Cosmozine #4 Rodrigo Oliveira - Coisas de valor ou o valor das coisas.

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Coisas de Valor e o Valor das Coisas


Coisas de Valor e o Valor das Coisas: Um texto com várias contribuições e a topografia de uma exposição

O início...começou com um email intitulado: _ Olá, estou “Do outro lado do Atlântico”... Mas isso é uma longa história...e é essa a razão pela qual estou aqui.

_Oi gente! Tudo bem? Vocês acham que vale a pena fazer uma entrevista para o meu cosmozine? Ou basta escrever algumas idéias. São tantas idéias... tenho receio que todo o mundo fique confuso com tanta informação. Aí... acho que era legal explicar a minha ligação com o Brasil e como o panorama artístico Brasileiro, que estudei e vi o trabalho da Lygia Clarck aqui em Portugal numa grande retrospectiva em 98 e dela cheguei ao trabalho do Helio Oiticica, do Cildo Meireles e de toda uma geração de jovens artistas que foi marcante para o meu percurso enquanto estudante de arte. Acho que esse texto fará com que muita gente entenda muita coisa do meu trabalho e sobretudo o conceito e fundamento da minha prática artística. Espero que gostem, estou fazendo tudo isto com um enorme prazer e muita reflexão. Um abraço forte...que estou a caminho. Atravessando o oceano penso numa introdução; o que faço e o que procuro, quem sou eu?


ARTE

CONTEMPORÂNEA

de segunda a sexta, das 10 às 19 horas sábados, das 10 às 15 horas Shopping Cidade Copacabana Rua Siqueira Campos, 143 Sl. 32 (galeria) e Sl. 80 (acervo) Copacabana – Rio de Janeiro Tel. +55 21 2236-4670 cosmocopa@gmail.com Diretores Artísticos Felipe Barbosa e Rosana Ricalde Diretor Executivo Álvaro Figueiredo Gerente Geral Roberta Alencastro Atendimento Bruno Monnerat Acervo e Transporte Teresa Gonçalves Assuntos Gráficos Lin Lima Elenco Edgar Orlaineta Felipe Barbosa Geraldo Marcolini Hugo Houayek Leo Ayres Lin Lima Louise D.D. Marta Neves Mônica Rubinho Murilo Maia Rafael Alonso Rodrigo Oliveira Rosana Ricalde Sidney Philocreon


Abre Espaรงo (Relato) / 2011


Vamos comer Caetano (marmita de canto) / 2011 caixa de plรกstico revestida com folha de prata


Sem terra / 2011

Reveillon, 2011 - O livro “arte na viragem do Milénio” / 1999-2000


“Rodrigo Oliveira (Sintra, 1978) é um artista com uma carreira relativamente recente mas com um trabalho irredutivelmente singular. Uma parcela importante da sua obra tem-se ocupado do desmistificar, ou do reduzir ao absurdo, determinados lugares comuns sobre a arte e os seus modelos de apresentação. Para isso tem analisado rigorosamente o aparato artístico, desenvolvendo projectos em que revê os papéis do artista e da instituição, mas também das circunstâncias e das expectativas que envolvem sempre a exposição de obras de arte. Não é por acaso que em várias das suas peças nos confrontamos com dispositivos como paredes, plintos, bancos de museu, que, na sua singular utilização pelo artista, garantem uma hábil gestão das nossas esperanças, ou dos nossos supostos direitos, quanto à apresentação e acessibilidade do objecto artístico – processos que evocam, de forma consciente, precedentes históricos associados à “crítica institucional”, que examinava espaços e processos de comunicação, bem como as condições do espectador. Isto levou-o a replicar estratégias e metodologias típicas da cultura modernista, revelando o carácter ideológico e cultural que distinguiu o nascimento das instituições que apresentam arte contemporânea, conduzindo-o naturalmente a um pensamento crítico sobre a arquitectura, e sobre os falhanços das utopias políticas, sociais e estéticas que culminaram no absurdo das nossas vidas quotidianas, nomeadamente a um encolher do espaço público e da interacção social. É um artista obcecado com as formas como os espaços arquitectónicos influenciam, controlam os nossos movimentos – controlo que não contradiz, pelo contrário, os vários graus de falsos conforto e segurança que pretendem proporcionar (e vários dos seus projectos partem de tipologias arquitectónicas ligadas à ideia de condomínio fechado). Interessa-lhe o espaço nas suas várias manifestações: sociais, políticas, físicas, psicológicas, históricas. As suas esculturas e instalações, no seu rigor, elegância formal e aparente frontalidade, escondem sempre um complexo sobrepor de sentidos, e vêm quase sempre acompanhadas de grandes doses de humor, muitas vezes corrosivo e nunca isento de crítica. É constante no seu trabalho um pensamento crítico sobre os paradoxos e os mistérios da vida moderna – no que toca às formas de habitar, à nossa relação com os espaços, com os objectos – muitas vezes associado a uma revisão da tradição do grande, quase messiânico projecto ilustrado que foi a arquitectura modernista. Rodrigo Oliveira, muitas vezes referindo-se directamente a figuras como Le Corbusier e Mies van der Rohe,


confronta-nos constantemente com os resultados contraditórios e múltiplas fissuras do projecto da modernidade, em termos arquitectónicos, mas também artísticos e filosóficos. Interessante é que, na sua obra, esta preocupação com a arquitectura se associe a determinadas formas e protocolos que associamos imediatamente ao minimalismo, que tem sido revisitado pela arte contemporânea justamente com o objectivo de mostrar como todo o ideal, qualquer ideia de pureza ou de neutralidade, podem ruir mal enfrentem a prova de serem colocados perante uma ordem social, histórica, narrativa; digamos que as referências à arquitectura modernista vêm submeter os objectivos do minimalismo às condições da realidade, complicando a sua intencional transparência. Também os materiais que utiliza, muitas vezes sem qualquer intervenção da sua parte, vêm contribuir para aquela complicação: interessam-lhe materiais ambíguos, que possam ser simultaneamente símbolo e matéria-prima, que estejam no mundo quotidiano e ainda impregnados de significados. (…)”1

Garimpos (detalhe)


Naturezas mortas (trabalho do fado Xuxu) / 2011 Livros da Taschen cortados e alterados, em caixas de acrĂ­lico.


Naturezas mortas (cesta bĂĄsica) / 2011 Livros da Taschen cortados e alterados, em caixas de acrĂ­lico.


O Título: _Nesse texto ele usa a palavra objetos, mas no meu livro ele fala de coisas mesmo!! _Obrigado Bruno, vou ler atentamente. Este título surgiu de forma intuitiva, como sempre. Estava pensando no valor dos objectos enquanto coisas e as coisas enquanto objectos e qual o seu valor. Mas legal que há uma teorização sobre isso. Deixa ver. “No ensaio de abertura do livro “História da arte como história da cidade”, datado de 1969, Argan (1909/1992), a partir dos escritos do filósofo alemão Scheler, fala das obras de arte como categorias de bens criados pelo ser humano e que diferem dos objetos comuns, havendo, portanto duas categorias distintas: a dos objetos que têm valor, e a do valor dos objetos. Os objetos, enquanto bens “tangíveis”, podem ser tocados, alterados, danificados ou reparados, e até mesmo comercializados. Já os valores são “juízos” atribuíveis aos objetos, e pertencentes à escala de valores da sociedade julgadora.”2 _Falando de “Coisas de Valor e do Valor das coisas”, a exposição é muito centrada em objectos que partem de algo da cultura Brasileira e/ou carioca e observados por alguém de fora que os canibaliza e os devolve com uma nova leitura. Os objectos são resultado de uma descontextualização e reinterpretação com linguagens conceptuais. Há todo um comentário sobre a identidade, o exótico, colonialismo e as linguagens existentes nos “circuitos ideológicos” (expressão emprestada do Cildo Meireles) As peças têm uma ligação e uma sequência entre elas e começar por uma ordem é meio complicado devido a toda a interligação e interdisciplinaridade que estabelecem.


Capanema / 2010 Instalação composta em duas partes; estrutura de metal, sistemas basculantes, manivelas, tecidos de plástico colordos. Dimensões variáveis consoante a instalação dos 15 módulos (cada modulo: 300x100x68cm)...

...quadro de mogno, vidro, feltros coloridos e placa gravada. Dimensões: 210x120x12cm


Cada Casa ĂŠ um Caso (Comunidade) / 2011

Garimpos (Posicionamentos geoestratĂŠgicos) / 2011 pratos de madeira com pinturas incrustradas


Sobre os trabalhos 1. Cada Casa é um Caso (Comunidade) / 2011 _Consiste numa espécie de móvel arquivo de caixinhas de fósforos coloridas que parecem uma fachada de um edifício. Aqui o contexto vai para a reorganização e racionalização das varias arquitecturas de uma favela colocadas num prédio modernista e de arquitectura racionalista. 2. Lá no Morro (Carmen a portrait) / 2011 _A peça parte de uma ideia de exótico sobre as frutas tropicais criando uma espécie de retrato de Carmen Miranda. Uma artista que é um símbolo do Brasil e que tem origem Portuguesa. A peça parece uma pintura com um cunho escultórico tipo uma lápide funebre que tem como fundo uma imitação de mármore com colagem colorida de frutas que são geralmente usadas para colar nos azulejos de cozinha de modo a tornar tudo mais decorativo. É uma espécie de natureza morta. 3. Naturezas mortas (cesta básica) e Naturezas mortas (trabalho do fado Xuxu) / 2011 _São dois livros da Taschen cortados e alterados, colocados em caixas de acrílico e fixados na parede. A natureza morta deixa de ser visual e passa a algo conceptual. No meio do livro recortado que revela de forma diferente o seu interior estão duas listas de compras de supermercado. Uma contendo os ingredientes da Cesta básica e outra contendo os ingredientes que estão presentes na letra de um fado de Amália (que viveu e cantou uma temporada no Rio) e onde os ingredientes exóticos do fado xuxu remetem para o exotismo tropical e numa segunda leitura para um trabalho de macumba. 4. Vamos comer Caetano (marmita de canto) / 2011 _é uma peça de canto de parede de pequenas dimensões que consiste numa caixa de sandwich de plástico revistida como se fosse uma marmita ou uma “quentinha” com folha de prata verdadeira. O título da peça parte de uma música com o mesmo nome, de Adriana Calcanhoto e que fala do Caetano Veloso ao mesmo tempo que refere o tropicalismo e a antropofagia. 5. Estante de Serviço (leitura em diagonal das páginas Amarelas RJ) / 2011 _Durante algum tempo coleccionei e recortei parte das páginas amarelas e as colei de modo a criar uma imagem de lombadas de livros colocados numa


estante e organizados por ordem alfabética. Esta peça é baseada na letra de uma musica de Adriana Calcanhoto chamada de “Jornal de serviço”. É um work in Progress para cada cidade) 6. Reveillon, 2011 O livro “arte na viragem do Milénio” / 1999-2000 _foi transformado numa espécie de confetti industrial para festa de passagem de ano. 7. Abre Espaço (Relato) / 2011 _É uma peça som instalada numa coluna de parede e que partiu da primeira marchinha carnavalesca abre alas de chiquinha Gonzaga e sobretudo dos relatos de futebol de jogos da copa em que o Brasil foi campeão. O relato é transformado numa narrativa radiofónica e descontextualizado. O som e a voz definem um espaço e a uma ação de movimento nesse mesmo espaço. Ou seja parece que somos orientados num circuito de uma casa imaginária. Não são ouvidas palavras directamente relacionadas com futebol mas o modo de relato remete para esse contexto. 8. Directório (Canibalizando Burlé que canibalizou Corbusier) / 2011 _Consiste em directórios, vitrines de informação que encontramos na entrada dos edifícios com informação dos condóminios ou com informação em edifícios públicos. São quadros de feltros com desenhos do Burle Marx do palácio Capanema e da Praça Salgado Filho RJ em frente ao aeroporto Santos Dumont. 9. Boa Vizinha (Aquarela do Brasil) / 2011 _Consiste numa pintura mural de uma das paredes da galeria. Godés de plástico com uma forma modernista são adaptados a uma das paredes da galeria como friso arquitectónico perto do teto. Esse friso deixa escorrer do teto ao chão aguarelas coloridas de um modo geométrico criando uma espécie de padrão geométrico de papel de parede. O contexto da peça parte de aquarela do Brasil que foi divulgada num dos filmes Disney (que introduzio o Zé Carioca) e tinha como missão uma política de boa vizinhança com o Brasil no período da 2ª Guerra Mundial. 10. Garimpos (Posicionamentos geoestratégicos) / 2011 _São uns pratos de grandes dimensões com pinturas incrustradas que referem os cristais dos minérios de garimpo mas aqui organizadas de modo a criar um padrão colorido. (foto do convite) As peças são colocadas no chão ou na parede e emanam um brilho, como se de uma aura se tratásse e que não é bem perceptível. Uma parte da peça é forrada a folha de ouro como os altares das igrejas barrocas de Minas gerais. Havendo aqui um comentário à exploração de minérios, religião e colonialismo (busca das matérias primas) ao mesmo tempo que é explorada a geometria quase modernista dos cristais de mineração colocados numa pintura.


Este trabalho se desdobrou em pequenas peças que podem fazer parte de uma instalação e também em duas séries de fotografias que são completamente autônomas. Encerram em si uma nova série de possibilidades que as tornam únicas em sua boragem conceitual e plástica. Uma das séries chamase “Espelhos de água (da série garimpos: posicionamentos Geoestratégicos) e a outra é intitulada “Do outro lado do Mundo (da série Garimpos: Posicionamentos Geoestratégicos)”. Para terminar... 11. Êxodo, (Sem Terra), 2011 _é uma caixa de luz que estamos habituados a ver sinalizando as saídas de emergencia dos edifícios. Aqui o texto que geralmente é SAÍDA ou EXIT é subvertido para Êxodo.

Rodrigo Oliveira, Rio de Janeiro, abril de 2011

1 _Ricardo Nicolau in “Atenção” no catálogo da exposição Joke, Satire, Irony and Serious Meaning, European Triennial of Small-Scale Sculpture, Gallery of Murska Sobota, Slovenia, curator: Thomas Deckee (cat.), 2007. 2 _“O valor intangível nas obras de arte”, de Edival Vilar de Araujo Júnior http://www.ici.curitiba.org.br/Multimidia/Documento/Artigos/ArtigoMBA_Edival.pdf Agradecimentos _A todos os que tornaram este projecto possível…e vocês sabem quem são, nem preciso nomear. Obrigado mesmo! Fotografias _Rodrigo Oliveira e Raquel Melgue (Rodrigo Oliveira * Studio)


Formação -

MA Fine Arts at Chelsea College of Art & Design, London, UK - 2006; Erasmus programme,UDK,Universität der Künste, Berlin, Germany - 2002/2003; Independent study programme,Maumaus School of Visual Arts, Lisbon - 2000/2002; BA Fine Art Sculpture, Lisbon University of Fine Arts, Portugal - 1997/2003.

Últimas Individuais 2011 2010 2009 2007

2005 2003

Coisas de Valor e o Valor das Coisas, Galeria Cosmocopa - Arte Contemporânea, Rio de Janeiro, Brasil; Ninguém podia dormir na rede porque a casa não tinha parede, Filomena Soares Gallery, Lisbon Portugal; Utopia na casa de cada um, CAV Centro das Artes Visuais, Coimbra, Portugal Da Obra ao Texto, Galeria Presença, Porto, Portugal; Voyeur Project, Lisboa, Portugal; O espírito do Lugar, Escrita na Paisagem - festival de performance e artes da terra, Museu da Luz, aldeia da Luz, Portugal; Complex constructions Mural Carpete, European Parliament Espace Couloir, An Camões Institute project for the Presidency of the Council of the European Union, Brussels, Belgium, curator: Lúcia Marques; ;-) Filomena Soares Gallery, Lisbon, Portugal; EmFractura: Colisão de Territórios, Project room do Projecto Terminal, Fundição de Oeiras, Hangar K7, Portugal, curator: PauloMendes (cat.); At First Sight, Project room, Filomena Soares Gallery, Lisbon, Portugal

Últimas coletivas 2011

2010

O Consolo da Pintura - Companhia de Seguros Tranquilidade, Lisboa / Lisbon A Corte do Norte, Plataforma Revolver, Transboavista | VPF | Art Edifício, Lisboa / Lisbon, Portugal; “Colecção Luís Ferreira” - Centro de artes e Cultura de Ponte de Sôr; “O Museu em Ruínas” - Museu de Arte Contemporânea de Elvas - Obras da Colecção António Cachola; A secreta Vida das Palavras (13ª edição do Projecto Verão Arte Contemporânea em Sines) Centro Cultural Emmerico Nunes (CCEN) e Câmara Municipal de Sines/Centro de Artes de Sines (CAS). Curadoria: João Pinharanda / The Secret Life of the words (13th edition of the Contemporary Art Summer Project, Sines) collaboration between the Cultural Center Emmerico Nunes (CCEN) and Municipal Chamber of Sines / Sines Arts Centre (CAS), Portugal. Curated by João Pinharanda; O DIA PELA NOITE, Lux Frágil; Projecto comissariado por Susana Pomba / Project curated by Susana Pomba. 10 intervenções no Lux / 10 interventions at Lux_ Artistas; ESTADO DE ATENÇÃO, Festival de Almada / Almada Festival ; Curadoria: Marta Mestre e Pedro Calapez curated by Marta Mestre and Pedro Calapez; Povo, Fundação EDP, Lisboa, Portugal / “People” EDP Foundation, Lisbon, Portugal; Carpe Diem Arte e Pesquisa, curadoria / Curated by: Paulo Reis. Artistas / Artists: Rodrigo Oliveira, Alejandro Somaschini, Cabelo, Helena Martins-Costa, José Bechara. Lisboa, Portugal; Até 2011. Cosmocopa Arte Contemporânea, Rio de Janeiro Brasil


ARTE

CONTEMPORÂNEA

Shopping Cidade Copacabana Rua Siqueira Campos, 143 –Sl. 32 (galeria) e Sl. 80 (acervo) Copacabana – Rio de Janeiro Tel. +55 21 2236-4670 – cosmocopa@gmail.com


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