ISSN 1677-0668
O economista...
Revista Editada pelo CORECON/DF ANO VI - Nº 22- ABR/JUN de 2005
ARTIGOS
...e sua capacidade de pensar e de traçar estratégias
Preços livres e sua contribuição para o controle da inflação Max Leno de Almeida
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Um perfil do curso de Economia, no Brasil e no Distrito Federal, com dados informativos e opiniões de coordenadores de cursos
Autonomia do BC: do que estamos falando? Carlos Alberto Ramos
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RESENHA A agenda inadiável da inclusão social José Valter Arcanjo da Ponte
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VEJA ENTREVISTA O engenheiro civil e Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados, José de Sena Pereira Júnior, fala sobre a relação benefício-custo favorável, dos riscos e dos supostos benefícios da Transposição do Rio São Francisco.
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Revista Editada pelo CORECON/DF - ANO VI - nº 22 - ABR/JUN DE 2005
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EDITORIAL ..........� ENTREVISTA
JOSE DE SENA Transposição das águas do Rio São Francisco ..............................................................................5 ESPECIAL O ECONOMISTA... ...e sua capacidade de pensar e de traçar estratégias ........................................................13 ARTIGOS MAX LENO DE ALMEIDA Preços livres e sua contribuição para o controle da inflação ..........................................16 CARLOS ALBERTO RAMOS Autonomia do BC: do que estamos falando? .....................................................................24 ELIACIR MARQUES PEREIRA Aspectos institucionais da Política Monetária ....................................................................37 RESENHA
A AGENDA INADIÁVEL DA INCLUSÃO SOCIAL O Atlas da Exclusão Social V .............................................................................................42
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EXPEDIENTE
EDITORIAL
Órgão Oficial do CORECON-DF Editor Responsável: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselho Editorial: Mônica Beraldo Fabrício da Silva, Roberto Bocaccio Piscitelli, Humberto Vendelino Richter, Maurício Barata de Paula Pinto, Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, José Roberto Novaes de Almeida e José Aroudo Mota. Jornalista Responsável: Daniela Lima - Reg. DRT/DF: 4926 Redação: Daniela Lima Editoração Eletrônica: Ars Ventura Imagem & Comunicação (61) 3273-1114 Impressão: Gráfica Plano Piloto Tiragem: 3.800 Periodicidade: Trimestral As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte. CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF Presidente: Mônica Beraldo Fabrício da Silva Vice-Presidente: Roberto Bocaccio Piscitelli Conselheiros Efetivos: Mônica Beraldo Fabrício da Silva, Roberto Bocaccio Piscitelli, Maurício Barata de Paula Pinto, Guidborgongne Carneiro N. da Silva, José Aroudo Mota, Victor José Hohl, Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira, Humberto Vendelino Richter e Maria Cristina de Araújo Conselheiros Suplentes: Newton Ferreira da Silva Marques, Max Leno de Almeida, Evilásio da Silva Salvador, Homero Gustavo Reginaldo Lima, José Luiz Xavier, José Luiz Pagnussat, Jusçanio Umbelino de Souza e Gilson Duarte dos Santos Equipe do CORECON: Iraídes Godinho de Sales, Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro. End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-1429 3964-8366 / 3964-8368 Fax: (61) 3964-8364 E-mail: corecondf@corecondf.org.br Site: www.corecondf.org.br Horário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas (sem intervalo)
No Brasil, é muito comum que certas idéias se transformem rapidamente em fatos incontestáveis, dependendo de quem as patrocine e do vazio em que se converteu o pensamento nacional. Com a visibilidade que tem o ex-Ministro Delfim Netto e o acesso que lhe assegurou a intimidade com o atual núcleo do governo, tudo isso aliado ao trabalho realizado pelas parcelas mais influentes da mídia, procurou-se convencer a opinião pública brasileira de que o déficit nominal zero é a nova solução. Estranho é que só agora se tivesse descoberto a fórmula para, finalmente, reduzir a taxa de juros. É interessante recordar que houve uma época em que o conceito relevante era o do déficit/superávit operacional. Depois, os acordos com o FMI consagraram o critério do déficit primário. Agora, enfim, o que importa é gerar um excedente que permita o pagamento integral das despesas de juros a cada mês, pois o aumento contínuo do superávit primário não teria sido suficiente para conferir a credibilidade suficiente, por parte dos credores – nacionais e internacionais – de que o governo tem a capacidade de arrochar o orçamento até o limite necessário para o pagamento de tudo o que seja exigido pelo mercado. Note-se que a meta de superávit primário veio crescendo ao longo dos anos, desde o Acordo com o FMI. Começou com 2,6% do PIB em 99 e, em 2004, chegou a 4,5%. A “lição de casa” foi bem cumprida: sempre logramos superar a meta, alcançando-se, por exemplo, no ano passado 4,61% do PIB. Este ano, até maio, estamos fazendo um superávit de 6,57% do PIB, ou R$ 50,3 bilhões, para uma projeção anual de R$ 83,6 bilhões. Temos, portanto, antecipado o cumprimento da meta. Porém, mesmo assim, se quiséssemos ter zerado a conta de juros este ano, teriam faltado, até agora, R$ 14,5 bilhões. O novo (?) argumento milagroso é o de que um superávit maior (total) reduziria o risco. A pressão pela aprovação da nova lei de falências também continha essa promessa. Ora, para aumentar o saldo entre receitas e despesas não-financeiras, o caminho do aumento da carga tributária parece estar descartado; há uma espécie de esgotamento no que concerne ao aumento de tributos, a par do compromisso assumido no projeto de lei de diretrizes orçamentárias, de estancar o limite da arrecadação das receitas administradas pela Secretaria da Receita Federal. De outra parte, a redução de despesas – e também há um compromisso quanto ao limite das receitas correntes não-financeiras – atingiria em cheio as despesas sociais, investimentos, remuneração de servidores e benefícios previdenciários. A medida estaria associada à duplicação das desvinculações de receitas orçamentárias, o que, certamente, não pouparia educação e saúde. O grande debate anunciado parece ter muito mais a finalidade de anunciar uma decisão já adotada ou, então, produzir um balão de ensaio para aferir a capacidade de resistência da sociedade, tão fragilizada, tão desorganizada. Muitos se perguntaram, nos dias seguintes, qual seria a duração desse novo sacrifício, e se ele lograria, efetivamente, afetar o nível da taxa de juros real e do spread mais elevados do mundo, e se não são outras as razões pelas quais, há tantos anos, exibimos situação tão pouco honrosa. Não fizemos moratória, mas o risco-país da Argentina se aproxima do brasileiro. Nosso processo de endividamento possui componentes próprios que não se explicam somente pela rolagem da própria dívida. Nosso sistema financeiro é excessivamente concentrado e poderoso. Por outro lado, a taxa de juros, no Brasil, serve para muita coisa, principalmente para o que não se consegue combater através de providências convencionais ou, talvez, mais vigorosas. Aqui, a taxa de juros parece constituir-se no único mecanismo de combate à inflação, mas também ajuda a atrair dólares, a manter o câmbio valorizado, e assim por diante. Esta prática é continuada, intensiva e extremada. O paradoxo é que, afinal, se é necessário aumentar o superávit para reduzir a taxa, reduzindo-se a taxa não seria necessário aumentar o superávit. Não haverá, então, um meio de abreviar o trajeto? Qual seria o primeiro passo para desatar o nó? A questão é mesmo de natureza estritamente econômica ou, muito mais, de caráter político e, quem sabe, de correlação de forças na sociedade? Os grandes beneficiários da atual situação têm de fato, interesse em revertê-la e estariam dispostos a fazê-lo por iniciativa própria?
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ENTREVISTA
Transposição das águas do Rio São Francisco O Jornal dos Economistas do Conselho Regional de Economia (CORECON/ DF) aborda a questão da Transposição do Rio São Francisco e entrevista José de Sena Pereira Júnior, engenheiro civil, sanitarista e Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados. José de Sena fala sobre a relação benefício-custo, dos riscos e dos supostos benefícios do projeto; mostra, ainda, a transposição como uma solução parcial para o problema da seca, sem maiores danos ambientais.
Entrevista: Daniela Lima Colaboração: Roberto Bocaccio Piscitelli
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JE/DF - Há mais de 100 anos a transposição do Rio São Francisco é cogitada. Desde o final do Império se fala em levar águas do Rio São Francisco para os Estados do Nordeste setentrional. Por que até hoje a transposição continua sendo um assunto tão comentado e não resolvido, seja no sentido de decidir-se pela realização da obra ou pelo sepultamento da idéia? José de Sena - Inicialmente, há que corrigir um erro semântico, talvez fruto da má comunicação do governo federal – do atual e do anterior. Não se trata de transposição do rio São Francisco, mas de água do rio São Francisco - uma parcela relativamente pequena da vazão do rio - para outras bacias hidrográficas com elevado déficit hídrico,
“O suprimento de energia elétrica, sempre foi um problema para o Nordeste, em parte resolvido com a construção da barragem de Sobradinho e a implantação da série de hidrelétricas que a seguem, hoje responsáveis por mais de 90% da eletri-cidade consumida na Região”.
idéia surgida já em meados do século XIX. Em minha opinião, a transposição só foi detalhada no nível de projeto de engenharia em razão dos grandes desníveis que terão de ser vencidos – 160 metros para as bacias do Nordeste setentrional, que inclui o Ceará, e cerca de 300 metros para as bacias do semi-árido situadas mais a leste (Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba). Os grandes desníveis exigem bombas de grande porte, com elevada demanda de energia elétrica. O limitante tecnológico das bombas só foi superado no primeiro quartel do século XX. O suprimento de energia elétrica, por outro lado, sempre foi um problema para o Nordeste, em parte resolvido com a construção da barragem de Sobradinho e a implantação da série de hidrelétricas que a seguem, hoje responsáveis por mais de 90% da eletricidade consumida na Região. A elevada demanda de eletricidade para a transposição – cerca de 300 MW de potência instalada – parece-me ainda um problema, pois a disponibilidade de energia elétrica no Brasil, em especial no Nordeste, é um limitante para empreendimentos que requerem grandes quantidades desse insumo. Desses dois fatores, além dos evidentes desafios técnicos e logísticos, decorrem custos elevados de implantação e de opera-
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ção do sistema de transposição. Isto sempre colocou em dúvida a sustentabilidade econômica da transposição, que só seria viável com fortes e contínuos subsídios públicos. A possibilidade de transposição foi estudada em detalhes pela primeira vez no início da década de 1980, quando o Ministro Mário Andreazza ocupava a pasta do Interior. À época foi concebido um projeto grandioso, que previa bombear cerca de 600 metros cúbicos por segundo, destinados a sustentar grandes projetos de agricultura irrigada. O alto custo das obras e o preço final da água inviabilizaram o projeto. Apesar dos limitantes naturais – distância e topografia -, dada sua situação geográfica e topográfica, o rio São Francisco será sempre a solução natural para suprir o déficit hídrico crescente de uma vasta parte do semi-árido do Nordeste setentrional. No São Francisco, com a regularização proporcionada pelo lago de Sobradinho, há disponibilidade de água, e os desníveis e distâncias a serem vencidos são muito menores do que os de outras alternativas, como a bacia do rio Tocantins. Em minha concepção, o projeto de transposição – ou de integração de bacias –, para ser eficaz, não pode limitar-se às questões de engenharia hidráulica, estas já equacionadas.
É necessário que ele inclua um arranjo administrativo que garanta que a água transposta vá ser levada aos locais e às pessoas que dela realmente precisam. Os efeitos mais dramáticos das secas são sentidos nas cidadezinhas, nas pequenas comunidades rurais, nas populações dispersas pelos sertões. Como a transposição será feita para cursos de água específicos, sem um sistema complementar de pequenas adutoras e uma gestão rigorosa, seus efeitos sobre a populações flageladas será nulo. Outro fato a ser considerado é o forte componente cultural associado aos efeitos das secas. A agricultura de subsistência praticada no Nordeste baseia-se no milho e no feijão, cultivares muito sensíveis às estiagens. Como a água transposta será cara, dificilmente seu uso será viável para esse tipo de agricultura. Penso que só usos de setores com maior capacidade de pagamento, como o consumo urbano e industrial, terão capacidade para pagar pela água transposta sem subsídios. Em minha opinião, portanto, a transposição de água do rio São Francisco para as bacias do semi-árido do Nordeste setentrional é uma questão de oportunidade, de viabilidade econômica, e de disposição da sociedade brasileira em subsidiar seus custos de implantação e operação, aspectos que têm
sido substituídos, nos debates, pela emoção, com fatos e dados relevantes omitidos, tanto por defensores, como por opositores do projeto. O déficit hídrico “per capita” de algumas áreas do Nordeste setentrional é um fato tecnicamente comprovado, que limita o desenvolvimento e até a melhoria dos padrões de vida de seus habitantes. A sociedade brasileira
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terá, mais dia menos dia, que decidir quando irá implantar a transposição, para onde e para quais usos. É muito difícil sepultar definitivamente a idéia. JE/DF - Quais são os principais riscos e os supostos benefícios de um projeto de transposição? José de Sena - A retirada de água do rio São Francisco pode-
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“Quanto aos usos atuais e futuros da água na bacia hidrográfica, poderá haver conflitos, embora as avaliações de demandas atuais e futuras apontem para um excedente que supera a demanda para a transposição. Há que considerar, ainda, que a maior parte da vazão demandada destina-se à irrigação, cujos processos vêm passando por rápida evolução tecnológica, tornando-os mais eficientes e menos consumidores de água”.
ria, em tese, causar efeitos nos fatores naturais e sócio-econômicos associados ao rio. Os fatores naturais são compostos pela água e pelos ecossistemas que dela dependem – flora e fauna aquáticas e terrestres. Os sócio-econômicos dizem respeito, principalmente, aos usos atuais e potenciais da água do rio São Francisco e seus afluentes, pela população de sua bacia hidrográfica. Qualquer análise nesse campo tem que começar pelo impacto
causado pela formação do lago de Sobradinho, a partir de 1978, que alterou profunda e definitivamente o regime de vazões e a vida aquática do São Francisco até seu estuário no Atlântico. O lago retém as enchentes e os sedimentos vindos do planalto mineiro e do oeste baiano, que não mais atingem o baixo curso do rio. A retenção de sedimentos empobrece a água de nutrientes que antes permitiam a reprodução e o crescimento de grandes cardumes de peixes de água doce, alterando a fauna e inviabilizando a pesca comercial e de subsistência. O amortecimento das enchentes acabou com o alagamento sazonal de áreas marginais e a formação de lagoas, inviabilizando atividades agrícolas tradicionais, como o cultivo do arroz em várzeas, principalmente nos Estados de Sergipe e de Alagoas. A combinação dos dois efeitos vem provocando a regressão progressiva dos bancos de sedimentos na foz, também afetando a fauna estuarina, com reflexos na pesca fluvial e marítima, prejudicando as condições de reprodução de peixes e outros animais marinhos. Em resumo, o baixo São Francisco, a partir de Sobradinho, foi transformado em canal que conduz vazões determinadas pela demanda de geração de eletricidade, com águas límpidas, decantadas em seu reservatório, quase imunes aos ciclos naturais das chuvas e da estiagem do
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alto curso do rio. Ressalte-se, no entanto, que a barragem foi uma opção estratégica, uma troca, a forma mais viável de produzir a energia elétrica de baixo custo financeiro que proporcionou condições de desenvolvimento à Região Nordeste. Pretende-se fazer a captação da água a ser transposta depois de Sobradinho, ou seja, numa parte do rio que já foi impactada e que já é condicionada, tanto qualitativa como quantitativamente, pela ação humana. A observação do curso do rio São Francisco, no mapa do Brasil, é bastante esclarecedora quanto aos prováveis efeitos da transposição. A vazão que se propõe transpor, que variará de 26 a 127 metros cúbicos por segundo, é proporcionalmente baixa em relação à vazão média regularizada por Sobradinho, que é de cerca de 2.800 metros cúbicos por segundo. A transposição dificilmente será a olho nu. Será como retirar 5cm de água de um tambor com um metro de altura. Quanto aos usos atuais e futuros da água na bacia hidrográfica, poderá haver conflitos, embora as avaliações de demandas atuais e futuras apontem para um excedente que supera a demanda para a transposição. Há que considerar, ainda, que a maior parte da vazão demandada destina-se à irrigação, cujos processos vêm passando por rápida evolução tecnológica, tornando-os mais eficientes e me-
nos consumidores de água. Os riscos, sob meu ponto de vista, estão na frustração de expectativas quanto aos efeitos da transposição na melhoria das condições de vida da população do semi-árido, pois parece-me que algumas questões importantes ainda não foram esclarecidas - pelo menos de público – pelos condutores do projeto, entre as quais destacamos: - o projeto de transposição é realmente uma prioridade nacional e regional? - o momento atual é o mais propício para a implantação do projeto, ou existem alternativas que permitem adiá-lo ou até mesmo não implantá-lo, levando-se em conta os efeitos que dele são esperados? - a aplicação dos mesmos recursos financeiros, previstos para o projeto de transposição, em outros projetos, alguns situados nas próprias margens do São Francisco e de seus tributários, não traria resultados mais substanciais para a sociedade nordestina – e brasileira – como um todo? - a água que será transposta irá realmente beneficiar as camadas mais necessitadas da população do semi-árido setentrional, contribuindo para uma efetiva redução das injustiças sociais que prevalecem nessa região? - não irá a água transposta servir para consolidar ainda mais o profundo fosso social existente na sociedade nordestina, benefi-
ciando prioritariamente quem já dispõe de recursos financeiros e tecnológicos para melhor aproveitá-la? - o alto custo da água transposta não inviabilizará seu uso em aplicações destinadas às camadas da população com baixa ou nenhuma capacidade de pagamento? Além dessas dúvidas, não foram divulgados, ainda, planos consistentes de utilização da água transposta, pois o projeto tem enfatizado apenas a parte de captação, bombeamento e transporte da água até as bacias receptoras. Questões como distribuição, utilização, custeio e remuneração carecem, sob meu ponto de vista, de melhor detalhamento. Tal fato é relevante, tendo em vista que os corpos de água receptores são, em geral, de domínio estadual. Sabendo-se que, via de regra, as instituições de gestão de recursos hídricos e de prestação de serviços públicos de abastecimento de água do Nordeste são institucionalmente frágeis, fica no ar a dúvida: existem, na Região, condições efetivas para aproveitamento da água transposta no curto prazo em que se pretende implantar o projeto de integração de bacias?
como uma solução parcial para o problema da seca, sem maiores danos ambientais? Atende a população e os setores mais carentes, inclusive dos diretamente atingidos com as obras? José de Sena - Em minha visão, dada a polêmica em torno do projeto, a sociedade brasileira ainda não obteve consenso sobre sua oportunidade, ou seja, se o momento atual é o mais propício para implantá-lo, ou se outros empreendimentos públicos seriam mais prioritários. Esta é uma questão extremamente relevante, por se tratar do Brasil, um país historicamente carente de recursos públicos para investimentos. A divisão é evidente até mesmo no Nordeste, região beneficiária do projeto.
JE/DF - O projeto que está sendo encaminhado pelo governo federal é viável e desejável? Tem uma relação benefíciocusto favorável? Apresenta-se
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“Dada a polêmica em torno do projeto, a sociedade brasileira ainda não obteve consenso sobre sua oportunidade, ou seja, se o momento atual é o mais propício para implantá-lo, ou se outros empreendimentos públicos seriam mais prioritários.
A relação custo-benefício dependerá dos usos que serão feitos da água transposta, se será dada prioridade ao abastecimento humano e a atividades econômicas que agreguem valores mais elevados. Para usos como a agricultura de subsistência, por outro lado, como já disse, serão
“O atendimento à população e aos setores mais carentes são, a meu ver, os aspectos em que pairam mais dúvidas. O aumento da oferta de água para abastecimento público urbano será um fator importante para estender esse serviço às populações hoje não atendidas, geralmente situadas nas periferias das grandes cidades”.
necessários fortes subsídios tanto na implantação como na operação do sistema de transposição. Ao aumentar consideravelmente a disponibilidade hídrica do semi-árido do Nordeste setentrional, a transposição, sem dúvida, contribuirá significativamente, embora não definitivamente, para resolver o velho problema das secas. Seus efeitos negativos sobre o meio ambiente natural tanto em relação ao rio São Francisco, como aos cursos de água receptores, não serão significativos, sob minha avaliação. O atendimento à população e aos setores mais carentes são, a meu ver, os aspectos em que pairam mais dúvidas. O aumento da oferta de água para abastecimento público urbano será um fator importante para estender esse serviço às populações hoje não atendidas, geralmente situadas nas periferias das grandes cidades. A criação de empregos, via viabilização de crescimento
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industrial e sustentabilidade de agricultura de ciclo longo, em geral de escala empresarial, também poderão gerar reflexos positivos para as populações mais pobres. No entanto, permanecem dúvidas quanto à possibilidade de a transposição beneficiar as populações dispersas pelo sertão, nas áreas rurais e pequenos vilarejos. Para isso, ela terá de ser complementada com um complexo sistema de adutoras e redes de distribuição, dotado de um eficiente processo de operação e manutenção, fortemente subsidiados com recursos públicos. Sem isto, as imagens mais chocantes da secas não serão eliminadas. A fase de obras do projeto de transposição será, talvez, uma das que mais benefícios trarão às populações menos favorecidas do Nordeste, pela quantidade de empregos que serão gerados, grande parte deles para mãode-obra não qualificada. Não se pode esquecer, todavia, que esta será uma fase transitória. JE/DF - As estimativas de custos apresentadas são realistas? Há recursos para financiar a obra, sem riscos de interrupção? José de Sena - Não tive acesso ao orçamento detalhado do projeto. Mas a estimativa de custo que vem sendo apresentada, de cerca de US$1,5 bilhão, perece-me compatível com as dimensões do empreendimento. Pelo que sei, até agora os únicos
recursos destinados ao projeto são do Orçamento Geral da União, que, como sabemos, não tem sido uma fonte muito segura em termos de continuidade. Sem financiamento de outras fontes - a história tem mostrado – haverá, sim, risco de interrupção das obras. JE/DF - Como ficariam os custos de manutenção do sistema de transposição de águas? Quem seriam os responsáveis? José de Sena - Este é outro ponto que não ficou ainda claro na divulgação do projeto. Como dissemos, a operação da transposição terá custo elevado, principalmente no item energia elétrica. Ainda não foi divulgado o arranjo institucional para gerir a operação do projeto, que deverá envolver os Estados e Municípios beneficiários e, muito provavelmente, órgãos e empresas estatais, como o DNOCS, a CODEVASF e a CHESF. Não será uma coordenação fácil, até porque envolverá a questão do rateio dos custos de operação e manutenção do empreendimento. JE/DF - O volume de recursos públicos direcionado para a transposição comprometeria os investimentos dos próximos governos nas demais regiões? José de Sena - Tudo depende das prioridades deste e dos futuros governos em termos de investimentos públicos e de contenção de despesas. Em meu
trabalho na Câmara dos Deputados, observo que a razão principal da oposição à transposição, vinda notadamente dos Estados da Bahia, Sergipe, Alagoas e parte de Minas Gerais, vem da opção de não dar continuidade a projetos situados na bacia do São Francisco, interrompidos por falta de recursos financeiros, que poderiam ser concluídos com muito menos dinheiro do que o que será nela investido. A má vontade do Comitê da bacia do São Francisco vem, em boa parte, dessa aparente opção do governo federal. Para os membros do comitê e seus representados, a opção preferencial – pelos menos na visão deles – pela transposição é uma decepção, dado o enorme estoque de demandas que poderiam ser atendidas com investimentos públicos na utilização da água da bacia do rio São Francisco na sua própria bacia, que está situada, em boa parte, no semi-árido e tem carências sociais e econômicas tão graves quanto às das áreas que serão beneficiadas pela transposição. Como observador externo, penso que o projeto de transposição não tem sido bem “vendido” à opinião pública e à população da bacia do São Francisco, em decorrência, talvez, da vontade de governo de implantá-lo em um tempo muito curto, o que é incompatível com suas dimensões, complexidade e conseqüências.
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“A operação da transposição terá custo elevado, principalmente no item energia elétrica. Ainda não foi divulgado o arranjo institucional para gerir a operação do projeto, que deverá envolver os Estados e Municípios beneficiários e, muito provavelmente, órgãos e empresas estatais, como o DNOCS, a CODEVASF e a CHESF. Não será uma coordenação fácil, até porque envolverá a questão do rateio dos custos de operação e manutenção do empreendimento”.
Quem tem informação tem poder Revista de Conjuntura, o melhor panorama sobre tudo que anda acontecendo.
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ESPECIAL
O economista...
...e sua grande capacidade de pensar e de traçar estratégias Daniela de Lima Pinto
A profissão de economista é disputada por centenas de jovens entre 17 a 19 anos, com a perspectiva de ocupar cargos de executivos, empresários, empreendedores, peritos, analistas, pesquisadores, professores, servidores públicos, ministros. Esses profissionais são ensinados a pensar e agir para solucionar questões econômicas que envolvem o País, as empresas, as finanças em geral. O economista aprende a lidar com números, modelos, simulações, cenários, a perceber mudanças, a traçar estratégias. Com um mercado de trabalho cada vez mais concorrido, o setor público é o principal empregador dos economistas brasileiros, através das empresas públicas estatais ou do Serviço Público. Mas as empresas privadas (nacionais e multinacionais) e o Terceiro Setor também são empregadores importantes. O mercado de trabalho em Brasília é um caso peculiar: de cada dez vagas para o nível superior, nove são no Serviço Público.
O chefe do Departamento de Economia do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), André Nunes, analisa o mercado de trabalho de Brasília, principalmente para os que acabam de sair da Universidade. Para ele, os advogados levam uma pequena vantagem, pois em alguns cargos há uma reserva de mercado. Entretanto, a vantagem é muito pequena, tendo em vista o exército de advogados que se formam a cada semestre, não apenas no Distrito Federal, mas no Brasil. Quanto às carreiras de Estado (excetuando a diplomacia e os militares), os economistas são, proporcionalmente, os que têm o mais elevado índice de aprovação nesses concursos. O último concurso para pesquisador do IPEA é um retrato claro dessa realidade, pois mais de 50% dos aprovados foram economistas. Apesar de todo o preparo intelectual que o curso de Economia oferece, a procura de jovens pelo Curso vem caindo nos últimos dez anos. Segundo reportagem da
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Folha de São Paulo, do dia 10 de abril, em 2003, pouco mais de 65 mil alunos estudavam Economia. Entre 1999 e 2003, o número de alunos matriculados caiu 14%. Os números podem ser conferidos nas estatísticas do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), entidade vinculada ao Ministério da Educação. Segundo o INEP, o número de matrículas, em 2002, nos cursos de Economia do Distrito Federal foi de 2.358 e do Brasil, de 63.375. Os principais motivos apontados por estudantes e especialistas para esta baixa procura são pouca oferta de emprego, baixa qualificação obtida nas faculdades e preferência por carreiras cujo dinamismo está mais presente hoje. “É um grande erro acreditar que o mercado de trabalho prefere um administrador ou um advogado (não obstante a reserva de mercado dos advogados) a um economista. O mercado de trabalho, cada vez mais, busca características que são inerentes às pessoas, e não aos carimbos. Isso é claro na seleção que as grandes empresas realizam. A área de graduação não é o mais relevante. A idéia de interdisciplinaridade e de competências múltiplas domina o mercado. É óbvio que, em algumas áreas, as especificidades são importantes. Mas, mesmo nesses casos, o que o aluno deveria preferir? Ser um dos quinze mil formados em Economia ou um dos 200 mil formados em Administração ou Direito?”, pergunta André Nunes. O professor fala também da opção dos alunos pelos cursos que não tenham Matemática ou
Matrículas na Educação Superior (Curso Economia - ano 2002) Brasil 63.375 Centro-Oeste 5.265 Distrito Federal 2.358 Fonte: MEC/INEP
Matrículas na Educação Superior (Curso Economia - ano 2002) Masculino (Brasil) Feminino (Brasil)
37.297 26.078
Fonte: MEC/INEP
Estatística. Segundo ele, essa aversão à Matemática tem causado grandes prejuízos à educação e ao desenvolvimento da pesquisa e da ciência no Brasil. “Os alunos fogem das graduações que tenham forte ênfase em Matemática e Estatística. Não há como esconder que a Economia depende de instrumentos matemáticos e estatísticos. A ciência depende desses instrumentos. É uma questão cultural, para a qual temos que encontrar um encaminhamento. Os tigres asiáticos mostraram que o caminho do desenvolvimento (científico, tecnológico, econômico) passa mais pela Matemática que pelo Direito. É uma questão de fazer a opção correta, e não a mais fácil”. Outra assunto polêmico entre os chefes e coordenadores dos cursos de Economia é com relação à rigidez ou não da Lei de Diretrizes Curriculares. Paulo Estêvão Tavares Cavalcante, professor e chefe do Departamento do Centro Universitário do Distrito Federal (UniDF), acredita em um avanço em termos de flexibilidade, permitindo mais variações nos cursos de Economia. “As recentes mudanças nas
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diretrizes curriculares foram objeto de audiência pública em que participaram vários segmentos interessados na área. O que me parece existir é um certo conservadorismo por parte da comunidade acadêmica de Economia em geral. Este conservadorismo em parte origina-se do padrão de reprodução do conhecimento em Economia. A maioria dos doutores em Economia foram formados nos EUA e, muitas vezes, ao voltarem costumam apegar-se aos padrões de ensino e metodologia das universidades americanas. O problema é que os padrões em que se baseiam são os do doutorado em Economia, que se caracterizam por um foco excessivo na teoria econômica”, declara o professor. Cursos de Economia no Distrito Federal A faculdade que pretenda ser um centro de excelência, principalmente um centro universitário, não deveria deixar de oferecer o curso de Economia, pois é a Economia a responsável pelo núcleo das pesquisas em ciências sociais aplicadas. Mas as faculdades que
oferecem o curso de Economia em Brasília, são em número cada vez menor. Esta conclusão foi de uma reunião com os coordenadores dos cursos de Economia no Distrito Federal, realizado no CORECON-DF. Para eles, a estimativa não é muito boa; em um prazo de dois anos existirão apenas três faculdades privadas oferecendo o curso de Economia. De acordo com o chefe do Departamento da Universidade de Brasília (UnB), Joaquim Pinto de Andrade, 400 alunos cursam Economia hoje na UnB. Em 2004, a concorrência no vestibular para Economia foi de cinco por vaga. Segundo ele, deveriam existir mais disciplinas voltadas para o funcionamento de empresas, e propõe ainda que a Economia se torne uma área de concentração em outros cursos. “Hoje é preciso muito menos macroeconomistas do que microeconomistas. A idéia seria dar mais ênfase às disciplinas voltadas para a organização industrial”, afirma. Joaquim de Andrade diz que, nos EUA, a Economia não é reconhecida como profissão, e sim como uma área de concentração, com ênfase nos cursos de mestrado e doutorado. O ajuste perfeito para o professor seria a introdução de aspectos administrativos no curso de Economia, e vice-versa. A vice-coordenadora do curso de Economia da Universidade Católica de Brasília (UCB), Júnia Rodrigues de Alencar, declarou que, no segundo semestre de 2004, existiam 415 alunos matriculados em Economia. Júnia
“O fundamental para o crescimento do Curso é oferecer aos alunos uma formação instrumental que garanta o desenvolvimento do raciocínio lógico (matemático, estatístico e econométrico) e privilegie a formação teórica, histórica e da realidade brasileira que garanta o desenvolvimento da capacidade de pensar, de compreender e de se ajustar ao ambiente de mudanças. Adequar a oferta do curso de Economia à soberania do mercado. Conseguir uma forma de, sem reduzir a qualidade dos cursos, sinalizar ao mercado que a teoria estudada nos bancos escolares de Economia é um instrumento poderoso para entender o funcionamento dos mercados e o comportamento dos consumidores. Mostrar aos jovens que os instrumentos quantitativos, a Matemática e a Estatística são importantes aliados, não inimigos de suas carreiras profissionais”. de Alencar declarou que, para a Universidade, o fundamental para o crescimento do Curso é oferecer aos alunos uma formação instrumental que garanta o desenvolvimento do raciocínio lógico (matemático, estatístico e econométrico) e privilegie a formação teórica, histórica e da realidade brasileira que garanta o desenvolvimento da capacidade de pensar, de compreender e de se ajustar ao ambiente de mudanças. Adequar a oferta do curso de Economia à soberania do mercado. Conseguir uma forma de, sem reduzir a qualidade dos
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cursos, sinalizar ao mercado que a teoria estudada nos bancos escolares de Economia é um instrumento poderoso para entender o funcionamento dos mercados e o comportamento dos consumidores. Mostrar aos jovens que os instrumentos quantitativos, a Matemática e a Estatística são importantes aliados, não inimigos de suas carreiras profissionais. O sucesso, então, viria para todos e o País continuaria ganhando executivos, empresários, empreendedores, peritos, analistas, pesquisadores, professores, servidores públicos e ministros.
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ARTIGO
Preços livres e sua contribuição para o controle da inflação Max Leno de Almeida *
Um dos principais objetivos estabelecidos nos últimos anos em se tratando de política econômica tem sido a busca por patamares mais reduzidos de inflação. Tal prática se intensificou, sobretudo, a partir da edição do Plano Real, em 1994, e vem sendo aprofundada sucessivamente pelos governos desde então. Vários instrumentos foram, assim, utilizados na tentativa de reduzir e manter os índices de inflação em patamares mais reduzidos, desde uma política cambial mais agressiva até o atual sistema de metas de inflação monitorado pelo Banco Central. Na prática, a adoção do regime de metas para a inflação obrigou o Banco Central, na condução da política monetária, a dispor do máximo de informações sobre a tendência e as expectativas para as várias medidas de inflação. Nesse aspecto, a expectativa acaba sendo enorme por parte dos agentes econômicos em relação às divulgações dos 1
índices de custo de vida pelos vários institutos de pesquisa, já que têm sido os balizadores das decisões do Banco Central no que tange à definição da taxa de juros referencial do mercado, a Taxa Selic. Além disso, sempre que os índices de inflação são divulgados surge a seguinte pergunta: de quem é a culpa pelas altas nos preços? E nesse caso, evidentemente, podem ser listados vários elementos que influem no comportamento dos preços dos bens, produtos e serviços pesquisados, principalmente relacionados a condicionantes internas e externas. Dentre esses vários fatores que interferem nos índices de inflação, podem ser apontados, por exemplo, alguns focos de pressão, tais como: os produtos cotados em dólar (como é o caso das commodities), os bens que possuem componentes importados, excesso de emissão de moeda, aumento dos impostos,
desarranjo da ordem econômica mundial, poder dos monopólios e dos oligopólios. Há, como visto, inúmeros elementos que podem influir no resultado final da inflação divulgada pelos diversos institutos de pesquisa, mas não se pode esquecer também do comportamento dos preços administrados, bem como dos preços livres, considerados como aqueles em que prevalecem, para determinação de seus preços, os mecanismos de mercado. Vale dizer ainda que os preços livres podem ser influenciados pelo comportamento dos mercados considerados oligopolizados1 e também dos concorrenciais. Há uma dificuldade em se estabelecer, até mesmo conceitualmente, a diferença precisa entre o que se pode considerar como preços oligopolizados e concorrenciais. É nesse aspecto que grande parte das análises dos índices de inflação é dividida entre preços livres e monitorados.
Sem entrar � mercado,� forma de organização de mercado, nas economias capitalistas, em que uma empresa domina a oferta de determinado produto ou serviço.
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Ainda assim, apesar de tal dificuldade, analisando-se os resultados do ICV-DIEESE2, tentou-se, a partir dos itens que o compõem, estabelecer aqueles que podem fazer parte dos mercados administrados, oligopolizados e concorrenciais. Nesse caso, verificou-se que, segundo informações de maio de 2005, o peso dos produtos concorrenciais no índice final apurado representou mais de 63% do índice final, enquanto os bens e serviços administrados tiveram uma participação de 22,2%. Já os produtos do chamado mercado oligopolizado3 representaram 14,7% do índice total divulgado pelo DIEESE. Analisando-se a variação anual (junho/04 a maio/05), percebe-se que o ICV acumulou no período 8,5%, sendo que as maiores contribuições para a totalização desse índice ocorreram justamente nos preços dos produtos dos mercados administrados e concorrenciais, com participação de 3,3% no índice total. No que tange aos produtos oligopolizados, os mesmos tiveram peso de 1,9% no ICV anual. A despeito de a contribuição na composição do índice ter sido inferior à dos demais segmentos, a variação dos itens que compõem o mercado de produtos oligopolizados foi de 12,4% no período analisado, sendo inferior à dos bens administrados, em que a variação foi de 14,8%, mas superior comparativamente 2
3
4
Tabela 01 – Variação dos preços administrados, oligopolizados e concorrenciais do ICV-DIEESE Mercados
Peso em maio/05
Contribuição
Variação anual (junho/04 a mai/05)
Administrados
22,2%
3,3%
14,8%
Oligopolizados
14,7%
1,9%
12,4%
Concorrenciais
63,1%
3,3%
5,3%
100,0%
8,5%
8,5%
Total global Fonte: ACV-DIEESE
ao que ocorreu no mercado de produtos concorrenciais, em que o crescimento foi de 5,3% (ver tabela 01). Em função da dificuldade já mencionada em relação à classificação dos produtos como pertencentes aos mercados concorrenciais e oligopolizados, grande parte dos institutos de pesquisa procura, em suas análises, efetuar duas grandes divisões, que serão examinadas a seguir, correspondendo à discriminação de preços ao consumidor pelos preços livres e os monitorados. Não se pode esquecer também que há uma série de parâmetros implícitos nas medidas de inflação ao consumidor, que as diferenciam, o que acarreta resultados diferentes entre os índices, tais como: a região/cidade e a faixa de renda da população coberta; a pesquisa de orçamentos familiares (POF) que identifica a cesta de consumo da população da região e da faixa de renda selecionada; a metodologia empregada no cálculo, de
forma a combinar em uma única medida estatística a variação dos preços do conjunto de bens e dos serviços pesquisados; a definição da periodicidade e das fontes para a coleta de preços (tipo e tamanho de pontos comerciais, coleta de informações de preços de serviços e aluguéis, entre outras). Sendo assim, para efeito de análise, adotou-se o IPCA4, por ser considerado, inclusive, o índice mais relevante do ponto de vista da política monetária, já que foi escolhido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) como referência para o sistema de metas para a inflação, implementado em junho de 1999. Quanto aos resultados, verificou-se que a inflação, segundo o IPCA, apresentou comportamentos bastante distintos nos últimos anos. Enquanto no ano de 2003 a variação foi de 9,3%, no ano de 2004 o IBGE registrou o índice de 7,6%, ou seja, aproximadamente dois pontos percentuais abaixo.
Índice de Custo de Vida calculado pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) no Município de São Paulo. A despeito da dificuldade em estabelecer os produtos considerados como pertencentes ao mercado oligopolizado, levaram-se em conta, para efeito de classificação, alguns produtos de limpeza doméstica, higiene e beleza, domicílio e farmacêuticos, além de planos de saúde e cigarros. O IPCA é c� fonte, e abrange nove regiões metropolitanas do País, além dos municípios de Goiânia e Brasília.
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Nota-se, inclusive, que em ambos os anos os preços monitorados foram os que exerceram maior pressão sobre o índice final. Ademais, percebe-se que a participação na composição do índice total em 2004 teve uma mudança de comportamento tanto em relação aos preços livres como também dos monitorados. Quanto aos preços livres, percebe-se uma queda na participação do índice final, de 71% para 61% em 2004, enquanto os preços monitorados tiveram seu peso aumentado de 2003 para 2004, passando de 28% para 38% (ver tabela 02). Ainda assim, a variação dos preços livres foi responsável por aproximadamente 4,7 p.p. da inflação de 2004, sendo que o peso dos preços monitorados correspondeu a 2,9 pontos percentuais. Verificou-se que em 2004 os preços livres foram influenciados positivamente pela oferta favorável de produtos agrícolas, com recuos nos preços do arroz, alimentos in natura e óleo de soja, com conseqüente diminuição da variação dos preços no
“Em 2004 os preços livres foram influenciados positivamente pela oferta favorável de produtos agrícolas, com recuos nos preços do arroz, alimentos in natura e óleo de soja, com conseqüente diminuição da variação dos preços no grupo “alimentação”, passando de 7,5% (em 2003) para 3,9% no ano de 2004”. grupo “alimentação”, passando de 7,5% (em 2003) para 3,9% no ano de 2004 (ver tabela 03). Outro fator importante foram os efeitos da apreciação cambial evidenciados pelo comportamento dos preços dos bens comercializáveis e dos bens não-comercializáveis internacionalmente. Em 2004, os itens comercializáveis apresentaram variação menor que a ocorrida em 2003, sendo que os não-co-
mercializáveis praticamente se mantiveram confrontando-se as informações de 2004 com as de 2003. Por conta de itens que são reajustados pela inflação do ano anterior, evolução dos preços internacionais do petróleo e também da elevação dos preços das commodities metálicas, como ferro e aço, não houve uma desaceleração maior dos preços livres em 2004.
Tabela 02 – Preço ao consumidor Variação 2003
2004
Contribuição 2004
Participação (em %)
100,0
9,3
7,6
7,6
100,0
71,1
7,8
6,5
4,7
61,3
Comercializáveis
40,1
8,7
6,3
2,5
33,3
Não-comercializáveis
31,0
6,7
6,9
2,2
28,0
28,9
13,2
10,2
2,9
38,7
Discriminação
Pesos
IPCA Livres
Monitorados Fonte: IBGE
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Tabela 03 – Preço ao consumidor – variação dos itens componentes do IPCA Grupos
Pesos
Variação 2003
2004
Contribuição 2004
Participação (em %)
Alimentação e bebidas
23,1
7,5
3,9
0,9
11,8
Habitação
16,6
12,3
7,1
1,2
15,5
Artigos de residência
5,6
6,9
5,4
0,3
4,1
Vestuário
5,2
10,2
10,0
0,5
6,8
Transportes
21,2
7,3
11,0
2,3
30,7
Saúde e cuidados pessoais
10,5
10,0
6,9
0,7
9,5
Despesas pessoais
9,1
9,6
6,9
0,6
8,3
Educação
4,8
10,2
10,4
0,5
6,4
Comunicação
3,8
18,7
13,9
0,5
6,8
Fonte: IBGE
Sabe-se que o efeito da inflação passada está mais presente no grupo de preços monitorados por conta justamente da indexação contratual de grande parte das tarifas públicas, mas tal fato pode ser observado também no grupo de preços livres, particularmente no item cursos, que engloba matrícula e mensalidade escolar. Além disso, apesar de o reflexo da elevação dos preços internacionais do petróleo ser, da mesma forma, maior nos preços dos segmentos monitorados, ainda assim tal fator foi determinante da elevação dos preços livres, já que o aumento no preço do barril de petróleo provocou alterações nos preços de insumos químicos e de matérias plásticas no atacado, com reflexos sobre os preços ao consumidor de bens que têm relação com tais matérias-primas. Nesse aspecto, por conta do aumento nos preços do grupo formado por matérias plásticas e insumos químicos, os produtos
que utilizam insumos dessa cadeia elevaram-se 6,4% em 2004 no varejo. Vale lembrar que, tomando-se como referência o IPCA do IBGE, esses produtos referem-se aos itens: artigos de limpeza e de plástico, calçados e acessórios, higiene pessoal etc. Já no atacado, correspondem aos itens: química, produtos de matérias plásticas, pneus, câmaras e mangueiras. Conforme já mencionado, os preços das commodities me-
tálicas também apresentaram, por conta do crescimento da economia mundial, aumentos representativos em 2004, ocasionando impacto nos preços ao consumidor nos produtos pertencentes à cadeia de ferro, aço e derivados. Em 2004, para se ter uma idéia, o incremento ocorrido nos preços dos bens de consumo durável foi de 8,9%, com destaque para a variação de 13,7% no preço do automóvel novo.
“Os preços das commodities metálicas também apresentaram, por conta do crescimento da economia mundial, aumentos representativos em 2004, ocasionando impacto nos preços ao consumidor nos produtos pertencentes à cadeia de ferro, aço e derivados”.
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Outro detalhe importante é que os preços dos produtos que utilizam insumos dessa cadeia registraram, em 2004, aumentos de 32,9% no atacado e de 10,5% no varejo. Nesse caso, tomando-se o IPCA como parâmetro, fazem parte da composição dos produtos no varejo os itens: reparos (material), utensílios para cozinha, aparelhos eletroeletrônicos, automóveis novos e usados, motocicletas, camionetas etc. No atacado, correspondem aos itens: metalúrgica, mecânica, material elétrico, móveis de aço e material de transporte. Percebe-se ainda que a influência dos choques do petróleo e das commodities metálicas em 2004 pode ser evidenciada com a exclusão desses grupos da variação dos preços livres no IPCA. Excluídos esses dois grupos do cômputo da inflação dos preços livres, esta teria sido de 5,9% no ano, segundo o IBGE, variação essa inferior aos 6,5% registrados.
“O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) aumentou 0,87% em abril, ante 0,61% em março. Com esse resultado, a variação no ano havia atingido 2,68% e a acumulada em doze meses, 8,07%”. Resultados mais recentes Quanto aos resultados mais recentes, segundo a última ata do COPOM, verificou-se que os índices de preços ao consumidor mostraram elevação em abril5, por conta da aceleração dos preços livres e da manutenção da variação dos itens com preços monitorados em patamar elevado. No atacado, o resultado de
“Em abril, o conjunto de preços livres considerados no cálculo do IPCA sofreu um aumento de 0,76%, frente a 0,33% registrados no mês de março, respondendo, assim, por 0,53 p.p. da variação do índice no período”.
5
Última informação contida na referida ata.
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abril foi fortemente influenciado pela queda dos preços agrícolas, após a alta observada no bimestre fevereiro–março, movimento que se sobrepôs à moderada aceleração nos preços industriais. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) aumentou 0,87% em abril, ante 0,61% em março. Com esse resultado, a variação no ano havia atingido 2,68% e a acumulada em doze meses, 8,07%. No mês, o conjunto de preços livres considerados no cálculo do IPCA sofreu um aumento de 0,76%, frente a 0,33% registrados no mês de março, respondendo, assim, por 0,53 p.p. da variação do índice no período. O grupo “alimentação e bebidas” variou 0,81% e contribuiu com 0,18 p.p. para o resultado do mês. Outra pressão importante, de 0,13 p.p., adveio do aumento dos medicamentos. Os preços monitorados e administrados por contrato variaram
1,14%, respondendo por 0,34 p.p. da variação do índice, com destaque para o impacto da elevação das tarifas de ônibus urbano em três capitais, que contribuiu com 0,13 p.p. para o resultado do mês. Destacou-se, ainda, a contribuição de 0,1 p.p. dos acréscimos nas contas de energia elétrica em cinco regiões, referentes aos reajustes anuais, aumentos na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e reajustes no valor da contribuição de iluminação pública. Já em relação ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA - do mês de maio6, nota-se que houve uma variação de 0,49%, ficando 0,38 ponto percentual abaixo da taxa de 0,87% do mês anterior (ver tabela 04). Os medicamentos tiveram alta de 1,81% e, mesmo com menor crescimento em relação a abril (3,26%), constituíram-se na maior contribuição individual no IPCA, 0,07 ponto percentual. Nesses dois meses, abril e maio, os preços dos medicamentos ficaram, em média, 5,13% mais caros, expressando reajuste autorizado pela Câmara de Regulação de Medicamentos sobre produtos controlados. A energia elétrica teve alta um pouco menor: de 2,22% em abril passou para 1,78%. Foram quatro as regiões com aumento, concentrando, além de reajustes contratuais anuais, aumentos na
6
Tabela 04 – IPCA – Total e por itens Variação Abril/05
Maio/05
Variação no ano Jan a Mai/05
TOTAL
0,87
0,49
3,18
Alimentação e bebidas
0,81
0,65
3,02
Habitação
0,83
0,65
3,39
Artigos de residência
0,52
0,58
2,80
Vestuário
0,92
1,45
3,02
Transportes
1,08
-0,04
3,13
Saúde e cuid.pessoais
1,55
1,06
3,72
Despesas pessoais
0,45
0,34
2,39
Educação
0,14
0,09
6,34
Comunicação
0,67
-0,17
0,77
Grupos
Fonte: IBGE
alíquota de ICMS incidente sobre as tarifas. Os ônibus urbanos que, junto com os medicamentos, haviam exercido os principais impactos no índice de abril, também mostraram menor crescimento: de 2,57% passaram para 0,82% em maio. Os alimentos tiveram alta de 0,65%, ao passo que em abril a taxa havia sido ainda maior,
0,81%, sendo que alguns produtos passaram a custar menos. Quanto aos combustíveis, ficaram mais baratos. O álcool chegou a ter queda de 5,42% em seus preços, enquanto a gasolina caiu 0,64%. Além disso, o gás de cozinha teve redução de 0,46%. Por outro lado, os artigos de vestuário subiram 1,45%, constituindo-se no grupo de maior variação no mês.
“Em abril, os combustíveis ficaram mais baratos. O álcool chegou a ter queda de 5,42% em seus preços, enquanto a gasolina caiu 0,64%”.
Último dado divulgado pelo IBGE até a elaboração deste artigo.
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Desta forma, observa-se que o menor crescimento na taxa de variação de itens com preços administrados (ou controlados), aliado à variação nos alimentos e à queda nos preços dos combustíveis, levou à redução do IPCA de abril para maio. Com o resultado de maio, o IPCA acumulou 3,18% no ano, superior ao percentual de 2,75% registrado em igual período de 2004. Nos últimos doze meses, o índice foi de 8,05% e ficou próximo ao dos doze meses imediatamente anteriores, 8,07%. Em maio de 2004, a taxa mensal foi 0,51%. Avaliação futura da inflação A partir da ata do BACEN, verifica-se ainda uma avaliação das tendências futuras de inflação. Para tanto, trabalhou-se com algumas hipóteses, na tentativa de traçar um cenário inflacionário para 2005. Nesse caso, as projeções para a inflação são apresentadas em dois cenários principais: o de referência e o de mercado.7 Considera-se, por exemplo, que as projeções para os reajustes totais nos preços da gasolina e de gás de botijão para 2005 ficam mantidas em valor igual ao da reunião anterior ocorrida, 0%, apesar da alta volatilidade que vêm experimentando os preços do petróleo. Em relação às tarifas de telefonia fixa, as projeções de reajustes para 2005 sofreram
7
“A partir das hipóteses do cenário de referência, que incluem o patamar da taxa de juros em 19,5% ao ano e da taxa de câmbio em nível próximo ao que prevalecia na véspera da reunião do Copom (R$2,50), concluiu-se que as projeções de inflação estão acima do objetivo de 5,1% para 2005, mas abaixo da meta para 2006”. elevação de 0,7 p.p., passando de 7,9%, na reunião de abril, para 8,6% atualmente. Já as projeções de reajustes das tarifas de energia elétrica residencial foram mantidas em 10,8%, considerando-se o acumulado para 2005. Quanto ao conjunto total de itens administrados por contrato e monitorados, com peso de 29,6% no IPCA de abril, projetou-se um aumento de 7,3% para todo o ano de 2005, valor 0,1 p.p. maior que os 7,2% projetados na reunião anterior. Há ainda projeções de reajuste do conjunto dos itens administrados por contrato e monitorados para 2006, baseada no modelo de determinação
O cenário de ref� cenário de merca� mercado às vésperas da reunião do Copom.
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endógena de preços administrados, sendo que, no caso, não houve alteração, permanecendo em 5,1%. Esse modelo, por sinal, considera componentes sazonais, variações cambiais, inflação de preços livres e inflação medida pelo Índice Geral de Preços (IGP). Dessa maneira, a partir das hipóteses do cenário de referência, que incluem o patamar da taxa de juros em 19,5% ao ano e da taxa de câmbio em nível próximo ao que prevalecia na véspera da reunião do Copom (R$2,50), concluiu-se que as projeções de inflação estão acima do objetivo de 5,1% para 2005, mas abaixo da meta para 2006.
Quanto ao cenário de mercado, que incorpora as trajetórias para as taxas de câmbio e da Selic esperadas pelos agentes do mercado na véspera da reunião do Copom, de acordo com os dados da pesquisa realizada pela Gerência-Executiva de Relacionamento com Investidores (Gerin) do Banco Central do Brasil, as projeções se encontram acima do objetivo de 5,1% para 2005 e acima da meta de 4,5% para 2006. Apesar da tentativa de se projetar os cenários inflacionários possíveis para esse ano bem como para 2006, não se pode negar que a trajetória da inflação dependerá marcadamente dos desdobramentos atuais e futuros no que diz respeito à incerteza sobre a ampliação da capacidade produtiva da economia para
atender ao eventual aumento da demanda por bens e serviços, bem como das incertezas que se têm acentuado no cenário externo em relação ao deslocamento para cima da curva de juros futuros nos Estados Unidos, assim como da escalada do preço internacional do petróleo e do aumento dos preços das commodities agrícolas, além das condições de liquidez e estabilidade dos mercados sinalizadas pelo quadro macroeconômico nos países industrializados.
Ademais, fatores que podem contribuir para arrefecer as pressões inflacionárias, tais como os sinais de desaceleração no ritmo de crescimento da economia, a queda nos preços industriais no atacado, a reavaliação das expectativas de mercado para a trajetória da taxa de câmbio e a postura mais restritiva de política monetária, são elementos importantes, que poderão influir de forma direta ou indireta no comportamento dos preços livres e dos monitorados.
* Max Leno de Almeida Mestre em Economia pela UCB, Assessor Técnico do DIEESE na CONDSEF e Conselheiro do CORECON/DF
Referências Bibliográficas BANCO CENTRAL DO BRASIL. “Preços Administrados”, Série Perguntas mais freqüentes, fevereiro de 2005, Diretoria de Política Econômica; BANCO CENTRAL DO BRASIL. “Ata do COPOM”. Data: 17 e 18/05/2005; BANCO CENTRAL DO BRASIL. “Índices de Preços”, Série Perguntas mais freqüentes. Diretoria de Política Econômica; BANCO CENTRAL DO BRASIL. “Relatório de Inflação”, março/05, v. 7, n° 1; BANCO CENTRAL DO BRASIL. “Relatório de mercado - Gerin”, junho/05; DIEESE, “Alta nos alimentos prejudica população de baixa renda” – mimeo – ICV- Índice de Custo de Vida. São Paulo, 06 de junho de 2005; INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. “Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor –INPC, IPCA” – mimeo, maio de 2005; INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. “Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor –INPC, IPCA” – mimeo, abril de 2005;
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ARTIGO
Autonomia do BC: do que estamos falando? *Carlos Alberto Ramos Keynes afirmou que um homem público é, inconscientemente na maioria das vezes, escravo de algum economista.1 Esta afirmação parece particularmente válida no caso do atual debate sobre a autonomia do Banco Central (BC). Alguns são radicalmente contra, outros radicalmente a favor, não poucos contra ou a favor com nuances, sem, na maioria das vezes, saber exatamente a fundamentação e o alcance de suas posições e, sobretudo, os conflitos com posições tomadas em outras matérias. Por exemplo, não é incomum identificar indivíduos que, de forma simultânea, incentivam intervenções no mercado de câmbio para segurar o valor do dólar em patamares que tornem competitivas as exportações e, simultaneamente, se apresentam como ferrenhos defensores da autonomia do BC. Esses 1
dois objetivos são compatíveis? De qual autonomia estamos falando? Nosso objetivo neste artigo consiste, justamente, em apresentar os marcos analíticos que fundamentam a conveniência de um BC autônomo e sua perspectiva em termos da evolução do debate, a complexidade do problema e as alternativas possíveis. Dado esse objetivo, estrutura-se o artigo da seguinte forma: na próxima Seção, colocaremos a questão da autonomia do BC desde uma perspectiva analítica de longo prazo, identificando a questão do status da principal autoridade monetária de um país como um aspecto particular de um paradigma dominante, que identifica no desenho das instituições de uma economia um dos aspectoschave para entender a potencialidade de crescimento; na Seção II, desenvolvem-se as distintas
formatações que um projeto de autonomia pode ter, concluindo que, ainda que concordando na questão da autonomia, essa denominação pode ocultar projetos quase antagônicos. I. Instituições de Desenvolvimento. I.1. As Modernas Explicações do Desenvolvimento. Há várias décadas que as idéias sobre as origens da riqueza das nações superaram os modelos mais simplistas que faziam uma correlação direta entre o PIB per capita, os recursos naturais, a acumulação de capital físico e mão-de-obra. A tecnologia foi o primeiro elemento a ser incorporado, com um certo esforço por entender as raízes (econômicas) do desenvolvimento técnico. A educação da
Concretamente, a frase de Keynes foi: “Os homens objetivos que se julgam livres de qualquer influência intelectual são, em geral, escravos de algum economista defunto” (Keynes, J.M. Teoria Geral do emprego, do Juro e da Moeda. S. Paulo, Editora Atlas. 1982. Pág. 291).
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força de trabalho (a “qualidade” da mão-de-obra, e não sua quantidade) foi outro fator a ser identificado, tanto nos arcabouços teóricos, como nas verificações empíricas, sendo hoje o capital humano acumulado por uma sociedade uma das variáveis mais usualmente mencionadas como propulsoras do desenvolvimento. Contudo, ainda que essas sofisticações interpretativas tenham tornado os modelos mais realistas, com maior aderência às séries históricas, em todos os casos as respostas não eram inteiramente satisfatórias. Faltavam variáveis para explicar, na sua integralidade, os diferenciais de renda entre países. Nessa procura por identificar outras variáveis (o misisng link), as pesquisas se direcionaram a dimensões um tanto etéreas, como capital social e instituições, com amplas dificuldades na sua definição e no tratamento econômico das mesmas. As obras de Douglas North e Mancur Olson, para ficar nos dois talvez mais conhecidos, são uma referência incontornável.2 A questão era simples: reduzir o processo de desenvolvimento a uma questão de agentes, que, maximizando determinadas funções, explicam a totalidade de mundo econômico era uma simplificação que pouco ajudava a entender a performance (ou melhor, o diferencial na performance) dos países. Como os atores intera-
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“A discussão da autonomia do BC deve situar-se, assim, nesse contexto. Essa autonomia seria uma das múltiplas instituições que hoje são vistas como “facilitadores” ou que ampliam aspossibilidades de crescimento”.
gem e se organizam, quais são as regras que regem o intercâmbio e dão estabilidade e previsibilidade às decisões, quais são os mecanismos para arbitrar os conflitos etc. são elementos que vão sendo paulatinamente incorporados aos modelos teóricos, às verificações empíricas e às recomendações de política. Assim, as explicações do crescimento de longo prazo incorporam variáveis que antes pareciam ser campo de pesquisa de disciplinas (Ciência Política, Sociologia etc.) com poucos contatos com a denominada Ciência Econômica. Observa-se, assim, que a corrupção tem desdobramentos sobre as potencialidades de crescimento (maior corrupção = menor crescimento).3 A definição
dos direitos de propriedade, a previsibilidade nos contratos etc. são variáveis, hoje, comumente vinculadas ao potencial de crescimento de um país, e cuja importância supera a outras, como os recursos naturais, antes bem ancoradas no pensamento econômico. A discussão da autonomia do BC deve situar-se, assim, nesse contexto. Essa autonomia seria uma das múltiplas instituições que hoje são vistas como “facilitadores” ou que ampliam as possibilidades de crescimento. Concretamente, porém, por que um BC autônomo (não importa agora os limites e características dessa autonomia, um aspecto de que trataremos nos próximos parágrafos) contribuiria para o
A obra de ambos autores é extensa. Ver, por exemplo: Noth, D. Institutions, Institutional Change and Economic Performance. Cambridge University Press. 1990; e Olson, M. The Rise and Decline of Nations. Yale University Press. 1982. Mauro, P. “Corruption and Growth”. Quarterly Journal of Economics, 110 (3), 1995.
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“Chegamos aos modernos modelos de crescimento que, de nítida inspiração neoclássica, incorporam variáveis de cunho heterodoxo, como independência do Poder Judiciário, agências de regulação da concorrência, Lei de Responsabilidade Fiscal etc”. desenvolvimento? Aqui encontramos uma situação um tanto paradoxal. Vamos fazer um pouco de História. As instituições como variáveis relevantes (até chaves) para entender a economia encontram suas raízes no historicismo alemão, cujos maiores expoentes foram Roscher, Hildebrant, Kines e, sobretudo, Gustav Von Schomoller, em fins do Século XIX.4 Essa tradição do historicismo alemão foi resgatada nos EUA, na obra de autores como T. Veblen, J.T. Dunlop, F. Commons, F. Knight, R.H. Coase etc. Em todos os casos, os esforços estavam direcionados para formar um paradigma que viesse a ser con-
corrente ao neoclássico dominante. Este último reduzia o universo econômico ao livre jogo da oferta e demanda, enquanto os institucionalistas resistiam a esse reducionismo, chamando a atenção para o papel dos direitos de propriedade, os contratos, as negociações, a forma de articulações das classes e as formas de resolução de seus conflitos, as coalizões etc. Em realidade, o institucionalismo sempre teve como vocação ser um paradigma concorrente e não complementar ao neoclássico. Contudo, a partir dos anos 80, e com a crescente insatisfação dos modelos de crescimento que esta última corrente propiciava, onde todo
o processo de desenvolvimento estava reduzido a uma combinação de recursos naturais, capital e mão-de-obra, os neoclássicos começam a incorporar outras dimensões, como investimento em ciência e tecnologia, educação e - quem diria! - instituições. Assim, chegamos aos modernos modelos de crescimento que, de nítida inspiração neoclássica, incorporam variáveis de cunho heterodoxo, como independência do Poder Judiciário, agências de regulação da concorrência, Lei de Responsabilidade Fiscal etc.; entre esse etcétera se encontra a discussão sobre a autonomia do BC.5 A maioria das reformas microeconômicas que hoje a ortodoxia está propondo não são outra coisa que a construção dessa institucionalidade, para dar estabilidade à ordem político-legal-institucional, e estabelece regras dentro das quais atuariam as forças do mercado, ou, em outros termos, dentro do qual o intercâmbio se processaria.6 I.2. As Especificidades do BC. Mas, em termos mais específicos, por que a autonomia do BC? Na fundamentação dessa institucionalidade, convergem várias vertentes que se complementam. Vamos analisar cada
A Alemanha� teórico que,� modelos abstratos� clássica, a marxista e, sobretudo, a escola neoclássica, ofereciam matrizes analíticas sem espaço nem tempo. 5 As PPP´s, por exemplo, podem ser olhadas desde essa perspectiva. 6 Aqui parece-nos � estratég� desenho instituc� B. “Gastos Sociais do Governo Central”. Econômica, Vol. 5, N 1. Pág. 123-134. Fevereiro de 2004. 4
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uma delas para, depois, articulálas e situar em uma perspectiva histórica as propostas sobre a conveniência de autonomia para o BC. A partir da Revolução Keynesiana, nos anos 30, foi construído um arcabouço de gerenciamento macroeconômico do ciclo de curto prazo, que foi hegemônico por quase 40 anos (até meados dos anos 70). Essa construção teórica colocava um conflito (trade-off no linguajar dos economistas) entre nível de atividade e inflação.7 Em outros termos, a sociedade, em cada conjuntura, teria que escolher ou arbitrar entre elevar o nível de emprego (reduzir o desemprego) e aumentar o patamar inflacionário, este último o preço a pagar, em termos de inflação, por elevar o emprego. Nesse contexto, discutir a autonomia do BC é
“A sociedade, em cada conjuntura, teria que escolher ou arbitrar entre elevar o nível de emprego (reduzir o desemprego) e aumentar o patamar inflacionário”. extremamente complexo, porque seria uma equipe “técnica”, sem mandato popular, que realizaria essa arbitragem. Estaríamos, assim, na presença de um “déficit democrático”, dado que uma equipe de tecnocratas seriam os encarregados de estabelecer o mix desemprego/inflação que cada sociedade teria em cada momento do tempo. É rigorosamente impensável que uma sociedade (ou sua classe políti-
“Estaríamos, assim, na presença de um “déficit democrático”, dado que uma equipe de tecnocratas seriam os encarregados de estabelecer o mix desemprego/ inflação que cada sociedade teria em cada momento do tempo”. 7
ca) abra mão de determinar essa escolha. Dessa forma, a questão da autonomia do BC seria irrelevante. Qual é o contexto histórico que mudou essa situação? Foi, justamente, o ocaso do pensamento keynesiano a partir de meados dos anos 70. Com efeito, com os choques de petróleo em meados dessa década, as sociedades enfrentaram um fenômeno antes impensável, a estagflação, ou o aumento de patamar inflacionário e, simultaneamente, queda no nível de emprego. Esse fato contrariava a Curva de Phillips, dado que, em conjunturas nas quais o desemprego aumentava, deveria reduzir-se, também, a variação dos preços. Esse fator, entre outros que não compete analisar neste artigo, levou a um questionamento profundo da herança keynesiana. A primeira Contra-Revolução Conservadora (termo cunhado para contraporse à Revolução Keynesiana dos anos 30), liderada por Milton
Esse conflito ou trade-off ficou conhecido na literatura como Curva de Phillips, devido a um artigo publicado em 1958 por A. W. Phillips (“The Relation between unemployment ant the Rate of Change of Money Wage Rates in the United Kingdom, 1861-1975”, Economica, Vol. 25. 1958), no qual� desemprego ou a taxa de desemprego geraria variações nos salários nominais, que terminariam traduzindo-se em elevações de preços, daí o tradeoff. Contudo, já Keynes, na sua Teoria Geral, sustentava que aquecimento no nível de atividade acabaria redundando em elevações de preços.
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“A questão da autoridade monetária diz respeito à sua credibilidade e ao problema a ela vinculado, a inconsistência intertemporal”.
Friedman (Nobel de Economia em 1976), da Universidade de Chicago, propugnava que esse conflito era válido no curto prazo, mas que não existia no longo prazo. Desde uma perspectiva de longo prazo, as políticas macroeconômicas ativas que visavam reduzir o desemprego à custa de maior inflação só acabavam tendo efeitos sobre esta (a variação dos preços), sem resultados tangíveis no nível de atividade. Contudo, essa perspectiva seria radicalizada anos mais tarde por uma vertente conhecida como das Expectativas Racionais, a qual sustentava que, mesmo no curto prazo, esse trade-off entre inflação e emprego não existe, e políticas macroeconômicas ativas geraram, exclusivamente, inflação. Esse novo marco analítico, que rendeu também um Prêmio Nobel a um de seus mais conhecidos teóricos (Roberto E. Lucas Jr. foi agraciado com o Nobel em 1995) acabou sendo integrado ao novo pensamento
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hegemônico. Percebamos que, ao não existir um conflito a ser arbitrado, fica aberto o espaço para a discussão da autonomia do BC, dado que – agora, sim - é factível imaginar que um grupo de qualificados tecnocratas seja capaz de gerenciar a Economia de tal forma a manter o nível de preços dentro de patamares razoáveis. Mais ainda, no médio e longo prazo, um ambiente econômico com variações de preços modestas, combinando marcos institucionais/legais adequados, seria propício para o crescimento econômico. O agora histórico conflito inflação/desemprego, além de inconsistente teoricamente, seria nefasto na prática, dado que o único resultado - de pretender aquecer a economia mediante políticas expansivas na área fiscal e monetária - seria pura e simplesmente inflação. Além de um marco analítico consistente, as evidências empíricas contribuiriam para tornar o nexo entre autonomia do BC e
nível de inflação plausível.8 Na realidade, a questão da autonomia do BC se colocava dentro de uma perspectiva teórica mais abrangente, que diz respeito à estabilidade das “regras do jogo”. Direitos de propriedade bem definidos, um Poder Judiciário independente, entes reguladores que assegurem a concorrência à margem das disputas políticas etc. eram quesitos que o novo pensamento hegemônico colocava como fatos geradores de um ambiente propício para o crescimento; o resto tinha que ser deixado aos mercados. A questão do BC só apresentava certas particularidades. Vamos a analisá-las. A questão da autoridade monetária diz respeito à sua credibilidade e ao problema a ela vinculado, a inconsistência intertemporal. A questão é não trocar as regras do jogo e, assim, estabelecendo-se uma meta de inflação (não importa por que nem quem a estabelece, depois voltaremos sobre esse ponto), a população (os “agentes”, no jargão economês) acreditaria que o governo ou o BC irá perseguir esse objetivo. Não é difícil perceber, de forma intuitiva, que se todos acreditam que os objetivos estabelecidos pelas autoridades serão perseguidos e não mudarão, ou seja, as autoridades têm credibilidade e as regras são fixas, os custos da estabilização de preços serão menores. Vamos dar um exemplo um pouco
Ver, por exemplo: Alesina, A. e Gatti, R. “Independent Central Banks: Low Inflation at No Costs?” American Economic Review, Paper and Proceedings, Vol.85, mai 1995, págs.: 196-200; e Alesina, A., Summers L. “Central Bank Independence and Macroeconomic Performance:Some Comparative Evidence”. Journal of Money, Credit, and Banking, Vol. 25, mai 1993, págs.: 151- 62.
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caricatural, mas que serve para ilustrar essa argumentação. Imaginemos que o Governo diz que no ano que vem a inflação será de 5% e todos acreditam que o mesmo utilizará todos os instrumentos para atingir esse objetivo e que não será permeável às pressões. Nesse caso, os contratos de futuros terão embutida uma inflação de 5% e a inflação será mesmo essa, dado que eu acredito que a inflação vai ser 5%, acredito que o Governo acredita e acredito que todos acreditam. Contudo, se a inflação-objetivo – estabelecida é de 5% e ninguém acredita que o Governo utilizará todos os meios para atingi-la, os contratos (os salários, por exemplo) podem prever aumentos nominais maiores. Nesse caso, se o Governo realmente pretende atingir esse objetivo, terá que impor um sacrifício à sociedade em termos de nível de atividade,
dado que os contratos serão calculados em função de um patamar inflacionário maior, visto a falta de credibilidade.9 Mas a questão que vale colocar aqui é: por que um Governo não pode ter essa credibilidade? Por que, para que o problema da inconsistência intertemporal não seja colocado, deve haver um BC autônomo? Aqui temos que introduzir uma outra dimensão, em torno da qual o pensamento hegemônico tem trabalhado desde a década de 70. Estamo-nos referindo ao ‘Ciclo Político dos Negócios”, de um famoso “paper” de meados dos anos 70 e que posteriormente foi sofisticado. Os políticos são identificados como agentes cuja racionalidade tenderia a fazer adotar políticas monetário-fiscais expansivas (“irresponsáveis”) para perpetuar-se no poder.10 Especialmente em conjunturas próximas da
renovação eleitoral, as políticas monetário-fiscais adotariam um viés pró-conservação do poder, seja no caso do próprio político, seja de seu Partido.11 Dessa forma, estamos diante de três tipos de variáveis que se articulam. Por um lado, existe uma tendência de crescimento de longo prazo, que está dada por fatores tais como a infra-estrutura de um país, o desenvolvimento tecnológico, a educação de sua força de trabalho etc. Esses fatores determinariam o produto potencial em cada momento do tempo, e a política econômica de curto prazo teria que tender a concentrar seus esforços nos aspectos vinculados à estabilização dos preços. Aqui encontramos a segunda dimensão. Com instituições e um marco regulatório eficaz, que propicie incentivos adequados, delimite e assegure direitos de propriedade claros, reduza os
O leitor terá percebido que o trade-off inflação/desemprego só se coloca em circunstâncias nas quais não existe credibilidade. Um texto interessante sobre o ponto é: Durham , J. B. “Sacrifice ratios and monetary policy credibility: do smaller budget deficits, inflation-indexed debt, and inflation targets lower disinflation costs?” Finance and Economics Discussion Series. Board of Governors of the Federal Reserve System (U.S.). 2001 (Pode ser encontrado no site www.federalreserve.gov/pubs/feds/2001/200147/200147pap.pdf) 10 O texto clássico é de Nordhaus, W. “The Political Business Cycle”. Review of Economic Studies Vol. 42. 1975. Págs. 169-190. Ver tambíen, Rogoff, K. “Equilibrium Political Budget Cycles”. American Economic Review. Vol. 80. Págs. 21-36. 1990, e Alesina, A., Roubini, N and Cohen, G. D., Political Cycles and the Macroeconomy. Cambridge: The MIT Press. 1998. 11 Aqui poderíamos introduzir uma outra discussão. Não fica claro por que os “políticos” não teriam uma racionalidade com pontos de convergência com a consis� staff do BC seria “tecnicamente neutro”? Tomemos o caso do atual Presidente do BC, um ardoroso defensor da sua autonomia. Ele já foi deputado, filiado a um partido político, se desfiliou só para assumir a presidência do BC e hoje (março de 2004) está flertando com diversos partidos para definir seu futuro. Tomemos outro caso. A quase totalidade dos Diretores atuais do passado recente do Banco Central vêm do mercado financeiro ou vão acabar nele depois de saírem da diretoria. Por que não teriam interesses particulares (ou funções-objetivos bem específicas, no jargão dos economistas), com racionalidades próprias? Por que eles seriam mais neutros que um político tradicional? Talvez as trajetórias e interesses sejam distintos, mas atribuir “neutralidade” a indivíduos oriundos do mercado financeiro e/ou que acabam no mercado financeiro ou é ingenuidade ou é de uma inocência suspeita. Vamos reproduzir uma história sobre Raúl Prebish (1901-1986), economista argentino, membro fundador da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina) e um dos principais ideólogos do estruturalismo latino-americano. Ele foi o primeiro gerente-geral (Presidente) do BC argentino, quando foi criado em 1935, permanecendo nesse posto até 1943. Quando saiu dessa instituição, foi convidado para assumir um emprego em um banco privado. Prebish não aceitou, argumentando que seria desonesto, dado que conhecia todos os pormenores sobre a situação dos concorrentes, retornando a sua cátedra na Universidade de Buenos Aires (Economia II-Dinâmica Econômica). Com o tempo, no Brasil e na Argentina, a promiscuidade entre altos cargos no BC e postos de diretoria em instituições financeiras privadas virou rotina. Supor� não só três ou quatro meses - de projetos político/partidários e de ocupar qualquer cargo em instituições financeiras privadas. Por uma questão de coerência com � os que porventura ocupem a Presidência e Diretorias do BC. 9
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“Em realidade, não existe um modelo de autonomia. A formatação da mesma pode ter profundos desdobramentos em termos de administração do ciclo conjuntural e deve guardar coerência ou evitar conflitos entre diferentes objetivos”.
riscos de políticas discricionárias etc., o funcionamento dos mercados possibilitará um natural crescimento desse produto potencial. Nesse contexto, um BC autônomo está situado dentro dessa perspectiva, que outorga ao arcabouço legal/institucional um papel crucial no desenvolvimento de longo prazo. A terceira dimensão diz respeito à inexistência de um conflito entre nível de atividade e patamar inflacionário, de forma tal que um “déficit de democracia” está descartado. Por último, a pertinência dessa autonomia do BC se justifica dado que a “racionalidade” dos políticos vai de encontro a essa desejada estabilidade das regras.
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II. Que Autonomia? Contudo, se esse contexto analítico está implícito nas propostas de autonomia do BC, amplos espaços de debate ainda permanecem abertos. Em realidade, não existe um modelo de autonomia. A formatação da mesma pode ter profundos desdobramentos em termos de administração do ciclo conjuntural e deve guardar coerência ou evitar conflitos entre diferentes objetivos. Vamos ilustrar a necessidade de maiores definições sobre o concreto conceito de autonomia mediante aspectos do debate corrente. Existe uma crescente pressão para a ampliação do CMN
Nos anos 8� do Nordeste, Presidente da CVM etc.).
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(Conselho Monetário Nacional) por parte de empresários, sindicalistas etc. A idéia consiste em ampliar o número de integrantes, restrito, desde 1994, a três representantes (Ministros da Fazenda, do Planejamento e Presidente do BC).12 As demandas sobre a ampliação do CMN, visando maior “democratização”, foram alimentadas pelas sucessivas elevações nas taxas de juros em 2004. Contudo, cabe uma pergunta: a que visam aqueles que propõem uma ampliação do CMN? Uma alternativa seria reformular, na sua integralidade, a atual política de estabilização (metas, câmbio flexível etc.). Outra seria manter o atual sistema, mas tornar as metas menos rígidas e mudar a sua forma de construílas (o core ou centro do índice em lugar do índice pleno, mudar o calendário gregoriano etc.). Contudo, mesmo alterando as metas para torná-las menos conservadoras, o BC ainda conservaria a capacidade de fixar juros e, nesse sentido, nada garante que o aperto na política monetária continue. Por último, outra alternativa seria que o CMN fixe as taxas de juros e, nesse caso, dever-se-ia outorgar algum outro papel ao BC. Vemos, assim, que questionar o gerenciamento da atual política monetária e aventar a conveniência de uma ampliação do CMN deixa em aberto a formatação final que adquirirão a administração da política de estabilização e a própria missão do BC.
A segunda questão mediante a qual queremos ilustrar a necessidade de coerência na proposta de alternativas diz respeito ao atual debate sobre a taxa de câmbio. Muitos defendem o atual sistema ou propõem mudanças marginais no mesmo, mas propõem uma atuação mais ativa do BC para evitar a valorização do Real, que poderia acabar prejudicando o setor externo. Contudo, está correto Meirelles quando sustenta que, pelas atuais regras do jogo, o BC não tem compromissos com a taxa de câmbio e, sim, com as metas de inflação. Ao contrário, uma valorização do Real pode contribuir para atingir mais facilmente as metas, reduzir a necessidade de elevações nos juros e, conseqüentemente, certas penalizações do nível de atividade. Como defender, na sua essência, o atual sistema e, concomitantemente, exigir dele uma
“Muitos defendem o atual sistema ou propõem mudanças marginais no mesmo, mas propõem uma atuação mais ativa do BC para evitar a valorização do Real, que poderia acabar prejudicando o setor externo”. intervenção do BC no mercado de câmbio?13 A experiência internacional induz a concluir que distintas formatações para a autonomia do BC são factíveis e, como já afirmamos, ainda supondo que consenso em torno dessa autonomia, diferenças de fundo não podem ser descartadas. Em outros termos: duas pessoas que estejam defendendo a autonomia devem qualificar esse termo,
“Uma valorização do Real pode contribuir para atingir mais facilmente as metas, reduzir a necessidade de elevações nos juros e, conseqüentemente, certas penalizações do nível de atividade”.
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dado que podem estar imaginando projetos radicalmente divergentes. Nos próximos parágrafos vamos desenvolver uma caricatura das distintas alternativas que, concretamente, um projeto de autonomia possa ter ou, ao menos, as diferentes possibilidades que a experiência internacional até hoje evidencia. II.1. O BC como Administrador do Ciclo de Curto Prazo (o exemplo do BC dos EUA). Talvez a referência mais conhecida seja o BC dos EUA, criado no 23 de dezembro de 1913. Ele já foi uma referência em termos internacionais, mas o FED representa um modelo que, hoje, talvez não sintetize o marco analítico dominante que resumimos nos parágrafos anteriores. Com efeito, sua autonomia é ampla e o objetivo da política monetária é atingir um nível de produto tal que se possa alcançar o pleno emprego,
Como veremos mais adiante, propor um sistema que contemple, simultaneamente, taxa de câmbio flutuante e metas de inflação é incompatível com demandas em torno de patamares dados e câmbio real. Quando o câmbio é flexível, o BC controla a política monetária, e se controla o câmbio a oferta de moeda é endógena.
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a estabilidade de preços e taxas de juros de longo prazo moderadas.14 Ou seja, o objetivo único e exclusivo do BC não é atingir a estabilidade de preços; controlar o patamar inflacionário é um entre outros objetivos e, entre eles, está o de atingir o pleno emprego. Mas, vamos supor que esses dois objetivos (estabilidade no patamar de inflação e pleno emprego) estejam em conflito: a quem caberá a escolha? Teoricamente, ao presidente do BC. Ele vai escolher, em última instância, o preço que a sociedade vai pagar (em termos de emprego) para administrar a taxa de inflação. Mas essa é uma
escolha crucial para uma sociedade e não pode ser tomada por um indivíduo que foi escolhido pelas suas qualidades técnicas. Aqui estamos na presença de um claro “déficit de democracia”. Um técnico tem o seu mapa de preferências, e o mesmo não pode ser identificado com aquele da maioria da sociedade. A legitimidade da escolha, neste caso, deve recair sobre alguém que foi escolhido democraticamente.15 Como saímos deste impasse? Simplesmente supondo que não exista escolha ou conflito (trade-off) entre inflação e nível de emprego. Nesta perspectiva, hoje dominante, que já anali-
“O objetivo único e exclusivo do BC não é atingir a estabilidade de preços; controlar o patamar inflacionário é um entre outros objetivos e, entre eles, está o de atingir o pleno emprego”.
samos, o objetivo do BC deve estar restrito a perseguir a estabilidade de preços, dado que, com preços estáveis, a economia cresce. Contudo, ainda supondo uma autonomia para perseguir esse objetivo, as alternativas que se abrem são diversas. Vamos estudá-las. II.2. O BC Fixando Metas e Instrumentos de Política (o caso do BC Europeu). Estando a autonomia restrita a administrar a taxa de variação dos preços, o BC pode ter ampla liberdade para fixar as metas de inflação e escolher os mecanismos mais adequados para atingi-las. Este é o caso do Sistema de Bancos Centrais Europeus (European System of Central Banks-ESCB). Se supomos que existe conflito entre inflação e emprego, estamos, outra vez, diante de um “déficit de democracia”, dado que as metas que fixa o BC podem ser tão ambiciosas que acabam penalizando o nível de emprego. Este é o caso da Europa, que apresenta nos últimos anos percentuais de crescimento pífios e, em não poucas ocasiões, esse resultado é atribuído à ortodoxia do BC
Concreta� long run growth of the monetary and credit aggregates commensurate with the economy’s long run potential to increase production, so as to promote effectively the goals of maximum employment, stable prices, and moderate long-term interest rates“ (A ata do Fed pode ser encontrada em www.federalreserve.gov/generalinfo/fract/sect02a.htm 15 Aqui c� país não existe um Ministério da Fazenda; existe uma Secretaria (Ministério) do Tesouro. Contudo, o Tesouro seria o encarregado de arrecadar impost� f não foi eleito democrat� curto prazo é � questão é mais complexa, mas, lamentavelmente, o seu tratamento está fora de nossos objetivos neste texto. 14
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Europeu, especialmente na fixação das metas.16 Por outra parte, esta alternativa de autonomia deixa às autoridades monetárias a escolha dos instrumentos a serem utilizados para atingir as metas que elas próprias fixaram. Elas podem, por exemplo, definir que se concentrará exclusivamente sobre a oferta de moeda, deixando a taxa de câmbio livre ou, contrariamente, utilizar esta última como âncora nominal, e a oferta de moeda ficaria endógena. Esta opção de autonomia pode gerar tanto polêmicas sobre o “déficit de democracia”, no tocante ao estabelecimento das metas de inflação, como induzir a polêmicas sobre os instrumentos. Por exemplo, no caso do Brasil, hoje, uma valorização do real diante do dólar pode ter impactos positivos sobre a infla-
“Uma valorização do real diante do dólar pode ter impactos positivos sobre a inflação, mas elevar a vulnerabilidade externa diante de potenciais choques negativos no exterior”. ção, mas elevar a vulnerabilidade externa diante de potenciais choques negativos no exterior. Se o BC tem, institucionalmente, a obrigação de atingir certos objetivos em matéria de inflação (não importa aqui se foram por ele fixados ou se uma institui-
“Uma forma alternativa de instrumentalizar a autonomia consiste em assumi-la como restrita à escolha dos instrumentos, sendo as metas de inflação fixadas por uma instituição fora do BC”.
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ção externa os determinou), não terá nenhum compromisso com os resultados externos e, assim, qualquer valorização da moeda nacional será bem-vinda. II.3. O BC Definindo Instrumentos de Política. Uma forma alternativa de instrumentalizar a autonomia consiste em assumi-la como restrita à escolha dos instrumentos, sendo as metas de inflação fixadas por uma instituição fora do BC ou com a parceria deste. No caso da atual conjuntura do País, a instituição é o CMN, no qual tem assento o presidente do BC. Porém, podemos imaginar, como está sendo reivindicado por representantes dos empresários e trabalhadores, um CNM
A meta de inflação do BC Europeu é de 2%. Implicitamente, ao estabelecer uma meta tão rígida, o BC Europeu não reconhece, no longo prazo, conflitos entre inflação e desemprego. Entre seus presupostos está que: “It is widely agreed that in the long run – after all adjustments in the economy have worked through – a change in the quantity of money in the economy will be reflected in a change in the general level of prices. But it will not induce permanent changes in real variables such as real output or unemployment. This general principle, referred to as “the long-run neutrality of m� determined by real factors, such as technology, population growth or the preferences of economic agents” (ver em: www.ecb.int/mopo/intro/ html/role.en.html).
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“Seria inconsistente que, se demande ao BC intervenção no mercado de câmbio, dado que, institucionalmente, está fora de seus objetivos e instrumentos a manutenção, valorização ou desvalorização da paridade cambial”. mais amplo, no qual o BC pode ou não ter assento. Nessa formatação institucional, cabe ao BC cumprir a meta escolhendo os instrumentos que considere mais convenientes (taxa de câmbio fixo e política monetária passiva ou política monetária ativa e câmbio flexível). II.4. O BC visando Atingir Metas já Definidas e Administrando Políticas já Escolhidas. Uma outra alternativa consiste em reduzir a autonomia do BC a cumprir a meta estabelecida por uma instituição a ele alheia (o CNM, no caso do Brasil), mas a escolha dos instrumentos para atingi-la sendo determinada seja pela mesma instituição que fixa a meta seja pelas instâncias políticas. Por exemplo, no caso do Brasil, a
meta poderia ser estabelecida pelo CNM, mas a instância política do Governo determinar que o regime macroeconômico seja de câmbio flexível. Nesse caso, o instrumento do BC estará restrito a utilizar a política monetária, a fim de atingir a meta. Nesta opção, voltamos a frisar dado que consideramos de suma relevância: seria inconsistente que, na prática, se demande ao BC intervenção no mercado de câmbio, dado que, institucionalmente, está fora de seus objetivos e instrumentos a manutenção, valorização ou desvalorização da paridade cambial. Esses são alguns exemplos das múltiplas possibilidades que, concretamente, pode chegar a adquirir a autonomia quando a mesma seja mereça uma proposta concreta. Além de elementos conceituais, a formatação institucional da autonomia será cru-
cial na determinação das relações entre o Governo (instância política), o BC e outras instituições (inclusive o setor privado). As metas e os instrumentos e suas combinações são diversos, e a maioria tem experiências na história recente dos BC´s. Contudo, uma tendência internacional é clara: os BC´s que não possuem nenhum meta explícita vêm perdendo importância, sendo diversas as combinações factíveis de variáveis (moeda, taxa de câmbio e inflação) a serem convertidas em metas e/ou passarem a ser instrumentos.17 Logicamente, esse arcabouço institucional deve ser complementado por discussões de pequenos detalhes, que não serão desprezíveis no perfil que a autonomia e suas conseqüências terão na prática. Esses “detalhes” vão desde a definição da escolha do índice de inflação, se o mesmo será “cheio” ou depurado de volatilidade, a variável a ser eventualmente utilizada (taxa de juros ou oferta de moeda) para administrar o agregado monetário, no caso de esta ser uma das metas, as formas de prestação de contas ao Congresso e à sociedade (informes sobre inflação, perspectivas etc.), o perfil administrativo (que será influenciado pela definição do objetivos e instrumentos) etc.18
Sobre a experiência internacional, nos anos 90, das metas dos BC´s, consultar Sterne, G. “ The Used of Explicit Targets for Monetary Policy: practical experience of 91economies in th 1990s”. Bank of England’s Quarterly Bulletin. August 1999. (Este texto pode ser encontrado em: www.bankofengland.co.uk/qb/qb990302.pdf )1 18 No tocante a� moeda. O BC do Brasil tem acompanhado essa prática. 17
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“Com um arcabouço institucional eficiente, o resto deveria ser deixado aos mercados, cujo funcionamento teria como corolário natural o desenvolvimento”.
III. Comentários Finais Nosso objetivo neste texto consistiu em evidenciar a fragilidade de afirmações, lamentavelmente cotidianas no debate sobre o assunto, sobre um posicionamento a favor ou contra a autonomia do BC. Em primeiro lugar, pretendemos pôr em evidência que, por trás das propostas de autonomia, existe um marco analítico que, na maioria das vezes, não está explicito. O status de entidade autônoma para o BC, com objetivos específicos e “blindado” contra influências políticas, é só parte de uma perspectiva que situa a potencialidade de crescimento de um país em desenhos institucionais que estabeleçam regras de jogo claras, permanentes e não-discricionárias ou imunes aos ciclos políticos, com incentivos adequados etc. Com um arcabouço institucional eficiente, o resto deveria ser deixado aos mercados, cujo funcionamento teria como corolário natural o desenvolvimento.
Contudo, ainda que esse paradigma seja aceito (como, aliás, o é pela quase totalidade do leque político/ideológio do País, o que lhe outorga um caráter hegemônico), ainda fica em aberto o perfil concreto que terá o status de entidade autônoma para o BC. Ser a favor da autonomia quer dizer, concretamente, pouca coisa. Em outros termos: dois indivíduos podem posicionar-se a favor da autonomia e ter em mente projetos quase antagônicos. Dessa forma,
exceto posicionamentos fora do paradigma dominante, onde caberiam propostas de uma subordinação total do BC ao poder político de turno, o futuro debate deve travar-se em torno do tipo de autonomia. Aí as alternativas são diversas e as implicações em termos macroeconômicos, relevantes. Por exemplo, abrir o CMN a atores sociais careceria de transcendência se a autonomia que será dada ao BC for ampla e consistir na definição tanto das metas de inflação como dos instrumentos para atingi-las. Um desenho diferente (com resultados distintos) poderia contemplar um CMN que fixa as metas de inflação e o poder político, o tipo de regime macroeconômico (taxa de câmbio flexível, por exemplo), cabendo ao BC administrar a trajetória dos preços para convergir à meta mediante a taxa de juros. Contudo, as margens de liberdade, uma vez definido o modelo, são estreitas. Por exemplo, se o CMN fixa as metas, o poder
“Abrir o CMN a atores sociais careceria de transcendência se a autonomia que será dada ao BC for ampla e consistir na definição tanto das metas de inflação como dos instrumentos para atingi-las”.
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“Esse contexto dificilmente sofrerá algum tipo de crítica radical, exceto por parte das correntes que questionam esse paradigma. Em outro nível de menor abstração, cabe polemizar sobre a característica concreta que tomará o projeto de autonomia, e, no transcurso desse debate, aflorarão posições que podem estar bem longe de um consenso, como hoje parece transparecer”. político determina que o regime de câmbio será flexível e o BC tem autonomia para gerenciar a política monetária, não caberia, a cada reunião do COPOM, questionar a taxa de juros que ele fixa ou insistir para que se controle a taxa de câmbio para contornar eventuais valorizações da moeda nacional. Temos, até agora, dois níveis de abstração. Um, na maioria das vezes implícito, situa a discussão da autonomia do BC no marco das premissas do paradigma dominante sobre os requisitos para um desenvolvimento de longo prazo. Esse contexto dificilmente sofrerá algum tipo de crítica radical, exceto por parte das correntes que questionam esse paradigma. Em outro nível de menor abstração, cabe polemizar sobre a característica concreta que tomará o projeto de autonomia, e, no transcurso desse debate, aflorarão posições que podem estar bem longe de um consenso, como hoje parece transparecer.
Por último, e em um nível de abstração ainda menor, o projeto deve merecer uma formatação final que diz respeito a aspectos organizacionais (número de diretores, tipo de estabilidade, âmbitos jurisdicionais nos quais se dirimirão eventuais conflitos etc.), formas de prestação de contas à sociedade (Congresso) etc. Esta última parte é operacio-
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nal, e não diz respeito aos aspectos mais transcendentes que antes mencionamos. Por outra parte, seria um erro conceitual reduzir a questão da autonomia a estes aspectos operacionais. Nosso objetivo no texto foi, justamente, evidenciar que um projeto de autonomia do BC é uma questão que vai muito além da estabilidade para seus diretores.
*Carlos Alberto Ramos Professor do Departamento de Economia da UnB e membro do CORECON-DF. E-mail: carlosal@unb.br
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ARTIGO
Aspectos institucionais da Política Monetária *Eliacir Marques Pereira Este documento pretende apresentar breves observações sobre o contexto institucional da formulação e execução da política monetária durante as quatro últimas décadas. Inicialmente, faremos considerações sobre as atribuições legais do Conselho Monetário e a evolução de sua composição. O Conselho Monetário Nacional (CMN) foi criado no contexto da denominada “reforma bancária”, implementada em 1964 e formalizada através da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro daquele ano, que dispõe sobre “a Política e as Instituições monetárias, bancárias e creditícias, cria o Conselho Monetário Nacional e dá outras providências”. Em seu artigo 2º, a referida norma legal estabelece como missão do CMN a formulação da política da moeda e do crédito, “objetivando o progresso econômico e social do País”. Suas atribuições específicas, típicas de Autoridade Monetária, incluem, dentre outras (art. 4º):
- autorização das emissões de papel-moeda; - regulamentação do crédito, em todas as suas modalidades; - regulação da constituição, funcionamento e fiscalização das instituições financeiras; - estabelecimento das diretrizes e normas da política cambial. - aprovação do orçamento monetário, preparado pelo Banco Central. A composição inicial do Colegiado consistia de 10 membros (art. 6º): I – Ministro da Fazenda, seu Presidente; II – Presidente do Banco do Brasil S. A.; III – Presidente do atual Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social; IV – “sete membros nomeados pelo Presidente da República, após aprovação do Senado Federal, escolhidos entre brasileiros de ilibada reputação e notória capacidade em assuntos econômico-financeiros, com mandato de 7 (sete) anos, poden-
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do ser reconduzidos”. Assim, o Banco Central do Brasil, criado pelo artigo 8º, não tinha assento no Conselho Monetário Nacional, isto porque sua função básica naquela ocasião era a de executar a política estabelecida pelo CMN, conforme estabelecido pelo art. 9º: “Art. 9 º Compete ao Banco Central do Brasil cumprir e fazer cumprir as disposições que são atribuídas pela legislação em vigor e as normas expedidas pelo Conselho Monetário Nacional”. Conforme já mencionado, o orçamento monetário, elaborado pelo BCB, era submetido à apreciação do Conselho Monetário. Outro ponto relevante a salientar era a estabilidade dos membros da iniciativa privada e/ou da sociedade civil, detentores de mandato por um período de sete anos. Porém, nossa memória registra que, na prática, esta estrutura, assim como as que se seguiram, não funcionou a contento. As medidas de política monetária
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“Em qualquer país, o órgão responsável pela oferta de moeda tem a faculdade de se utilizar de procedimentos excepcionais na tomada de decisões”. (inicialmente denominada pela legislação de “oferta/controle da moeda e do crédito”) eram decididas freqüentemente pelo Ministro da Fazenda, Presidente do Órgão, em caráter “ad-referendum”. Lembramos também que o argumento utilizado para este quase-hábito era a necessidade da tomadas de decisões urgentes, sempre denominadas de “emergenciais”. Evidentemente, em qualquer país, o órgão responsável pela oferta de moeda tem a faculdade de se utilizar de procedimentos excepcionais na tomada de decisões. Porém, como nem sempre as decisões de política monetária têm caráter emergencial, caberia uma pesquisa sobre o funcionamento do CMN no período 1964-1994. Para tal, seria indispensável o depoimento de alguns de seus ex-membros. Infelizmente, não dispomos de meios para a execução deste trabalho. Em 1974, a composição do Conselho foi alterada, mantendo-
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se seu “tamanho”, através da Lei nº 6.045, de 15/05/74 (art. 3º): - os membros do setor privado foram reduzidos para três, com mandato de cinco, e não mais sete anos. - foram incluídos o Ministro do Planejamento, o Ministro da Indústria e do Comércio, o Presidente do Banco Central e o Presidente do Banco Nacional da Habitação. Durante a década de 80, o orçamento monetário era paralelo ao Orçamento Geral (fiscal) da União. Como este último e o das estatais revestiam-se de caráter meramente autorizativo - como ainda o é o orçamento fiscal -, a componente monetária era uma peça de ficção! Lembramos que nesse período as despesas de investimento com recursos próprios das estatais, por “recomendação” do Fundo Monetário Internacional (FMI), eram incluídas no gasto público e, desta forma, alvo permanente da “tesoura” de cortes em nome do combate à inflação.
Este dispositivo foi alterado pela Emenda Constitucional nº 40, de 29 de maio de 2003
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A Constituição da República, promulgada em 1988, alterou significativamente o marco institucional da política monetária. Seus principais dispositivos reguladores da matéria em apreço são os seguintes: a) o artigo 48 estabelece, entre as atribuições do Congresso Nacional, dispor sobre “matéria financeira, cambial e monetária...” (inciso XIII), e sobre “moeda, seus limites de emissão, e montante da dívida mobiliária federal (inciso XIV); b) o artigo 192, em sua redação original, estabelecia que o sistema financeiro nacional, “estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e servir aos interesses da coletividade”, seria regulado em lei complementar, dispondo sobre oito temas básicos (incisos do mencionado artigo)1; Por outro lado, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 25, revogou, “a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional ...” (Grifo nosso.) A primeira lei naquele sentido foi a de nº 7.770, de 31 de maio de 1989, resultante da Medida Provisória nº 53/89, prorrogando, até 30 de outubro daquele ano, a vigência dos dispositivos legais que foram atribuídos ou
delegados ao CMN, dentre outros Órgãos Colegiados, competências assinaladas, pela Constituição, ao Congresso Nacional. A citada vigência foi sucessivamente prorrogada pela edição das Leis nºs 8.056, de 1990, 8.021 e 8.392, de 1991. A composição do CMN foi novamente alterada, em 1993, através da Lei nº 8.646, de 07 de abril, que dispunha “sobre a organização e o funcionamento do Conselho Monetário Nacional”. Este passou a ser integrado por vinte membros: - o número de membros do setor privado foi elevado para sete, incluindo-se o representante das classes trabalhadoras, ouvidas as centrais sindicais (art. 1º, incisos XIV e XV), com mandato de dois anos, podendo ser reconduzidos; - foram designados para integrar o Colegiado os Ministros de Estado da Agricultura, do Trabalho, da Previdência Social, e o Presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM); - também o foram os Presidentes de outros bancos oficiais (Caixa Econômica Federal, Banco da Amazônia e Banco do Nordeste do Brasil). Fato interessante a ressaltar é que esta norma legal revogou a Lei nº 8.056, de 28 de junho de 1990, que, como dissemos acima, prorrogou a vigência inicial de lei determinada pelo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 25. Com a palavra, pois, os juristas e constitu-
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cionalistas. Finalmente, o Conselho Monetário Nacional, na prática, foi extinto, pela edição do Plano Real, através da Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, originária da Medida Provisória nº 542, de 30/06/94. Isto porque sua composição passou a ficar restrita a apenas três membros (art 8º): Ministro de Estado da Fazenda, na qualidade de Presidente; Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, e o Presidente do Banco Central do Brasil. A partir de então, cristalizouse a tendência, já evidente desde a década de 80, de centralização, pelo Banco Central, das decisões sobre políticas monetária e cambial. Neste sentido, diversos políticos e técnicos de diferentes matizes ideológicos têm opinado que o Banco Central é, na prática, independente dos demais Órgãos do Poder Executivo.
Estas opiniões foram sintetizadas por PEREIRA2. A juridicidade deste poder (exorbitante?), que resultou na criação do Comitê de Política Monetária (COPOM), foi analisada por FALCÃO3 (2003), que concluiu negativamente, in verbis: “Em razão da prorrogação do poder normativo do CMN, cujas prerrogativas e atribuições já foram mencionadas, cabe-nos concluir que não há embasamento legal para que o Banco Central do Brasil crie um comitê em seu organograma que venha a exercer funções que são legalmente atribuídas ao CMN, de acordo com a Lei nº 4.595/64”. Por outro lado, o tradicional orçamento monetário foi substituído pela programação monetária trimestral, disposta pela já mencionada Lei nº 9.069, cujo artigo 6º determina que o Presidente do Banco Central a subme-
“Cristalizou-se a tendência, já evidente desde a década de 80, de centralização, pelo Banco Central, das decisões sobre políticas monetária e cambial”.
Pereira, Eli� 2003. Falcão, Guilh� dezembro de 1964, que rege o Sistema Financeiro Nacional”. Consultoria Legislativa, setembro de 2003.
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“No caso de o Congresso Nacional não aprovar a programação monetária até o final do primeiro mês do trimestre a que se destina, fica o Banco Central autorizado a executá-la até sua aprovação”. ta ao Conselho Monetário Nacional, no início de cada período. Após aprovação pelo CMN, a programação monetária deve ser encaminhada à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. O Congresso Nacional, com base no parecer da CAE, poderá rejeitar a programação monetária, mediante decreto legislativo, no exíguo prazo de 10 dias, a contar do seu recebimento. Porém, o referido decreto legislativo não poderá introduzir nenhuma alteração, limitandose à aprovação ou rejeição “in totum”. No caso de o Congresso Nacional não aprovar a programação monetária até o final do primeiro mês do trimestre a que se destina, fica o Banco Central autorizado a executá-la até sua aprovação. Geralmente, a mensagem presidencial tem sido encaminhada ao Senado um dia antes do início do trimestre ao qual se refere, fazendo com que o prazo de 30 dias do início do trimestre tenha
sido suficiente apenas para a apreciação da matéria pelo Senado, que sempre concluiu por sua aprovação. Como a matéria, ao ser recebida pela Câmara dos Deputados, já perdeu sua oportunidade, e sua tramitação inclui duas Comissões Permanentes (Economia, Indústria e Comércio, e Finanças e Tributação), o Congresso Nacional tem atuado como instância meramente homologatória, com grande defasagem temporal. Já houve casos em que a programação monetária trimestral
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teve sua tramitação concluída, no Poder Legislativo, somente após dois anos após sua execução! As observações do presente documento conduzem-nos à conclusão da imperiosa necessidade de revisão deste marco institucional, com a inclusão de penalidades, em caso de seu descumprimento.
*Eliacir Marques Pereira
Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados
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RESENHA
A agenda inadiável da inclusão social O Atlas da Exclusão Social V José Valter Arcanjo da Ponte* Este quinto volume da série completa e encerra um ciclo de pesquisas coordenadas por Marcio Pochmann, concomitantemente à sua condução à Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo. O primeiro volume foi publicado em abril de 2003 e o volume 5, em janeiro de 2005. O lançamento da “Agenda não liberal da inclusão social no Brasil” foi realizado, com muita conveniência, por ocasião do Fórum Social Mundial em Porto Alegre, pois aponta os principais problemas do País relacionados à exclusão social e quantifica os recursos necessários para sua superação. Em resumo, os quatro primeiros volumes apresentam um mapeamento da exclusão social no Brasil e o quinto avança além do diagnóstico, com proposições de uma agenda concreta para a consecução da inclusão social no Brasil, agenda não-liberal da inclusão social no Brasil. O quinto volume, objeto específico desta resenha, tem na bela epígrafe de Sérgio Buarque de Holanda “somos ainda hoje
uns desterrados em nossa terra” o mote de sua percuciente análise. A partir do diagnóstico da financeirização da riqueza no País e o esgotamento das tentativas de inclusão social, os pesquisadores se debruçam sobre o dilema das tentativas de inclusão social no Brasil e as perguntas que não querem calar: o que precisamos fazer para a reversão do processo de exclusão social? como conseguiremos suplantar as segregações e desigualdades históricas a partir de um novo modelo de desenvolvimento? A apresentação elabora brevemente o marco conceitual para, a partir do diagnóstico precedente realizado nos quatro volumes, fazer frente ao desafio da elaboração de uma agenda não-liberal de inclusão social. Em resumo, trata-se de olhar a exclusão social como um fenômeno complexo e com uma visão holística. A equipe de pesquisadores partiu do pressuposto de que a exclusão não é natural, e sim provocada pela atuação dos seres humanos sobre a realidade econômica e social, especialmente pelas formas de organização re-
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lacionada a seus esforços e interesses para produção e distribuição da riqueza. O excluído social não é apenas quem está desempregado, mas também aquele que não tem acesso à cultura, à educação, à saúde etc. Ou seja, seu enfrentamento não pode ser feito de maneira compartimentalizada, e sim através de uma política global, não apenas através de política de governo, e sim através de políticas de Estado. Essa concepção significou romper com a idéia de inevitabilidade da exclusão social e conseqüentemente com o pensamento dominante do modelo econômico vigente, e demonstrar o caráter histórico das desigualdades sociais para formular, em um prazo de 16 anos, um horizonte almejado de inclusão social mediana. Para tanto, é preciso convencer a opinião pública da necessidade de um amplo debate nacional sobre o resgate da dívida social, do mesmo modo que o debate sobre a dívida externa mobilizou as principais forças sociais do País ao final do período autoritário. Em síntese, o objetivo do
Atlas da Exclusão Social – volume 5 é apontar caminhos e alternativas para que, no prazo de 16 anos, governo e sociedade civil promovam o desenvolvimento e o bem-estar social brasileiro. No capítulo Metodologia da Inclusão Social, os autores formulam os aspectos metodológicos que guiaram a construção dos indicadores de inclusão social. Saliente-se que a equipe trabalhou com o conceito de complexos sociais tanto relativos ao indivíduo como à oferta de equipamentos e serviços públicos. Qual o cenário futuro desejado? O Brasil se resigna a trilhar inexoravelmente o caminho da exclusão - “o Haiti é aqui!” - ou conseguiremos, por fim, realizar as reformas civilizatórias e atingir um nível mediano de inclusão social comparável à média dos países com maior desenvolvimento social e eqüidade? Para a elaboração do Atlas, a equipe criou uma metodologia para dimensionar a dívida social brasileira, que é muito comentada, mas pouco quantificada. A metodologia partiu de dados oficiais brasileiros que permitem constatar, no primeiro momento, os níveis de desigualdade e exclusão. Em um segundo momento, estatísticas oficiais de entidades supranacionais, governos como a União Européia, ou organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e a Organização de Cooperação para o Desenvol-
vimento Econômico, ou ainda agências especializadas como a Organização Mundial de Saúde, a UNESCO e a OIT, ou até mesmo programas como o Programa Habitat das Nações Unidas. Em alguns casos, agências continentais ou regionais específicas foram utilizadas, como a Organização Pan-Americana de Saúde ou a Comissão Econômica para a América Latina, e suas estatísticas foram coletadas e comparadas às nacionais (p. 14).
A equipe de pesquisadores estabeleceu, a priori, um cronograma de 16 anos - 2005 a 2020 - para que o Brasil possa mobilizar seus recursos e alcançar um patamar significativamente superior ao atual no que se refere à exclusão social. Calculou-se, para atingir um padrão intermediário de inclusão em termos internacionais, que é necessário que o País invista, anualmente, até 2020, a quantia equivalente
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a 14,5% do seu Produto Interno Bruto (PIB). Os oito complexos sociais analisados foram: educação, saúde, habitação, cultura, inclusão digital, pobreza, trabalho decente e previdência social. O texto especifica ainda os países que serviram de referência para os níveis medianos e avançados de inclusão social nos complexos sociais citados acima. As conseqüências excludentes do modelo de desenvolvimento brasileiro são analisadas no capítulo Fracasso da inclusão social brasileira (19502000), que se inicia por um apanhado histórico da formação nacional e da falência dos projetos de reformas nacionais. Os autores situam, então, a situação nacional no contexto internacional, dedicando-se a contemplar itens fundamentais para o entendimento de nossa realidade, desde o período do liberalismo do século XIX e início do século XX, passando pelo desenvolvimentismo nos “30 anos dourados” do capitalismo. Em seguida, aborda-se o período mais recente, com a análise do Brasil inserido no capitalismo globalizado, financeirizado e liberal, a partir dos anos 1990. Esse apanhado histórico conforma um cenário da nãomudança, caracterizado pela não-realização das reformas sociais e da reforma agrária. É fundamental relembrar que nos cinqüenta anos decorridos entre 1950 a 2000 o País viveu 21 anos sob regime de exceção,
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com a ditadura militar no período 1964-1985, que, somados à herança escravocrata e à ideologia do autoritarismo, explicam a situação de exclusão da grande maioria da população brasileira. A questão da luta pela reforma agrária no Brasil é tratada de maneira sucinta, mas incisiva, sob três perspectivas: os governos civis e a questão agrária; os governos militares e a contrareforma agrária; e a redemocratização, mas sem as reformas de base (pp. 36 a 41). Os autores se detiveram também sobre a análise do regime militar e as reformas conservadoras, ao analisar
“Os dados demonstram que, no Brasil, apenas 9 milhões de jovens de 15 a 17 anos, ou aproximadamente 35% da faixa etária, estão cursando o ensino médio. Essa proporção, porém, varia entre os extremos de 54% em São Paulo a 13,5% em Alagoas. No que se refere ao ensino superior, a situação é ainda mais crítica, pois apenas 7,4% da faixa etária entre 18 a 24 anos estão cursando esse nível educacional”.
a reforma tributária de 1966, a criação do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço e outras reformas tecnocráticas do regime militar. Uma visão abrangente sobre as relações entre a demografia e economia é apresentada na seção “Demografia e o mundo do trabalho desconectados”, onde se abordam as implicações da transição demográfica, com a participação relativa da população por faixa etária (1950-2000) (Gráfico 1, p. 47), e as dinâmicas reversas do trabalho, em especial a evolução da população economicamente ativa e das condições de ocupação e desemprego de 1940-2000 (tabela 1, p. 50), além da evolução dos segmentos da população ocupada e desempregada (1940-2000) (tabela 2, p. 52). A conseqüência direta desse modelo se traduz em Renda e Riqueza abordadas, traço histórico geral característico do Brasil, identificado pela estabilidade na má distribuição individual da renda e, pior ainda, pelo aprofundamento da concentração da renda funcional e pela degradação da relação do salário mínimo médio versus PIB. A seção denominada “políticas sociais constrangidas” traz um esboço histórico das políticas sociais no Brasil, onde o crescimento econômico, principalmente entre os anos 1950 e 1980, aconteceu divorciado de políticas sociais e baseado em um modelo concentrador de renda. Ilustra o final deste capítulo o cotejo chocante entre o mapa da “Geografia da Fome” (Josué de Castro), no Brasil de 1950, e a
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cartografia da exclusão social no Brasil e no mundo, em 2000 (pp. 63 a 66). O capítulo 3, A disforme geografia da inclusão social no Brasil do limiar do século XXI, apresenta os dados e os mapas relativos aos oito complexos estudados. Na seção sobre educação, focalizou-se a situação do ensino médio e do ensino superior nas unidades da Federação.Os dados demonstram que, no Brasil, apenas 9 milhões de jovens de 15 a 17 anos, ou aproximadamente 35% da faixa etária, estão cursando o ensino médio. Essa proporção, porém, varia entre os extremos de 54% em São Paulo a 13,5% em Alagoas. No que se refere ao ensino superior, a situação é ainda mais crítica, pois apenas 7,4% da faixa etária entre 18 a 24 anos estão cursando esse nível educacional. As disparidades regionais mais uma vez se manifestam, com os extremos variando entre o Distrito Federal, com 13,5%, e o Maranhão, com apenas 1,9%. Quanto ao complexo da área da saúde, foram utilizados dados relativos a equipamentos (leitos hospitalares) e recursos humanos (médicos e enfermeiros) para a construção de um índice-síntese. Aqui também evidenciam-se as grandes distorções na área da saúde, pois, por exemplo, o Distrito Federal apresenta 5,5 médicos por mil habitantes, ao passo que no Maranhão o índice é de apenas 0,65. O complexo da área da habitação é constituído pelo conjunto de dados sobre coleta de lixo,
esgotamento sanitário, abastecimento de água e fornecimento de energia elétrica, e densidade habitacional por domicílio, que foram incorporados em um índice-síntese. O Rio de Janeiro apresentou o melhor índice, seguido de São Paulo e do Distrito Federal, ao passo que os piores Estados foram o Maranhão e o Piauí. No que se refere ao complexo da área da cultura, os pesquisadores trataram unicamente dos dados sobre habitantes por biblioteca, por cinema e por museu. Mesmo essa simplificação da diversidade cultural do País permitiu demonstrar a carência enorme de acesso aos bens culturais em diversos Estados da Federação. As regiões Sul e Sudeste, (juntamente com o Distrito Federal) contrastam violentamente com as outras regiões em relação a habitantes por bibliotecas, cinemas e museus. Na seção relativa à Informática, a equipe levantou os dados sobre microcomputadores por domicílio e acesso à Internet por domicilio. No Distrito Federal e em São Paulo, 28,5% e 23%, respectivamente, dos domicílios têm acesso a computador, ao passo que no Maranhão este índice é de apenas 3%. A mesma situação praticamente se repete quanto a domicílio com acesso à Internet, que varia de 22,8% para o Distrito Federal e 2,08% para o Maranhão. Na seção dedicada à pobreza relativa, adotou-se uma linha de pobreza nacional com base na renda média familiar per capita. Segundo esse critério, mais de
82 milhões de pessoas no País são pobres. A cartografia por unidades da Federação (p. 100) demonstra uma situação alarmante no Nordeste, onde Estados como Alagoas e Maranhão apresentam 78,1% e 77,6% da população abaixo da linha de pobreza nacional. Santa Catarina apresenta o melhor índice, e mesmo assim cerca de 28% de seus habitantes vivem abaixo da linha da pobreza. A seção intitulada trabalho decente avaliou a distância do País em relação a uma situação de mercado menos excludente e precário, e apresenta a metodologia criada para apurar a ausência de trabalho decente, ou seja, as várias formas de ocupação e desocupação aquém de um padrão definido com o mínimo aceitável (pp. 101). O Brasil teria um contingente de 22 milhões de trabalhadores desempregados e subempregados. Desse contingente, cerca de 14 milhões não são considerados pelas estatísticas oficiais, demonstrando a precarização nas condições e relações de trabalho. O alcance da inclusão social proporcionada pela previdência social no Brasil foi analisado tendo em vista sua importância principalmente para os trabalhadores ocupados e a população idosa. Os dados mostram que cerca de 62% dos trabalhadores entre 16 e 59 anos recebem algum tipo de proteção previdenciária, o que significa mais de 43,5 milhões de pessoas. Porém, cerca de 27 milhões de pessoas não estão cobertas pela previdência social.
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“O alcance da inclusão social proporcionada pela previdência social no Brasil foi analisado tendo em vista sua importância principalmente para os trabalhadores ocupados e a população idosa. Os dados mostram que cerca de 62% dos trabalhadores entre 16 e 59 anos recebem algum tipo de proteção previdenciária, o que significa mais de 43,5 milhões de pessoas. Porém, cerca de 27 milhões de pessoas não estão cobertas pela previdência social”. Em relação aos idosos, cerca de 82% dessa faixa etária - ou 13 milhões de pessoas - recebem algum tipo de benefício previdenciário, o que é bastante significativo para o tecido social brasileiro. O lado negativo é que quase 3 milhões de idosos ou 18% estão desprotegidos. As tabelas contendo os dados elaborados a partir do Censo Demográfico de 2000 encontram-se nos anexos estatísticos (pp. 110 a 122). A etapa seguinte ao diagnós-
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“Esta é uma obra séria e abalizada, que provoca impacto ao fornecer elementos para o debate que a sociedade brasileira deve empreender para guiar suas escolhas. Este livro torna-se, assim, indispensável para governo e sociedade civil, para todos aqueles preocupados em mudar o retrato excludente do Brasil e empenhados na criação de um país solidário”.
tico está consolidada no capítulo Agenda não liberal da Inclusão social no Brasil, que analisa e dimensiona os recursos necessários para que o Brasil se aproxime dos padrões intermediários ou avançados de inclusão social. Isso significa entender a distância que separa o País de hoje e os esforços espaçados em um período de 16 anos para o alcance daqueles objetivos. Em resumo, para se atingir padrões avançados de inclusão
social, esse esforço exigiria um total de 7,2 trilhões, ou 450 bilhões de reais a cada ano. Para os padrões intermediários, o esforço seria de 3,9 trilhões, ou 241 bilhões anuais. Transformados em termos de PIB, esses números significariam 27,6% e 14,5% do PIB por ano, respectivamente (pp. 124 e 125). Esses esforços foram traduzidos em equipamentos, serviços e recursos humanos conforme disponibilizados na tabela 1 (pp. 126 e 127). Por exemplo, na área da saúde, alcançar um padrão intermediário de inclusão social significa aumentar em quase 344 mil leitos a oferta hospitalar, formar cerca de 352 mil médicos e 1.590 mil enfermeiros. Para o padrão avançado, esses números são, respectivamente, 2.648 mil leitos, 845 mil médicos e 3.924 mil enfermeiros. O capítulo discute ainda o que significam essas cifras aparentemente exageradas. Assim, a tabela 2 (p. 129) apresenta os empregos gerados entre 2004 e 2020 para se alcançar o padrão intermediário e avançado de inclusão social, ou seja, 50 milhões e 56 milhões de vagas respectivamente. Os investimentos anuais, em reais, acumulados tanto para o padrão avançado como para o padrão intermediário, decompostos por área e por unidade de Federação, são apresentados na tabela 3 (pp. 130 e 131) e na tabela 4 (pp. 132 e 133).
Os dados relativos à distribuição dos investimentos anuais em porcentagem do PIB, por Estado e por complexo social, para os padrões avançado e intermediário estão disponíveis nas tabelas 5 e 6, respectivamente (pp. 134 e 135). Em seguida, cada complexo social é então analisado, comparando-se a distância do Brasil aos países de referência com os padrões avançado e intermediário. Por fim, as cartografias demonstram a situação comparativa do Brasil com os países de padrões de inclusão social intermediário e avançado de referência. Alguns erros passaram desapercebidos pela revisão. No entanto, nem de longe comprometem a validade e qualidade do trabalho, Cito, por exemplo, onde se lê “censos democráticos”, leia-se “censos demográficos”, p. 14, um deslize irônico, talvez, pois alguns censos foram mesmo “não-democráticos”. Concluindo, esta é uma obra séria e abalizada, que provoca impacto ao fornecer elementos para o debate que a sociedade brasileira deve empreender para guiar suas escolhas. Este livro torna-se, assim, indispensável para governo e sociedade civil, para todos aqueles preocupados em mudar o retrato excludente do Brasil e empenhados na criação de um país solidário. *José Valter Arcanjo da Ponte Analista Judiciário – STJ
Atlas da Exclusão Social – Volume 5 Agenda não liberal da inclusão social no Brasil Marcio Pochmann, Alexandre Barbosa, Valter Ponte, Marco Antonio Pereira, Ronnie Silva (orgs). Cortez Editora, São Paulo, 2005. ISBN 852491103, 168 p. R$ 32,00. Revista de conjuntura
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