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Problemas e perspectivas
Dirceu Gassen
Inóculo produzido pela safrinha, fenômeno El Niño e atraso na semeadura do trigo integram o cenário que em 2015 tende a favorecer a maior pressão da ferrugem asiática em lavouras brasileiras. Anos favoráveis à doença costumam ser ao mesmo tempo promissores em termos de rendimento de grãos, pela melhor ocorrência de chuvas. Cabe ao produtor realizar o manejo correto para aproveitar este potencial
O
cenário da ferrugem asiática da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, mudou significativamente nas últimas safras. Verificou-se uma intensificação da doença no Sul do Brasil. O desempenho dos fungicidas diminuiu pela resistência do fungo. A safrinha de soja bateu recorde no ano de 2014, projetando mais inóculo à próxima safra. E há previsão de El Niño, com expectativa de ambiente mais favorável às doenças. Estes fatores combinados entre si desafiam o manejo da doença, ameaçam a
sustentabilidade da cultura da soja e requererem a adoção de novas ferramentas e estratégias de manejo. A variabilidade genética, através de mutações, é grande em fungos com altíssima produção de esporos como Phakopsora. As mudanças na população do patógeno ocorrem, principalmente, na direção dos fatores que mais ameaçam sua sobrevivência, como a utilização de cultivares resistentes e a aplicação de fungicidas. Em soja, a menor sensibilidade de Phakopsora aos fungicidas triazóis já foi relatada, tendo como consequência prática a
redução da sua eficácia de controle (Figura 1). Mas é também provável que a população do fungo seja mais agressiva à cultura, apesar do ainda pequeno número de cultivares resistentes ou tolerantes à ferrugem. Enfrenta-se, hoje, um patógeno diferente, menos sensível aos fungicidas e mais agressivo à planta, em relação àquele que iniciou a ferrugem no Brasil em 2001. Combinar fungicidas com diferentes mecanismos de ação e, igualmente eficazes no controle do mesmo patógeno, é excelente estratégia antirresistência. Contudo, com a menor sensibilidade aos triazóis, induzida pelo seu uso isolado, em várias aplicações, também houve comprometimento do desempenho das misturas (T+E), que hoje é menor em relação ao que era obtido anteriormente. Controle seguro da ferrugem asiática em soja agora requer a utilização de novas estratégias em relação aos fungicidas. A primeira consiste em substituição parcial dos tratamentos pelas novas misturas de estrobilurina + carboxamida. Atualmente existem duas registradas para a cultura da soja, uma sendo azoxistrobina + solatenol e outra piraclostrobina + fluxapiroxade. A combinação estrobilurina + carboxamida indisponibiliza o uso do O2 pelo fungo, afeta a produção de energia (ATP) e compromete a germinação de esporos, entrada do fungo na planta e sua esporulação. Em campo, se observa melhor controle da ferrugem, maior manutenção da área foliar e rendimento de grãos superior. A forte epidemia de ferrugem asiática na safra 2014, no Planalto Médio gaúcho, destacou o desempenho da combinação azoxistrobina + solatenol. Carboxamidas são fungicidas com médio-alto risco de resistência, e mesmo em mistura com estrobilurinas, recomenda-se limitar sua utilização ao máximo de dois tratamentos por ciclo de soja. A segunda estratégia se baseia na utilização das tradicionais misturas de triazol + estrobilurina com o reforço de fungicidas multissítios, adicionados ao tanque do pulverizador. A sua utilização tem como objetivo adicionar às misturas T+E
Soja - Agosto 2014 Figura 1 - Área cultivada com soja no Brasil e eficácia de controle (%) da ferrugem asiática por fungicidas triazóis. Fonte: Conab; Godoy (2012); Consórcio Anti-Ferrugem
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Tabela 1 - Severidade da ferrugem asiática e rendimento de grãos de soja em função da aplicação de fungicidas. UPF, Passo Fundo, 2014 Época aplicação Pré-fechamento (Veget.) 15 dias (R1-R2) 18 dias 18 dias Severidade (%) Rendimento (kg/ha)
Testemunha 72,5 a1 2790 d
Programa 1 Programa 2 Programa 3 T+E T+E T+E T+E C+E T+E T+E C+E T+E T+E T+E 33,6 b 26,5 c 10,4 d 3228 c 3486 b 4188 a
Médias com a mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% probabilidade de erro.
1
produtos de baixíssimo risco de resistência, para tentar estabilizar este processo. Maior número de estudos tem sido realizado com os ativos mancozeb (ditiocarbamato) e clorotalonil (isotalonitrila), porém, outros fungicidas podem ser avaliados com o mesmo propósito. A suplementação com mancozeb, em R1, R1 + 20 dias e R1 + 35 dias, resultou em rendimento de grãos 210kg/ha a 564kg/ha maior. As duas estratégias podem ser combinadas em um mesmo programa de tratamentos, eficiente no controle da ferrugem asiática e seguro para o manejo da resistência. O número de aplicações dependerá da pressão de doença, que projetase maior em 2015, devido: 1) ao inóculo produzido pela safrinha em 2014, 2) há previsão de mais chuvas pelo El Niño, e também 3) ao atraso na semeadura do trigo, em 2014, que irá retardar a semeadura de soja em muitos locais. Há grande possibilidade de antecipação na ocorrência da ferrugem em relação ao ciclo da soja. Neste caso, a doença tem mais tempo para desenvolver, com prejuízos ainda mais significativos.
A
Para situações de mais ferrugem projeta-se um total de quatro tratamentos, na forma de um sanduíche (Tabela 1). A primeira e a última aplicações com misturas de T+E, complementadas com um fungicida multissítio. As duas aplicações intermediárias com as combinações de estrobilurina + carboxamida. Nos cultivos com menor pressão de doença (abertura de plantio, cultivares precoces) sugere-se realizar as aplicações iniciais e monitorar o final do ciclo da cultura, podendose descartar a última. Esta sugestão de manejo incorre em investimento maior por parte do agricultor, porém, resulta em maior segurança e produtividade. É do conhecimento dos produtores de soja no Sul do Brasil, que anos favoráveis à ferrugem são, ao mesmo tempo, promissores em termos de rendimento de grãos, pela melhor ocorrência de chuvas. Se os cuidados não forem adequados, a ferrugem aproveita esta condição. Com bom manejo, a soja o faz. C
Carlos A. Forcelini, Universidade de Passo Fundo
Vista de parcelas experimentais submetidas a três aplicações da mesma mistura de triazol + estrobilurina, em 2010 e 2014
Vista aérea de parcelas experimentais tratadas com duas aplicações da mistura de azoxistrobina + solatenol
B
Vista de parcelas experimentais sem fungicida (A) ou com duas aplicações (R1 e R1 + 20 dias) de triazol + estrobilurina (B) ou estrobilurina + carboxamida (C). UPF, Passo Fundo
C
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Lições amargas
Embrapa Soja
Em 12 anos da detecção da ferrugem asiática da soja no Brasil a doença trouxe prejuízos severos e duros ensinamentos que demonstram ainda haver muito a aprender. Recorrentes problemas de resistência do fungo à aplicação de fungicidas aumentam o sinal de alerta. A chegada de novos produtos ao mercado melhora as opções de manejo, mas cuidados precisam ser tomados para preservar estas tecnologias e evitar que também sejam comprometidas
O
s 12 anos de ferrugem asiática da soja (Phakopsora pachyrhizi) na região central do Brasil têm deixado muitos ensinamentos. Esta região, onde o Mato Grosso está inserido, tem se mostrado um ambiente extremamente propício para a disseminação desta doença. As temperaturas amenas, a altitude, o alto índice de molhamento foliar e a presença de ventos
frequentes têm tornado estas regiões um grande reduto da doença. Praticamente todos os anos surgem notícias de grandes desastres causados por ferrugem em alguma região, mostrando que se está sempre aprendendo e que nunca se saberá o suficiente. Nas regiões de maiores altitudes como Parecis, regiões Leste (Primavera do Leste/Campo Verde) e Sul (Serra da Petrovina), onde as
À esquerda área de cultivo de soja sem aplicação de fungicidas e à direita tratamento apenas com estrobilurina isolada
condições para a ferrugem são mais propícias, ainda tem acontecido as maiores perdas. Nas regiões mais baixas, onde o manejo costuma ser mais flexível, frequentemente os agricultores também são surpreendidos com fortes epidemias. Para uma doença que encontra um dos melhores ambientes do Brasil e, por que não dizer do mundo, nestas regiões em que quase todo o manejo da ferrugem recai sobre o controle químico através do uso de fungicidas, a perda de ativos através de sensibilidade do fungo ou resistência tem sido frequente. Em 2006/2007 observou-se em ensaios de campo e em áreas comerciais a queda de desempenho do ingrediente ativo flutriafol pertencente ao grupo dos triazóis, extremamente eficiente até aquele momento. No ano seguinte, em 2007/2008, praticamente todos os fungicidas triazóis utilizados em soja mostravam a mesma tendência, com ênfase para o tebuconazole, produto amplamente
Soja - Agosto 2014
Área tratada com estrobilurina + triazol (esquerda) e parcela com tratamento à base de carboxamida + estrobilurina (direita)
margens de estradas e até mesmo restevas de soja não destruídas tem sido a grande fonte de inóculo para dar início às epidemias da safra seguinte. O cultivo de soja de segunda safra também contribui para a exposição excessiva de determinados ativos, reduzindo a vida útil destes produtos. Além disso, a previsão para a safra 14/15 é de El Niño, com previsão de mais chuvas e uma provável antecipação da chegada do fungo. Confirmando-se este cenário, é de se esperar um ano de alta pressão de ferrugem. Agora, vemos um novo grupo de ativos chegando ao mercado, as carboxamidas, altamente específicas e eficientes, dentro do propósito de cada produto, mas que necessitam de triazóis e estrobilurinas para completarem sua performance e/ou protegê-las da resistência. Para este grupo de ativos terem sua longevidade, os demais ativos (estrobilurinas e triazóis) têm que dar sua contribuição como protetores das moléculas e como parceiros completando-os. O número limitado de aplicações e as pulverizações preventivas (conforme posicionamento dos fabricantes), não expondo este grupo a altas pressões, também são fatores de preservação destes ativos. Fungicidas protetores têm sido avaliados nos últimos anos, com ações interessantes quando trabalhados em conjunto com as misturas de triazóis e estrobilurinas, com boas respostas em produtos que estão perdendo a performance.
Nossa opinião é de que, para uma doença tão agressiva, é preciso manter-se muito atualizado, adotando todas as ações possíveis a fim de minimizar as perdas, cumprindo com rigor o vazio sanitário, evitando semeaduras tardias sempre que possível, reduzindo ciclo das cultivares, monitorando a doença, realizando aplicações preventivas, conhecendo as características de cada produto, rotacionando produtos preferencialmente com mecanismos de ação diferentes, reduzindo intervalos conforme o desempenho dos produtos, utilizando adjuvantes recomendados ou avalizados pela indústria, sem subdosar produtos e utilizando fungicidas protetores. C
Valtemir José Carlin, Agrodinâmica Divulgação
usado na época e certamente o mais exposto à pressão de seleção. Infelizmente a coisa não parou por aí. Percebeu-se que safra após safra uma grande ferramenta de controle químico, representada por estrobilurinas + triazóis, continua perdendo a eficiência, dando a impressão de que as estrobilurinas, apesar de não estar comprovado, também estariam perdendo o seu poder de controle. As grandes extensões de soja, aliadas ao uso excessivo e repetido do mesmo produto, com todo um cenário climático favorável à doença, continuam a reduzir a eficácia (diretamente proporcional à exposição destes produtos no campo, além da maior ou menor fragilidade de cada ativo). Em ensaios nesta última safra, para semeaduras de início de dezembro, ultrapassou-se a marca de 90% de perdas de produtividade por ferrugem da soja (3,5 sacas por hectare na testemunha contra 43,5 sacas por hectare nos melhores tratamentos), resultado nunca visto até o momento e citado há tempos na literatura (Yorinori, 2004). O manejo eficiente da ferrugem da soja na região e no estado é um dos grandes desafios dos agricultores. Dentro do manejo integrado, a busca por materiais mais precoces, a antecipação de plantio e a rápida semeadura têm sido estratégias muito comuns nos últimos anos, sendo importantes fatores de escape. A presença de tigueras de soja em outras culturas de safrinha, em coberturas de solo,
Carlin faz retrospecto da incidência da ferrugem asiática no Brasil
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Ação diferenciada Cultivar
Aplicações de produtos com princípios ativos diferentes ou misturas que atuem em processos metabólicos diversos, como triazóis + estrobilurinas e carboxamida sem mistura com estrobilurinas são ferramentas importantes no manejo da ferrugem asiática, com reflexos positivos no controle e na produtividade da cultura
O
s agricultores costumam receber alertas sobre a maior ou menor probabilidade de ocorrência de ferrugem na safra de soja. Nem sempre estas previsões se confirmam, porém, a pesquisa tem aperfeiçoado seus métodos. Além dos fatores meteorológicos tem-se considerado também a quantidade de inóculo presente no início da safra. Uma análise histórica da ocorrência da doença sob condições de epidemia para o estado do Paraná indica duas safras favoráveis à ferrugem, 2006/2007 e 2009/2010, ou seja, duas safras nas quais a ferrugem foi problema, para 11 anos de cultivo na presença da doença. O estado possui uma rede de estações meteorológicas que coleta dados de forma automatizada desde 1990. Utilizaram-se estes dados para simular quantas safras teriam sido favoráveis a epidemias de ferrugem dentro deste horizonte de 24 anos, caso a ferrugem já estivesse presente. Os resultados indicaram, além das duas safras já mencionadas, que haveria mais três anos favoráveis para epidemias. Assim sendo, há grande probabilidade de uma a cada cinco safras apresentar problemas com epidemias de ferrugem. Atualmente, sabe-se que a ocorrência de epidemias de ferrugem depende de condições climáticas favoráveis durante dois períodos do ano. Durante a safra a doença necessita de chuvas bem distribuídas (Del Ponte et al, 2006) para progredir. Já durante a entressafra, por se tratar de um patógeno biotrófico, que necessita do hospedeiro vivo para parasitar, invernos menos rigorosos favorecem a sobrevivência do fungo, incrementando o inóculo inicial da epidemia. Safras com a combinação destes fatores, ou seja, invernos menos rigorosos com poucas geadas e clima
chuvoso durante a safra, propiciam epidemias severas de ferrugem. Para o Paraná e regiões próximas, a safra 2014/15 tem apresentado até o momento, julho de 2014, condições favoráveis à ocorrência da doença. O inverno não está rigoroso, favorecendo a sobrevivência do fungo em plantas tigueras e há previsão de El Niño, indicativo de verão chuvoso. Estes dois fatores são agravados pelo incremento do cultivo de soja safrinha na última safra, aumentando ainda mais a ocorrência de soja tiguera e consequentemente incrementando em grandes proporções a sobrevivência do inóculo do fungo. Controle Em anos menos favoráveis à doença, a eficiência dos fungicidas não apresenta grande variação. Os produtos tendem a demonstrar comportamento semelhante para o controle. Enquanto em anos favoráveis há destaque para produtos de maior eficiência. Apresentam melhor controle da doença, além de incremento significativo na produtividade, quando comparados à testemunha sem aplicação. Resultados sumarizados dos ensaios cooperativos de eficiência de fungicidas para o controle da ferrugem asiática da cultura da soja têm demonstrado queda na eficiência do controle quando se aplica triazol isolado, partindo de eficiência de 90%, na safra de 2003/04, chegando em cerca de 30%, na safra de 2009/10. A eficiência das misturas de triazol + estrobirulina também tem apresentado redução preocupante. Carboxamidas Em ensaios conduzidos na Fazenda Escola da Universidade Estadual de Londrina, nas duas últimas safras foram testados produtos com mistura de estrobilurinas com carboxamidas. Um destes produtos apresentou eficiência significativamente superior a todos os produtos existentes no mercado. A maior porcentagem de controle foi observada para o tratamento com azoxistrobina + solatenol (60g i.a./ha + 30g i.a/ha). Outros produtos com boas porcentagens de controle foram trifloxistrobina +
protioconazol (60g i.a./ha + 70g i.a./ha), picoxistrobina + tebuconazol (60g i.a./ha + 100g i.a./ha) e a mistura tripla piraclostrobina + epoxiconazol + fluxapiroxad (64,8g i.a./ha + 40g i.a./ha + 40g i.a./ha). A pesquisa também tem obtido resultados surpreendentes com os mesmos produtos adicionados com fungicidas protetores, como mancozeb, chlorotalonil e cúpricos. Porém, são necessários mais dados para confirmação dos resultados. Ainda não se pode recomendá-los pela ausência de registro destes produtos para controle da ferrugem da soja. Produtividade As respostas em produtividades dos ensaios acompanharam a eficiência de controle para a ferrugem. As maiores produtividades foram obtidas para azoxistrobina + solatenol (60g i.a./ha + 30g i.a./ha), seguida de trifloxistrobina + protioconazol (60g i.a./ha + 70g i.a./ha), piraclostrobina + epoxiconazol + fluxapiroxad (64,8g i.a./ha + 40g i.a./ha + 40g i.a./ha), piraclostrobina + fluxapiroxad (99,9g i.a./ha + 50,1g i.a./ha) e picoxistrobina + tebuconazol (60g i.a./ha + 100g i.a./ha). Isto reflete a importância da ferrugem para redução da produtividade, quando comparada às outras doenças que afetam a cultura da soja. De uma forma genérica, severidades baixas de ferrugem podem reduzir tanto a produtividade quanto severidades elevadas da maioria das outras doenças, que afetam a cultura de forma epidêmica. Resistência A queda da eficiência de fungicidas para controle de Phakopsora pachyrhizi obedece às “leis” da pressão de seleção e tem sido observada nos últimos anos. Para que os produtores possam evitar ou atrasar a resistência deve-se aplicar a dose recomenda pelo fabricante, monitorar a resistência do fungo ao produto, manejar as doenças de forma integrada e evitar a utilização de fungicidas com uma única ação específica, como no caso do uso isolado dos triazóis. Portanto, recomendam-se aplicações de produtos com princípios ativos diferentes ou misturas que atuem em processos metabólicos diferentes, a exemplo dos triazóis em mistura com estrobilurinas, e carboxamidas em mistura com estrobilurinas, devido ao eficiente resultado demonstrado pelos ensaios para controle da ferrugem. C
Marcelo G. Canteri e Ciro H. Sumida Univ. Est. de Londrina (UEL)
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Controle efetivo
Cultivar
Com boa eficácia no combate à ferrugem asiática o fungicida azoxistrobina + solatenol tem apresentado também resultados positivos no incremento de produtividade na cultura da soja. Contudo, o manejo da doença não pode ser encarado de modo isolado, mas integrar um rol de medidas conjuntas para redução do inóculo de forma duradoura e sustentável
Aveias-pretas são indicadas para a redução de populações do nematoide Pratylenchus brachyurus
A
safra 2013/14 foi marcada pela alta pressão da Ferrugem Asiática no sudoeste goiano, mesmo nos primeiros plantios. Em virtude do atraso nas chuvas, maior parte das áreas foi semeada após a primeira quinzena de outubro, recebendo maior pressão de inóculo de outras regiões. Além de a semeadura ter ocorrido um pouco mais tarde que o normal, o vazio sanitário não foi bem executado por alguns produtores, que não eliminaram completamente a soja tiguera, principalmente em áreas às margens das rodovias. O desvio do
foco para identificação e controle da lagarta Helicoverpa armigera fez com que alguns agricultores não pulverizassem os fungicidas no momento correto, sendo as aplicações realizadas de forma curativa. Desde 2002/03 o controle químico vem se destacando entre as principais estratégias de controle da doença. No entanto, muita coisa mudou desde então e, certamente, a sensibilidade do fungo Phakopsora pachyrhizi aos fungicidas. Os primeiros trabalhos que comprovaram a menor eficácia dos triazóis foram realizados durante a safra 2006/07 pela Universidade
de Rio Verde. A partir de 2009 os ensaios cooperativos coordenados pela Embrapa corroboram com tais resultados. Nas últimas duas ou três safras, os trabalhos desenvolvidos pela Universidade de Rio Verde em parceria com a AgroCarregal Pesquisa e Proteção de Plantas têm indicado a hipótese da menor eficácia também das estrobilurinas, sendo percebida queda acentuada no controle proporcionado pelas misturas entre triazóis e estrobilurinas a campo. Estudos preliminares em laboratório indicam alteração na concentração inibitória da germinação de 50% dos uredosporos
10 • Agosto 2014 - Soja Tabela 1 – Severidade média (%) em 07/02/2014 (R3), 23/02/2014 (R5.3) e 11/03/2014 (R6) em função do controle de Ferrugem Asiática da soja TRATAMENTOS 1-TESTEMUNHA 2- tebuconazol (triazol) 3- ciproconazol (triazol) 4- azoxistrobina (estrobilurina) 5- azoxistrobina (estrobilurina) + ciproconazol (triazol) 6- epoxiconazol (triazol) + piraclostrobina (estrobilurina) + óleo mineral (hidrocarbonetos alifáticos) 7- ciproconazol (triazol) + Picoxistrobina (estrobilurina) 8- Protioconazol (Triazolinthione) + trifloxistrobina (estrobilurina) 9- Picoxistrobina (estrobilurina) + tebuconazol (triazol) 10- azoxistrobina (estrobilurina) + flutriafol (triazol) 11- metconazol (triazol) + piraclostrobina (estrobilurina) 12- azoxistrobina (estrobilurina) + tetraconazol (triazol) 13- fluxapiroxade (carboxamida) + piraclostrobina (estrobilurina) 14- Codificado 1 15- Codificado 2 16- Codificado 3 17- Codificado 4 18- Codificado 5 19- Codificado 6 20- azoxistrobina + solatenol C.V. (%)
Época de aplicação R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4 R1; R4; R5.4
Severidade (%) R3 22,42 f 12,91 e 11,94 d 14,54 e 13,85 e 13,34 e 11,70 d 5,22 a 8,30 b 12,81 e 13,41 e 13,07 e 9,34 b 10,95 c 10,45 c 12,01 d 8,32 b 6,74 a 5,96 a 5,76 a 8,15
R5.3 26,27 j 15,10 e 12,31 d 16,93 f 15,54 e 15,50 e 11,69 d 9,13 b 11,10 c 16,47 f 21,35 h 20,48 h 17,25 f 19,75 g 19,20 g 21,12 h 13,25 d 12,30 d 9,31 b 7,63 a 5,31
R6 58,95 j 49,58 h 47,58 g 46,96 g 40,62 e 43,43 f 27,64 c 18,00 b 27,52 c 52,12 i 49,91 h 45,58 g 40,91 e 47,58 g 48,83 h 53,83 i 31,25 d 30,04 d 16,12 b 10,35 a 3,42
Médias seguidas pela mesma letra em cada coluna não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Scot-Knott a 5% de probabilidade.
(CI50) até 20 vezes maior quando comparadas àquelas obtidas por Blum em 2009. Novos trabalhos científicos estão sendo conduzidos em diferentes regiões do Brasil para confirmação ou não dessa hipótese. Neste contexto surge a necessidade urgente do lançamento de cultivares com algum nível de resistência, a introdução de fungicidas protetores no sistema produtivo e também de novos grupos químicos. Recentemente, as carboxamidas (SDHI – inibidores da succinatodesidrogenase) foram disponibilizadas
Sem aplicação
para aplicações em parte aérea na cultura da soja, sendo as primeiras registradas pertencentes à Basf (fluxapiroxade) e à Syngenta (benzovindiflupir – denominado solatenol). Embora pertençam ao mesmo grupo químico, tem se verificado nos testes experimentais grande heterogeneidade das moléculas em relação à eficácia e ao espectro de controle, principalmente em virtude do momento de aplicação e pressão de inóculo. Durante a safra 2013/14, em experimentos conduzidos no campus experimental da AgroCarregal Pesquisa e Proteção de Plantas,
Estrobilurina + triazol
Comparativo entre parcelas experimentais, à esquerda testemunha sem qualquer tratamento, aplicação de estrobilurina + triazol (centro) e emprego de azoxystrobina + solatenol (direita)
verificou-se a alta eficácia do fungicida Elatus (azoxistrobina + solatenol) para o controle da ferrugem asiática. O ensaio cooperativo foi semeado em 10 de dezembro de 2013, utilizando-se a cultivar Msoy 7739 RR Ipro. Foram realizadas apenas três aplicações, sendo a primeira em R1, a segunda 21 dias após a primeira (R4) e a terceira 14 dias após a segunda (R5.4). No momento da primeira aplicação havia sinais do patógeno (urédias) nas folhas do terço inferior da planta. Portanto, a aplicação foi realizada de forma curativa. Embora esse tipo de experimento não represente a recomendação oficial das empresas detentoras dos fungicidas, vem sendo conduzido há vários anos e tem como principal objetivo evidenciar a performance de cada produto isoladamente no controle da ferrugem asiática. Em todos os fungicidas foi utilizado o adjuvante recomendado pela empresa na dose também indicada. Avaliaram-se a severidade da doença e a seletividade dos fungicidas em R1, R3, R5.3 e R6, seguindo-se a escala diagramática proposta por Canteri e Godoy (2003). Calculou-se também a eficácia dos fungicidas, sendo separados em grupos de eficácia pelo teste de Scott-Knott a 5% de probabilidade. Ao término do experimento, com umidade de grãos corrigida a 13%, avaliaram-se o peso de mil grãos e a produtividade. Na Tabela 1, verifica-se que a severidade da doença na testemunha foi de 58,95% na última avaliação, enquanto que no me-
Azoxystrobina + solatenol
Soja - Agosto 2014 lhor tratamento foi de 10,35% (Elatus). Em relação ao agrupamento de eficácia, verificou-se a distinção dos produtos em nove grupos para a situação em que esse experimento foi conduzido. A eficácia variou de 8,69% a 82,44% (Tabela 2), o que evidencia a necessidade de se utilizar um produto realmente efetivo para o controle dessa doença. Ao se avaliar a produtividade, verificou-se para as condições desse experimento que a ferrugem asiática foi responsável por perdas superiores a 51% (Tabela 3). É importante ressaltar que houve forte estresse hídrico no mês de janeiro, o que foi determinante para a menor severidade da doença. A testemunha produziu 1.535,01sc/ha. O tratamento que apresentou maior produtividade foi aquele que recebeu pulverizações de azoxistrobina + solatenol (3.134,07sc/ha), seguido do tratamento contendo protioconazol (triazolinthione) + trifloxistrobina (estrobilurina) (2.837,33sc/ha). É importante salientar que a eficácia dos fungicidas poderá divergir da exposta na Tabela 2 no caso de a aplicação ser realizada de forma preventiva, sob menor pressão da doença, aumentando-se o número de aplicações ou seguindo-se os programas recomendados por empresa. A efetividade do manejo da doença não dependerá exclusivamente do fungicida em questão. Todas as medidas cabíveis deverão ser adotadas para reduzir o inóculo, inclusive durante a safra. Cumprir o vazio sanitário, principalmente eliminandose a soja tiguera, semear no início da época recomendada, optar por cultivares de ciclo mais curto, antecipar as primeiras aplicações, utilizandose preferencialmente produtos mais efetivos no controle da doença, são medidas fundamentais para o sucesso no controle. Fungicidas mais eficazes devem ser utilizados necessariamente nas primeiras aplicações, o que retarda o início da doença e possibilita o controle também efetivo de fungicidas menos eficientes nas últimas aplicações. Outra possibilidade que será
de vital importância para melhorar eficácia e, principalmente, preservar a vida útil dos produtos é a introdução de fungicidas protetores no sistema produtivo. Trabalhos conduzidos pela Universidade de Rio Verde em parceria com a Agro Carregal Pesquisa e Proteção de Plantas evidenciam que os fungicidas multissítios podem propor-
cionar aumento significativo na eficácia dos produtos. O fungicida com maior número de experimentos conduzidos até o momento é o mancozebe. Esses produtos só poderão ser utilizados pelos agricultores após registrados e liberados C para comercialização.
Luís Henrique Carregal, Universidade de Rio Verde
Tabela 2 - Agrupamento por eficácia de fungicidas em virtude severidade da doença pelo teste de Scott-Knott Agrupamento A B C D E F G
H
I
Eficácia relativa (%) 82,44 72,65 69,47 53,32 53,11 49,04 46,99 31,09 30,60 26,33 22,68 20,34 19,29 19,29 17,17 15,89 15,39 11,59 8,69
Fungicida azoxistrobina + solatenol Codificado 1 Protioconazol (Triazolinthione) + trifloxistrobina (estrobilurina) Picoxistrobina (estrobilurina) + tebuconazol (triazol) ciproconazol (triazol) + Picoxistrobina (estrobilurina) Codificado 2 Codificado 3 azoxistrobina (estrobilurina) + ciproconazol (triazol) fluxapiroxade (carboxamida) + piraclostrobina (estrobilurina) epoxiconazol (triazol) + piraclostrobina (estrobilurina) azoxistrobina (estrobilurina) + tetraconazol (triazol) azoxistrobina (estrobilurina) Codificado 4 ciproconazol (triazol) Codificado 5 tebuconazol (triazol) metconazol (triazol) + piraclostrobina (estrobilurina) azoxistrobina (estrobilurina) + flutriafol (triazol) Codificado 6
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Caderno Técnico: Soja Foto de Capa: Cultivar Circula encartado na revista Cultivar Grandes Culturas nº 183 - Agosto/14 Reimpressões podem ser solicitadas através do telefone: (53) 3028.2075 www.revistacultivar.com.br
Tabela 3 - Peso de mil grãos (g) e produtividade (kg ha-1) em função do controle químico de Ferrugem Asiática da soja. Universidade de Rio Verde, 2014 TRATAMENTOS 1-TESTEMUNHA 2- tebuconazol (triazol) 3- ciproconazol (triazol) 4- azoxistrobina (estrobilurina) 5-azoxistrobina (estrobilurina) + ciproconazol (triazol) 6-epoxiconazol (triazol) + piraclostrobina (estrobilurina) 7-ciproconazol (triazol) + Picoxistrobina (estrobilurina) 8-Protioconazol (Triazolinthione) + trifloxistrobina (estrobilurina) 9-Picoxistrobina (estrobilurina) + tebuconazol (triazol) 10-azoxistrobina (estrobilurina) + flutriafol (triazol) 11-metconazol (triazol) + piraclostrobina (estrobilurina) 12-azoxistrobina (estrobilurina) + tetraconazol (triazol) 13-fluxapiroxade (carboxamida) + piraclostrobina (estrobilurina) 14- Codificado 1 15- Codificado 2 16- Codificado 3 17- Codificado 4 18- Codificado 5 19- Codificado 6 20- azoxistrobina + solatenol C.V. (%)
Dose mL p.c. ou p.f.ha-1 500 300 200 300 500 300 400 500 500 500 500 300 600 500 250 580 800 500 200
PMG (g) 103,69 f 111,45 e 111,86 e 104,60 f 121,62 d 109,81 e 123,74 d 147,15 b 126,86 d 111,03 e 103,04 f 103,79 f 107,53 e 104,46 f 102,61 f 103,49 f 109,43 e 130,31 c 146,96 b 163,10 a 2,60
Médias seguidas pela mesma letra em cada coluna não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Scott-Knott a 5% de probabilidade.
Produtividade (kg ha-1) 1535,01 f 1631,23 f 1678,82 f 1607,91 f 1968,19 d 1749,63 f 2218,05 d 2837,33 b 2343,98 d 1585,52 f 1607,97 f 1708,67 f 1819,47 e 1672,61 f 1550,04 f 1579,05 f 1907,16 e 2270,42 d 2658,25 c 3134,07 a 5,34