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A UTOPIA É UM DESAFIO
from Lusitano de Zurique
As trapalhadas continuam em Portugal, casos e mais casos, corrupção e negociatas, regalias chorudas e prémios robustos para administradores de empresas falidas. Assim vai o nosso país, vítima da falta de mentalidade e da soberba de uns quantos que mais pensam no seu umbigo que no compromisso social exigido pelas próprias funções. A questão do carisma, da ética, da moralidade, prende-se com o exercício simples da racionalidade, uma pessoa cumpridora vive para colaborar com os outros e não se situa dentro do mal para prejudicar os fragilizados e os que mais necessitam. O egoísmo não se coaduna com o sentido de estado, é preciso saber abdicar e conceder, porque as funções públicas de orientação e liderança devem ser mantidas sob vigilância e transparência. Também não deveria existir a premissa de filtragem dos que resistem ou não às tentações da corrupção e afins, mas parece ser evidente que as pessoas honestas são trituradas no seu percurso pelos interesseiros e gananciosos. Há muito para mudar em Portugal. E tudo tem início precisamente na formação das crianças e dos jovens, da educação no seu contexto de desenvolvimento de capacidades e de personalidades. Dar o exemplo. É esta frase que deve dar o mote para a construção de uma sociedade justa e equilibrada.
Os portugueses estão cansados e descrentes, sem que sintam alterações para melhor, quando as polémicas se sucedem a um ritmo avassalador. Não consigo explicar, por exemplo, porque é que a descrença se desvia para o apoio à extrema-direita, talvez porque o discurso daquela é veemente e tende a acenar com a justiça e com o final deste regabofe. As pessoas como querem muito acreditar na mudança acabam por sucumbir a esta retórica. Mas esperemos que 2023 nos traga energias redobradas para enfrentar os desânimos. Precisamos todos de alinhar nos procedimentos, o bem de todos é o bem de cada um. Os portugueses têm de saber alinhar-se num denominador comum, contribuir para distribuir em conformidade, de forma motivadora. É fundamental investir na educação e na saúde. É fundamental apostar na equidade social, na inclusão e na flexibilidade laboral, concedendo salários consistentes e oportunidades de emprego que possibilitem o cresci- mento económico e, por inerência, o crescimento do país, em nome de toda a população e não apenas para salvaguarda de uns poucos que querem subir a pulso na vida. Provavelmente, serão necessárias várias gerações para atingirmos altos padrões de ética e transparência. Contudo, se é para começar, tem de ser agora, erradicando a espiral de favores e premiações sem sentido, em cunhas e compadrios de todas as espécies.
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Estes comportamentos sociais também retiram equilíbrio no que diz respeito às oportunidades de emprego, ao reforço da igualdade no acesso à habitação e bens de consumo, de lazer, culturais e artísticos. No fundo, ter uma sociedade mais enquadrada e menos hierarquizada. Este cenário não é utópico, até porque há países da dimensão geográfica e demográfica de Portugal que o conseguiram estabelecer, com frutíferos resultados na regulação democrática e de participação cívica, que não se fica apenas pelas eleições e pela entrega representativa das decisões como se uma folha em branco se tratasse. Segundo a mentalidade portuguesa, por exemplo, aceita-se a norma da disciplina de voto para proteger medidas economicistas em detrimento dos interesses da população. Portanto, é vulgar observar-se no parlamento a reprovação de propostas justas e cuja aprovação seria essencial para promover positivamente a vida das pessoas nas suas rotinas diárias.
O potencial que o país apresenta tem de ser acompanhado por posturas credíveis nas lideranças, políticas, associativas, empresariais ou académicas, todas com sentido exemplar nos procedimentos, reveladoras de níveis consistentes de compromisso, de missão, de defesa das causas públicas. Assim seja o caminho a percorrer nos próximos tempos, para que possa Portugal alinhar na vanguarda europeia, saindo do fundo das estatísticas para abraçar a essência de um país moderno, inclusivo, equilibrado, que se bate pelas questões sociais, culturais, identitárias e ambientais, um país na linha da frente das oportunidades, do progresso, das gerações que promovem a cidadania e os conceitos de partilha e solidariedade. Um país virado para o futuro, com tradição, mas centrado nas suas capacidades e nas competências dos seus cidadãos. Acreditar não custa, a utopia é um desafio.