O Boi no Telhado - Geraldo Peçanha de Almeida

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Ilustrações

Marcelo Alonso



Geraldo Peçanha de Almeida

Ilustrações

Marcelo Alonso

Alfenas - MG - 2018 1ª Edição

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© Cria Mineira Empreendimentos Ltda. Todos os direitos reservados. Impresso no Brasil Rua Dirce Moura Leite,118 - Alfenas - MG - 37130-762 - Brasil contato@criaeditora.com.br ISBN 978-85-65377-26-5

_____________________________________________________________ A447a Almeida, Geraldo Peçanha de O Boi no Telhado / Geraldo Peçanha de Almeida; organização Nádia Alonso; ilustração Marcelo Alonso. - 1. ed. - Alfenas, MG: Cria, 2018. 32 p. : il. ; ISBN 978-85-65377-26-5 1. Conto infantojuvenil brasileira. I. Almeida, Geraldo Peçanha de. II. Alonso, Marcelo. III. Título.

CDD: 028.5 CDU: 087.5 _____________________________________________________________ Ficha catalográfica gerada pela editora.

cria editora .com.br Direção Geral: Nádia Alonso Direção Editorial: Marcelo R. Alonso Revisão: Samuel Swerts Cria Mineira Empreendimentos Ltda. Rua Dirce Moura Leite,118 - Alfenas - MG +55 35 3292.4859 criaeditora.com.br

Um livro dedicado a crianças sobre “O Boi no Telhado” é um acontecimento cultural da maior importância entre nós. O compositor francês Darius Milhaud (1892-1974), o autor da obra, foi um dos mais originais criadores musicais do século XX. Talvez tenha sido o mais prolífico autor de seu tempo, com quase 450 obras numeradas. De família judia, se interessou por todo o tipo possível de música não europeia, inclusive o jazz, a música africana e a música popular brasileira. Perseguido pelos nazistas morou muito tempo nos Estados Unidos. Ele viveu no Rio de Janeiro, de 1917 até 1919, atuando na antiga capital brasileira como secretário do então “ministro plenipotenciário” Paul Claudel, famoso escritor, irmão da famosa amante de Rodin, Camille Claudel. Curiosamente, as obras mais tocadas de Milhaud tem alguma ligação com esse período no Brasil. Junto a músicos brasileiros, apresentou primeiras audições nacionais de obras de Ravel e Debussy, além de diversas composições suas. Entre as obras mais conhecidas do compositor, que tiveram origem em sua estada no Brasil, está a suíte “Saudades do Brasil” (em versões para piano solo ou para orquestra) e o Ballet “Le boeuf sur le toit” ou .com.br “O Boi no Telhado”. Essa obra foi completada cria editora em português na França logo após seu retorno à Europa. O enredo do ballet foi escrito por Jean Cocteau, e sua estreia parece ter sido bem sucedida. Como consequência um cabaret – restaurante abriu em Paris, em 1921, com o mesmo nome, frequentado pela elite artística da capital francesa. A obra mostra uma numerosa série de melodias intercalada com uma música que se repete diversas vezes, formando um rondó. Durante muitos anos Milhaud fez


segredo, e mesmo despistou sobre a origem dos temas. Logicamente, qualquer pessoa pensava que ele tinha se inspirado em algum “folclore” sul americano (meu professor francês, Michel Phillipot, falava de “sambinhas brasileiros”). Entre suas “despistadas”, ele dizia que “tal tema veio de um tango português” ou coisa do gênero. Só muito recentemente, é que “O Boi no Telhado” foi revelado ao mundo como uma colagem de obras com nomes e autores. Todos eles brasileiros. Quem nos revelou a verdade sobre “O Boi no Telhado” foi a pesquisadora americana, apaixonada por música brasileira, Daniella Thompson. Inicialmente, ela esclarece o porquê do título. “O Boi no Telhado” era o nome de um “tango”, de autoria de Zé Boiadêro (!), que foi um grande sucesso no carnaval carioca de 1918 e que Milhaud cita em sua obra. Daniella Thompson enumera todos os compositores que Milhaud “tomou emprestado”. Existem alguns bem conhecidos como Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga e Alexandre Levy. Mas 11 melodias, “emprestadas” por Milhaud eram obras de um só autor: Marcelo Tupinambá. Até mesmo um compositor mais erudito foi “emprestado”: Alberto Nepomuceno. Milhaud escondeu por toda a sua vida a origem dos temas por uma razão muito simples: medo de ter que pagar direito de autor aos compositores citados. A obra de Milhaud em si é muito interessante, extremamente bem humorada e, curiosamente, a única criação do autor, o tema do rondó, que aparece repetida vezes, é de longe o material musical menos interessante. Lindo reconhecer o “Corta Jaca” de Chiquinha Gonzaga, “Apanhei-te cavaquinho” de Nazareth ou o “Tango Brasileiro” de Alexandre Levy. Não tenho a menor dúvida: Milhaud, mesmo escondendo suas “fontes”, amava a música brasileira. A minha dúvida: por que “O Boi no Telhado” é uma obra tão pouco conhecida entre nós? Obra, inúmeras vezes gravada, por regentes do nível de Dimitri Mitropoulos, Antal Dorati, Leonard Bernstein, Daniel Harding e Ricardo Chailly. Em suas dezenas de gravações, encontramos atuações de orquestras americanas, inglesas, francesas, canadenses e tchecas. Mas não existe uma só gravação com orquestras e regentes brasileiros. Um livro, destinado a crianças, cujo tema é essa obra de Milhaud pode reverter essa situação. Os jovens leitores com certeza saberão admirar esse som, tipicamente brasileiro, e saberão reconhecer esse amor que um francês demonstrou por nossa cultura.

Maestro Osvaldo Colarusso


Se o boi subiu no telhado, Isso é história, e nela não entro E, antes de qualquer coisa, Deixe-me vê-la por dentro, Pois, em terra de mentiroso, Que é sempre mais valioso, Verdadeiro não cabe lá dentro.


São Paulo futuro certo Da viola cantadeira, Mas, Vixi Maria, homem de Deus! Pare de falar besteira, Pois boi no telhado não existe, Isso deixa até menino triste Na terra da cantareira.


De amor avacalhado eu entendo, De mulher traída também, Mas boi subir no telhado Parece história do além, Parece causo amedrontado De alma em pranto e pecado Querendo nos levar junto também.


Deixa disso, matuto pobre. Pare de bobeira pensar, Pois, se tem boi no telhado, Vamos lรก ver pra acreditar, Pois homem que duvida tem que ver Pra depois ter que entender Da vida depois do altar.



Se o boi subiu no telhado, Jesus Cristo também para o céu já subiu E governa a todos na terra, E só São Tomé que não viu, E assim eu preciso dizer, Acredite em mim pra valer, Quem te pede é quem te pariu.

Se a gente tiver que tirar O boi do telhado à noitinha, Aproveite pra encomendar Umas ferramentas lá na Dona Cotinha, Que ela é moça direita e prendada, Que fica até madrugada Dando duro pra comprar a farinha.


Mas tem gaúcho naquele pedaço Bem de olho na prenda da hora, Se esquecendo que, antes da Cotinha, Tem que passar pela Dona Aurora, Mulher brava que impõe seu respeito A peão que não anda direito Com as moças e com as senhoras.

Moça fina tem que receber O perfume de dama da noite Pra sentir o moço a dizer, Senão ele já entra no açoite, Pois peão que não anda direito E falta pra com as moças o respeito Chega a ela, mas não ganha o pernoite.



Geraldo Peçanha de Almeida nasceu no Vale do Paranapanema numa cidade chamada São João do Caiuá. Talvez por ter nascido em São João é que ele goste tanto de estrelas. Ele é psicanalista pela Sociedade Internacional de Psicanálise de São Paulo. É pedagogo e psicopedagogo pela UNESP-SP. Formando em Letras, mestre e doutor em Literatura pela Universidade Federal do Paraná e é autor de mais de 50 livros, entre infantis, livros para educadores e livros para pais. Tem trabalhos internacionais na Alemanha, Itália e Bolívia. Implantou na África, em Moçambique, um Programa de leitura e escrita. Tem 25 anos de experiência em educação de crianças e jovens em todos os Estados do Brasil.

Marcelo Alonso nasceu em Piracicaba – SP. É ilustrador e designer, formado pela Universidade Estadual Paulista - Bauru (Unesp). Seu envolvimento com a arte começou ainda na infância. Aos oito anos de idade, já pintava telas e fazia esculturas em giz. A volta para o universo dos desenhos aconteceu em 2010, quando recebeu o convite para ilustrar o livro infantojuvenil “Guerra e Paz”, inspirado na obra de Candido Portinari. Desde então, vem desenvolvendo novas técnicas de ilustração, dando cores e vida a histórias e personagens.


SOBRE O COMPOSITOR DA PEÇA Segundo a pesquisadora Daniella Thompson, em ensaio elaborado especialmente para o projeto “Músicos do Brasil: Uma Enciclopédia”, patrocinado pela Petrobras através da Lei Rouanet, Darius Milhaud nasceu em 4 de setembro de 1892, em Aixen-Provence, França; e faleceu em 22 de junho de 1974, em Genebra, Suíça. Francês da Provença e de religião judaica, conforme suas próprias palavras, ele teve saúde frágil durante toda a vida e passou a segunda metade de seus dias numa cadeira de rodas. Mesmo assim, foi um dos compositores mais prolíficos do século XX e produziu uma obra gigantesca com mais de 450 composições em todos os gêneros imagináveis, utilizando os mais diversos estilos e arranjos instrumentais, cujas características mais notáveis são o contraponto e a politonalidade. Foi a saúde precária que livrou o jovem Milhaud do serviço militar e que, por fim, o trouxe ao Brasil como secretário do embaixador francês, o conhecido poeta Paul Claudel. Em sua autobiografia, Notes sans Musique (Notas sem Música, 1949), [referência] o compositor relembrou as circunstâncias de sua indicação para a embaixada: “Meu primeiro contato com o folclore brasileiro foi repentino. Cheguei ao Rio no meio do Carnaval e logo senti o espírito de louca alegria que tomara posse da cidade inteira [...] Durante seis semanas, a população se entrega à dança e ao canto; há sempre uma canção preferida a todas as outras, que se torna o ‘tema do Carnaval’. Assim, em 1917, arranhada por pequenas orquestras diante dos cinemas da Avenida, tocada por bandas militares e orfeões municipais, reproduzida por pianolas e gramofones, cantarolada, assoviada e cantada bem ou mal em todas as casas – ‘Pelo Telefono’ [sic], o tema do Carnaval de 1917, explodia por todos os cantos e nos acompanhava durante o inverno inteiro.”


SOBRE A PEÇA MUSICAL Ainda segundo a pesquisadora Daniella Thompson em seu ensaio, Le Bouef sur le Toit é um rondeau-avec-reprises inspirado por Rameau e Couperin. A reprise politonal talvez seja o único motivo original de Milhaud, reaparecendo quinze vezes em três ciclos, seguida de uma recapitulação e de uma coda. Dispostos em quatro pares dentro de cada ciclo, cada um dos motivos citados sobe uma terça menor acima do par anterior, e depois a música modula um tom inteiro para baixo, iniciando a sequência seguinte em outro tom. Terminada a obra, ela terá passado por todos os doze tons. A intenção de Milhaud era transformar seu rondó no acompanhamento de um filme de Charlie Chaplin, mas sua vontade foi ignorada por seu amigo, o poeta e dramaturgo Jean Cocteau, que a utilizou no roteiro para um balé-pantomina surrealista passado num bar norte-americano durante a Lei Seca. Estreada em fevereiro de 1920, a peça alcançou enorme sucesso. Seu nome foi adotado por um bar-restaurante parisiense que abriu em janeiro de 1922 e logo se tornou o point noturno mais chic para os escritores, artistas e para a elite social parisiense durante toda a década de 1920. O jovem francês impressionou-se, em particular, pela música de


Ernesto Nazareth e Marcelo Tupinambá, que elogiou num artigo intitulado “Brésil”, publicado em La Revue Musical em novembro de 1920, e foi daí que veio a inspiração para compor a obra, embora muitos o acusem de plágio mesmo. Le Boeuf sur le Toit é uma concatenação animada de motivos melódicos tomados de empréstimo (ou cópia) a 28 músicas, 24 das quais publicadas no Brasil entre 1890 e 1919, sendo a maioria datada do período em que o compositor viveu no Brasil. Com a exceção de “O Boi no Telhado” (composta em 1918 e, portanto, nunca uma “velha ária brasileira” como disse Milhaud), de cujo título se apropriou, ele nunca mencionou os nomes das canções brasileiras que incorporou ao Le Boeuf sur le Toit. Sete das canções eram de autoria de Tupinambá e quatro de Nazareth, mas, apesar de seu entusiasmo declarado pelos dois compositores, Milhaud não só nunca reconheceu as contribuições deles à sua obra, como também jamais mencionou os outros doze compositores brasileiros cujas melodias citou. Segue abaixo todas as obras que serviram de base para a composição da peça e do livro que ora apresentamos.


Composições brasileiras citadas em Le Boeuf sur le Toit Título,

Gênero, Data

e Compositor

São Paulo Futuro

Maxixe curtindo; 1914

Marcelo Tupinambá

Viola Cantadeira

Tanguinho /canção sertaneja; 1917

Marcelo Tupinambá

Amor Avacalhado

Tango; 1918

João de Souza Lima, “Xon-xon”

O Matuto

Cateretê/canção cearense; 1918

Marcelo Tupinambá

O Boi no Telhado

Tango; 1918

José Monteiro, “Zé Boiadêro”

Ferramenta

Tango; 1905

Ernesto Nazareth

Olh’ Abacaxi!

Samba; 1918

F. Soriano Robert

Gaúcho

Corta-jaca; 1895

Chiquinha Gonzaga

Flor do Abacate

Polca; 1915

Álvaro Sandim

Tristeza de Caboclo

Tanguinho; 1919

Marcelo Tupinambá

Maricota, Sai da Chuva

Tanguinho; 1917

Marcelo Tupinambá

Carioca

Tango; 1913

Ernesto Nazareth


Escovado

Tango; 1905

Ernesto Nazareth

Caboca di Caxangá

Canção; 1913

[João Pernambuco] Catulo da Paixão Cearense

Vamo Maruca, Vamo

Samba; 1918

Juca Castro

A Mulher do Bode

Polca-tango; 1918

Oswaldo Cardoso de Menezes

Tango Brasileiro

Tango; 1890

Alexandre Levy

Que Sodade!

Cena sertaneja; 1918

Marcelo Tupinambá

Seu Amaro Quer

Tango carnavalesco; 1918

F. Soriano Robert

Sertanejo

Tango/batuque-dança brasileira; 1919 Carlos Pagliuchi

Para Todos

Samba carnavalesco; 1919

Eduardo Souto

Galhofeira

Peça lírica; 1894

Alberto Nepomuceno

Sou Batuta

Tanguinho; 1919

Marcelo Tupinambá

Apanhei-te, Cavaquinho Polca; 1915

Ernesto Nazareth


Um livro dedicado a crianças sobre “O Boi no Telhado” é um acontecimento cultural da maior importância entre nós. O compositor francês Darius Milhaud (1892-1974), o autor da obra, foi um dos mais originais criadores musicais do século XX. Talvez tenha sido o mais prolífico autor de seu tempo, com quase 450 obras numeradas. A minha dúvida: por que “O Boi no Telhado” é uma obra tão pouco conhecida entre nós? Obra inúmeras vezes gravada e, em suas dezenas de gravações, encontramos atuações de orquestras americanas, inglesas, francesas, canadenses e tchecas. Mas não existe uma só gravação com orquestras e regentes brasileiros. Um livro, destinado a crianças, cujo tema é essa obra de Milhaud pode reverter essa situação. Os jovens leitores com certeza saberão admirar esse som, tipicamente brasileiro, e saberão reconhecer esse amor que um francês demonstrou por nossa cultura.

Maestro Osvaldo Colarusso

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