Retalhos da vida de bruscos

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Escola 1ยบ CEB de Bruscos

Retalhos da Vida de Bruscos

Ano Lectivo 2002 / 03

Retalhos da Vida de Bruscos


BREVE APRESENTAÇÃO

SÓ PARA COMEÇAR

Esta recolha de histórias e memórias foi feita por nós ao longo deste ano lectivo com a ajuda de algumas pessoas com mais alguns anos de vida do que aqueles que nós ainda temos.

Só para começar podemos dizer que foi com imenso prazer que levámos a cabo este projecto.

Procurámo-las, em casa, e convidámos algumas a vir até à escola , passar um pouco de tempo, acordar a criança que um dia foram e a partilhar connosco as recordações de uma vida que tiveram e das memórias que guardaram . Afinal, este trabalho é uma homenagem a todos os que só por terem vivido deram corpo à história da vida desta terra. Não é de forma alguma uma história acabada, mas, talvez só e apenas, uma porta aberta para uma investigação mais dedicada e um estímulo à preservação das nossas riquezas, usos e costumes.

Sempre com base no respeito por todos os que foram dando corpo à nossa história e à nossa identidade. Na certeza, porém, de que muito mais ficou ainda por saber e descobrir. . Nada se constrói sem passado e sem perspectiva de futuro. Cabe-nos a nós, em tempo presente, procurar, investigar, intervir, participar, colaborar, chamar e incentivar outros a partilhar do mesmo entusiasmo, do convívio e da vontade de contribuir para enriquecer o conhecimento colectivo, registar vivências, conhecer o passado, compreender o presente e construir o futuro. É este o nosso contributo. Resta-nos a esperança da continuidade.


BRUSCOS

Este lugar de Bruscos, situado na Ribeira ou Vale do mesmo nome, constituiu um pequeno concelho até 1835. Na origem de Bruscos talvez esteja uma herdade já cultivada e possivelmente a formar um pequeno agregado populacional. Existe uma Carta de Venda, desta herdade, datada de 1147, a Rodrigo Pelais, alcaide de Coimbra, e a sua esposa D. Elvira Rabaldes, da Herdade de Podentes, situada entre Penela e Miranda do Corvo onde já se menciona o nome de Bruscos. Sabe-se, também que Pedro Julião, subdiácono da Igreja de S. Cristóvão de Coimbra, adquiriu duas casas em Bruscos e uma terra, no ano de 1175. O lugar era e continua a ser divido em cinco núcleos de designação bem antiga, a Torre, a Quelha, o Concelho, a Venda e Malta. Torre, porque em tempos aí se ergueu uma torre mourisca, para a construção da igreja que mais tarde foi transferida para Vila Seca.

O substantivo quelha, é um provincianismo ainda usado nas regiões serranas a designar caminho estreito, tortuoso e de piso irregular e, esta talvez seja a razão pela qual a ligação entre a Torre e o Concelho se chame Quelha.

Concelho, porque neste local esteve o Domos deste pequeno concelho datado de 1835.


Venda, este nome mais recente será porque aqui terá havido uma estalagem, hoje café Rosi, onde também se fazia a venda de produtos dos almocreves e mais tarde das galeras puxadas por quatro mulas, utilizadas no transporte e venda de peixe vindo da Figueira da Foz..

Malta, talvez porque em tempos idos aí se instalou a algum dignitário da Ordem de Malta

As restantes ruas e largos têm o nome popular de acordo com qualquer coisa que os sinaliza. Por exemplo, a Rua do Sapateiro, onde vivia o sapateiro da aldeia, o Largo do Freixo, onde existe um lindo freixo já com algumas dezenas ou talvez até centenas de anos;

a Rua do Carvalheiro Monumental, porque no final dessa rua aí caiu, há muitos anos, um enorme carvalheiro e aí ficou até hoje;


a Rua do Largo, talvez porque seja o largo maior do lugar onde os mais velhos, nos seus tempos de criança, brincavam e a Rua da Capela , rua onde fica a capelinha de Senhora da Conceição e de Stº Isidoro.

ARTES , OFÌCIOS E TRADIÇÕES

O comércio de peixe, é sem duvida uma das actividades mais antigas, desta terra. Entre os anos de 1940 e 1970, eram talvez mais de cem pessoas que diariamente trabalhavam no comércio de peixe. O peixe, esse, iam-no buscar a pé, com as mulas à reata, à lota da Figueira da Foz. Depois, nos dias seguintes distribuíam-no por várias localidades. Chegavam mesmo a fazer a venda de peixe em Góis e Pampilhosa da Serra. O que hoje nos parece qualquer coisa de incrível! Também aqui, viviam mais de vinte artífices “Lavrantes de Cantarias”. Trabalhavam a pedra com perícia. Faziam cantarias de qualquer espécie, da pedra arrancada das pedreiras, da região. Era também uma terra de prestigiados sapateiros que calçavam tanto os grandes senhores como as gentes da terra . A agricultura, sempre foi a base do sustento das famílias cá da terra . Aqui, se cultivava o bom vinho, o bom azeite e alguns cereais, principalmente o milho. Tal como nos velhos tempos, ainda hoje se amanha a terra e se fazem as colheitas . Ficaram-nos de tempos idos, as ternas recordações das antigas desfolhadas e da apanha da azeitona. Havia, na altura, dois lagares de azeite que trabalhavam três meses sem descanso. Ranchos, sem conta, de gente alegre, faziam a apanha da azeitona, sempre cantando lindas canções.


No serão, quando se fazia a escolha da rama e se separava a azeitona, entre cantigas e anedotas, sempre que se encontrava um “píncaro” com sete azeitonas juntas, a que se dava o nome de Penhora, ficava-se com o direito de penhorar o patrão. Mas, para isso tinha de se improvisar uns versos. Eis, aqui ,dois desses exemplos. Aceite-me esta penhora Achada no seu olivalzinho O patrão está penhorado Em cinco litros de vinho  Aceite-me esta penhora Grada como uma espiga O patrão está penhorado Em bolos e geropiga Outro dos bons momentos eram as escamizadas, do milho. Eram feitas ao serão, com a alegria das belas cantigas, cantadas muitas vezes ao desafio. Melhor, ainda, era quando alguém encontrava uma espiga vermelha, pois, ficava com o direito de abraçar a rapariga ou o rapaz que mais lhe agradasse. Então, se a espiga tivesse grãos pretos os direitos adquiridos eram, ainda, mais ousados. Nessa altura , até alguns beliscões se podiam dar e brindar com umas danças de roda. Eram , estas, as noites mágicas cheias de alegria e boa disposição que ficaram e ficarão para sempre nas nossas memórias! Na gastronomia também temos os nossos velhos e deliciosos sabores tradicionais.

Como prato principal temos a Chanfana que vem já da altura das invasões francesas, a que o nosso país esteve sujeito, por volta do ano de 1800 e qualquer coisa. Conta-se que nesta altura as tropas francesas famintas e sem grande respeito, pelas nossas gentes, saqueavam todas as casas e matavam todos os animais, para saciarem a sua fome. Então, a população resolveu , antes que isso voltasse a acontecer, matar todas as cabeças de gado caprino e guardar a sua carne, afogada em vinho tinto, em caçoilas de barro velho, para mais tarde levarem ao forno de lenha e, assim, alimentarem a família nesses tempos tão difíceis . Pensavam eles serem, assim, capazes de se precaverem do saque dos franceses. Pensavam e, parece que para além de o terem conseguido descobriram também uma forma fantástica de se saborear a carne de cabra. Outros dos bons sabores da nossa terra é sem dúvida o cabrito assado, no forno temperado, apenas, com banha, colorau, sal, muito alho e regado com vinho branco. Para sobremesa temos o delicioso arroz doce, a famosa “escarpiada,” feita à base de farinha, azeite, açúcar e canela, a broa doce e os bolinhos de abóbora. Já deu para abrir o apetite , Não?! Continuando esta nossa incursão, pelas nossas tradições, resta-nos lembrar a festa anual do nosso padroeiro Stº. Isidoro, que se realiza no Domingo mais próximo do dia 20 de Julho e a da Nossa Senhora da Conceição a 8 de dezembro, de cada ano.


MEMÒRIAS E HISTÒRIAS

E lá vai com devoção Visitá-lo à capelinha Fazer a sua oração E acender uma velinha

QUADRAS SOLTAS  De autoria de Alberto Tomás Luís Silva

Muito cantou e bailou A mocidade deste lugar Muito namoro se arranjou Debaixo do freixo secular  Antigamente as raparigas Com o cântaro abraçado Iam à fonte da Bica Arranjar um namorado Entre falas e sorrisos E algumas anedotas Os rapazes lá passavam A tarde co’ as cachopas

A agricultura já não dá nada Está tudo tão mudado Só cá ficou a velhada Os novos ?! está tudo empregado  Está tudo tão diferente Pois, tanta coisa mudou Vive diferente esta gente E até o sino se calou  Quando mal rompia o dia O nosso povo rezava Os toques das Trindades se ouvia E a faina começava 

 Pede o nosso povinho Ao Stº. António milagreiro Que lhe guarde o gadinho Durante o ano inteiro

Soavam de novo ao meio dia E mais tarde ao anoitecer Rezava o povo e pedia Mais um novo amanhecer


 E já de noite adiante Tocava o sino a dobrar Como um apelo constante Para as almas sufragar  E quando o sol de novo nascia Lá ia o pobre trabalhador E durante todo o dia Regava a terra com o seu suor 

Quando as nove horas chegavam E já mais alto ia o sol Paravam e almoçavam E bebiam o bom tintol  O Jantar era ao meio dia E até às quinze descansavam Ás dezoito era a merenda E ao pôr do sol despegavam  Voltam a casa ao anoitecer Fartos de tanto trabalhar No fim de se lavarem e comer Vão para a cama descansar

E quando a aurora raiar Já está pronto outra vez Para o trabalho recomeçar É assim a vida ... de um camponês


MEMÒRIAS E HISTÒRIAS DA NOSSA ESCOLA

Dulce dos Prazeres Mateus, hoje com 89 anos, nasceu em 7 de Julho de 1913. Entrou na escola com 7 anos ( 1920 ), lembra-se do nome da senhora professora, a D. Carolina, muito boa pessoa, não batia, mas dava alguns castigos A escola ficava na Rua do Sapateiro e passado alguns anos passou a ser no lugar de Malta , na rua da Igreja. Hoje é uma casa de arrumos, onde se guardam também algumas colheitas de batatas e milho. Tempos depois a escola passou a ser na Quelha. Aí era o Sr. Professor Giraldo que morava na Bendafé, onde a sua esposa, A Srª D. Eduarda também leccionava. A sala tinha apenas uma secretária, um quadro e as cadeiras. “ Réguas?!... Já não havia porque nós não aprendíamos lá muito bem e elas iam-se partindo... ele tinha gosto que nós aprendêssemos e ainda hoje digo abençoadas palmadas...” Entretanto as obras da escola nova que começaram no ano de 1918, iam avançando. Finalmente, em 1938 a escola estava pronta. Dulce dos Prazeres ainda foi para a escola nova. Não se lembra do nome do professor. Diz apenas que tinha vergonha dele e saiu da escola sem fazer o exame da 4ªclasse. Na nova escola, havia a casa do professor, uma sala para as meninas e noutro lado da escola, uma sala para os meninos. A Srª Professora D. Elvira dava aulas às meninas e o Sr. Professor Pita dava as aulas aos meninos.

Até que na década de quarenta chegou à escola um nobre casal de professores que, por vários motivos, deixaria também ficar a sua marca, na nossa história. Muitos foram aqueles, cá da nossa terra que aprenderam a ler escrever e contar pelas mãos deste casal. As meninas ficavam dum lado da escola com a Srª Professora Maria do Céu e os meninos ficavam do outro lado com o Sr. Professor Bento. Ainda não havia luz eléctrica, na escola, tinham apenas candeeiros a petróleo para os iluminar. Não havia aquecimento e todos andavam descalços e , pior ainda, não havia casa-de-banho!... Quando a vontade apertava tinham de dar uma corrida, passar a estrada e ir ao monte. Não era nada fácil... Pois, não?! Na escola, escreviam em lousas, com uma pena-delousa, o caderno da escola estava ao cuidado do Sr: Professor e o registo diário dos trabalhos era feito apenas por um aluno, correndo a vez a todos. Na hora do recreio, meninas de um lado e meninos do outro, brincava-se ao anel-anel, ao raminho entraçado, ao pião, ao lencinho vai na mão e aos berlindes. O almoço era feito nas escadas da escola onde se comia qualquer coisa trazida de casa. Muitas das vezes abriase o farnel e tirava-se uma sardinha embrulhada numa folha de couve Ao Sábado era dia da doutrina, dos trabalhos manuais, da educação física e da limpeza da escola. Aos Domingos cantava-se e dançava-se ao som do acordion do filho mais velho, o menino Carlitos, da D. Maria do Céu e do senhor professor Bento . Ño sábado gordo, então, era uma festa! Todos em cortejo, pelas ruas do lugar, lá iam com as suas galinhas, ovos, vinho, mercearia ou qualquer outra coisa para oferecerem aos seus professores. Era uma alegria!... A escola fazia parte integrante da vida desta gente, a tempo inteiro.


Um dia, a D. Maria do Céu deu à luz outro menino e logo, também ele, foi acarinhado por todos. A D. Lurdes Esmael, outra menina da altura, ainda se lembra do dia em que pela primeira vez pegou neste bebé ao colo. Diz ela que tem a certeza que foi a primeira pessoa de Bruscos a fazê-lo. Sempre que a D. Maria do Céu tinha que sair para a Vila era a menina São, ainda hoje vizinha da escola, que ficava com o Jorgito. Este menino foi crescendo e viveu em Bruscos, até por volta dos seus cinco anos, data em que os seus pais deixaram a escola de Bruscos e foram para a vila continuar as suas vidas. Gostava de brincar aos “Cobois” ( Cowboys ), fazia pistolas de cano, passeava pelas ruas , da aldeia com um arco, da roda de uma bicicleta, juntamente com as outras crianças e um dia... Até sonhou ser marinheiro!.... Mas, o tempo passou, o menino fez-se um homem. Tirou o curso de Engenharia Civil e, hoje, é aquele a quem respeitosamente todos chamamos de, Sr. Presidente da Câmara. Por todas estas razões e mais uma esta família será sempre, sem dúvida, uma referência na vida desta comunidade. A vida da escola continuou os anos passaram, outros professores se sucederam e o edifício foi envelhecendo. Até que no ano de 2000 se começaram as obras de restauro e remodelação deste velho edifício Foi um ano um pouco complicado para os alunos, da altura e para a Srª Professora Ana Rota que tiveram de se mudar, de armas e bagagens, para uma pequena sala cedida pelo Centro Cultural e Recreativo de Bruscos. Mas, foi também, sem dúvida, um ano de viragem nas páginas do livro da história, desta escola. No ano seguinte, em Setembro de 2001, já tínhamos uma escola nova, completamente diferente. Mas, o melhor de tudo é que fomos nós que tivemos o privilégio de a estrear .

RETALHOS DE VIDAS DE BRUSCOS

Ao longo deste ano lectivo algumas pessoas já com alguns anos a mais (muitos até), do que nós, foram conversando e partilhando connosco algumas histórias das suas vidas. Como forma de lhes agradecer o facto de nos terem ajudado a conhecer o passado da nossa terra e a perceber melhor o nosso presente, as razões que nos fazem ser como somos e ter o que temos, aqui vamos deixar registadas algumas dessas histórias.


Ainda falando com Dulce dos Prazeres... Por volta do ano de 1900, Manuel Ferreira Mateus, seu pai, foi dos primeiros sardinheiros de Bruscos. Saía de madrugada, a pé, com a mula à reata ( à mão com o cabresto em volta do pescoço ), até à lota da Figueira da Foz e voltava . Era um dia inteiro de viagem. Chegava a casa dormia e mal acordava partia para Pampilhosa da Serra. Aí vendia a sardinha e se por acaso comprasse uma carga de àguardente voltava para casa de novo a pé , para não cansar a mula. Ao Domingo iam para Góis e para Arganil. A esposa ficava em Góis e ele saía de madrugada para Arganil. Depois, regressava a Góis, encontrava-se com a esposa e voltavam os dois para Bruscos. Mais tarde, já tinha uma carroça, com duas mulas e uma galera puxada por três mulas. Compravam o peixe aos almocreves ( peixeiros da Costa de Lavos) que por aqui passavam e depois faziam a revenda às outras povoações. Então, nesta altura, à Segunda Feira iam para Poiares, nas galeras, às Quartas feiras para Miranda do Corvo e às Quintas Feiras iam para a Pampilhosa da Serra. Era uma vida muito dura.... mas, tinha de ser mesmo assim!.... Fausto Manuel Alegre Preces, tem 56 anos e toda a sua vida foi alfaiate. Começou a trabalhar com 11 anos, no dia 18 de Julho após ter terminado o exame da quarta classe. O seu pai passou-lhe uns panos para as mãos , linha e agulha para ele começar a aprender a chulear. Não foi nada fácil! Pois, para o conseguir fazer teve , o pai, de lhe atar o dedo ao dedal com um cordel.

Aos catorze anos, ainda não cortava, mas, já fazia parte de um casaco. Foi nessa altura, também, que começou a namorar. Mas, só aos dezoito anos, idade em que também foi para a tropa, é que estava pronto para fazer um fato completo. Durante todo este tempo a tarefa que lhe era mais penosa, era sem dúvida, a de passar a ferro. É que o ferro de Inverno pesava nem mais nem menos que cinco quilos e o de Verão quatro quilos... Temos de admitir que era necessário um bom bocado de força de braços, o que para um garoto ainda era uma tarefa penosa. Hoje, ainda continua a exercer a sua actividade, muito embora as encomendas sejam em menor número. Gosta do que faz e diz, que até hoje, nunca teve um cliente que não tivesse ficado satisfeito. Inês Moreira , 74 anos, começou a trabalhar com onze anos de idade, foi morar para a casa do Sr. Eduardo Silva., em Castanheira de Pêra. Segundo diz “morar e casar tem de ser de vontade” e ela aí ficou até aos catorze, a servir e a fazer todo o trabalho da lida de casa. Depois, regressou a Bruscos e começou a vender o peixe com uma bacia de esmalte à cabeça, descalça e de terra em terra. Ia de manhã, muito cedo, buscar o peixe a Condeixaa-Nova ou à feira a Coimbra . O seu almoço era, muitas das vezes, dois tostões de tremoços e um pão que custava quatro tostões, ou seja um cruzado como dizia o povo. Á tarde ia, então, vender o seu peixe para Rio de Galinhas. Foi assim a sua vida durante mais vinte e seis anos. Hoje, ainda trabalha nas terras, toma conta da casa e da neta, enquanto a sua filha continua a trabalhar na venda de peixe.


Maria da Conceição Figueira Alcouce, setenta e sete anos de idade , tecedeira de profissão e casada à cinquenta e seis anos com Manuel Jesus Pascoal Alves, nascido em Bruscos, há setenta e oito anos, e canteiro de profissão. Nos seus tempos de tecedeira muitas foram as passadeiras de cinco metros e de cinquenta metros que levava à cabeça, a pé, para Mirando do Corvo. Mas, entre tantos trabalhos que fez, há um que lhe é muito querido e que ainda hoje guarda como um tesouro. É a colcha que teceu , já lá vão cinquenta e seis anos, com todo o amor para a sua noite de núpcias. Enquanto ela tecia, fios sem conta, o seu marido “trabalhava a pedra como ninguém.” De terra em terra, levando na sua mala de ferramentas a maceta , o compasso, a suta, o esquadro, o ponteiro e o escopro de dentes, entre outros instrumentos com que trabalhava a pedra amarela ou branca, o calcário, e fazia as cantarias das casas , escadas, degraus, ombreiras, ladrilhos e tantas outras coisas.. De todos os seus trabalhos salienta a pedra amarela do portão, duma das entradas, do Jardim Botânico, de Coimbra, que fica ao cimo da Couraça de Lisboa, uma outra algures no Hospital de Celas e uma outra que está no Observatório de Meteorologia, também em Coimbra. Hoje, vai passando os dias entre o trabalho nas terras e a escultura de pequenos objectos de decoração para matar o tempo e a saudade. Maria Teresa Moreira, sessenta e nove anos, foi em tempos tecedeira. Quando miúda, por ser jeitosa e muito senhora de si alguém disse um dia - “ Teresa de barriga tesa, do cu papudo boa para jogar o entrudo”- e o que é certo é que o dito prevaleceu na memória , até hoje.

Casou, largou a sua profissão desfez-se de todos os seus bens e partiu, com as suas filhas, ao encontro do seu marido que já se estava em Angola . Aí viveu tempos muito felizes. Mas, a guerra viria a alterar toda a sua vida obrigando-a a regressar a Bruscos, em 1975. Hoje, recorda as suas histórias com os seus netos e conta que após terem vindo de Angola tinham uma ovelha que um dia pariu dois cordeiros, um branco e outro preto. Ora, o seu marido que de certa maneira estava revoltado com tudo o que tinha passado em Angola, não gostou nada do evento e dizia repetidamente: - Filha da mãe da ovelha que logo havia de parir um cordeiro preto!... Maria da Lurdes Fernandes, nasceu na Quelha, já lá vão setenta e quatro anos. Tecedeira e costureira , muitas meninas e senhoras ela vestiu ao longo de todos estes anos. Trabalhava dia e noite sem horas marcadas, ou não fosse tão certo que “alfaiates e costureiras davam a sesta por um prato de salada ao almoço”. Lembra no entanto os tempos em que a indumentária feminina obedecia a alguns requisitos. Sempre que uma menina se tornava moça, por volta dos seus dezasseis anos, fazia parte da sua toillete diária a camisa, a combinação, o corpete, a calcinha, o saiote e o espartilho. Isto quer fosse de Inverno ou de Verão! Convenhamos que naqueles dias de muito calor devia ser um tanto ou quanto complicado...dizemos nós... que somos doutro tempo!... António Pedro Fernandes, hoje com 72 anos, foi durante toda a sua via um exímio sapateiro. Sempre guardou, como manda a tradição, a segunda – feira como dia do alfaiate e do sapateiro. Pois, era o dia da semana consagrado ao descanso destas duas classes.


A sua arte, em outros tempos, só servia para os homens. Pois, as mulheres calçavam chinelitos de cotim, pano de que eram também feitas as calças de trabalho dos homens, ou tamancos de madeira. Cada par de sapatos já custava, na década de quarenta a cinquenta, cento e quarenta escudos, o equivalente a uma semana de trabalho, em que o homem ganhava vinte escudos por dia. Por esta altura foi proibido o pé descalço , na cidade e, ai de quem se atrevesse a entrar na cidade de Coimbra descalço, pois, ficava sujeito a uma multa de vinte e cinco tostões. Ora,, como a vida era difícil e o dinheiro raro, as pessoas iam para Coimbra com os sapatos às costas, para não os estragarem , mas, mal entravam na cidade calçavam-se para não serem multados. No entanto, era uma altura em que não lhe faltava trabalho. Chegou mesmo a ter semanas em que fazia nove pares de sapatos. O calçado era todo feitos em calfe, pele de vitela própria para fazer os sapatos. Só as chiolas, que eram o calçado específico para os canteiros, é que eram feitos com uma tábua atada com uma correia de sola ou de pneu. Hoje em dia, ainda vai fazendo uns arranjos no calçado. Vai colocando umas solas nos sapatos deste, umas capas nos sapatos daquele...Mas, o seu trabalho já pouco ou nada tem a ver com o de outrora. Augusto Raimundo, nasceu há setenta e três anos. Saiu da escola aos onze anos com o exame da 4ª classe feito no dia dezasseis de Julho de 1940. Lembra-se que a prova escrita foi feita numa Sexta-feira e a prova oral no Sábado e, senão passasse não iria ver, no Domingo, a inauguração do Campo de aviação no Picoto, em Cernache.

Na segunda –feira seguinte, foi acartar terra, à cesta, para ajudar a construir uma exploração de água que iria abastecer toda a localidade de Bruscos. Trabalhava de sol a sol e ganhava dois escudos por dia. Quando acabou a exploração foi guardar ovelhas e aos catorze anos foi com o pai e com os irmãos trabalhar à jorna na agricultura. Com quinze anos já ganhava como os homens e aos dezassete decidiu mudar de vida. Pois, “já estava cansado de todas as noites ter de rapar a terra que trazia nas bainhas das calças.” Então, o irmão mais velho que tinha casado com a filha de um padeiro, arranjou-lhe um lugar ao pé dele e começou a fazer a distribuição de pão, com um balaio, a Alcouce. Levava o cesto do pão, às costas, protegido com um oleado, enquanto a sua irmã ia à Bendafé e a esposa do seu irmão ia a Traveira com a burra. Dizia-se, naquele tempo, que quem não servia para mais nada ia para padeiro . Mas, o que é certo é que também se diz que nem o Diabo gostou da vida de padeiro. Porque, “tinha de fazer o fermento ( levedura com farinha) e, daí a quatro horas desfazê-lo, juntando-lhe a farinha, o sal e a àgua e, se há alguma coisa que o Diabo não gosta é de desfazer o que lhe deu tanto trabalho a fazer.” Por outro lado, tem ainda hoje guardado, numa muda roupa, um pão amassado e cozido numa quinta –feira de Assunção há já quarenta anos. Não, não está estragado. Parece é que o pão amassado neste dia é abençoado e nunca se estraga. Também o pão amassado à meia-noite da noite de S. João não precisa de fermento para levedar . É incrível!... Diríamos mesmo que afinal aquilo que o Diabo não quis Deus abençoou!


...................................................................................... FICHA TÉCNICA: ...................................................................................... 3º Ano 

A Professora ......................................................................................

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Os alunos

1º Ano

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4º Ano

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2º Ano

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Agradecemos a todas as pessoas que de qualquer forma colaboraram connosco e que tornaram possível a concretização deste trabalho.

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BEM HAJAM! ...................................................................................... ..................................................................................... .....................................................................................

Escola 1º CEB de Bruscos 27 de Maio de 2003


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