Revista Movimento Médico - N 05

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CREMEPE

Conselho percorre 60 cidades do Interior do Estado para diagnosticar seus problemas

osexual de jovens é tema de entrevista _______ ~s_çél~léls-tronco, e tre a religião e a ciência Uma visita ao interior dos engenhos de Pernambuco Omovimento mangue completa uma década -

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l"'tJ

CENTRAL DE REGULAÇAO. 5 ANOS ORGAN IZANDO OFLUHO DE PAC IENTES ATENDIDOS ATRAUES DO SUS.

I

o trabalho

da Central de Regulação vem facilitando a vida dos

pernambucanos que precisam dos serviços prestados pelo Sistema

-* GOVERNO; 7 DO'i ESTADO,: -

Único de Saúde. São cinco anos organizando o fluxo de pacientes

-

-

-

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"I

SECRETARIA DE SAÚDE

para que todos tenham direito a uma melhor qualidade de vida.

\~\\\\\

Central de Parto : 0800.814.1000 I Central de Leite Humano: 0800.281.2350 Ilnfosaúde: 0800.281.5656 Praça Oswaldo Cruz. 359. Boa Vista


N° 05' Ano 02' Ago/Sel/Out 200S

Editorial revista Movimento Médico comemorou, em maio, o primeiro ano de circulação. Uma vitória editorial da proposta do Conselho Regional de Medicina de Per­ nambuco em agregar, num só veículo de comunicação, entidades médicas do Estado que lutam para que a categoria tenha salários mais justos, melhores condições de trabalho e que a me­ dicina seja cada vez mais humanizada. E nesta sua quinta edição, Movimento Médico traz uma repor­ tagem especial de capa sobre a "Caravana do Cremepe". Fun­ cionários do Conselho e do Sindicato dos l\1édicos percorreram sessenta cidades de todas as regiões do Estado. Foram visitados hospitais, maternidades, postos de saúde e secretarias municipais. Um relatório de vinte páginas foi entregue ao Governo do Estado, Ministério da Saúde, Ministério Público Estadual e outros órgãos. No documento, denúncias de péssimas condições de trabalho dos médicos, sucateamento dos hospitais públicos, falhas no aten­ dimento à população e mau uso das verbas do SUS. A Caravana também detectou e denunciou o problema da prostituição infantil no interior de Pernambuco: crianças entre dez e doze anos de idade estão se prostituindo à beira das estradas por centavos. Movimento Médico traz ainda uma reportagem sobre os dez anos de criação do Manguebeat, a revolução musical genuinamente pernambucana criada por Chico Science, que morreu, em 1997, num acidente de carro, em Olinda. Em outra matéria, a revista mostra os avanços da medicina com as cirurgias feitas no Recife, com uso de células-tronco, para recuperação do movimento das mãos de dois jovens vítimas de acidente. Abaixo, um registro histórico do lançamento da revista Movimento Médico.

A

Capa: Foto de Hans Manteuffel

EXPEDIENTE Conselho Editorial

Cremepe

Presidente: Ricardo Paiva

Vice-presidente: Carlos Vital

Assessoria de Imprensa: Joane Ferreira - DRT/PE 2699

Simepe

Presidente: André Longo

Vice: Mário Fernando Lins

Assessoria . de Imprensa: Chico Carlos - DRT/PE 1268

Somepe

Presidente: Jane Lemos

Vice: Bento Bezerra

Coordenação: Sirleide Lira

Assessoria de Imprensa: Elisabeth Porto - DRT/PE 1068

APMR

Presidente: Adriana Marques

Vice: Marizon Armstrong

Trauma

Coordenação: João Veiga e Fernando Spencer

Damuc/UFPE

Coordenação: Tiago Emmanuel de Oliveira

e Berta Maria Brunet

DA/UPE

Coordenação: Renan Eboli Lopes

e Carlos Tadeu Leonidio

Redação. publicidade. administração e correspondência:

Rua Conselheiro Portela. 203. Espinheiro.

CEP 52.020-030 - Recife, PE

Fone: 81 3241.5744

Edição Geral: VERBO Assessoria de Comunicação.

Fone 81 3221.0786 - verbo@verbo.com.br.

Jornalistas responsáveis: Beto Rezende e Lula Porteia

Projeto Gráfico/Arte Final: Luiz Arrais - DRT/PE 3054

Reportagem: Joane Ferreira, Etiene Bahé, Roberta

Vasconcelos e Nathália Duprat

Tiragem: 15.000 exemplares

Impressão: Intergraf

Coordenador Editorial:José Brasiliense Holanda

Cavalcanti Filho

Todos os direitos reservados .

Copyright © 2005 - Conselho Regional de Medicina

Seção Pernambuco


Sumário

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4

Entrevista Patrícia Sabóia, uma voz contra a exploração de crianças e jovens

6 Capa Cremepe faz raio X do interior

Seções

12

Editorial

01

Opinião

03

Entrevista

04

Capa

06

História

12

Científica

Científica

16

Células-tronco: e haja polêmica!

Cremepe

18

Simepe

22

22

Somepe

26

Sindicato

Trauma

30

Simepe faz acordo com PCR

, , - -­

Res. Cremepe

31

Diretórios

32

-----

Cultura em Foco ---,

Uma viagem aos engenhos pemambucanos

16

26 FAV

33

o trabalho da Fundação Altino

40

Ventura

-

Ultima página

História

34 Cultura em foco Manguebeat completa uma década


Opinião Or. José Brasiliense Filho*

Sobre médicos e Cartas odisséias

H

á algum tempo fui pre­

não vai bem; porém, aqui na galé, não

senteado com um chavei­

largo do remo.

ro. Nada contra chavei­ ros. O que incomoda, em

verdade, não é sua alusão à campanha salarial dos médicos. É a data 1981. Início dos anos oitenta. Saíamos

vitoriosos do movimento pela regula­ mentação da residência médica. Época

Encaminhamentos. Plenárias. J or­ nadas. Congressos. Idas e vindas. Pre­ senças, presentes, tal como a maré, ora vazante ora cheia. Entretanto, a linha do horizonte é imprecisa. Tudo é Cillza.

Paulatinamente, insidiosamente, a

em que ainda reprimia-se tais ações

medicina e o seu exercício têm sido

com a polícia. Ainda? Mas alijá se en­

precarizado e despersonalizado. Há

contravam desfraldadas as faixas pelos

quem diga que somos apenas profissi­

10 salários minimos por uma jornada

onais da saúde. A desmotivação acen­

de 20 horas semanais, melhores con­

tua a monocromia desse momento.

dições no local de trabalho e eqüidade salarial. A expectativa da democratização dava espaço e condições para o que en­

Seguimos remando, acompanhan­ do o som de um discurso carente de palavras, o som das sirenes. Ou tapamos os ouvidos ou nos ati­

tendíamos serem reivindicações justas

ramos às rochas. São claros os sinais

para o exercício da medicina. E o são.

do naufrágio iminente.

O discurso estava pronto. Tal

No cotidiano exercício médico, se

como Ulisses em sua Odisséia, em­

nos determos a observar a avassa­

barcação pronta para singrar mares revoltos. Jornada longa. Vinte quatro anos

ladora multidão carente e dessasistida, assistida por médicos despreparados, extenuados e embrutecidos pela ba­ nalização das angústias das dores e da

de mar a adentro, sem e;'.'Pectativa de porto à vista. Período de grandes mudanças no paradigma do trabalho médico. Os sindicatos priorizando resulta­

impotência, sem dúvida pode-se aus­ cultar, na aparente inércia daqueles ne­ cessitados, a violência pura em seu estado latente.

dos, as cooperativas de trabalho, os

A falência do discurso nos aponta

planos e seguros, a universalização do

para o porto temporal onde, àquela

Sistema Público de Saúde foram os

época, a ação precedia o discurso.

grandes marcos.

Ajamos, portanto!

Nesta jornada infinda, da minha perspectiva não mais vejo as faixas, "as

~Médico

ouço". Começo a desconfiar que algo

Movimento Médico

Cirurgião/Coordenador da revista

Senhores editores,

Fiquei muito feliz em ver uma poesia minha

publicada. Escrevo também para parabenizá-los

pela revista de muito boa qualidade. Abraços.

E/ille Gomes. Médica residente de inlec:tologia do Hospital Couto Maia em Salvador - BA.

Senhores editores, GostaIiamos de ressaltar, através da Movimento Médico, a importância do II Curso de Educação Continuada no InteriOl: O evento, promovido pela Sociedade de Pediatria de Pernambuco, contou com um grande número de profissionais de saúde de toda a região. Com o tema O DiagnfÍslÍCfJ PiuIXe do CaUter infontJ!, um curso como esse vem enriquecer ainda mais os conhecimentos dos nossos profissionais. Llláam de Faria HmrU]lIes Delegado do cremepe em Arcoverde.

Aos editores da re\~sta, A publicação da reportagem sobre o Mercado de São José, na edição na 04, é a smte$e da \~da real dos que fazem aquele mercado, tralr<ilhando 365 dias por ano, para \~ver com dignidade. Esse documentário fez vibrar os corações de todos os trabalhadores que fàzcm o cotidiano do mercado N° 1do Brasil. Sillésio Rnbe/to Presidente da comissão permanente, represer1C!ndo os locatários do Mercado.

Caros editores, A reportagem "Museu mostra Pernambuco através de rico acervo", publicada na re\~sta lVlovimento Méclico na 4, apresenta uma infor­ mação equivocada no que diz respeito à forma­ ção c regulamentação da profissão de Museólo­ go no Brasil. A profissão é regulamentada, sim, como mostra a lei 7.267, de 18 de dezembro de 1984. O artigo 1° diz: "O desempenho das ati\~dade$ de muscólogo, em qualquer uma de suas modalidades, constitui objeto da profissão de Museólogo, regulamentada por esta Lei". NltillfJ Oliveira Museólogo - Coordenador do Awvo Museológico da UFPE.


ENTREVISTA PATRÍCIA SABOYA GOMES

"A exploração sexual de cr"anças e jovens é uma das piores violações dos direitos humanos" exploração de crianças e adolescentes é tão gritante no Brasil que mereceu a Instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional. Os trabalhos já foram concluídos. Os dados estão na publicação Esperança para as crianças do Brasil- A CPMI da Exploração Sexual apresenta seus resultados, de autoria da senadora Patrícia Saboya Gomes, à época no Partido Popular Socialista e hoje sem partido. Aos 42 anos, essa cearense de Sobral se orgullla do trabalho que fez. Para ela, a exploração sexual de crianças e adolescentes "é uma das piores violações dos direitos humanos". Patricia apóia a administração Lula - é vice-líder no Senado Federal-, mas nem por isso deixa de criticá,la. "Falta ousadia ao governo federal para essa questão", sentencia. Nesta entr vista exclusiva à revista Movimento Médico, feita pelo repórter Beto Rezende, em Fortaleza, a senadora Patrícia Saboya Gomes critica a falta de recursos para combater a exploração sexual de crianças e adolescentes e defende um investimento forte na educação como forma de evitar que milhares de riangas e jovens sejam explorados.

A

Movimento Médico - Qual a maior dificuldade para se combater a prostituição infantil no Brasil? Patrícia Saboya Gomes - A ex­ ploração sexual de crianças e ado­ lescentes é uma das piores formas de violação de direitos humanos. Durante o trabalho na CPMI, constatamos que isso se dá por questões econômicas. Por causa da pobreza, da miséria. Muita gente considera o problema grave, mas por outro lado acha que é inevitável. Aí, entra a questão cultural, as rela­ ções culturais. Pobres e ricos. Bran­ cos e negros. Essa questão cultural é a mais difícil de ser vencida. Era preciso discutir o tema, até porque a exploração sexual de crianças e ado­ lescentes não era um assunto nacio­ nal. Para se ter uma idéia, a última vez que o Congresso discutiu o as­ sunto foi há 11 anos. 4 Movimento Médico

Quais OS números atualizados da exploração sexual de crianças e adolescentes no País? Eu, Patrícia, não me arrisco a dar números. Segundo a Secretaria Na­ cional de Direitos Humanos, existe exploração sexual de crianças e ado­ lescentes em cerca de mil municípios.

Como a senhora avalia o trabalho do governo Lula em relação a esse tema? O presidente Lula foi o primeiro presidente do Brasil que trouxe para si a responsabilidade de erradicar a prostituição infantil. Mas o governo federal ainda precisa de uma política mais criativa e ousada. Hoje, só existe o Projeto Sentinela, que atende a crianças vítimas de exploração sexual. Eu acredito que deveria existir um investimento maciço na educação. Se tivéssemos escolas decentes, de qua­

lidade, em tempo integral, coisas des­ se tipo (a exploração de crianças) não estariam acontecendo. Os governos não estimulam as crianças pobres a pensar. Repito: falta ousadia. Tem que ter escola com curso de inglês, com Internet. A classe média tem. Então, os pobres têm que ter tam­ bém. Chega de política pública para pobrezinho. Voltando ao governo Lula, destacaria o trabalho feito pelo ministro Walfrido dos Mares Guia, que tem sido duro com os que ex­ ploram crianças e adolescentes. Go­ vernantes corajosos são fundamen­ tais. Recentemente, o governo do Ceará mandou voltar um avião cheio de gente que vinha para Fortaleza fazer turismo sexual. Foi um grande exemplo.

Quais os dados que a CPMI tem quanto ao abuso sexual na família?


Saiba quem é Patrícia Gomes Herdeira política de seu a'<Ô, o senador cearense Plínio Pompeu Saboya. Patrida Lúcia Saboya Ferreira Gomes nasceu, em 1962, em Sobral, interior do Estado do Ceará. Filha de José Saboya Neto e Maria Marty Mendes Saboya e mãe de três filhos - Uvia, Oro e Yuri, Patrída se formou em Pedagogia em 1988, passando a orientar sua trajetória política para atividades sociais, com atenção especial para a defesa dos direitos de crianças e adolescentes. Quando foi primeira­ dama do Estado do Ceará (1991/1995), à frente do MO'Iimento de Promoção Sodal do Estado, da Comissão Intersetorial de Ações para Criança e Adolescente do Estado, da Associação das Primeiras Damas do Estado e do Conselho contra a Fome e a Miséria no Ceará. criou dois importantes projetos: os ABC •s (Aprender, Brincar e Crescer) e o SOS Criança. Nesse mesmo período, chefiou a Delegação Brasieira no Seminário de PreYenção às Drogas e Elaboração de Projetos, realizado em Boston, nos Estados Unidos, e no 111 Encontro das Primeiras-Damas da América e do Caribe, em San José - Costa Rica. Em 1996, Patricia Saboya elegeu-se vereadora de Fortaleza, e, nas eleições gerais de 1998, foi eleita deputada estadual pelo PPS. Eleita senadora para o exercício de fevereiro de 2003 a janeiro de 20 li, Patrida Saboya assumiu várias funções no Congresso Nacional. Desde 2003, ela é vic&-Iíder do Governo no Senado e Coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente. Entre 2003 e 2004, foi integrante das Comissões de Assuntos Econômicos (CAE), Relações Exteriores (CRE) e Assuntos Sociais (00), além de ter exercido a presidência da CPMI da Exploração Sexual. O trabalho desenvolvido à frente da CPMI teve repercussão internacional.

o

abuso sexual contra crianças e adolescentes se dá, em 90% dos casos, dentro da família. Isso dificulta muito o trabalho de levantamento de dados, até porque quem é molestado por pai, tio, ou qualquer outro parente próximo, tem medo de denunciar o crime.

Quanto existe em orçamento do governo federal para combater os exploradores? Infelizmente, hoje os recursos estão espalhados em vários órgãos. Os recursos são insuficientes para um trabalho mais eficaz. O Sentinela, por exemplo, só atua em 350 cidades. É muito pouco num país que tem 5.507 municípios.

Como a sociedade civil pode atuar para combater mais eficazmente a ex­ ploração de crianças e adolescentes? A sociedade civil tem sido a nossa principal aliada no combate à vio­ lência sexual. É essa sociedade que tem mais experiência no combate aos exploradores. Temos que tirar o cha­ péu para as ONGs como a Humanos Direitos, que fazem um trabalho muito sério. No âmbito internacional, como andam as articulações contra a exploração sexual infanto-juvenil? No dia 9 de junho último, estive no Encontro Mundial de Mulheres Parlamentares, em Genebra, na Suí-

A senadora com o enviado especial da

revista ao Cearã, Beto Rezende

ça. Discutiu-se a exploração de crian­ ças, o tráfico de seres humanos e o envolvimento infanto-juvenil em conflitos armados. Os problemas são parecidos em todos os países. Veja a Itália: lá, as leis são muito duras, mui­ to rígidas, mas, paradoxalmente, é da Itália que vem o maior número de pessoas em busca de turismo sexual. Movimento Médico 5


Cremepe põe o pé na

estrada para conhecer os

problemas de Pernambuco

Em sua primeira etapa, a Caravana do Cremepe foi a 60 cidades das Matas Sul e Norte, Agreste, Região Metropolitana e Sertão Beto Rezende e Roberta Vasconcelos* 6 Movimento Médico


R

ealidades adversas

são

transformadas com ação. Com atitudes positivas. A gestão que hoje dirige o Cremepe acredita nisso. Ficar fechado em salas, atrás de birôs, de nada adianta. A realidade politica brasileira prova ISSO. Estar nas ruas, conversar com as pessoas, saber de seus problemas, po­ de ser o caminho para mudar o País, por mais que a palavra "mudar" não agüente mais ser tão manipulada. Ações concretas, com base na realidade, podem ajudar o nosso Estado a melhorar. A Caravana do Cremepe, que percorreu 60 cidades, se propõe a isso. Na primeira etapa, que terminou em junho, a Caravana viu coisas boas e coisas ruins. Tristes. Viu que em Santa Cruz do Capibaribe, por exemplo, existe uma máquina novinha de raio X. O leitor sabe por que ela não funciona? Porque não tem uma sala adequada para instalá-la, fato que já foi levado ao promotor do muni­ cípio. O Cremepe cobrou providên­ cias. Vai voltar à cidade do AgTeste para cobrar do prefeito que ele faça o aparelho funcionar. A Caravana do Cremepe também constatou que há hospitais caindo aos pedaços. O de Ribeirão, por exemplo, que os moradores chamam de "ma­ tadouro". Viu também crianças se prostituindo. Se nem tudo são flores, o Conselho constatou também que exis­ tem conselhos municipais de Saúde que estão bem vivos e participantes. Na mesma Santa Cruz do Capi­ baribe, Severino Felizardo, conse­ lheiro representante da comunidade de Santo Agostinho, acha que ações como as do Cremepe ajudam a mudar a realidade. "Essas visitas são de gran­ de valor. E u não sabia, por exemplo, que o Conselho Municpal de Saúde tinha tanto poder. Saí gratificado da reunião", afirma.

o presidente do Cremepe, Ricardo Paiva, e equipe, em Santa Cruz do Capibaribe

Trabalho começou pelo Sertão

o

Petrolina grupo se dividiu: uma parte foi à prefeitura da cidade para uma reunião com o prefeito, Fer­ nando Bezerra, o secretário muni­ cipal de Saúde, José Brito Veiga, e o representante do conselho municipal de Saúde, Rosalvo Antônio da Silva. Outra equipe foi fazer uma fiscaliza­ ção no hospital regional Dom Malan. Durante a reunião na prefeitura, Bezerra Coelho falou da aplicação financeira na área de saúde do mu­ nicípio; abordou os problemas da formalização dos contratos dos mé­ dicos; fez um histórico sobre o Pro­ grama de Saúde da Familia (PSF), explicando que a cobertura é de 53% e o PACS 60%. A meta, segundo ele, é atingir os IOO%. O prefeito eÀ'Plicou que enfrenta dificuldade para contratar médicos também do plantonistas.Falou interesse em construir um outro hospital e na intenção de transformá­ lo em uma unidade universitária. Quanto ao Dom l\1alan, que per­ tence ao município, Bezerra Coelho apresentou algumas melhorias reali­ zadas. Ele reclama a falta de ajuda por parte do Governo do Estado.

A equipe que foi fiscalizar ao Dom Malan constatou várias irregu­ laridades, entre elas a falta de gasime­ tria e ionograma na UTI, desqua­ lificando-a como unidade de terapia intensiva. Verificou-se que na U Tr a má­ quina de raios X está quebrada. Caso alguém precise de uma ultra-sono­ grafia, terá que ser removido para outro hospital. No setor de urgência pediátrica, não existe cardioscópio nem desfi­ brilador. Caso uma criança sofra uma parada cardíaca, estará correndo risco de vida, isso porque não existe mate­ rial para reanimação. No setor de urgência de adultos, existem pacien­ tes graves em estado de observação. Também se constatou uma demanda muito grande de pessoas em relação à estrutura oferecida pelo hospital. No final do primeiro dia da Cara­ vana, o presidente do Cremepe, Ri­ cardo Paiva, junto com o secretário estadual de Saúde, Gentil Porto, participou da posse da nova diretoria do hospital Dom Malan. Paiva falou sobre questões éticas (como abandonar o plantão antes do Movimento Médico 7


o conselheiro José Brasiliense, acompanhado da equipe, em conversa com representantes do Conselho Municipal de uma das cidades visitadas horário, ou chegar atrasado) de estudantes que assumem a função de médico e sobre a humanização da medicina. Ouricuri - Nessa cidade, houve contatos com o prefeito Francisco Coelho, e com a secretária municipal de Saúde, Maria do Carmo. De acordo com as informações repas­ sadas, o Programa Saúde da Família (PSF) tem cobertura de 75%. Faltam, segundo a prefeitura, cinco equipes para atingir os 100%. Ela se queixou das dificuldades encontradas, como, por exemplo, a falta de médicos que tenham resi­ dência fixa no município. O s diretores do Cremepe suge­ riram que haja definição das prio­ ridades do hospital regional, reflexão

o vice-presidente Carlos Vital e o conselheiro Mário Femando em entrevista a uma emissora de rádio durante a Caravana

8 Movimento Médico

sobre o papel do Conselho Municipal e a realização de treinamentos em ATLS e ACLS para os médicos. N a reunião com o conselho municipal de Saúde, os conselheiros apresentaram os problemas encontra­ dos no Hospital Regional de Ouri­ curi, como, por exemplo, a falta de profissionais, de estrutura e de von­ tade política para resolver questões urgentes. Segtmdo o Conselho, o hospital não tem perfil de hospital regional e não existem alta e média complexidades. Parnamirim - O terceiro dia da caravana visitou essa cidade, situada a 573 km do Recife. O grupo se reu­ niu com o prefeito Fernando Cabral e com a Secretaria Municipal de Saú­ de, Ioneide Maria. Ioneide disse que vai reorganizar o Plano Municipal de Saúde. A gestora acrescentou que a conuatação do PSF é feita pela cooperativa (CENlAM). Ela reclamou que o município não está recebendo do Ministério da Saúde o Kit PSF, e que, por isso, foi feito um convênio com o Lafepe para aquisição de medicamentos básicos. A secretária informou que o PSF faz um atendimento de apro­ ximadamente 80 pacientes/dia, e que a marcação de consultas no hospital tem o objetivo de descentralizar o atendimento.

A Secretaria de Saúde de Parna­ mirim desenvolve programas sociais. Entre eles, o Viver Terceira Idade. Cabrobó - Nesse município, a Caravana se reuniu com a secretária municipal de Saúde, Carmem Diana. Lá, a equipe de fiscalização encontrou uma médica boliviana exercendo me­ dicina ilegalmente. Essa suposta profissional atendia em um PSF, mas, segundo a secre­ tária, ela já estava sendo desligada do cargo. Carmem Diana explicou que o atendimento na área da saúde é precário porque só existem três PSFs, quando o ideal seriam doze. Isso de­ safogaria o hospital. A comunidade indígena do município é atendida por uma equipe multidisciplinar. Em reunião com representantes do Conselho Municipal de Saúde de Cabrobó, viu-se que faltam médicos no município. Outro problema grave é a falta de água tratada; uma equipe técnica para elaborar projetos tam­ bém é necessária. O Cremepe verificou que não existem políticas públicas que incen­ tivem médicos recém-formados a trabalhar no interior. Salgueiro- Era 10 de abril quando o Cremepe se reuniu com a prefeita da cidade, Cleusa Pereira. Ela


apresentou os projetos sociais que são desenvolvidos, como o programa que estimula o artesanato na região. Citou também o projeto de construção de uma adutora, que aguarda só o sinal verde da Compesa. Na Secretaria de Saúde de Sal­ gueiro, existe uma médica estrangeira trabalhando ileg-almente. Maria Go­ rete, secretária de Saúde, se compro­ meteu a regularizar a situação. Ela destacou que existem dez equipes do PSF, com 72% de cobertura local. Para melhorar o atendimento, são necessárias mais quatro equipes. A secretária mostrou os altos índices de violência contra a mulher. Disse que é necessana a im­ plantação de uma delegacia espe­ cializada. Os representantes do Conselho Municipal de Saúde informaram que o percentual aplicado em saúde é de 11 %, mas a previsão para este ano é 12%. Os conselheiros acrescentaram que falta humanização da medicina por parte dos profissionais dos PSFs e há carência de médicos. Sugeriram capacitar os profissionais dos postos de saúde da fàmilia já existentes. Belém do São Francisco Representantes do mUrllClpio disseram que não existe alta e média complexidades, e que há necessidade de enviar os doentes para outras cidades. Após a reforma do hospital, Belém do São Francisco entrará na Gestão Plena.

Relatório chega às

mãos do Governador

Ricardo Paiva e André Longo entregam ao governador Jarbas o relatório da Caravana

A

diretoria do Cremepe se reuniu com o governador do estado de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, para falar sobre o relatório da

Caravana do Cremepe. O presidente do Conselho, Ricardo Paiva, disse

que procurou saber qual o investimento do Governo Federal contra a

prostituição infantil e viu que no ano de 2004 dos R$ 34 milhões disponíveis

só foram liberados 30%. Outro problema, relatou Paiva, é que o Fome Ze­

ro não chega a todos, o que leva crianças à prostituição como forma de

conseguir alimento.

Ricardo Paiva solicitou ainda ao governador a assinatura do decreto pela inserção dos deficientes físicos no mercado de trabalho. Mas para os representantes do Cremepe que estavam presentes na

reunião a maior urgência e que precisa de medidas emergenciais é a pros­

tituição infantil. Jarbas, segundo disse Paiva, acrescentou que essa

questão tem que ser resolvida com ação eficaz, porque só indignação não

adianta.

Para o secretário estadual de Direitos Humanos, Elias Gomes, a ini­

ciativa do Cremepe foi louvável e salutar. Ele afirmou ser inconcebível a

situação em que se encontra o abuso sexual de menores, mas que o

governo não pode resolver sozinho e precisa do apoio de outras entidades

para que se chegue a uma solução.

Floresta - Aqui, o Cremepe se reuniu simultaneamente com a secretária mwucipal de Saúde, Ana O hospital da cidade é municipal. Elizabete, e com o Conselho Mu­ nicipal de Saúde. O maior problema Os representantes do Conselho de enfrentado na cidade, segundo a Saúde disseram ter dificuldades após Secretária, é a falta d ' água. Algumas a municipalização, pois a unidade de ruas estão há mais de quinze dias sem saúde atende a várias cidades ábastecimento. Existem três PSFs na vizinhas. Durante a visita à cidade, o cidade, um só para atender índios. Segundo Ana Elizabete, Floresta choque: prostituição infantil e muita violência contra mulheres. necessita de mais quatro PSFs.

Poucos casos, no entanto, são registrados. Serra Talhada e Triunfo - Essas duas cidades foram visitadas no mesmo dia pelo Cremepe. A rewUão com o Conselho Mwucipal de Saúde de Serra Talhada e com a Secretaria Municipal de Saúde dessa cidade Movimento Médico 9


Crime no asfa to Meninas de 10,11 e 12 anos são vítimas de exploração sexual Chico Carlos*

P

elo retrovisor do carro as imagens da geografia de nossa terr-a se confundem na poeira das estradas com as quais sonhamos. A Caravana do Cremepe - Conselho Regional de Medicina de Pernambuco - seguiu por canúnhos de sol e chuva, pcSqLú­ sando as condições sócio-econômicas e, principalmente, de saúde pública de pelo menos 60 municípios de nosso Estado. Cidades do Sertão, Matas Norte e Sul, Região Metropolitana do Recife e Agreste, na última fase do projeto, foram visitadas em mais de 60 dias pelos participantes. Estivemos em Belém de São Francisco, Floresta, São José do Egito, Afogados da Ingazeira, Triunfo, Custódia, Surubim, Carpina, Glória do Goitá, Limoeiro, :t\azaré da Mata, Timbaúba, Paulista, Goiana e Itamaracá. Vimos de perto os problemas na área de saúde. São quase tcxlos iguais nos municípios de Pernambuco. Os novos prefeitos, os secretários de saúde e os conselheiros mUlúcipais reclama­ ram de muita coisa. Desde o elevado índice de desemprego, passando pela violência urbana, saneamento básico, prostituição infàntil e má distribuição da água na rede de abastecimento. Muitos nem percebem que fàlta uma politica séria para a pessoa portadora de deficiência fisica. Um absurdo! Os gestores, especialmente aqueles do Ser­ tão que conversaram com as equipes da Caravana, queixam-se da "herança maldita" largada como um maior abandonado. Tudo para ser resolvido ontem. Doenças como tuberculose, leishmaniose, mal de Chag-as, DST, 10 Movimento Médico

A nudez infantil, em pintura de Balthus

hanseníase, diabetes, hipertensão, diar­ réia e infecções respiratórias fazem parte de uma rotina quase que comum nas cidades visitadas. Os hospitais re­ ionais estão entregues à própria sorte. Superlotação, equipamentos sucatea­ dos. Faltam remédios e profissionais de saúde de várias especialidades. Um cenário preocupante. Em algumas cidades, os Progra­ mas de Saúde da Fanúlia (PSFs) pas­

saram da E'lse de empolgação para en­ frentar seus dilemas no cotidiano. A rotatividade é marcante entre os mé­ dicos. A cobertura de atendimento atinge patamares recomendados pelo Ministério da Saúde. No entanto, o PSF precisa ser repen­ sado, antes que se torne inviável. A precarização do trabalho, a instabi­ lidade, a falta de pers­ pectiva provocam ques­ tionamentos aos traba­ lhadores da saúde. An­ damos por estradas si­ nuosas, trechos esbura­ cados e perigosos, onde a presença de PMs é uma necessidade impe­ riosa, principalmente de­ pois das 18h. Há um sopro de violência em muitas cidades. No en­ tanto, o que mais chocou os participantes foi a prostitlúção infantil. Pa­ rece uma doença in­ controlável. Meninas de 10, 11, 12 anos, são víti­ mas da exploração e de abusos seG.lais. Ganham R$ 5,00, R$ 10,00, R$ 15,00 por uma transa qualquer. Essas g-arotas deixa­ ram a infância e a adoles­ cência de lado há muito tempo. Foram envolvidas pelos "mercadores de ilusões" e impul­ sionadas pela fome, pobreza e \1Úséria social. São levadas a essa prática por condições e imposições sociais, pois em alguns casos tornam-se uma fonte de renda familiar. É preciso criar uma consciência de que os adultos têm de proteger as crianças. Em muitos casos, a ineficácia da fiscalização das autoridades policiais


e judiciárias em casas de shows, bares e boates de "beira de estrada" alavanca a prostituição infantil. fica bem claro: quem se envolve com a prostituição infàntil ou, pior, tàvorece essa prática, está in­ fi-ingindo duas legislações. A pri­ meira é o artigo 228 do Código Penal Brasileiro, que trata do favo­ recimento à prostituição. A pena prevista para esse crime é de até 10 anos de pl-isão. A outra lei é o Esta­ tuto da Criança e do Adolescente (ECA) - Lei 9.975/2000. Em seu artigo 244, diz que está sujeita a uma pena de quatro a 10 anos de re­ clusão, além de multa (que é deci­ dida pelo juiz), a pessoa que fa­ vorece a prostituição infantil, assim como o proprietário/ gerente do es­ tabelecimento onde ocorre o delito, que será interditado. O problema precisa ser combatido com informa­ ção, educação e melhorias na qua­ lidade de vida. O País ainda não conseguiu conter a prostituição de crianças e adolescentes pela vulnerabilidade social das vítimas e a impunidade dos responsáveis pela perpetuação desse crime. Quem não respeita uma criança ou adolescente, em sua fase mais efervescente de vida, me­ rece o repúdio e o desprezo de todos nós. Falta vontade poutica e ação dos governos federal, estadual e municipal na implementação de políticas de desenvolvimento regio­ nal, geração de emprego e renda. Porém, nem tudo está perdido ... As cidades pernambucanas têm tradi­ ção, riqueza cultural, arte e história para serem contadas. Tem um povo que sobrevive com intensidade e tei­ mosia. Esperança, otimismo e fé em nossa gente. ·Chico Carlos é jornalista

As reuniões com conselheiros, fiscais e Conselhos municipais foram uma constante na Caravana

aconteceu simultaneamente, quando se falou da necessidade de tratamento da água. A cidade tem altos índices de hepatite e dengue. Foi dito, durante a reunião, que o lixo hospitalar é enviado direto para o lixão.

São José do Egito e Afogados da Ingazeira - As visitas foram feitas no mesmo dia pela equipe da Caravana. Em São José do Egito, verificou-se que estudantes de me­ dicina exercem a profissão ilegal­ mente, principalmente no hospital Menino Jesus. Durante a reunião, foi citado que o Posto de Saúde da Família tem cobertura de 83 %, tem sete equipes e necessita de mais três. O prefeito da cidade, Evandro Valadares, traçou como pontos negativos o saneamento básico; a prostituição infantil; falta de

segurança; e abastecimento precário d ' água. Para ele, os pontos positivos estão relacionados ao funcionamento da saúde e à evolução do quadro educacinal. Em Mogados da Ingazeira, faltam profissionais nos PSFs. Lá, o contrato dos médicos é temporário, feito diretamente com a prefeitura. Os conselheiros municipais de saúde não recebem curso de capacitação.

Sertânia e Custódia - Foras as duas últimas cidades da primeira etapa da Caravana. Os problemas são semelhantes aos das outras cidades: faltam médicos, água tratada e saneamento. A prostituição infantil tem crescido, por conta do alto índice de desemprego das famílias; o alcoolismo é a fuga para muitos pais de família . Movimento Médico I I


HISTÓRIA

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, , pernambuco não é somente sol e mar. Pernambuco tem uma história que não pode ser contada sem se narrar o papel desempenhado pela cana e pelo açúcar". A frase do escritor Paulo Maranhão, no livro Cana de Açúcar e Engenho Bangiiê Coiem1ai, define bem a importância dos engenhos para o de­ senvolvimento do Estado. O cultivo da cana-de-açúcar foi introduzido no Brasil, no ano de 1522, por Martim Afonso de Souza, na capitania de São Vicente. Mas, foi em Pernambuco que ela floresceu, concorrendo apenas com a cultura do algodão nos séculos 18 e 19, e com o café, nos séculos 19 e 20.

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A experiência anterior dos portu­ gueses nos engenhos das ilhas do Atlântico, o solo propício, a abundân­ cia de mão-de-obra escrava e a expan­ são do mercado consumidor na Eu­ ropa foram os fatores principais para o sucesso da iniciativa. De acordo com Manuel Correia de Andrade, um dos maiores conhecedores da realidade nordestina, autor de Pernambuco Cinco Séculos de Coiem1Z11fão, no passado ha­ via mais de dois mil engenhos em Per­ nambuco. "As casas grandes ricas e bonitas retratam a riqueza gerada pela cultura canavieira", diz Andrade. Os engenhos eram unidades de produção de açúcar mascavo auto-su­

ficientes, compostas pela casa de en­ genho (local da maquinaria e instala­ ções fundamentais para a obtenção do açúcar e até de cachaça em alguns lu­ gares); pela casa grande (moradia da família proprietária); pela senzala (lar dos escravos); por uma pequena cape­ la; e por uma escola. Na propriedade, junto aos canaviais, existia uma parcela de terras reservada para o gado e roças de subsistência. O açúcar produzido em Pernam­ buco era exportado para o mercado europeu. O monopólio português so­ bre o açúcar assegurava os lucros con­ sideráveis aos senhores de engenho e à Coroa. E sse monopólio terminou


quando os holandeses começaram a produzir açúcar nas Antilhas, na se­ gunda metade do século 17. A concor­ rência e os limites da capacidade de consumo na Europa provocaram uma rápida queda de preços no mercado. Para completar, a Europa passou a usar a beterraba na produção de açúcar. Com o intuito de enfrentar a crise, o Brasil decidiu investir na construção de ferrovias e na modernização dos engenhos de açúcar. Nas últimas dé­ cadas do século 19, os proprietários mais ricos compraram máquinas para a produção do açúcar cristal. Esses engenhos modernos foram chamados de engenhos centrais e usinas. Os en­

genhos centrais, do ponto de vista téc­ nico, não tinham diferença das usinas, mas sim do ponto de vista econômico: geralmente pertenciam a uma socie­ dade, não possuíam terras e não de­ senvolviam atividades agrícolas. Primeira usina - A primeira usina implantada em Pernambuco foi a de São Francisco da Várzea, cuja pri­ meira moagem aconteceu em 1875. Pernambuco já chegou a ter mais de cem usinas. Atualmente, existem cerca de 40, algumas, inclusive, encontram­ se desativadas. "Pernambuco perdeu o domínio da exportação do açúcar para Alagoas, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Goiás, que têm mais condições de produção. Mesmo concorrendo com a produção do su­ deste e do Centro-Oeste, ainda ex­ porta o produto para os Estados Unidos", afirma Andrade.

o

Turismo Rural - Com o fim da monocultura canavieira, a maioria dos engenhos virou fazendas, outros se tornaram assentamentos. A exemplo do Engenho Barra Azul, em Bonito (Agreste, a 136 km do Recife) e do Engenho Serro Azul, em Palmares (Mata Sul, 118 km da capital), onde hoje vivem mais de 200 farrúlias de assentados. Segundo o escritor de Vich de engenhos: estórias e hút6rias, José Au­ gusto Carneiro Leão, quase todos os engenhos foram totalmente destruí­ dos. "Não sobrou muito dos tempos áureos do açúcar em nosso Estado. As casas grandes dos engenhos foram quase todas destruídas; algumas das que restaram foram tombadas pelo Patrimôrúo Histórico. Espero que, com a exploração do turismo rural, boa parte da história de Pernambuco seja recuperada", comenta. Os engenhos de Pernambuco tor­ naram-se um forte atrativo cultural e vêm motivando a visitação de grupos turísticos interessados na reconstitui­

geógrafo Manuel Correia de Andrade,

que nasceu no engenho Jundiá, em

Vicência

ção da história colonial. De olho nesse mercado, os proprietários de engenho, mesmo investindo em pecuária e nou­ tras culturas, passaram a recuperar a estrutura básica da arquitetura cana­ vieira: casa da moenda, casa grande, capela, senzala e casa de purgar -local onde eram feitos .os pães de açúcar. Uma alternativa rentável para eles, uma boa pedida para quem busca via­ jar no tempo e fugir do agito da cidade grande. A casa grande do Engenho Barra Azul, foi transformada em pousada com o objetivo de explorar o turismo rural. Uma iniciativa que já virou ten­ dência no Estado. O lugar oferece ba­ nho de cachoeira e de bica, além de trilha dentro da Mata Atlântica. A Fa­ zenda Engenho Cordeiro, localizada entre Carpina e Lagoa do Carro, a 63 km da capital, abriu literalmente as porteiras para receber turistas. O seu hotel-fazenda conta com suítes luxuoMovimento Médico 13


Em suas obra Minha Formação , Joaquim Nabuco referia-se aos engenhos com grande emoção

Casa-grande do Engenho Bonito, Nazaré da Mata. Abaixo, detalhe da Casa-grande do Engenho Santa Fé, na mesma cidade

sas em meio ao clima bucólico. O con­ junto arquitetônico do lugar data de 1867, típico do Brasil Colonial. Outra boa oportunidade de vive nciar uma parte da história de Pernambuco na época do apogeu do ciclo da cana-de­ açúcar está em VIcência (Mata Norte, a 87 km do Recife). O Engenho Poço Comprido, si­ tuado no município, foi totalmente re­ cuperado pelo Governo do E stado. A importância do engenho deve-se ao ['1­ to de ser o único exemplar remanes­ cente do século 18 no Estado e ter se­ diado a última reunião do Conselho do Governo da Confederação do Equa­ dor, em 1825, com a participação de fl-ei Caneca, um dos líderes da revo­ lução. Além de ser o único que possui um pelourinho. O seu casarão abriga a exposição '~ç úcar: Mostra do Enge­ nho Poço Comprido", onde painéis fotográficos retratam a época do açúcar e dos engen hos de Pernambuco. O Engenho Jundiá, também loca­ lizado em VIcência, berço do escritor Manoel Correia de Andrade, oferece prática de rapel e de vôo livre. Em Na­ zaré da Mata, a 74 km da capital pernambucana, foi implantado o pro­ grama de turismo rural no Engenho Santa Fé, construído no início do sé­ culo 20 para a produção de açúcar 14 Movimento Médico

mascavo e aguardente. A visita ao en­ genho permite vivenciar um pou co da história da atividade açucareira, atra­ vés de algumas instalações originais que foram preservadas. O Santa Fé também dispõe de diversas opções de lazer, além de atividades culturais e pedagógicas. No Cabo de Santo Agostinho, a 40 km do Recife, encontra-se o antigo Engenho Massangana . A casa­ grande original foi reconstruída no es­ tilo neoclássico, vigente no século 19, e restaurada recentemente. O cOI~unto arquitetônico foi tombado pelo Patri­ mônio Histórico e Artístico de Per­ nambuco e denominado de Parque Nacional da Abolição, em homena­ gem ao abolicionista Joaquim N abu­ co, que lá morou até os 8 anos de ida­ de. Em seu livro M inha Formação,

Nabuco refere-se muitas vezes, com emoção, às edifIcações e paisagens do lugar. Hoje, o Engenho Massangana pertence à Fundação Joaquim Nabu­ co, funcionando como centro de estu­ dos e pesquisas. Um espaço sem simi­ lar no Nordeste do Brasil, para o de­ senvolvimento de ações científicas e culturais, com um a capacidade de hospedagem para 28 pessoas, dispon­ do de uma biblioteca de referência, au­ ditório e equipamento de apoio. J á o Engenho Casa Forte, que deu origem ao bairro de mesmo nome, na zona norte do Recife, foi cenário de um dos mais sangrentos combates en­ tre holandeses e portugueses, no dia 17 de agosto de 1645. O engenho per­ tencia à matriarca Ana Paes, uma das figura s mais respeitadas e polêmicas do período holandês em Pernambuco. O local foi um dos pontos centrais do processo de povoamento da região. No livro Arredores de Recift, do histo­ riador Pereira da Costa, consta que o terreno era uma das melhores proprie­ dades agócolas do Estado, pela sua vantaj osa situação, com matas, terras, vales férteis e facilidade de co mu­ nicação fluvial com a Praça do Recife. Do engenho, resta apenas a antiga ca­ pela que se tornou a matriz de Casa Forte, uma bela opção de visita. A


antiga casa de Ana Paes, conhecida como Casa Forte, onde foi instalado o Colégio da Sagrada Família, teve sua estrutura toda modificada. Na entrada da cidade de Cama­ ragibe, Região Metropolitana, ainda encontra-se habitada e totalmente recuperada a casa grande do Enge­ nho Camaragibe, tombada pela Fun­ darpe. O engenho de açúcar começou a funcionar em 1549 e foi menciona­ do por Duarte Coelho em carta ao rei de Portugal, Dom João III. Assim como esses engenhos citados, outros também contribuíram para o cresci­ mento da economia do Estado, do sé­ culo 16 ao 20, e estão abertos à visi­ tação. Vale a pena uma excursão por esses paraísos hiStÓI;COS e culturais. *Etiene Bahé é jornalista

Um pouco mais sobre engenhos

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Duarte Coelho Pereira trouxe da Ilha da Madeira, em 1553, a chamada cana Cl;oula, que, durante três séculos, foi cultivada em Pernambuco. No início do século 19, a cana crioula foi substituída pela cana caiana, trazida pelos portugueses da Guiana Francesa. Só depois surgiram as variedades híbridas, oriundas das Antilhas, da Índia e da Indonésia. Os engenhos de açúcar eram movidos a tração humana, como as casas de iàrinha. Depois, evoluíram para a tração animal e para os engenhos d'água. Só a partir do século 19 é que foram introduzidos em Pernambuco os engenhos movidos a vapor.

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SERViÇO Engenho Barra Azul

Bonito / PE

3737 -0705 (Prefeitura)

Fazenda Engenho Cordeiro

Carpina - PE

3621-8188/ 9984-1056

www.ruccultural.adm.br

Engenho Poço Comprido

Vicência - PE

3641-1156

pmv@vianet.com.br

Engenho Judiá

Vicência - PE

9984-3096 / 9982-61 I I

Engenho de Lazer Santa Fé

Nazaré da Mata/PE

(81) 3633-1254

www.profmedeiros.com/santafe

Engenho Massangana

PE 60 km 10

Cabo de Santo Agostinho/ PE

3527- 4025

Matriz Casa Forte

Praça de Casa Forte,

Recife - PE

Engenho Camaragibe

Entrada da cidade de Camaragibe

IOkm do Recife

A cana-de-açúcar é plantada na Zona da Mata de Pernambuco, na chamada zona canavieira, há quase cinco séculos. A área cultivada tem cerca de 12 mil km2 , fica situada próxima ao Oceano Atlântico, possui solos ricos para a agricultura, onde não há ameaças de seca, e os rios são perenes.

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A zona canavieira pernambucana já teve uma boa malha ferroviária, composta pelas ferrovias da antiga Great vVestern (companhia que construía estradas de ferro no Brasil, criada em 1872 por capitalistas ingleses) e pelos ramais construídos pelas usinas para o transporte da cana. A partir de 1960, as ferrovias ficaram abandonadas, sendo substituídas pelas rodovias. 0s senhores de engenho sempre participaram das decisões políticas do país. Os representantes das câmaras e senados er-am pessoas ligadas aos engenhos. Vál;OS governadores foram senhores de engenho ou usineiros: Herculano Bandeira, Manoel Borba, José Bezerra, Estácio Coimbra, Carlos Lima Cavalcanti. Outros são netos ou filhos de senhores de engenho: Moura Cavalcanti, Paulo Guerra, Joaquim Francisco e Jarbas Vasconcelos, governador atual.

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As famílias tradicionais pernambucanas vêm todas do ciclo da cana: Souza Leão, Holanda Cavalcanti, Rego Barros, Paes Barreto, Vanderlei, Cunha, entre outras.

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Tabataupé de Flores: Maior engenho de Pernambuco, com 2.400 hectares, localizado em Nazaré da Mata. Movimento Médico 15


I

CIENTIFICA

Pesquisas com células-tronco são polêmicas no mundo todo

Entre a religião e a ciência, as polêmicas células-tronco Longe de terminar, essa discussão ainda vai gerar muito assunto na mídia Nathalia Duprat*

16 Movimento Médico

escobertas pela ciência há vários anos, as células-tron­ co nunca estiveram na mí­ dia tanto quanto agora. De cientistas e médicos a advogados e re­ ligiosos, a sociedade inteira está envol­ vida em uma grande discussão sobre as possibilidades - e suas implicações ­ apontadas pelo uso das células-tronco na cura de um grande leque de doenças. Mas para chegar até esta questão, é preciso entender primeiro o que de fato são células-tronco. Células-tronco nada mais são que células "curingas", capazes de se trans­ formar em qualquer tecido do corpo humano. Tais características, junto com sua capacidade de auto-replicação (podem gerar cópias de si mesmas), acabou por transformá-las em um grande objeto de estudo dos pes­ quisadores, que acreditam que as células-tronco podem, no futuro, funcionar como substitutas de tecidos doentes, como nos casos de Mal de

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Alzheimer, Mal de Parkinson, defi­ ciências cardíacas e doenças neuro­ musculares, ou ainda no lugar de célu­ las que o organismo deixa de produzir, como no caso de diabetes. A grosso modo, elas podem ser classificadas como embrionárias ou adultas. As células-tronco embrionárias (denominadas de totipotentes) surgem quando o óvulo é fecundado e duram apenas cinco ou seis dias de vida, até transformarem-se em blastócitos; du­ rante este período, elas têm a capacidade de gerar todos os 216 tecidos do corpo humano, dando origem ao organismo. Já as células-tronco adultas (pluri­ potentes), - encontradas apenas em alguns tecidos como medula óssea, san­ gue e cordão umbilical - têm capacida­ de limitada para originar novos tecidos (estes ainda não totalmente conhecidos pelos pesquisadores). E é justamente a diferença entre estes dois tipos de células-tronco que vem causando uma grande polêmica.


Momento de operação com células­ tronco

Isto porque as células adultas, ape­ sar de já estarem sendo usadas com muito sucesso em técrucas inovadoras de reconstituição, por exemplo, de ner­ vos lesionados, têm um poder limitado em vista das células embrionárias. Mesmo as células-tronco recolhidas do cordão umbilical (consideradas de mais qualidade que as demais) que podem, no futuro, ser utilizadas para a cura de algumas doenças e lesões, não têm a capacidade de uma célula embrionária. O que ocorre, no entanto, é que as células embrionárias só podem ser obtidas até o quinto dia de vida dos embriões - sejam dos excedentes des­ cartados em clinicas de fertilização por não terem qualidade ou terem sido con­ gelados há muito tempo, seja através da clonagem terapêutica, condenada por alguns religiosos como sendo um passo para a clonagem humana. Essa associação, entretanto, é feita equivocadamente, pois a clonagem te­ rapêutica nada mais é que um apri­ moramento das técrucas hoje existen­ tes para cultura de tecidos, que são realizadas há décadas. Explicando melhor, o processo consiste em pegar uma célula, retirdf seu núcleo e colocá­ la num óvulo sem núcleo. Quando ela

começar a se dividir, dará origem a células-tronco com a capacidade de se diferenciar em todos os tecidos hu­ manos. Este seria um grande passo para o avanço da medicina, pois uma pessoa que sofresse lesões em um aci­ dente, por exemplo, poderia ter sua medula recuperada - ou qualquer ou­ tro órgão afetado - sem risco de reJeIção. A clonagem humana, por sua vez, é um processo mais complexo, pois apesar do processo de transferência de núcleos ser o mesmo, é necessário que o óvulo utilizado seja implantado no útero de uma mulher - o que não acontece na clonagem terapêutica, uma vez que os embriões utilizados têm o único propósito de gerar tecidos. Esse ponto também tem sido combatido por uma grande parcela da sociedade, que considera o uso dos embriões com este fim como um atentado à vida. Segundo os pesqui­ sadores, entretanto, esta é mais uma visão errada, já que os embriões utilizados seriam normalmente des­ cartados, não chegando a gerar um feto. Para a lei brasileira, no entanto, essa questão ainda está em discussão.

Em 24 de março deste ano, a Lei da Biossegurança liberou (para fins de pesquisa) a utilização de células-tron­ co de embriões por fertilização in vitro, desde que estes não sejam aprovei­ tados para gerar uma gravidez, sejam inviáveis para o desenvolvimento no útero ou estejam congelados por pelo menos três anos. No último dia 30 de maio, en­ tretanto, o então procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, ingres­ sou no Supremo Tribunal Federal com uma ação de inconstitucio­ nalidade contra a Lei da Biossegu­ rança, alegando que o uso de em­ briões, ainda que considerado por al­ guns cientistas como "um pequeno amontoado de células", contraria o princípio constitucional da "inviola­ bilidade do direito à vida", uma vez que "a vida humana acontece na, e a partir da, fecundação", explica o procurador. Longe de terminar, essa discussão promete gerar ainda muito assunto na mídia. Enquanto isso, a sociedade espera para saber se as cé­ lulas-tronco são, ou não, o grande trunfo da medicina do futuro. *Nathalia Duprat é jomalista.

Movimento Médico 17


CREMEPE epois de realizar, por dois dias, blitzen em hospitais e unidades de saúde do Recife no final do último mês de junho, o Cremepe encaminhou ao Ministério Público (MP) oDcios, pedindo providências imediatas, para melhorar o atendimento nas unidades visitadas. O oDcio endereçado à promotora titular da Promotoria de Saúde do Mi­ nistério Público de Pernambuco, Iva­ na Botelho, faz um encaminhamento da relação dos pacientes que neces­ sitam de tratamento intensivo com ur­ gência. No total, foram encontrados 33 pacientes que necessitavam de inter­ namento em UTI. A equipe do Cremepe (composta por médicos, advogados e coletores de

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dados), que contou com o apoio de re­ presentantes do Sindicato dos Médi­ cos, foi acompanhada por repórteres, cinegrafistas e fotógrafos de todos os veículos de comunicação, devidamente credenciados pelo Conselho. Foram visitados os hospitais Aga­ menon Magalhães (HAM), Oswaldo Cruz (HUOC), Otávio de Freitas (HOF), além das policlínicas Arnaldo Marques, no Ibura, e Amaury Cou­ tinho, na Campina do Barreto. No HUOC e na policlínica da Campina do Barreto, os jornalistas não tiveram problemas para ter acesso às emergências. Já no HAM, HOF e no Ibura, houve resistência por parte dos seguranças das unidades e dos chefes dos plantões. Para o presidente do Cremepe, Ricardo Paiva, as unidades

Cremepe surpreende e faz visitas em hospitais e clínicas Asituação nessas unidades hospitalares é preocupante, na avaliação do Conselho Joane Ferreira*

que não permitiram a entrada da imprensa devem ter algo a esconder. "Isso não pode acontecer. O que eles fizeram foi cercear o trabalho da imprensa, o que é um absurdo. Lá dentro deve ter algo de muito grave para que a entrada dos repórteres seja proibida", completou Paiva. Mesmo com o abuso de autoridade dos seguranças, os assessores de im­ prensa do Cremepe filmaram e foto­ grafaram os locais por onde a equipe de fiscalização passou, disponibilizando o material às TVs e jornais credenciados.

Constatações - Nas duas únicas emergências cardiológicas da Região Metropolitana, HAM e HUOC, mantidas pelo Estado, foi encontrada uma quantidade de doentes equivalente ao dobro da capacidade. Parte deles, inclusive, correndo risco de morrer por fàlta de atendimento adequado. A emergência cardiológica do HAM foi comparada, pelos médicos, a "um hospital de campanha" (como em situações de guerra), segundo o presidente do Sindicato dos Médicos, André Longo. Todos os 20 leitos estavam ocupados e 13 pacientes ainda estavam em macas, no mesmo espaço, além de outras oito pessoas em bancos. No HOF, fàltam equipamentos pa­ ra atender pacientes de trauma, como desfibriladores; o número de auxiliares de enfermagem nos leitos de observação é insuficiente; e existe excesso de pacientes na emergência. Entre os pro­ blemas mais graves, está o fato dos res­ ponsáveis pelo plantão serem obrigados a atender qualquer ocorrência no hos­ pital. "Se chegar alguém grave, pode até morrer por falta de atendimento", ob­ serva Dirceu de Lavor, um dos repre­ sentantes do Cremepe na fiscalização. A Policlinica Amaury Coutinho, na Campina do Barreto, administrada pe­ la Prefeitura do Recife estava com um mau cheiro insuportável. A equipe de


limpeza, que é terceirizada, não havia feito o traballio da tarde. Pacientes ten­ tavam, em vão, realizar exames de Raio-X. Lá, é um dos poucos serviços que tem ortopec:lista de plantão, mas a máquina de raio X estava quebrada há duas semanas. Uma mulher, na tenta­ tiva desesperada de amenizar a dor da sua mãe, tentava aplicar uma injeção.

Lençóis sujos e falta de cadeiras para uma simples aplicação de injeção, fo­ ram outros problemas encontrados. A Policlinica, que tem capacidade para atender 150 pacientes porc:lia, está rea­ lizando, atualmente, cerca de 500 atendimentos. Na policlínica do Ibura, as conc:li­ ções de higiene também são precááas,

faltam lençóis e, na emergência de pec:liatáa, há muitas goteiras no teto. Essa fiscalização realizada pelo Conselho e Sinc:licato dos Méc:licos, como um complemento da Caravana que foi realizada no inteáor, vai se re­ petir em outros hospitais administrados pelos governos estadual e municipal, informa a diretoria do Cremepe.

Feira do Bem ajuda entidades Promovido para colaborar com instituições sociais apoiadas pelo Cremepe, evento já caminha para sua quinta edição

Grande variedade de produtos pode ser encontrada na Feira do Bem

D

esde a sua pámeira edição, em dezembro de 2003, a Feira do Bem já demonstrava que seáa um evento crescente e com continuidade. Realizado no estacionamento do Cre­ mepe e com 60 barracas, na época o evento recebeu centenas de visitantes, gerou bons lucros para os comer­ ciantes e garantiu ótimos percentuais para as entidades sociais. Com o resultado da primeira, os organizadores da Feira resolveram le­ vá-la para um lugar onde o grande pú­ blico tivesse mais conforto. O lugar es­ colhido foi o Círculo Militar do Reci­ fe. No local, foram realizadas a segun­ da e a terceira edições do evento. E o sucesso se repetia: novamente, o nú­ mero de visitantes superava as expec­ tativas, aumentando, assim, a quantia doada às instituições beneficiadas. ']á para a IV ec:lição da Feira do

Bem resolvemos ousar ainda mais", re­ vela o coordenador do Centro de Es­ tudos Avançados do Cremepe (CEAC),jurandir Brainer, responsável pela realização do evento. "Dobramos o número de barracas (120) e c:liversifi­ camos ainda mais os produtos comer­ cializados", festeja Bramer. O local tam­ bém foi mudado. As entidades assis­ tidas com a Feira conseguiram o Clube Portui,'1.1ês do Recife como sede nos c:lias 26 e 27 de abril deste ano. Além das barracas que dispõem dos mais diversos tipos de produtos ­ artesanato, roupas, bijuteáas, bolsas, velas, perfumes e alimentos, - as entidades sociais também expõem os seus produtos. São camisetas, canetas e chaveiros com a marca de cada uma, além de roupas, sapatos e bolsas que são venc:lidas em forma de brechó. '1\ l<êira do Bem é muito importante para

as entidades, não só do ponto de vista financeiro, já que nós sobrevivemos de doações, mas também por conta da divulgação que podemos fazer do nosso trabalho", conta Nailda Valença, presidente da Associação Pernam­ bucana de Apoio aos Doentes de Fígado, uma das entidades beneficia­ das com evento. 'Y\lgumas entidades foram cáadas há pouco tempo e ainda são pouco conhecidas. Mostrando o nosso trabalho na feira conseguimos ter credibilidade, e isso tem aumen­ tado, significativamente, o número de doadores e voluntários", acrescenta. Em todas as edições da Feira do Bem, os visitantes puderam assistir apresentações de cantores regionais, gTUpOS de dança, maracatu, teatro, entre outras atrações.(JF)

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*Da Assessoria de Imprensa do Cremepe.

Movimento Médico 19


Representantes do Ministério da Saúde e de outras entidades participaram do seminário, no Recife

Especialistas discutem direitos

sexuais e reprodutivos da mulher

uma realização do Conselho Re­ gional de Medicina de Pernam­ buco (Cremepe), especialistas discuti­ ram alternativas para substituir a exi­ gência do boletim de ocorrência (BO) por outro documento que permita a realização de abOlto em casos de estupro na rede pública de saúde. Representantes do Cremepe, Mi­ nistério da Saúde, Conselho :Federal de Medicina, Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, Federação Latino-Americana de Ginecologia e Obstetrícia, OAB, Rede l<êminista de Saúde e Articulação de Mulheres Brasileiras participaram do seminário sobre políticas de direitos sexuais e re­ produtivos da mulher. No dia 22 de março deste ano, o Ministério da Saúde lançou uma nor­ ma técnica que autoriza os serviços médicos a realizar abortos em caso de estupro, sem a apresentação do bole­ tim de ocorrência. Segundo o Minis­ tério, a medida está de acordo com o Código Penal, que não exige BO ou qualquer instrumento para que sep

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realizada a interrupção da gravidez nos serviços públicos. O presidente do Cremepe, Ricardo Paiva, ressaltou a importância desse debate no momento atual. "Temos que encarar o tema de frente. Temos que parar de tratar o as­ sunto com tanta hipocrisia. As mulhe­ res estão morrendo disso", destacou Paiva, na abertura do evento. Para o juiz de direito José Hen­ rique Torres, que participou do semi­ nário, a assistência médica para a rea­ lização do aborto, quando a gravidez resulta de violência sexual, é um direi­ to da mulher. Ele diz que a exigência prévia do boletim de ocorrência é in­ constitucional e desnecessária. "Ne­ nhuma vítima de estupro, ou de qual­ quer outro crime, está obrigada a co­ municar o fato à autoridade policial, ainda que tal providência seja reco­ mendável", esclarece. O juiz citou, durante a sua pa­ lestra, a Conferência do Cairo, de se­ tembro de 1994. Entre outras coloca­ ções, o texto diz que o aborto não deve ser usado para planejamento familiar,

mas a mulher deve ter atenção médica quando optar pelo aborto. ''Abandonar a mulher à própria sorte, com todas as complicações que um aborto mal feito pode trazer, é crime. Tem que ser da­ do acolhimento, apoio emocional, ga­ rantir o sigilo e conversar sobre o futu­ ro reprodutivo", cita o texto da Con­ ferência. José H enrique também mos­ trou gráficos onde, nos países que ade­ riram à Conferência do Cairo, a mor­ talidade materna diminuiu até 60% no período de uma dois anos '*, . O vice-presidente do Cremepe, Carlos Vital, afirmou que, do ponto de vista jurídico, é preciso avaliar formas de dar segurança ao médico que se propõe a praticar o aborto sem exigir documentação, como a aná lise da história da agressão da vítima. Na opinião da coordenadora da área técnica de saúde da mulher do Ministério da Saúde, Maria José Araújo, a política nacional de direitos reprodutivos não propõe a legalização do abOlto. "O que o Ministério está fazendo é uma norma que cumpre o


código penal, não exigindo o BO", informa ela. Mana José diz ainda que, para garantir mais segurança, o médico deve estimular a vítima de violência a registrar a ocorrência, com O objetivo de denunciar o agressor e processá-lo criminalmente. Aníbal Faundes, presidente da Federação Latino Americana de Ginecologia e Obstetncia (Flasog), defendeu que as entidades médicas e o Ministério da Saúde devem chegar a um denominador comum, que seja o melhor, para meU10rar o atendin1ento à saúde da mulhel~ "Os profissionais de saúde que atendem mulheres devem ser capacitados de uma forma que recebam as pacientes da maneira mais humanizada possível. Num momento pós-violência, que a mulher acabou de sofrer, ela precisa de acolhimento, atenção e orientação", concluiu o presidente da Flasog. Também falaram sobre o assunto os representante do ministério da Saúde, Cristão Rosas e Tereza Campos; o co­ ordenador do Seminário, Rivaldo Mendes, e o presidente do CFM, Ed­ son Andrade, que no começo do semi­ nário se mostrou a favor do BO para que seja realizado o aborto, mas, após lhe ser apresentado um parecer judicial do CFM esclarecendo que não é obri­ g-atórÍa a existência de um boletim, não mais se posicionou contra a prática do aborto sem o documento. Durante o evento uma equipe de jornalistas do JC on Line entrevistou vários especialistas no assunto para, no mês seguinte, publicar um especial que está disponível em wW'vv2.uol.com.brZfClsites/abortolhome.htm. A reportagem traz opiniões de mé­ dicos, advogados, religiosos e femi­ nista s, denúncias de compra de medicamentos abortivos, além de gravações com os entrevistados. "Outras informações sobre a Conferência do Cairo em www.redesaude.org.br/html/cairo.html.

Projeto Médico-Cultural

do Cremepe

Cremepe, em parceria com a Caixa E conômica Federal, realiza periodicamente o Projeto Médico Cultur-al. Com o objetivo de promover a interação entre as entidades médicas, seus associados, familiares e estudantes de medicina, além de contribuir com a humanização da medicina, o Projeto desenvolve atividades nas áreas de teatro, música, dança, literatura, artes plásticas e fotografia . Nas edições anteriores do evento, já foram realizados shows como o poético-musical A Bossa NO'Va e outras Bossas e peças teatrais, entre elas O Ano do Coelho. O s pacientes também já mostraram seus dons artísticos com exposições de fotografias e desenhos, entre diversas outr-as apresentações artísticas e culturais. No m ês de agosto passado, o Projeto Médico Cultural apresentou o espetáculo Dor:Expressão e Superação pela Arte. N a oportunidade, se apresentaram os grupo de dança em cadeira de rodas, de J oão Pessoa, e o de Mulheres Mastectomizadas do Hospital do Câncer. O Grupo de Trabalho em Prevenção Positivo (GTP) ainda encenou um esquete sobre prevenção do HIV O Projeto Médico Cultural tem o patrocínio da caL'{a Econômica Federal e é realizado sempre na Academia Pernambucana de Letr-as.

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Pareceres CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE PERNAMBUCO - CREMEPE PUBLICAÇÃO DE PENALIDADES PÚBLICAS Ref. Prcx:esso Ético Profissional n.o 22/00 EDITAL DE APLICAÇÃO DE PENALIDADE DE CENSURA PÚBLICA EM PUBLICAÇÃO OFICIAL PENA DISCIPLINAR APLICADA AOS MÉDICOS DR. LUIZ OTÁVIO NOGUEIRA DASILVA-CREMEPE N"7.040; DR. SIDNEY DE SOUZA RIBEIRO - CREMEPE N° 10.543 E DR. ALBERTO MAGNO SANTOS BAGml - CREMEPE N° 3.837 O CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE PERNAMBUCO ­ CREM EPE. no uso de suas atribuições que lhe confer'e a Lei n.o 3.268/57, regulamentada pelo Deueto n.O44.045/58, e em conformidade

e Editais

com o A:órdão pr"Oferido nos autos do PEP n.o 22/00, julgado em Sessão Plenária Da 7a Câmara do Tribunal Superior de Ética Médica do Conselho FederClI de Medicina, realizada em 13 de Janeiro de 2005, vem aplicar aos médicos DR. LUIZ OTÁVIO NOGUEIRA DA SILVA ­ CREMEPE N° 7.040; DR. SIDNEY DE SOUZA RIBEIRO - CREMEPE N° 10.543 E DR. ALBERTO MAGNO SANTOS BAGml - CREMEPE N° 3.837, a pena de CENSURA PÚBLICA EM PUBLICAÇÃO OFICIAL, prevista na letra "C' do art. 22, da Lei 3.268/57, por terem os mesmos cometido as infrações previstas nos arts. P . 8°, 16°,21°,56° e85° do Código de Ética Médica. Recife, 20 de Maio de 2005. Ricardo de Albuquerque Paiva Presidente do CREMEPE

Movimento Médico 21


Waldir Araújo Cardoso (em pé), da Fenam, esteve presente ao encontro

Médicos e estudantes compareceram em bom número

Um bom público esteve discutindo o SUS no Park Hotel, em Boa Viagem Por Chico Carlos* Ministério da Saúde e organização do Sindicato dos Médicos, do Conselho Regional de Medicina de Pernam­ buco e dos Diretórios Acadêmicos de Medicina das UFPE e UPE. Os debates aconteceram nos horários da manhã e da tarde, no Park Hotel, Pracinha de Boa Viagem, com a participação de entidades nacionais e de movimentos que atuam na saúde brasileira, tais como gestores do SUS e de controle social, professores universitários, sindicatos médicos e estudantes de medicina. O presidente da platéia na discussio sobre o SUS da Fenam, \Val­ dir Cardoso, dis­ se que ficou en­ tusiasmado com o resultado do Fórum no Reci­ fe, porque foi conseguido, na prática, consoli­ dar a articulação

oi realiza.do no !<-e.cife o Fórum Sistema Uruco de Saúde, [SUS] Educação Médica e o Mundo do Trabalho . O evento foi promovido pela Federação Nacional dos Médicos [Fenam] e a Direção E xecutiva N acional de Estudantes de Medicina [Denem] com o objetivo de avaliar a situação do SUS, da formação do médico com as necessidades da população brasileira, buscando es­ tratégias para sua consecução. O Fó­ rum SUS contou com o apoio do

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política entre o movimento sindical e o movimento estudantil. Basicamen­ te, essa consolidação foi no campo das idéias durante os debates de temas de interesse da categoria médica, dos estudantes e dos gestores do SUS, quando foram apresentadas propostas e encaminhamentos relevantes. "Na verdade, o fundamental foi a troca de conhecimentos, informações e experiências entre as lideranças dos dois movimentos. Acredito que o resultado foi estimulante para todos nós, com um horizonte de trabalho conjunto daqui. pra frente" disse. Para o Coordenador Geral da Denem, Luiz Nicolodi, o evento colocou na ordem do dia questões importantes em discussão, princi­ palmente em relação à formação e ao mundo do trabalho. Para ele, o desafio agora é pactuar uma agenda que não apenas viabilize o Fórum como pontual, porém, que haja des­ dobramentos efetivos. Ou seja, uma aproximação mais intensa entre as entidades, tentando discutir a questão do SUS e os entendimentos nos seg­ mentos do trabalho e da formação do ensino médico. De acordo a representante do Ministério da Saúde, Laura Fowe­ vert, o Fórum SUS expressou uma oportunidade interessante para se fazer uma avaliação de vários aspectos na politica, com os estudantes e as entidades médicas. "Trata-se de um público privilegiado para aprofun­


Reforma Sindical é

debatida no Recife

darmos a cooperação e a Im­ plementação de uma série de inicia­ tivas que são importantes para a qualificação do sistema", ressaltou . O presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal do Recife, Mozart Sales, destacou que o encontro discutiu perspectivas impor­ tantes do mundo do trabalho e de mudanças na formação médica. Ele frisou que nos últimos seis anos hou­ ve um aumento de 50% de escolas médicas no País; o que vai trazer grandes repercussões para o futuro do exercício da profissão. "É preciso que as entidades médicas e estudantis ampliem esse debate com objetivo de analisar, aprofundar e enfrentar os desafios futuros . Os próximos cinco e dez anos serão cruciais para todos nós" afirmou Sales. Na opinião da representante do Diretório Acadêmico de Medicina Umberto Câmara Neto/UFPE e da Regional Nordeste 2 da Denem, Lúcia Rühr, foi bastante positivo pelo envolvimento e aproximação entre as entidades do médicos e dos estu­ dantes em nivel nacional. Ela disse, também, que o encontro sign.i.ficou mwto para Pernambuco, por conta da participação do Sindicato dos Mé­ dicos, do Conselho Regional de Me­ dicina e dos Diretórios Acadêmicos de Medicina, tornando-os parceiros com mais intensidade "'Chico Carlos

é jornalista.

Maurícío Rands(terceiro da dir. para a esq.) esteve presente à reunião

reforma sindical e o café da manhã deram o tom do en­ contro realizado no Recife entre as lideranças médicas nacionais e o deputado federal Maurício Rands (PT/PE), relator da PEC da Reforma Sindical, em tra­ mitação no Congresso Nacional. O eLXO da discussão girou em torno da estrutura e organização sindicais, do custeio/f1l1ancia­ mento, do exercício profissional e representatividade das entidades médicas. Os médicos expressaram suas preocupações sobre a Reforma Sindical e apresentaram sugestões ao petista, que enfatizou seu papel de ouvir os segmentos do capital e do trabalho, negociar os con­ sensos possíveis para avançar a proposta, porque está compro­ metido com a reforma no Brasil,

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independentemente de aplausos ou de vaias. O presidente da Federação Nacional dos Médicos [FenamJ, \iValdir Cardoso, classi­ ficou como positivo o encontro com o parlamentar, que mostrou conteúdo técnico, competência e franqueza no diálogo com os médicos. "O reconhecimento da repre­ sentatividade médica, dos sindi­ catos e da Federação Nacional dos Médicos foram importantes", enfatizou Cardoso. Ele disse que a conversa fluiu naturalmente e que todos os médicos presentes ao encontro conseguiram expor suas idéias. Como isso, o deputado po­ de perfeitamente compreender as especificidades do exercício da profissão e as dificuldades relativas ao processo de arrecadação de entidades médicas. (Cruco Carlos) Movimento Médico 23


Acordo beneficia médicos e população Sindicato destaca avanços da negociação

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gru po de trabalho, viabilizar a implantação das ações prometidas em resposta à Pauta de Reivindicação Salarial/200S. Destaque-se ainda a importante participação da Câma ra Municipal como mediadora do acordo, através da Comissão de Saúde. Entre o Simepe e o secretário de Saúde do Recife, Gustavo Couto, prevaleceram o diálogo e o reconhecimento das ne­ cessidades da categoria médica de melhores condições de trabalho para atender a comunidade. Veja em nosso site (www.simepe.org.br) a íntegra do documento oficial da pc.R. apre­ sentado na Assembléia Geral e apro­ vado por ampla maioria dos médicos presentes.

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acordo firmado em 15/08/05 en­ tre o Sindicato dos Médicos de Pernambuco (Simepe) e a Prefeitura da Cidade do Recife traz beneficios para os médicos da Prefeitura e para a popu­ lação em geral. O presidente do Simepe, André L ongo, destacou que houve avanços da Campanha Salarial dos M é­ dicos da PCR, porém, é necessário que a categoria continue mobilizada em bus­ ca do ideal reivindicado. E le salientou que ganhos salariais imediatos para os médicos diaristas, plantonistas e do Pro­ grama de Saúde da Família (PSF), com a garantia de assegurar em 60 dias a adequação à reaLdade salarial do Estado. Foi assegurada a melhoria das con­ dições de trabalho com investimentos

de R$ 1.900 .000.00 para revisão do ambiente de trabalho e condições de alojamento dos profissionais. Longo disse que a PCR garantiu também a contratação imediata de 22 médicos pa­ ra suprir a necessidade da rede muni­ cipal de saúde. Além do envio de projeto de lei à Câmara :M unicipal que amplia o quadro de médicos possibilitando a contratação de mais profissionais. O Simepe conseguiu também, participação na defi nição dos critérios a serem utilizados no Concurso Público para a contratação de médicos do PSF, a ser realizado no primeiro semestre de 2006. Foi criada uma comissão de médicos, para em conjunto com a Secretaria de Saúde do Recife, em

Seminário alcança objetivos

Federação Nacional dos Médicos (Fenam) realizou com sucesso no Salão Dourado do H otel Glória, Rio de J aneiro, o I Seminário de Integração Médico/Mídia. O encontro (foto) foi voltado para profissionais e estudantes de jornalismo e medicina, visando a troca de experiências entre os dois segmentos. O seminário teve a participação dos jornalistas Sidney Rezende, âncora de telejornal e apresentador de programas de TV e rádio; Va nessa Leão Pedroso, produtora do Fantástico; E lza Gimenez, produtora de telejornal do RJ ; Claúdia Silveira, repórter e redatora de agência de notícias; vValdir Cardoso, cardiologista e presidente da Fenam; Heder Murari Borba, especialista em transplante renal, e José E rivalder Guimarães, especialista em medicina do trabalho e presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo. A apresentadora do evento foi a jornalista Aparecida Torneros. A delegação de Pernambuco marcou presença com os médicos André L ongo e lVlarcelo Falcão, pelo Simepe, e Ricardo Paiva (Cremepe), além dos jornalistas Chico Carlos, Carla Leão (Simepe) e Joanne Ferreira (Cremepe).

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Municipalização dos Serviços de Saúde

o presidente do Simepe, André Longo (foto), foi um dos participantes da Audiência Pública "Municipalização e Regionalização dos Serviços de Saúde no Recife" promovida pela Comissão de Higiene, Saúde e Bem-Estar Social da Casa, presidida pelo vereador Mozart Sales (PT). Ele infonnou que o encontro no Plenarinho da Câmara Municipal do Recife, foi muito oportuno oom os representantes dos secretários de Saúde do Recife e do Estado, representantes dos Conselhos Estadual e Municipal de Saúde, além dos ccnselhos gestores de hospitais públicos. Longo enfatizou que foram apresentados de fonna bastante dara as propostas, idéias e questionamentos sobre a municipalização e regionalização dos serviços de saúde. "Acredito que foi um passo importante em busca de avançar no processo de negociações entre Estado e a PCR. Melhorar a qualidade do atendimento da população da cidade deve ser uma prioridade". Os hospitais Barão de Lucena, Geral de Areias e Ulysses Pemambucano estão na pauta para serem municipalizados.

24 Movimento Médico


Parceria contra assaltos Simepe e SDS selam acordo contra roubos

De olho na notícia

Nordeste Forense A APEMOL e ABML promoverão no período de 07 a 10 de setembro próximo, no Recife, o Nordeste Forense, compreendendo a Jomada Nordestina de Medicina Legal, Direito Médico e Odontologia Legal. Na programação, serão abordados os seguintes temas: Erro Médico, Perícias Cíveis, Lesões "In Vita e Post Morten" e Crime de Tortura. Informações pelos telefones: 32212348 e 3221.2455

Vitória contra o RHP

Assaltos preocupam médicos

Sindicato dos Médicos de Pernambuco e a Secretaria de Defesa Social firmaram parceria no sentido de implantar ações estratégicas para combater o aumento dos assaltos à mão armada e roubos em consultórios e clinicas médicas nos últimos meses no Recife. O primeiro passou foi dado com a implantação do treinamento de funcionários dos estabelecimentos médicos, possibilitando, desta forma, rapidez no atendimento às demandas policiais em caráter de emergência, isto é, em assaltos. Vale fi-isar que a SDS já aplica o "Projeto Olho na Rua", em parceria com o Sindicato da Habitação (Secovi/PE), que consiste em uma rede de rádio-comunicação com dois canais com freqüência própria, interligando porteiros e os policiais dos Núcleos de Segurança Comunitária, unidades da SDS que concentram policia civil, militar e bombeiros próximos à comunidade. As entidades médicas de Pernambuco cobram desde do mês de abril, ao secretário João Braga, um trabalho preventivo diante do crescimento da violên­ cia que continua aterrorizando profissionais de saú­ de, funcionários e, especialmente, pacientes que fa­ zem consultas em clínicas, laboratórios e consultórios instalados nos bairros do Recife. Nos últimos meses, assaltantes invadiram esta­ belecimentos que prestam serviços médicos, cau­ sando pânico e insegurança às pessoas. Atualmente, áreas como a Ilha do Leite, Boa Viagem, Boa Vista, Espinheiro, Graças, Jaqueira, Aflitos e Santo Ama­ ro são as mais visadas. Informações pelo telefone (81) - 3221.2455

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A Defensoria Médica do Simepe obteve decisão favorável contra o Real Hospital Português (RHP). A Justiça do Trabalho reconheceu o vínculo empregatício do médico Bruno de Lima Grangeiro junto àquela instttuíção hospitalar. O juiz André Luiz Machado, da 11 8 Vara do Trabalho da Capital, constatou a existência de fraude à legislação trabalhista por conta da prestação de serviços médicos, através da Cooperativa de Saúde do Pólo Médico [Cosame), caracterizado-se irregularidade e desrespeito ao estabelecido na Lei 5764/71. A Justiça do Trabalho estabeleceu que o RHP terá que pagar em tomo de R$ 20 mil ao médico. Simepe apóia decisão judicial contra a revalidação O Sindicato dos Médicos de Pemambuco expressa total apoio à posição da Federação Nacional dos Médicos (Fenam) bem como a decisão judicial da Justiça do Rio Grande do Sul. O SIMEPE mantém­ se contrário a revalidação do título de especialista, da forma como foi apresentada pela Resolução 1.755/04, do Conselho Federal de Me­ dicina (CFM), que estabeleceu no país a revalidação periÓdica de títulos de especialistas. O Sindicato apóia o processo de Educação Continuada para os médicos, que seja de fácil acesso, com o custo reduzido na medida que seja financiado pelos empregadores e tomadores de serviços médicos e pelas entidades médicas.

Médicos demitidos Funcionários da Empresa de Correios e Telégrafos de Pemambuco (ECT) denunciam que o ambulatório central está funcionando de forma ilegal. Isto é, sem diretor médico e sem licença da Vigilância Sanitária da Prefeitura da Cidade do Recife. Os funcionários da estatal dizem que a Diretoria Regional da ECT, alegando gastos, demitiu três profissionais médicos, e, agora, quer transformar os que ficaram no ambulatório em clínicos para atender o Programa do Departamento de Saúde de Brasília (DESAU), bem como utilizá-los em atividades paralelas como, por exemplo autorização de exames periódicos, admissionais, etc.

N;ão garante médicos na Unimed Recife A Defensoria Médica do Simepe obteve mais uma vitória para seus associados. A juíza Elaine dos Santos Mendes, da 278 Vara Cível da Capital, determinou que a UNIMED RECIFE fosse obrigada a cooperar os médicos Carlos Augusto do Couto e Márcia Cristina Fraga que já assinaram o termo de posse. Um dos fundamentos alegados na ação é que a Lei das Cooperativas 5.764/7 - em seu artigo 4°, determina que é ilimitado o número de cooperados, desde que os médicos preencham os requisitos exigidos no Estatuto. Todavia, a Unimed Recife vem con­ trariando a referida Lei, não acett8ndo novos cooperados. O Poder Judiciário do Estado vem entendendo de forma cristalina que a Cooperativa está equivocada em não cooperar os médicos. Por isso, tem concedido liminares as ações interpostas pelos médicos, através da Defensoria Médica do Simepe. Os médicos interessados em ingressar como cooperado na Unimed Recife devem procurar o Sindicato dos Médicos/PE - Av. João de Barros, 587 - Boa Vista, ou ligar para 81­ 3221 .2455, das 09 às 17h.


SOMEPE

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Fundação Altino Ventura tem novas atribuições A FAV aguarda credenciamento para atender pacientes com múltiplas deficiências Elizabeth Porto* acientes pobres com múlti­ plas deficiências poderão ser bem atendidos na Fun­ dação Altino Ventura ­ FAV A instituição, coordenada pelo médico Marcelo Ventura, tem a presi­ dente do Conselho Curador da FAY, Liana Maria Vieira de Oliveira Ven­ tura, como Iider no projeto do Centro de Reabilitação para Pacientes com Múltiplas Deficiências, que, há mais de um ano, aguarda credenciamento da Secretaria de Saúde de Per­ nambuco e da Prefeitura do Recife. É um trabalho que exige uma no­ va equipe de profissionais contrata­ dos. Mesmo sem o credenciamento do SUS para implantação do Centro de Reabilitação, a FAV já iniciou tratamento de crianças com cegueira e surdez.

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O projeto, pioneiro no Norte e Nordeste, foi enviado pela diretoria da FLmdação Altino Ventura para o Mi­ nistério da Saúde, que o aprovou e en­ viou equipamentos e mobiliário. O ma­ ior problema é que, até agora, não recebeu credenciamento do SUS pela Secretaria de Saúde de Pernambuco e pela Prefeitura do Recife. "Estamos aguardando, desde a gestão de Gui­ lherme Robalinho, a aprovação desse credenciamento. Esperamos que o a­ tual secretálio Gentil Porto possa resol­ ver a questão. Essa demora é triste, por­ que os equipamentos enviados pelo Ministério da Saúde podem deteriorar­ se," alerta Liana Apesar de a Fundação ser contem­ plada com o 10 lugar em qualidade de atendimento, em Pernambuco, através de pesquisa do Ministério da Saúde

com o usuário, e já ter atendido mais de três milhões de pacientes, a entida­ de ainda não tem sede própria. "É ou­ tro problema que precisamos resolver. Nossa demanda é enorme. Já pedimos à prefeitura e a várias autoridades poli­ ticas a doação de um terreno. Espe­ ramos que a prefeitura possa ceder um de seus imóveis ociosos", apela Liana.

Missão - Para Liana Ventura, a FAV tem duas missões: a primeira é o atendimento oftalmológico à popula­ ção de baL'Ca renda. A segunda missão é o ensino e a pesquisa. Há o curso de Residência Médica em Oftalmologia, credenciado pelo Ministério da Edu­ cação e do Desporto (MEC), e o de Especialização em Oftalmologia - um dos 54 cursos oficiais do Brasil - cre­ denciado pelo Conselho Brasileiro de


Oftalmologia. A Instituição oferece ainda o curso Fellow nas subespecia­ lidades de Catarata, Glaucoma, Cór­ nea e Doenças EÀ1:ernas Oculares, Retina e Vítreo, Oftalmologia Peditá­ trica, Estrabismo e Plástica Ocular. Receberam certificados, na FAY, subespecialistas proveruentes da Ar­ gentina, México, Venezuela, Peru, Chile, Costa Rica, Colômbia, Repú­ blica Domirucana, além de brasileiros de vários Estados do país. No campo da pesquisa, Liana Ven­ tura informa que a Fundação é a que mais publica trabalhos científicos, no Brasil e no exterior. "Isso prova que o nordestino é inteligente e tem capaci­ dade para contribuir para a medicina mundial", avisa Liana, lembrando que vários trabalhos científicos apresenta­ dos em congressos nacionais e interna­ cionais já foram premiados. Liana dis­ se, também, que se o médico não faz pesquisa, não analisa os dados que não deu certo no seu procedimento, com o paciente, não pode ser um bom profis­ sional. Não progride.

Prevenção e reabilitação - A Fundação Altino Ventura, para atender a população de baixa renda, desenvol­ veu diversos projetos. Entre tantos serviços especiais, podemos desta­ car o Departamento de Prevenção à Cegueira e Reabilitação Visual com Unidade Clínica Móvel, coordenado pelo médico Wagner Lira, que atende crianças, jovens, adultos e idosos. O oftalmologista é também um dos coor­ denadores do Curso de Residência Médica na especialização de Trans­ plante de Córnea. São realizados exa­ mes oftalmológicos com­

pletos, na localidade onde o paciente reside, prevenindo a cegueira e reabilitando a visão em todo o Estado de Pernambuco. "Temos parcerias com secretarias de saúde dos muru­ cípios pernambucanos e comurudades dos bairros", afirma Wagner. Anual­ mente são realizados mais de 23 mil atendimentos aos pacientes e duas mil e quinhentas cirurgias oftalmológicas, aproximadamente.

Multidisciplinar - A coordenado­ ra do Departamento de Visão Subnor­ mal de crianças e idosos da FAY, Dae­ na Barros Leal, trabalha com equipe multidisciplinar. "Há terapeutas e psi­ copedagogas que atuam na estimu­ lação visual dos pacientes, inclusive em bebês e adaptação de auxilio ótico em crianças maiores, adultos e ido­ sos", afirma Daena. "Nós queremos ver o paciente como um todo. Por isso, precisamos de uma equipe multi­ disciplinar. Infelizmente, ainda não te­ mos o credenciamento da Secretaria de Saúde para atuarmos. Mas já esta­ mos atendendo crianças cegas e sur­ das. O objetivo geral do Centro de

Fundação Altino Ventura surgiu no ano de 1986 Reabilitação é o diagnóstico em pes­ soas com múltiplas deficiências, na perspectiva de um atendimento global a fim de rrúnimizar as diversidades so­ ciais", informa Daena. Por sua vez, a diretora do Projeto de Reabilitação, Liana Ventura, explica que a experiência da FAV concluiu que, quando existe uma deficiência visual grave no paciente ela sempre está associada a múltiplas deficiências. Manter apenas atendimento oftalmo­ lógico não é bom, porque não traz tratamento totalmente eficaz. Fica in­ completo. "Por isso, temos necessidade de ampliar para outras áreas de saúde com equipe multidisciplinar", garante Liana.

Arte e progresso - Um trabalho importante vem sendo realizado pela FAV desde j unho do ano passado. É o projeto Enxergando com as mãos, vi­ sando detectar as carências sociais, de desenvolvimento neuropsicomotor e oftalmológicas de crianças com múl­ tiplas deficiências. Sob orientação das artistas plásticas Ziza Pantoja, Norma Gaião e da arquiteta Edy Valença, as crianças pintaram vários quadros e tiveram suas artes exibidas numa exposição. A Fundação Altino Ventura surgiu em 1986. É urna entidade filantrópica que presta serviços médicos de alta complexidade à população de baixa renda e promove o desenvolvimento científico e a capacitação profissional na área oftalmológica. Nos seus pri­ meiros anos, sem renda própria, suas atividades foram mantidas pelos seus sócios fundadore s Altino Ventura, Lourdes Ventura, Inácio Cavalcanti, Aristela Cavalcanti, Marcelo Ventura, Movimento Médico 27


A quase desconhecida

Síndrome de Munchausen

Criança mostra pintura do projeto Enxergando com as Mãos

Liana Ventura, Ronaldi Cavalcanti e Elani Cavalcanti. A partir de 2003, a FAV passou a realizar cirurglas oftalmológlcas de alta complexidade numa Unidade Ci­ rúrgica M óvel, projeto pioneiro no Brasil, através de uma doação da Fun­ dação Rotária Internacional, equipada com instrumentos de última geração. Quando a FAV com pletou 18 anos, recebeu do então Ministro Humberto Costa uma homenagem por escrito, dizendo o seguinte: "Uma das princi­ pais prioridades do governo do pre­ sidente Luiz Inácio Lula da Silva é a redução das desigualdades regionais e sociais. E a Fundação Altino Ventura é um precioso instrumento de inclusão social" . A equipe multidisciplinar da FAV é formada por 45 oftalmologlstas do staff, coordenando e realizando os procedimentos clínicos e cirúrgicos. Há um legado de 48 médicos anuais, realizando os cursos de EspeciaEzação, Residência Médica e Feliowem Oftal­ mologla e, também, pedagogas espe­ cializadas em visão subnormal; cardio­ logi.stas; funcionálios; 9 estagiá rios e 24 voluntários. A FAV conta com a participação de oftalmologlstas desenvolvendo traba­ lho voluntário, doando quatro horas semanais em atividades de preceptorias clínicas e cirúrgicas, valo rizand o a relação médico-pacie nte. "Hzabeth Porto é jornalista

28 Movimento Médico

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Doença é considerada uma forma de abuso contra crianças

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Etiene Cardoso da Silva*

ssa síndrome é considerada uma forma de abuso infantil, quando um dos pais dirige ações sobre a criança, decorrendo dessas ações si­ nais e sintomas de doença. U ma característica desse quadro é que os sintomas geralmente não conduzem a um diagnóstico preciso, pois são introduzidas substâncias tó­ xicas que ora provocam vômitos, diarréia, febre, sang1.le nas fezes ou na urina e até crises convulsivas, sendo necessário a hospitalização da criança para investigação e tratamento mé­ dico. Ao mesmo tempo, esse pai ou essa mãe mostram-se tão dedicados à criança, ganhando simpatia e con­ fiança do corpo médico e de enfer­ magem, dando-lhe total acesso a criança, fazendo com que os sin tomas persistam e os agravamentos desses quase sempre ocorrem na presença desse familiar. Caso não haja o afas­ tamento desse pai ou mãe, o quad ro clínico tenderá a se agravar, podendo chegar a óbito. O quadro acima re­ ferido é conhecido como Síndrome de Münchausen por Procuração ou por Poderes. Quando ocorre no adolescente ou no adulto, o próprio paciente se auto­ agride, não só i.ngerindo substâncias tóxicas, como, por exemplo, se auto ­ inoculando, utiEzando agulh as de seri ngas já usadas, catando-as em lixo

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hospitalar, provocando abscessos, que são drenados e novamente se auto­ inoculam na mesma reglão e em ou­ tras simultaneamente, levando a um ciclo de drenagens e agravamentos que muitas vezes termmam no centro cirúrgico, face à extensão das lesões. Neste caso, os pacientes não só que­ rem chamar atenção para si como também existe urna necessidade de estar em ambiente hospitalar, uma atração por hospitais e doenças. Por tratar-se de uma patologia psiquiátrica e classificada pelo CID como tal, o paciente deverá receber tratamento psiquiátrico. É muito importante observar que em todas essas situações acima referi­ das, tanto no abuso como na auto agressão, o ato ocorre de forma in­ consciente, só se dá com pessoas com transtorno de comportamento. Uma vez reconhecida a síndrome é necessário proteger a criança, fa­ zendo a notificação às autoridades e a criança será retirada legalmente da tutela desses pais. As crianças vitimadas, além das cicatrizes fisicas, portarão seqüelas psíquicas, tais como depressão, ansie­ dade, transtorno de estresse pós-trau­ mático e outros. Serão futuros pacientes psiquiátricos. " Etiene Cardoso da Silva é psiquiatra


nio Laprovitera é anestesista conhe­ cidíssimo, um mestre na sua espe­ cialidade. Figura humana estimada, res­ ponsável pelo "sono" anestésico de mui­ tos, desde os humildes pacientes do Hospital Pedro II aos doentes de elite, inclusive governadores. Não se limitou à rotina: colocou no meio médico per­ nambucano algumas importantes inova­ ç6es, que beneficiaram a todos. Nunca se acomodou, está sempre atualizado. O interesse de Enio pelos cuidados com os doentes começou em casa, quan­ do teve que ajudar a cuidar de seu pai enfermo. Na época, não desgrudava dos médicos que atendiam ao seu genitor. Encantou-se pela medicina. Decidiu ser médico. Na juventude, Enio Laprovitera tor­ nou-se um grande esportista: foi um grande remador, o melhor de Pernam­ buco. Colecionou medalhas e titulos de campeão. Mais tarde, já médico, seu nome se fixou definitivamente entre os das mais conhecidas e famosas perso­ nalidades pernambucanas. Na faculdade, além de se destacar nos esportes universitários, foi repre­ sentante de turma e \~ce-presidente do

E

Diretório Acadêmico e começou a parti­ cipar do universo da Anestesiologia, ini­ cialmente no serviço do Prof Ruy Ba­ tista (influenciado por uma freira, a irmã Suzana) e posteriormente no Hospital Pedro II, onde se engajou no sen~ço de Anestesiologia, dirigido por Paulo Bit­ tencourt, se ndo então treinado por Luiz Ribenboinl. A seguir, passou a trabalhar no serviço do Prof Romero Marques, onde permaneceu até se formar em 1957. Como médico, foi nomeado anes­ tesista do Pedro II e do Ipsep. Licen­ ciou-se e foi fazer estágio de pós-gra­ duação em São Paulo, no serviço do fa­ moso anestesista Takaoka. De volta ao Recife, casou-se com a também anes­ tesista Tereza Marletti, e dessa união vie­ ram dois filhos: um tornou-se enge­ nheiro e o outro enveredou pelo jor­ nalismo fotográfico. Enio Laprovitera voltou a sair do Recue por diversas vezes, sempre para cursos e estágios que visavam a atualiza­ ção, o que nele despertou o espírito ino­ vador, a idéia de trazer "novidades" ao meio médico pernambucano. Esteve no serviço do famoso prof De Baker, em Houston, Texas, e no Deutsches H erz­

zeetium em Berlim. Nas duas ocasi6es, foi como professor visitante. Participou de congressos, jornadas e workshops, no Brasil e no exterior. Foi palestrante e ministrou cursos. Em 1963, após um curso dado pelo Prof Armando Fortuna, introduziu no meio médico pernambucano os novos conceitos de anestesia peridw-al (usados até hoje) lombar e toraxia. Em 1992, trouxe de um CLU"SO com o inglês prof Brain outra novidade: a "Mascara Larín­ gea", que havia sido aprovada pela FDA no ano anterior. Em 1999, demonstrou (pela prÍ111eira vez em Pernambuco) a Entubação Traqueal Digital. Fez carreira no ensino médico: deu aulas de anestesiologia nas duas fac ul­ dades pernambucanas. Foi examinador de concursos públicos e (até hoje) atua como Prof Auxliar na Cadeira de "Ba­ ses de Técnica em cirurgia e anestesia" da Faculdade de Ciências Médicas, da qual recebeu o título de Prof Emérito. Escreveu um capítulo do livro An.este­ siologia, prin.cípios e técniw de James Manica, do Rio Grande do Sul. Recebeu a medalha Maciel Monteiro, da Sociedade de Medicina de Pernambuco. Foi presidente de honra do 40° Congresso Brasileiro de Aneste­ siolog-ja e membro de várias associaç6es cien títicas da sua especialidade, do Brasil e do exterior. É, mem bro honorífICO da Sociedade de Anestesio­ logia de Pernambuco e, desde 1977, é membro ativo da Sociedade Brasileira da Anestesiologia. Enio Laprovi tera participou de diversas situaç6es-limite da profissão. Uma delas o marcou profundamente: foi quando esteve em uma equipe que atendeu dezesseis queimados de uma só vez e teve que fazer "escolhas de Sofia". Competente, trabalhador, inovador, amigo, Enio Laprovitera, expoente da Medicina Pernambucana, é uma figura médica reconhecida e respeitada por quantos dele já se aproximaram ou dele tiveram noticia. ~'Gildo Benício

é neurologista Movimento Médico 29


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Brasil: um país de recordes No Brasil, um jovem de 24 anos tem 14 vezes mais chances de morrer que uma mulher da mesma idade Josimário Silva*

Brasil hoje é considerado um país de grandes nú­ meros. Com uma econo­ mia em crescimento, vem batendo alguns recordes em setores como a agricultura, indústria automo­ tiva e de bens. Também apresenta re­ corde os quais não podemos admirar, apesar de influenciar na balança comercial do país, não traz beneficios, pois afasta o crescimento da indústria do turismo. Entramos no século XXl com wn recorde fàntástico: 50 mil homícidios. Em 1980, eram 10 mil. Em 1990, passou para 25 mil, e em 2000 foi para 40 mil. O Brasil registra 40 mil dos cerca de 500 mil casos de morte por armas de fogo todo ano. Isso corresponde a 8% do total do planeta Terra. No en­ tanto, o país tem apenas cerca de 3% da população mundial. Alguns estudos mostram que uma pessoa morre a cada 13 minutos no Brasil vítima de arma de fogo. De acordo com o Núcleo de Estu­ dos em Violência da USP em um es­ tudo em parceria com a Organização Mundial de Saúde(OMS), o homicí­ dio ocupa o primeiro lugar entre as causas de mortes precoces no Brasil.

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30 Movimento Médico

Entre os anos de 1990 e 2000, 12,4% das mortes foram por causas externas (homicídios, acidentes de trânsito e suicídios). N a década de 90, as armas de fogo foram responsáveis por quase 266 mil mortes, ou seja: 24% de todas as mortes por causas externas (mortes não naturais). A partir de dados do SUS, os ho­ micídios passaram de 13.910 em 1980 para 50.980 em 2003. De cada 10 homi cídios registrados nos hospitais do SUS, sete foram por armas de fogo. Os gastos com internação por violência já custaram ao governo R$ 397 milhões somente no período de janeiro a setembro deste ano, sendo que desse total, 6,3 milhões de inter­ nações por armas de fogo. Em 2003, hospitai s públicos e particulares conveniados com o SUS registraram 753.304 internações por acidentes e violência ao custo médio de R$ 643, 10 por paciente. De janeiro a setembro de 2004, ocorreram 564.869 internações, o gas­ to alcançou R$ 397.874.630,64, isso sem contar os gastos com retorno am­ bulatorial e a reabilitação do paciente. O s jovens são as maiores vítimas. Durante os anos 90, os homicídios entre a população de 24 anos au­ mentaram 48%, enquanto o cresci­ mento entre a população mais velha foi de 29%. A situação mais grave é no Rio de Janeiro e em Pernambuco, on­ de a taxa de homicídios entre os jovens

é su perior a 100 mortes para cada 100 mil habitantes. No Brasil, um rapaz até 24 anos tem 14 vezes mais chance de morrer que uma mulher da mesma idade. N os últimos seis anos, o fatura­ mento das Empresas de Seguro cres­ ceu 89,84% de acordo com a Fe­ naseg(Federação N acionai de Seguros Privados). Até 200 5, a arrecadação do setor crescerá outros 148%. As recei­ tas evoluíram de R$ 12,1 bilhões em 1994 para 25 bilhões em 2000. Para evidenciar que boa parte desse cres­ cimento está relacionada com o avanço da criminalidade, é o fato que apenas 20% do total do mercado está dirigido aos seguros de vida. Outra indústria que vem batendo recorde é a de segurança privada. Ho­ je temos um contigente de cerca de 1,5 milhão de seguranças, isso equivale a ce rca de 1/3 da população do Uru­ guai. O número é bem maior que todo o efetivo das policias militar e civil dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, chegando a ser 3,5 vezes maior que o conjunto do efetivo das forças armadas brasileiras, que é es ti­ mado em 279 mil homens. Até quando iremos continuar a bater esses recordes? "Josimário Silva é coordenador do Núcleo de Estudos em Violência e Trauma/HR Coordenador da residência em CTBMFjHR Prof. Adjunto de Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial/UFPE


CREMEPE

Resolução Cremepe n.o 01/2005

Conselho Reginal de Medicina, no uso das atribuições que lhe são conferidas pela lei n.o 3.268 de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto n.o 44.045, de 19 de julho de 1958, e,

O

Considerando as responsabilidades do médico, ética, civil e criminal, como pesssoal e intransferível;

Considerando as disposições contidas nos ditames dos artigos 2°, 4° e 8° e 27 do Código de Ética médica;

o de até 14 (cartoze) pacientes, atendidos por médico, em 4(quatro) horas de jornada de trabalho, respeitando-se a decisão do médico de ultrapassar ocasionalmente este número de acordo com sua capacidade de trabalho, mas dentro dos ditames de padrões éticos.

Considerando os óbices impostos a autonomia do médico em seu exer­ cício profissional, a necessidade de regulamentar uma adequada propor­ cionalidade da demanda de trabalho aos recursos humanos disponíveis;

§. II - Para evolução de pacientes internados em leitos de enfermaria, o limite referido no caput deste artigo é o de até 1O (dez) pacientes atendidos por médico, em 04 ( quatro) horas de jornada de trabalho.

RESOLVE: Ali. 1° - Determinar os parâmetros a serem obedecidos, como limites má­ ximos de consultas ambulatoriais, de evoluções de pacientes internados em enfermarias, de atendimentos em urgências e emergências e os realiza­ dos em serviço de terapia intensiva.

§. I - Para consultas ambulatoriais o limite referido no caput deste al1Ígo, é

Ali. 2() - Os atendimentos cirúr­ gicos, por suas especificidadese com­ plexidades, serão limitados, por compatíveis condições físicas e mentais do médico, obedecidos os princípios do bom senso e da razoabilidade, à critério dos cirur­ giões responsáveis.

Art. 3D

Considerando a preservação dos valores envolvidos na prestação da assistência à saúde como impres­ cinc\ivel à dignidade humana;

Considerando o caráter de irreversibi­ lidade de muitos dos danos ocorridos na práxis médica;

atendidos por médico, em 12 (doze) horas de jornada de trabalho.

§ III - Para o atendimento de pacientes internados em serviço de terapia intensiva, o limite referido no caput deste artigo é o de até 05 ( cinco) pacientes atendidos por médico, em 12 (doze) horas de jornada de trabalho.

§ IV - No atendimento prestado em setores de urgência e emergência, o limite referido no caput deste artigo é o de até 36 (trinta e seis) pacientes,

-

É de responsabilidade do

Gestor, Diretor Técnico e/ou admi­ nistrador dos serviços de saúde, o provimento dos profissionais mé­ dicos para assegurar a devida evo­ lução dos pacientes em finais de semana e feriados garantindo a qua­ lidade do atendimento, sendo função do plantonista apenas o atendimento de intercorrências. Art. 4° - As situações estabelecidas legalmente, como de calamidade pública ou caracterizadas por surtos endêmicos ou epidêmicos, à critério de definição da Secretaria Estadual de Saúde e reconhecimento por parte do Conselho Regional de Medicina, são exceções à aplicação dos ditames desta Resolução. Art. 5° - Os Diretores Técnicos e Clínicos dos nosocômios, no âmbito das suas competências, são res­ ponsáveis pelo rigoroso cum­ primento destas normas resolutivas. Art. 6° - Esta Resolução entrará em vigor 120 (cento e vinte) dias após a data de sua publicação.

Recife, 22 de junho de 2005 Ricardo Albuquerque Paiva Presidente Antonio Jordão de Oliveira Neto I o Secretário

Movimento Médico 31


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DIRETÓRIOS ACADÊMICOS

Novas escolas médicas

no centro da discussão

Compromisso com a população, ou farra dos tubarões da educação? Renan Éboli Lopes / Carlos Tadeu Leonídio DA Josué de Castro - UPE

abertura de novas escolas médicas é um tema em grande discussão não só na Denem (Direção E xecuti­ va Nacional dos Estudantes de medicina), como também em toda a sociedade. O porquê do movimento estudantil não ser a favor da abertura de novas escolas? Develiam existir cri­ térios mais ngidos? Quais seriam es­ ses? São questionamentos freqüentes ao se fàlar nesse assunto. Este te,,,'to tenta discutir em cima de alguns pon­ tos, explicações pragmáticas do porquê desse posicionamento. A Denem, como um movimento em defesa da vida, defende a escola médica como um importante "espaço­ processo" de formação de indivíduos­ construtores de referências, significa­ dos e valores, gerador de demandas e produtor de modos de subjetivação. Acreditando que essas são caractens­ ticas de suma importância para a al­ mejada revolução da educação e escola médica, e para a formação de profis­ sionais adequados ao nosso sistema de saúde. É sabida a dificuldade que existe para ingTessar no curso de medicina em qualquer lugar do país, assim como toda a subjetividade envolvida no de­ sejo do jovem e de seus familiares em vê-lo iniciar sua formação em um dos cursos que ainda é um dos mais valo­ rizados (pra não dizer "idealizado") pela sociedade. :M as isso não nos impede de exercer um olhar cntico­ reflexivo e de atuar de forma incisiva

A

32 Movimento Médico

nas empreitadas sobre esse tema. Pois, ao ingressar na universidade passamos a enxergar a nossa relação com o sistema de saúde de forma diferente. Somos, agora, futuros profissionais desse sistema, e, portanto, é necessário que rassemos a refletir, tendo como prioridade as necessidades de saúde da população. Segundo recomendações da Orga­ nização Mundial de Saúde (OMS), a proporção de médico para cada ha­ bitante é de 1/1000. Contudo, hoje se tem uma proporção dt: 1/606 no país, chegando ao absurdo da 1/264 na ci­ dade de São Paulo (Fonte: Cremesp 2003). Essa distorção deve-se, entre outros fatores à abertura desenfreada de novas escolas na região Sudeste, principalmente no Estado de São Pau­ lo; um claro descomprometimento com as necessidades de saúde da popu­ lação, uma vez que essas escolas foram abertas sem C1;térios qua.l.i.ficativos, e boa parte delas por interesses privados instituindo uma prática mercantiliza­ dora e descompromissada socialmente. Atualmente, na Regional Nordeste II (de PE até PI) temos 18 escolas, e constantemente surgem notícias sobre a pretensão de abertura de novas. Por exemplo, temos a possibilidade de abertura de mais seis faculdades na nossa regional neste ano. Fato que nos remete fortemente a essa discussão. Mas como podcnamos atuar diante dessa frente? A Denem entende que a abertura de novas escolas médicas deva existir para suprir as necessidades

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da população, tanto do ponto de vista da falta de profissionais médicos quanto na qualificação deste. Entende também, que, para a abertura de novas escolas, deva existir uma forte politica de incentivos a per­ manência do profissional nessa localidade, possibilitando seu cresci­ mento nas áreas de conhecimento, como pós-graduação, especializações, incentivos à pesquisa etc. E a disponibi.lização de uma rede de saúde capaz de proporcionar uma boa inter­ relação entre o profissional e o usuário, garantindo uma alta resolubilidade aos problemas de saúde. E, como ainda não há um estudo finalizado com esse propósito, entende que essas aberturas são precipitadas. Portanto, é consenso na Denem: que: a abertura de novos cursos médi­ cos sem a caracterização da neces­ sidade social é contrária ao interesse público e tem reflexo na qualidade de assistência à saúde; A assistência à população requer médicos devidamente qualificados, questão que não está sendo priorizada diante da falta de critérios para a aber­ tura de novas escolas; A abertura de novas escolas deverá estar atrelada à necessidade de assis­ tência à saúde de uma região, assim como a uma politica de incentivo à permanência do profissional nessa localidade; A política de abertura de novos cursos de medicina deve ser associada às politicas de Residência Médica, pós-graduação e educação continua­ da, dando ao médico a possibilidade e o estímulo a descoberta de novas formas de conhecimento; E, para tanto, não podemos ser coniventes com politicas mercanti­ lizadoras que visam a obtenção de lu­ cros em detrimento à formação de profissionais de qualidade.



'Não tínhamos a menor idéia de que a cidade viria a ter uma cena tão dinâmica", diz Renato L, DJ e jomalista No final dos anos 80, o cenário cultural do Recife e de quase toda cultura pop brasileira andava estagnado. Por aqui, a situação precária da própria cidade, eleita, na época, a quarta pior do mundo para viver, agravava o quadro. Em termos musicais, a MPB dominava, e os únicos destaques da música pernam­ bucana eram Alceu Valença e Geraldo Azevedo. O jornalista e escritor José Teles chegou a rotular os anos 80 co­ mo "a década perdida", uma vez que a música de qualidade feita por aqui não conseguiu encontrar seu público. Nesse cenário, grupos de amigos se juntaram para fazer música - sob influ­ ência de diversas bandas internacionais. Surgiram grupos de hardcore, punk, htp hop, que encontraram no Arte Viva, originalmente uma academia de dança, um espaço para seus shows. Paralela­ mente, apareceram novas lojas de discos

rock internacional aos ouvidos pernambucanos. Nessa tentativa de reorgcmi­ zação, um grupo de amigos, reunidos no bar Cantinho das Graças, gerou o embrião do movimento musical mais impoltante na músicaM brasileira dos últimos anos. Sentavam-se à mesa no bar: Fred 04, que já lideravà a mun­ do ~vre s/a, na época, tocando punk, os jornalistas Xico Sá e Renato Lins, o Re­ nato L; o designer Hélder Arag~o (DJ DoloI"e-'i); Mabuse; e Francisco França, batizado como Chico Science, por seu amigo Renato L. "Um amigo meu, Renato Lins, me chamou de Science porque eu sempre gostei de mexer com alquimia dos sons. Me acostumei, e é legal, porque fica mais universal", disse Chico em depoimento à Folha de S Paulo, em 1994. ''Acho que era um monte de gente com formação diferente, de lugares de diferentes, reunidos com o mesmo sen­ timento: transformar a cidade e criar espaços alternativos", lembra Fred 04. Foi lá que Chico descreveu, com em­

Alceu x Chico N

Postura e proposta diferentes criaram a idéia da inimizade 34 Movimento Médico

que traziam as novidades do

polgação, o trabalho do grupo L amen­ to Negro, de Peixinhos, Olinda, que acabara de conhecer. O contato com o samba reggae despeltou a idéia de inte­ grar os tambores e alfaias do maracatu à música da CSNZ,junto com recursos tecnológicos ligados aos, até então raros, computadores. "Eu batizei essa coisa de resgatar os ritmos regionais e ligar isso à música pop mundial. Pegar esses elementos e botar com a guitarra, o baixo e usar o sampler, usar tec­ nologia", afirma Chico Science, em entrevista concedida à revista virtual Up To Date, em 1995. A cena, uma grande cooperativa, já estava praticamente montada. Foi bati­ zada de Mangue (o beat foi introduzi­ do pela imprensa) por Chico, inspira­ do na diversidade e na função gerado­ ra desse ambiente. Por coincidência, Fred 04 trabalhava como repórter e ha­ via realizado uma matéria sobre os manguezais. Os seus conhecimentos técnicos sobre o ecossistema foram fundamentais na elaboração do release do disco independente Caranguejos com Cérebro, que os mangueboys pretendi-

o fim dos aos 80, quando o Mangue dava seus primeiros passos, o destaque da música pernambucana era Alceu Valença e sua música ligada às origens, bebendo na fonte de Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga. Ele já arriscava algumas alquimias sonoras, reprocessando sons locais com o rock dos Beatles e de Elvis. O Manguebeat chegou fazendo uma nova leitura, com outras influências, e um caráter fortemente coletivo. As comparações foram inevitáveis. Alceu: "É uma outra visão, mas em cima do mesmo depositário afetivo". Chico: "O que a gente faz é mais moderno. Existe uma fome de informação. Não é só música, mas sobre todas as coisas que acontecem no mundo, na sociedade, na tecnologia, na ciência de hoje. Não queremos ficar fàzendo a mesma coisa o tempo todo. Aí que está a diferença!". Contudo, foi a diferença de propostas que criou uma certa mitologia em torno da animosidade entre eles, mesmo sem nunca ter ocorrido nenhum conflito. Na­ quele momento, de certa forma, Alceu personificava tudo aquilo que os jovens mú­ sicos queriam combater: carreirismo e personalismo. "Ele se ploclamava 'Capitão Alceu'. Mostramos que o Recife não se encerrava em Alceu Valença", recorda Fred 04. Segundo Renato L, não era nada pessoal, mas boa parte do núcleo central do início do Manguebeat não gostava da música de Alceu Valença, e achava sua postura coronelista. Os mangueboys lembnun o caso de Lenine que só encontrou espaço para o reconhecimento do seu trabalho em Pernambuco depois do movimento Mangue. "Ele nunca teve um papel de articulador de uma cena, que abrisse espaço para os outros. E era justamente isso que os mangueboys queriam fazer", arremata Renato L .


nhada de especulações sobre o futuro. Alguns preconizavam o fim do Man­

am lançar com as bandas Loustal, mundo livre s/a, Chico Science & Na­ ção Zumbi e Lamento Negro. Fred 04 conta que havia o desejo de conectar o Recife à produção contemporânea. Quando o release começou a circular pela imprensa, foi confundido com um manifesto e instaurou-se o Movimento Manguebeat. Segundo Renato L, no irúcio eles não tinham a pretensão de criar um movimento. A idéia era reunir amigos, se libertar das dificuldades e usar o rock como linguagem. "Não tínhamos a menor idéia de que a cidade viria a ter uma cena tão dinâmica. A gestação do movimento foi feita sem pretensão", enfatiza. "Eu via o mo­ vimento como uma oportunidade de dar mais visibilidade para os trabalhos do grupo", complementa Fred 04. Nessa altura, o público e a eferves­ cência cultural cresciam em progTessão

dutor Paulo André Pires, hoje um dos maiores fes­ tivais de música do país. Naquela tarde de domin­ go, doze bandas subiram ao palco do Circo Maluco Beleza, incluindo CSNZ e mundo livre s/a. A banda de Chico assinou contrato com a Sony M usic e a de Fred 04 com o selo Banguela, ligado à \tVarner. Com os cds Da Lama ao Caos e Samba Esquema Noise nas mãos, as bandas ga­ nharam o Estado, o Brasil e um espaço na world musico O sucesso levantou a auto-estima dos pernambucanos. A "estética mangue" estava nos cine­

geométrica. Rogê de Renor largou seu emprego para abrir o bar .......,....oI!II~. . Soparia, no Fina, Zona Sul do Recife, que se trans­ formou num reduto Mangue. O ano de 1993 foi movimen­ tado. A música feita aqui ganhou a núdia

fumado, filme de Paulo Caldas e Lí­

no Ferreira, com trilha sonora Man­ gue -, na moda e no tra­ balho de outras bandas, como Eddie, Devotos, Faces do Subúrbio, Comadre Fu­ lozinha, Mestre Ambrósio. O Recife virara moda. Em fevereiro de 1997,

nacional e atraiu as atenções das grava­

o golpe: a perda de Chico Science, num acidente de

doras. No dia 25 de abril, um festival de rock tomava conta do Recife. Era o primei­

carro, no Complexo de Salgadinho. A morte do líder gerou uma comoção genera­ lizada, que che­

ro Abnl pro Rock, organizado pelo pro­

gou acompa­

guebeat, o que não aconteceu, segundo Renato L, pelo caráter coletivo que o Mangue possui. Nesses últimos oito anos, o cenário musical do Estado conti­ nuou se renovando. O trabalho da Na­ ção Zumbi não parou: lançaram dois cds após a morte de Chico. A banda, junto com a mundo livre s/a, tornou-se re­ ferência obrigatória na música brasileira. Atualmente, começa a se configurar uma cena pós-mangue, que in­ clui trabalhos que passeiam do maracatu à música ele­ trônica. O Cordel do Fogo Encantado saiu de Arcoverde, Sertão de Pernam­ buco, e trou.,'-(e a poesia serta­

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neja, Silvério Pessoa iniciou carreira solo e cumpre roteiro de shows internacionais, Siba e Fu­ loresta do Samba fazem música ligada às raízes da Zona da Mata pernambu­ cana, Hélder Aragão transformou-se no DJ Dolores, uma nova geração de jovens, com idade entre 17 e 22 anos, formou a Mombojó, banda de sucesso nacional. Isso tudo sem falar num outro gTUpO de bandas independentes, com influências diversas do rock interna­ cional, que fazem um som bem dife­ rente do feito nos primórdios do Man­ gue. Rádio de Outono, Superoutro, Va­ moz! e Parafusa já conquistaram espa­ ços para seus shows e um público fiel. Depois de 10 anos, talvez, esse seja o maior legado do Movimento Man­ guebeat: ter criado uma cena que se renova a cada dia e que afasta o conservadorismo e a paralisia que dominaram a cultura de Pernambuco durante um longo tempo. A para­ bólica fincada na lama está mais fume do que nunca. Abriu um espaço para a diversidade de sintonias. "Moder­ nizar o passado é uma evolução mu­ sical. Cadê as notas que estavam aquir Não preciso delas. Basta deixar tudo soando bem aos ouvidos". Science tinha razão. Movimento Médico 35


A esquerda Nise da Silveira. Acima , pintura do Museu da Imagem do Inconsciente

Vôos da imaginação Ao usar métodos inovadores no tratamento das doenças mentais, Nise da Silveira revolucionou a psiquiatria no Brasil Roberta Vasconcelos* "Felizmente, eu nunca convivi com gente muito ajuizada", era essa a frase que Nise da Silveira, psiquiatra revolu­ cionária que estaria completando 100 anos este ano, costumava dizer e relata bem toda a trajetória da sua vida, sem­ pre procw-ando tratar os pacientes mentais com carinho para que eles pudessem voltar a ter uma vida social. A ousadia de Nise da Silveira co­ meçou cedo. Aos 15 anos, em 1920, entrou na Faculdade de Medicina da Bahia, formando-se em 1926, junta­ mente com 156 homens. Foi uma das primeiras muJheres a se tornar médica. Aos 27 anos, foi aprovada no con­ curso de psiquiatria do Hospital da Praia Vermelha, mas foi presa logo em seguida (na época da ditadura) porque uma enfermeira que trabalhava com ela a denunciou, após encontrar livros socialistas entre seus pertences. Du­ rante essa época, Nise conheceu Olga Benário, Graciliano Ramos, Maria \iVerneck de Castro, entre outros 36 Movimento Médico

com unistas, que se tornaram seus grandes amigos. Nise só voltou a trabalhar com a psiquiatria em 1944, no Centro P si­ quiátrico Pedro II, e foi lá que ela teve a oportunidade de humanizar o trata­ mento dado aos pacientes mentais. Ela era contra os métodos utilizados tais como lobotomia ecirurgia q ue mutila o cérebro), choque de insulina e a utili­ zação indiscriminada de remédios. E , após se recusar a dar eletrochoque em um paciente, foi chamada de rebelde e afastada das enfermarias, sobrando­ lhe somente a área de terapia ocupacional, que era desprezada pelos méclicos, por não a considerarem uma forma de tratamento. Três anos mais tarde começou sua evolução como psiquiatra , quando ela percebeu que a pintura, a mú sica, o teatro e os desenhos poderiam se r formas de expressão dos doentes mentais, e era uma forma de tratamento. fo i aí que Nise fundou a Seção de Terapêutica

Ocupacional e Reabilitação eStar) no Centro Psiquiátrico Nacional de E ngenho de D entro, no Ri o de Janeiro. Já em 1952, a médica fundou o Museu da Imagem do Inconsciente, introd uzindo a psicologia jungu iana no Brasil, como forma de preservar as obras feitas pelos pacientes no Stor. Ela nunca deixou que peças do acervo fossem vendidas ou levadas, porque sempre atribuiu a elas uma grande im­ portância. Di zia que elas possiblGta­ riam um conhecimento aprofundado do interior do esq ui zofrênico. Com o contínuo c uidado que tinha com seus pacientes, ou clientes, como ela mesma costumava defmi­ preocu pação da los, vela a reintegração dessas pessoas com a soc iedade . Foi qua ndo em 1956, juntamente com alguns cola­ boradores, Nise fundou a Casa das Palmeiras, q ue é um lugar que existe ainda hoje, e funciona co mo ligação entre a rotina hospitalar e a vida social.


Nise é responsável também pela criação do Grupo de Estudos c.G Jung, que através das pesquisas, deu ori­ gem a vários filmes, peças de teatro, exposições e publicações. Nise também foi pioneira no tratamento utilizando animais - que eram chamados de co­ terapeutas. Ela percebeu que eles poderiam ser um ponto de referência estável na vida dos pacientes, porque, em seus estudos, viu que o ser humano cria mais facilmente um elo com um animal do que com outro ser humano. Ela tem diversas publicações, realizou diversas e>..'P0­ sições e recebeu várias homenagens. Entre elas, existe uma homenagem do Conselho Regional de Medicina como representante da área de psiquiatria. Nise faleceu em 30 de outubro de 1999, aos 94 anos, por insuficiência respiratória, mas isso não quer dizer que seu trabalho tenha acabado. Vários hospitais adotaram os métodos de tratamento utilizados por ela, e tanto a Casa das Palmeiras quanto o .Museu de Imagens do Inconsciente continuam funcionando. Eles contam muito da história de Nise e seus "clientes". O Centro Psiquiátrico Pedro II foi municipalizado em 2000. Em sua homenagem, passou a se chamar Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silveira.

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Departamento de P6s-graduação Email: positaperuna@redentor.edu .br Tel.: (22) 3822-2854/3824-3812 Inicio dia 17 e 18 de setembro de 2005 Aulas mensais 24 hla mês Duração 15 meses Dias e horários - sábado e domingo das 08 às12 horas e das 13 às 19 horas, Local do curso: MarOlinda Residence Hotel - Av. Conselheiro Aguiar 755 - Pina -Boa Viagem - Recife. Investimento: 675,00 mensais Incluidos 4 cursos da AMIB HEMODlNAMICA, CITIN, TENUTI E HUMANIZAÇAo

Pontuaçio - AMIB Serão oferecidos os cursos da AMIB nos módulos correspondentes (TENUTI - NUTRiÇÃO, CITIN­ NEUROINTENSIVISMO, IjUMANIZAÇÃO E HEMODINÂMICA). aluno do curso receberá as pontuações correspondentes aos cursos e isso conta ponto no currículo, além de promover um ótimo exercício de atualizaçAo. aluno do curso de pós-graduaçãoAMIB terá seu tempo abreviado de 8 para 7 anos para a realizaçAo da prova de titulo de especialista.

Cid Marcos Nascimento David Médico. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação Médica Brasileira (AMB). Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da UFRJ. Presidente do FUNDO AMIB.

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Odin Barbosa da Silva Médico. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação Médica Brasileira (AMB) . Coordenador Cientifico do Hospital Santa Joana ­ Recife. Chefe da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Santa Joana ­ Recife . Preceptor da Residência de Clínica Médica do Hospital da Restauração - Recife . Membro do Comitê e Ética em Ensino e Pesquisa do Hospital da Restauração - Recife

PUBLICO AL VO

Médicos

• A Especialidade Medicina Intensiva. Avaliação Clinica do paciente gravemente enfermo.Via aérea e Reanimação

Cardiopulmonar e Cerebral.

• Equilfbrio Hidro-Eletrolltico e Distúrbios Metabólicos. Alterações Endócrinas. Nefrointensivismo. • Insuficiência Respiratória e Ventilação Mecânica I • Ventilação Mecânica 11. • Epidemiologia Clínica . Metodologia Cientlfica. Bioestatística • Intoxicações Exógenas e Acidentes por animais Peçonhentos Agentes Físicos e Qu ímicos. Analgesia, SedaçAo e Bloqueio Neuro-Muscular em UTI. • Disfunções Hematológ.icas e Coagulapatias. Terapia Intensiva doAparelho Digestivo. • Cardiointensivismo • CursodaAMIB- HEMODINÂMICA • Infecção e Sepse • Terapia Intensiva Cirúrgica e Trauma • Cursoda AMIB - CITIN • CursodaAMIB- TENUTI • Terapia Intensiva Pediátrica e NJeonatal.Terapia Intensiva na Gravidez • Curso daAMIB - HUMANIZAÇÃO

-Gestão em UTI


(f~

~HUMOR Apolo Albuquerque

U

m delegado se apegou ao depoimento de uma teste­ munha ocular de um crime para prender o principal suspeito do homicídio que havia cho­ cado a comunidade. Mas, na hora da prisão, surgiu um problema. O ho­ mem reconhecido pela testemunha ti­ nha um irmão gêmeo. E agora? O delegado resolveu então prender os dois irmãos até concluir as investi­ gações que apontassem qual dos dois realmente havia cometido o crime. Dois meses se passaram sem que o policial chegasse ao verdadeiro culpa­ do. Mas, notou que um dos gêmeos havia engordado trinta quilos durante o tempo em que ficou preso. E aí che­ gou à conclusão de quem realmente havia praticado o assassinato e pren­ deu o magro. Você, meu caro leitor, teria condições de imaginar em que o delegado se baseou para apontar o culpado? A resposta é simples: o que não mata, engorda!

O português Joaquim Manoel foi o primeiro entre os amigos a comprar um celular. Poucos dias depois, estava na companhia de uma bela morena dentro de um motel quando o aparelho começou a tocar. Era uma ligação da mulher dele. Indignado, perguntou: "Oh, Ma­ ria, como você descobriu que eu estou em um mote!?".

* Essa foi a contribuição enviada à coluna pela jornalista Joane Ferreira, assessora de imprensa do Cremepe: U ma bonita loira procurou o psiquiatra para uma consulta. Travou­ se o seguinte cliálogo: - Doutor, estou ouvindo vozes. - A senhora costuma ouvir vozes sem saber de onde vêm ou quem está falando? - Sim, costumo. - E quando isso acontecer - Quando atendo o telefone.

* Um executivo vivia uma rotina de homem casado há mais de vinte anos. Do trabalho para casa e vice-versa. Certo dia, o capeta atentou e ele resolveu tomar um drinque antes de chegar em casa. No balcão do bar, uma mulher se ofereceu para lhe fazer companhia. Ele não viu nada demais. Só que, depois do quinto drinque, ambos decidiram terminar a noite no apartamento dela. E aí, quando ele olhou para o relógio tomou um baita susto: oito horas da manhã. Antes de ser engolido pelo desespero, veio a idéia salvadora. Ligou para casa e, quando a mulher atendeu o telefone, ele gritou: "Não pague resgate, consegui fugir".

* Apolo Albuquerque se despede hoje com uma frase do grande Nélson Rodrigues: "O homem que se vende está sempre recebendo mais do que merece".

Movimento Médico 39


Moacyr Scliar

Em busca do esquecimento

"D

"Doutor, eu estou aqui porque esqueço coisas"

outor, eu estou aqui porque esqueço

contrário. Nunca estive tão bem da

dor que é constatar o sumiço de tais

cabeça. Eu quero menos memória .

lembranças, de coisas que desa­

cOisas.

Memória ze ro é o que eu pretendo.

parecem da memória como a água

Já sei o que o se­ nhor me dirá. Em primeiro lugar, o

E já vou explicar-lhe a razão desse

no ralo da pia. É isso o que eu que­

pedido que lhe pode soar estranho .

ro: viver como se meu cérebro fosse

sen hor vai me consolar: é normal

Eu esqueço coisas, doutor. Es­

uma folha em branco - ou uma tela

para uma pessoa de 70 anos es­

queço onde deix:ei ce rtos objetos, es­

de computador vazia, se o sen hor

quecer coisas, afinal, você não tem o

queço de que conversei com pes­

quiser. Ali não há nada do passado.

céreb ro de um jovem, seus neu­

soas. Mas, por incrível que pareça,

Ali só aparecerá o que está acon­

rônios já não funcionam tão bem.

não é isso o que me incomoda. As

tecendo. A cada instante minha vida

Depois, e dependendo do tipo de

coisas que esqueço, já descobri, não

recomecará. Mesmo eu tendo 70

médico que o senhor é, o senhor tal­ vez me receite alguma coisa, alguma

me prejudicam em nada - a esta al­

anos. Melhor dizendo: exatamento

tura da vida, ningu ém precisa de

porque tenho 70 anos. É só numa

vitamina, algum desses chamados

mim, não sou necessário para coisa

idade assim que a gente pode rei­

tônicos para o sistema nervoso. E,

alguma, portanto não há nada que

niciar a existência sem nenhum

tendo feito isso, o senhor se levan­

eu tenha de lembrar. Mas lembro,

tará e, com um sorriso, o senhor

sim, que esqueci, e isso me inferniza

compromisso com o que ficou para trás.

dirá: 'Não se preocupe, a sua me­

a vida. Esqueci alguma coisa; não

Eu vim aqui para lhe pedir isso,

mória vai melhorar'. O senhor me

lembro que coisa é; não faz dife­

doutor.

acompanhará até a porta, achando

rença lembrar que coisa é; não que­

I sso o quê?

que, ao menos transitoriamente, o

ro lembrar que coisa é - mas por

O que foi mesmo que eu lhe

senhor resolveu a questão.

que, diabos, tenho de lembrar que

pedi? Que coisa doutor: acabei de

esqueci? Por que esta compulsão,

esquecer. I sso me acontece. Aliás,

Mas o senhor está enganado, doutor.

nesta necessidade imperativa e ab­

tem a ver justamente co m o motivo

Eu não quero mais memória; disso desisti há tempo. Eu quero

surda? Se esqueço tudo, por que não posso também esquecer que esque­ ci! Um esquecimento neutralizaria

de minha consulta. Doutor, eu estou aqUi porque esqueço coisas ."

menos memória. Não, os seus ouvidos não lhe traíram; o senhor ouviu muito bem. E eu não estou louquejando, pelo

outro, os dois mutuamente se extin­ g uiriam. Eu não teria lembranças, mas tam bém não passaria por esta

Extraído do livro melhores Crônicas­ Moacyr Scliar, 2004, Global Editora. www.globaleditora.com .br MOACYR SCLlAR nasceu em Porto Alegre, RS, em 1937. Formou-se em medicina em 1962, com especialização em Saúde Pública. Desde 1968 pratica o exercício de escrever ficção, ensaios, crônicas e literatura para jovens, sendo autor de aproximadamente 70 livros. Suas obras já foram traduzidas em mais de 20 países. É detentor de vários prêmios concedidos no Brasil e no exterior com grande aceitação de crítica.

É colunista

dos jornais Zero Hora (Porto Alegre) e Folha de S. Paulo. Ocupa desde 2003 a cadeira 31 da Academia Brasileira de Letras.

40 Movimento Médico


Novo Maternidade Brites de Albuquerque. Agora, com muito mais vida poro os olindenses. Visando melhorar o atendimento das gestantes olindenses, a Prefeitura Popular de Olinda reabriu a Maternidade Brites de Albuquerque. Depois de uma reforma estrutural completa, com amelhoria de 29 leitos, reaparelhagem de todo centro cirúrgico, revisão nas partes elétrica ehidráulica esubstituição do telhado, a maternidade, agora, pode receber suas pacientes com muito mais conforto equalidade. Além da reforma física, realizada desde a lavanderia até a sala de cirurgia, a Prefeitura Popular de Olinda criou programas de humanização no atendimento. • Projeto Nascer: toda gestante internada ésubmetida a um teste de HIV. Esse procedimento reduz os riscos do bebê contrair ovírus da Aids na hora do pllrtO. • Visita Aberta: permite que as pacientes recebam seus familiares em qualquer horário. • Disponibilidade de um acompanhante do sexo feminino para cada paciente. Antes, apenas as gestantes menores de 18 anos tinham esse direito. Nova Maternidade Brites de Albuquerque.Mais uma grande obra da Prefeitura Popular de Olinda.

COMBATE Á 1RANSMISSÃO VERTICAL DA AIDS

~tJ~"tJ PREFEiTURA P~PULAR



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