I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ

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I Antologia Liter谩ria do

Maraj贸


I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ Comissão editorial Dilomeno Márcio Maués Vitelli Jorge Domingues Lopes Manoel Pedro Monteiro Vitelli Filho Marcos Antônio Maués Vitelli Maria Dalva Viana Lima Revisão Jorge Domingues Lopes Marcos Antônio Maués Vitelli Projeto gráfico, Editoração eletrônica e Capa Dilomeno Márcio Maués Vitelli Jorge Domingues Lopes Ficha catalográfica Hilma Celeste Alves Melo (CRB 2/374) Impressão e acabamento Gráfica da Universidade Federal do Pará O motivo ornamental utilizado nesta Antologia foi baseado no desenho de uma peça de cerâmica “tortual de fuso, decorado com motivos incisos”, do livro “Motivos ornamentais da cerâmica marajoara: modelos para o artesanato de hoje” (2005, p. 104), do Pe. Giovanni Gallo.

Todos os textos desta Antologia são de inteira responsabilidade de seus respectivos autores, que autorizaram expressamente a sua publicação pelo CPOEMA.

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) I Antologia Literária do Marajó / organizadores Dilomeno Márcio Maués Vitelli, Jorge Domingues Lopes. - Belém: CPOEMA EDITORA, 2009. 216 p. ISBN 978-85-2470386-7 1. Poesia brasileira – Pará. 2. Prosa brasileira – Pará. I. Vitelli, Dilomeno Márcio Maués, org. II. Lopes, Jorge Domingues, org. CDD – 20.ed.869.91 Todos os direitos desta publicação reservados para o Clube do Poeta e do Escritor Marajoara – CPOEMA 5.a Rua, 1069, 68870-000, Centro-Soure-Pará

Impresso no Brasil Printed in Brazil


Organizadores

Dilomeno Márcio Maués Vitelli Jorge Domingues Lopes

I Antologia Literária do

Marajó 2ª edição

Soure 2009


Apresentação A I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ é uma coletânea textual em prosa e verso, escrita por vinte destemidos marajoaras de coração e de berço; dos muitos que temos neste torrão composto pelos municípios de Cachoeira do Arari*, Salvaterra, Santa Cruz do Arari e Soure. Hábeis autores que confiaram ao Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA) a árdua, mas gratificante, incumbência de organizar, editar e conduzir à luz da publicação esta pioneira obra. Não usaremos este valioso espaço para delinear as inúmeras dificuldades que o escritor encontra para publicar um livro, sobretudo no Marajó. Mas, vale a nota de que, mesmo diante da ausência de patrocínio oficial, a presente obra é sonho palpável, graças, antes de tudo, a Deus e depois aos autores, familiares, amigos e mecenas que depositaram sua confiança no Cooperativismo, ferramenta indispensável para se chegar ao objetivo comum: publicar esta Antologia Literária. A abrangência da obra, abastada pela diversidade de seus autores, cada um com seu estilo próprio em forma, temática e conteúdo, é prova cabal de que unidos somos capazes de transformar nossas aspirações em realidade, como bem nos lembra o educador Paulo Freire: “Não podemos deixar de sonhar sonhos possíveis”. Neste sentido, o volume da nossa força de vontade só se compara ao grande Lago Arari, que gentilmente empresta seu nome ao título desta Antologia. Sendo merecedora de nossa atenção, a coletânea em foco é, provavelmente, um novo referencial na história da cultura marajoara, pois, pela primeira vez, contistas, cronistas e poetas marajoaras promovem uma ação conjunta e inédita na região. Iniciativa marcante, Arari vem do tupi *ara’ri “variedade de arara” (forma histórica, 1928 arary), logo rio Arari = rio das araras, é também nome de um cipó (cipó-cururu), encontrado nas margens dos rios da região. Marajó, maior arquipélago de ilhas fluviomarinhas do planeta, provém do tupi mbara-ïo “tirado do mar, anteparo do mar”, em alusão à posição da ilha na foz do Amazonas, segundo Teodoro Sampaio (Cf. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001). *


tanto pelo valor de seus escritos, quanto pela relevante contribuição à bibliografia do gênero. Pororoca de palavras que traz movimentação artística ao Arquipélago do Marajó. Almejamos que o presente livro, construído nesta primeira edição a vinte mãos, incentive muito mais o escritor à seara das letras, o leitor ao gostoso hábito da leitura e que fomente, de alguma forma, outras iniciativas no campo sociocultural do Estado do Pará. Aqui também externamos nossa gratidão a todos que colaboraram para a construção deste livro; a todos os autores que dão mais um passo relevante, quiçá, rumo à nobre carreira literária; e, de modo especial, a Maria Dalva Viana Lima, Jorge Domingues Lopes, Manoel Pedro Monteiro Vitelli Filho e Marcos Antônio Maués Vitelli; dinâmicos e corajosos membros do CPOEMA e da Comissão Editorial, com os quais tivemos a honra de trabalhar. Com um abraço do tamanho da Amazônia, desejamos a você boa leitura. Até logo! Dilomeno Márcio Maués Vitelli

Poeta, pedagogo e ex-presidente do CPOEMA


Sumário Prefácio . .....................................................................................................................................................................

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Ailton Silva Favacho ...........................................................................

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Alcindino Pacheco Portal ...................................................................

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli ........................................................

36 37 37 38 39 40 41 42 42 43 44 45

Jorge Domingues Lopes . ....................................................................

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Moleque atrevido ............................................................................ Me nina, moça ................................................................................

Salvaterra . ...................................................................................... Sabores marajoaras ......................................................................... Jovens da 3ª idade ........................................................................... Ode ao Pará .................................................................................... Abacaxi ........................................................................................... Sindicato Rural . ............................................................................. O bezerro de duas cabeças . ............................................................. Conheça o Marajó I . ....................................................................... Conheça o Marajó II ....................................................................... Búfalo do Marajó ............................................................................ Mona lisa ........................................................................................ Ela é a onda . ................................................................................... Volta pra mim . ............................................................................... Bálsamo derramado . ....................................................................... Soure por um fio de poesia .............................................................. Tempo nublado ............................................................................... Sexta-feira Santa . ........................................................................... Palavra é crueldade . ....................................................................... O dia-a-dia da poesia ...................................................................... Melodias do mar ............................................................................. A passos atrás ................................................................................. A última palavra . ........................................................................... As águas ......................................................................................... A ferida ........................................................................................... Elementar I – Ares da Terra ........................................................... Elementar II – Fogo ........................................................................ Elementar III – Água . .................................................................... Ao amar ..........................................................................................


José Antônio Monteiro Muribeca ......................................................

56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 65

José Lúcio Sarmento Alves .................................................................

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Liz Carla Silva Castro . ........................................................................

76 77 78 80 81 82 83 84 85

Luíz José Monteiro Cecim ..................................................................

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No tempo de João Vianna ............................................................... Brilhante Cachoeira ........................................................................ Lembrando Dalcídio ....................................................................... Marajó supremo . ............................................................................ Meu Marajó .................................................................................... Ge . .................................................................................................. Quero .............................................................................................. Meu poema, seu poema ................................................................... Amor em poema .............................................................................. És ....................................................................................................

O Boto, uma versão científica ......................................................... A gana humana .............................................................................. Canção ao vento .............................................................................. Anjo ................................................................................................

Navegante sonhadora ..................................................................... Contemplação marajoara ................................................................ Olhos de inspiração . ....................................................................... Dentro de mim . .............................................................................. Eterno laço ...................................................................................... O meu amor não morrerá ............................................................... É sempre assim ............................................................................... Saudade . .........................................................................................

Anjo e demônio ............................................................................... Bocas ............................................................................................... Canção da esperança ....................................................................... Do fundo d’alma ............................................................................. Vozes . ............................................................................................. É preciso . ........................................................................................ Ociosidade interior ........................................................................ Procissão ......................................................................................... Sussurros ........................................................................................


Luiz Tarciso Coelho Bezerra ..............................................................

96 97 98 99 99 100 100 101 103 104 105 105

Marcos Antônio Maués Vitelli . ...............................................................

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Maria Jardelina Pinheiro . ..................................................................

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Maria José Barros de Almeida ..........................................................

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Banco da Amazônia – 50 anos, em set./2006 ................................. Brincadeiras .................................................................................... Cândida . ......................................................................................... E o que é que me falta fazer mais? .................................................. O cachorro ...................................................................................... Prazer carnal .................................................................................. Minha aposentadoria ...................................................................... Patativa do Assaré e Assaré do Patativa ........................................ Preto Jovêncio, O Vaqueiro ............................................................ Quem é a Mulher? . ........................................................................ Soneto do Amor Ausente ................................................................

A magia do amor . ........................................................................... Desencanto ..................................................................................... Distância . ....................................................................................... Escolha ............................................................................................ Mutismo ......................................................................................... Recordações . ................................................................................... Saudade . ......................................................................................... Tempo ............................................................................................. Vozes no poema ..............................................................................

Harpa do poeta . .............................................................................. Quero te amar ................................................................................. Musa dos poetas . ............................................................................ O vento ........................................................................................... Madona ........................................................................................... Triste separação .............................................................................. Cabocla morena . ............................................................................. Cidade das mangueiras ................................................................... O nascimento da Princesinha do Marajó .......................................

Minha inspiração . ......................................................................... Terra querida .................................................................................. Santa Cruz, linda e faceira ............................................................. Minha terra . ................................................................................... Minha mãe Rosa, meu porto seguro ...............................................


Pra sempre te amar ......................................................................... Para Anderson e Bárbara . .............................................................. Sua fé .............................................................................................. 2° Domingo de Maio ......................................................................

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Maria Justina Sabóia ...........................................................................

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Max Barbosa Gomes ...................................................................................

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Mestre Tomaz. ...............................................................................................

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Outra vez ........................................................................................ A filha do sol ................................................................................... Imenso sentimento .......................................................................... Ilha maravilha . ............................................................................... Marajó curumim ............................................................................ Marajó em canto ............................................................................. Lágrimas de um rio . ....................................................................... Cotidiano ........................................................................................ Amor cigano ...................................................................................

Marajó ............................................................................................ Pedaço da Amazônia ....................................................................... Exaltação . ....................................................................................... Madrugada cachoeirense ................................................................ Lucidez . .......................................................................................... O louco . .......................................................................................... Eu e meu ......................................................................................... Paz e tristeza . ................................................................................. Vinte de março . .............................................................................. O problema .....................................................................................

HISTÓRIAS E LENDAS .............................................................. Pretinho da Bacabeira ..................................................................... A Carrocinha .................................................................................. O Vaqueiro Boaventura . ................................................................ Mãe de Fogo . .................................................................................. A Verdadeira História do Lobisomem ............................................ O Fantasma .................................................................................... As Cidades do Marajó e suas Tradições ......................................... Reação Clube . ................................................................................. VERSO EM RIMA DE PROSA ................................................... Dia das Mães .................................................................................. O Toco ............................................................................................


Otávio da Silva Nascimento Júnior ..................................................

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Reginaldo da Consolação Monteiro .................................................

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Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador ..........................

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa ...................................................

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Sinto . .............................................................................................. A grande Ilha de Marajó . ............................................................... Lembranças daquela carta . ............................................................. Ao meu conterrâneo . ...................................................................... Maisa .............................................................................................. Olhos . ............................................................................................. Boto ................................................................................................. Ontem, hoje e o amor ...................................................................... Vem . ............................................................................................... Nunca ............................................................................................. Uma lágrima escondida ..................................................................

Um símbolo de amor ....................................................................... Uma velhice feliz . ........................................................................... O poeta é um sofredor ..................................................................... Quando a vi pela primeira vez . ...................................................... Na verdade, quem sou eu? . ............................................................ Dia das mães sem você . .................................................................. O preço de uma alucinação alcoólica .............................................. Uma inesquecível noite de amor .....................................................

Heróis anônimos ............................................................................. Soure ............................................................................................... Belezas naturais .............................................................................. Cultura ........................................................................................... Feliz cidade ..................................................................................... Olhos de poeta . ............................................................................... Ilha de esperança . ...........................................................................

A natureza e um sofredor ............................................................... Cristão ............................................................................................ Dádivas ........................................................................................... Egoístas . ......................................................................................... Eu sei .............................................................................................. Últimas palavras . ........................................................................... Sinais de realidade ..........................................................................


Fernanda ......................................................................................... O poeta apaixonado ........................................................................ Sabedoria . ....................................................................................... Rosa ................................................................................................

Sinval Lyra, Dr.

.................................................................................. Acróstico ......................................................................................... Devaneio ......................................................................................... A chuva . ......................................................................................... Experiência de amar ....................................................................... Nova aurora .................................................................................... Doce ilusão . .................................................................................... Caminhando . .................................................................................. O luar ............................................................................................. Enganos .......................................................................................... Consumatum est . ...........................................................................

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Prefácio

Ao ler a I Antologia Literária do Marajó, deparei-me com a singeleza da expressão do sentimento artístico e com o amor pelo fascinante mundo amazônico do Arquipélago do Marajó. Lembrei-me de um texto de Jorge Luís Borges que diz: “Não apenas o escritor, mas todo o homem deve se lembrar de que os fatos da vida são instrumentos, (...) tudo que lhe aconteceu (...) funciona como argila, como material que deve ser aproveitado para sua arte”. É desta argila que se formou esta Antologia. Da vida simples de pessoas comuns emanou o sentimento artístico, que se transfigurou em versos e contos. São sonetos e odes ao lado de poemas escritos com versos livres, brancos e até formas concretistas; há contos e microcontos ao lado de crônicas sobre lugares e situações do cotidiano. Enfim, tudo isso traduz a vida, no inquietante cismar do artista com a palavra, cujo esforço coletivo dos escritores, vale ressaltar, alguns estreantes outros mais experientes, trouxe a público esta obra. É na palavra peculiar do homem caboclo, filho ou não desta Ilha, que deseja expressar, por meio da literatura, a experiência com a terra, seu encatamento pela natureza, suas paixões, venturas e desventuras, que cotejamos o limiar entre o vivido e o imaginado. Por isso, alguns textos, mesmo seguindo a matriz das tradições orais amazônicas, destacam, além dos aspectos culturais da região, traços de uma produção literária contemporânea que almeja a universalidade. A atmosfera mística de um mundo habitado por “pretinhos”, “botos”, “vaqueiros”, criaturas mágicas que povoam encruzilhadas, estradas, rios, igarapés, matas e fazendas, e compõem o cenário para esses artistas em cujo ufanismo ressaltam e exaltam um Marajó desconhecido, que se vai desnudando pouco a pouco nos textos. Assim, ao reunir escritores dos municípios de Cachoeira do Arari, Soure,


Salvaterra e Santa Cruz do Arari, observamos, de certo modo, a própria composição da identidade marajoara. Por isso, o cantar a terra passa pela idealização de uma natureza idílica e segue para mostrar, por meio da ficcionalidade, a vida real de homens e mulheres reais que aproveitam da vida, argila de sua arte, todos os sentimentos que revolvem seu espírito criador e que marcam seu regionalidade. Elizabete Raiol Lopes

Professora de Literatura Brasileira


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“Com as palavras nasciam rumos, sombras, movimentos, impulsos, novos ares.” Jorge de Lima

(Canto V – Poemas da Vicissitude. Invenção de Orfeu, 1952)


Ailton Silva Favacho

Nasceu em Soure-PA, no dia 04 de setembro de 1980. De origem humilde, sempre se dedicou aos estudos, tendo ingressado, aos 17 anos, na UFPA, licenciando-se em Letras, habilitação em Língua Portuguesa. Descobriu, desde muito cedo, o gosto pela leitura e pela escrita, chegando a compor pequenas narrativas e poemas. Carteiro de ofício e filho de professora e marceneiro, costuma exercer as profissões de ambos, além de dedicar-se ao artesanato e a movimentos sociais.

Meus agradecimentos elevo a Deus por ter-me concedido este singelo talento e a todos os meus familiares e amigos que me incentivaram, contribuindo significativamente para que pudesse participar desta publicação.


Ailton Silva Favacho

MOLEQUE ATREVIDO Maldito do homem que não sonha.

Passava-se julho quando Caio e Bete haviam concluído a Faculdade de Engenharia Civil. O desemprego assolava o país, grande era a concorrência na capital. No jornal, a oferta de vagas numa pequena cidade do interior. Vivia-se o período das obras que só se edificam próximo às eleições. Era preciso tentar impressionar o povo, descrente diante de tanta corrupção. Não havia escolha. Já se fora o tempo em que se podia apontar o lugar para exercer um ofício. Preencheram os requisitos exigidos e conseguiram trabalho, sazonal. Dias depois, partiram cedo, de madrugada. No céu, a lua e as estrelas cintilavam sobre o caminho para Niili, localizada numa região em que as fazendas de búfalos compunham quase todo o cenário e onde, à época, reinava a estiagem, impiedosa e voraz. Nunca estivera tão quente e seca. A televisão noticiava o aquecimento que o homem fomenta e pelo qual paga alto preço. Às margens da estrada, a vegetação e a água tinham desaparecido, e um enorme zebu olhava a seu redor procurando o que comer. Mas o fogo já comera praticamente tudo. Somente algumas poucas árvores restaram. Durante horas, a paisagem parecia nada se alterar. Pensavam ter brecado. Só pensavam. A viagem, longa e triste, lenta e incomodamente ia consumindo-lhes as forças. No caminho, inúmeras pessoas eram encontradas, em geral saindo em busca de uma vida melhor. Grande era o êxodo; pequena a chance de conseguir o que se queria. Após tanto sacrifício, finalmente chegaram. Logo foram em busca de um local para tomar banho e para saciar a sede e a fome que os massacravam há horas. Por coincidência, Caio encontrou Tonho, um velho amigo de infância, por quem foi convidado, juntamente com Bete, para conhecer-lhe a residência. Na casa, havia não só água e comida como também conforto similar àquele do qual ambos dispunham em sua casa. A refeição parecia ter sido temperada com sonífero, fazendo-os adormecer a tarde inteira. Tarde ensolarada, bastante apropriada a um passeio, mas faltava-lhes energia. www.cpoema.org

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Quando o sol já se recolhia para seu descanso diário, acordaram e resolveram sair para ver o lugar em que estavam, o que lhes esperava. Passearam muito e puderam vislumbrar um local abandonado, onde não havia sequer um parque ou cinema. Restava a pracinha, na qual crianças brincavam de pião, de roda e de peteca. Brincadeiras raras e já quase extintas pelos vídeogames e computadores. Achavam já ter visto o suficiente para aquele dia. Regressaram para casa. No noticiário da noite, guerras, violência, conflitos. Estaria o racional em regressão? Após o jantar, os dois acomodaramse em um quarto que o amigo lhes concedeu para ficarem enquanto durasse a realização das obras nas quais iriam trabalhar já a partir do dia seguinte. Ao amanhecer, nuvens excêntricas em conjunto com raios solares traziam consigo um tom enigmático, misterioso. A sinfonia dos pássaros anunciava o nascer de mais um dia, o início de mais um capítulo de uma novela real e infinda de um povo cuja sombra eram as dificuldades, diversas. A esperança, o sofrimento, a incerteza, tudo voltava à cena. Na cozinha de uma velha casa, onde morava Chica, a vizinha e lavadeira de roupas de Tonho, ouviu-se uma voz pueril, corajosa: — Mãe, sonhei que era médico, conseguia dinheiro e uma casa grande e bonita. A gente não passava mais fome. A mãe, chateada com o marido, que costumava chegar embriagado, tentando espancá-la, retrucou: — Deixa de besteira, Leo. Cuida é de ir vender o chopp que a Dona Marciana fez. Nós precisamo é de dinheiro e não desses sonho besta. Hoje não temo nem café, e teu pai já tá bebendo lá no Custódio. Cuida, vai logo, garoto! E vê se não volta pra casa sem nenhum trocado. Incentivar sonhos era coisa que não se fazia em Niili. Aprendera-se desde cedo a viver daquele jeito, a aceitar aquela realidade, aquelas condições difíceis de sobrevivência. Não se podia nem se queria sonhar; muitos pareciam estáticos diante de tudo. E nada faziam para burlar tal sina e alterar o cruel destino. Perdiam horas envolvidos em jogos de cartas. Jovens e adultos. As cartas sobre a mesa

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geravam um outro mundo, cheio de fantasias, no qual mergulhavam sem perceber que o tempo não dá tempo a quem acha que tem tempo de fazer algo sempre adiado. Mais pareciam crianças, cuja limitação diante da miséria e da falta de oportunidades as fazia brincar ao invés de lutar contra inimigos aparentemente indestrutíveis. Miro era pai de Leo e de mais cinco filhos. Jamais lhes afagou a face, nunca os abraçou. Tornara-se alcoólatra, maltratava a companheira e havia anos que não trabalhava. Vivia a família do pouco gerado pela lavagem de roupas e dos trocados que Leo conseguia durante horas de andanças. Da mulher doíam as mãos calejadas; das crianças, a barriga. — Mamãe, lá vem o papai. — Dizia, já choramingando, a pequena Lu, que via na presença do pai uma ameaça. — Vão pra casa da vó de vocês, mas não falo nada pra ela. — Ordenava a sofrida esposa, poupando os filhos de mais um conflito. — Cadê a bóia, já tá pronta? Quero cumê. Cadê o cumê? ― Chegara o homem, bêbado, faminto e constantemente irado. Nada lhe dizia Chica. O silêncio talvez fosse a melhor saída. Talvez. O porre irritava-se ainda mais ao sentir-se ignorado. — Tu não fala, não? — Indagava Miro já segurando a mulher pelos braços e cabelos. — Me solta, safado! — Retrucava ela, agatanhando-lhe o rosto. Aquela cara monstruosa que até os filhos conseguia afugentar. Não gostavam dele as crianças. Era ríspido, inacessível, cruel. O jogo de cartas era bem mais atraente que a própria família. Lá bebia, o dia todo, a cachaça, o líquido que o destruía sem que se desse conta. Perdera o emprego, o respeito e a confiança. Tornara-se um marginal, evitado por quase todos. Transformara-se num bicho a vagar sem rumo, caminhando sempre em direção a lugar nenhum. Os tempos eram difíceis em Niili. A miséria era a sombra de muitos. Para poucos sorriu a vida. Emprego e dinheiro pareciam estranhos ou desconhecidos a incontáveis indivíduos. Leo continuava a sonhar com a medicina. Realizar-se seria a glória para o menino pobre e negro da humilde cidadezinha. Queria poder curar crianças carentes, mudar de vida, ajudar a família, mas ainda era moleque e www.cpoema.org

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não tinha apoio ao menos para manter vivo o sonho. Apesar disso, sua persistência e determinação sufocavam a carência de incentivo e o preconceito para os quais muitas pessoas se rendem. Chamavamlhe de Pretinho da Bacabeira, zombavam-lhe da cor. E não é que o moleque tinha algo de Pretinho! Ambos eram ousados, atrevidos, sagazes. Contrariamente ao que desejavam, os ignorantes que o discriminavam traziam-lhe à mente a figura do lendário, impositor de autoridade e respeito. Nas ruas, onde passava horas a trabalhar, Leo vivenciou diversas experiências, tornou-se excelente moleque de negócios, aprendeu a se defender das arapucas da vida e fortaleceu-se. Tanto que foi capaz de dizer não quando os meninos que não sonhavam lhe ofereceram cola para cheirar e cachaça para beber. Jamais poderia ser um médico alcoólatra ou drogado, porque assim não salvaria as vidas como as queria. Sofria muito nas ruas. Sempre surgia alguém para querê-lo humilhar. Era preço pago por não ter um pai do tipo que toda criança quer. Fazia dele às vezes. Tinha de labutar duramente para alimentar os irmãos-filhos e tentar dar-lhes o mínimo de condições para sobreviverem. Um moleque-homem. Mais homem que moleque. Consumira-lhe a infância o trabalho nas ruas. Um mal necessário do qual extraía comida e roupas, ainda que parcas. Quando possível, adorava ler bons livros. Gostava do Alfredo, aquele do caroço de tucumã; ria do Macunaíma e admirava Castro Alves, porque defendia os negros. Os dias passaram. Leo amadureceu. Conseguiu, apesar de tudo, concluir os estudos. O pai morrera. O vício o matara. A mãe envelhecera e agora precisava dele como nunca. E ele sempre estivera ao lado dela. Era um filho obediente, carinhoso. Tinha virtudes que muitos filhos equivocadamente desprezam. Era também bastante esforçado nos tempos de escola. Estava determinado a chegar ao destino apontado. Estudar significava a maior arma para superar todos os obstáculos que a vida lhe impusera. Precisava vencer por si só e tinha em seu interior a vontade de vencer. Queria escrever a própria história, conforme a planejara. Durante horas, ficava embaixo das mangueiras, pensando no futuro. Para buscar o que queria, era preciso passar a morar na Capital.

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Mas não poderia partir diante do debilitado estado de saúde da mãe. Jamais a deixaria. Pensava também em Clóvis, um fazendeiro que conhecera há anos quando Leo ainda era garoto. Conheceram-se num dia em que o gentil senhor foi a Niili numa balsa buscar uns búfalos, como costumavam fazer os criadores que exploravam a terra e a gente niiliense para construírem seus impérios na Capital. Leo viu a embarcação e foi até lá para vender chopp. Vários homens lá estavam e pediram a aproximação do garoto. Ele assim o fez. E os tripulantes passaram a servir-se do produto vendido pelo guri. Depois, alguns o mandavam embora recusando-se a pagar. De súbito, Clóvis chegou, percebeu o que estava acontecendo e ficou observando, revoltado, aquela cena. O menino suplicava para que lhe pagassem, porém só recebia em resposta sarcásticos risos que torturavam sua alma pueril. Chegar sem o dinheiro certo significaria perder a pequena comissão a qual teria direito. Talvez Chica lhe batesse, achando estar Leo envolvido em molecagem, deixando de ser o filho responsável, por quem sempre teve admiração. Ele chorou, e Clóvis resolveu sair da platéia e interferir: — Por que não pagam o menino, se sabem da importância que esse dinheiro tem para ele? Gostariam vocês que outros fizessem o mesmo com seus filhos? Ficariam felizes ao vê-los humilhados da maneira como o vejo agora? Deveriam sentir pena dele e ajudá-lo, e não fazer uma coisa dessas com uma criança sacrificada pela sociedade e, principalmente, por pessoas como vocês. Palavras ferem. Às vezes, até mais que um golpe contundente. As palavras ferem a alma e sufocam inclusive alguns daqueles julgados fortes e insensíveis. Inertes, os homens fitavam Clóvis e, sem dizer-lhe sequer uma palavra, pois as mentes perturbadas pelo teor da cobrança não a puderam produzir, curvaram-se diante de Leo, pagaram-lhe e saíram de lá todos, como se procurassem recato para fulminar o remorso que lhes tirava a paz naquela hora. Ficaram então os dois, a sós. Puderam conhecer-se. Tornaramse amigos. O menino falou ao novo amigo sobre a difícil vida que levava, sobre o sonho de ser médico. Achou-o confiável, sentiu nele algo de paternal. O homem, sensibilizado, prometeu ajudá-lo. Disselhe que gostava de ajudar quem demonstrava vontade de vencer www.cpoema.org

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na vida. Queria poder construir uma sociedade mais igual, menos injusta. Escreveu num papel um endereço e um número de telefone, pedindo-lhe que o procurasse quando precisasse. A vida colocara em seu caminho alguém solidário, a seu favor. Era quem faltava. Com o passar do tempo, a doença de Chica agravou-se. Achando que em breve morreria, ela passou a conversar com os filhos, buscando confortá-los. Falou com todos, deixando Leo de último. Pediu-lhe que não desistisse de seu sonho, pois o tempo a fez acreditar no potencial do filho. Choravam os dois, abraçados. Sempre foram grandes amigos, porém parecia estar próxima a natural separação. O rapaz afagava-lhe o rosto, apertava-lhe as mãos. A melancolia tomava conta da humilde casa. No dia seguinte, a morte chegou. Tristeza geral. Perder a mãe, que dor! Com a ajuda dos vizinhos, preparam o funeral e sepultaram, então, a mulher. Depois de alguns dias, a família reuniu-se para discutir o que faria a partir daquele acontecimento. Dos seis, três acharam que deveriam ficar na casa e zelar por aquilo que tinham. Os outros decidiram que uma vida melhor só seria possível fora de Niili e, portanto, brevemente partiriam. Decidido, Leo manteve contato com Clóvis, dizendo-lhe que, na semana seguinte, estaria lá. De acordo com o que prometera, viajou. No cais, o fazendeiro estava à sua espera e o levou a uma luxuosa casa, onde morava sua esposa e mais dois filhos, que o receberam com grande alegria. Um mês após a chegada, Clóvis o matriculou num dos melhores cursos pré-vestibulares da cidade. Também o vestiu de rico para adequá-lo ao recinto. Inicialmente, era nítido o desconcerto daquele humilde espírito frente a tanta pompa. Os amigos e parentes haviam ficado em Niili. Tornara-se um solitário na multidão. Gradativamente, o rapaz negro e pobre camuflado de burguês começou a assimilar a nova realidade em que vivia. Passou a destacar-se junto com alguns poucos da classe. Seu esforço e dedicação lhe renderam bons conhecimentos em diversas matérias, dando-lhe grande prestígio diante dos demais. Nesse período, conheceu Mara, colega de sala, num intervalo de aulas. Ela aproximou-se para pedir explicação, e ele a ajudou

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atenciosamente. Desde então, tornaram-se amigos e parceiros de estudos quando não estavam no curso. Estudavam muito. Os dias pareciam mais curtos. Aproximavam-se as provas. Clóvis sempre o estimulava. Queria saber sobre seu desempenho e animava-se com a confiança do rapaz. Leo não conseguia esquecer os irmãos, preocupava-se com eles. A lembrança da mãe sempre lhe vinha à mente, e ele orava todos os dias por sua alma. O envolvimento nos estudos tirava-lhe o lazer, a diversão. Fato entendido naturalmente por Leo, porque ele aprendeu, desde muito cedo, que vencer implica abdicação ao que é supérfluo. Há uma semana da prova, nervosismo e apreensão. Estava próximo o dia em que sua dedicação e esforço estariam postos em jogo. Passar em Medicina sempre havia sido uma façanha conquistada por poucos, mas nem isso o impressionava. Queria ser médico e achava que quando se quer e se busca a consecução de um objetivo, o impossível se empequenece. Finalmente, o dia da prova. Difícil e extensa. Ainda assim, pensava ter conseguido um bom desempenho; Mara também. Restava agora a angústia da espera pelo resultado. Nesse intervalo, aproveitaram para ir à praia, à festa e começaram a namorar. Identificavam-se bastante. No dia do aniversário de Leo, coincidentemente, ocorreu a publicação da lista de aprovados. Os céus os presentearam por tudo aquilo que passaram. Pelo sofrimento, pela confiança, pela garra. Eles provaram que obstáculos existem para serem transpostos e barreiras, para serem demolidas. A casa de Clóvis virou uma festa só. Até os vizinhos vieram prestigiar a alegria que nem os filhos deram ao fazendeiro. Continuavam dependentes por considerar o patrimônio do pai suficiente para financiar a vida que levavam. Leo ligou para os irmãos, contando, euforicamente, seu feito. Na Faculdade, foi um excelente aluno. Formou-se e casouse com a médica Mara. Depois de alguns meses, resolveram morar e trabalhar em Niili. Foram recebidos com festa. Leo podia agora dar tratamento digno à gente humilde de seu povo, além de ajudar a curar as feridas que a corrupção e a falta de oportunidades mantinham acesas na pobre cidade. www.cpoema.org

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Era movido pela lembrança de um poema que Clóvis leu para ele no dia em que agradeceu profundamente por todo o apoio recebido, antes de retornar da Capital. Intitulava-se Mãos Dadas e dizia: Sei que só Não vou salvar o mundo Mas vou dizer pra todo mundo Em qualquer parte Que, se cada um, Com amor trabalho arte... Fizer sua parte Será mais fácil conter o mal Minimizar o caos. Pode ser mais simples do que parece De pouco carece É só perceber: É partilhar sem pensar só em ter E estender a mão ao irmão Ali. No chão, sem lar nem pão Sei que só Não vou salvar o mundo Mas quando a solidariedade Der a mão à sensibilidade Haverá um tempo diferente Decente De gente Sei que só Não vou salvar o mundo Mas espero acreditar Que isso é possível E necessário.

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Ailton Silva Favacho

ME NINA, MOÇA

Chegaste. Morena, tingida em neve Luzindo teus olhos fitando os meus Menina moleca sapeca sorrindo Tua vida da minha o frio feneceu. Risonho garoto em mim resgatei Brotou em meu peito amor singular Ninar-te no colo, ai como esperei! Pareces ter vindo pra me recriar. Flor linda e singela do amor emanou Um jasmim pequeno de odor pueril Em meu mundo entraste, tudo transformou Pérola negra, ser meigo e gentil. Distante és saudade e perto, alegria Doce criatura, do Pai um presente Te quero, te amo de noite, de dia Minha Cinderela de pardo semblante. Princesa encantada, de agora e depois E eu, seu vassalo, é só ordenar Te nino, me nina, ninemos nós dois És dona, senhora, a rainha do lar.

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Alcindino Pacheco Portal

Filho de Sebastião Claro Portal e Maria Melo Pacheco Portal, nasceu em Retiro Grande, Município de Cachoeira do Arari em 23/12/1932. É casado com Assunção Maria Seabra Portal, com quem tem 16 filhos e mais de 30 netos. Seu gosto pela literatura está intimamente ligado a música. Descobriu-se para a poesia numa viajem a São Paulo que fez à convite dos filhos. Na ocasião, sua cunhada Leonor encomendoulhe letra e música com o título “Do meio do Vale”, de início relutou, mas, depois de alguns dias, criou o louvor para o encontro evangélico. ALCINDINO é músico, intérprete, compositor e poeta. Aos 74 anos de idade, destina esforços para lançar o seu 3° CD gospel. Durante sua carreira literária já obteve algumas conquistas: Menção Honrosa no III Concurso de Poesia do CPOEMA, no ano e 2003 em Soure. Neste mesmo ano, obteve o 2° Lugar no Concurso de Poesia do V FESCABU, em Cachoeira do Arari, e 1° Lugar no VI Festival da Canção Cachoeirense, com a música “Cidade do meu encanto”, em 2005.

A Deus. A toda a minha família . À família CPOEMA. Aos amigos marajoaras. À Câmara Municipal de Cachoeira do Arari.


Alcindino Pacheco Portal

SALVATERRA

I Vamos falar sobre Salvaterra, Da foz do Rio Camará. Aqueles que não conheceram Como era este lugar. Era encosto de pescadores. Como era ruim pra gente saltar.

IV Dela continua ainda Não é o fim. Tem a Vila Ceará. A próxima é o Jubim. Dela segue avante. A próxima é a Passagem Grande.

II Hoje tem um porto bonito E uma rodovia também. É um movimento diário Pra ir e voltar de Belém. Isto é uma prova concreta De quem administra bem.

V Deixando a Passagem Grande Está perto pra chegar. Tem a praça do mercado Até chegar ao quebra-mar. É outra praça bonita. É um vento muito legal.

III Segue a rodovia pela Condeixa, Um lugar bonito e bom. De Condeixa vem o Moroacá. A próxima é a Vila União. Dela, pra frente, se expande... A próxima é a Vila de Joanes.

VI Salvaterra é uma cidade Do Estado do Pará. O desenvolvimento dela Dá pra se admirar. Hoje é conhecida Como a Princesa muito legal.

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SABORES MARAJOARAS

Preciso de sua atenção, Com toda realeza. Vamos considerar O que é bom e beleza. Vamos ouvir algo A respeito da natureza.

Vamos olhar para as campinas, As lindas paisagens que têm, Aonde pastam os pássaros E os animais também. Estas e outras coisas Lindas que a natureza tem.

Olhando para as alturas Contemplamos o céu azul. O grande número de estrelas Brilhando com seu fulgor. São estas e outras obras Feitas pelo criador.

Vamos falar sobre os rios E o oceano também. Meditemos no poder E na força que as águas têm. Quero mencionar o vento No movimento que faz. Não se sabe de onde vem Nem para onde vai.

Olhemos para o sol. Fiquemos a contemplar O percurso do dia-a-dia Iluminando em todo lugar. Trazendo o bem para os homens E para os animais. Vamos contemplar a lua Quando vem a clarear, Com o seu brilho tão lindo Que dá pra gente meditar. É uma coisa tão linda A noite de luar.

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Vamos falar sobre as caças Que têm um sabor muito bom. A paca e o tatu, A cutia e o camaleão, O macaco e a guariba, O jabuti e a capivara. Estou dizendo isto Porque sou marajoara.

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JOVENS DA 3ª IDADE Vamos mais uma vez Demonstrar nossa ansiedade. Isso pode descobrir A nossa capacidade. Vamos fazer movimento Com as pessoas da 3ª idade. Queremos fazer parte Desta realidade. Vamos avançar juntos, Aproveitar a oportunidade. Para sim manifestar A ação da maturidade. Com as asas da esperança A gente pode voar. Com ajuda e coragem Podemos caminhar. Não desista da jornada Pra conseguir chegar lá. É uma oportunidade, Vamos avançar. Essa é a nossa jornada, Vamos sim caminhar. Vamos fazer movimento Aqui em nosso lugar. Vamos todos mostrar O valor que cada um tem. Vamos participar Dos movimentos que vêm. Esse é o meu incentivo Eu sou idoso também.

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ODE AO PARÁ O Pará é muito grande. Nele tem muitas cidades. Tem produtos importantes De diversas qualidades. Tem quem cria e tem quem plante. Tem também o pescador. Tem o pequeno, tem o médio E tem o grande produtor. Muito campo e muitas matas Que existem no Pará. Muito campo e muito gado Para a gente desfrutar. Se você ainda não conhece Dê uma voltinha por lá. Veja que coisa bonita Tem o Estado do Pará. Tem campinas muito lindas Que dá pra se admirar. Tem o búfalo e o cavalo Que dá pra gente montar. Tem o peixe e tem a caça Pra gente se alimentar. São estas e outras coisas Que tem no nosso Pará. O que estou lhe falando São novidades reais. Quem ver vai ficar gostando E vai querer conhecer mais Das belezas do Pará. O Marajó é um dos tais. Gosto muito do Marajó. Foi onde eu nasci. Tudo que eu sou Foi lá que aprendi. Sou poeta, sou músico E tenho satisfação por mim.

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ABACAXI I Vamos entrar num assunto Que nos chama atenção. É um assunto importante Que nos traz satisfação. É o futuro do abacaxi Chegando as nossas mãos. II Esta é a novidade Nos chamando atenção, Que o futuro do abacaxi Está chegando em nossas mãos. O abacaxi tem no Pará E em outras regiões. III O abacaxi é um produto Que tem suas qualidades. Isto é coisa boa E uma realidade. Produzido no interior E consumido nas cidades. IV O futuro do abacaxi Chegando às nossas mãos. Vamos todos pra frente, Vamos entrar em ação, Fazendo todo esforço Pra melhorar a produção. V É hora de avançar E também prosseguir. Vamos fazer parceria Com o movimento aqui. Povo paraense, Vamos plantar abacaxi.

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SINDICATO RURAL I Preciso de sua atenção Neste momento exato, Pra conhecermos mais perto Aquilo que é um fato. Vamos ouvir um pouco A respeito do sindicato. II O sindicato é um órgão Que antes não existia. Ele tem uma força Que todo o sócio confia. É nele que a gente encontra O direito de cidadania. III Seja um sócio do sindicato Pra poder se prevenir. Aquilo que você não consegue Com ele pode conseguir. Ele é o seu amigo Em Cachoeira do Arari. IV O sindicato é um órgão Que cada dia avança. Os tempos estão passando Aumentando a confiança. Com ele a luta é certa Porque pesa na balança. V Quero parar por aqui Sem receio e remorsos. Vamos sentir o perfume Das mais lindas flores. Vamos parabenizar O Sindicato Rural dos Trabalhadores. www.cpoema.org

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O BEZERRO DE DUAS CABEÇAS

I Vou pedir sua atenção E também advertir, Se ainda não conhece Dê uma voltinha aqui. Venha ver novidade Em Cachoeira do Arari.

V Este bezerro nasceu. Esses dados consegui. Esta grande novidade É que eu posso transmitir. No ano de 1947 Em Santa Cruz do Arari.

II Cachoeira do Arari Tem novidade pra nós. São coisas na realidade Que existem ao nosso redor. O que nos chama atenção É o Museu do Marajó.

VI Este é um fato importante Que está ao nosso redor. Venha dar uma examinada Pra capacitar melhor. Foi doado pelo proprietário Para o Museu do Marajó.

III É um Museu muito bonito. Eu afirmo, com certeza. Tanta cultura que tem Que forma uma riqueza. O que me chama atenção É um bezerro de duas cabeças.

VII Esta é a realidade Que eu pude transmitir. O Marajó tem tanta beleza Que faz a gente sorrir. Este museu tem grande cultura Em Cachoeira do Arari

IV Este bezerro está lá. É uma coisa espantosa. O que nos chama atenção É uma ação valorosa. Este fato aconteceu Na Fazenda Santa Rosa.

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CONHEÇA O MARAJÓ I

I Quero dar umas boas novas E no mesmo lhe informar. Se alguém ainda não conhece Mas com certeza já ouviu falar, É sobre o Marajó, Pois eu sou filho de lá.

V Muitas gentes que visitam Em busca de um lazer melhor. Pra quem gosta De tomar banho de sol São essas e outras belezas Que tem o meu Marajó.

II É um lugar bonito e bom Com muitas paisagens ao redor. Dê uma volta por lá, Para conhecer melhor. Este lugar que eu me refiro É o famoso Marajó.

VI Vou falar nas ribeirinhas Que estão ao nosso redor: O açaí e o camarão Com um sabor melhor. Não há coisa mais saudável Do que viver no Marajó.

III Lugar igual a este Não conheço outro melhor. Existe tanta cultura Tudo ao nosso redor. Este lugar de tanta beleza É o nosso Marajó.

VII Quero parar por aqui Apresentando sempre o melhor. Sou marajoara Com isso não tem xodó. Por isso que eu apresento As belezas do Marajó.

IV São grandes as áreas do campo Que o Marajó tem. Nessas áreas tem beleza E muita fartura também. Em toda parte tem transporte Pra ir e voltar de Belém. www.cpoema.org

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CONHEÇA O MARAJÓ II Companheiro cidadão Alguém já lhe convidou? Venha dar uma voltinha, Conhecer o interior. Dar um passeio a cavalo No meio da vaquejada, Comer carne de sol E tomar uma coalhada. Lá tem fruta gostosinha Que é produto natural. O açaí e a abacaba, Cupuaçu e o piquiá, E também o tucumã Que dá um suco de se admirar. Pondo ele pra ferver Dá a gostosa canhapira.

Pra onde você quiser ir O transporte dá na cara. Tem cavalo, tem bicicleta, Tem o ônibus e pau-de-arara. Eu lhe falo com certeza Porque sou marajoara. Eu estou lhe convidando Pra você vir passear. Lá tem coisa muito boa. Você vendo, vai gostar. Se eu disser, você duvida. Mas olhando é melhor. É por isso que eu convido: Venha ver o Marajó.

Existe outra coisa tão boa, Não tem negro que rejeite: A carne de sol assada, Comida com o pirão de leite. Tem o frito, a lingüiça. São alimentos que têm lá. O espinhaço do boi bem Molhe faz até a gente suar.

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Búfalo do Marajó Poema vice-campeão no concurso de poesias em Cachoeira do Arari, Setembro/2006, no Festival de Carne Bufalina e Derivados.

Vamos ouvir novidade Que está chegando pra nós, De tudo que está surgindo Vamos escolher o melhor. Quero falar a respeito Do búfalo do Marajó.

O búfalo é um animal Que grande produção dá. Coloca numa balança, Veja como ele vai pesar. Olhando esta vantagem O marajoara se interessa pra criar.

O búfalo é um animal De grande utilidade É produzido no interior E abastece a cidade. Isto não é uma estória, Mas sim a realidade.

O búfalo é valente Que não conheço igual. Seja rio ou barranco Ele querendo vai lá. É bom pra puxar carroça E bom pra gente montar.

O búfalo tem vantagem Em tudo que vejo. Tanto seja no tamanho Como também no peso. Tanto a carne como o leite Do qual se fabrica o queijo.

A carne dele é gostosa Que não existe melhor. É muito sadia Que não tem colesterol. Por isso, recebe título De riqueza do Marajó.

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli

O mais velho dos quatro filhos de Manoel Pedro Monteiro Vitelli e Maria Lúcia Maués Vitelli é caboclo marajoara nascido no Município de Soure em 16/03/1974, consorte de Maria Estrela Dalva, pai de Gábrio Luigi e Mallena Thais. É Pedagogo formado pela UFPA, radialista da sol FM, funcionário público e poeta. Colaborou na criação do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA), do qual foi presidente por dois mandatos consecutivos. Têm alguns trabalhos premiados, dentre os quais: 1° Lugar com o poema Soure por um fio de poesia, que escreveu com Dalva Lima para o Concurso em homenagem aos 148 anos do Município de Soure, fev/2007; 1° Lugar com a letra de Melodias do Mar, musicado e interpretado por Paulo Cassiano e Gilmara, no IV Festsol, Festival Sol da Música Marajoara, set/2006. Márcio Vitelli cultiva o gosto pelo desenho e pela pesquisa. Hoje têm no prelo as obras: Ilha do Marajó e Outros Poemas de Virgílio Vitelli, Latino Poeta e Lendas e Visagens de Soure.

A Jesus Cristo, caminho, verdade e vida. Às minhas famílias Maués e Vitelli. A Dalva Lima, estrela do amor que ilumina meus dias. Às nossas maiores obras: Gábrio Luigi e Mallena Thais. Aos sócios do CPOEMA, por sonharem comigo este sonho fatível. E a todos os amigos, incentivadores, leitores e críticos.


Dilomeno Márcio Maués Vitelli

MONA LISA

Só aceitamos a prisão do corpo porque com os olhos podemos abraçar as belezas do mundo.

Leonardo Da Vinci

Universo erguido à parte Pinceladas de requinte Idéia visível é arte Obra do mestre Da Vinci Genialidade que evade A tela que o bardo sonda Desmedida liberdade Uni versos à Gioconda Num cromo em viva aquarela Co’a pena de Gabriel Faz declarações àquela Musa dos lábios de mel Com solar tinta amarela No papel azul do céu

ELA É A ONDA Vendo o sol Da paixão raiar No teu celeste olhar azul Senti as ondas da tua voz no ar E as ondulações do teu corpo nu Ensinarem as vagas do mar Com um vai E Vem De Norte A Sul www.cpoema.org

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VOLTA PRA MIM A Dalva Lima, luz de minha inspiração.

O que esperas? Vem agora Fonte eterna de inspiração Marajoara de toda hora Cabocla do meu coração Dia atarefado é Éden pra quem ama Afirmo confiante, excitado e sem temor. Deita, bela fera, na nossa verde cama... Selvagem Marajoara libera id e calor Noite de luar, é fetiche no pensamento. Alça vôo e pousa aqui, ombro amigo. Sinto tua presença a todo o momento... Mística Marajoara, que magias trazes contigo? Madrugada sonhando vejo um reino encantado. Nele Morpheu blasfema sua desgraça... Mas por quê? Pesadelo não o alimenta, nem sonho despertado... Entendi o infortúnio, Marajoara! És a Deusa deste ser Que amanhece com olhos cerrados de saudade Reflexos d’alma contidos pelo sofrer Abri-los! Só diante dos teus... felicidade Musa Marajoara quero ver, tocar e te ter; Retorna, Deusa Cabocla, à fértil mãe Ilha. Volta, Musa Selvagem, pra cama de capim... Vem, Feiticeira da agradável armadilha... Cinco numa só, Marajoara: teu segredo revelado, enfim! Tua luz ilumina a minh’alma, Estrela d’Alva Cheirosa Marajoara dos campos de jasmim Ah! Como és bela e tua pele tão macia e alva, Enfeitiçado vim a compor: “Volta pra mim”.

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli

BÁLSAMO DERRAMADO A Manoel Pedro, meu pai Com amor, respeito e eterna gratidão

Manifestação de teu venturoso afeto, as carícias são o bálsamo derramado num coração ferido que chora inquieto, orando a Deus que sempre estejas do meu lado e que o brilho em teu olhar que me afaga e ilumina, leve paz e carinho à mais distante plaga... Para que os abatidos por alguma sina, encontrem a bendita luz que não se apaga; dádiva a cintilar, ante meu cafuné, raios fecundos de amor e lumes de alegria, obras de um santo Pai que a exemplo de José, Pelo filho adorado a luz vital daria às trevas, mas de certo que o afago da fé iria te guardar no manto de Maria.

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SOURE POR UM FIO DE POESIA Neste fio de poesia Arte que abraça o universo Desfio a Soure minha alegria Com 28 pernas de versos A novela de teu advento Trago a luz da memória Puxando neste momento O grosso novelo da História Dos Maruanazes e Mundis Ao povoado de Monte-Forte Freguesia de Menino Deus Benção de boa sorte Neste dia 20, viva a inocência Deixe Deus tocar teu coração Brinque na Praça da Independência E mergulhe com o sol no Caldeirão Pois em cada face brota o sorriso Ao Município que aniversaria – Soure é o nosso paraíso! Brada o povo em sintonia Vizinho, amigo, turista, parente Vaqueiro, artista, aluno, professor... Todos te ofertam valiosos presentes: Respeito, poesia, carinho e amor A felicidade reside na essência Tanto que em nossos parabéns Agradecemos pela tua existência E por sermos teus maiores bens

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli

TEMPO NUBLADO

Entre nuvens cinzentas E árvores de concreto e aço A cigarra de casa canta Instantes e sonhos perdidos Atraída pelo cigarro aceso vaga-lume errante Que pisca memórias Na fumaça do esquecimento E me quebra as vidraças da alma Estilhaçocular é navalha Que abre na face do tempo Anos-luz de janela E cristaliza minha visão Na 1ª Torre de Comando da Capital Que controla o tráfico aéreo E o vôo cego da

pequenaeronav

e

No Monte De mata Que mata A ave perdida Caixa-preta encontrada A sete palmos de luto E sob forte chuva de lágrimas Que não cai do céu nublado Mas das vítimas deste inferno de tempo

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SEXTA-FEIRA SANTA Aprendi com o filho de Drummond Que poesia É a descoberta Das coisas que eu nunca vi E com o meu De 5 anos O melhor exemplo: Vi pelos seus olhos Sua mãe iluminar O céu da boca da noite Enquanto a minha orelha Brincava com as palavras: ― Estrela cadente Devolve o meu dente. Estrela da gente Cadê o meu pente? Do firmamento O seu sorriso Encheu de luz A nossa páscoa

PALAVRA É CRUELDADE Há muito que a procuro Na escuridão da ignorância E no espinheiro insano Da angústia Lá Ela me corta a carne E a minha frente Inerte O papel se delicia Com o sangue que brota das chagas Abertas Pela palavra

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli

O DIA A DIA DA POESIA Hoje descobri que tudo Está para a poesia Como a lua pra noite E o sol pro dia Poesia é livre-arbítrio Na escola, na rua, na livraria... É livro na fogueira do olhar Com ela me livro de cada fria! Poesia na deprê É a melhor terapia Dela se alimenta E nos enche de alegria Poesia é viagem fantástica É singrar na capitania Mares surreais Norteado pela fantasia Poesia é arte-manha Ficção, lida, mania... É cultura universal É ânimo que nos recria Poesia é sem vergonha Quebra pau com a orgia Pula a cerca da moral Une credo, ciência, magia... Poesia é da família Como avó, mãe e tia É nossa parente de sangue Na veia corre a poesia Quer ser correspondido? Proseie com a poesia No verso branco do papel Na rima da caligrafia www.cpoema.org

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MELODIAS DO MAR Incorporada ao espumoso peito da praia, aonde as ordeiras ondas vêm sonhar, a marajoara balança a beira da saia, no ritmo das melodias do mar. Vaga cantiga que engoma e agasalha, A anágua’lagada da bela morena. Rastro na areia, brisa na palha, Dança o coqueiro a balada serena. Gigante praiano que se inclina galante, vendo a cabocla reger o coral. A garça anuncia nova vazante. Maré se despede do manguezal. O sol sonolento dorme na duna. D’água me vem o “tibum” do açaí. Quanta harmonia tem Caju-Úna! Onde as aves gorjeiam para dormir. Mas quem pode ser a marajoara que se branqueia deitada na areia? O coração rebate: É a Iara, Tanto que seu canto é de sereia Dentro das sombras do caminho a lua cheia derrama o dia. A praiana transborda de carinho, E me atrai com sua sonífera melodia. Afagando a terra ela me sonda Mas foge ao tentar lhe abordar. Corre, nada, desfaz-se em onda. A musa dorme no leito do mar A vaga na areia leva seu nome. Seu ronco-canção a onda me traz. A triste voz voraz me consome. Desfaleço distante dos braços da paz

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Dilomeno Márcio Maués Vitelli

A PASSOS ATRÁS Na floresta fechada Do meu interior O ar da inspiração É vento que me calça No pé do ouvido Do alto Me vejo foice Língua afiada Cortando fundo O feroz capim teimoso Arame farpado de valores Que arranha a palavra Presa na minha garganta Silêncio escrito nas folhas verdes Que eu distraído Deixei cair das plantas dos pés Quando corri no encalço Da única folha em branco Que Zéfiro soprou Para longe de mim Agora folha cheia Desta seca Lembrança

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Jorge Domingues Lopes

Nasceu em Belém do Pará. É casado e pai de três filhos. Formou-se em Letras, com habilitações em Português e Francês, e é Mestre em Teoria Literária pela Universidade Federal do Pará e Université des Antilles et de la Guyane. Iniciou o magistério atuando em escolas públicas de Ensino Fundamental e Médio da Rede Estadual de Ensino (SEDUC). Foi professor dos Cursos de Letras da Graduação e da Pós-Graduação na Faculdade Integrada Brasil Amazônia (FIBRA). Atualmente, é professor de Francês e Literatura no Campus Universitário de Soure da UFPA, onde exerceu o cargo de Coordenador do Curso de Letras, coordenou um projeto de pesquisa na área do ensino da literatura e coordena um novo projeto de extensão voltado para produção de textos e inclusão digital para estudantes do município de Soure. Membro da Associação dos Professores de Francês do Pará, onde exerce a função de 1.o Secretário, e membro do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara, ganhou o Concurso de Redação em Língua Francesa da Aliança Francesa de Belém, em 2003, e do V Concurso de Poesia “Maria de Nazaré M. Barbosa”, promovido pelo CPOEMA em 2006. Os que madrugam no ler, convém madrugarem também no pensar. Vulgar é o ler, raro o refletir.

Rui Barbosa (“Oração aos moços”, 1921)

Dedico estes textos à minha esposa e aos meus filhos. Aos meus pais e irmãos. E aos amigos Manoel Ricardo, Paulo Maués e Clodoaldo Oliveira.


Jorge Domingues Lopes

A ÚLTIMA PALAVRA Somos feitos da matéria dos sonhos.

William Shakespeare (“A tempestade”, 1611)

Nasceste num dia de poesia e chuva depois de um sonho de solidão. Nasceste de um impulso que vem como o sono do caminhante que, cansado da estafante e poeirenta jornada, foge do tempo e se entrega ao esquecimento. Inspiração e dor te precederam. Quando te escrevi pela primeira vez, não consegui te amar. Tua imperfeição, nascida de minhas mãos trêmulas, foi riscada ao meio pelo fio da espada. Angustiado, sentiate palpitar em meu peito. Insistente futuro que quer escrever o presente, palavra que, ainda em estado de caos, busca a existência tênue, eterna, sobre o espaço antártico do papel, sobre as linhas azuis do Equador. Antes, porém, já existias silenciosamente em cada olhar: palavra-ideia cujo destino é sempre incerto, carregas em ti o mistério do símbolo no movimento incessante que provocas nos lábios imprecisos que te seguem e crias a ilusão sonora de um adeus, alquimia sublime de um verso. Enfim, nasceste. Tu, que dialogas com o sonho, brincaste livre na floresta dos eucaliptos, linearmente, originalmente. Ainda lembro. Vi teus primeiros passos, largos, imprecisos, sobre desertos e campos, sobre rios e cordilheiras. E mesmo quando chegaste à beira da insondável materialidade das metrópolis pré-moldadas, continuei ao teu lado. Juntos, colhemos a música suave dos sorrisos apaixonados esquecidos pelos bancos das praças e desenhamos a tênue luz do luar no céu estrelado de poemas. Amava as tuas cores, seguia a tua voz e pouco a pouco te via crescer. O tempo fez o seu papel. Então, de sonho em sonho em uma noite de verão, decidiste partir. Ir por caminhos tortuosos em busca de tuas quimeras quixotescas, à procura do impossível mistério da vida sob a metáfora da tua vontade, escrita e luz do teu corpo. Logo descobriste o segredo da onipresença.

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Caminhando por entre espelhos de amor e separação, conheceste o ego dos romances. Dos grifos, ouviste antigos contos de virtudes e traições; e, sob o eterno drama, viste o teatro da efemeridade humana. Sonhaste cada parábola contada nos campos e, sob a ventania de uma tarde de abril, voaste flor semente para além das margens do Norte, sustentada pela magia das asas de uma borboleta serena que coloria o poema do velho poeta da praia. Ainda eras jovem quando aprendeste o nome das coisas sagradas e profanas, quando a ti confiaram a lembrança de ritos secretos e histórias do não-tempo daquilo que curiosamente chamamos de fé. Aprendiz e mensageira foste. Sorrias ao ver o mundo se desvelar em ti. Sorrias ao ser o vidro e pedra, silêncio que ecoa no querer-ser de cada alteridade ausente. Entretanto, Cronos insistia em te conduzir ao dia em que conhecerias os infindáveis lapsos da nossa existência. Acusada de subverter a ordem-do-que-deveria-ser-eterno ao construir asas com inquietantes ideias de poesia e cera, foste sentenciada injustamente. Uma parte de mim morreria naquela noite ao saber que o homem de gestos bruscos ordenara que te queimassem em praça pública ao lado de tantas outras. E, sob a metáfora da noite, entraste em um novo labirinto de sombras, enquanto sandeus de todo o reino, em gesto sincronizado, apagavam todas as linhas que marcavam o teu caminho. De ti muitos homens têm medo, por isso, arrancam-te dos pensamentos e te fecham em torres de marfim. Mas resistes. Resistes mesmo esquecida nas páginas de um velho livro, onde, condenada a anos de solidão, te convertes em mitopalavra. Tu, que voaste pelos campos elíseos de cada querer, por mármores de sabedoria e inspiração, alcanças um sopro de eternidade. Fortalecida, de ti nasceram antigas cidades, novas ideias e raros sentimentos. Por ti, o dragão e o basilisco transpuseram a gênese dos rios do esquecimento para encontrar a manhã clara de uma leitura, porque és o toque de dois universos que partilham, no caos, um instante de arte. Às vezes, basta uma única palavra para provocar o amor ou a revolução. E tu, a quem amei loucamente sob a tempestade, morreste. Extinguiu-se o sangue do magro instrumento que te alimentava e, assim, perdeste o rumo da linha imaginária. Morreste, minha Fênix.

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AS ÁGUAS O encontro de duas expansões (...) pode determinar a supressão de uma delas; mas, rigorosamente, não há morte, há vida, porque a supressão de uma é a condição da sobrevivência da outra. Machado de Assis (“Quincas Borba”, 1891)

Todas as manhãs aquela mulher deixava as escuras águas e subia com muita dificuldade as paredes sujas do velho poço; apoiava-se nas pedras da beira e, como se estivesse em uma janela, preparava-se para ver aquele magro menino, desses de baladeira e igarapé. Foi por acaso que ela o descobriu, justamente quando, chamada pelo Sol, cumpria o seu destino de guardar as águas dos rios, lagos e poços. E, sem saber o porquê, a bela mulher ficou encantada por ele, a quem passou a visitar todos os dias, sempre invisível aos olhos humanos. Certo dia outonal, havia acabado de chegar à boca do poço, quando avistou, na direção da amarelada casa de sapê, o menino moreno junto com outras crianças debulhando açaí. Já tinham conseguido encher dois paneiros, logo passados para a velha que iria preparar o gostoso vinho. Pacientemente ela colocou o fruto no alguidar e mandou um dos meninos buscar água no pote. Apressado pra tomar do vinho, o garoto correu até a cozinha e pegou a primeira garrafa de água que encontrou. O açaí ficou pronto e cada um bebia, em suas próprias cuias, aquela deliciosa bebida feita à mão. Do poço, a bela mulher observava tudo e sorriu com ternura ao ver o menininho com o rosto todo enfiado na cuia preta. Mas, de repente, ficou séria ao perceber que o garoto, com o rosto quase todo coberto de açaí, também a olhava fixamente. Sem saber o que fazer, a mulher, coberta apenas por seus longos cabelos dourados, lançou-se assustada ao poço e desapareceu no espelho das águas. Daquele momento em diante, a criança adoeceu. Durante vários dias, ficou sem dormir e sem comer, apenas bebendo água, muita água. Tinha febre forte e, em seus delírios, falava de lugares estranhos que ninguém conhecia; também fazia gestos em que tentava a toda hora pegar os peixes que, segundo ele, nadavam ao seu redor. O médico foi chamado, mas não descobriu a causa da estranha doença. Aconselhou interná-lo no hospital na cidade, mas, a avó do menino não aceitou. www.cpoema.org

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Desconfiando daquela moléstia, mandou então chamar um velho curandeiro que morava na entrada do paraná Tuíra. Naquele mesmo dia, o velho homem chegou com a preamar. Ao ver a criança, disse umas rezas incompreensíveis e concluiu com voz grave: — É feitiço forte de mãe-d’água! E ela quer levar esse menino pro fundo do rio, quer encantar, pra ele ficar filho dela. Não deixe ele fazer isso. Na sexta-feira seguinte, antes do meio-dia, seguindo as orientações do pajé, a velha levou sozinha o garoto para junto do poço, deitou-o em uma esteira de palha e, segurando um terço, começou a desfiar o rosário. Entretanto, ao meio-dia, o tempo escureceu. Uma névoa envolveu a senhora que foi ficando sonolenta e, sem resistir, caiu em profundo sono. Nesse momento, sob o zênite solar, a mulher das águas apareceu no poço. Ao descobrir o corpo quase sem vida do menino que tanto queria bem, pegou-o cuidadosamente em seus braços e decidiu levá-lo, mesmo contrariando a natureza dos seres, para o único lugar onde poderia tentar curá-lo. Assim, sob as águas barrentas do rio, a mulher tentou livrá-lo daquele estado que o consumia rapidamente. Nada funcionou. Então, ao perceber o fim iminente daquela pequena criatura, resignou-se a invocar a mais antiga força guardada sob o Sol, a do Gênese. Silêncio e luz para transformar a vida. No sexto dia, ouviu-se na brisa da madrugada um canto melodioso que invadiu todo o vilarejo. Pessoas, plantas e animais acordaram. Todos seguiram aquela música suave que os conduziu à beira do rio, onde encontraram o menino em pé, nu e completamente curado. Perguntaramlhe o que havia acontecido, onde e com quem estivera todo aquele tempo, mas ele nada respondeu, apenas sorriu um terno e misterioso sorriso de mar.

A FERIDA1 Que abismo que há entre o espírito e o coração. Machado de Assis (“Quincas Borba”, 1891)

Só, Carlos Avaro esperava a morte. 1

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Este conto, escrito originalmente em francês e sofreu alterações para esta publicação. Biblioteca Virtual do CPOEMA


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Seu coração, o médico lhe avisara, estava cansado e um novo infarto do miocárdio seria inevitável e fatal. Impassivelmente o velho moribundo olhava o nada da janela aberta enquanto mil pensamentos o absolviam de um passado inglorioso. Necessário era exercitar sua memória para não perder a consciência. Ele não sabia o que fazer: chorar, gritar, rezar, por quê? para quem? Órfão, conheceu desde o seu nascimento a fome, a fadiga e o frio. Nada de família. Nada de amigos. Nada de amores. Para ele a alegria nunca existiu e a morte não seria mais do que uma maneira de apagar uma vida entediosa. É por isso que decidira viver num sítio, longe das pessoas da cidade, longe dos sentimentos inúteis. Às seis horas da manhã, ele escutou longe o soar dos sinos da igreja. “É domingo”, ele pensou, “eu vou morrer num domingo, é um bom dia”. Subitamente um vento frio soprou dentro do quarto e ele viu um pequeno pássaro preto e amarelo atravessar a janela, fazer um vôo rápido sobre ele e, em seguida, pousar na mesinha de mogno ao lado de sua cama. Maquinalmente, com seu instinto rude, ele expulsou o pássaro, que saiu do quarto pela porta entreaberta. Entretanto, lá fora, um gato cinzento o espreitava com paciência. Ao percebê-lo, a pequena ave tentou ainda fugir, mas o felino, com um salto preciso, a alcançou e machucou a asa esquerda de sua presa, que caiu imediatamente por terra. Diante daquele quadro trágico e natural, para o pássaro, o velho Avaro, inexplicavelmente tocado por um estranho sentimento, levantouse da cama e, fazendo um grande esforço, foi em direção ao almoço do gato. Por um instante, esquecido de suas fronteiras, só pensou na ferida do pequeno animal. Afastou o gato com o pé e, ajoelhado na grama, pegou o pássaro com cuidado. Olhou o sangue que borbotava do machucado e, angustiado face à sua incapacidade diante da morte, chorou. De súbito, começou a mover seus lábios e rezou para tentar salvar a vida daquela criatura. Suas preces não foram respondidas, e o pássaro morreu. “—Toma”, disse ao gato, “pode comê-lo!”. Aborrecido por ter participado daquela cena patética, Carlos Avaro levantou-se rapidamente, mas uma dor muito forte em seu peito o lançou de volta ao chão. Comprimindo seu coração, procurou algo ao seu redor para se apoiar. Tudo em vão. Caído, ele não via mais do que as nuvens escondendo o céu azul e, ao seu redor, a grama mal-cuidada. “Sou uma urtiga que acaba de ser arrancada”, disse sorrindo. Alguns minutos depois, morreu ao lado do gato que comia o pequeno pássaro preto e amarelo. www.cpoema.org

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ELEMENTAR I

Ares da Terra

Nasceste nas areias do tempo aprisionada no grão das horas repetindo a queda e o lamento eterno retorno por que choras Palpita em teu seio a vontade De um mundo que corre inconstante Para além de toda verdade Esquecer da noite é o bastante Porque estavas acima do bem Luz calma que respira o quando E já não esqueceste ninguém Nos versos livres do teu canto Enquanto buscavas além O teu prazer em qualquer pranto

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ELEMENTAR II

Fogo

Teus olhos de sol cativo Abrigam o horizonte dos meus desejos Como ilhas proibidas e sagradas. Tuas mãos, desenhadas pelo tempo, Guardam o segredo dos espelhos Como o abismo de um olhar. Tua boca, pequeno jardim da inocência, Floresce na primavera de um sorriso Como a orquídea, o amor e a vida. Teus seios, cálices do sonho, Delineiam as cores do amanhecer Como a natureza viva do paraíso. Tua pele, doce vinho tinto, Respira os perfumes da terra Sob a luz de um entardecer.

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ELEMENTAR III

Água

No lago dividido pelo sonho Sob as águas dos oceanos estrelados Banha teu coração de amante perdida No rio misterioso de teu corpo Sob o medo desejado do desconhecido Brincam meus dedos, meus dedos fogo A volúpia de teu adormecer Acalma a tempestade de teus lábios Que fazem reviver os rituais da lua Tu amas a doçura das areias Que vão e vêm em suaves carícias Na fatiga de uma noite de inverno Esperando a chuva do destino Esquece o tempo, esquece a maré Para sempre. Descobre teus oceanos

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Jorge Domingues Lopes

AO AMAR2

A Elizabete Raiol Lopes

Meus passos carregam naufrágios de sonhos Abandonados na praia dos teus desejos E esquecidos no horizonte do teu olhar Tornam-se escuros abrigos pelas mãos do mar Tornam-se espuma que se desfaz pelas ondas de teus cabelos Caminho abraçado ao vento que me traz o teu perfume marinho e sal Caminho sobre destroços de um frágil querer que não resistiu ao tempo e ao mar Pelas minhas mãos escorre a fina lembrança dos teus beijos Enquanto a luz de teu sorriso se perde lentamente no horizonte É tempo de baixamar 2

Com o pseudônimo Ícaro, este poema ganhou o V Concurso de Poesia do CPOEMA.

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José Antônio Monteiro Muribeca

Nasceu na cidade de Cachoeira do Arari, Marajó, no dia 24 de fevereiro de 1971. É poeta e correspondente literário do CPOEMA desde 2002 no município de Cachoeira do Arari. É autor do livro “Nossa Vida: O Sentimento”. Além de ser poeta, é árbitro de futebol e correspondente das Rádios Guarani AM, Sol FM e Clube do Pará.

Agradeço a Deus. À minha mãe que mora no céu, Dona Maria Monteiro Muribeca. Ao apoio do Prefeito Municipal de Cachoeira do Arari, Dr. Jaime Barbosa. Ao amigo Ovídio Gomes Brício Neto – Cachoeira do Arari – Pará. E ao amigo Garibaldi Nicola Parente e Família – Abaetetuba – Pará.


José Antônio Monteiro Muribeca

NO TEMPO DE JOÃO VIANNA

No tempo de João Vianna Nosso povo vivia feliz, Cachoeira tinha fama É isso que minha vó me diz. O coral de nossa igreja Era orgulho de cada mocinha; E assim a nossa cidade Um dia tornou-se Rainha. Autor de um lindo Hino Que até hoje é oficial, Às vezes eu canto sozinho Em casa ou em outro local. Compôs Batuque na Fazenda Boi Arisco e Mulata Dengosa, Ah! Saudade me entenda Em verso e também em prosa. Fundou o Internato Rural Uma relíquia para todos nós, Minha homenagem é especial Porque João Vianna foi a nossa voz.

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BRILHANTE CACHOEIRA

Cachoeira do meu encanto Rainha do Rio Arari, Por você, eu derramo pranto Expressando o meu sentir. Cachoeira do Lago Guajará Formoso e misterioso, Com estórias de arrepiar Que deixa o caboclo medroso. Cachoeira do Museu do Marajó Nosso acervo fenomenal, Certamente é o maior Tenho estilo bem regional. Cachoeira de Dalcídio Jurandir O pajé de nossas palavras, Fico eu a ler aqui As suas obras consagradas.

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José Antônio Monteiro Muribeca

LEMBRANDO DALCÍDIO

Dalcídio da sensibilidade, Dalcídio da raridade, Dalcídio da consciência, Dalcídio da inteligência. Dalcídio destaque regional, Dalcídio destaque nacional, Dalcidio passado de glória, Dalcídio da nossa história. Dalcídio da Região Norte, Dalcídio caboclo forte, Dalcídio do sofrimento, Dalcídio do sentimento. Dalcídio do lindo Marajó, Dalcídio vulto maior, O Dalcídio citado aqui É Dalcídio Jurandir.

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MARAJÓ SUPREMO

Marajó de nobreza e encanto Orgulho dos Marajoaras, Destaque no suave canto Como uma das belezas raras. Marajó de magia e pureza Portal da minha inspiração, Retocado com tanta riqueza Até mesmo em qualquer estação. Marajó de luz e cor Parceiro das lindas poesias, Paraíso do grande amor, Perfeito nos inesquecíveis dias. Marajó de mistério e formosura Imbatível e incontestável, Possuidor da forte cultura Que hoje é incomparável. Marajó de ternura e prazer Dono da ardente paixão, Fonte do meu doce viver Alicerce da minha razão.

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MEU MARAJÓ

Marajó formoso, rico, misterioso, Fonte da beleza natural, Especial, fenomenal. Marajó cenário da minha inspiração, Canção, emoção, Enraizada em meu ser. Te amo Marajó, te amo como és: Maravilhoso, majestoso, caloroso, Em cada hora que se vai me encantas. Seu clima perfeito surte efeito No coração do caboclo, homem disposto, Te mostro para o mundo Em meu sonho profundo. Em seu inverno com certeza inundo, Lembro da morena, e respiro fundo. Meu Marajó, és sim o Paraíso, Retrato, símbolo do meu viver Em cada amanhecer, em cada anoitecer.

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GE

Tens a beleza plena luzente Retratada em meu poema, O sentimento agora está em cena Nas palavras que se fazem presentes. De um presente bem atraente Você parte do meu coração... Sinceridade é a minha afirmação Entendimento só depende da gente. Reconhecer, querer, esclarecer É ofício de todo Poeta, Comunicação é a porta aberta Para quem sonha e quer reviver. Acordei na madrugada, Atravessei o amanhecer; Penso ainda em te ter Como princesa e namorada.

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José Antônio Monteiro Muribeca

QUERO

Quero estudar cor por cor Para descobrir o mistério do seu amor, Quero estudar luz por luz Para descobrir porque você me seduz. Quero estudar parte por parte Para descobrir a sua especial arte, Quero estudar dia por dia Para descobrir sua preferida poesia. Quero estudar tempo por tempo Para descobrir o seu exclusivo momento, Quero estudar canção por canção Para descobrir o seu aquecer com razão. Tudo isto farei sim Com inspiração sem ter fim, Porque estudei o romance constante Para tornar-me o seu poeta galante.

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MEU POEMA, SEU POEMA

És sim a flor bela Na estação mais singela, Fazes parte do meu coração Com carinho e gratidão. Seu brilho e esplendor São referências ao amor, No dia sempre envolvente Na noite sempre ardente. Olha-me e deseja-me, Toca-me e beija-me, Meu convite é a você Para realmente acontecer. Sou o seu poeta e apaixonado, Seu príncipe inspirado, Sou o cavalheiro galanteador, Sou o jovem, dependendo do seu amor.

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José Antônio Monteiro Muribeca

AMOR EM POEMA De oceano a oceano, De país a país, Não poderei cometer o engano De dizer que não sou feliz ... De planeta a planeta, De continente a continente, O papel e a caneta Farão eu vê-la você presente ... De estação a estação, De momento a momento, Você será a atração Lembrada por mim no tempo... De flor a flor, De cena a cena, Dedico o meu amor A você em poema...

ÉS És como a rainha das flores A musa dos grandes apaixonados, Que buscam sim os primores Nos momentos eternizados. És como o azul do céu A cor preferida dos navegantes, Amantes da lua de mel Até nas noites angustiantes. És como o rio caudaloso www.cpoema.org

Formoso no amanhecer, Cenário tão maravilhoso Que só o poeta sabe descrever. És como o poema lindo Unindo o frio e o calor, Na perfeita tarde de domingo Reservada somente ao amor.

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José Lúcio Sarmento Alves

Nasceu no município de Salvaterra, em 17 de setembro de 1966. Filho de Maria José Sarmento e de Lúcio Barbosa Alves. Formado pela UFPA, Campus de Soure, no Curso de Letras e Artes. É professor de Ensino Fundamental e Médio, nas Escolas “Prof. Gasparino” e Edda Gonçalves”. Sempre esteve voltado para as artes. Dirige há mais de 10 anos o Grupo de Teatro Marajoara – GRUTEMA. Desenha, pinta e escreve amparado por um inegável talento natural. É sócio fundador e atual presidente do CPOEMA. Possui vários contos e poemas vencedores de concursos do gênero, como: Menção Honrosa com a obra “O BOTO: Uma versão científica”, no IV Concurso de Contos da Região Norte “11 Contistas da Amazônia”, realizado pela UFPA, em 1996; poemas “Amor eterno” e “Amor que não tive” na Antologia Poética “Escritos feitos de amor”, Ed. Litteres, RJ, 2000; vencedor do Concurso para a escolha do Hino de Soure, promovido pela Prefeitura Municipal de Soure.

A Deus. À minha esposa Cláudia, aos meus filhos Lucas Gabriel e Bárbara Lima Alves e demais familiares. Ao CPOEMA, pela oportunidade apresentada. A todos os amigos.


José Lúcio Sarmento Alves

O BOTO

Uma versão científica Chegamos debaixo de um verdadeiro aguaceiro. Maio era um dos meses mais chuvosos do inverno marajoara. Distingui a escola e a capela no meio do temporal. João vinha logo atrás de mim soltando imprecações. Estávamos ensopados até os ossos. Passamos pela escola e demos de frente para a casa grande. Tia Ana nos viu surgir no canto da escola e sorriu. Assim que pisamos no pátio, ela estava abrindo a porta e recebeu-nos de braços abertos: — Antônio! João! Que surpresa! Vamos entrando! Olha só como estão molhados. Nesse instante, os que estavam na cozinha também vieram ao nosso encontro, com os abraços calorosos. João depositou nossas sacolas em cima de um velho baú, que ficava no canto de um dos quartos. Airton me abraçou feliz da vida: — Até que enfim vocês chegaram pra animar isso aqui! — É, estava louco pra vir logo, mas aconteceram uns imprevistos. Espichei a cabeça pela janela e reparei que, do outro lado do jardim, pros lados da casa-do-forno, havia um grande movimento. — Estão na farinhada? — É, estamos terminando a nossa, e já vamos começar a do tio Sabá. Vamos até lá? — Espere só até eu trocar de roupa! — Como é? Já reparou na maré? Mais logo vamos cair n’água. Aproveite a bermuda molhada como está. — Tem razão. Eu espero vocês. Só então reparei no igarapé. Estava cheio. As longas raízes dos mangueiros descreviam uma longa curva no ar e se prendiam no fundo do leito lodoso do igarapé, formando um cenário lúgubre, dantesco. Como se enormes aranhas caminhassem sobre as águas cor de chumbo. Parecia mais terrível com aquela chuva torrencial, que apressava a chegada da noite, tornando as cinco horas da tarde escura e triste. Naquele momento, João, a quem chamávamos Juca, entrou no quarto acompanhado do primo Tonico, o qual me saudou: — Oi, primo! — Oi, Tonico! Estávamos indo visitar a casa-do-forno. Vocês vêm com a gente? www.cpoema.org

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— Vamos, sim. Mas, antes, a tia está chamando pro café. Dirigimo-nos para a cozinha. Nem bem estávamos sentando, quando o resto da primarada irrompeu no recinto como um bando de araras. Estavam quase todos: Zazá, Rosa, Cacá, Dilermando (Dila), Cláudio, Mauro, Anita... Todos riam e falavam ao mesmo tempo, como numa Torre de Babel. No entanto, fora como se eu tivesse jogado um jato de água na fervura, quando indaguei: — Cadê a Mariazinha? Houve um silêncio de morte. Perscrutei os rostos de um por um e percebi que algo estava errado. — Então? Ninguém me responde? Onde está Mariazinha? Todos sabiam dos meus sentimentos pela prima. Por isso relutavam em me dizer. Zazá foi quem respondeu: — Ela tá muito doente, Tuca. Tuca era como me chamavam. Eu era um dos cinco primos mais velhos. Os outros me tinham um certo respeito. Era muito bom o namoro entre nós, durante as férias escolares. Eu namorava a Mariazinha há um ano, já. — O que ela tem? Perguntei. — Não sabemos. O tio Pedro acha que é caso de levar pra Belém. Disse a Zazá. — Já até trouxeram o pajé pra ver Mariazinha. Quem falou foi Rosa. — Pajé? Pra quê? Perguntei. — Pra nada! Desta vez quem interrompeu foi tia Ana. – Não ligue pra esses moleques, Tuca. A Maria está só um pouco adoentada. Talvez seja só uma gripe. Agora voltem pro trabalho, que a farinha tem que ficar pronta ainda hoje. Eles se despediram e ficamos sós. — Parece que tu tá com azar, hein, mano? — É, Juca. Preciso fazer uma visita para a prima. E terminamos nosso café. Chegamos à casa-do-forno no momento em que a última cuia de farinha estava sendo despejada na saca. O pessoal ajeitava-se pelos assentos para descansar e prosear. Fomos recebidos calorosamente, e respondemos às perguntas costumeiras. Então, principiou-se a conversa propriamente dita. O Juca pediu licença e foi procurar companhias da sua idade. Eu, pelo contrário, adorava estar no meio daquela gente alegre, espontânea e simples. Adorava sobretudo ouvir suas narrativas.

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Gente crédula, supersticiosa. Eles sabiam que eu não acreditava muito naquelas estórias e, por isso, me tratavam com certa reserva. Para mim o melhor contador de estórias era o meu avô. Embora ali estivessem bons narradores, como tio Manduca, Zé Jibóia, tia Herundina, tia Cota, seu Rogério e tio Sabá. Para mim, vô Miguel era o melhor de todos, o maioral. Homem simples, voz grave, pausada, utilizava recursos próprios para despertar a curiosidade, como enrolar um cigarro no meio de uma narrativa, enquanto aumentava a expectativa da platéia. Uma das lendas mais interessantes que vô Miguel costumava narrar era a do boto. — O boto – dizia ele – é o mais feiticeiro dos peixes. E assim iniciava a estória. Esta lenda surgiu da crença de que o boto é um ente encantado que, nas noites de lua cheia, sai das profundezas dos rios, se transforma num belo homem e encanta as jovens caboclas ainda virgens. Seduzindoas, o boto-homem as conduz para o fundo do rio, ou engravida-as. O filho que nascer dessa relação, por sua vez, quando adulto, atira-se no mar e transforma-se em boto. De nada valeu dizer ao meu avô que o boto não passava de um mamífero, um cetáceo como a baleia e o golfinho, e que, por causa dessas crendices, estava com a vida ameaçada. O boto ainda era, para aquela gente, um mistério. À noite, reuni-me com os outros primos e convidei: — Vamos até a casa da tia Rosa fazer uma visita para Mariazinha. Ninguém se manifestou favorável. — Afinal, o que está acontecendo? Toda vez que falo na Mariazinha vocês se espantam. A doença dela é tão grave assim? — Sabe o que é, Tuca, a tia Rosa não quer que ninguém fale com ela – falou a Zazá. — Mas por quê? — Isso não sabemos. Vamos meninas! E elas se retiraram. Olhei para os rapazes. Todos me olhavam de uma maneira estranha. Foi Dila quem falou: — Ah! Não esquenta, primo! Isso é coisa de mulher. A velharada tá estranha. Ninguém fala nada. Ficam cochichando pelos cantos e nos proíbem de visitar a Maria. — Só que eu não sou vocês. Venha, Juca. Vamos até a casa da titia. www.cpoema.org

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— Vamos, mano. Também não gosto desse mistério. Chegamos pelos fundos da cozinha. A casa era grande, de madeira. Entramos de como de costume: gritando sem cerimônias. — Ei, de casa! Cadê o pessoal dessa casa? Titia surgiu na varanda, com uma estranha expressão no rosto. — Oi, rapazes! Soube que já estão de férias. — Oi, titia. Soubemos que a Maria está de cama. O que ela tem? — Não é nada sério. É só uma dor de cabeça. — Podemos ver ela? – Perguntou o Juca. — Sinto muito, Juca, mas ela está dormindo. Amanhã, quem sabe... Neste instante, um homem de negro, de barba e cabelos grisalhos, surgiu atrás de titia. Vinha da direção do quarto de Maria, como pudemos observar. — Vamo, Dona Rosa. O trabalho vai começá. Disse o velho. — Certo, seu Rouxinol. Boa noite, garotos! Saímos da casa bastante aturdidos. Na hora do jantar na casa do vovô perguntei: — Quem é aquele homem, na casa da tia Rosa? Fiquei observando o semblante de cada uma daquelas pessoas. Foi vovô quem respondeu: — Pai Rouxinol está cuidando de Mariazinha. — Por quê? Não é melhor chamar um médico? Ninguém respondeu. Resolvi não insistir. Pela manhã, enquanto todos saiam pra a roça, enveredei pelo caminho da mata, que dava certo na casa de Maria. Saltei a janela, como de costume, e dirigi-me ao quarto da prima. Abri a porta e deparei com uma cena deprimente. Maria estava sentada na beira da cama, pálida, magra, triste. Tentou sorrir quando me viu, mas apenas sussurrou: — Tuca! Aproximei-me e segurei sua mão. Ela estava linda, frágil como uma rosa. Perguntei: — O que está acontecendo, meu amor? Você está bem? — Estou cansada...! Ela deitou e imediatamente adormeceu. Senti, no ar, forte cheiro de incenso. Levei um grande susto quando me deparei com aquele homem. O tal Rouxinol. — O que faz aqui dentro? Perguntou mal-humorado. — Quero saber o que está fazendo com ela?

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polícia!

— Não é de sua conta! — É da minha conta, sim! E, se não me disser, vou chamar a

Ele acreditou. Respirou fundo e disse: — Tô tentando livrar ela do mardito. — Do que está falando? — Dele! Do mardito peixe! Quer levar a criança, sabe? Tá mundiando a menina! — Quer falar mais claro! Não estou entendo nada! — Na próxima lua cheia ele vem, e vai arrastar Maria pro fundo do rio. — Mas, ele quem? — O boto. Agora, sai daqui! Saí sem dizer uma palavra. E sem acreditar no que havia escutado. Como poderia ser ele? A lenda. O boto. Agora eu compreendia porque os velhos faziam tanto segredo. Não dormi direito durante dois dias. Estava sempre olhando pro rio e lembrando o que o pajé havia dito. A lua cheia se aproximava. Os rapazes estranhavam minha ausência nas brincadeiras. Os velhos, o meu silêncio. Aquilo não poderia ser possível. Não poderia ser verdade. Finalmente era lua cheia. Como se obedecessem a um sinal previamente estabelecido, todos silenciaram. As meninas não se aproximavam do igarapé. Os velhos encerram a farinhada. Como se adivinhasse o que eles estavam pensando, resolvi que deveria fazer alguma coisa. Se aquele monstro existisse de verdade, eu não deixaria que levasse Mariazinha. Era já de madrugada quando deslizei sorrateiramente da rede. Apanhei a mochila que havia deixado na noite anterior com o material que poderia precisar. Tendo a lua como testemunha rumei para o porto de baixo, que ficava de frente para a casa de tia Rosa. Se aquele tal boto resolvesse aparecer naquela noite era da água que ele sairia. Encostei-me num velho bacurizeiro e me pus vigilante. Dali, dava para vigiar o porto e a casa da titia. Empunhei a espingarda de caça do meu avô, deixei o facão ao alcance da mão e esperei. A poronga se fez desnecessária, pois a lua iluminava toda a paisagem. Seus raios arrancavam reflexos dourados, e sua claridade produzia arabescos das sombras dos mangueiros. Só ouvia a cantilena noturna. Meus nervos estavam à flor da pele. O vôo de uma coruja assustou-me. Várias horas se passaram e o sono chegou. www.cpoema.org

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Eram quase cinco horas da manhã. A lua havia se retirado, e eu resolvi me retirar também. Pela manhã ninguém pareceu ter notado a minha ausência. O resto do dia transcorreu sem incidentes. Passei o dia inteiro observando a casa de Maria. Cheguei a vê-la aparecer na janela, bela como a primavera. Aquela aparição deu-me a coragem que faltava para repetir o feito da noite passada. Quando todos adormeceram, ocupei meu posto de vigilância. Desta vez, havia arranjado um casco e me afastado da margem. As horas se arrastavam lentamente. Comecei a temer que estava perdendo o meu tempo. Já eram quase três da madrugada, e nada de boto. Começava a chover quando resolvi voltar pra rede. Justamente quando peguei no remo um relâmpago riscou o céu, iluminando a noite. Subitamente, as águas foram rompidas, dando passagem para um titã de corpo luzidio. Um boto enorme saltou bem junto do casco. Aqueles foram os instantes mais longos de minha vida. Seu corpo, brilhando pelo clarão do relâmpago, voltou a afundar na água escura. Percebi que ele apontava na direção da margem. Fiquei paralisado, como se uma estranha força impedisse de me mover. Dali de onde estava vi um vulto de um homem alto e elegante, todo de branco, emergir das águas. Subiu agilmente o barranco e foi em direção à casa de tia Rosa. Parou diante da janela do quarto de Maria e esperou. Pude distinguir, no meio da chuva que caía, o vulto de minha prima. Foi aí que saí do meu estupor, remei vigorosamente até a margem, subi a encosta já engatilhando a espingarda. Cheguei no alto do barranco quando eles já ali se encontravam. Maria parecia hipnotizada. Deparei, então, com um homem de olhar frio, sobrenatural. Tentei gritar. Mas não consegui. Eles passaram por mim e não tive forças para mover um músculo sequer. A espingarda deslizou das minhas mãos. Entendi horrorizado que estava impotente diante daquele ser hediondo. Senti o desespero de apossar de mim. Precisava reagir de qualquer maneira. Escutei Maria me chamar. Ela também tentava reagir. Reuni minhas forças e, num ímpeto, consegui me libertar. Saltei o barranco, empunhando o facão. Vi Maria, com as águas até o joelho, estender as mãos para mim. O homem se colocou entre nós. Cortei o ar com um golpe de facão. Tudo inútil. Ele agarrou a minha mão armada com grande facilidade e, com um forte tapa no rosto, prostrou-me na lama. Senti o gosto do sangue na boca. Novamente pus-me de pé. O monstro tentou me acertar de novo. Meti a cabeça nele, ergui-o do solo e bati com ele na lama. Esmurrei-o duas vezes, mas ele nada parecia sentir. Tentou me asfixiar apertando meu pescoço. Com um pisão desvencilhei-me de seu

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aperto mortal e corri até Maria. Apanhei-a pelas mãos e procurei fugir dali. Tudo em vão. O boto-homem surgiu minha frente, acertou um forte golpe na minha cabeça e tudo ficou escuro. Quando voltei a mim estava deitado num lugar estranho. Ouvia vozes ao meu redor, mas nada compreendia. Então alguém falou: — Saudações, terrestre! Você apenas ouvirá, mas não poderá falar. Somos uma raça que vive num planeta há milhões de anos-luz daqui. Apesar de nosso poderio tecnológico, nossa raça não conseguiu evitar que uma desgraça se abatesse sobre o nosso planeta. Nossos cientistas perceberam que o uso excessivo de produtos químicos estava causando danos irreparáveis à qualidade de vida na nossa atmosfera. Sobretudo, que havia causado modificações no sistema reprodutor feminino de nossa espécie. Explicando: nossas fêmeas estavam se tornando estéreis. Dentro de mil anos terrestres nossa raça deixaria de se renovar. Então, descobrimos que a fêmea de sua raça apresenta uma estrutura orgânica idêntica à da nossa. No entanto, nunca poderíamos nos mostrar aos governantes de seu povo. Eles reagiriam com violência ao nosso contato. Foi então que percebemos como a sua gente é supersticiosa e resolvemos criar uma lenda. Usamos o boto por ser uma espécie inteligente e curiosa. Assim, raptávamos suas mulheres, estudávamos sua estrutura reprodutiva e não éramos incomodados. Em troca, demos ao boto uma espécie de sonar, que o possibilita orientar-se no fundo do rio. Nunca, porém, havíamos nos deparado com um caso como o seu. O seu sentimento foge de nossa compreensão. Uma estranha força capaz de romper o campo hipnótico a que o submetemos e até ferir-me fisicamente. Ao partirmos levaremos esta informação a respeito de um sentimento terrestre chamado amor. Depois de algum tempo todos os fatos deste encontro serão apagados de suas memórias. Adeus, terrestre! Aquilo foi como um sonho. As imagens eram vagas, mas a voz era clara. Quando acordei estava deitado na beira do igarapé, junto ao corpo imóvel de Maria. Tomei-a nos braços e voltei para casa. Titia nos recebeu à porta. No outro dia, a conversa girava em torno do sonambulismo de minha prima. E de como evitei que ela se afogasse. Será que foi tudo um sonho? Não sei. Só sei que antes que estas lembranças se evaporem, resolvi escrevê-las. Agora, só me resta aproveitar o resto de minhas férias...

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A GANA HUMANA A gana humana Mistura água e óleo Fumaça e perfume Sol e flash Dissolve pedras Encurta segundos Em uma hora Agoniza e chora Refaz a vida Reclama a paz Faz mutirão Separa átomos Com estiletes Percorre becos Com canivetes Com cassetetes Grita preços Nas avenidas Em altos brados Amarela o verde Depois o cinza Escurece o azul Endivida o outro E cobra-lhe os juros Depois chora

Para não pagar É lixo. É luxo É branco impuro É lucro e ouro Em pescoços femininos Furta a maçã Daquela venda Chora a vida Que nasceu agora Acompanhada Por um grito De dor feliz É inocência A violência Da indecência Se faz sentir De bar em bar Em grandes favelas À luz de velas Repousa um ser Cuja gana Da natureza humana Teima e tenta Sobreviver

CANÇÃO AO VENTO Canta vento, no caminho! Como é belo teu cantar! Leva, leva o doce hino Entre a rosa e o espinho, A borboleta e o passarinho, Espalha o hino pelo ar! Canta um canto de esperança! Como é lindo o teu cantar! Chora, chora a vida!

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O hino que te consola Não fere, não te desola! É o que te leva a amar. Canta, vento! Acompanha Este humilde trovador! A canção é minha prece Que não chora, nem entristece! Quem a ouve, logo oferece A Deus como um louvor. Biblioteca Virtual do CPOEMA


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ANJO

A luz brilhou nos teus cabelos Reluzente querubim Como ouro encaracolado Num rosto de marfim Te vi, anjo silente, Sorridente para mim Tinha asas, pelo menos, Eu as vi, oh querubim! Carregou-me até o céu Perfumou-me com jasmim Te vi, anjo inocente, Sorridente para mim. Escutei o som da lira, Quando tu falaste, enfim. Coloriste o arrebol Com o toque do carmim Do teu rosto angelical, Sorridente para mim. Hoje, creio ver um anjo, Nas noites vagas, sem fim. Nos meus sonhos mais bonitos, Num bosque, em meio aos jasmins, Estendendo mãos tão puras, Sorridente para mim.

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Liz Carla Silva Castro

Nasceu em Soure, no dia 08/07/1986. Filha mais velha da Sra. Maria da Conceição Castro é sócia fundadora do CPOEMA e integra a Diretoria Executiva do Clube desde 2005. É professora efetiva da Rede Municipal de Ensino e aluna do Curso de Letras, habilitação em Língua Inglesa, pela UFPA. Liz conquistou importantes premiações em concursos de poesia da região e cultiva o gosto pela escrita e leitura desde criança.

Agradeço ao Meu Senhor e Meu Deus por ter-me concedido a dádiva da mais bela poesia: a vida. À minha família, pelo incentivo. À família CPOEMA, pela acolhida e pelos inúmeros momentos que compartilhamos, sobretudo as conquistas e alegrias. À minha cidade de Soure, que me proporcionou paz e tranqüilidade nos períodos de produção literária. E especialmente a Meu Canto, Meu Encanto, Meu Encontro, fonte eterna de inspiração.


Liz Carla Silva Castro

NAVEGANTE SONHADORA Sou eu que no céu ou na terra Ecoa na explosão do teu olhar. Ponho-me a tremer alucinada Quando lanças palavras ao ar. Sou eu quem vê luzes remotas Na voragem da saudade, Na escuridão da minha memória Atravessando a eternidade. Sinto-me no oceano De turvos desejos, Quando a noite desce pelo dia No compasso em trilhas de beijos. Tua presença é a inspiração maior Faz lua cheia surgir ao meio dia Torna doce a manhã abstrata e nua E se chove traz com ela a estrela-guia. Gaivotas sobrevoam meu mar, Quando visitas as ondas do meu pensamento. Sinto o vento das águas de sargaços. Aquecendo o mar aberto do meu sentimento. Continuo a navegar nas lavras de espuma. Vez após outra vejo o nascente. Tu não te rendes às ondas E eu navego descrente. Mergulho, então, no curso das palavras. Entre a noite e a madrugada teu anjo adormece. Uma brisa vadia plange em suave murmúrio Na sonolência da densa paixão que enfraquece. www.cpoema.org

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O sol me acorda num lance. Pareço ter preguiça de viver. Veleja meu barco fraco e sozinho, Buscando as águas azuis do teu rio para percorrer. Sou uma navegante contemplando o horizonte Água serena e pálida. Sou ela. Tenho esperança nos olhos de dilúvio. Sonho aportar tua caravela. CONTEMPLAÇÃO MARAJOARA

2° Lugar no III Concurso de Poesia do CPOEMA, Edição “Mestre Tomaz Barbosa da Cruz”

Ilha quase selvagem Por atabaques és embalada Retumba o estrondo na paisagem E estremece a passarada Belezas e mistérios se confundem Ante o tropel de teu carimbó Lendas e costumes se infundem No caboclo de nosso igapó Rolam rumorosas saias Derrama-se aroma típico no ar Cantamos aos manguais tuas praias A grandeza do meu Pará Na pujança do vaqueiro A vida parece parar O tempo a correr brejeiro Como areias finas no galope do ar Nos vastos campos cavalgo O meu gado a contemplar Quanto mais estradas, mais algo De deleite me prende a este lugar Encolhida e sonolenta

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Liz Carla Silva Castro

A lua no verdor do inverno Adormece com a chuva violenta Que deita em lágrimas seu brilho eterno O pescador resvala sua canoa No colo de borrascosos rios E a natureza intrépida o abençoa Dando-lhe peixes frios Arbustos frondosos ao longe dançam Numa indescritível sedução E a arrastados, abaixo se lançam Pela pororoca em ação Meu Marajó! Deixe-me provar do teu tacacá Põe-me ébria de teu açaí Toque-me os versos de teu siriá Mas não me deixe daqui sair Suave perfume de mulher-fantasma criaste Faróis da boiúna acendeste Língua indígena tu falaste A ser soberano aprendeste Reinas, reinam teus guarás em quilômetros quadrados Do nascer ao pôr-do-sol Remansos e encantos por todos os lados Ritmo e esplendor no fulgir do arrebol Marajó, tu és fortaleza a vigiar Do Rio Amazonas as águas Chamam-te anteparo do mar Por pousarem em ti correntezas alvas Ilha que endeusa a região amazônica Aqui jaz fortes traços artesanais No acorde de tua sílaba tônica Encontro meus laços culturais

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OLHOS DE INSPIRAÇÃO

Quando pairo em teu olhar Homem fascinação Lá no fundo o índigo do mar Vejo inundar meu coração Quando me olha e nada fala Atroa meu corpo então Depois sorrindo a alma dispara E voa em minha direção Avoantes teus olhos pousam Como duas gotas de escuridão Sobre um lírio branco repousam Dando-lhe inspiração Delicadas crispas se espalham no ar E com elas quanta, quanta sedução Ígneo às vezes é teu um olhar Que inebria-me e furta-me a razão Encontrá-lo é gravitar no amor Perdê-lo é incutir solidão Abraça-me a dor Longe de teus vetustos olhos de paixão.

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DENTRO DE MIM

Rolam dentro do meu coração, Irias lembranças daquele amor. Quanto mais se distancia, Maior é meu clamor. E os tempos mais difíceis de esquecer, Até hoje são lembrados. Que faz tempo já não há Momentos mais sagrados. São belas as noites que atravesso, Mas sem vida me vejo. É tamanha a tristeza sentida Que a manhã me encontra no arquejo. Alegre e triste eu sou, Um pouco medrosa, um pouco destemida. Eu me lembro! Era vazia, Quando entraste em minha vida. Então, ouvi um canto doce e lindo. Igual à orquestra de querubins. Na verdade, era a canção dos teus olhos Se apossando de mim. Digo que vi refletido em você Todos os sonhos que sonhei. E, no mistério desse cantar, Desde a primeira nota eu te amei. www.cpoema.org

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ETERNO LAÇO Meus olhos palpitam Coração atroa No semblante se agitam No seio logo ecoa A voz do amor, Feroz senhor. Saudade Tormenta Me invade Lamenta. A distância Ânsia me traz Pesadelo edaz. Te quero E venero De um querer Não perder, De um olhar Não tocar, De um falar A me calar. Te espero E me desespero. As horas amargas As tristezas largas Eu sinto, e minto pra mim E, assim, Sou forte

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Sou sorte Tenho você Me tens no ser. Por ti Me parti Sem me ferir. Por nós Fui atroz com a vida Minha esquecida. Fiz do hoje um lugar, Do espaço, teu olhar A me cercar Imenso mar. Perdem-se as cores Em nossas faces: dores! Tempo perdido, Sonho esquecido Preso pelo laço Do teu eterno abraço Que ficou, que marcou Num instante único me aprisionou. Sou tua És meu/somos pura tortura Somos um amor Que pressente Fundo sente Que será eternamente.

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O MEU AMOR NÃO MORRERÁ Olhos ao céu procuram a paz da minha fúnebre vida. O milagre divino de minha existência caiu em holocausto. Estou a ver com esforço os espasmos de meu coração doentio. Abala-me profundamente a tua ausência. O movimento do vento que leva e traz brasas, Não deixa aqui uma fagulha que possa me aquecer Em tom seco, constante, Passa com um alarido estonteante para meu suspiro profundo. Morrer. Eis a visão que dança no meu destino Me convidando a valsar. Espaços minúsculos de tempo Retratam uma eternidade silente e amorosa, Que acentua meu sentimentalismo. Deixando-me pensamentos desordenados, Em laivos de flagelação... Penso em ti a cada oscilação de minhas artérias. Chamo-te com os lábios em melodia enervante E obtenho apenas sentenças de saudades douradas. Lacrimeja o meu devaneio, Pois gostaria de descansar sua cabecinha no ombro que tanto ama, Mas não pode modificar as raízes recurvas desse amor. Sigo meu caminho cada vez mais anuviado. Cada vez mais alagado de imaculadas dilacerações pungentes. Mas não te perco de vista. Os cupidos adejam o esto que sinto por ti E eu te consagro, agora e sempre, o mais belo estro radioso Fixado no meu universo.

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É SEMPRE ASSIM

Escurece o céu, mas o dia não finda. Surge nova manhã, Mas é noite ainda. No olhar fixo, o vazio da tua vinda E a espera da madrugada vã. Em passos tardos meu coração avança Com as chagas tontas de amor por um triz Numa comoção que não cansa, De colecionar esperança. Ao invés de ser feliz Meu emocional alucinado voa. Amando a ti e o que virá. Por incertos rumos abençoa Os sertões de nossa terra boa E as margaridas de nossa sorte má. É sempre assim meu eu acordado Ansiando aqueles momentos reproduzir Mas, como o merecimento é demorado, Consumo o passado Até o inesperado me contrair.

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Liz Carla Silva Castro

SAUDADE

Saudade! A melodia fascinante dos teus passos A leveza mansa do teu ar Do sonho encantado nos teus traços Acordando somente no meu olhar Saudade! Tua mão entrelaçando a minha Teus dedos dominando os meus Tua fúria que não mas caminha No meu silêncio, meu deus Saudade! Teu beijo nutriz Teu sabor sem definição O toque meigo de teu lábio petiz Rompendo segundos eternos de fitação Saudade! O remanso do teu abraço A ternura do aconchego teu Felizes momentos do afago Laço frágil que me desprendeu Saudade! Tua presença nos meus sentidos Tua ausência constante proclamo Falta-me fazem os ledos ruídos De você que tanto quero e amo

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Luíz José Monteiro Cecim

Brasileiro, paraense de Bragança, casado (3 filhos), funcionário do Banco do Brasil desde 1980. Brangantino de nascimento (20/09/1956), marajoara por sentimento, faço poesia por inspiração e pelo desejo de poder compartilhar alegrias, tristezas, felicidade e dor, revoltas e esperanças, coisas enfim que são da natureza humana.

“... e enquanto muitos se perdem no emaranhado de seus ódios, na escuridão sinistra de seus desencantos, destruirei meus medos com a melhor canção que puder entoar...”

Foi através do CPOEMA e dos concursos de poesia em Soure, Ilha de Marajó, onde pude, oficialmente, expor minhas poesias e ver agraciados com premiações alguns desses trabalhos. Agradeço aos primeiros concursos realizados e organizados por Maria Justina e Ângela Benassuli. Mas foi principalmente pela dedicação e pela persistência de Márcio Vitelli e sua equipe (esposa, irmãos e amigos) que podemos ver a realização desta publicação que para muitos, é um sonho. Agradeço, portanto, a todos os que contribuíram para que pudesse ter a oportunidade de ver publicadas algumas de nossas poesias através desta Antologia Literária, que talvez seja a primeira da região do Arari, no Marajó. Dedico este trabalho à minha esposa Eliana (fonte de muitas inspirações) e a meus filhos Rodrigo, Renato e Rodolfo.


Luíz José Monteiro Cecim

ANJO E DEMÔNIO

Quando te encontrei E olhei teu rosto Vi um anjo bom A fitar-me, meigo E ao beijar-me os lábios Mostrou-me teu gosto. Toda tua magia Penetrou meu ser E me entreguei inteiro. Me enfeitiçaste E aos teus encantos Fiquei prisioneiro. Quando o corpo quente O meu envolveu Não pude fugir. E tua beleza Revelada inteira Meu corpo aqueceu.

Foste anjo bom A me dar prazer Amor, alegria, Mas sempre eu fugia Pra não magoar-te Te amar não podia. Hoje lembro tudo Sempre, todo dia Da paz, da amizade De tantos abraços Dos beijos ardentes Eu sinto saudades... Fico a meditar: Se foste um anjo Que eu pude ter Hoje és “demônio” Trazendo as lembranças Pra não te esquecer.

Num instante só Eu me renovei Com tu’energia E me entreguei Como a realizar Uma fantasia.

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BOCAS Da boca que grita a dor Também sai o canto que anima; Da boca que xinga e chora Também sai o riso, a alegria; A boca que acusa e fere Também defende, protege; A boca que morde e sangra Também socorre, beija; A boca que se embriaga Sacia também outras bocas. Boca, bocas. Vozes roucas. Boca, bocas. Palavras loucas. Bocas loucas. Vozerias... Bocas roucas. Palavras frias... Deixa a boca sorrir ao amor Deixa a boca gritar alegrias Deixa a boca cantar, animar, Deixa a boca... bocejar. Beija boca, sem ferir. Fere boca, o que não servir. Morde boca, a quem reclama, De não ter uma outra que inflama. Boca. bocas. Simplesmente. Bocas tristes ou sorridentes. Bocas, bocas que saciam. Bocas ternas, bocas quentes...

CANÇÃO DA ESPERANÇA Há uma nova esperança Para reavivar os planos Para realizar os sonhos De liberdade e paz

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E de tantas verdades Deixadas pra trás. Haverá muitas mudanças E as velhas andanças Vão continuar bem sei. Mas desta vez haverá menos sofrer E certezas de se encontrar no fim da estrada Outros modos de sobreviver. Já não se verá mais fome No povo que faz esta nação Pensaremos livremente Sem riscos de opressão. Afinal, aprendemos a lição: Temos o poder de decisão. São os braços fortes dos homens Que darão o que precisamos Para se viver melhor. Foi sempre assim E por muito tempo será O que nos salvará do pior. Não são paletós nem gravatas Que dão comida e roupa ao povo São os braços fortes dos homens São os calos secos das mãos. Não os homens de almas pobres! Nisto não existe segredo. São os homens de rostos pálidos É o suor de corpos flácidos São os pobres de alma nobre Que têm o senso de irmãos Vamos ser gente de novo. Que saudades de Tancredo! www.cpoema.org

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DO FUNDO D’ALMA Ninguém conhece minha dor Ou minha alegria. Ninguém sabe o gosto das lágrimas Que escorrem no meu rosto. Ninguém imagina meus sonhos Nem meus desgostos. Ninguém ri meu riso Nem chora meu pranto. Ninguém grita meu desespero Nem entoa meu canto. Ninguém sabe o que busco Nem andou meus caminhos. Ninguém navegou comigo Nos oceanos de minhas aventuras Nem mergulhou nos mares de loucura Das minhas ilusões. Ninguém vê o que vejo Nem sente o que sinto. Ninguém vê o inverso dos tormentos De minhas paixões. Dor e desgosto, Lágrimas e prantos, Alegria e sonho, Riso e canto, Aventura e paixão. Só eu sei o que são... E cada um sabe o que chora E o que sonha. Cada um sabe por que ri E por que ama. Mas de mim ninguém sabe, Só imagina. Às vezes... Compartilha...

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VOZES No princípio era o som... Atuando livre na natureza primitiva, De lugar ignorado ressurgindo Trazendo as energias do espaço infindo Dando ao planeta nova alternativa. E o som se fez voz. Através do sublime despontar das criaturas Prevendo a importância que teria por certo Na paulatina harmonização do universo Para brindar as gerações futuras. E vozes se perderam. Do sentido maior que lhes atribuía A divindade que os criara, então Espalhando o caos, o ódio a dissensão Retardando a nova era que surgia. Muitas outras, porém, compreenderam, E em cada tempo essas vozes solidárias Insistiram, ressoando nos desertos Tentando saciar a sede de saber Que multidões ignorantes clamavam solitárias. E as vozes espalharam nos caminhos Mensagens de coragem, de fé e de esperança Tentando resgatar o amor perdido ― Que outras seqüestraram de homens livres ― Fazendo ver a todos que tenham confiança. São muitas, hoje, as vozes que ecoam, Trazendo nesta era verdades escondidas Propositadamente por séculos de trevas Em que o terror tragava as almas mais sublimes Sepultando verdades que não podem ser vencidas. Falam-nos essas vozes das formas mais diversas www.cpoema.org

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Dos evos da existência da qual somos partícipes Surgindo a todo instante e sempre mais presentes Nos jovens, nas crianças conforme está escrito Fazendo o intercâmbio com as zonas mais distantes. E assim o som retorna mais livre e desenvolto Jorrando em toda parte mais luz, mais claridade Fazendo o ar vibrar com as vozes do espaço Que surgem a nossa volta trazendo entendimento E força a outras vozes que amparam a humanidade

É PRECISO

É preciso ter na alma um canto E ter encanto ao sorrir É preciso ter um pouco fantasia Ser um tanto poesia Estar livre da hipocrisia E se enfeitar todo dia De amor! É preciso ser um sol ou uma estrela Um rouxinol ou uma abelha Pra ter beleza ao cantar E a doçura do mel no falar. É preciso ser o mar ou o infinito E todo grito conter De dor! Se for difícil no entanto Sorrir, cantar, alegrar-se. Ser poeta ou amar Ser intenso como o sol Ou imenso como o mar Ser suave brisa matinal Ser arrebol Pelo menos se livre do perigo De tornar-se um ser irracional.

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OCIOSIDADE INTERIOR Uma mente vazia Que vaga no espaço Vadia... Se entrega. Não se alimenta, Não come... Não mastiga, Se castiga, Se consome, Se arrebenta. Uma mente vazia Não aprende, Não serve E nem é servida. Se perde, Não sacia, Se vicia Submerge. É uma mente vadia Que vaga Sem nada Nada sabe, Não se anima É enfadonha. Uma mente vadia Não pensa E não sonha. Se enxerga Não sente o que vê. Uma mente vazia Não ouve nem fala, só cala. E fácil se desespera Pois tudo o que passa por ela Não fica, esvoaça. Se per de co mo fu ma ça... www.cpoema.org

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PROCISSÃO Quantas cordas lhe atam as mãos calejadas Que precisam de terras e não de promessa De mãos que carregam charolas Cheias de dores Carentes de amores. Quantas flores! Bonitas, de cores, Enfeitam as janelas sem vida, e as padiolas. Mas perderam o perfume e, embora às avessas, Revelam ainda a fé e a esperança, vilipendiadas. Quantas badaladas anunciam uma onipotência Sem denunciar a fome e a miséria dos degredados Que silenciam diante da opressão Da pressão oculta e do medo Guardados em segredo. Quanto folguedo, Jogo, vício, brinquedo, Mudam o que deveria ser a atração. E os mercadores da fé dos desenganados Vendem os milagres e as bênçãos com negligência. Dissipam-se os sonhos Nos “artifícios dos fogos”, Que queimam os alimentos dos famintos Despidos de sorte, de caridade e amor, Na dolorosa caminhada de redenção e resgate. Com quantos adornos lhe cobrem, quanta arte! E descobrem os menores sem lar, que dor! Quantos lhes beijam os pés por instinto Pedindo prodígios espetaculosos Diante de tantos atos medonhos. Mas, salve a oração de quem luta Pelo resgate do homem Da solidão que criou na própria caminhada. Aleluia ao sacrifício da fé no futuro da própria alma Que faz hoje o que convém, mas que colherá o que planta. Salve o ladário que encanta

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Luíz José Monteiro Cecim

E a ladainha que acalma. Que afinal não seja em vão o sacrifício, a jornada Que muitos fazem à toa, e onde outros tantos consomem A pouca força que resta, na esperança da busca.

SUSSURROS É frio, na noite que vai... Ao longe, o canto do galo ― Que é tão raro ― Se mistura a música do cabaré Que aos poucos se esvai Com o barulho dos carros Que encobriu o som dos grilos, enfim E o coaxar dos sapos Do meu jardim. É frio... E a madrugada que chega Me trás um arrepio: Um arrepio de medo Dos sussurros da madrugada Que encerram a noite mais cedo. É frio, é madrugada. E agora me enchem de pavor Os gritos na madrugada. Os gritos das gangues Das mulheres semi-nuas Das sirenes das ambulâncias Dos tiros dos policiais Do choro dos meninos das ruas. Mas do frio da madrugada Também me vem a calma Dos que buscam a paz Com o silêncio que agora faz Porque tem um momento Em que a madrugada jaz. É o momento da trégua Para que os músicos de jazz Descansem para logo mais. www.cpoema.org

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

Nasceu no dia 31.12.1953, na Fazenda Aba da Serra, em Várzea Alegre (CE). Filho e Manoel Sampson Bezerra e Cândida Coelho Braz Bezerra. Em 1956, seu pai deixa o trabalho na agricultura e se transfere para Cedro (CE), onde foi trabalhar numa farmácia como enfermeiro e, algum tempo depois, veio a adquirir tal farmácia, onde Tarciso começou a trabalhar. Em 1970, a família se transfere para Crato (CE), onde Tarciso concluiu o curso Técnico em Contabilidade, já trabalhando em uma fábrica de biscoitos. Em 1974, casou-se com Verônica Maria Moreira Bezerra, advindo da união seus filhos Bruno e Sampson. Em 1976, ingressou no Banco do Brasil. Nesse mesmo período, filiou-se à União Picoense de Escritores, e publicou seu primeiro livro de poesias intitulado LIBERDADE (lançado em Picos, PI, em 2002, é uma coleção de suas poesias e frases, escritas ao longo de sua vida). Em 1992, casou-se com Simoni Socorro Mescouto Rodrigues, advindo da união seus filhos Tarciso e Ariadne. Estudou Ciências Contábeis na Universidade Federal do Ceará, de onde transferiu o curso para Universidade Estadual do Piauí ― Campus de Picos (PI). Cursou MBA em Auditoria na USP/FIPECAFI. Em 2005, ingressou no Banco da Amazônia, onde exerce as funções de Técnico Bancário na Agência de Soure. Durante toda sua vida procurou em suas leituras garimpar textos, frases, provérbios e citações que inspirassem sabedoria e positividade. Estes trabalhos vêm sendo divulgados pela Internet, no local de Trabalho e na Maçonaria. Mantém os seguintes endereços na Internet: www. garimpodesabedoria.cjb.net; http://sites.uol.com.br/garimpo e http:// garimpo.blig.ig.com.br. Tem várias poesias inéditas. Soure (PA), Ilha do Marajó, 17.03.2007.


Luiz Tarciso Coelho Bezerra

BANCO DA AMAZÔNIA – 50 ANOS, EM SET/2006 É grande a Amazônia Aqui tudo tem mais Mas uma coisa tão boa Não se imita jamais Por isso nosso Banco É o melhor entre os demais Tem o Banco do Brasil Também tem o Banpara Mas só um da Amazônia Que é o melhor que há Os outros não são daqui São do Brasil e do Pará O Banco da Amazônia Foi o terceiro a nascer E mesmo entre gigantes Sempre teve seu poder De com crédito de fomento Fazer sua Região crescer Aqui na bela Soure Hoje faz cinqüenta anos Desenvolvendo a Ilha Seguindo todos seus planos Servindo a todo seu povo Sem lhe causar desenganos Por aqui muitos passaram Outros muitos hoje estão Todos deixando um tijolo Nesta grande construção Pois o Banco da Amazônia É orgulho desta Nação Edmilson seu Gerente Está bem assessorado Pois ao seu lado tem gente www.cpoema.org

Que muito tem trabalhado Para ver Soure crescer E seu povo recompensado O Frank e a Nazaré O Renato e a Rosemeire O Eliel e a Taiana O Diogo e a Silvia Meyre Fazem que seu trabalho Como bela rosa cheire E assim continuando Tem o Marcelo e o Orivaldo Um graúdo e outro gito Mas ambos com respaldo Para compondo com os outros Fazerem crescer o saldo O João e o Alexandre O Marcelo e o Astério A Laila e a Tamara Trabalham com esmero E também a Eliane Tem o seu trabalho sério Obrigado, seu Miranda Por sua honrosa presença Prestigiando este povo Que labuta nesta Agência É a certeza que a Sede Em seu pessoal pensa E o Tarciso poeta Vai aqui se despedir Cumprindo a sua meta De com todos aplaudir Por estes cinqüenta anos E por outros que hão de vir.

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BRINCADEIRAS

Peteca, bola, bila e pião Em dupla ou mesmo só Faça chuva ou faça sol Era grande a animação Futebol eu não jogava A bola corria mais que eu e quem quedas não sofreu Quando na bola pisava Baralho nunca joguei Nem que fosse apostado De vício único e danado Só do cigarro peguei (mas já larguei) Brincando o tempo matava Era assim meu pensamento Mas quem matava era o tempo Eu apenas me enganava

Sem querer fui crescendo As brincadeiras morrendo E eu sem brinquedo ficando Na vida adulta o trabalho Os problemas e a família Tem sido o que alivia E da tristeza quebra o galho E assim vai indo a vida Caminhando para o fim E o que será de mim? E da saudade sentida? O melhor é nem saber E a todos ir amando Pois se ela vai chegando Feliz vou tentar viver

Estudar eu não gostava Mas meu pai era sabido E dando bronca comigo Pra escola me mandava A vida assim foi passando

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

CÂNDIDA Ao dar-te o nome de Cândida Feliz idéia teve a criatura Ao pressentir-te talvez santa Ou mesmo imaculada e pura Tal qual Maria Mãe de Jesus Aos filhos amas com ternura Fazendo ao teu nome jus Pois és cheia de candura

Aprendemos muito da vida Para melhor a vida viver Que Deus vida longa te dê Para que ao longo da vida Tenhamos sempre você

Com o teu grande saber

E O QUE É QUE ME FALTA FAZER MAIS? Eu transportei as pirâmides do Egito Botei a terra no deserto de Saara Venci três grandes tigres em Bengala Levei a água pro Rio São Francisco Nas escrituras deixei os meus anais Fui no inferno e bati em Satanás Fui quem no Rio criou o carnaval E dei um pulo do Brasil a Portugal E o que é que me falta fazer mais? Se o que fiz até hoje ninguém faz Eu ensinei Pelé a jogar bola E o Patativa ensinei a rimar Fiz o Roberto aprender a cantar E Paulo Freire mandei para escola A Vilanova ensinei tocar viola E a Carla Perez ensinei a rebolar A Sílvio Santos ensinei a conversar Beto Carreiro, a domar os animais E o que é que me falta fazer mais? Se o que fiz até hoje ninguém faz www.cpoema.org

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I Antologia Literária do Marajó

O CACHORRO Se você quer um amigo Que mais dá do que lhe pede E que amigo persevere Mesmo quando ofendido Não procure o bicho homem Para tê-lo como amigo Se quiser ter um amigo Até mais que um humano E que não traga desengano Tenha um cachorro consigo Em vez de ter amigo cachorro É melhor ter cachorro amigo

PRAZER CARNAL No desejo constante do corpo amado Na ânsia de amar o maior dos amores Fico sonhando mesmo acordado Em ter de ti agradáveis favores No teu leito de amor quero deitar Na esperança de ter os teus beijos E nas curvas de teu corpo me deleitar E também suprir teus maiores desejos Na beleza de teu corpo sem par Quero meu corpo nele juntar E sentir da vida o maior prazer Linda mulher a quem vivo a amar Vamos pra sempre juntos ficar Para melhor nossa vida viver

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

MINHA APOSENTADORIA

Vou embora pro meu Ceará Porque lá tenho um nome Não sou Luiz com fome E aqui não posso ficar Foram vinte e oito anos De trabalho no Banco Agüentando firme no tranco Como previam meus planos Não pisei subordinado Nem puxei saco de Chefe Pois não sou um mequetrefe Tenho muito é trabalhado Hoje estou realizado Com a missão cumprida E mais uma vez de ida Para o meu solo prezado Pode ser seco e duro Chover pouco e ser quente Mas a sua boa gente Acredita no futuro Não estou indo pro escuro Lá meu sol é bem mais claro E banho de mar não é raro Tenho a praia do futuro www.cpoema.org

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I Antologia Literária do Marajó

Esta história teve começo No Sertão Pernambucano Setenta e seis era o ano Até o dia não esqueço

Conheci todo o Brasil À exceção de dois estados Que fui só aos seus lados Mas suas terras não vi

Foi em trinta de dezembro Tomei posse em Salgueiro E não houve desespero Isso é coisa que não lembro

Picos e Rio Branco As duas últimas paradas Talvez melhores estadas Das que tive no meu Banco

Depois fui pra Juazeiro, Parnamirim, Piancó E nunca me senti só Em dezembro ou janeiro

Não esqueci Wanderley Onde um dia fui adido E na Bahia fui querido Do seu povo que amei

Manicoré me abraçou Na nossa grande Amazônia Pois digo sem parcimônia Quem passou ali gostou

Aos colegas meu abraço Aos clientes agradecimento Pois não há esquecimento Na lembrança sempre trago

Retornando ao Pernambuco Fui a São Vicente Férrer E na volta não há quem erre Se já não estiver caduco

Quem te ama de bom grado Por tudo que me destes Diz feliz um cabra da peste Banco do Brasil, muito obrigado!

Ali passei quatro anos Até noventa e dois Para AUDIT fui depois Onde passei nove anos

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

PATATIVA DO ASSARÉ E ASSARÉ DO PATATIVA (08.07.2003 – Um ano sem Patativa do Assaré)

Nasceu, viveu e cresceu Naquela pequena cidade Cantou o Sertão como seu Com toda simplicidade Até ganhou belo nome Ainda em pequena idade De Patativa do Assaré Poeta de fé e sabedoria Que com seu canto alegre Tornava belo o quanto dizia Já que foi para o Céu Encontrar o Pai Criador Deixou aqui seu cordel Com alegria e amor E sua pequena cidade A qual tanto homenageou De Assaré do Patativa Seu novo nome ganhou Prestigiando de forma afetiva O Poeta que Deus lhe tirou

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I Antologia Literária do Marajó

PRETO JOVÊNCIO, O VAQUEIRO

Cem longos anos O Preto Jovêncio tem Mas como ele consegue Ser jovem como ninguém É verdadeiro mistério Que descobrir convém Ele foi menino forte Desde cedo trabalhou E mesmo ainda miúdo Sua profissão abraçou E no mais famoso vaqueiro Do Marajó se tornou Ao longo de sua vida O medo não lhe rondou Ganhou muita corrida Nos cavalos que montou E derrubou touro brabo Que nos campos campeou E pelas ruas de Soure Esta tão bela cidade Tem a figura singela Que lhe trás felicidade Pois o vaqueiro mais forte Aqui em muita amizade Quando na rua ele passa

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Cumprimenta todos que vê E também é cumprimentado Por quem quer lhe conhecer Para saber da história De tão longo bem viver Se o ser humano busca A sonhada longevidade Não precisa de mistério Só de Deus a caridade E um monte de amigos Que lhe dê felicidade Passar o dia trabalhando E toda noite dormindo É apenas uma das formas Para se manter menino Mas se quiser coma turu No seu lanche matutino E assim vamos vivendo Sem com ninguém se zangar Nunca guardando ódio E tendo sempre a quem amar Pois com o caldo de turu A energia vai lhe sobrar.

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Luiz Tarciso Coelho Bezerra

QUEM É A MULHER? É a mais singela figura Deus a fez bela e frágil Mas com muita formosura Para que ela fosse ágil Em continuar sua Criatura Sendo mãe de homem e mulher Perpetuar a Humanidade Com saber, amor e fé Quer no campo ou na cidade Com certeza a mulher Tem grande capacidade E para ser mais poderosa Não precisa se esforçar Pois traz consigo o dom De a todos sempre amar

SONETO DO AMOR AUSENTE Com a volúpia própria dos amantes Quero ter o teu amor intensamente Tornando eternos todos os instantes Em que meu corpo sentir o teu presente Buscarei odores entre teus seios Onde dormirei um sono inocente Ao acordar darei aos meus anseios O prazer de dentro do teu ventre Teus lábios largos e sorridentes Adivinhando o meu maior desejo Anunciarão que isso tu consentes Se permanecermos sempre persistentes Nossos lábios se unirão em longo beijo E nossos corpos se amarão ardentemente. www.cpoema.org

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Marcos Antônio Maués Vitelli

Nasceu no dia 16/06/1979, na cidade de Soure, Arquipélago do Marajó, Pará. Filho de Maria Lúcia e Manoel Pedro Monteiro Vitelli, é formado em Letras pela UFPA. É sócio-fundador do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA) e tem vários poemas premiados em concursos do gênero: “Ausência”, na Antologia “Poetas do Brasil”, Arte Bahia (2006), entre outros.

Agradeço à minha família e aos conterrâneos que serão cúmplices de meus singelos versos rebentados na mocidade.


Marcos Antônio Maués Vitelli

A MAGIA DO AMOR

O amor puro fere, cura e consola aquele que se embebe no vermelho, rende-se ao mundo, chora, grita, rola, no otimismo de um dia revivê-lo. A amada – reconforto do perdido – há de aquecer seu peito tristuroso, reestruturar o riso envelhecido, a carne fervilhar em quente gozo. O amor é chuva infinda de alegria, nutrindo corações e muitos sonhos, é luz, com sua hipérbole do dia, que as almas apaixonadas inflama, solta ainda os selváticos demônios, filhos do prazer, na quebrada cama.

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DESENCANTO

De tristezas e restos vive, apenas, um coração que já sorriu, decerto. É sofrível lembrar das mãos serenas – dos pássaros pequenos – que não aperto. Saudades! Olhar gélido e desnudo em meio à sombra, à luz, à dor, tudo! Esse amor, por mais triste, me derrama um gosto de viver com toda gana! Sei que jamais hei de tê-la comigo. Assim, me entrego à sina – novo abrigo, para gozar de todo o desencanto, deste meu doloroso e infindo pranto. E tranco os olhos, miro minha alma caminhante nas sombras da ilusão... Enxergo ainda o meu corpo na palma enregelada e côncava do chão!

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Marcos Antônio Maués Vitelli

DISTÂNCIA

É triste viver! É dorido, sim! O desamor constrói a solitude. Nasce no peito a noite vil, sem fim. Do fado arquitetei fugir, não pude. É vão sorrir! Se a dor vem e não cala, Uma augusta tristeza me debela E todo aquele sonho em tê-la, amá-la, Foi-se perdendo... tão distante dela. Vejo na escuridão que me vigia Um fantasma andarilho, luminoso? É a ilusão da amada, de meu dia, Mostrando-me o destino venenoso. Estou partindo à espera de uma paz, Que possa me servir de um novo abrigo. Não tento estar ao teu lado, jamais! Tornaste o maior, sevo, inimigo.

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ESCOLHA

Tirem a luz que arde em minha cara! Quero o infindo silêncio do desterro. O amor já não preenche, já não sara, O impuro coração, meu antigo erro... Que venham a loucura e o amargo pranto, Pra acabar com a dor que inda persiste. Quero respirar muito o desencanto E gritar, sem controle: Sou homem triste! Feneço no calor das ilusões, Ante os olhos sem pálpebras da morte. Vejo-me num invólucro, sob sons; São de demo, mostrando a minha sorte! Não calcule exibir-me uma saída. Está escrito, com sangue, meu sofrer. Expulsei, consciente, a suja vida, Para residir próximo de Lúcifer.

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MUTISMO

Depois que a morte divorcia-nos da vida, há um vazio esboçado no dorso da terra, um gesto definitivo de silêncio, ... vestígio de passos dormidos, empoeirados na lâmina suja – descolorida – arranhada pelo tempo. Mas fica a lembrança venerada, à tona, e sua do baú da memória, tão próxima, convertida no presente, na expressão doce de um olhar, na singeleza profunda de um riso.

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RECORDAÇÕES

Sinto a essência inquieta do passado, que a memória empenhou-se em sustentar. Escuto as maresias segredando, nas transparentes águas de meu mar! Embala-me a saudade grandiosa, onde as gaivotas dançam, sem parar, na cadência do vento projetista, sobre as trêfegas águas de meu mar! Transpira uma canção do paraíso, enfeitiçando tudo, sem cessar. A natureza verde se embeleza, fitando-se nas águas de meu mar! E as pegadas na vasta areia clara, dos passeios antigos, ao luar, o sol as enche de lume e carícia, após beijar as águas de meu mar! Nas ondas vão meus sonhos navegando... Vão desobedientes a ancorar. A ventura carregam em suas velas, da cor do céu e das águas de meu mar! Azul é o desejo que me move. É divinal o êxito a brilhar. É soberba a lembrança preservada, das claríssimas águas de meu mar!

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Marcos Antônio Maués Vitelli

SAUDADE

Meu amor veste-se de vento e sai vagando na lentidão do sopro do tempo. A saudade se comprime em delírio, hesita ferir-me com o verbo preso na garganta da página vazia. Tenho abismos propondo-me a morte, enquanto me acende o aço da espera. Eu era... Sou a incerta grafia da vida deitada em versos de um poema cuspido. Marcho nesse mapa de palavras e entorno a noite no meu peito fútil. Eu mato o silêncio e recolho-me (tento) em passos atrasados àquele amor já não vestido de vento.

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I Antologia Literária do Marajó

TEMPO

O tempo tem sua bússola no Tempo vergando a vida. Somos nuvens – minúsculos retirantes – na complexidade do arco. O mundo e seus calos... conseqüências do tempo respirando as horas oxidadas. Tanto tédio tem no tempo escravo do Tempo. É tempo de sorrir. Ainda tem tempo. O tempo do mundo se curva em cada curva. Tudo muda com o tempo muda com o tempo com o tempo o tempo tempo.

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Marcos Antônio Maués Vitelli

VOZES NO POEMA

Cuspo no dorso da página as minhas digitais em palavras reprimidas e ignoradas pelo tempo. É sem rosto o meu poema, mas abriga, na essência, a identidade de todos! No deserto estranho dos verbos – silente como um câncer – o descaso, a força corrompida, a vida latente respirando... talvez, os últimos instantes. No cerne das palavras a energia motriz reacendida, gritos encobertos pelo fumo negro das letras estampadas na superfície branca do cárcere da página negada, que o pensamento estanca.

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Maria Jardelina Pinheiro

Sou mais conhecida entre alguns amigos íntimos como “Jady”, pelo fato de eles acharem difícil pronunciar o meu nome. Nasci e me criei em Belém, capital paraense, e resido em Soure, desde 01/03/1990. Amo esta cidade e gosto dela como se fosse minha. Fico feliz por ter sido adotada por ela. Eu, meus filhos Paulo Sérgio Pinheiro e Liliane de Nazaré Pinheiro, além dos meus netos Paulo Augusto Silva Pinheiro e Tayanê Pinheiro Pinho, dádivas de Deus que ganhei residindo em Soure, por isso, amamos viver no Marajó. Faço poesia desde criança, mas não posso apresentá-las pois o caderno que as continha foi destruído pelos cupins. Em Soure já escrevi muitas poesias vencedoras, nelas usei os pseudônimos: Peregrina e Estrangeira: 2° lugar no Concurso de Música Vocacional Evangélica, promovido pela Igreja Católica, com a letra “Eu Preciso de Ti” (A música foi defendida pela minha filha), em 2001; 1° lugar no concurso de poesia em homenagem a Soure, com o título “Natureza”, 2001; 1° lugar no concurso de poesia em homenagem a Soure, com “Talentos do Marajó”, em 2002, onde destaquei os talentos de nossa linda e exuberante cidade.

Primeiramente a Deus e depois à minha mãe Maria Rosilda da Conceição Pantoja, à 1ª Dama do Município de Soure, Dra. Carmem Lúcia Lima Gouvêa, e ao meu companheiro Otacílio Lobo dos Santos, que me apóiam, fazendo com que eu participe da I Antologia Literária do Marajó. A toda a minha família e aos integrantes do CPOEMA.


Maria Jardelina Pinheiro

HARPA DO POETA

Sou feliz em ser poeta Fazendo parte dessa augusta Que só me faz sonhar Tocando o meu instrumento Com as mãos a dedilhar Cada dedo é um poeta Que faz a minha Harpa cantar

QUERO TE AMAR Saia bordada com pétalas de flor O seu sorriso encanta qualquer sofredor Teus lábios carnudos destilam o teu amor Uma onda disse à outra: ― quero este corpo banhar Revolver-me em teu regaço, até em espumas me tornar Então entoaram juntas: ― Soure eu quero te amar

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MUSA DOS POETAS

Mãe eu quero te cantar Do teu amor falar Para toda a nação Falar do teu talento Que até o pensamento Transformas em canção Eu quero te agradecer Poder falar, te dizer Toda a minha gratidão Com três letras:... MÃE! Me deste a vida Me trazendo ao mundo Me fazendo a preferida Com quatro letras:... AMOR! Me enches de paz E me tornas capaz De sentimento profundo Ao terminar este poema Fica sempre o dilema De um filho poeta Que ao procurar uma inspiração Tem sempre no coração Sua musa predileta... MÃE! BENDITA ÉS TU ENTRE AS MULHERES

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Maria Jardelina Pinheiro

O VENTO

O vento leva a minha vida Como uma folha perdida Voando no ar O vento sopra momentos Levando todo o desgosto Que vem para me atormentar O vento baila no ar Com um suave murmurar A minha alma vĂŞ acalmar O vento com a sua voz sonora Manda toda a dor embora E me ensina a cantar O vento sussurrado me consola Empurra a tristeza, manda fora JĂĄ chegar de tanto chorar O vento ĂŠ um grande abrigo Que oferece o ombro amigo Para que eu possa respirar

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MADONA

Das ondas do mar fazes tua saia Das areias do mar fazes tuas sandálias Da voz do vento, ouço canto de sereia Com a espuma do mar tua saia é rendada A tua face rosada me deixa encantado Os teus olhos verdes me deixam enamorado Teu corpo delgado me faz sonhar Teus lábios cálidos me fazem delirar Ah! Se eu pudesse contigo casar Com linhas marcadas ensinas o teu corpo Teus cabelos dourados fazem inveja para o sol Tua pele clara, desnuda, faz a lua chorar Arrastas a tua saia pela areia do mar Tuas madeixas compridas em forma de véu Traduzem a beleza, transformação do eu Madona – Donzela – És descida do céu

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Maria Jardelina Pinheiro

TRISTE SEPARAÇÃO

Réu eu sou por ter rejeitado o teu amor Amor que tu me dedicavas e que eu não entendia Ia caminhando na grande incerteza Mas quando acordei já era tarde demais Um dia descobri que eras casado Não resisti às lágrimas, pois perdi o meu amado De dia e de noite penso em ti Os nos passaram e nunca te esqueci Da vida só espero um bom tempo A quem amo venha diminuir meu sofrimento Como a brisa sopra as árvores Os seus galhos e frutos molhando Na calada da noite, no pensamento te vejo Como se fosse uma flor E eu um beija-flor te beijando Indo a caminho eu sonho Com os meus braços te procuro, te alcanço Amor, palavra que soa como o mel Os pássaros bebem sobrevoando o céu São teus todos os meus pensamentos O tempo que perdi longe de ti Uma vez me servem de exemplo Zangão sem abelha não pode reinar Amor com amor se deve pagar Às vezes fico pensando: por que não te esqueci Rio quando lembro do tempo que perdi As nuvens no céu me dão alegria Uma vez descobri o amor, não sabia amar Já não agüento mais essa triste separação O mar já me leva para dentro do teu coração www.cpoema.org

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CABOCLA MORENA

Morena bonita Menina cheirosa Por mim passas faceira E toda dengosa De tranças compridas Cabocla brejeira Teus lábios destilam O sabor do fruto da açaizeira Cabelos cacheados Quero neles me envolver Enroscar-me nos teus cachos Até o dia amanhecer Quem dera eu pudesse Em teus braços me enlaçar Poder gritar: te amo! E nunca mais te deixar Tu és a rainha Dessa imensa região Soure, cidade querida Tu moras no meu coração

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Maria Jardelina Pinheiro

CIDADE DAS MANGUEIRAS

És conhecida como hospitaleira Criança manga rosa Cidade das Mangueiras Teus frutos adocicados Chegam a ser o meu bocado De tua terra fértil E todo o meu legado Ao desabrochar do dia Teus lábios se abrem em risos Com o frescor da manhã Dai-nos a tua brisa Cidade dos maruanases Carimbó e bois-bumbás Lindas praias: Barra-Velha, Araruna Pesqueiro com suas dunas Negras, compridas e lindas tranças Enfeitadas com rosas e jasmins O vento leva o teu perfume E nos traz através do Rio Paracauarí Até os hotéis imitam a ti Hotel Ilha, Asa Branca, Soure Araruna, Marajó e Paracauari Soure, cidade morena, não sei viver sem ti

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O NASCIMENTO DA PRINCESINHA DO MARAJÓ

Há alguns anos, chegou aqui no Pará um casal de fidalgos estrangeiros, que, depois de muito tempo, resolveram habitar na terra. Sua esposa concebeu. Não quiseram ir para o seu país, a fim de que ali ela desse a luz. E, no dia 10 de março de 1962, nasceu uma linda menina de olhos verdes, que se confundiam com os matos, cabelos louros bem compridos chegando até os pés, irradiando o brilho do sol, era tão branca que se comprava com a lua. Seus pais, quando viram as belezas de seu rebento, ficaram maravilhados, pois nunca tinham visto tamanha beleza, nem mesmo em seu país, então chegaram a um acordo: criá-la em terra paraense. A menina foi crescendo. Passou feliz pela sua tão bela infância; por sinal não teve do que se queixar. Divertiu-se bastante, tendo sempre o apoio e companheirismo dos pais. Chegou à adolescência, muito estudiosa e ambiciosa, só pensava no progresso de seu futuro. Atravessou pela juventude. Era uma jovem bela, formosa, cheia de vida, por que não dizer: exuberante. Sua face rosada igualava-se com o pôr-do-sol, seus lábios eram o puro favo de mel. Seus pais a observavam em todos os seus gestos: pois ela gostava muito de contemplar o mar e sentir o seu cheiro. Apreciava quando as ondas deitavam-se e deleitavam-se na areia da praia. Adorava contemplar as matas, observando as belas flores que enfeitavam as florestas e exalavam os seus aromas perfumando o ar e ouvir o canto dos pássaros que pareciam cânticos melódicos e apaixonados para ela ouvir. A jovem fascinou-se tanto pela natureza que desejou fazer da floresta seus vestidos, das flores, adornos para seus cabelos e colar para seu pescoço. Saltitando descalça pela areia da praia, sentia a altivez da realeza em que nascera e fora criada. Agora adulta, continua sobrepujando do reinado real que ela envolveu-se desde o nascimento até os nossos dias. E o que é muito

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Maria Jardelina Pinheiro

importante, todos que a vêem e a conhecem, aprendem a amá-la e não tem coragem de abandoná-la. Parabéns, “Princesa”! Por mais uma pétala de flor colhida no seu jardim natalício cheio de vigor e prosperidade. Parabéns! Para os seus habitantes, visitantes e dirigentes que têm feito de você o que hoje se vê. Salvaterra, você merece toda a felicidade do céu. “Princesinha do Marajó”

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Maria José Barros de Almeida

Ou simplesmente JÔ, nasceu no município de Santa Cruz do Arari, onde mora e trabalha, sempre gostou de ler poesias, depois passou a escrevê-las. Em julho de 2001, quando ganhou o concurso de poesias no “XI Festival do Tamuatá”, é que descobriu seu grande desejo de ter seu trabalho publicado.

A Deus, pela realização deste, aos meus filhos Anderson e Bárbara que sempre me passaram confiança. À minha mãe e a toda a minha família, que sempre me incentivou. Aos meus amigos, que elogiam e torcem pelo meu trabalho. À Sra. Laíse Silva, 1ª Dama do Município de Santa Cruz do Arari. Às professoras Raquel Araújo e Maria José Vitelli, pelo incentivo e idéias. Ao Prefeito de Santa Cruz do Arari, Fernando Lobato, pelo patrocínio, boa vontade em colaborar e por querer que todos tenham oportunidade. Ao CPOEMA, pela idéia de dar oportunidade a todos.


Maria José Barros de Almeida

MINHA INSPIRAÇÃO Esta poesia dedicada a Santa Cruz do Arari, foi vencedora no XI Festival do Tamuatá, realizado nos dias 27 e 28 de julho de 2001.

Minha terra não tem mangueira Igual às terras de lá Mas tem coisa mais gostosa O famoso tamuatá Minha terra não tem cachoeira Nem praia pra bronzear Mas tem o Lago Arari Rico pra se pescar Esse majestoso lago É de muito valor É apreciado por todos É orgulho do pescador O povo que aqui mora Tem muito orgulho de ti. De ser marajoara De Santa Cruz do Arari Santa Cruz do Arari Terra de pescador Do pequeno fazendeiro De povo trabalhador Santa Cruz do Arari Não és esquecida não És uma linda cidade Fruto de minha inspiração

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TERRA QUERIDA

Santa Cruz não tem garimpo Mas tem o que encontrar Nossa riqueza está no lago Nosso gostoso tamuatá Santa Cruz terra querida Foi Deus que te fez brilhar Todos nós temos orgulho De sermos deste lugar Falaremos de tua beleza Que está em todo lugar Falarei sempre de ti Pois sempre irei te amar O sol nascente nas manhãs Que dá vida para ti Nesse lindo horizonte Retrata o Lago Arari A lua é companheira Que chega até encantar Ilumina Lago Arari E suas águas fazem brilhar

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Maria José Barros de Almeida

SANTA CRUZ LINDA E FACEIRA

Santa Cruz linda e faceira Berço de muitos amores És a cidade mais bela Com este lago multicores Santa Cruz linda e faceira Cheia de amor e unção És para o poeta Motivo de sedução As riquezas que teu solo produz É o que nos seduz Quero-te tanto bem Minha querida Santa Cruz

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MINHA TERRA

Jurandir elogiou sua terra E tem toda razão Santa Cruz é mais bonita Em minha opinião Santa Cruz terra querida Rica de natureza É só prestar atenção Que você vê a beleza Santa Cruz do Arari Cidade de encantos mil Minha querida cidade Neste imenso Brasil Santa Cruz eu peço a Deus Para te abençoar E proteja todas as pessoas Aqui deste lugar Jurandir cantou sua terra Pois motivo ele tinha E eu canto Santa Cruz Porque essa cidade é minha

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Maria José Barros de Almeida

MINHA MÃE ROSA MEU PORTO SEGURO

Mãe, foi pensando em ti Que me veio a inspiração Te fiz esta poesia Pela tua dedicação Hoje quero apenas Mostrar o teu valor Te dizer muito obrigado Por tudo que me ensinou Estás sempre presente Em todo meu caminho Sempre me apoiaste Com palavras de carinho Me ensinaste que na vida É preciso humildade Pois para vencer Tem que ter honestidade Quero pedir a Deus Em minha oração Que te dê saúde, alegria E paz no teu coração

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PRA SEMPRE TE AMAR

Antes de te encontrar Eu não sabia direito Qual o valor da vida E se o mundo era perfeito Quando te encontrei Encontrei também a razão Descobri que a vida Tem muito mais emoção Agora ao seu lado Eu sempre quero estar Te dar muito carinho E para sempre te amar Portanto quando partires Continuo te lembrando Que aqui existe alguém Que está te esperando Fiz esta poesia Para você não esquecer Que morrer perto de ti é mais fácil Do que viver longe de você

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Maria José Barros de Almeida

PARA ANDERSON E BÁRBARA

Juro que procurei Uma palavra para definir Todo o sentimento Que eu tenho por ti Quero pedir a Deus Nessa minha homenagem Que lhes dê: saúde, alegria E muitas felicidades Nesta minha homenagem Também quero dizer A grande admiração Que tenho por você A palavra que eu procurava Sem querer hoje eu achei Mas não foi no dicionário Foi dentro de mim que encontrei

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SUA FÉ A distância pode separar dois corpos Jamais um sentimento Por isso estás presente Em todos os meus momentos Na vida só existe Um grande querer Faço qualquer coisa Para estar junto a você Se todos os meus sonhos se realizassem Você seria um presente Em minha história de amor Você estaria para sempre Você é o agora é o sempre É o hoje é o amanhã Você é a força presente É por isso que sou sua fã

2° DOMINGO DE MAIO Neste 2° domingo de maio Homenageamos uma mulher Que pelo seu amor O nosso bem ela quer Pela sua paciência E sua dedicação Não esquece nem um dia Dos filhos em oração Sua dedicação é tanta

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Maria José Barros de Almeida

Que chega até encantar É capaz de qualquer coisa Para os filhos salvar Ela é muito sábia É uma pessoa importante Vamos valorizar Essa pessoa brilhante O que sentimos por ela Não é só gratidão É amor, é carinho É uma grande paixão Tens a bravura De um grande leão Defende os filhos Da ingratidão Hoje tudo o que somos Devemos tudo a você És a nossa rainha És o nosso bem querer Portanto minha rainha Obrigado pela boa criação Aceite minha homenagem Que é de todo coração Hoje eu peço a Deus Que ilumine teu caminho Para que tenhas muita saúde Amor e muito carinho Mãe, mulher querida É de ti que estamos falando Pelo teu grande dia Estamos te homenageando www.cpoema.org

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Maria Justina de Farias Sabóia dos Santos

É Bacharel em Turismo pela UFPA e Especialista em Planejamento e Administração do Turismo pela Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco. Natural de Salinópolis-PA, mãe de Ana Luiza e Yago Lucas, escreve poemas e letras para músicas desde os 17 anos de idade, sob o pseudônimo Lara Lhys. Tem como frases prediletas: “Se não posso ajudar, também não atrapalho” e “A liberdade é um olhar”. Gosta de música e literatura, e também de viajar; e tem como primeiro amor Jesus Cristo, depois seus filhos.

O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.

Salmos, 30;5.

Agradeço à minha família, principalmente aoYago, à Ana Luíza e ao Fabinho, que me incentivam a escrever e servem-me de fonte de inspiração. À minha mãe Lauzita, à minha irmã Carmem Lúcia e à minha grande amiga Ilma.


Maria Justina Sabóia

OUTRA VEZ

Lara Lhys

Tudo tão novo... tudo tão velho... tudo outra vez... e eu fingindo não perceber seus motivos para ficar junto a mim por medo da conhecida desilusão preferi a solidão... da alma do coração da insolente madrugada insone e me vem esta paixão pra você atos singelos pra mim momentos únicos, belos num encontrar de olhos mil palavras voam ao encontro de teu coração tão complexo... o despertar de sentimentos adormecidos em minh’alma de mulher tão sem nexo... o querer ter boca vermelho carmim pele de seda e marfim gestos ousados falas delicadas encantos de sereias ceias com mesas ao luar e orquestras a cantar imagino teu rosto encostado ao meu e sinto pétalas de rosas caírem em forma de lágrimas quentes, ardentes... então adormeço docemente para sonhar com você...outra vez

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A FILHA DO SOL Para Ana Luiza, princesa amada que alegra meu viver.

Nana morena, bela, faceira pedaço do meu amor prazer de te ver sempre brejeira tua voz macia, como pétala de flor sempre a espantar a dor te pressinto menina na minha canção que vem do meu coração o porte altivo de filha do sol de rosa menina, de meigo aconchego das lembranças passadas na antiga morada das luzes que brilham no grande farol te vejo, menina, da fada a beleza da árvore altaneira, a graciosa leveza do sonho de moça, da garça a graça dos olhos risonhos do encanto festivo dos amantes dos sonhos da beira dos rios dos bosques sombrios das grandes paixões da lua o mistério do mar a esperança dos mitos a lembrança.

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Maria Justina Sabóia

IMENSO SENTIMENTO

Na imensidão de minha alma tem um gato que faz miau um grilo que faz cricri e um luar que me faz lembrar de ti tem o gosto de teu beijo a saudade de teu desejo tem momentos sofridos sonhos interrompidos e corações partidos tem fogueiras ao luar canções a beira-mar fantasias no ar tem tristezas inexplicáveis amores inconfessáveis e certezas imponderáveis tem vergonhas a esconder medo de ofender riscos para se correr tem nariz a ser quebrado pudor desmantelado e segredos escancarados tem razão desconhecida marcas de outras vidas lembranças queridas tem sentimento vagando amores passando angústias rondando e tem o meu amor te chamando meu sono te sonhando e meu olhar te procurando.

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ILHA MARAVILHA Mara bela, mara ilha, maravilha barreira do mar Arquipélago encantado onde a biodiversidade escolheu morar Respaldas tuas lendas e mitos na magia de teus antepassados Aguas, beleza natural, verde imensidão, cria em nós imensa paixão Jeito de menina-morena, serena na quietude de teu branco leito de areia Orgulho de ser ilhéu, verdes matas, teus guarás avermelham o céu Indios, negros, portugueses, legaram a tua raça, orgulho, graça e beleza Lua cheia de doces aromas ilumina os sonhos da morena de olhos de mel Habitat dos maguaris, caranguejos e siris, mundo das águas, poente sol, pequeno farol, esplendor paracauary Amor de imensidão que vem do coração da mulata faceira nos círios da padroeira Mulher caprichosa quando tuas águas mandam em todos nós A falta de tecnologia supera-se em alegrias, hospitalidade, charme e melodia Respeitar costumes e tradições, fomentar tua cultura, entender teus amores, são parte de teus valores Amante do sol, filha das águas, nas rimas do carimbó, olhos rasos d’água cor do mar, matas verdes, sonhos ao luar Valente boi-tenente, paciente-displicente, é o búfalo corredor o símbolo do Marajó Imaginário ser, habitante das águas, é o boto, sinhá, que vem namorar Lacaio ferrava gado, fazendeiro corria mundo, Preto Juvêncio todo prosa, pés descalços, roubava corações com a chula marajoara Há aqui tantas estórias, Boaventura, Curupira, mãe-d’água “diz que” linda, pavulagem e caprichosa Antes de ti, o que era aqui? Terras altas, mapinguaris, piracema, aruãs, maruanazes... orgulho é ser parte de ti

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Maria Justina Sabóia

MARAJÓ CURUMIM Para Yago Lucas, o beija-flor que alegra minha vida

No negro de teus olhos mistério, sedução no encanto de teus olhos o sol, a lua, a paixão um arco-íris que alegra o céu e a chuva cai em gotas de mel na ternura de teus olhos o orvalho da manhã e o canto da passarada no negro de teus olhos tem o remanso do paracauary tem o cheiro do patchoulli ah! esse teu olhar fala por ti na ternura de teus olhos o sol, a lua, a paixão és anjo, és duende mistério, sedução no encanto de teus olhos a maresia do mar o orvalho da manhã e a leveza do ar marajó curumim estão em teu olhar.

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MARAJÓ EM CANTO

Dourado sol do Marajó aquece o imenso coração do rio-mar e deixa tua saudade perfumando o ar No beija-flor que povoa a natureza meu pensamento atravessa o paracauary e voa livre para perto de ti no bailado atrapalhado do tralhoto encontro distração para minha solidão corre correnteza vai buscar quem me amou e leva esta saudade que ficou cintilante espelho d’água são narcisos dos sorrisos do encantador boto namorador o redondo vermelho sol beija o pequeno farol e some prenhe de minha paixão-solidão sombras azul-lilases do anoitecer desenham nuvens de papel lembrando teus olhos de mel natureza de grande beleza um nó perfeito aperta o peito e uma lágrima cristalina vem saudar o pôr-do-sol e molhar o meu olhar noite-solidão maltrata o coração e vem fechar com calma as cortinas de minh’alma

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Maria Justina Sabóia

LÁGRIMAS DE UM RIO

Hoje eu vi um rio um rio que gritava socorro parecia que estava com frio chovia mansamente em suas margens essa chuva se confundia com lágrimas que caiam olhei melhor e vi que as lágrimas eram mensagens: por favor, não joguem lixo em meu leito assim esmagam meu peito que já respira cansado de tanto ser maltratado

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COTIDIANO

Triste sina dos viajantes solitários que buscam companhias até em templos e campanários dos que estão distantes de seus amores pois só lhes resta chorar as dores triste sina dos que não enxergam a situação do povo e só pensam em correr atrás do novo dos mal amados com seus destinos mal fadados triste sina dos infelizes e dos amores das meretrizes dos incapazes com suas falácias mordazes dos meninos de rua, que comem até restos de carne crua dos amantes da lua, sempre em busca das fases suas triste sina do proletariado, obrigado a se virar sem erário dos sem maldade, que não percebem as sutilezas da crueldade dos que esperam, sempre a sonhar chegadas e mistérios dos que choram as dores do povo pois sabem que a vida será sempre um recomeçar de novo triste sina dos enamorados, que não sabem viver separados dos trabalhadores, sem o reconhecimento de seus valores dos excluídos, que jamais serão ouvidos dos poetas, com suas almas irrequietas de nossas riquezas, arrancadas de nosso solo nos deixam maior pobreza triste sina, dos que não têm seus direitos respeitados e são como objetos descartados das fantasias, de quem pensa em melhorar o mundo através das poesias

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Maria Justina Sabóia

AMOR CIGANO

Te vejo te sinto te penso sozinho te busco te espero te quero carinho te sonho me imponho no teu caminho te deixo lembranças e não te dou esperança sou o teu desatino e fiz reserva no teu destino te julgo saudade sou tua maldade sou flor, sou amor, sou teu despudor sou anjo caído de um céu de estrelas florido e te deixo zangado e te deixo sofrido sou tua chuva fina que cai de mansinho beijando teu corpo cigano sou tua paz, sou capaz de tornar-te eterno

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de virar teu inferno sou pureza sou dor sou ternura sou amor sou espírito aventureiro e te quero maneiro sou teu sonho e sou teu pesadelo e sou tua lua quando estou nua sou noite estrelada trocando afagos na madrugada sou teu pranto calado e teu encanto presente mas não te dou explicação para esta explosão de tanta paixão te deixo confuso te faço entrar em parafuso e te quero mundano só para ter o gostinho de domar o teu amor cigano.

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Max Barbosa Gomes

Nasceu em Cachoeira do Arari, Marajó, Pará, no dia 20 de março de l972. Filho de Benedito Gomes, vaqueiro, e de Valéria da Conceição Barbosa, dona de casa. Estudou em escolas públicas do seu município. É Licenciado Pleno em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará. Ocupa as funções de Coordenador Pedagógico das escolas municipais e é Técnico da Rede Estadual de Ensino.

Ao meu Deus, Jeová. Aos meus pais: Benedito Gomes (falecido) e Valéria da Conceição Barbosa. À Prefeitura Municipal de Cachoeira do Arari. (Secretaria de Educação, Cultura, Desporto e Turismo).


Max Barbosa Gomes

MARAJÓ

Nos encontros pesqueiros; Nas boiadas vaqueiras; Nas águas trincheiras; Nos campos matreiros.

Vacas leiteiras... Leite abundante. Trabalho no campo, No sol chispeante.

É madrugada...

Vaqueiro...

No casco o pescador Conserva sua tradição Bate o caniço n’água Para dos peixes Chamar atenção.

Cavalo arreado Com ele montado. Na garupa a corda... Animal estimado.

Ou então... Tarrafas e redes Nos rios a se estender, Nos pontos de peixes Conhecidos pelo Seu talento e saber. É madrugada...

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Chapéu de carnaúba; Muxinga e baeta, Rédeas na mão e, No seu cinturão, Repousa atento Seu amigo, o facão. Águas barrentas, Do rio, do lago e do igapó. Preservada flora... Ilha esquecida... Desperta Marajó!

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PEDAÇO DA AMAZÔNIA Pedaço da Amazônia Onde vejo O caboclo nativo Subir num açaizeiro. Pedaço da Amazônia Onde se assemelha O seringueiro amazônico Com o marajoara roceiro. Onde se depara O fazendeiro explorador E o vaqueiro trabalhador Explorado, que alegre e animado Ergue o laço: Dizendo “eia” pro gado. O pescador conhecedor Dos furos e lagos, Em que o cigarro É bom companheiro; O carapanã seu despertador; As estrelas suas guias; A tarrafa, a rede, o anzol, Seus meios de sobrevivência. Onde com alegria Encara a dor. Homem marajoara matreiro, Onde os mitos e lendas São seu folclore, Onde a morena cabocla É seu fogo amoroso Nas horas prazerosas de gozo. Onde o artesanato revela Sua herança indígena. Pedaço da Amazônia, onde vejo, A marajoara mãe acalentar o menino Cantando uma cantiga.

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Max Barbosa Gomes

EXALTAÇÃO

Ah! Como é bela minha terra! Tão poucas terras hei de exaltar. Exclamar aos ventos, aos mares, Da terra a qual em seu seio Tem-me a guardar. A menina tímida dos meus olhos Que em seus laços me ampara. A tapuia dos meus sonhos Guardando-me, me protegendo, Nas noites agitadas de farra. Ah! Como é bela minha terra! Terra da Conceição, Do pau-do-santo, da romaria, Do Glorioso São Sebastião. Ah! Como a noite é bela em minha terra. Nas noitadas de fim de ano, Nas festanças de junho, No roubo da donzela. E a observar assombras, As poucas vidas noturnas, Atenta, está fofoqueira na janela. As velas à Senhora das Candeias Que vão queimando devagar, No bater do vento calmo e lento Igual a vida pacata que impera, Fazendo-me exaltar com ternura: Ah! Como é bela minha terra!

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MADRUGADA CACHOEIRENSE

Madrugada cachoeirense. Um silêncio que grita, A calmaria. Cortado pelo cantar de um galo, Pelo ronco de um motor. Madrugada cachoeirense. Um cheque-cheque De alguém no calçadão, Cachorros sem donos Vagando nas ruas. As poucas luzes Retratam um ar de solidão. O longe progresso Retrata uma vida de prisão. E os meus versos? Ah! Os meus versos! Se pudessem salvar... Dar um colorido todo especial A essa paz sem colorido Das madrugadas cachoeirenses.

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Max Barbosa Gomes

LUCIDEZ

A poesia... Que derreteu tantos corações; Que despertou tantas ambições; Que já feriu tantas reputações... Parece que todo poeta é louco Pelo amor ou pelo ódio, Faz do seu mundo um sonho, Do espaço a eternidade, Às vezes é covarde Por não viver a vontade. A loucura do poeta Nem sempre se interpreta, Seus olhos são sempre alerta E de suas mãos brota, Que nem todos podem ver; Um jogo de cartas abertas. Ah! A loucura do poeta? É ver na escuridão uma luz, É comunicar no medo O seu segredo, seu pejo, Seu sentimento abafado. Na voraz vida que vive, Viver seu sonho sonhado. Parece que todo poeta é louco. A loucura do poeta? Ah! A loucura do poeta... Por não viver a vontade, Que nem todos podem ver, Na voraz vida que vive Escreve pra poder ser. www.cpoema.org

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O LOUCO O louco está às soltas Nas ruas, festas e bares, Nas casas e no Planalto, Na cadeia e no Judiciário.

Roubando, matando e prendendo. Casando e esperando; Rindo e também chorando. O louco está solto E também se suicida, Sonha, ama e odeia a vida. Porém ao nascer já estava morto.

O louco está às soltas Nas escolas, no mar e no ar. Reza, canta e dança, Vota e se faz votar. O louco está às soltas

EU E MEU São coisas Que mexem comigo: Caminhos às beiras de cercas, Uma casinha lá fora Numa imensidão de campo... São esses meus encantos. Desencantos para alguns, Mas... São coisas Que mexem comigo E não vejo nenhum perigo Gostar de quintais cheios De xerimbabos diversos, Por isso escrevo tais versos... Tão banais para alguns, Contudo... São coisas

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Que mexem comigo, Não me importo com isso. Numa casinha de pau-a-pique Às vezes quero morar Sem do que me preocupar... São coisas que preocupam alguns, No entanto... São coisas Que mexem comigo. Caipira... Assim dizem outros Por eu pensar assim Ser eu e meu E nunca acanhado D’eu ser um sonhador E meu, meu sonho sonhado.

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Max Barbosa Gomes

PAZ E TRISTEZA

O silêncio, Quebrado apenas Pelo barulho Das águas na praia. Uma vida pacata Como se não Existissem problemas. Meninos numa carroça Sem camisas, pés no chão. Vida de caranguejeiro, Vida de pescador, De tristeza e paz, De alegria e dor. A tarde sombria. O vento o frio Faziam lembrar-me Da minha terrinha. Paz e tristeza, Recordações minhas. Paz e tristeza, Recordações minhas Do final de Soure Naquela tardinha.

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I Antologia Literária do Marajó

VINTE DE MARÇO

Na segunda-feira Sem eira nem beira, Cheguei a este mundo. Não tinha cobiça, Egoísmo, preguiça. Na segunda-feira. Sem eira nem beira. No vinte de março De glória ou fracasso, Não tinha saudade, Ilusão ou paixão. No vinte de março. De glória ou fracasso. Na madrugada Sem hora marcada, Não tinha compromisso, Nem ponto de chegada. Na madrugada. Sem hora marcada.

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Na segunda-feira, No vinte de março. Na madrugada Sem eira nem beira. De glória ou fracasso, Sem hora marcada, Cheguei a este mundo. Não tinha compromisso, Nem ponto de chegada. Não tinha preguiça, Egoísmo cobiça. Não tinha saudade, Ilusão ou paixão. Cheguei a este mundo, Na madrugada Sem hora marcada; No vinte de março, De glória ou fracasso; Na segunda-feira Sem eira nem beira.

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Max Barbosa Gomes

O PROBLEMA

O problema Não é perceber, É sentir. Não é calar, É falar. Não é ver, É fazer. Não é dormir, É acordar. O problema É enfrentar, Não fugir. É mostrar, Não guardar. É tentar, Não querer. É realizar, Não sonhar. O problema É criá-lo sempre; É ficar no dilema; Não satisfazer acena; Não cair na realidade; É ficar só na saudade De viver o problema.

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Mestre Tomaz

Eu sou Tomaz Barbosa da Cruz nascido em 28 de Janeiro de 1929, filho de Messias Gonçalves da Cruz e Joana Barbosa da Cruz, natural da cidade de Soure – Ilha do Marajó. O meu primeiro trabalho foi a pescaria até os 12 anos. Aos 14 anos trabalhei como ajudante de carpintaria do Mestre Aranha e, aos 18 por tornar-me arrimo da família, voltei a trabalhar na extração do caranguejo e pesca. Cursei somente até a segunda série primária incompleta. Mestre Tomaz poeta e repentista é autodidata procuro sempre resgatar em minhas obras a cultura da minha região, coisa que já estava no esquecimento dos meus conterrâneos. Em outros momentos procuro levar às pessoas o conhecimento das belezas que existe em nossa região marajoara. Hoje tenho quatro livros publicados em minha cidade de origem, sou conhecido internacionalmente devido aos documentários feitos por emissoras de televisões estrangeiras com a minha participação. Obras: Poesia: Verso em Rima de Prosa (1992); Conto: O Valente Viléla – Conto em Versos (1994); Prosa: Marajó e suas histórias (Vol. 1, 1998); Marajó e suas histórias (Vol. 2, 2002). Agradecimentos especiais: À minha esposa Iraci Brito de Cruz Aos meus filhos e genros: Dr. Ademir Barbosa da Cruz; Sra. Lucidalva Barbosa da Cruz; Sub-Ten. Alberto Barbosa da Cruz; Sr. Adailton Barbosa da Cruz; Sr. Alfredo Barbosa da Cruz; Sr. Adjalma Barbosa da Cruz; Sra. Lucilene Barbosa da Cruz; Profª Lucideia Barbosa da Cruz; Sr. Moises Trindade; Prof. Antenor Pereira Barbosa. Aos Professores das Escolas Gasparino e Edda e a todos os alunos. E em particular ao meu Amigo Coronel Alacid da Silva Nunes, mãos amigas de Soure. E à Pousada dos Guarás.


Mestre Tomaz

HISTÓRIAS E LENDAS

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PRETINHO DA BACABEIRA Há tempos passados aparecia um menino bem escurinho, que o povo chamava Pretinho da Bacabeira, por haver duas árvores de bacabeira no lugar onde ele aparecia, na Terceira Rua com a Travessa 18. Nas proximidades existiam também uma mangueira e duas seringueiras, local que era o porto dos pescadores.Uma noite passou no local um cidadão de prenome Teodoro, cujo apelido era “dois cano”, vendo o menino no meio da rua, próximos às bacabeiras, disse: moleque não é hora de estar na rua, e o menino responde: – Estou esperando um homem para ajudar a empurrar uma canoa, então Teodoro disse ao menino: – Eu ajudo homem porque eu não posso ajudar um moleque. Quando os dois chegaram à beira do rio, não tinha nenhuma canoa. Foi quando Teodoro se aborreceu e correu para cima do moleque para o agredir. Se deu mal. O moleque aplicou-lhe chutes e tapas e Teodoro chegou a pedir para que o garoto parasse de bater, que inclusive o moleque teve de ajudar o Teodoro a subir do barranco até a rua. Outros também sofreram nas mãos do Pretinho da Bacabeira, mas ele ajudou a muita gente, como, por exemplo, quando a pessoa estava com medo, ele ia junto até as proximidades da residência. Só fazia mal a quem lhe fazia mal.

A CARROCINHA Na cidade de Soure, ouve-se falar em uma carrocinha de ossos. A população comenta que o aparecido é geralmente por volta da meianoite, quando se ouve um barulho como se fosse um carregamento de ossos. Quando a carrocinha chegava em um determinado ponto da cidade, parecia desabar e escutava-se a ossada espalhar-se pelo chão.

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O VAQUEIRO BOAVENTURA Nos Campos do Marajó aparecia um vaqueiro de nome Boaventura, vagando entre as matas e os tesos. Segundo o dito popular, Boaventura era um encantado e conhecido pelo povo dessa região como vaqueiro de “Piratuba”, por ter aparecido no lugar com esta denominação na Fazenda São José.

MÃE DE FOGO Nos Campos do Marajó existe a “Mãe de Fogo”. É algo que a pessoa vê como se estivesse caindo brasas acesas de cima de uma árvore. A pessoa vai na tentativa de ver a coisa de perto, porém, nunca chega na árvore, apesar de estar vendo a claridade, por sinal, muitas pessoas já se perderam tentando chegar ao local. Ainda nos Campos do Marajó, como exemplo nas Fazendas Laranjeira e Desterro, e no Retiro Mamão, o sinal no Mamão tem uma ilha conhecida como “Ilha do Meio”, onde existe um bezerro todo mole, parece que acabara de nascer. O bezerro não é perigoso se você passar no seu caminho normalmente, tudo bem; mas, se a pessoa tentar pegar ou fazer qualquer outra coisa, se o vaqueiro tiver montado, fatalmente vai parar no chão, pois o bezerro vira um monstro. Ainda têm muitas coisas aparecendo nos Campos do Marajó, não é possível contar tudo agora.

A VERDADEIRA HISTÓRIA DO LOBISOMEM Aqui na cidade de Soure, localizada na nossa grande Ilha do Marajó, apareciam coisas estranhas contadas pelos meus avós, algumas delas eu ainda alcancei, como, por exemplo, o aparecimento do Lobisomem, que, para amedrontar as pessoas e fazer o mal, se transformava em animais como cachorro, porco, cavalo e outros. Eram pessoas que, pela força diabólica, conseguiam tais façanhas, ou seja, eram chamadas de feiticeiras, que, por meio de orações malignas também se transformavam em Matinta-Perera. Por sinal, o poder era tanto, que a

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Matinta-Perera chegava até a voar sobre as pessoas. Confesso que eu não acreditava, mas eu, conversando e lendo, cheguei à conclusão que era verdade. A Matinta-Perera atacava os vaqueiros nos grandes campos das fazendas do Marajó e chegava a ferir alguns, já que os atacava com suas garras e suas grandes asas. A gente, montado ou a pé, sentia quando ela passava por cima de suas cabeças, pois era fácil ouvir o barulho das asas e os seus apitos. Há quem diga que a Matinta-Perera passa por sete cidades em uma noite. Assim como as que não voam, os seus trajes são casacos e saias em preto e branco, cabeça amarrada com um pano e grande cutelo nas mãos, prontas para cometer o mal. O horário do meu trabalho fazia com que eu saísse a qualquer hora da noite e, por diversas vezes, me deparei com algo semelhante. Se era a Matinta-Perera, eu não sei, só sei que era alguma coisa anormal. Nas minhas andanças sempre me preparei antes de sair de casa, já que sempre faço e oriento todos a rezarem um Pai-Nosso, pois o Satanás pode até aparecer, mas jamais vai tocar ou fazer o mal a você. Se o Satanás aparecer, por Jesus Cristo, não tentará algo anormal contra nós. Os feiticeiros existem como os curandeiros. Deus deixou de tudo no mundo e, se ainda faltasse alguma coisa, é evidentemente que o mundo não estaria completo. Um amigo meu me contou que ele tinha um colega que virava bicho. Um dia disse ao tal colega: — Me ensina a fazer o que fazes, se quiseres, é claro. — O colega de imediato respondeu: — Tudo bem, só é preciso fazer o que eu vou te ensinar: durante três sextas-feiras, quando o relógio apontar zero hora, ou seja, meia-noite, vai até um lugar esmo (mato), e lá verás um cavalo, deite de lado dizendo as palavras encabelaencabela,ou seja, pedir para o seu corpo ficar cheio de cabelo. Na primeira noite, ele não sentiu e nem viu nada. Voltou ao colega e disse que nada sentiu. Logo o amigo disse: — Não te preocupa, são três vezes. — Na segunda sexta-feira, chegou onde o cavalo rolou, tirou novamente as roupas e deitou-se rolando e dizendo encabelaencabela. Foi quando viu que o corpo apresentou algo diferente, passou a mão na barriga e sentiu a presença de cabelos. E, com medo do que estava acontecendo, correu gritando desencabela-desencabela! Assim de imediato começou a rezar um Pai-Nosso, ofereceu a todos os santos e voltou ao normal. Não deixou nem amanhecer o dia e foi à casa do amigo, para quem contou tudo o que viu e sentiu. Nunca mais quis falar a palavra encabela. www.cpoema.org

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Hoje algumas pessoas me perguntam por que essas coisas não aparecem mais e respondo que naquele tempo as únicas ruas que existiam limpas eram a Oitava e algumas travessas até a Vinte. Os bairros Matinha, Pacoval, Umirizal, Macaxeira e o Bairro Novo não existiam. Pra chegar de casa a outra era através de caminho,sendo que cada casa ficava distante uma da outra.Não tinha luz elétrica; a usina funcionava à lenha e a iluminação era até a Quarta Rua, o restante era à base de lamparinas e lampiões a querosene.Hoje com o progresso está tudo claro, como pode aparecer,pois a população cresce e tudo tem o seu tempo. A história de virar bicho aconteceu com outras pessoas na região do Marajó, contadas por pessoas direitas e honestas, era possível acreditar nelas.

O FANTASMA Eu trabalhei em uma fazenda que para chegar na casa, tinha que andar aproximadamente uns sessenta metros do leito do rio. Lá também aparecia um fantasma. Como o lugar tinha muita lama, tivemos de construir uma ponte. Em um belo dia uma moradora da casa da fazenda e seus filhos viram um homem na referida ponte por mim construída. Como não tinha nenhuma embarcação atracada no porto e os trabalhadores da casa estavam no campo, ficou com muito medo. Apesar da casa ser muito grande, ficaram todos só em um quarto, agasalharam-se e não se preocuparam, já que na casa grande tinha equipamentos para currais de peixes e outros. Às vinte e uma horas, começou a festa (barulho), caíam panelas, pote, cadeiras, quebravam pratos e o barulho era forte no assoalho. Junto com as crianças a mulher passou a rezar e, como já era de madrugada o galo cantou três vezes e o barulho parou. Assim passou o medo da família. Quando o dia amanheceu a mulher abriu aporta do quarto, saindo para verificar os danos, e se surpreendeu, pois estava tudo arrumado na casa. Os demais moradores começaram a chegar do campo e ela lhes contou, mas eles não acreditaram. Em uma outra noite, a canoa que deixava o rancho na fazenda ao atracar na mesma ponte, um dos tripulantes avistou um homem, jogou a corda para que este à amarasse na cabeça do esteio. Para a surpresa

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da tripulação, viram que não estavam atracando; a canoa estava indo na correnteza e, quando estavam bem distantes da ponte, não viram mais ninguém. Ficaram com medo, mas, mesmo assim, com uma vara, empurram a embarcação até encostar na ponte, já que, naquela época, as canoas não tinham motores, pois eram a velas e remos. Quando a tripulação contou para as outras pessoas, alguns acharam que eram bobagem e mentira. Nos Campos do Marajó ainda hoje existem coisas que só quem viu sabe da real situação.

AS CIDADES DO MARAJÓ E SUAS TRADIÇÕES Na cidade de Soure, o primeiro cartão postal é o muro de arrimo, além da bela vista, está escrito “Seja bem-vindo a Soure, a Pérola do Marajó”. Soure é banhada pela baía do Marajó e tem belas praias: a praia do Pesqueiro, com tradições pelas belezas ecológicas, já que nas proximidades existem manguezais, igarapés, dunas de areia, etc. Na parte cultural a praia do Pesqueiro, nos meses de junho e julho, tem inúmeras apresentações como: boi-bumbá, dança de carimbó, corrida de crianças em sacos, luta marajoara e ainda desfile de moças bonitas, participando do concurso miss veraneio. Os eventos prosseguem nas praias da Barra Velha, Mata Fome e Garrote. Também são lindas as praias da cidade de Salvaterra, como a praia Grande e Santa Marta, e, se andarmos nos povoados e vilas de Salvaterra, vamos encontrar diversas coisas lindas, como por exemplo: as praias de Joanes e Jumbim e outras banhadas pela Baía do Marajó. Marajó, com sua beleza e o poder econômico não tanto explorado, atrae turistas de várias cidades brasileiras como também de muitos países. As belazas noturnas aliadas à infra-estrutura básica geradas pelas administrações municipais colaboram para receber bem os turistas. A cidade de Soure dispõe de praças, clubes, espaços culturais, igrejas, galerias de arte, orla fluvial, belas praias, além de aventuras como passeios pela Baía do Marajó e nos rios entre as ilhas...

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REAÇÃO CLUBE Em 1925, fundou-se o Reação Clube em Soure. Hoje com sua sede social e seu estádio de futebol, mantém sua tradição com seu baile social há quase trinta anos, o baile das debutantes, no qual é obrigatório o traje social. No dia 7 de setembro, é realizado o aniversário do Clube, quando é oferecida uma festa aos seus sócios, diretores e atletas. Na parte esportiva, o clube foi quem mais conquistou títulos municipais e tem um dos melhores jogadores do Estado do Pará. Tratase de JANGO, que foi do Reação Clube para o Clube do Remo, onde conquistou alguns títulos. Em seguida, o jogador foi vendido para o Santa Cruz de Recife. Era conhecido como Mestre Jango, por ser o 1° jogador vendido para outro estado. Também o jogador CONEGAS que pertencia ao Reação, defendeu por vários anos o Clube do Remo. Além de outros craques como POEIRA e BERECO, que defenderam a Tuna Luso Brasileira. Na década de 60 tivemos uma geração vitoriosa no Clube, como: Eduardo, Evane, Ari, Folião, Xavier, Rosemir, Simão, Eurico, Jamico, Moacir, Bidoga, Carlitinho e Baxote. Agora, por trás de tudo isso, tivemos um dos maiores desportistas do Marajó: CARLOS DE SOUZA GONÇALVES, o conhecido CARLOS BIÁ, já falecido, que deixou muita saudade, tanto na parte esportiva como na parte social. Hoje o Reação conta com o apoio do Sr, Davi Martins de Paula, que é o grande benemérito do Clube, dando-se o direito de ser o presidente do Clube com maior idade: 92 anos e com mais de 60 anos dedicados ao Reação Clube. O último título que conquistou foi em 2004. De lá pra cá não houve mais campeonato. Através do apoio do Sr. Davi de Paula e da coordenação do exatleta do Clube: CÉLIO PIMENTEL, criou-se a Escolinha de Futebol CARLOS BIÁ, com Estatuto e CNPJ, que participou do Campeonato Paraense Intermunicipal, Categoria Sub-17, conquistando o título inédito para Soure. Os atletas foram: Miguel, Dinamérico, Oberdan, Anilson, Patiara, Renan, Arian, Levi, Anderson, Dione Leal, Marcelo, Dionizinho, Dengo, Cate, Gordo e Willas; técnico: Bigú; coordenador: Célio Pimentel e assistente social: Sueli.

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VERSO EM RIMA DE PROSA

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Soure cidade querida cidade de grande valor aqui o vento sopra bem por isso não sentimos calor O povo da cidade é maravilhoso é humilde, honesto, alegre e trabalhador quem vem conhecer a cidade é recebido com paz, carinho e amor. O folclore daqui é completo assim dizia minha avó Soure tu foste o inventor da música, dança, dança do carimbo! Tu és a cidade mais bela da grande Ilha do Marajó na Ilha do Marajó tudo tem tatu, marreca e guará e a belíssima capivara.

Lutasse com o gado bravo com corda e até mesmo com vara mais é bonito mostrar a cultura Marajoara.

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DIA DAS MÃES

Hoje é o dia mais importante, de todos que pra nós Deus criou entre outros este é maravilhoso porque eu vou dizer o seu valor quem tem sua mãe em seus braços é abençoado com paz, carinho e amor. É assim que a gente vê a beleza é a mas pura de todas as realidades e daí que veremos o amor da família, junto com a sua mamãe a nossa tranqüilidade. é assim que Deus nos abençoa com paz, carinho e felicidade. Você estando junto com sua mamãe jamais errará o longo caminho, porque é acompanhado com Deus por isso nunca estará sozinho. Seja a estrada limpa ou cerrada, você nunca encontrará espinho porque sua mãe está lhe cobrindo com alegria, amor e carinho.

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O TOCO

Aqui no rio passa um toco na água de lua cheia, a pessoa que vê ele logo se receia fica pensando consigo aí vem coisa feia. Quando este toco passa que alguma pessoa vê pergunta a si mesma quem será que vai morrer isso é verdade e pode acontecer E fica pedindo a todos que tenha muito cuidado falando e explicando, não pode ficar calado, na certa é que morre uma pessoa afogada. Isso vem de muito tempo não começou agora, fica na expectativa esperando qualquer hora, passe o que passa e às vezes nem demora.

setenta centímetros mais ou menos uns acham que é grande outros dizem que é pequeno, mas algumas pessoas dizem este toco é veneno Mas meus amigos vejam que isso é caso sério não é pedindo que aconteça nada disso eu quero mas que na certa vai um para o cemitério. Meio metro ele tem fora d’agua de grossura é roliço e bem redondo não parece cintura quando ele passa é na certa é um para a sepultura. Meus amigos eu não sei como isso acontece é uma coisa de superstição, mas povo não esquece nem bem a gente pensa o danado do toco aparece.

Quem não sabe veja bem e pode prestar atenção, ele passa e nem precisa de abalo de trovão ele vem em pé parece que está no chão Eu passei perto dele e calculei www.cpoema.org

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Otávio da Silva Nascimento Jr.

Popularmente conhecido como NIC Jr., é filho de Otávio Nascimento e Maria Pinheiro. Nasceu em Belém do Pará, no dia 07 de setembro de 1986. Aos cinco dias de nascido veio para Soure, onde cresceu, estuda e vive. Descobriu-se como poeta após a leitura da narrativa “O circo chegou”, texto integrante de um livro de 4ª série do ensino fundamental. Atualmente, cursa Letras – UFPA e Matemática – UEPA. É membro fundador do CPOEMA. Compõe sonetos, odes, baladas e trovas. Uma pessoa que se pauta pelo dinamismo, pela justiça, pela coragem. Companheiro, está sempre sensível às questões sociais (das pessoas), em particular, das pessoas com as quais convive.

Fazer parte desta coletânea é uma benção especial que Deus me privilegia. Sem a presença Divina em minha vida, nada disso estaria acontecendo. Obrigado Divino Pai por ser teu filho. Filho que recebeu educação, amor e carinho de Otávio e Maria Antônia e a convivência fraterna com meus irmãos. A minha instrução foi se estruturando a partir da vivência prazerosa que passei em minhas escolas. Assim, obrigado Santana de Tucumanduba, Instituto Stella Maris, Escola Edda, UFPA e UEPA pelos ensinamentos, de modo particular, aos professores que acreditaram em mim e me incentivaram a escrever. A minha musa inspiradora merece também um obrigado em forma de beijo, sem o apoio de Meiriane talvez o sonho não fosse concretizado. Amigos e leitores, obrigado pela aquisição de nossa Antologia e pela leitura que farão.


Otávio da Silva Nascimento Jr.

SINTO

Sinto meu peito atravessado por uma navalha daquela que nos fere como a rede que nos malha Sinto meu peito como uma flor envelhecida cujas pétalas no chão moribundas nessa vida Agora vou mais fundo não sinto mais meu peito sinto meu coração de um outro jeito Sinto meu coração quase morrer de vontade correndo a tua procura na estrada da Saudade... Sinto meu coração como aquele do cupido ARPÃO, DOR, SOLIDÃO no meu peito adormecido

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A GRANDE ILHA DE MARAJÓ

Tudo de bom que tu imaginas tem aqui do nascente do sol ao sol poente da lua ainda minguante à lua crescente do frito de vaqueiro à cuia de açaí Já ouviste falar do canto do bem-te-vi do famoso boto que vira gente do toco que aparece de repente peças lendárias no Rio Paracauari O caranguejo do buraco oriundo no pedaço mais lindo do mundo tem a bela dança do carimbó O caboclo foi privilegiado temos tudo que por Deus foi deixado falo da Grande Ilha de Marajó.

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LEMBRANÇAS DAQUELA CARTA

Lembrei-me das belas e amargas palavras que ora eram doces como doce é o mel Outrora tristes rabiscadas no papel recordei-me das duras palavras grifadas. Letras e mais letras, todas entrelaçadas que daria até pra sangrar o céu ou delas extrair o aroma de channel são vogais e consoantes na carta grafadas. Quem és tu que a dedicou para mim e porque citas a mulher que amei quem és tu que chama-me e eu vim. Com você muitas vezes eu sonhei vi preto no fogo em pleno jardim mas quem és tu que ainda não sei.

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AO MEU CONTERRÂNEO

Oh! Centenário Rio Paracauari como pro povo e pra mim tu és bondoso és o conhecido rio caudaloso originário do lendário Tupi-guarani Agradecido fui eu quando te vi tu que dá-me o peixe mais saboroso no mundo és conhecido e mui famoso e ovacionado és pelo povo daqui Da canoa tu és o constante caminho Em teu corpo dá paixão, dá peixinho tuas ricas margens têm pássaro e ninho Por muitos já foste então esculpido hoje te encontras um pouco ferido mas continuas sendo o meu rio querido

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MAISA Vi a menina de saia alongada bela e faceira e um pouco queimada Corpo delicado sorriso perfeito cabelo assanhado e um peito que deito Olhos puxados uma pulseira no pé bela e faceira que linda mulher

OLHOS Tudo está branco e preto sou pobre e rico sou torto e direito sou João, mas também sou Chico Sou do campo e da cidade ando a cavalo e de carro conheço bondade e maldade moro em prédio ou casa de barro Luz elétrica e lamparina sou forte e também sofrida tudo isso se combina sou a VIDA www.cpoema.org

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BOTO

Vamos contar agora história de pescador faz parte da cultura foi o boto sim senhor Nas festas de salão é um homem encantador vestido todo de branco seu charme já mundiou Cuidado menina cuidado com o boto esse cabra é maroto ele vai te pegar se te pega o boto sabes no que vai dar Te tira do meio da festa e leva pra beira do rio faz o serviço completo Já sumiu e tu não viu Agora espere o resultado criança sem pai o boto é culpado levando culpa dos outros Ai meu Deus! Mais que coitado

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ONTEM, HOJE E O AMOR

Ontem escrevi um belo poema hoje nem consigo pensar ontem eu tinha você e hoje não posso contar Ontem eu andava na rua sorrindo pra lá e pra cá hoje a vida perde o sentido e o coração começa a chorar Quisera eu ontem não ter te encontrado queria eu hoje estar ao teu lado colado Acho que o amor outrora esquecido ressurge com mais força e como se fosse cupido deixando-me loucamente apaixonado desabrochando o que estava escondido

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VEM Vem meu amor vem logo sem demora vem que te espero vem que te quero vem logo me abraçar meu corpo necessita do teu sinto-me com frio precisas me esquentar vem meu amor vem logo sem tardança vem pra sua criança vem me namorar

NUNCA Paro pra pensar e chego à conclusão de que nunca acertarei e o amor de verdade que procuro nunca, eu nunca o encontrarei.

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Otávio da Silva Nascimento Jr.

UMA LÁGRIMA ESCONDIDA

Uma vez vi um pinheiro chorar Levou corte de machado E percebi que levemente Caiam gotas do lugar que foi afetado Aquela árvore sofria demais Porém despejava sua dor A lágrima recompunha a vida Sofria, mas superava com amor Hoje sinto-me como a árvore Aquela bonita árvore ferida Porém sofro com algo preso Tenho uma lágrima escondida

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Reginaldo da Consolação Monteiro

Sourense, nascido em 24/02/1939. É casado, desenhista de profissão. Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais (Direito) pela Universidade Federal do Estado do Pará. Diplomou-se pela Escola Superior de Magistratura. Cursou a escola de inglês Centro Cultural Brasil EEUU (CCBEU). Colou grau pela Escola Paulino de Brito em Técnico em Contabilidade. Trabalhou em empresas privadas e também na Prefeitura de Belém como desenhista e projetista. Exerceu o Magistério e a Magistratura, por onde se aposentou por tempo de serviço. É autor da autobiografia “Sonhos, Pesadelos e Triunfos”.

Sorte é o casamento do talento com a oportunidade, ou seja, é a soma dessas oportunidades quando aproveitadas sem nenhum desperdício. A sorte não existe sem o concurso de terceiros e amigos que nos valorizam, sem estes, seremos sempre um anônimo a mais, ou alguém que sempre será ninguém. Ao Clube de Poetas e Escritores da Ilha do Marajó, o meu agradecimento pela sorte em fazer parte dessa grandiosa empreitada literária.


Reginaldo da Consolação Monteiro

UM SÍMBOLO DE AMOR O Deus do amor tem como símbolo, na mitologia romana, um anjo alado de olhos vendados, com arco e flecha, chamado Cupido. Quando esse anjo é assassinado, esse crime é covarde, pois, ele sempre é executado quando agasalhado no interior de algum coração.

UMA VELHICE FELIZ Uma velhice feliz é como se, ao pôr-do-sol de uma belíssima tarde de primavera, os passarinhos alegremente cantassem, agradecendo as belezas de um lindo dia que lentamente se apaga, nos horizontes da vida.

O POETA É UM SOFREDOR O poeta sofre porque enxerga tudo com os olhos da alma, portanto, ele é bem mais sensível aos embates da vida. Ele tem uma visão diferente das coisas e das causas que o rodeiam. Talvez por isso, ele não apenas sabe sentir resignadamente, mas sabe muito melhor, transmitir o que sente e pensa de seu mundo interior. O poeta que é solitário é muito solidário, sua bandeira é a fraternidade que o faz embalar dores, que quase sempre não são suas, deste modo, seus olhos estão sempre molhados por lágrimas alheias. Ele só reclina a cabeça aos ombros da poesia. Por ser tímido e simples, não consegue ser egoísta e, se não tem escolaridade, é dono da notável sabedoria de um autodidata, pois, a fonte de suas inspirações vem do belo, que só ele consegue extrair da própria natureza. O poeta é, verdadeiramente, um solitário, é das profundezas mais íntimas de sua solidão que emergem as ondas sonoras de suas sinfonias de amor, cantadas em repetidas paixões doentias, refletidas liricamente em seus poemas. O poeta é um sonhador, no horizonte de seus sonhos, desenhamse os coloridos fantasiosos do seu distante mundo de ilusões que ele, por ser um caçador de nuvens, morre contemplando sem que possa alcançá-lo. Por ser um visionário, ele vive de esperanças que jamais se convertem em realidade, e aí vão somando-se em traumas e desencantos que resultam em um mundo místico, fantasioso e triste, que muitas vezes o leva à morte. www.cpoema.org

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O poeta amarra-se às suas doces lembranças e meditações, seu passado juntando-se ao presente, inibe o futuro. O poeta é por vocação um mensageiro da dor e do amor, é isso que lhe faz inconscientemente, cultivar o sofrimento como o nascedouro fértil de suas ardentes inspirações. Se não sofresse, não seria poeta, talvez que não conseguisse articular uma só frase romântica, se não estivesse sufocado por copioso pranto. O poeta reside nas paixões, onde costuma colorir o branco e preto de sua vida com matizes chocantes, que transformam o trágico em belo e o drama em comédia. Ele está ligado à máxima de Cristo que diz: “Quem não vier pelo amor, virá pela dor”. O poeta vai pelos dois caminhos, da dor e do amor, pois, entende que esses caminhos acoplamse a um só, que é o da dor. O sofrimento é o termômetro do amor. Sem sofrimento o amor não subsiste. Sendo fantasioso, em seus devaneios o poeta levita, nessa flutuação, conseguindo virtualmente voar nas asas do vento, navega sobre as águas de oceanos, mares e rios, buscando o porto seguro de uma felicidade que para ele, jamais existirá, já que ele é poeta. O poeta faz de sua insônia um alazão fogoso, o qual, entre galopes, vara noites e noites, buscando as madrugadas. Sofre porque muito ama e tem a sensibilidade de um oleiro que, trabalhando, dá ao barro a arte de feitios diferentes. O poeta, também, faz da tristeza e da saudade, principalmente das paixões, a matéria prima para as suas líricas e divinas obras. Eu sei de tudo isso pelo fato de ser um poeta anônimo.

QUANDO A VI PELA PRIMEIRA VEZ Um dia, conheci alguém especial, mas enraizada nos hábitos e costumes da vida campesina. Ela ainda é uma jovem bonita, clara, esbelta e arredia. Por viver na zona rural, me faz lembrar de algumas rosas silvestres que, embora lindas e coloridas, não têm perfumes. No nosso primeiro encontro, trocamos sorrisos ligeiros e olhares furtivos. Fomos aproximando-nos levemente e o que era apenas uma brincadeira virou um caso muito sério. Interessante, nós, eu e ela, embora nascidos do mesmo torrão natal, trilhamos caminhos muito diversos. Advindo disso, nosso modo de vida, quer social, moral, familiar, ético e religioso, era muito diferente. Isso não me impedia de admirar a singular beleza daquela que, na fazenda onde um dia morei, atendia pelo nome de Moema. Nós não nos conhecíamos.

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Eu notava que ela, naquele dia, embora juntinho a mim, me parecia distanciada e calada. Após algumas perguntas, ela confessoume que, por ser eu um moço da cidade grande, ela nutria por mim uma grande consideração e respeito. Em verdade eu achava mesmo que o que ela tinha era receio de falar; eu então, me contive para não feri-la. Passei longos minutos, imerso em profundo silêncio, certamente, com receio de avançar o sinal. Assim, enquanto Moema apertava as minhas mãos, ajudado pelo luar daquela belíssima noite, eu me perdia no azul-celeste daqueles olhos miúdos e belos, buscando decifrar os enigmas, agasalhados no mais íntimo daquela pureza de mulher. Quando nós nos entregamos à solidão daqueles campos prateados de luar; quando a natureza arranjou para nós, a pintura de um céu de variado esplendor; quando sentimos a emoção da sensação e da liberdade de estarmos sós, eu, inebriado de encantamento, me extasiei como se aquilo fosse uma festa de consagração ao belo, louvando o nosso primeiro encontro. Estimulado não só pela magia contagiante daquela noite, mas pela cândida beleza de Moema, sem mais poder agüentar um só minuto, rompendo o silêncio, disse-lhe o seguinte: – A folha murcha do deserto nunca esquecerá o orvalho de uma noite amiga que lhe fez vivificar. Tu, Moema, és o frescor dessa brisa que trouxe ao meu rosto vincado, o orvalho restaurador, que está me restituindo a vontade de viver. Eu sou essa folha murcha. Então, navegando nas águas remansosas do meu incontido desvario, me deixei dominar pelas palavras que, fluindo, me fizeram continuar assim: – Moema! Estou certo que, quando te vi pela primeira vez, os olhos dos céus, ao luar desta noite, através de estrelas curiosas e cintilantes, nos espreitam encantados. De repente, quando ela se mostrou pensativa, passivamente tímida e emocionada, de chofre, aproveitando falei: – Isso tudo, Moema, foi o que pensei e senti quando te vi pela primeira vez. E tu, amor... O que na verdade sentiste, quando também me viste pela primeira vez? Fala, por favor! Estou ansioso, por Deus! Não faz suspense. Envaidecido, desejava saber das coisas românticas que Moema sentia por mim naquele primeiro encontro. Eu queria ouvi-la naquela noite. Ela, sem dúvida, teria coisas belas a me dizer. Enquanto, nervosamente, eu esfregava as mãos, ela olhou-me e graças a Deus, com www.cpoema.org

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doçura, serenamente começou a falar. Quase desfaleci de emoções ao ouvir as suas palavras me perguntando o seguinte: – Amor – disse ela languidamente –, estou emocionada, posso falar? Eu, impaciente, respondi nervoso: – Por Deus! Querida Moema, fala sem demora. E ela finalmente, com muita sinceridade, falou assim: – Sabe, amor! Quando eu te vi pela primeira vez – disse ela – pensei o seguinte: aquele “negão” com certeza, tem cara de quem pula a cerca.

NA VERDADE, QUEM SOU EU? Sou um homem que aprendeu a ser idoso sem deixar de ser criança. Que tem o coração provido de emoções, que me fazem rir à toa e chorar com facilidade, admitindo que o sorriso e a lágrima, são as mais sinceras expressões da sensibilidade humana. Sou um guerreiro anônimo e muito determinado, que nunca se deixou abater por derrotas sucessivas nem se empolgar com vitórias, que tão pouco se repetem. Sou aquele que sempre teve a sua alma albergada por muitos sonhos de gigante, portanto, quem sonha os meus sonhos, inevitavelmente, terá muitos pesadelos, mas despertará aos pés de grandes realizações. Não sou humilde, porém sou simples e entrego-me fácil ao embalo de sofrimentos alheios. Mesmo pobre de bens materiais, sempre admiti que a doação, é a maior manifestação de amor ao próximo carente. Doar é um ato de despretensiosa grandeza e generosidade, não cabe retorno, nem mesmo o agradecimento deve ser exigido pelo doador, para que o ato de dar não seja convertido em troca. Não creio em conquista fácil, nem na proteção da sorte, admito que as sementes do triunfo que muitas vezes frondejam na aridez de um solo estéril, o fazem ao impulso de nossa determinação e sudação. Creio na Lei do Retorno, com a certeza de que o amor é o passaporte para a nossa viagem introspectiva, onde adentraremos os jardins paradisíacos, que cada um de nós traz dentro de si mesmo, pois, é pelo que plantamos e colhemos que tudo que temos, sem erro, é o saldo daquilo que demos e fizemos ao outro. Eu sou um homem de muita fé. Sempre admiti que os amigos próximos são mais perigosos do que os inimigos distantes, assim, os poucos amigos que considero são aqueles que provaram comigo, o mel e o fel, servidos na taça da felicidade

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e das desventuras. As minhas emoções, a minha coragem e a minha fé me levaram a entender que a soma de tudo isso, premido pela dureza que a vida me impôs, teve como saldo um encontro marcado com Jesus e eu agradeço. Foi isso que me tornou um cristão feliz para sempre. Sou maduro de aparência e jovem de espírito, exerci cargos públicos importantes, sem jamais discriminar alguém. Admito que a desigualdade social é o cerne da discriminação, e esta, a seu turno, é a mãe de todos os preconceitos. Se o amor recíproco for impossível entre nós, eu Te peço, meu Deus... Abranda os rancores das diferenças pessoais e sociais. Sou frágil, sempre adoeço, mas a doença nem sempre é um mal. Há momentos em que é também um remédio eficaz, capaz de cicatrizar feridas incuráveis. Às vezes, me imagino um cidadão perfeito, pelo fato de ter defeitos que todos os outros homens têm e virtudes raras, que nem sempre os outros homens conseguem ter. Tenho consciência de que sou o resultado do mais belo fenômeno da natureza – a fecundação –, que me deu a vida. Se eu nasci, é porque tenho um compromisso com essa vida. Talvez que seja o de dividir o pão para encontrar a felicidade. Na verdade, quem sou eu? Meu nome é: Reginaldo da Consolação Monteiro. Sou alguém que nunca foi. Não é, e nem será ninguém.

DIA DAS MÃES SEM VOCÊ Ser mãe é a mais bela, porém, a mais espinhosa das missões. Não existem cursos que diplomem essas profissionais. A escola superior delas é a universidade do amor, da afeição e da renúncia. A maternidade é dom legado por Deus. Muito obrigado, Senhor, por me teres feito racional, com o privilégio de poder entender quão importante tem sido o papel dessa mulher chamada mãe, na vida da humanidade. Todo dia de minha vida é também o teu dia, mãe, pois, cada um deles, desde a tua partida, é o dia da tristeza, da solidão e da saudade. Na verdade, todo dia é o dia das mães, que desde que te foste, representa para mim a eterna ausência de uma mãe que não voltará jamais. Todo o ser humano, seja quem for, do coração mais rude ao mais sensível, que um dia perdeu a sua mãe, traz neste dia das mães, nos olhos dependuradas, muitas lágrimas lutando para explodirem, em www.cpoema.org

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dolorosos prantos. Sim, eu sei! Estou vivendo agora, no dia das mães, neste momento, a quietude de um misterioso clima. Eu sinto a falta de teu calor e de teus afagos, eu preciso chorar e me embrulhar contigo, mesmo que virtualmente, nos mantos cariciosos do teu amor, ouvindo de ti minha mãe, o murmurar de tua voz aos meus ouvidos, dizendo baixinho: – Meu filho, eu te amo! Por um momento as minhas emoções me fazem regressar no tempo. Rapidinho eu viro uma criança mesmo que, por tão poucos segundos. Ainda assim, volto a experimentar o quanto é belo estar outra vez em teus braços, agasalhadinho no colo macio de teus carinhos, sentindo o teu calor de mãe. É a repetição de meus sonhos instantâneos que me despertam para os pesadelos de tua ausência. Tu partiste, mãe, quando eu ainda tanto precisava do teu amor, da tua companhia, nós, crianças sabemos sentir, mas não sabemos entender, nem nos conformar. Hoje, ainda lembro quando em minha frente, cerraste para sempre os teus olhos verdes e profundos como um oceano. Aos meus ouvidos, ainda ecoam os soluços dos parentes e amigos, quebrando o silêncio de nossa alcova e, na tela de minhas lembranças, ficou gravada a tua palidez ao desfaleceres nos braços de meu pai, que também soluçava. Era a tua partida. Ainda repercute em mim o meu grito de apelo a Deus, repetindo: “Mãe, minha mãezinha! Não te vás. Por Deus mãe! Não te vás...” Ainda assim, tu partiste mãe, de súbito, sem tempo para me dizer adeus. No teu lugar impreenchível, ficou só a saudade. Minha mãe! Onde quer que estejas o teu coração há de estar sintonizado ao meu, não sou mais menino, assim, receba, neste dia das mães, o afeto de um homem maduro, que só não está bem, porque ainda sente muita falta da luz verde-esmeralda de teus olhos, que, na noite escura daquele triste dia, para sempre se apagou de minha vida. Mãe, tu não foste apenas uma mãe, mas uma estória de renúncia, de fraternidade, de ternura e paz, enfim, um anjo mensageiro do amor que, só por um momento, esteve entre nós, apenas para cantar as glórias de Deus. Dentro deste vazio repleto de saudades, está plantada a árvore frondosa do amor que viceja em meu coração. Ó minha mãe! A tua ausência que impera em mim neste dia me faz quedar de joelhos, sobre o tapete macio de tuas doces recordações. Minha mãe, todo o amor que me legaste na inspiração de tua presença, agora me faz, neste dia das mães, chorar, um rio de lágrimas na solidão da tua ausência.

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Muito obrigado pelo companheirismo e pela vida. Mãe! Onde estiveres, recebe neste dia das mães, daquele que foi teu único filho, este presente, em forma de uma linda mensagem, divinizada no amor. “Que Deus te abençoe.”

O PREÇO DE UMA ALUCINAÇÃO ALCOÓLICA Assumindo interinamente uma comarca do interior, no primeiro dia de trabalho, quando ainda colocávamos tudo em seus devidos lugares, adentrou ao meu gabinete, um homem precocemente grisalho, nervoso e abatido. Cumprimentando-me, disse chamar-se Fábio Martins. Aquele homem desculpou-se por ter sido ele, o primeiro atendimento daquele dia e, em seguida, requereu verbalmente o que desejava dizendo: – Doutor, com respeito, rogo que V.Exa. dê prioridade ao meu processo, que já completou quatro anos sem julgamento. Desculpe-me, doutor, mas não estou mais agüentando. Sem tomar ciência do fato, mas curioso e bem intencionado, perguntei: – Por favor, senhor, diga-me: esse caso que lhe preocupa, tratase de quê? – É homicídio, doutor – disse ele cabisbaixo –, matei e necessito ser julgado, não suporto mais esperar. Essa liberdade me tortura em demasia. Sinceramente, estranhei aquilo que jamais tinha visto antes. Ninguém estando em liberdade, deseja ser julgado com brevidade, por isso, voltei a questioná-lo outra vez. – Por que pressa, não está em liberdade? Essa pressa senhor, pode colocá-lo na cadeia – e pedindo desculpas quis saber –, como aconteceu isso, poderia me dizer? Ele, suspirando fundo, fez uma longa pausa e continuou: – Sabe, doutor, alucinado pelo álcool, atirei em um jovem, que apenas começava a viver. Ele era um universitário inteligente, sadio e contava apenas com dezoito aninhos de idade. Em conseqüência, perdi a esposa, minha casa, os filhos, os amigos, a paz e a vontade de viver. Só uma coisa me restou, o desejo de ser condenado. Após ouvi-lo com respeito e redobrada emoção, aconselhei-o a buscar um novo caminho que o levasse ao encontro de Deus, talvez que o milagre da resignação abrandasse a culpa, o desespero e o remorso. www.cpoema.org

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Mas ele, coitado! Ao ouvir-me, passou a chorar incontidamente, como se o seu pobre coração tivesse se despedaçando, a cada palavra por mim pronunciada. Percebendo que o senhor Fábio Martins havia perdido o equilíbrio, levantei-me apressado, segurei-o pelas duas mãos e disse-lhe com desvelo: – Amigo, tenha fé e confie em Deus, quem sabe sua família pode se recompor outra vez. Ao sair daqui, entre no primeiro templo que estiver de portas abertas, se lance aos pés de Jesus. Faça isso! Mas antes, faleme de sua família. Onde está sua esposa? Por que perdeu seus filhos e a casa? Confie e desabafe, isso o fará melhorar. – Minha esposa, doutor – disse ele constrangido –, já tem nova família, nossa casa abandonada foi vendida e meus filhos... – aqui ele baixou a cabeça – tomaram rumo diferente. Pedindo licença e desculpas, audaciosamente, tornei a indagar: – Agora, senhor Fábio Martins, fale-me da vítima e dos familiares dela. – Estou sem coragem, doutor, mas vou falar – disse ele entre soluços –, a vítima, doutor, foi meu filho mais novo, a pessoa humana que mais amei na vida. Por Deus, doutor, me condene, é um ato de amor, V.Exa. pode fazer isso. Matei o meu filho... Ajude-me, eu quero ser condenado. Outra vez pus-me de pé, para dar-lhe o conforto que tanto necessitava, naquele difícil momento de sua vida. Abraçando-o apertado e olhando de frente para um crucifixo de metal, que decorava uma das paredes de meu gabinete, motivados por desmedida emoção, nós dois choramos juntos. Vejamos, até onde o álcool, somado a um curto momento de insensatez, é capaz de nos conduzir. Apenas por segundos de irreflexão, aquele pai mergulhou no mais ardente de todos os infernos. Para que julgamento ou cadeia, se ele já estava condenado à prisão perpétua dos remorsos e arrependimentos, que o farão pelo resto da vida, arrastar aquela pesada cruz?

UMA INESQUECÍVEL NOITE DE AMOR Tomara que as aves noturnas não calem nesta noite, os gorjeios de trinados e dolentes bemóis que ensaiaram para nos recepcionar. Tomara, meu amor, que saibas bem mais, colocar um tempero novo, no cardápio

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Reginaldo da Consolação Monteiro

desse nosso manjar de paixões; tomara que este corpo moreno, esbelto e luzente, ache em mim a fonte de suas satisfações, sentindo cada vez mais, muita sede de amar. Vem, meu amor, vem ao nosso encontro, meu corpo ávido e pronto te espera para alvejar os teus segredos, subir celeremente e escorregar paulatino e cansado, de todos os teus altos montes. Deixa que eu mergulhe fundo nas águas mornas dos desejos e do amor que só tu, nesta noite, me podes proporcionar. Vem mansinha, despida de normas e preconceitos, envolta nos lençóis cariciosos dos instintos e das fantasias amar-me, na longa noite deste lindo dia. Vem sem perda de tempo, fechando portas e janelas, para que a timidez e o pudor se mantenham lá fora, distante de nós. Agora que estamos sós, aproveita nesta noite, o calor abrazador desta paixão, para te agasalhares em mim até a fundição de nós dois, derretidos em um só prazer de amar. Vem, antes que a luz audaz do amanhecer domine as sombras, iluminando nossas faces deprimidas pela exaustão que essa noite quase eterna nos faz viver, debaixo das belezas de um céu virtual, estrelado de luxúria, sedução e amor. Aquela noite, que parecia eterna, na verdade, representa para a eternidade, o que uma gota de água a faz para um oceano, mas se de tudo sempre sobra algumas coisas, de nossa noite não podia ser diferente, sobrou a eternidade das saudades e das imorredouras recordações. As belezas de uma noite de prazer, nem sempre compensam a tortura das lembranças que nos levam às tristezas e nos fazem chorar. Quanto maior tenha sido a intensidade de uma noite de amor, mais pesada é a cruz de nossas recordações. Isso nos faz crer que, é melhor evitar um comprometedor e efêmero prazer, do que sofrermos para sempre, os pesadelos de suas doces lembranças que, às vezes, nos fazem crer que é mais importante não iniciarmos um relacionamento amoroso, do que termos que interrompê-lo quando tudo ainda está começado. Quem nos dera podermos inverter o tempo, só para que tivéssemos condições de novamente garimpando, vivermos os nossos começos, descobrindo a cada instante as pedras preciosas das jazidas de uma mina, abastecida de amor. Foi ali, Esmeralda – minha reluzente pedra preciosa –, que no garimpo do amor, te conheci e jamais te esquecerei.

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Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador

É belenense de nascença (17/01/1967), mas gerada no Marajó; Arquipélago que guarda no coração. Filha caçula de Inês Figueiredo dos Santos e Raimundo Nonato da Silva Santos (em memória), ambos naturais de Soure. Seu gosto pela leitura, escrita e pesquisa começou ainda criança e hoje lhe rende a obra Ilha de Marajó: Terra de Todos Nós a ser publicada brevemente. Também escreve poemas e artigos para a Via Amazônia, revista com mais de cinco anos na área editorial paraense. Rosângela é sobrinha do saudoso músico sourense Capitão Aniceto; casada com Luiz Amador e mãe de Felipe, Cleber e Fernanda, maiores incentivadores de sua labuta literária.

Agradeço a Deus e à minha Mãe pelo Dom da Vida. Ao meu Pai, hábil poeta e compositor, de quem herdei a veia literária. Ao demais membros de minha família e aos meus amigos. Aos membros do CPOEMA, meus irmãos na palavra e em Deus.


Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador

HERÓIS ANÔNIMOS Ainda hoje, lembro-me da pacata e tranqüila cidade onde morávamos, no tempo da minha infância, onde meus pensamentos voavam através da imaginação cheia de cores e fantasias. Muitas lembranças se perderam ao longo do tempo, restando apenas as que ficaram gravadas na mente e no coração. O mundo era tão diferente do que se vê hoje, mais inocência e pouca violência. As brincadeiras reuniam crianças vindas de todos os lados, estávamos muito distantes das modernidades das grandes cidades. Brinquedos industrializados não faziam falta, inventávamos o que a nossa criatividade permitisse como, por exemplo, as pequenas mangas (fruto regional) caídas da árvore, e que nós as transformávamos em bois, vacas, etc. No final da tarde em frente à casa simples de madeira, os banquinhos também de madeira eram ocupados por quem gostava de conversar e contar histórias fantásticas. No céu totalmente estrelado, dava para ver as “Três Marias” e o “Cruzeiro do Sul”. A lua cheia parecia sorrir e o vento soprava aos nossos ouvidos dando um ar de suspense àquele momento. Todas as crianças assentavam-se ao redor dos adultos, a maioria das vezes toda a família se reunia: meus avós, pais, tios, irmãos e primos. As crianças encostavam-se umas às outras tremendo, principalmente quando o vovô contava as histórias de pescador. Acreditávamos em todas e parecia que nos transportávamos e passávamos a ser personagens das histórias. Meu avô era um nato pescador, desde cedo aprendeu com o seu avô a arte de despescar curral. Construiu alguns currais nas praias do “Garrote” e “Mata Fome”. Na maioria das vezes, a vazante da maré se dava pela madrugada. Meu avô saía na penumbra da noite; sozinho ou acompanhado por um dos filhos, a lamparina era a fiel companheira. Mata por todos os lados, contudo, uma estradinha de terra as dividia. O medo e o frio se misturavam com o impulso que o encorajava em ir à luta, afinal sua família dependia de seu trabalho, não podia voltar atrás. Contava que aprendeu a tocar violino quando tinha sete anos de idade; como obra artesanal construiu o seu primeiro violino. Eu admirava muito o meu avô, observava as mãos trêmulas e cansadas, o rosto já meio enrugado, todavia, parecia sonhar ao tocar tão suavemente www.cpoema.org

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aquele instrumento, como se fossem pétalas de uma rosa, ou um cisne deslizando num lindo lago azul. Papai era um exímio músico, o cavaquinho era o instrumento predileto. Quando podia, reunia-se com os amigos e formavam o tradicional conjunto pau e corda: banjo, xeque-xeque e cavaquinho. As cantigas surgiam de acordo com a situação do momento, a solidão e a saudade da família quando estavam no campo trabalhando, os tornavam especialistas na arte da música e poesia. As palavras brotavam do sentimento que estavam ali, dentro do peito. As composições eram feitas sem muito esforço, com a mais preciosa essência. As letras quase sempre retratavam a história do povo marajoara, ou falavam do amor entre homem e mulher, ou então, da dura realidade que enfrentavam nas cheias, no período invernoso, ou no período da seca, quando o chão de tão duro se transformava em terroada. Todas essas coisas serviam como fonte de inspiração para aqueles artistas, que dividiam suas experiências, criando a própria arte. Antigamente os homens e mulheres se orgulhavam por ensinar seus filhos oralmente, passavam suas experiências sem precisar de lições escritas no papel. Nos dias atuais, os pais passam as experiências para os filhos, seus talentos e habilidades, porem, com uma pitada de acréscimo por meio dos livros e das máquinas. Os heróis estão por toda a parte, são personagens que trabalham e fazem a história seguir o seu rumo, sem ser interrompida. Nem todas as coisas que se aprendem no mundo são tão importantes quanto àquelas que se aprendem com a própria vida.

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SOURE

Carinhosamente conhecida como a Capital deste imenso Arquipélago, indubitavelmente, merece o título de “Pérola do Marajó”. No passado fora habitada por aldeias de índios maruanazes e mundis, descendentes dos Aruãs. Após o descobrimento do Brasil, em todo o território do arquipélago marajoara, ocorria o processo de colonização pelos portugueses. Visto que, por volta de 1640, um grupo de imigrantes, também portugueses, vinha de uma pequena e antiga vila de Concília, do distrito de Coimbra, conhecida como “Saurium”, chamada assim pelos romanos por causa dos grandes jacarés que havia lá no sítio de Portugual, os habitantes da vila os chamavam de “saurios”. Ao perceberem que nos rios daqui havia muitos jacarés, definitivamente decidiram mudar o nome da cidade, que antes recebera dois nomes: Monte Forte e Menino Deus, para “Soure”, que é simplesmente uma tradução de “Saurium”.

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BELEZAS NATURAIS A fauna Amazônica é rica em espécies de animais silvestres e aquáticos, com uma infinidade de pássaros raros, completando a paisagem emoldurada pela biodiversidade dos ecossistemas existentes no Marajó. A flora é abundante, um verdadeiro celeiro de espécies de plantas medicinais , madeira, sementes oleaginosas, sementes para o artesanato, e uma diversidade de árvores frutíferas que geram recursos para os nativos que vivem basicamente do extrativismo. Em Soure, os recursos naturais são conservados mediante a sua exploração sustentável, permitindo-se que continuem disponíveis para as gerações futuras. Existe uma região de campos a perder de vista, com flora peculiar composta por matas de várzea e igapó, rabiscada por lagos e igarapés. As viagens de barco cruzam os rios numa aventura fantástica e inesquecível. Beleza majestosa de diversas praias banhadas pelo Oceano Atlântico. São praias impressionantes e selvagens, modificadas a cada ano pela própria natureza. Praias que misturam o mar com o manguezal, as raízes aéreas contorcidas como se fossem esculturas sobre a areia branca. Antigas vilas de pescadores, onde o progresso tem chegado lentamente: escola, igreja, posto médico. Por outro lado, paisagens de águas claras e areia enfeitada com coqueiros, malocas que mais lembram o estilo dos índios maruanazes, todos englobados num exótico e atraente cartão-postal.

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CULTURA

Incontáveis fazendas ainda guardam o estilo colonial do século XIX. Retiros com casas rústicas suspensas no chão, chamadas de “palafitas”, preparadas especialmente para o inverno, onde o caboclo marajoara tem o costume de pescar na porta da própria casa. O período da cheia favorece isso a ele, pois os lagos transbordam de tanto peixe. O vaqueiro no verão só anda montado a cavalo; no inverno, sua montaria transforma-se numa pequena canoa a remo, onde pode praticar a pesca do lago, opção favorável de subsistência para quem mora no campo ou nas comunidades ribeirinhas. A cultura popular do povo de Soure é rica em cores, sons e sabores, recheada de ritmos e danças de origem mestiça. A culinária é criada com produtos que a terra oferece. São pratos preparados à base de filé de carne de búfalo, peixe, camarão, caranguejo e queijo de leite de búfala. O artesanato local, expressão de sabedoria do artesão marajoara, destaca-se com a criatividade das esculturas produzidas em argila e outros produtos extraídos da floresta.

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FELIZ CIDADE

Soure, graciosa pela própria natureza. As casas simples e recuadas quebram um pouco a tradicional arquitetura portuguesa. No entanto, ainda guardam o charme das primeiras edificações. Os jardins floridos enfeitam o espaço urbano, árvores gigantescas e centenárias, coqueiros que mais parecem arranha-céus. O exótico Rio Paracauari, fonte de mistérios e segredos, onde embarcações navegam diariamente. Ruas largas e avenidas bem enumeradas. Soure foi projetada e desenhada por Arão Reis, todavia, é sua antítese. A vida em Soure não é um conto de fadas, e sim uma realidade de quem precisa lutar para sobreviver e alcançar os seus sonhos. Acredito que cada habitante de Soure tem um grande desejo no coração: ver esta terra tranqüila, feliz e próspera, com direitos e deveres sendo respeitados. Os corações apaixonados cantam e versam o amor pela terra, emanados e respaldados pela benção de Deus. “O temor do Senhor é a instrução da sabedoria, e diante da honra vai a humildade.” (Pv 15.33)

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Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador

OLHOS DE POETA

Meus olhos não se fartam de ver Ou vir, ou ver? Doces jóias de reis Os búfalos são pérolas negras nos campos No azul moreno das águas E no verde robusto das matas Meus olhos não se fartam de ver Pontinhos brilhantes nos rios Palmeiras bailando ao vento Com longos cabelos cacheados Cachos roxos, vermelhos, amarelos Flores ímpares, cores, aquarela.

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ILHA DE ESPERANÇA

Brilhante nacarado Das conchas bivalves Do fundo do mar Dos oceanos folgazes No deserto da vida Tornaste-te oásis De águas cristalinas De rios infindáveis Inesgotáveis florestas De bosques gigantes Fiéis testemunhas De aves errantes Bichos selvagens Príncipes das matas O homem, no entanto, Em rei transformaste O vento cortante Sopra de onde quer Em tua face sedenta Tanto faz de onde vier Dominante na terra A alma rendida É lamparina na mesa Que a esperança acende

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Rosângela Maria Figueiredo dos Santos Amador

No campo gelado O vaqueiro peleja Sonhando acordado A fartura almeja Voando na solidão De um mundo atroz O cavalo é companheiro Daquele que é seu algoz Na montaria a remo O caboclo se esguia Debaixo da chuva A tempestade o guia Lançando a sua sorte Enfrenta a morte Crendo na fartura Que vem lá do Norte Suportando as trevas Dos meses cinzentos Das noites sem lua Sua dor é ungüento No murmúrio da noite O sonho se desvanece Como vaso que se quebra Das promessas se esquece No entanto a esperança É tesouro desejável Reascende a candeia Como bálsamo suave

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

Nasceu em 20/01/1990, em Belém, mas desde os primeiros anos de vida, residiu em Caju-Úna, aprazível comunidade litorânea do Município de Soure. É filha de Rosa Maria Sobrinho e Lourival Nascimento. Sócia efetiva do CPOEMA e leitora de Pedro Bandeira e Fernando Pessoa, não tardou para se apaixonar pela literatura, por isso, dedica um tempo especial à poesia.

A Deus, que está me dando força para continuar a expressar os meus sentimentos. Aos meus pais Rosa Maria Sobrinho (em memória) e Lourival Nascimento. Em especial ao professor Manoel Pedro Monteiro Vitelli Filho, que me descobriu poeta.


Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

A NATUREZA E UM SOFREDOR

Um amor que é relembrado ao olhar para o mar. Um coração machucado de momentos tão apagados insistindo em lembrar. A brisa da aurora toca minha tristonha face. O chiado do mar... são os seus afagos na última hora. E só se encontrando assim... com um sofrimento que não tem fim... apenas contigo em meus pensamentos... E vejo o sol descer para amanhã retornar... mas agora é noite e eu à beira-mar pensando em teu amar. Amargamente choro, e apenas estão para testemunhar o mar, as estrelas e a luz do luar.

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CRISTÃO Me vejo diante da luz que me conduz ao pé da cruz. Agora, entre feras e trevas, meu Cristo, meu rei: orgulhoso comigo. Ó Deus! por ti morrerei.

DÁDIVAS O amor é uma dádiva Todo sentimento Todo sentimento é uma dádiva A paixão A paixão é uma dádiva Com sua esperança e sua alegria A paixão é uma dádiva O amor é infinito Também é finito... O tempo é infinito O tempo é uma dádiva As memórias são uma dádiva Tudo é dádiva de Deus... Tudo, menos a morte Maldita é a morte Que define o fim de todas as dádivas

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

EGOÍSTAS

Todo dia eu encontro pessoas de pouca sorte, que não ligam para as doenças, não mais sentem muito receio, receio de Deus, receio do inferno, receio da morte e do fogo eterno. Têm eles consigo Deus. Mas eu sou mal. São estrelas no princípio do espaço. Mas, eu sei o que eu quero, e sei o que eu faço. Onde estamos? Não nos interessa, vamos sempre avante. Nesse mundo temos pressa E andamos sempre errantes. Mas eu espalho meu grito, pois eu escolho a paz estampada nas ruas, com foto em cartaz. Porém, vocês ficam bravos se o bem um tanto demora, e rezam e choram e imploram uma nova brisa da aurora. Quanto a mim trago sempre o pão e o vinho. Mas vivo num inferno sem fim. Um mero egoísta sozinho. Não ter tentação. Pois “o maior erro do ser humano é tentar tirar da cabeça o que não sai do coração”. www.cpoema.org

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EU SEI...

Sei que o melhor sabor do mel é um minuto no céu. e que o defeito do fel é o melhor gosto do mel. Vocês comem em “prato pleno”, o que podem ser seus venenos (mas como acreditar sem tentar?) Eu saberei se provar... Então nomeio-te fascista “mista, simplicista e anti-socialista.” Admita: Nós estamos na pista. Somos ego. Eles são “istas”. Todos egoístas. Por que não? Se nesse mundo Todos estão?

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

ÚLTIMAS PALAVRAS

E você? O que me diriam se eu me fosse? Se eu jogasse fora o amor que tu me trouxeste? O que haveria em seu coração Se não, um músculo espedaçado Cheio de ódio e rancor De uma paixão que foi ilusão? Faltaria, porém, o delírio de uma idéia A loucura de uma razão Que transformou nosso namoro sem graça Pra você uma louca e irreversível paixão Sei que tu temes, ó, meu querido Que eu de você facilmente esqueça Pois sabes que estás no meu peito E não em minha cabeça Haja o que houver de mim Pra você sei que fui a rainha Que há algum tempo atrás Você jurou que nunca amaria Assino com minhas lágrimas Esse poema que te darei Como se fosse algo importante Que nunca mais escreverei Não deixe delirar sua cabeça apaixonada Pois sou farsante e mascarada Sou farsante que se passou por amada Sou covarde, pois por você Nunca estive apaixonada

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SINAIS DE REALIDADE

Sinais? Eu já estou cheia de sinais. Que a guerra seja um sinal, está bem. Que a morte seja um sinal, está bem. Que a pobreza seja um sinal, está bem. Mas não permito que finja que nada acontece àquela criança que anda silenciosa nas esquinas, com o semblante cheio de dor e de saudade de seus genitores que a deixaram e partiram para o além, por motivos banais. Sinais? Eu já vi, vejo e verei muitos sinais... Porém, queria ver apenas o sorriso e a alegria desta criança

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

FERNANDA

Sonhadora e determinada Meu nome rola em desejos vãos Garota linda e agitada Que facilmente conquista corações Uma canção de Ana Carolina Lhe faz crer Que confusa coagita Consigo mesmo em ser Fernanda, Luz do caminho de não sei quem Tenta não sofrer, mas ama Alguém que não sei também De braços abertos Espera a felicidade Seus olhos despertos Não conquistam apenas amizade “Nanda”, Fernanda... Luta, sofre e ama... E tão confusa e insana Não sabe por onde anda

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O POETA APAIXONADO

O poeta apaixonou-se E suas obras mais vida ganharam O poeta magoou-se E suas idéias se despedaçaram Andava sozinho Sem esperanças de um dia encontrar Um caminho Em que mais não poderia chorar Andou longe... muito longe.... Com o parecer de solitário Mas não se lembra onde Do amor tornou-se empresário De repente Ao ver o olhar de uma linda musa Ficou consciente De que ainda no seu peito o amor atuava Levou-se pelo embalo do tempo E sentiu a força de uma paixão Amou a cada momento Com toda força de seu coração... ... O poeta apaixonou-se e suas obras mais vida ganharam o poeta magoou-se e suas idéias se despedaçaram

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Sabrina Socorro Sobrinho Barbosa

SABEDORIA Não é bastante abrir os olhos Para ver as árvores e o mar Não é bastante ter visão clara Para contemplar o luar Para ver o amor e as flores Não é preciso ter sabedoria Junto à sabedoria não há natureza Há apenas ideais de uma natureza melhor Junto à sabedoria há uma porta aberta E todo mundo fora dela Em um vazio que os consome E que nunca vêem quando ele se fecha

ROSA Minha querida rosa morena que tão rápido o tempo levou, teu perfume no vento está, que penetra no meu coração e de você me faz lembrar. Aí no meio das outras rosas, no mais lindo dos jardins, para mim, tu és a mais formosa das margaridas tulipas e jasmins. Que saudades dos afagos e aconchegos em teus braços. Mas agora como estou sozinha, choro de saudade e remorso, de para ti não ter sido uma boa menina. www.cpoema.org

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Dr. Sinval Lyra

Médico clínico e cirurgião geral, formado em 08 de dezembro de 1975 pela Faculdade de Medicina Federal do Pará, exerce a sua atividade há 31 anos no Marajó. Foi médico-diretor do Hospital Menino Deus, em Soure, foi médico-chefe do Centro de Saúde de Salvaterra e, atualmente, trabalha em sua Clínica e presta assistência médica em Salvaterra e Cachoeira do Arari.

Agradeço o despertar para a poesia aos meus professores de Língua Portuguesa, dos antigos: ginásio e científico – hoje, primeiro e segundo graus (ensino fundamental e médio) À minha esposa e filhas que sempre elogiaram estes humildes rabiscos apelidados de poesias.


Dr. Sinval Lyra

ACRÓSTICO

Situada, majestosa, Onde o sol é mais brilhante Uma dádiva de Deus, maravilhosa, Reluzes, qual um lindo diamante E és nossa querida terra fértil e pressurosa, A encantar o mais cético viajante. Possuidora de beleza plena É banhada pelo Rio Paracauary Reina tua gente, serena O vigor da tua raça, aqui Lânguida, a tua brisa amena A soprar cá e ali. De manhã, um mágico alvorecer E no crepúsculo, um calmo anoitecer. Meandros de lagos e igarapés As praias de doce fascinação Rios ricos em piabas e tucunarés As fazendas que completam a emoção; Jovem ainda és Ó obra magnífica da Divina criação.

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DEVANEIO Na madrugada calma, inebriantes, Lustrosas falenas, Serenas, Dançam leves e esvoaçantes. Cai, suave, uma bruma fria, Onde as aves noturnas, fagueiras, Faceiras, Rodopiam em ruidosa alegria. Sinto, na magia desta noite, Que a ilusão, Coisa do coração, Feriu que nem açoite, Embalando minh’alma sofrida Doce melodia, Pura magia, Abrindo profunda ferida. Mas, as irrequietas falenas, Mimosas, Pressurosas, Com carícias plenas, Enchem-me de esperança, De desejo, De teu beijo, De tua eterna lembrança. Oxalá esta noite não findasse E o prazer subalterno, Eterno, Deste sonho não acabasse; Ainda o orvalho sentir, No meu devaneio, Doce enleio, Nas pétalas das flores cair.

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Dr. Sinval Lyra

A CHUVA Menção Honrosa no V Concurso de Poesia do CPOEMA. Edição “Maria de Nazaré Mirian Barbosa”

Leve, intermitente, Cai a chuva, impertinente, Molhando todo o chão. Sopra o vento, gelado, Sussurrando belo fado, Entoando linda canção. Enlevada pela brisa fria Minh’alma exulta de alegria Transparecendo felicidade. E a chuva que cai agora Minha felicidade ignora Logo cessará, deixando saudade. E quando a chuva cessar Deste êxtase irei despertar Cessará toda a emoção. E este poema que é feito Dirá você, com efeito, Que foi a chuva a inspiração.

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EXPERIÊNCIA DE AMAR Quando o amor, traiçoeiramente, Qual serpente, Enfeitiçou-me a mente, Envenenou-me o coração, Senti, naquele momento, No meu pensamento, Que atrevimento, Uma arrebatadora paixão. E agora, pranteando minh’alma, Faltando-me a calma, A serenidade da palma, Já não me iludo mais; É só tristeza e desgosto Que no meu rosto, Qualquer prazer deposto, Sinais de alegria jamais. Quem se compraz com o sofrimento Que pense agora, neste momento, Que qualquer sentimento De piedade não convém; Já que é difícil a vida Para uns, guarida, Para outros, ferida, Produzida por outro alguém. É por isto que a tristeza, De qualquer natureza, Com plena certeza, Aquebranta todo e qualquer ser; Seja rico ou pobre, Plebeu ou nobre, Da têmpera do aço ou do cobre, De amor, algum dia, irá sofrer.

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NOVA AURORA

Tristonho, sozinho, Sinto falta de carinho, Sinto falta de amor. E colho, entre prantos, Os frutos dos desencantos Da semente semeada com dor. Na estrada, a princípio florida, Surgiu espinho, me abriu ferida, Fazendo-me retroceder. Mas nesta estrada árida e fria Entre cantos de alegria Outras flores haverão de nascer. E o coração, que vaga tristonho, Despertará, construirá novo sonho, Outro amor irá encontrar. Então, surgirá nova aurora, Nascerão as alegrias de outrora No seu novo despertar.

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DOCE ILUSÃO

Como a fogueira crepitante Morre meu sonho delirante Enquanto o tempo se esgarça. E a última esperança De um amor pleno de confiança Esvai-se como a fumaça. Na brisa que sopra fria Já percebo a nostalgia De uma triste separação. E pensar que a felicidade Que planejei dar-lhe sem igualdade Não passa de uma mera ilusão. Como a fogueira que ainda arde Sinto o desejo que me invade De este lindo amor salvar. Mas, desta que queima faceira, Igual a toda fogueira Cinzas, apenas, irão restar. E do nosso amor tristonho Que não passa de um belo sonho Lembranças, simplesmente, haverão de ficar.

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Dr. Sinval Lyra

CAMINHANDO Vejo um caminho, Sozinho, Neste caminho, Sigo meditando.

Neste caminho, Cheirosa, Flor mimosa Vejo desabrochar.

Vou sentindo, No caminho, Meigo carinho Da brisa passando.

Se no caminho, Espinho, Ao invés de carinho, Irei retornar.

O LUAR Tantas vezes, solitário, Passo noites a olhar Este céu tão azulado, De estrelas, marejado, Pelo luar, iluminado, Como é belo contemplar. Não há beleza que possa A esta se comparar Pois um’alma padecida,

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Que vagueia entristecida, Como a lua parecida, Conforta-se no luar. E assim, noites seguidas, Vou ficando a esperar Que, por trás da verde mata, Surja a lua cor de prata, E, ao luar, uma serenata Qual seresteiro entoar.

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ENGANOS Disseram-me que são bonitos os teus olhos; Belo engano, pois são lindos, Mais lindos que o mais claro azul do céu. Disseram-me que é gostoso o teu beijo; Doce engano, pois é delicioso, Mais delicioso que o mais puro mel. Disseram-me que é cativante o teu sorriso; Divertido engano, pois é encantador, Mais encantador que o mais inebriante luar. Disseram-me que é delicada a tua voz; Suave engano, pois é terna, Mais terna que a mais leve brisa do mar. Só não me disseram, triste certeza, Que era impossível poder te amar.

CONSUMATUM EST Quando um dia, sem aurora, For chegada a minha hora, Tranqüilo partirei. Deste mundo de maldades Levarei somente saudades De alguém que muito amei. Por batalhar em agonia Já me assoma a nostalgia Já não quero mais lutar. É o repouso do guerreiro Das batalhas o altaneiro Vê o braço fraquejar.

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Mas não partirei tristonho Realizarei todo e qualquer sonho Antes irei vencer. Ainda que o corpo fraqueje Que só ao descanso almeje Continuarei a viver. Sentindo a vida que finda Não querendo ir, ainda, Um pouco mais merecer; Contemplar o céu azulado Ouvir, dos pássaros, o trinado, Ver um novo amanhecer; O perfume das flores, que delírio, Do majestoso sol, o ofuscante brilho, O esplendor do luar; Ainda sentir a brisa fria Do vento suave, a doce melodia, E das estrelas o tênue cintilar. Então, dos meus olhos reluzentes, Brotarão lágrimas ardentes No meu derradeiro pranto. E, ao rolarem na minha lívida face, No prenúncio do desenlace, Já terei entoado o meu canto. No limiar deste meu penoso viver Sentindo o último suspiro anteceder Aí sim, estarei realizado. E tal como o Cristo na cruz Direi sob um raio de luz: “Tudo está consumado!” www.cpoema.org

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TÍTULO I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ FORMATO: 14,8 x 21cm EDIÇÃO 1 FORMATO E-BOOK NÚMERO DE PÁGINAS 216 DISPONÍVEL EM www.cpoema.org

Fonte VITELLI, Dilomeno Márcio Maués; LOPES, Jorge Domingues (org.). I Antologia Literária do Marajó. 2.ed. Soure: CPOEMA, 2009. Texto proveniente da Biblioteca Virtual do Clube do Poeta e do Escritor Marajoara <http://www.cpoema.org> Atenção Permite-se a redistribuição livre deste material, desde que ele não seja alterado e as informações acima sejam mantidas. Recomenda-se o uso deste livro e de seu conteúdo apenas para fins educacionais e culturais. Colabore Para colaborar conosco neste projeto de publicação, envie uma mensagem para <info@cpoema.org>



CPOEMA Clube do Poeta e do Escritor Marajoara

I ANTOLOGIA LITERÁRIA DO MARAJÓ Coletânea textual em prosa e verso, escrita por vinte destemidos marajoaras de coração e de berço, dos muitos que temos neste torrão. Hábeis autores que confiaram ao Clube do Poeta e do Escritor Marajoara (CPOEMA) a árdua, mas gratificante, incumbência de organizar, editar e conduzir à luz da publicação esta pioneira obra.

Ilha Camaleão

SANTA CRUZ DO ARARI

Rio Paracauari Lago Arari

SALVATERRA

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Retiro Grande REGIÃO DO

A R A R I ILHA

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SOURE

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CACHOEIRA DO ARARI

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ISBN

852470386-5

MARAJÓ 9 7 8 8 5 2 4

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