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Torto Arado
“A parede de terra, do barro que era o chão de Água Negra, voltou a ser terra de novo. Nasceram ervas e flores minúsculas em meio à umidade que surgia com o orvalho e com a chuva que caía quando era da vontade dos santos. Fiquei atenta a tudo o que acontecia, sabia que nada retornaria. Olhei com certo encantamento o tempo caminhando, indomável como um cavalo bravio.”
Encontramos no livro “Torto Arado”, de Itamar Vieira Júnior, a história de um Brasil colonial, misturada às lembranças dos personagens. Entrelaçando memória e ficção, o autor toca em pontos nos quais insistimos em apagar, ou mesmo, esquecer, mas que tomam forma na narrativa, como as casas de barro, refeitas a cada chuva, testemunhando as vidas privadas do direito a terra e ao lugar. Assim, o autor nos coloca em contato com uma temporalidade na qual o passado ainda precisa ser historiado no presente, onde não se trata apenas de lembrar, mas, também, reescrever a história.
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Nessa relação intrínseca entre o vivido e a memória, o autor nascido em Salvador, geógrafo e doutor em estudos étnicos africanos, vai tecendo um romance contagiante e sensível, em uma narrativa onde vozes esquecidas de um país múltiplo e diverso, que se imaginou unívoco, tomam a palavra produzindo novos elos entre história e memória, entre os sujeitos na multiplicidade de culturas.