Deserto Arenoso, Kukatja Nyarkalpa (Olho d'Água), 1991 Nyarkalpa (Waterhole) Tinta acrília sobre linho belga


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Marie Jose e Orsto, 1962 Wuramiyanga, Território do Norte, Ilha Bathurst, Tiwi

Fa ma Kan lla, 1971 Pulurumpi, Território do Norte, Ilha Melville, Tiwi

Miyinga Jilamamra, 2001

Esta Manada Vai Caçar, 1990 This Mob Going Hun ng

Pigmentos terrosos naturais sobre linho Silk-screen sobre papel fine-art Edição: 5/35

........................... Jack Dale, 1922 – 2014 Derby, Austrália Ocidental, Kimberley, Austrália Ocidental, Ngarinyin Estrada Packhorse, (s.d.) Packhorse Road Coleção de Neil McLeod Fine Art, VIC Pigmentos terrosos naturais sobre tela


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Dennis Nona, 1973 Ilha Badu, Queensland, Ilhas do Estreito de Torres, Kuku Lagaw Yah

Saulal, 2010 Gravura a água-forte

Edição: 16/45


................................ Red Back Graphics Design e Cartaz de Exposição, 1982 Design Exhibi on Poster Silk-screen sobre papel

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........................... Dorothy Napangardi, 1956 – 2013 Yuendumu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri Sal em Mina Mina, 2005 Salt on Mina Mina Tinta acrílica sobre linho belga Coleção da Galeria Gondwana, Território do Norte


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No Princípio dos Tempos, 1995 In the Beginning of Time Serigrafia sobre papel fine-art

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Paddy Fordham Wainburranga, 1941 – 2006 Beswick, Território do Norte, Katherine, Rembarrnga

David Jarinyanu Downs, 1925 – 1995 Fitzroy Crossing, Austrália Ocidental, Grande Deserto Arenoso, Walmatjarri Yapuru, c.1986 Pigmentos terrosos naturais sobre escudo de madeira


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Cacatuas Pretas, 1991 Black Cockatoos Litografia em papel fine-art

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David Daymirringu Malangi, 1927 – 1999 Ramingining, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Manyarrngu

Eubena Nampitjin, 1924- 2013 Balgo Hills, Território do Norte, Grande Deserto Arenoso, Kukatja

Kinya, perto da Estrada de Canning Stock, Austrália Ocidental, 1992 Kinya, near Canning Stock Route, WA Tinta acrílica sobre linho belga


................................ Angelina Tjaduwa Woods, 1954 Tjuntjuntjarra, Austrália Ocidental, Grande Deserto de Vitória, Pitjantjatjarra Pirapi, 2011 Tinta acrílica sobre tela

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................................. Queenie McKenzie, 1930 – 1998 Turkey Creek, Austrália Ocidental, Kimberley Oriental, Gija As Três Irmãs, Montanhas Azuis, 1997 Three Sisters, Blue Mountains Pigmentos terrosos naturais sobre tela


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Owen Yalandja, 1962 Maningrida, Território do Norte, região central da Terra de Arnhem, Kunwinjku Yawk Yawk, Conjunto de Três, 2006 Yawk Yawk, Set of Three Escultura em madeira com pigmentos terrosos naturais

................................ Ian Abdulla, 1947 – 2011 Cobdolga, Austrália Meridional, Riverland, Austrália Meridional, Ngarrindjeri

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Colocando Larvas em uma Linha Transversal, 2008 Pu ng Grubs on a Cross Line Tinta acrílica sobre linho belga

................................ Bobby Badjerai Ngainmirra, 1915 – 1992 Oenpelli, Território do Norte, região ocidental da Terra de Arnhem, Kunwinjku Serpente Arco-Íris, 1989 Rainbow Serpent Pastel de óleo sobre papel


...................... Mitjili Napanangka Gibson, c. 1932 – 2011 Yuendumu, Território do Norte, Deserto de Tanami, Warlpiri Parrailpit, (s.d.) Tinta acrílica sobre linho belga Coleção de Gundooee, Nova Gales do Sul


AUSTRÁLIA

FITZROY CROSSING BELYUEN MULLUN

BILILUNA TURKEY CREEK BALGO HILLS FROG HALLOW

OENPELLI BESWICK RAMINGINING

KALUMBURU DERBY

MANINGRIDA

MILIKATPITI WURAMIYANGA PULURUMPI

AUSTRÁLIA ILHA BADU

CAIRNS

NORTHERN TERRITORY

QUEENSLAND WESTERN AUSTRALIA

CHARLEVILLE

SOUTH AUSTRALIA

TJUNTJUNTJARRA

CUMERAGUNJA

PERTH

NEW SOUTH WALES

VICTORIA

NT LAJAMANU

WINGELLINA

YUENDUMU UTOPIA NAPPERBY

C E N T R A L KINTORE DESERT

PAPUNYA

SA

TASMÂNIA

COBDOLGA

NABIAC

SYDNEY


O Tempo dos Sonhos: Arte Aborígene da Austrália Out Of The Dreaming: Contemporary Aboriginal Art Presidenta da República / President of the Republic:

Dilma Rousseff

Ministro da Fazenda / Minister of Finance:

Nelson Barbosa

Presidenta da CAIXA / Chairman of CAIXA:

Miriam Belchior

FICHA TÉCNICA / OUR TEAM: Curadoria Brasil / Curator Brazil : Consultoria de Conteúdo / Content Advisor:

Clay D'Paula Ilana Seltzer Goldstein

Curadoria Austrália / Curators Australia:

Adrian Newstead & Djon Mundine

Coordenação Brasil / Coordinator Brazil:

Ta ana Flores

Coordenação Austrália / Coordinator Australia: Projeto Expográfico / Exhibi on Designer: Fotografias / Images: Tradução / Translator: Assessoria de Imprensa / Press Service: Design Gráfico / Graphic Designer: Iluminação/Ligh ng: Transporte Internacional / Interna onal Shipping: Transporte Nacional / Na onal Shipping: Produção Internacional / Interna onal Organizers: Produção Nacional / Na onal Organizers:

Mirri Leven Heitor Mestres Coo-ee Art Gallery - Austrália Marisa Shirasuna Lucelle Gomes Flávio Mello - www.blank.design Toninho Rodrigues IAS Fine Art Logis cs Vanguardian 2 levels & Coo-ee Art Gallery Ta ana Flores Produções - 2 levels

Agradecimentos / Acknowledgement: Sr. Patrick Lawless e ao Sr. John Richardson, ex- e atual Embaixadores da Austrália no Brasil, respec vamente. Agradecimentos especiais a Mark Bromilow, Diretor Execu vo do Australia Now, e a Marion Walshe, Conselheira e Cônsul-Geral da Austrália no Brasil. Mr. Patrick Lawless and Mr. John Richardson, former and current Australian Ambassadors to Brazil, respec vely. Special thanks to Mark Bromilow, Execu ve Producer of Australia Now, and Marion Walshe, Counsellor and Australian Consul-General to Brazil.




Distribuição gratuita. Comercialização proibida.

CAIXA Cultural São Paulo Praca da Sé, 111 – Sao Paulo/SP CEP 01001-001 Tel.: (11) 3321-4400


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