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EDP, a energia oficial da mĂşsica e do desporto. 2
D I R E C T O R A E X E C U T I VA Sofia Arnaud DIRECTOR DE ARTE Miguel Mascarenhas SUMÁRIO
REDACÇÃO Diogo Queiroz de Andrade, Miguel Morgado e Salvador Pacheco COL ABORAM NESTA EDIÇÃO André Pinotes Batista, Assunção Cristas, Carlos Pereira, Duarte Alves, Francisco de Mendia, Hugo Soares, João Cotrim Figueiredo, José Manuel Pureza, José Prada, Manuel Lemos, Manuel Monteiro, Margarida Ferreira Carneiro, Miguel Anacoreta Correia, Mónica Farinha, P. Saragoça da Matta, Pedro Ferreira Malaquias, Rui Patrício e UNICEF Portugal TRADUÇÃO Outernational, Unipessoal Lda. PUBLICIDADE Telf.: 210 120 600 IMPRESSÃO Soartes Artes Gráficas, Lda. Rua A. Cavaco - Carregado Park, Fracção J Lugar da Torre, 2580-512 Carregado PROPRIETÁRIO E EDITOR Cunha Vaz & Associados – Consultores em Comunicação, SA NIF 506 567 559 CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO António Cunha Vaz (Presidente) António Estrela Ribeiro (VicePresidente) Francisco de Mendia (Vogal) Ricardo Salvo (Vogal) DETENTORES DE 5% OU MAIS DO CAPITAL DA EMPRESA António Cunha Vaz SEDE Av. dos Combatentes, n.º 43, 12.º 1600-042 Lisboa CRC LISBOA 13538-01 REGISTO ERC 124 353 DEPÓSITO LEGAL 320943/10 PERIODICIDADE Trimestral TIRAGEM 3500 Exemplares
DIREITOS HUMANOS 8 ENTREVISTA Linos-Alexandre Sicilianos, Presidente do Tribunal Europeu Direitos Humanos (TEDH) 14 OPINIÕES Manuel Lemos, Presidente da União das Misericórdias Portuguesas; Paulo Saragoça da Matta, Advogado e Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados; Pedro Ferreira Malaquias, Advogado, Uría Menéndez Proença de Carvalho; Rui Patrício, Advogado e Sócio da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados 20 ALBINISMO Margarida Ferreira Carneiro, Presidente da Direcção da Kanimambo; Miguel Anacoreta Correia, Presidente do Conselho de Fundadores da Kanimambo 22 UNICEF 30 Anos da Convenção sobre os Direitos da Criança 30 CONSELHO PORTUGUÊS PARA OS REFUGIADOS Mónica Farinha, Presidente do CPR 35 DESPORTO Velhas e Novas formas de luta pelos Direitos Humanos PORTUGAL LEGISLATIVAS 42 A DEMOCRACIA AMEAÇADA 48 OPINIÕES Manuel Monteiro, Professor universitário e ex-líder do CDS; José Manuel Pureza, deputado e um dos
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responsáveis pelo programa eleitoral do Bloco de Esquerda; Assunção Cristas, Presidente do CDS-PP; João Cotrim Figueiredo, Iniciativa Liberal, cabeça de lista por Lisboa; Duarte Alves, deputado do PCP, candidato da CDU pelo círculo eleitoral de Lisboa; André Pinotes Batista, Deputado do PS; Hugo Soares, ex-líder parlamentar do PSD O COMBATE À ABSTENÇÃO
MADEIRA LEGISLATIVAS REGIONAIS 64 OPINIÕES Carlos Pereira, Deputado Partido Socialista; José Prada, Secretário Geral do PSD Madeira ÁFRICA PRESIDENCIAIS GUINÉ-BISSAU E GERAIS MOÇAMBIQUE 68 ENTREVISTA José Mário Vaz, Presidente da Guiné-Bissau 74 MOÇAMBIQUE Um mandato que pode ficar para a história 76 MOÇAMBIQUE A importância do voto para o futuro de Moçambique 78 ENTREVISTA Guilherme Figueiredo, Bastonário Ordem dos Advogados 82 OPINIÃO Francisco de Mendia, Administrador da CV&A
ESTATUTO EDITORIAL
R EV I ST A C O R P O R AT IV A D A CV & A
www.revistapremio.pt/estatuto 3
EDITORIAL
ANTÓNIO CUNHA VAZ, PRESIDENTE DA CV&A
UM MUNDO DIFERENTE
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sta revista é especial. “Fala” de “Direitos Humanos”. Também fala de “Deveres Humanos”. Não exclusivamente no seu sentido estrito e muito menos naqueles vários sentidos panfletários que alguns usam no seu próprio interesse. A PRÉMIO de Setembro traz ao conhecimento dos leitores o que pensam e como agem algumas das entidades que cuidam, a nível nacional e internacional, de pessoas que vivem em situações menos boas. Não quero, propositadamente, chamar-lhes situações dramáticas. Umas serão menos que outras, mas entendi que ao chamar-lhes menos boas deixo uma réstia de esperança no ar. Falamos de crianças, pela pena da UNICEF Portugal, falamos daqueles Portugueses que beneficiam da acção da União das Misericórdias, do papel do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, do que é e faz o Conselho Português para os Refugiados e, com muito gosto, acompanhado de alguma tristeza, deixamos uma introdução a um assunto raramente mencionado na comunicação social: os albinos. Neste caso, tratamos de trazer ao leitor alguns dos factos da vida dos albinos em Moçambique. Mas este ano, em Portugal, continental e Região Autónoma da Madeira, na Guiné-Bissau e em Moçambique há
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eleições. Elegem-se os Presidentes da Guiné-Bissau e de Moçambique, há legislativas, em Portugal e em Moçambique e, ‘last but not least’, há legislativas regionais na Região Autónoma da Madeira. As eleições da Ordem dos Advogados também aqui são tratadas, com uma entrevista de balanço dada pelo Bastonário, Guilherme Figueiredo. Deixam-nos, também, textos jurídicos sobre o tema dois ilustres advogados da nossa praça. Todos estes temas são tratados pela pena de quem deles sabe. O que aqui se traz ao leitor é informação objectiva, não influenciada politicamente, com nada de panfletário, até porque a PRÉMIO não é nem nunca será uma revista para massas. A empresa proprietária desta Revista está envolvida nas campanhas eleitorais. Por essa mesma razão procurámos ser ainda mais isentos, se é possível, do que o habitual. Nas legislativas nacionais e regionais ouvimos quem entendemos ter uma palavra a dizer nas respectivas “contendas”. O espaço concedido e as
questões colocadas foram os mesmos e cada partido resolveu fazer-se representar por quem quis. Para que o leitor saiba, fizemos contactos através da via oficial de cada partido e quando não obtivemos resposta procurámos contactos de personalidades que têm funções de representação política. Fizemos um convite fora dos partidos a um ex-líder partidário, agora professor universitário cujo pensamento respeitamos. A partir deste número procuraremos ter sempre alguém fora do sistema a escrever. Sabemos que, por vezes, incomoda, mas cada vez mais a PRÉMIO será uma Revista inconformada. O Diogo Queiroz de Andrade escreve, como bem sabe, os textos introdutórios
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EDITORIAL de cada dossiê de política nacional. Porquê? Porque quisemos não ser nós, por estarmos envolvidos em campanhas, a fazê-lo. O Mundo está num momento de mudança. As tensões agravam-se entre Estados, sobretudo entre os poderosos, com cada mestre a colocar em posições chave os seus bispos, cavalos, torres e alguns peões. Uns são propositadamente sacrificados, outros são estrategicamente protegidos. EUA, China e Rússia, a Coreia do Norte, a Venezuela e o Iémen, a Síria, o Congo e o Brasil são exemplos de países que todos os dias, para aqueles que lêem a comunicação social internacional, porque a nacional continua a ser parca em noticiários de fundo sobre outras paradas do mundo, aparecem nas CNN, FT, Quartz, Bloomberg, NYT, Frankfurter Allgemeine, Le Figaro, El País, Corriere della Sera, Folha de São Paulo ou Jornal de Angola, apenas para citar alguns. Os nossos ‘online’, como o Diário de Notícias, ECO, Expresso, Jornal Económico, Jornal de Negócios, Observador, entre outros têm feito um esforço para acompanhar o Mundo mas com redacções curtas e com gente nova têm ainda um caminho a percorrer. As redes sociais, se ninguém lhes põe ordem, tornam-se numa arma de grande destruição. As notícias falsas são mais que muitas, algumas elaboradas por profissionais e alimentadas pelos incautos. Alguns especialistas montam projectos que levam a que quem os leia pense que são criados pelos seus opositores, outros criam notícias com fotografias falsas ou antigas e, pasme-se, assessores de presidentes ou membros de governos diversos enganam os seus governantes e fazem-nos cair no ridículo. O exemplo da Amazónia é um deles. Quando se entra por um caminho de falsidades para combater uma monstruosidade que está a acontecer ao Planeta está a dar-se força aos monstros que se querem combater. A par da Amazónia Brasileira, em África, na Rússia, e na Amazónia Boliviana os incêndios devastam vastas áreas de floresta. 6
“ E S TA R E V I S TA É E S P E C I A L . ‘ F A L A’ D E ‘ D I R E I T O S H U M A N O S ’. T A M B É M F A L A D E ‘ D E V E R E S H U M A N O S ’. N ÃO E X C LU S I VA M E N T E N O SEU SENTIDO ESTRITO E MUITO MENOS NAQUELES VÁ R I O S S E N T I D O S PA N F L E TÁ R I O S Q U E A LG U N S USAM NO SEU PRÓPRIO I N T E R E S S E .”
Claro que é preciso apurar quem são e punir os responsáveis. Mas o facilitismo modista de julgar o presidente do Brasil como responsável por todos os males do mundo só serve para camuflar os interesses de quem verdadeiramente beneficia com a exploração dos recursos naturais. Ninguém escreve, mas deve notar-se que na Amazónia Brasileira o estatuto de ONG é atribuído com uma facilidade tal que existem mais de cem mil organizações destas. Algumas são donas de verdadeiros impérios financeiros. Outro exemplo é o continuado esquecimento a que algumas populações do Mundo são vetadas. Ainda nas últimas semanas vimos e lemos, os que quiseram fazê-lo, a história das continuadas chacinas no Iémen e das suas congéneres congolesas agora descobertas. É de estranhar que o que se passa no Congo só agora tenha vindo a lume. Um autodenominado “Exército de Resistência do Senhor” deixou um “rasto de morte … no Nordeste do Congo”, diz o relatório da Human Rights Watch. Na sua sangrenta história de 23 anos de chacinas, este dito exército continua a ser um problema gravíssimo para as populações ao contrário do que tentam dizer os governos congolês e ugandês.
Um último exemplo dramático, miserável, é o da Venezuela. Sob a capa de uma democratização do país iniciada por Hugo Chavez, Nicolas Maduro destruiu um dos países mais ricos e dinâmicos do continente sul americano. Uma população que tem um salário mínimo de pouco mais de dois euros diários, que tenta fugir do país a todo o custo – mais de 3 milhões de pessoas deixaram a Venezuela nos últimos dois anos – e que não tem alimentos, medicamentos, água potável e electricidade apenas porque um qualquer louco – que um povo ignorante elegeu – se acha no direito de proceder como entende para alcançar os seus intentos. Estes são apenas dois exemplos do muito de mau que se passa no mundo. É preciso pôr cobro a estes iluminados que ascendem ao poder, parar de apelidá-los de ditadores de esquerda ou de direita. É urgente reforçar as verbas entregues às Nações Unidas para emergência, mas, ao mesmo tempo, dar educação aos povos para que não sejam manipulados por quem tem outros interesses que não sejam os da humanidade. Boa leitura.
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A PRÉMIO está ao seu dispor em www.revistapremio.pt
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DIREITOS HUMANOS
PORTUGAL TEM CONTRIBUÍDO PARA O PROGRESSO DA JURISPRUDÊNCIA EUROPEIA
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SOFIA ARNAUD
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DIREITOS HUMANOS
OPINIÃO MANUEL LEMOS, PRESIDENTE DA UNIÃO DAS MISERICÓRDIAS PORTUGUESAS
AS MISERICÓRDIAS E OS DIREITOS HUMANOS
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bordar o tema da relação entre as Misericórdias e os Direitos Humanos é algo deveras interessante seja qual for o plano, e podem ser vários, em que se pretenda fazer essa abordagem. Escolhi por evidentes razões de ordem de economia de espaço fazê-lo em dois planos. O plano mais conceptual, logo mais teórico, e que, a meu ver, se prende com o próprio ideal da misericórdia e o plano mais pragmático e concreto, que se traduz na atividade a que as obras de Misericórdia conduzem. Assim, no que respeita ao primeiro plano, sempre acentuarei que, quando se procura definir o conceito e expressões da natureza comum das Misericórdias, sobrepõe-se a toda e qualquer outra, a definição de Santo Agostinho: “Se o coração do teu irmão está em sofrimento e o teu sofre com ele, isso é misericórdia”. Foi esta visão radiante do que é a misericórdia, que efetivamente deu nascimento e sentido de existir e operar àquelas instituições, que o povo chamou de Santas Casas, as quais, muito para além das suas variadas expressões jurídicas, sociais e religiosas, configuram a mais sublime forma de organização da Fraternidade, motor e cerne da sua ímpar natureza. As Misericórdias são, de facto e por natureza, instituições de “misericórdia por fraternidade”, aquela Fraternidade que leva “homens bons” a unir-se e tratar-se como “irmãos” (recordo que a palavra inglesa para “Fraternidade” é nada mais nada menos do que “Brotherhood”). E daqui decorre que as
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Santas Casas não nasceram para tratar dos “pobrezinhos, coitadinhos”, nem para “caridadezinhas” alegadamente virtuosas, mas para permitir e promover que os irmãos caídos em necessidade possam exercer o seu “direito fundamental à dignidade e à misericórdia.” Ora, o “direito à misericórdia”, ou seja, o direito a ser tratado como irmão, com coração e em fraterna solidariedade, é inequivocamente um direito humano fundamental e, por isso, inalienável e imprescritível. Cabe aqui chamar à colação o Papa Francisco, quando, no Ano Jubilar da Misericórdia, se permitiu acrescentar uma décima quinta Obra de Misericórdia, precisamente a “promoção do bem comum” que a todos compete em nome da solidariedade, da coesão, da inclusão, numa palavra, da fraternidade entre os homens. Mas se o “direito à misericórdia” é, como vimos, um direito humano fundamental, é no exercício desse direito consubstanciado nas 14/15 Obras de Misericórdia que estas Instituições encontram a sua expressão plena e dão testemunho do tal ideal de fraternidade, da promoção da dignidade e da cidadania, que também os direitos humanos, em última análise, visam proteger. Assim, a promoção de atividades na área social (da infância e juventude à proteção do envelhecimento, passando pela deficiência em todas as sua vertentes), na área da saúde (cuidados de saúde primários, agudos e continuados), na área cultural (salvaguarda do património) traduzem a expressão do exercício da proteção dos direitos humanos de que todos falam, mas que, na maior parte dos
casos, se perde no pântano das palavras e da retórica política. A este respeito, e se me é permitido destacar uma questão concreta, saliento a do envelhecimento, seguramente o mais complexo problema, com que os europeus se debatem e que atravessa transversalmente as áreas da saúde e da segurança social, constituindo por certo, a maior preocupação para quem sustenta que os direitos humanos são a melhor expressão de um conceito moderno de civilização e cidadania. Ora, o aumento da esperança de vida, que representa obviamente um sucesso civilizacional, coloca paralelamente novos problemas resultantes da maior fragilidade dos idosos, do aumento das doenças crónicas ou das novas patologias como as demências. Tudo acompanhado das mudanças sociais que vão desde o emprego das mulheres à desestruturação das famílias e à progressiva falência dos serviços nacionais de saúde. E neste quadro, em que é patente que o Estado por mais declarações pias dos políticos, não foi, não é e não será capaz da agilização necessária para cuidar destes cidadãos, cabe em Portugal às Misericórdias em primeiro lugar (e em muitos casos mesmo em único lugar!) a defesa dos direitos humanos em nome da liberdade dos direitos e garantias que a Constituição prescreve. O que tudo visto, recoloca a capacidade de organização das associações livres das comunidades que as Misericórdias são no seu plano original e virtuoso. Como diria Pascal: “Perdoem-me ter-vos tomado tanto tempo, mas não tive tempo para menos!” l (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
DIREITOS HUMANOS
OPINIÃO P. S A R A G O Ç A D A M AT TA , ADVOGADO E PRESIDENTE DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS
A DEMOCRACIA INIMIGA DOS DIREITOS HUMANOS
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á cinco anos, apenas, não imaginaria que em 2019 fosse tão negro o panorama de Direitos Humanos (DH) no Mundo como hoje o vejo. Negro por estarem os DH’s perigados como poucos poderíamos prever. Mesmo só pensando no “Mundo Ocidental”. Olhando para os EUA encontramos um Presidente que defende abertamente tudo o que sejam violações dos DH’s. Desde a infeliz continuação da construção do Muro que separa os EUA do México (e seus centros de detenção), à apologia expressa de radicalismos nacionalistas assassinos, e, ainda, à instrumentalização dos órgãos da Justiça norte-americana. Justiça totalmente manietada por um poder Presidencial aclamado por uma maioria de eleitorado cuja dimensão esmagadora nos surpreenderá nas próximas eleições. Um tiranete eleito ataca não disfarçadamente todos os que se lhe opõem, violando escancaradamente os DH’s, aniquilando os valores cardeais da liberdade, da igualdade e da democracia, fazendo a apologia do ódio pelo diferente, demolindo o edifício da Justiça, pilar fundamental de um Estado de Direito. Justiça norte-americana que, diga-se, tão frágil era que soçobrou como um boneco de areia aos primeiros arremedos presidenciais. Tudo legitimado pelo voto popular. Descendo pelo mapa, encontramos o Brasil. Da esperançosa manhã que nasceu após a última ditadura militar, pouco sobra. Também aqui, um
pouco alfabetizado político foi alçado pela vontade popular, ora ignara, ora revoltada, ao mais alto magistério do Estado. Estribado no populismo fácil e barato, ataca mulheres, jovens, ‘gays’ e negros. Até campanhas publicitárias proíbe se tiverem destes “indesejáveis”. Tudo legitimado no voto popular. Numa maioria incapaz de decisão esclarecida, por um lado, e, por outro, numa maioria a quem só interessa vingar-se de uma oposição (democraticamente eleita) que governou oligarquicamente, em nepotismo, em corrupção, em saque da coisa pública. Mas não só nas Américas a era do “terror democraticamente eleito” faz curso. Na Turquia, um ex-Presidente de Câmara de Istambul e ex-Primeiro Ministro fez-se democraticamente eleger Presidente do País, liderando o “Partido da Justiça e Desenvolvimento”. Depois de nomear um Primeiro-Ministro que lhe sucedesse, amordaçou a liberdade de imprensa e de pensamento. Em seguida deu corpo à perseguição discreta das minorias. Desobedeceu à Lei e violou frontalmente ordens judiciais que o tentaram impedir de construir um Palácio megalómano. De caminho aniquilou as suspeitas de corrupção e desvio de verbas na construção desse Palácio. Aproveitando “o presente de Allah” que foi um suposto golpe de Estado frustrado, concentrou em si todo o poder, perseguiu, demitiu e prendeu largas dezenas de milhares
de juízes e académicos, advogados e jornalistas, polícias, soldados e funcionários públicos. Todos os que pudessem ser opositores ao seu regime, “por pensamentos, palavras, actos ou omissões”. E o panorama segue na Europa: na Polónia, além das compressões à liberdade de imprensa, passou a ser legal recusar a entrada em lojas a pessoas LGBTI; os índices de corrupção e de nacionalismos extremistas na Bulgária são assustadores, sendo também patente o tendencial desaparecimento da comunicação social livre, num país já classificado como democracia imperfeita; na Hungria as últimas eleições europeias viram a campanha eleitoral assente em discursos extremistas anti migrantes; e até os eleitores do insuspeito Reino Unido foram sensíveis a tais argumentos mesquinhos ao votarem o Brexit. A tudo isto se soma o crescimento imparável dos extremismos nacionalistas radicais por toda a Europa. Tudo, sempre, por escolha popular democrática. Por isso digo estarmos na era em que é a Democracia a maior inimiga dos DH’s. Também assim foi na génese, democrática, do III Reich. E todos sabemos como acabou essa história. l 15
DIREITOS HUMANOS
OPINIÃO
PEDRO FERREIRA MALAQUIAS, ADVOGADO DA URÍA MENÉNDEZ PROENÇA DE CARVALHO
A OBRIGATORIEDADE DO VOTO OBRIGATÓRIO
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tema de o voto ser um direito ou um dever e, sendo um dever, se deve ter uma sanção adstrita e, se assim for, que tipo de sanção, tem sido objeto de vários estudos e artigos, tanto em Portugal como no estrangeiro. Os argumentos num sentido ou no outro, são já largamente conhecidos, pelo que me dispenso de os reproduzir. A verdade é que as taxas de abstenção têm vindo a assumir números assustadores (em Portugal e não só), pelo que é importante que este tema não seja desvalorizado ou esquecido – bem pelo contrário, deve ser objeto de um debate profundo e alargado. Pelo meu lado, gostaria de contribuir para esse debate com algumas (novas) considerações ou ideias. Desde logo, há que distinguir votos para eleições de caráter político (sejam elas europeias, legislativas, autárquicas ou outras), dos votos em organizações de caráter privado ou órgãos colegiais (nomeadamente órgãos de governo de sociedades comerciais). Só no primeiro dos cenários apontados faz sentido questionar se o voto pode/ deve ser obrigatório. No segundo cenário, a opção deve ser deixada à liberdade do grupo em causa. Avanço desde já que, como ser eminentemente liberal, sou estruturalmente contra a obrigatoriedade do voto em eleições políticas, por o considerar um atentado a uma liberdade
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fundamental de qualquer cidadão – a liberdade de escolher participar, ou não, na vida política de um país, uma região, etc. Mas, como quase sempre, toda a regra pode (deve?) ter exceções. Ora, no campo da participação política dos cidadãos na vida de um país, só admitiria ver uma tal exceção em cenários que chamaria de radicais, como sejam um referendo para a passagem de um regime republicano para um regime monárquico (Deus nos livre!), ou um referendo para decidir sobre uma possível integração total do país numa União Europeia em que cada um dos Estados que a compõem deixassem de existir. Em casos desta índole, magnitude e relevância para o futuro do país, admito que se pudesse contrair essa liberdade fundamental e se pudesse exigir a participação de todos os cidadãos num tal processo decisório, através do voto. Mas, mais do que discutir cenários de voto obrigatório, é minha firme convicção de que devemos antes debruçarmo-nos sobre como motivar os cidadãos a, livremente, participarem na vida política do seu país, ‘maxime’, através do voto. Claro está que essa motivação deve passar sobretudo, e em primeiro lugar, pela qualidade das ofertas políticas que são feitas aos eleitores, pela seriedade das mensagens, pela sobriedade dos políticos, por uma justa remuneração dos cargos públicos, pela responsabilização (‘accountability’) dos intervenientes na vida política, por um dever de prestação
regular de contas aos eleitores, pela facilitação da participação dos cidadãos na vida política (ex: voto eletrónico), etc. Até aqui nada de novo. Onde poderá haver margem para inovar na motivação dos cidadãos a participarem na vida política, será na concessão de estímulos ou benefícios aos que aceitarem fazê-lo. E como o disponente desses estímulos ou benefícios deve ser o Estado, os mesmos poderão assumir diversas formas ou modalidades. Estou a pensar, por exemplo (e porque não?), numa majoração de despesas dedutíveis em matéria de IRS. Muitos outros esquemas poderiam ser concebidos para aliciar os cidadãos a ter uma participação mais ativa e interventiva na vida pública do seu país. E essa compensação é inteiramente justificável pelo enriquecimento que, dessa maior participação dos cidadãos, adviria para o país. Essa maior participação dos cidadãos deve assim ser considerada um objetivo de interesse público, digno de proteção pelo Estado. Benefícios deste tipo não violentariam a consciência dos cidadãos que, por convicção, não quisessem participar na vida política – que seriam livres de continuar a não o fazer, mas estimulariam e premiariam os que só não têm participado por inércia ou desinteresse. Por outro lado, o custo para o Estado seria apenas marginal e os benefícios de uma maior participação dos eleitores suplantariam largamente esses custos. l (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
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DIREITOS HUMANOS
OPINIÃO
RUI PATRÍCIO, ADVOGADO E SÓCIO DA MOR AIS LEITÃO GALVÃO TELES, SOARES DA SILVA & ASSOCIADOS
DIREITOS HUMANOS VERSUS DEMOCRACIA
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ode causar estranheza o título, sobretudo para quem se tenha habituado a ver na democracia, não apenas o pior dos regimes excetuando todos os outros (nas celebradas palavras de Winston Churchill), mas também uma necessária garantia do respeito pelos direitos humanos, sejam (com liberdade e simplismo conceitual) os fundamentais sejam os que se situam nas esferas circundantes à destes. Mas nem sempre é, embora seja ela própria resultado do exercício de um direito que se tem reconhecido, de há uns tempos a esta parte e nalguns lugares, como fundamental (aliás, nesta formulação temporal e espacial logo se pode começar a ver algum do “relativismo” associado a estas matérias, ‘et pour cause’). E nem sempre é, por uma razão tão óbvia quanto por vezes esquecida, que resulta do facto de a soma dos votos poder ir no sentido da tomada de decisões que colocam em causa direitos humanos, basta que uma maioria simples ou qualificada (consoante as regras consagradas em cada regime) o dite. Por isso se diz - e deve sublinhar bem - que existem democracias liberais e iliberais, no sentido de que as primeiras respeitam as liberdades individuais e as segundas não, total ou parcialmente. Mas não se julgue que o termo democracia iliberal cai bem apenas àqueles regimes onde se vota mas depois existe limitação de certas liberdades civis, como de expressão, associação, etc., havendo 18
também pouco escrutínio ou controlo da atividade governativa. O termo cai igualmente bem, e tanto mais quanto mais os mecanismos de limitação sejam menos evidentes ou mais sub-reptícios, aos casos de democracias “mais abertas” mas onde as maiorias votam no sentido de limitar, condicionar ou “normativizar” minorais (melhor dizendo, indivíduos que, nalgum aspeto fundamental da sua vida, não afinam pelo diapasão eleito pela maioria). Donde, se impõem duas conclusões, mas também um enorme problema que emerge da segunda delas. Primeira conclusão: uma democracia é tanto mais liberal (no sentido de respeitar as liberdades individuais, mesmo contra o sentido de voto ou de pensar da maioria), quanto mais cultive um sistema de ‘checks and balances’, e, também, quanto mais viva o debate, o escrutínio, a pedagogia, a reflexão, a separação entre a esfera da moral e a esfera da lei, a diversidade, o pluralismo e, sobretudo, a valorização da pessoa e da sua dignidade como pontos de Arquimedes do sistema. Segunda conclusão, e um enorme problema: os direitos humanos, especialmente os fundamentais, devem ser barreiras
ao exercício democrático, devem ser (para usar a expressão feliz de um constitucionalista) trunfos contra a maioria. Mas - e essa é pergunta de um milhão em qualquer moeda, e para a qual este texto já não tem caracteres disponíveis, e eu tenho apenas um punhado de dúvidas e alguns apoios provisórios - resta sempre a questão de saber que direitos fundamentais são esses, onde estão inscritos, quem os dita ou revela, quais as suas fontes? Um oceano de dúvidas, problemas, desafios, navegando de costa a costa, de um lado um extremo jusnaturalismo, do outro um extremo positivismo - Tucídides diria, talvez, a ordem cósmica e a vontade dos homens - , sem saber bem onde fundear uma embarcação que leve de lastro tanto de democracia quanto de direitos humanos, ou a divina proporção de cada um. l (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
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DIREITOS HUMANOS
PESSOAS COM ALBINISMO OS MAIS DISCRIMINADOS DOS DISCRIMINADOS
MARGARIDA FERREIRA CARNEIRO, PRESIDENTE DA DIRECÇÃO DA KANIMAMBO
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MIGUEL ANACORETA CORREIA, PRESIDENTE DO CONSELHO DE FUNDADORES DA KANIMAMBO
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os últimos anos têm sido muitos os artigos na imprensa e programas de televisão relatando a difícil situação que as pessoas com albinismo enfrentam na África Oriental. Em África, a prevalência do Albinismo é superior à verificada noutros continentes. Chega a atingir uma Pessoa com Albinismo (PCA) por 1.000 habitantes, enquanto noutras regiões não ultrapassa 1: 20.000. Não existem estatísticas e, por isso, estima-se ser algo entre 20.000 e 30.000 o número de PCA em Moçambique. Desde tempos imemoriais sempre houve uma atitude discriminatória e de desprezo pelas Pessoas com Albinismo. Mas no triângulo constituído por Moçambique, Malawi e Tanzânia, veio juntar-se à discriminação um fenómeno novo, com origem já na segunda década deste século, que é a perseguição com vista à mutilação e assassínio para o fabrico de poções, pós e amuletos, que a feitiçaria garante darem sucesso e sorte aos seus clientes. O “negócio” atinge valores de dezenas de milhares de euros por pessoa morta. Para além da situação de discriminação e perseguição, as pessoas com albinismo têm carências de visão, o que dificulta a sua escolaridade e aprendizagem, logo a sua integração social. Por outro lado, a exposição ao sol (dada a ausência de melanina) provoca cancros de pele que se manifestam prematuramente e são responsáveis porque a esperança média de vida não atinja 35 anos. Kanimambo: em defesa das pessoas com albinismo A Kanimambo é uma ONGD, para a defesa das pessoas com albinismo de Moçambique, constituída oficialmente
em 2016, mas com início de actividade há mais de seis anos. Actua a partir de quatro pontos: Maputo, Nampula, Inharrime e Parque Nacional de Gorongosa. Não pretende, dada a sua limitada capacidade, actuar em todo o país, nem ser a solução do problema, mas sim, ser uma referência de boas práticas na assistência e constituir elemento inspirador de boas políticas que venham a ser adoptadas. Em 2018 prestámos assistência a quase 400 pessoas com albinismo, especialmente crianças. Os eixos de actuação são, basicamente três: consciencialização da população (em Portugal e Moçambique); envio e distribuição de materiais de protecção para Moçambique (protectores solares, cicatrizantes, chapéus, etc.) e missões médicas de oftalmologia e dermatologia. Em ambos os casos, além das consultas, têm-se efectuado intervenções cirúrgicas e, no caso da oftalmologia, são posteriormente distribuídos óculos graduados com protecção UV (oferta de ópticas amigas). A Kanimambo tem os seus órgãos sociais em Portugal, destacando-se a direcção e o conselho de fundadores. Desde há cerca de um ano está reconhecida a sua existência legal em Moçambique, tendo sido nomeado o seu representante em Moçambique, Eng. Nuno Bento, que constituiu uma equipa de trabalho. Até hoje não beneficiou de qualquer subsídio oficial e todos os que nela trabalham fazem-no de forma gratuita. Cerca de 20% dos valores consumidos nas suas acções provêm de contribuições regulares do Grupo de Amigos da Kanimambo (GAK) e 80% resultam de contribuições de empresas portuguesas e moçambicanas.
B E R N A R D E T E , Q U AT R O A N O S D E I D A D E . V I V E E M M A P U T O E X T R E M A M E N T E S I M PÁT I C A . É U M A V E R D A D E I R A M A S C O T E D A K A N I M A M B O
Os novos projectos A Kanimambo pretende realizar um projecto de capacitação dos futuros professores primários de todo o Moçambique, pois achamos que a mudança fundamental de atitudes só pode acontecer a partir da Escola e dos Manuais Escolares. Este projecto está em discussão com o Ministério da Educação e com Organismos potencialmente financiadores. A organização apoia e participa num projecto de uma Clínica Médica em Nampula promovido pela Sociedade Portuguesa de Dermatologia. O projecto, ainda no seu início, tem já assegurado o apoio do Ministério da Saúde de Moçambique, do Governo da Província de Nampula, da Universidade Lúrio (UNILURIO) e dos Hospitais Centrais de Maputo e de Nampula. A Kanimambo vem insistindo com o Governo de Moçambique de que é possível o estabelecimento de uma política de apoio cobrindo a quase totalidade do território de Moçambique com alta eficácia e custo muito reduzido, desde que se faça apelo a ONG adequadas, se incentive a cooperação entre elas, reduzindo a burocracia ao mínimo dos mínimos, por forma a que as ONG seleccionadas se sintam como “desejadas” para um projecto tão nobre. Finalmente – e essa é uma preocupação permanente da Kanimambo – aprofundar e melhorar o que tem vindo a ser feito. A Kanimambo continua a trabalhar com poucos meios, mas com enorme capital humano, tendo completado três anos de funcionamento independente enquanto Associação e ONGD. Procuramos, constantemente, novos parceiros e apoios; convidamo-lo(a) a conhecer-nos melhor através da nossa página www.knmb.pt e a entrar directamente em contacto pelo email kanimambo@knmb.pt. l
D R A . M U N F A R I A E M N A M P U L A . P O S T E R I O R M E N T E À S C O N S U LTA S , A S PESSOAS COM ALBINISMO RECEBEM ÓCULOS GRADUADOS COM PROTECÇÃO U V, O F E R TA D E Ó P T I C A S A M I G A S
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DIREITOS HUMANOS
UNICEF PORTUGAL
30 ANOS DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA: OS PRÓXIMOS DESAFIOS
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CONSCIENTE DOS DESAFIOS ACTUAIS, A UNICEF ESTÁ EMPENHADA EM CONTRIBUIR PARA A CONCRETIZAÇÃO DA AGENDA DOS OBJECTIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (ODS), EM PARTICULAR DAS METAS EM PROL DE TODAS AS CRIANÇAS E DAS GERAÇÕES FUTURAS, EM COLABORAÇÃO COM OS VÁRIOS ACTORES E PARCEIROS.
Celebramos este ano os 30 anos da Convenção dos Direitos da Criança. Ao longo das últimas três décadas, a Convenção sobre os Direitos da Criança tem transformado o modo como a criança é vista e tratada em todas as partes do mundo. Adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 20 de Novembro de 1989, a Convenção tornou-se o tratado de direitos humanos mais amplamente ratificado e é hoje um importante instrumento legal em todo o mundo. A sua adopção representou um compromisso histórico assumido pelos líderes mundiais e desde então tem exercido uma influência profunda no conjunto dos enquadramentos legais
ERRADICAR A POBREZA
ERRADICAR A FOME
SAÚDE DE QUALIDADE
ENERGIAS RENOVÁVEIS E ACESSÍVEIS
TRABALHO DIGNO E CRESCIMENTO ECONÓMICO
INDÚSTRIA, INOVAÇÃO E INFRAESTRUTURAS
AÇÃO CLIMÁTICA
PROTEGER A VIDA MARINHA
PROTEGER A VIDA TERRESTRE
EDUCAÇÃO DE QUALIDADE
IGUALDADE DE GÉNERO
ÁGUA POTÁVEL E SANEAMENTO
REDUZIR AS DESIGUALDADES
CIDADES E COMUNIDADES SUSTENTÁVEIS
PRODUÇÃO E CONSUMO SUSTENTÁVEL
PAZ, JUSTIÇA E INSTITUIÇÕES EFICAZES
PARCERIAS PARA A IMPLEMENTAÇÃO DOS OBJETIVOS
para todas as crianças
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DIREITOS HUMANOS
Todas as crianças sobrevivem e prosperam
Todas as crianças aprendem
Todas as crianças estão protegidas da violência e abusos
Todas as crianças vivem num ambiente seguro e limpo
Todas as crianças têm uma oportunidade justa na vida
ERRADICAR A FOME
EDUCAÇÃO DE QUALIDADE
IGUALDADE DE GÉNERO
ÁGUA POTÁVEL E SANEAMENTO
ERRADICAR A POBREZA
SAÚDE DE QUALIDADE
IGUALDADE DE GÉNERO
TRABALHO DIGNO E CRESCIMENTO ECONÓMICO
CIDADES E COMUNIDADES SUSTENTÁVEIS
IGUALDADE DE GÉNERO
PAZ, JUSTIÇA E INSTITUIÇÕES EFICAZES
ACÇÃO CLIMÁTICA
REDUZIR AS DESIGUALDADES
IGUALDADE DE GÉNERO
PAZ, JUSTIÇA E INSTITUIÇÕES EFICAZES
O S O B J E C T I V O S D A U N I C E F E O S O B J E C T I V O S D E D E S E N V O L V I M E N T O S U S T E N TÁV E L
internacionais para a protecção e bem-estar das crianças. A Convenção oferece uma visão de um mundo no qual todas as crianças se desenvolvem plenamente, no qual são protegidas, respeitadas e incentivadas a participar nas decisões que as afectam. A Convenção transforma a perspectiva sobre a criança, de ser passivo para sujeito de direitos. Garantir que todas as crianças gozam plenamente os seus direitos, é garantir também a criação de um mundo de paz, tolerância, equidade, segurança e sustentabilidade do planeta. A UNICEF trabalha especificamente para a promoção e defesa dos direitos das crianças, estando presente em mais de 190 países, incluindo em países devastados por conflitos e nas comunidades mais remotas. Trabalha para que todas as crianças tenham direito à sobrevivência, educação, cuidados de saúde, nutrição adequada, acesso a água e protecção e está no terreno antes, durante e após as emergências humanitárias. A UNICEF é inteiramente financiada por contribuições voluntárias 24
públicas e privadas. Em 2015, a adopção dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável pela Assembleia Geral das Nações Unidas representou um compromisso importante dos Estados para a erradicação da pobreza e o desenvolvimento económico, social e ambiental à escala global até 2030. A UNICEF, consciente dos desafios actuais, incorporou a Agenda dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em particular das metas em prol das crianças, para a concretização dos Direitos da Criança em todo o Mundo. Os princípios da Convenção sobre os Direitos da Criança caminham lado a lado com os ODS e requerem uma acção à escala mundial de governos, empresas e sociedade civil para erradicar a pobreza, criar uma vida com dignidade e oportunidades para todos. Com efeito, os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, articulando os princípios intemporais e internacionais da Convenção sobre os Direitos da Criança, são uma perspectiva contemporânea de desenvolvimento social, económico e ambiental sustentável.
1. O PROGRESSO DESDE 1989 ATÉ AOS DESAFIOS DE HOJE
Para compreender o progresso conseguido nos últimos 30 anos, os desafios actuais e futuros para as crianças, é importante identificar alguns dos principais avanços e o seu impacto na vida das crianças desde 1990, aquelas que continuam a ser áreas de preocupação e os desafios a nível internacional e em Portugal. O progresso nos indicadores de sobrevivência, como a taxa de mortalidade infantil, e os avanços na área de educação, demonstram como globalmente, e em particular em Portugal, as políticas e programas têm assegurado às crianças uma estrutura para viverem e concretizarem o seu potencial. No entanto, todas as crianças precisam de uma oportunidade justa na vida e analisando a situação actual, muitas crianças ainda se vêem privadas de serviços básicos e o seu dia-a-dia é influenciado pela pobreza ou situações de violência. As alterações climáticas e os perigos do mundo digital, reforçam a importância de uma acção urgente e concertada para garantir que as crianças, hoje e no futuro, possam crescer e desenvolver-se plenamente.
Em 2017, 80 países alcançaram a cobertura, praticamente universal, de serviços básicos de água potável
0-25 25-50 50-75 75-99 >99 Not applicable Proportion of population using at least basic drinking water services, 2017 (%)
2 . O S AVAN ÇO S D E S D E 1 989
Acesso à água e saneamento básico Muito foi alcançado ao longo dos últimos 30 anos. Desde 1990, o número de pessoas com acesso a água potável aumentou em 2,6 milhões. Porém, mais de metade da população mundial não tem acesso a serviços de saneamento seguros 1 . As crianças que vivem em áreas pobres e rurais correm maior risco de serem deixadas para trás. Vacinação Desde 1990, os esforços globais para garantir que todas as crianças têm acesso a cuidados adequados à saúde têm sido
notáveis, em particular, no que diz respeito à vacinação. Esta representa a primeira linha de defesa contra vários tipos de doenças infecciosas, algumas delas mortais para as crianças. Em 2010, a cobertura de vacinação com três doses de difteria, tétano e tosse convulsa e uma dose da vacina contra o sarampo estagnou nos cerca de 86% de cobertura. Embora elevada, esta taxa não é suficiente, urgindo a necessidade de uma cobertura de 95%, em todo o mundo, para deter os surtos de doenças evitáveis pela vacinação. Em 2018, a UNICEF vacinou quase metade das crianças do mundo. Foram administradas 2,36 mil milhões de doses de vacinas para combater
doenças, como o sarampo, a difteria, o tétano e o vírus do papiloma humano. Mortalidade Infantil A taxa de mortalidade infantil é um indicador crucial para avaliar os progressos para atingir os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável. São inúmeros os factores que podem pôr em causa a sobrevivência de uma criança nos seus primeiros anos de vida. Complicações neonatais e doenças infecciosas como a pneumonia, a diarreia e a malária são as principais causas de morte das crianças com menos de 5 anos de idade. Desde 1990, a taxa de mortalidade infantil reduziu em 50%,
P r o g r e s s o n h o u s e h o l d d r i n k i n g w a t e r, s a n i t a t i o n a n d h y g i e n e 2 0 0 0 - 2 0 1 7. S p e c i a l f o c u s o n i n e q u a l i t i e s . N e w Yo r k : United Nations Children’s Fund (UNICEF ) and World Health Organization, 2019.
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para todas as crianças
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DIREITOS HUMANOS
Reduziu 50% a taxa de mortalidade infantil, desde 1990
Diminuiu para metade o número de crianças subnutridas, desde 1990
Aumento em 2,6 milhões o número de pessoas com acesso a àgua potável, desde 1990
PROGRESSOS A NÍVEL GLOBAL
correspondendo a 50 milhões de crianças salvas. Porém, esta taxa continua elevada – em 2016, morreram 5,6 milhões de crianças de causas evitáveis, o que reforça a urgência de unir esforços para que o único sentido seja assegurar o direito à vida e à sobrevivência de todas as crianças. Subnutrição Embora o número de crianças subnutridas tenha diminuído para metade nos últimos 30 anos, foram registadas 155 milhões de crianças subnutridas em 2016. A subnutrição coloca em causa o desenvolvimento pleno da criança, tendo implicações directas na capacidade de concentração e no sucesso escolar. Educação Desde 2000, foram matriculadas na escola primária 50 milhões de crianças. Em particular, o número de raparigas que entraram na escola aumentou significativamente, sendo que muitos países atingiram a igualdade de género. No entanto, estima-se que 59 milhões de crianças em idade escolar (incluindo 31 milhões de raparigas) e 65 milhões de adolescentes (dos quais 32 milhões são raparigas), estão ainda fora da escola. Para além da necessidade de aumentar o acesso, para muitos daqueles que frequentam a escola, a qualidade da educação é baixa, pondo em risco a aprendizagem. Mais de 175 milhões de crianças - cerca de metade das crianças em idade pré-escolar no mundo - não estão matriculadas no ensino pré-escolar, 26
perdendo oportunidades e sofrendo profundas desigualdades desde uma altura precoce das suas vidas. As crianças que frequentam pelo menos um ano de educação pré-escolar têm maior probabilidade de desenvolver as competências essenciais para poderem ter sucesso escolar e ficam menos propensos a retenção ou abandono escolar e, portanto, mais capazes de contribuírem para a construção de sociedades e economias pacíficas e prósperas quando atingirem a idade adulta. No caso de Portugal, o país apresenta valores de frequência e investimento na educação pré-escolar em linha com os países europeus. A taxa de frequência das crianças em Portugal em educação pré-escolar é de 92,5% (a média da União Europeia é de 95,3%) e o Governo investe cerca de 8,8% do
orçamento em educação no ensino pré-escolar (a UNICEF insta os governos a comprometer pelo menos 10% dos seus orçamentos nacionais de educação na ampliação da educação pré-escolar). 3. A AGENDA DOS DIREITOS DA CRIANÇA ESTÁ LONGE DE SER TOTALMENTE CUMPRIDA
Milhões de crianças em todo o mundo não gozam, ainda, plenamente todos os seus direitos, sendo privadas de serviços essenciais que contribuem para sua sobrevivência, bem como, para reduzir a sua vulnerabilidade a doenças, para assegurar o acesso a água e saneamento e permitir que tenham acesso a uma educação de qualidade. Casamento infantil Muitas crianças não crescem num ambiente protector, fundamental para
F O N T E : M I N I S T É R I O D A J U S T I Ç A / R E S P O S TA G O V E R N O P O R T U G U Ê S A O C O M I T É D O S D I R E I T O S D A CRIANÇA 28 DE JUNHO 2019
salvaguardá-las da violência, abusos e exploração. Desde 1990, estima-se que cerca de 650 milhões de crianças casaram com menos de 18 anos. Em números absolutos, os continentes africano e asiático registam as maiores concentrações de privações dos direitos da criança. Mantendo-se as tendências actuais, a prática do casamento infantil não será eliminada até 2030, tal como os Estados se comprometeram na Agenda 2030 – Objectivos Desenvolvimento Sustentável. Em Portugal, mais de 150 crianças, entre os 16 e os 18 anos, contraíram matrimónio em 2018, segundo dados do Ministério Justiça. A UNICEF Portugal tem alertado para a necessidade de revisão do enquadramento legal para o fim do casamento infantil, ou seja, a partir dos 16 anos, no sentido de assegurar que todas as crianças possam crescer e desenvolver-se plenamente, e tenham garantidos todos os direitos civis, políticos, económicos, sociais e culturais. Violência contra as crianças O problema da violência contra a criança é alarmante: estima-se entre 500 milhões e 1,5 mil milhões de crianças são vítimas de violência todos os anos. Em todo o mundo, cerca de 130 milhões de alunos (1 em cada 3), entre os 13 e os 15 anos, sofrem de ‘bullying’. As crianças que sofrem deste tipo de violência têm um desempenho escolar mais baixo do que aqueles que não são vítimas. A violência ocorre, não apenas no interior das escolas, mas no caminho para a escola. Em 2016, foram documentados cerca de 500 ataques ou ameaças contra escolas em 18 países ou áreas afectadas por
CRIANÇAS QUE VIVEM EM SITUAÇÃO DE POBREZA
conflitos. É essencial a criação de ambientes de aprendizagem seguros para garantir que todas as crianças são protegidas, bem como, é crucial acabar com castigos corporais, assédio e abuso verbal ou sexual, agressão ou violência ‘online’. Acabar com a violência é urgente para assegurar os direitos de todas as crianças. Em Portugal, a violência doméstica é um dos desafios de direitos humanos mais presente, sendo especialmente preocupante a invisibilidade da criança neste tipo de crime. Além dos efeitos imediatos, como sejam os problemas psicológicos e de comportamento ou dificuldades na aprendizagem, as crianças expostas a violência em casa, podem sofrer efeitos graves e duradouros. Todas as crianças têm o direito a protecção e a sentirem-se seguras, precisando de um ambiente protegido para crescer de forma saudável. Pobreza infantil Em todo o mundo, demasiadas crianças vivem em situações de pobreza. A infância é uma oportunidade única, mas também pode ser uma fase de vulnerabilidade, pelo que viver a pobreza nas suas
variadas formas, é particularmente prejudicial para o desenvolvimento da criança. Desde 1990, o número de crianças a viverem na pobreza reduziu mais de 50%. Contudo, ainda hoje, aproximadamente uma em cada duas pessoas que vive em extrema pobreza no mundo, tem menos de 18 anos. A pobreza infantil não se trata de uma preocupação apenas de países em desenvolvimento; em todos os países do mundo é possível identificar situações de crianças que, vivem em contextos vulneráveis, enfrentam desigualdades no acesso a educação, condições básicas de água, saneamento e higiene ou cuidados de saúde. Em Portugal, estima-se que 18,9% das crianças e jovens até aos 18 anos vivam em risco de pobreza. Apesar da diminuição nos últimos anos, o número continua bastante elevado e as crianças continuam a ser as mais afectadas pela pobreza no país. Portugal é, ainda, um dos países com maiores desigualdades quando comparado com os restantes países da UE e da OCDE. O combate às desigualdades assume-se como indispensável para um desenvolvimento mais justo,
para todas as crianças
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DIREITOS HUMANOS
DEFINI ÇÕ E S
D E
P O BR E Z A :
POBREZA EXTREMA – SITUAÇÃO EM QUE A PESSOA VIVE COM MENOS DE 1,90$ POR DIA (BANCO MUNDIAL) LINHA DE POBREZA RELATIVA – 60% DA MEDIANA DA DISTRIBUIÇÃO DOS RENDIMENTOS MONETÁRIOS LÍQUIDOS EQUIVALENTES (INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA) PRIVAÇÃO MATERIAL DAS FAMÍLIAS – A TAXA DE PRIVAÇÃO MATERIAL DOS AGREGADOS FAMILIARES REFERE-SE À INCAPACIDADE DESTES PARA FAZER FACE A UM CONJUNTO DE BENS/SERVIÇOS, DEFINIDOS POR REGIÕES DO PLANETA, QUE PODEM INCLUIR CAPACIDADE PARA TER UMA REFEIÇÃO DE CARNE OU MANTER A CASA ADEQUADAMENTE AQUECIDA.
inclusivo e sustentável. A UNICEF tem apelado à adopção de uma Estratégia Nacional para a Erradicação da Pobreza Infantil, centrada numa abordagem multidimensional e que inclua medidas integradas e um investimento em serviços públicos, como a educação pré-escolar. As crianças que crescem em situação de pobreza ou exclusão social têm menor probabilidade de frequentar a educação pré-escolar, de ter sucesso escolar, de gozar de boa saúde e de desenvolver plenamente as suas potencialidades. Alterações climáticas Uma das maiores preocupações deste século são as alterações climáticas, uma vez que põem em risco o direito
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das crianças, desde a sua sobrevivência ao seu bem-estar, do acesso à água, à alimentação e à educação. Actualmente, mais de 500 milhões de crianças vivem em áreas onde a precipitação extrema é frequente e 160 milhões vivem em regiões de seca severa. Além disso, as alterações climáticas significam subidas da temperatura, vagas de calor, cheias, secas e outros fenómenos meteorológicos extremos que podem causar morte e devastação, contribuindo para o aumento da má nutrição e da propagação de doenças infecciosas, as principais causas de morte entre crianças. A exploração insustentável de recursos naturais é também uma preocupação real e actual. Desde
a década de 1990, pelo menos 18 conflitos violentos envolveram a luta por recursos naturais. A disputa contínua por estes recursos ocorre num mundo em que a população cresce rapidamente, tal como a urbanização, exercendo uma pressão acrescida e desproporcionada sobre os recursos naturais existentes. Tecnologias digitais A criação de novas oportunidades, incluindo o avanço na ciência, tecnologia e inovação, têm permitido à criança, incluindo as que vivem em situação mais desfavorecida, aumentar o acesso à informação, desenvolver competências necessárias ao mercado de trabalho digital e proporcionar-lhes uma plataforma para se conectarem, comunicarem e partilharem as suas opiniões. Apesar da presença massiva das crianças no meio ‘online’ (1 em cada 3 utilizadores de internet em todo o mundo é uma criança), muito pouco é feito no âmbito da protecção dos perigos do mundo digital e para tornar o acesso a conteúdos ‘online’ mais seguros. Tornar o mundo digital mais seguro e acessível a todas as crianças é essencial para não deixar ninguém para trás. Desta forma, o mundo enfrenta o desafio de consolidar os progressos inquestionáveis do passado, mitigar os riscos e aproveitar as oportunidades actuais e futuras para assegurar todos os direitos, a todas as crianças.
Cerca de 160 milhões de crianças vivem em zonas de seca de severidade ‘alta’ ou ‘extremamente alta’
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MILLION
children living in areas of high or extremely high drought severity
6
8
MILLION
MILLION
children living in areas of high or extremely high drought severity
children living in areas of high or extremely high drought severity
High child population density
Drought severity Mean length x dryness Low (<20) Low to medium (20–30) Medium to high (30–40) High (40–50)
8
MILLION
children living in areas of high or extremely high drought severity
27
MILLION
children living in areas of high or extremely high drought severity Note: Drought severity estimates the average of the length times the dryness of droughts from 1901 to 2008. Drought is defined as a continuous period where soil moisture remains below the 20th percentile. Length is measured in months, and dryness is the number of percentage points below the 20th percentile (Sheffield and Wood 2007, provided by WRI). For a full description of droughts, see Annex A.
Extremely high (>50) No data
This map does not reflect a position by UNICEF on the legal status of any country or territory or the delimitation of any frontiers. The dotted line represents approximately the Line of Control in Jammu and Kashmir agreed upon by India and Pakistan. The final status of Jammu and Kashmir has not yet been agreed upon by the parties. The final boundary between the Sudan and South Sudan has not yet been determined. The final status of the Abyei area has not yet been determined.
Source: UNICEF analysis, 2015. Original drought maps from World Resources Institute (WRI) Aqueduct.
PARA TODAS AS CRIANÇAS, TODOS OS DIREITOS: A NOSSA MISSÃO PARA OS PRÓXIMOS 30 ANOS
Em 2019, nem todas as crianças do mundo gozam plenamente dos seus direitos. 30 anos depois da adopção da Convenção sobre os Direitos da Criança, os direitos das crianças não mudaram, não têm um prazo de validade, continuam claros e objectivos. Contudo, o crescimento da tecnologia digital, as mudanças climáticas, as crises
humanitárias e as migrações estão a transformar a infância e adolescência. As crianças enfrentam novas ameaças aos seus direitos, mas também têm novas oportunidades para realizar os seus direitos. É premente recuperar a visão e o compromisso que levou à adopção da Convenção, em 1989, num esforço conjunto de todos os líderes mundiais, empresários e comunidades para que, em conjunto, todas as crianças gozem todos os seus direitos. O objectivo para os próximos 30 anos
é avançar a partir dos progressos já realizados, trabalhando em conjunto para chegar às crianças que têm os direitos negados. A implementação plena da Convenção e a concretização das metas estabelecidas pelos ODS requerem a colaboração de todos. Para as empresas, em particular, estas metas constituem uma oportunidade para criar e implementar soluções e tecnologias que respondam aos maiores desafios globais e aos direitos humanos. l
para todas as crianças
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DIREITOS HUMANOS
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MÓNICA FARINHA, PRESIDENTE DO CONSELHO PORTUGUÊS PARA OS REFUGIADOS
CONSELHO PORTUGUÊS PAR A OS REFUGIADOS
CONTRIBUIR PARA A MELHORIA DO SISTEMA DE PROTECÇÃO EM PORTUGAL PORTUGAL TEM MANTIDO UMA POSIÇÃO FAVORÁVEL À PROTECÇÃO DOS REFUGIADOS, COM INTERESSE EM CONSOLIDAR UMA POLÍTICA DE ACOLHIMENTO E INTEGRAÇÃO, DEFENDENDO MECANISMOS DE SOLIDARIEDADE NO ÂMBITO DA UNIÃO EUROPEIA.
A
ssistimos hoje ao aumento do número de pessoas forçadas a deslocar-se devido a perseguição, a conflitos e à sistemática violação dos direitos humanos. Assistimos também à polarização da opinião pública e de posições políticas extremas quanto aos refugiados, bem como a deficiências nos sistemas de protecção e de acolhimento. O asilo constitui hoje um tema de interesse global e Portugal não constitui excepção. Todavia, ainda que com diversos níveis de visibilidade e reconhecimento, legislativo e institucional, os refugiados têm estado sempre presentes. Ao longo do séc. XX, Portugal foi país gerador de refugiados, mas também país de trânsito e de acolhimento para aqueles em fuga da Guerra Civil Espanhola, da II Guerra Mundial e de outros conflitos armados. No séc. XXI, Portugal continuou a garantir protecção a vítimas de perseguições por razões religiosas, étnicas, opiniões políticas, nacionalidade, pertença a determinado grupo social e violações sistemáticas dos direitos humanos. O Conselho Português para os Refugiados (CPR) nasce da vontade e do esforço de um grupo de pessoas, que reconheceu a necessidade de constituir uma organização humanitária e independente que prestasse apoio à população refugiada em Portugal. Desde 1991 que o CPR, Organização não-Governamental para o Desenvolvimento, tem como missão a defesa e a promoção do direito de asilo, prestando apoio especializado e gratuito a requerentes e beneficiários de protecção internacional, advogando pelo reconhecimento e implementação dos seus direitos, promovendo o acolhimento através de estruturas dedicadas, contribuindo para o seu
W
e are currently witnessing an increase in the number of people forced to move around due to persecution, conflicts and systematic violation of human rights. We witness also the polarization of public opinion and extreme political positions towards refugees, as well as deficiencies in both protection and reception systems. Asylum is today a topic of global interest and Portugal is no exception to the rule. However, albeit with different levels of exposure and recognition, both at legislative and institutional level, refugees have always been there. Throughout the 20th century Portugal was a refugee-generating country, but also a transit and host country for those fleeing the Spanish Civil War, World War II and other armed conflicts. In the 21st Century, Portugal continued to provide protection to victims of persecution for religious reasons, ethnicity, political opinion, nationality, affiliation to a particular social group and systematic violations of human rights. The Portuguese Refugee Council (CPR) was born out of the will and effort of a group of people who acknowledged the need to establish an independent humanitarian organization to provide support to the refugee population in Portugal. Since 1991, a Non-Governmental Organization for Development (CPR) has had the task to defend and promote the right to asylum, providing free and dedicated support to applicants and recipients of international protection, advocating recognition and implementation of their rights, promoting reception through dedicated structures, assisting their empowerment and integration 31
CONSELHO PORTUGUÊS PARA OS REFUGIADOS
Ao longo de três décadas podemos destacar: Celebração do 1º Protocolo de Cooperação com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). O CPR é, desde esta data, o parceiro operacional desta instituição em Portugal
1992
Acreditação junto do Instituto para a Qualidade na Formação como entidade formadora (presencial e e-learning)
1994
1998
1993
1997
Adesão ao European Council on Refugees and Exiles - ECRE, rede europeia de 101 ONGs de apoio a refugiados
Adesão à European Legal Network on Asylum – ELENA
2007
Reconhecimento do papel do CPR no âmbito do procedimento, em matéria de informação e apoio jurídico e supervisão na Lei do Asilo
2004 2004 Criação do Refugiacto
Inauguração do Centro de Acolhimento para Crianças Refugiadas - CACR
2000 Adesão à Rede Separated Children European Programme - SCEP
Adesão ao Asylum Information Database (AIDA) / ECRE, participando no mapeamento dos procedimentos de asilo, condições de acolhimento, detenção e protecção na Europa
2014 2012
Assinatura do Protocolo de Cooperação em Matéria de Apoio a Refugiados e Requerentes de Asilo, que criou o 1º Grupo Operacional de Cooperação, bem como Comissão de Acompanhamento, que reúne os principais intervenientes nesta temática1
Atribuição do Prémio Direitos Humanos da Assembleia da República
2000
2006
2012
1999
Atribuição do Estatuto de ONGD pelo IPAD – Ministério dos Negócios Estrangeiros
Inauguração do Centro de Acolhimento para Refugiados – CAR
Entrada em funcionamento do “Espaço A Criança” – creche e jardim-de-infância
Nomeação - Membro da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR)
Inauguração do Centro de Acolhimento para Refugiados – CAR2
2018 2017
Adesão ao Conselho Municipal para a Interculturalidade e Cidadania (CMIC) de Lisboa (membro observador)
2019 Adesão à European Network Statelessness – ENS
1 O Protocolo, assinado em Setembro de 2012, promove uma política integrada de intervenção, com o objectivo de regular a cooperação de todos os organismos com competência na matéria: Instituto da Segurança Social, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Instituto do Emprego e Formação Profissional, Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Alto Comissariado para as Migrações e CPR.
32
empoderamento e integração na sociedade de acolhimento, e sensibilizando as autoridades e a sociedade civil para a garantia do direito de asilo, promovendo, dessa forma, uma política de asilo, no respeito pelas obrigações internacionais. Ao longo dos últimos 27 anos, verificaram-se alterações significativas no enquadramento normativo nacional, nomeadamente através da progressiva integração europeia com o objectivo de assegurar práticas uniformes, bem como no contexto operacional. Em 1991, registaram-se em Portugal 234 pedidos de asilo espontâneos2. De 442 pedidos em 2014, Portugal passou para 1190 pedidos espontâneos em 2018, o que representa um aumento de 170% nos últimos anos. Em 2019, até ao momento, foram comunicados pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) 850 pedidos, ou seja, mais 51% de pedidos do que em 2018. Em 2019, o CPR continua a acolher a maioria dos requerentes espontâneos em Portugal3, prestando apoio jurídico a 90% destes, que se podem caracterizar como sendo maioritariamente do sexo masculino (68%), apresentando pedidos em território nacional (60%) e chegando sós a Portugal. 41 requerentes foram inicialmente registados como crianças não acompanhadas e 256 pessoas foram identificadas como particularmente vulneráveis (crianças, crianças não acompanhadas, famílias monoparentais, mulheres grávidas, idosos, pessoas com deficiência, sobreviventes de tortura,
in the host society and raising the authorities and civil society awareness to the right to asylum, thereby promoting an asylum policy and complying with international commitments. Over the past 27 years, there have been significant changes in the national regulatory framework, notably through progressive European integration aimed at ensuring uniform practices, and in the operational framework. In 1991, 234 spontaneous asylum applications were submitted in Portugal 1. From 442 orders in 2014, Portugal moved to 1,190 spontaneous applications in 2018, an increase of 170% in recent years. In 2019 to date, 850 applications were reported by the Foreigners and Borders Service (SEF), 51% more than in 2018. In 2019, the CPR continues to receive the majority of spontaneous applicants in Portugal2, providing legal support to 90% of them, who can be defined as being mostly male (68%), submitting applications in national territory (60%) and arriving alone in Portugal. 41 applicants were initially registered as unaccompanied children and 256 people were identified as particularly vulnerable (children, unaccompanied children, single-parent families, pregnant women, elderly, people with disabilities, survivors of torture,
2 Requerentes que apresentam pedido de protecção internacional em Portugal, quer em território nacional, quer nos postos de fronteiras, junto das autoridades competentes – SEF. 3 Em 2019, até ao momento, o CPR acolheu o número recorde de 1100 requerentes e 66 menores não acompanhados.
1 A p p l i ca nts a p p ly i n g fo r i nte rn ati o n a l p ro te cti o n i n Po rtu ga l , e i th e r o n n at i o n al te rri to r y o r at b o rd e r cro ss i n g s , w i th th e re le va nt a u th o ri ti e s - SEF. 2 I n 2 019 a n d to d ate , th e C PR w e lco m e d a re co rd n u m b e r of 1,100 a p p l i c ant s an d 6 6 u n a cco m p a n i e d m i n o rs .
PORTUGAL
2014 > 442 2018 > 1190 +170%
68%
32%
De 442 pedidos em 2014,
Em 2019, o CPR continua a
Característica interessante do
Portugal passou para 1190
acolher a maioria dos
contexto português é a diversi-
pedidos espontâneos em 2018,
requerentes espontâneos em
dade de países de proveniência.
o que representa um aumento
Portugal , prestando apoio
Em 2019 registaram-se pedidos
de 170% nos últimos anos.
jurídico a 90% destes, que se
de protecção de pessoas
podem caracterizar como sendo
originárias de 62 países.
maioritariamente do sexo masculino (68%), apresentando pedidos em território nacional (60%) e chegando sós a Portugal. 33
violência física, psicológica ou sexual, pessoas com doenças graves ou crónicas). Característica interessante do contexto português é a diversidade de países de proveniência. Em 2019 registaram-se pedidos de protecção de pessoas originárias de 62 países. Naturalmente a evolução quantitativa e a diversidade de países de proveniência dos requerentes e beneficiários de protecção internacional diversifica o trabalho dos intervenientes neste domínio, mas comporta exigências para prestar o apoio adequado e analisar adequadamente os processos4. O actual contexto de aumento crescente de requerentes tem tido também impacto em todos os intervenientes (autoridades, tribunais), mas particularmente no CPR, que se encontra na primeira linha de resposta à população refugiada, nomeadamente no que diz respeito ao acolhimento5, 6. No contexto nacional verifica-se também a diversificação nas formas de protecção, que abrangem mecanismos como a Recolocação e a Reinstalação. Com efeito, Portugal acolheu 1520 requerentes recolocados ao abrigo da Agenda Europeia para as Migrações durante o período 2015-2018. Existe igualmente o compromisso de reinstalar 1010 refugiados, provenientes da Turquia e do Egipto. Portugal tem mantido uma posição favorável à protecção dos refugiados, com interesse em consolidar uma política de acolhimento e integração, defendendo mecanismos de solidariedade no âmbito da União Europeia. Com 27 anos de experiência reconhecida, o CPR tem um mandato único, reconhecido pela Lei do Asilo e pelos principais interlocutores. É uma organização com uma missão e trabalho consolidados, com cerca de sete dezenas de colaboradores, vários projectos financiados por entidades europeias e nacionais, visando a promoção de políticas de protecção humanitárias, estáveis e sustentáveis. No contexto descrito, o CPR torna-se ainda mais necessário. Todavia, a experiência e o reconhecimento referidos representam igualmente reptos para a melhoria constante e incitamento para responder aos desafios. A estratégia consistirá em consolidar o relevante papel do CPR no acolhimento e no apoio especializado a esta população, adaptando-o a um contexto nacional em mutação, colaborando com as instituições governamentais e com os parceiros (ACNUR, SEF, mas também parceiros locais), promovendo a participação dos refugiados, mobilizando a opinião pública e a sociedade civil e defendendo junto das entidades governamentais o cumprimento das obrigações internacionais, da cooperação europeia em soluções solidárias, bem como a promoção de um sistema nacional de protecção integrado e participativo, que envolva entidades públicas nacionais, regionais e locais, organizações do terceiro sector e representantes dos próprios refugiados. Acreditamos que Portugal tem todas as condições para desempenhar um papel importante, a nível europeu e internacional, no âmbito da protecção, e, como tal, também ao Conselho Português para os Refugiados é colocado este desafio. l
physical, psychological or sexual violence and people with illnesses, severe or chronic). A particular feature in the Portuguese context pertains to diversity of countries of origin. In 2019 there were requests for protection of people from 62 countries. The quantitative evolution and diversity of countries of origin of applicants and beneficiaries of international protection diversifies obviously the work of actors in this field but requires additional requirements to provide adequate support and to properly analyse the relevant files3. The current context of growing number of applicants has also had an impact on all actors (authorities, courts), but particularly on the CPR, the main institution when it comes to assist the refugee population, particularly as regards reception4, 5. In the national context, there is also some diversification in the means of protection, which include mechanisms such as Relocation and Resettlement. In fact, Portugal welcomed 1520 applicants relocated under the European Agenda on Migration during the 2015-2018 period. There is also a commitment to resettle 1010 refugees from Turkey and Egypt. Portugal has maintained a favourable stance as regards protection of refugees, focused on consolidating a policy of reception and integration, advocating solidarity mechanisms within the European Union. With 27 years of acknowledged experience, CPR has a unique mandate, recognized by the Asylum Law and key interlocutors. It’s an organization with a consolidated mission and work, with around seven dozen employees, a number of projects funded by European and national entities, aimed at promoting stable and sustainable humanitarian protection policies. In light of the picture described above CPR thus becomes even more necessary. However, the aforementioned experience and recognition also represent challenges towards ongoing improvement and encouragement to respond to such situations. The strategy will be to consolidate the relevant role of CPR in welcoming and providing dedicated support to this population, adapting it to the changing national context, working together with government institutions and partners (UNHCR, SEF but also with local partners), promoting the participation of refugees, mobilising public opinion and civil society and stating next to the governmental entities the need to comply with international commitments, European cooperation in solidarity solutions, as well as the promotion of a national integrated and participatory protection system involving national, regional and local authorities, the 3rd sector organizations and people and institution representing refugees. We believe Portugal has all the right conditions to play an important role, at European and international level, in the field of protection, and as such, the Portuguese Refugee Council is also faced with this challenge. l
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Em 2018, o CPR efectuou 10.1 78 atendimentos ( 5789 atendimentos jurídicos, 1656 atendimentos sociais e 2733 atendimentos no âmbito da integração). 5 Em 2018, o CPR garantiu o alojamento a 1,171 requerentes e 16 beneficiários de protecção internacional. 65 crianças e jovens não acompanhados requerentes de protecção foram acolhidos na Casa de Acolhimento para Crianças Refugiadas. 6 Em 2018, o CPR prestou informação e apoio jurídico a 1,020 requerentes, o que representa 86% do total dos pedidos (1,190), Efectuou 1427 horas de formação em Português Língua Estrangeira.
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3
In 2018, the CPR assisted 10,178 people (5789 legal aids, 1656 social aids and 2733 aids in the field of integration) In 2018, the CPR secured housing for 1,171 applicants and 16 recipients of international protection. 65 unaccompanied children and young people seeking protection were welcomed into the Refugee Child Care Home. 5 In 2018, the CPR provided information and legal support to 1,020 applicants, representing 86% of the total applications (1,190). It provided 1427 hours of training in Portuguese as a Foreign Language. 4
DIREITOS HUMANOS DESPORTO
DE PUNHO ERGUIDO, JOELHOS NO CHÃO E VOZ INCÓMODA VELHAS E NOVAS FORMAS DE LUTA PELOS DIREITOS HUMANOS
AJ OE LHAD OS AO SO M D O H INO NAC IO N A L . E M D E CL A R AÇÕ E S P Ú BL ICA S N O S M E D IA E N AS RE D E S SOCI AI S. DESP O RTISTA S LUTA M CO N T R A O R ACIS M O E A BU S O S . E STÃO AO L A D O D O S D I R E I TOS D OS REFUG IA D O S. DÃO A VOZ P E L A IG UA L DA D E S A L A RIA L E D E G É N E RO, P EL AS M I N O RI AS, S E XUA IS E R EL IG IO SA S. O DE S P O RTO CO M O F O RM A D E LU TA P E LO RE S PEI TO D OS D I RE I TOS HUMA NO S R ETR ATA D O N A H ISTÓ RIA D E U M RE F U G IA D O, U M P RE TO, U MA LÉ S B ICA E UMA MUL H ER PR IVA DA DE V E R F U T E BO L . O VE L H O E O N OVO ACT IVIS M O E M AN O P RÉ - OLÍ MP I CO.
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DIREITOS HUMANOS
MIGUEL MORGADO
H
akeem Al-Araibi. Ariclenes da Silva Ferreira. Megan Rapinoe. Forough Alaei. Dois homens e duas mulheres. Três atletas. E uma fotojornalista. Um refugiado. Uma vítima de racismo. Uma mulher assumidamente lésbica. E outra que quer ver futebol ao vivo, mas o país onde vive, Irão, não o permite. O futebol liga-os. Por acaso. Assim como a luta pelos Direitos Humanos. O que não é um acaso. Um direito, ‘lato sensu’, onde cabe a luta contra o racismo, os direitos dos refugiados, a condenação dos abusos sexuais, a igualdade de género e defesa dos direitos das comunidades LGBT e a não discriminação por razões de sexo, orientação sexual ou religião. Por detrás de cada nome, uma estória que marca o ano. E quer marcar o curso da história. Poderiam ser muitos mais relatos. Doutros desportos. Individuais e colectivos. De jovens atletas vítimas de tráfego humano ou de abusos sexuais perpetrados pelos treinadores. E aqueles que sem serem desportistas, são a mão-de-obra que constrói estádios para os mundiais de futebol aos Jogos Olímpicos (ver caixa). Irão. O país onde as mulheres não entram nos estádios Forough Alaei é uma fotojornalista iraniana. Em 2019, venceu o World Press Photo com a fotografia (com o título “chorar pela liberdade”) de uma mulher, mascarada de homem, a assistir a um jogo de futebol no Estádio Azadi, em Teerão, capital do Irão, furando a proibição que vigora desde 1979, ano da revolução islâmica iraniana, que proíbe as mulheres de verem, ao vivo, 36
desportos masculinos. Recentemente, Alaei entrou num estádio, vestiu-se de homem e colocou uma barba, como um homem. Como é mulher, acabou detida. A fotojornalista seguiu o guião de Jafar Panahi’s, que retratou no filme (Offside, de 2006) a situação e ilustra o que movimentos como @OpenStadiums e #NoBanForWomen pedem. A proibição, é para a FIFA, uma clara violação da Política de Direitos Humanos e dos seus Estatutos, que no artigo 4 estatui que a discriminação contra mulheres “é estritamente proibido e punido por suspensão ou expulsão”. O organismo máximo do futebol mundial embora não queira melindrar costumes locais tem solicitado às autoridades iranianas que abram as portas dos estádios às mulheres, e que resolva, de vez, a tal lei não escrita de 1979. Uma questão que quer resolvida antes da fase de qualificação para o Mundial 2022. No ano passado, foi dada uma autorização excepcional a cerca de uma centena de mulheres para assistirem ao Irão-Bolívia, equipa iraniana, então, orientada por Carlos Queiroz. Desde então, o procurador-geral do Irão, Mohammad Jafar Montazeri, tem expressado publicamente que as mulheres não devem entrar nos estádios, uma vez que “ver homens seminus em roupas desportivas encaminha ao pecado”. Um refugiado na Austrália e um brasileiro preto a jogar pela Rússia Hakeem Al-Araibi. Ex-jogador de futebol do Bahrein. Em 2014 foi para a Austrália jogar no Pascoe Vale e três anos depois o país concedeu-lhe o estatuto de refugiado.
Crítico do regime do Bahrein e das instâncias futebolísticas (e do xeque Salman bin Ebrahim al-Khalifa, ex-presidente da Federação, candidato à presidência da FIFA, actual nº 1 da Confederação Asiática de Futebol e vice-presidente da FIFA), esteve 77 dias preso na Tailândia, país que não é signatário da Convenção das Nações Unidas sobre Refugiados de 1951, em Banguecoque, onde tinha ido passar férias com a sua mulher. À sua volta conseguiu uma histórica união de esforços de instâncias políticas, ONG’s (a Human Rights Watch lançou a campanha #SaveHakeem) e desportivas (FIFA e Confederação Asiática de Futebol) e personalidades públicas (Craig Foster, antigo jogador australiano). “O caso de Hakeem é sobre um jogador de futebol, um defensor dos direitos humanos, um refugiado e a capacidade do desporto global manter o compromisso que assinou com os Direitos Humanos”, afirmou recentemente Brendan Schwab, director executivo da Associação Mundial de Futebolistas. Ariclenes da Silva Ferreira, “Ari”, como é conhecido, nasceu na cidade de Fortaleza, no Ceará, Brasil. Futebolista, na Rússia desde 2010, tornou-se, por via da naturalização, no ano passado, o primeiro jogador negro com a camisola da selecção russa. Uma naturalização que mereceu um comentário de Pavel Pogrebniak, internacional do país do leste da Europa, que declarou numa entrevista ser “estranho ver um jogador negro na selecção russa”. A frase resultou num castigo monetário, embora este se tivesse retratado, alegando que não “tinha nada contra jogadores negros”, mas que preferia “ver jogadores nascidos criados no país” a representar a selecção.
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DIREITOS HUMANOS
JOGOS OLÍMPICOS, MUNDIAIS E OUTROS EVENTOS DESPORTIVOS Em 2018, no Mundial da Rússia, a AI entrou em campo com a #TeamBrave, equipa de 11 activistas locais que chamaram a atenção para as questões dos Direitos Humanos na Rússia “confrontando a tortura e outros abusos e maus-tratos cometidos pelas forças de segurança russas, protegendo o ambiente, apoiando vítimas de violência doméstica, pessoas das comunidades LGBT, trabalhadores sexuais e antigos presos”, leu-se, então, num documento assinado pela Amnistia Internacional. A três anos de distância, a mesma organização, têm apelado à FIFA que respeite direitos humanos na organização do Mundial 2022. O Qatar, sede do evento, tem levantado algumas dúvidas em relação à exploração das condições de vida dos trabalhadores envolvidos na construção quer dos estádios, quer das infra-estruturas de apoio. A construção e a dignidade dos trabalhadores é algo que também está na agenda do Comité Olímpico Internacional (COI) ao criar uma comissão de direitos humanos, liderada pelo jordano Zeid Ra’ad al-Hussein, antigo Alto-Comissário para os Direitos Humanos das Nações Unidos, a ser
Vítima de cânticos racistas, a situação não foi diferente de outros. Que o digam o antigo jogador do Porto, Hulk e Witsel (ex-Benfica), alvos dos adeptos do Zenit, clube cuja claque mais radical se tem manifestado contra jogadores negros e homossexuais. No que toca ao racismo, a FIFA, que quer estar “na linha da frente do combate a este ataque aterrador aos direitos humanos fundamentais”, anunciou recentemente uma alteração no código disciplinar, duplicando o castigo mínimo (de 5 para 10 jogos de suspensão) previsto para intervenientes do futebol que tenham comportamentos racistas. Além disso, os árbitros podem interromper, ou terminar, atribuindo derrota à equipa “infractora”, um jogo de futebol por incidentes racistas. Por fim, Megan Rapinoe, capitã da selecção norte-americana de futebol. Assumidamente gay desde 2012, para além da defesa das minorias e dos direitos da comunidade LGBT, Rapinoe, sente que é seu dever estender a sua influência a outros temas. Não poupa nem no verbo, nem na acção. Estrela mundial, aproveitou o 38
incluídos nos contratos com as cidades-sede dos Jogos Olímpicos, a partir de Paris 2024. Os eventos desportivos servem para mascarar políticas, acusam as organizações. Antes da final da Liga Europa, prova que se realizou no Estádio Olímpico de Baku, capital azeri, a Amnistia Internacional intensificou a pressão sobre a UEFA dizendo que o Azerbaijão, sede da partida, “não pode mascarar seu terrível histórico de violação dos direitos humanos através do desporto”. Por medo de sofrer com a violência por conta da disputa territorial que envolve Azerbaijão e Arménia, o arménio Henrikh Mkhitaryan (então no Arsenal) não jogou, nem viajou com a equipa. Os mesmos alertas são transmitidos por exemplo, em relação à Arábia Saudita e à sua lavagem desportiva – organização de eventos desportivos para tapar as violações de direitos humanos - ao promover o título de “Pesos Pesados” entre Anthony Joshua e Andy Ruiz Jr., apelidado de “Clash of the Dunes”, em Diriyah, a 7 de Dezembro. Um combate que vale 100 milhões de dólares.
estatuto para reacender o tema da luta pela igualdade salarial entre homens e mulheres (‘equal pay’). Antes, tinha dado o corpo ao manifesto por causas que outros sentem mais na pele. Em 2016, colocou-se na vanguarda da actual onda de activismo de atletas quando se ajoelhou ao som do hino nacional (foi a primeira atleta branca a fazê-lo) para mostrar solidariedade com o Colin Kaepernick, antigo jogador de futebol americano (NFL). Ajoelhar na hora de cantar o hino Quando se comemora os 71 anos da Declaração Universal dos Direitos
Humanos e os 41 da adesão de Portugal à Convenção Europeia dos Direitos Humanos, as quatros histórias ilustram bem aquilo que, ainda hoje, através do desporto, se procura combater. O activismo dos atletas está em diversos desportos. Em 2016, Colin Kaepernick, na altura uma das estrelas da NFL, activista pelos direitos humanos, contra a segregação racial, juntou os dois ingredientes e começou a ajoelhar-se, antes dos jogos, quando se escutava o hino norte-americano. Um gesto de protesto contra a violência policial e a desigualdade racial nos Estados Unidos que lhe valeu um exílio desportivo
“OS DIREITOS HUMANOS S ÃO D I R E I TOS I N E R E N T E S A TODOS OS SERES HUMANOS, I N D E P E N D E N T E M E N T E D E R AÇ A , S E XO, N AC I O N A L I DA D E , E T N I A , I D I O M A , R E L I G I ÃO O U Q UA LQ U E R O U T R A C O N D I Ç Ã O .” N AÇÕ E S U N I DA S
DESPORTO
“A D I S C R I M I N A Ç Ã O C O N T R A M U L H E R E S É E S T R I T A M E N T E P R O I B I D O E P U N I D O P O R S U S P E N S Ã O O U E X P U L S Ã O .” F I F A desde 2017. De ícone do desporto a mártir da justiça social, ‘persona non grata’ no campo, é um símbolo e uma consciência fora dele, ao ponto da Nike, ter lançado uma campanha que tinha como mote a frase “acredite em algo, mesmo que isso signifique sacrificar tudo”. A sua luta ganhou eco junto de outros desportistas. No basquetebol feminino norte-americano, em que diversas equipas numa das mais unidas e persistentes manifestações políticas na história do desporto, surgiram em apoio do movimento “Black Lives Matters” e obrigaram a WNBA (Liga Feminina) a recuar nas multas às jogadoras que usavam as camisolas de aquecimento com frases com protestos contra o racismo e a repressão policial. Em 2016, nos Prémios anuais do canal desportivo ESPN, quatro estrelas do basquetebol, LeBron James, Chris Paul, Dwyane Wade e Carmelo Anthony abriram a cerimónia com uma mensagem sobre a importância do papel que querem que os atletas desempenhem no apoio às causas sociais da América, como sejam a violência com armas, injustiça racial, força policial e outros que impactam na vida do país. É tempo de seguir as pisadas de outras vozes do desporto como Muhammad Ali, Jackie Robinson, John Carlos, Tommie Smith e Bill Russel, alertaram. Numa entrevista à CNN, Adam Silver, líder da NBA, recordou que o facto dos
jogadores de basquetebol da NBA serem “mais activos deve-se ao facto de ser parte da cultura da liga” e o “sentido de obrigação, responsabilidade social, desejo de falar directamente sobre temas que são importantes” tem sido passado de geração em geração. “Faz parte de ser jogador da NBA”, argumentou, citando o exemplo de Bill Russel, jogador dos anos 60 muito activo com causas sociais e no combate ao racismo.
Imboden (Esgrima) ajoelhou-se durante do hino nacional ao receber a medalha de ouro e a lançadora de martelo Gwen Berry, campeã, fechou os olhos e ergueu o punho fechado no pódio. “Precisamos cobrar por mudanças”, disse Imboden nas redes sociais, criticando o racismo, a política de armas, e os maus tratos a emigrantes da presidência de Donald Trump. Num ano pré-olímpico, estes jogos
“A P R Á T I C A D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A E D O DESP ORTO É UM DIREITO F U N D A M E N T A L D E T O D O S .” C A RTA I N T E R N AC I O N A L DA E D U C AÇ ÃO F Í S I C A E D O DESP ORTO DA UNESCO
O activismo dos atletas cresce e diversifica-se a tempo dos Jogos Olímpicos de 2020, em Tóquio, Japão. Apesar das motivações relacionadas com Black Lives Matter (questões raciais) permanecer na vanguarda dos protestos de muitos atletas, um movimento crescente desenvolveu-se, destacando uma multiplicidade de preocupações da sociedade, transcendendo raça, género e orientação sexual. Nos jogos Pan-americanos, em Lima, no Perú, passariam mais ou menos despercebidos não fosse o gesto de dois atletas norte-americanos. Race
“A ‘ P R ÁT I C A D E S P O R T I V A’ C O M O ‘ U M D I R E I T O H U M A N O ’. . . N ÃO D E V E S E R O B J E TO D E ‘ D I S C R I M I N AÇ ÃO D E Q U A L Q U E R T I P O ’ ”. C A RTA O L Í M P I C A
regionais serviram como uma “abertura” para o activismo global em Tóquio. Haverá espaço para uma versão 4.0 dos gestos de Tommie Smith e John Carlos, em 1968, nos JO do México? Eles, pretos, sem ténis, com meias pretas, elevaram os seus punhos pretos na hora da celebração. Que protesto poderemos esperar em Tóquio? De quem? E, acima de tudo, será algo de novo? Ou bastará uma vitória, mais uma, da ginasta campeã mundial Simone Biles, que não cabe no perfil de activista ou desportista que protesta por temas, mas cujas medalhas de ouro que colecciona podem ser vistas como um lego que se vai colando os cacos derivados do escândalo sexual que atingiu a equipa de ginastas norte-americanas e o ex-médico, Larry Nassar. Ela, que foi ela mesmo, uma das sobreviventes dos abusos sexuais de Nassar, conforme admitiu na sua conta do twitter, em Janeiro de 2018. l
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P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S
ELEIÇÕES
LEGISL ATIVAS 2019
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AS ELEIÇÕES LEGISL ATIVAS TÊM DATA MARCADA PARA O PRÓXIMO DIA 6 DE OUTUBRO. NÃO CABE A UM MEIO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL E MUITO MENOS A UM MEIO DETIDO POR UMA AGÊNCIA DE COMUNICAÇÃO TOMAR PARTIDOS OU, SEQUER, TECER CONSIDERAÇÕES SOBRE O QUE ACONTECERÁ. O QUE É CERTO É QUE OS PORTUGUESES TÊM O DIREITO DE IR A VOTOS PARA ELEGER OS 230 DEPUTADOS À ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA. MAIS DO QUE APENAS UM DIREITO, OS PORTUGUESES TÊM O DEVER DE IR A VOTOS. ENTRE QUEM ESTÁ SATISFEITO, QUE COM CERTEZA IRÁ REPETIR O VOTO, E QUEM ESTÁ INSATISFEITO HÁ APENAS UM PONTO EM COMUM: NINGUÉM DEVE SER CÚMPLICE OU AUTOR POR OMISSÃO DA ELEIÇÃO DE QUEM NÃO QUER VER NO PODER. SE O FIZER PERDE O DIREITO A QUEIXAR-SE. AS ÚLTIMAS ELEIÇÕES LEGISL ATIVAS DECORRERAM NO DIA 4 DE OUTUBRO DE 2015 E TERMINARAM COM A VITÓRIA DA COLIGAÇÃO PSD/CDS-PP - “PORTUGAL MAIS À FRENTE”. MAS ESSA VITÓRIA FOI ESCASSA E O PARTIDO SOCIALISTA FORMOU UM GOVERNO ASSENTE NA SUA BASE PARL AMENTAR E APOIADO NO BLOCO DE ESQUERDA E NA CDU. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA ACEITOU ESSA SOLUÇÃO E A “GERINGONÇA”, A QUEM MUITOS VATICINAVAM UM FIM BREVE DEU SUPORTE AO GOVERNO LIDERADO POR ANTÓNIO COSTA ATÉ AO FIM DA ACTUAL LEGISL ATURA. RECORDE-SE QUE A ABSTENÇÃO NAS ELEIÇÕES VOLTOU A BATER RECORDES, ATINGINDO O VALOR MAIS ALTO DE SEMPRE DA ABSTENÇÃO NAS LEGISLATIVAS, CERCA DE 43,07%. O PAÍS MUDOU. PARA MELHOR, DIZEM UNS, PARA PIOR, DIZEM OS OUTROS. A PRÉMIO APENAS DIZ QUE ESPERA QUE NÃO SE REPITA O NÍVEL DE ABSTENÇÃO E QUE OS PORTUGUESES SAIBAM HONRAR A LUTA QUE MUITOS TRAVARAM PARA QUE VIVAMOS HOJE EM DEMOCRACIA. HONRANDO O PASSADO E CONSTRUINDO O FUTURO. PARA QUE POSSAMOS DECIDIR EM CONSCIÊNCIA É PRECISO ESTARMOS INFORMADOS. A PRÉMIO AUSCULTOU OS VÁRIOS PARTIDOS POLÍTICOS COM ASSENTO PARLAMENTAR E UM PARTIDO FORA DO SISTEMA SOBRE AS SUAS EXPECTATIVAS PARA AS PRÓXIMAS ELEIÇÕES PARA A ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA, COLOCANDO-LHE SEIS INTERROGAÇÕES: 1. O QUE É PARA SI UM BOM RESULTADO ELEITORAL? EM VOTOS E EM DEPUTADOS. 2. O QUE DESTACA DE MELHOR E DE PIOR NOS ÚLTIMOS QUATRO ANOS DE GOVERNO? 3. QUAIS AS CINCO MEDIDAS QUE TOMARÁ SE FOR GOVERNO? 4. QUAL A MELHOR SOLUÇÃO PARA SE DIMINUIR A ABSTENÇÃO NOS ACTOS ELEITORAIS? 5. CONSIDERA QUE O SISTEMA ELEITORAL AINDA É JUSTO, OU DADA A MATURIDADE DA DEMOCRACIA PODERIA PENSAR-SE NUMA REFORMA? 6. O TRATAMENTO DADO NOS MEDIA AOS PEQUENOS PARTIDOS PERMITE QUE POSSAM CRESCER E TORNAR-SE VERDADEIROS ‘PLAYERS’ DE PODER? ESTAS QUESTÕES FORAM COLOCADAS NÃO EM FORMA DE ENTREVISTA MAS COMO PEDIDO DE CONTRIBUIÇÃO ESCRITA. AS OPÇÕES DE CADA UM FORAM LIVRES. ESPEREMOS QUE AS RESPOSTAS SEJAM ESCL ARECEDORAS.
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P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S
A DEMOCRACIA AMEAÃ&#x2021;ADA
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DIOGO QUEIROZ DE ANDRADE
A DEMOCRACIA, EM ESPECIAL A DEMOCRACIA LIBERAL, ESTÁ AMEAÇADA. A FALTA DE SOLIDEZ DAS INSTITUIÇÕES, O AUTORITARISMO DIGITAL E A CRISE DE MIGRANTES E REFUGIADOS SÃO APONTADAS COMO ALGUMAS DAS CAUSAS. TEMOS UMA SOCIEDADE E UMA ECONOMIA DO SÉCULO XXI GOVERNADAS POR UM SISTEMA POLÍTICO DO SÉCULO XIX. O QUE PODEMOS ESPERAR NO FUTURO?
A
Freedom House, que mede anualmente o índice de democracia no mundo, registou em 2018 o 13º ano consecutivo de declínio nas liberdades. É um fenómeno global, que tem várias causas e que está a ser avidamente estudado. Mas já não há dúvidas. A democracia, em especial a democracia liberal, está ameaçada como nunca esteve neste século. E a crescente deriva nacional-populista de nações como a Índia, o Brasil e a Turquia garantem que 2019 vai confirmar a continuação da crise. A Freedom House aponta como causas a falta de solidez das instituições nas democracias recentes, o autoritarismo digital e a crise de migrantes e refugiados. Mas o fenómeno é complexo e merece ser dissecado convenientemente. Na passagem do milénio, o mundo era mais fácil de explicar. A globalização ainda tinha consequências maioritariamente positivas, a Europa celebrava a libertação dos países que tinham estado sob o domínio soviético e a
F
reedom House, which measures the world’s democracy index every year, witnessed in 2018 the 13th consecutive year of freedom decline. This is a global phenomenon with many causes and is being currently and eagerly studied. But let there be no doubts. Democracy, especially liberal democracy, is under threat as never before in this century. And the growing national populist drift of nations like India, Brazil and Turkey are clear indicators that 2019 will witness a continuation of this particular crisis. Freedom House points to the lack of soundness of institutions in recent democracies, digital authoritarianism and the migrant and refugee crisis as the main causes. But the phenomenon is complex and needs to be duly and thoroughly analysed. The world was easier to explain at the turn of the millennium. Globalization still had mostly positive consequences, Europe was celebrating the liberation of countries previously under Soviet rule and European integration was proceeding well. The horror expressed at the turn of the
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P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S
O T E R R O R E X P R E S S O N A V I R A G E M D O S É C U L O C O M O ATA Q U E À S T O R R E S G É M E A S D E N O VA I O R Q U E C O N S A G R O U N O I M A G I N Á R I O D E MUITOS A MAIOR AMEAÇA À DEMOCRACIA
integração europeia corria a bom ritmo. O terror expresso na viragem do século com o ataque às Torres Gémeas de Nova Iorque consagrou no imaginário de muitos a maior ameaça à democracia: o terrorismo de actores não governamentais cujo único fito é provocar o medo para fazer colapsar as instituições. Sem dúvida que o terrorismo foi – e é – uma ameaça à estabilidade interna das democracias, mas acabou por ser rapidamente ultrapassado por um outro fenómeno bastante mais complexo. A sociedade global e digital, que começou a ganhar forma precisamente na viragem do século, demorou uma década a ganhar dimensão e menos de duas a assumir-se como ameaça à democracia liberal. Os factores em jogo são variados. E vale a pena começar com as redes sociais, que são um exemplo paradigmático desta década. Em 2012 foram saudadas como a salvação da democracia, por causa do papel que tiveram nas primaveras árabes que pareciam ser o tiro de partida para um movimento libertário que varreria o norte de África. Tudo aconteceu ao mesmo tempo: os smartphones generalizaram-se, as redes sociais massificaram-se e as comunicações deixaram de ser centralizadas. A informação passou a ser transmitida de forma directa, em rede, sem intermediários. Wael Ghonim, o activista que fundou o movimento que levou à transição egípcia, escreveu um livro chamado “Revolution 2.0” em que o Twitter e o Facebook são alardeados como heróis dos princípios democráticos – mas 44
century with the attack on the New York Twin Towers was retained in the minds of many as the biggest threat to democracy: the terrorism of non-governmental actors whose sole purpose is to cause fear and the collapse of institutions. Terrorism was - and is - undoubtedly a threat to the internal stability of democracies but it was quickly superseded by a far more complex phenomenon. Global and digital society, which began to take shape precisely at the turn of the century, took a decade to gain size and less than two decades to become a threat to liberal democracy. There are many factors at play. And it is worth starting with social media, a paradigmatic example of this decade. In 2012 they were hailed as the salvation of democracy for their role in the Arab Springs that seemed to be the starting shot for a libertarian movement that would sweep across North Africa. Everything happened at the same time: smartphones became widespread, mass social media and communications were no longer centralized. Information was now transmitted directly, in a network, without intermediaries. Wael Ghonim, the activist who founded the Egyptian transition movement, wrote a book called “Revolution 2.0” in which Twitter and Facebook are touted as heroes of democratic principles - but it didn’t even take five years for Ghonim to conclude that “The tools that bring us closer are the same tools that destroy us.” In 2017 the scenario was already clear: Facebook, Twitter, and Youtube were perfect machines for spreading misinformation and became mere instruments
nem foram precisos cinco anos para o mesmo Ghonim concluir que “as ferramentas que nos aproximam são as mesmas que nos destroem”. Em 2017 o cenário já era claro: o Facebook, o Twitter e o Youtube eram máquinas perfeitas para espalhar desinformação e funcionaram como meros instrumentos na orquestra de entidades que queriam enriquecer (como as máfias macedónias), derrubar democracias (os serviços secretos russos) ou ambos em simultâneo (a Cambridge Analytica e suas sucessoras). O Facebook ainda conseguiu piorar o seu registo ao contribuir activamente para o genocídio em Myanmar, para campanhas de desinformação estruturadas e para colocar em causa o consenso científico sobre questões como o aquecimento global e a vacinação. Já a Google
in the orchestra of entities wanting to get rich (like the Macedonian mafias), overthrow democracies (the Russian secret services) or both at the same time (Cambridge Analytica and those that followed). Facebook has even managed to worsen its record by actively contributing to the genocide in Myanmar, to structured disinformation campaigns and to undermine the scientific consensus on issues such as global warming and vaccination. As for Google, it considered the possibility of creating a censored version of its search engine to serve Chinese interests, thereby taking part in the largest act of information clampdown in history. At the same time, globalization was making a key contribution to make the world less unequal, reducing the disparity between the more developed countries and those on the way there. China has definitely taken on the
“ R E V O LU T I O N 2 . 0 ” E M Q U E O T W I T T E R E O FAC E B O O K S ÃO A L A R D E A D O S C O M O H E R Ó I S D O S P R I N C Í P I O S D E M O C R ÁT I C O
ponderou criar uma versão censurada do seu motor de pesquisa para servir os interesses chineses e assim tomar parte no maior acto de repressão informativa da história. Ao mesmo tempo, a globalização foi contribuindo de forma decisiva para tornar o mundo menos desigual, reduzindo a disparidade entre os países mais desenvolvidos e os que para aí caminhavam. A China assumiu-se definitivamente como uma potência global, graça a uma mistura perigosa de nacionalismo económico, capitalismo de estado e diplomacia musculada que estendeu os seus interesses a todo o mundo e abriu conflitos com as economias que deixaram de beneficiar com a
role of global power, thanks to a dangerous mix of economic nationalism, state capitalism and muscular diplomacy, spreading its interests around the world and starting conflicts with economies that were no longer reaping the rewards from job and technology transfer to distant places. On this last point, it is worth reading the most recent book by Bruno Maçães, “Belt and Road” which explains well what is at stake. The financial crisis, which in fact resulted in economic stagnation, served as the background for more serious problems. And what started as a subprime problem in the United States turned into a crisis of confidence that affected all institutions: the media, parties, banks, the government and international institutions. The inability of states to react and the disbelief in the system led to increasing tensions in 45
P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S transferência de empregos e tecnologias para paragens distantes. Sobre este último ponto, vale a pena ler o mais recente livro de Bruno Maçães, “Belt and Road”, que explica bem o que está em causa. A crise financeira que se transformou, de facto, numa estagnação económica foi o enquadramento de problemas mais profundos. E aquilo que começou como um problema no ‘subprime’ nos Estados Unidos transformou-se numa crise de confiança que afectou todas as instituições: média, partidos, bancos, estado central e instituições internacionais. A incapacidade de resposta dos estados e a descrença no sistema conduziam a uma tensão crescente no tecido social. E começava a expor-se a duplicidade da globalização: ela serviu para aproximar as nações, mas foi também o mote para aprofundar o fosso dentro de cada país industrializado. As vítimas da globalização são as massas não-educadas dos países desenvolvidos, que subsistiam graças a empregos não-qualificados – precisamente os que migraram para a Índia, para a China, para o Vietname e para o México. Foram essas vítimas que, ressentidas, se tornaram o alvo predileto de um discurso populista e identitário que promete o melhor para “os nossos” desde que se excluam “os outros”. Para alimentar esta fogueira surgiram novas achas, como a fraude que levou à guerra do Iraque, as revelações de Edward Snowden e os Panama Papers, que confirmam a desconfiança sobre as instituições e alimentaram novas teorias da conspiração. Nos Estados Unidos, o discurso nativista levou à eleição de Trump, ao recrudescer do racismo e aos campos de concentração para migrantes latinos. Na Europa conduziu ao Brexit, a afogamentos repetidos no mediterrâneo e à eleição de proto-ditadores na Hungria, na Polónia e em Itália. E expôs ainda uma preocupante inércia dos “líderes do mundo livre”, que não souberam defender os valores liberais que deveriam promover. Em “The Great Convergence”, Richard Baldwin explicou
the social fabric. And the duplicity of globalization was beginning to come up: it served the purpose of bringing nations together, but it was also the motto for the gap increase inside each industrialized country. The victims of globalization are the uneducated masses of developed countries that survived thanks to unskilled jobs - precisely those who migrated to India, China, Vietnam and Mexico. It were these victims who, resentfully, became the favourite target of a populist and identity discourse that promises the best for “our people” as long as “the others” are excluded. To fuel this bonfire new insights emerged, such as the fraud that led to the Iraq war, the revelations of Edward Snowden and the Panama Papers, confirming the lack of trust on institutions and fuelling new conspiracy theories. In the United States, the Nativist discourse led to the election of Trump, the resurgence of racism and concentration camps for Latin-American migrants. In Europe it led to Brexit, frequent deaths by drowning in the Mediterranean and the election of proto-dictators in Hungary, Poland and Italy. It also exposed a worrying inertia of the “leaders of the free world”, who were unable to defend the liberal values they should promote. In “The Great Convergence”, Richard Baldwin explained in a comprehensive way the state of the economic cycle that presided over globalization and is now reshaping the world, with serious consequences for democracy. But it is worth looking for a broader historical framework to find references and parallels situations in the past. This is precisely what Carl Benedikt Frey did, who started looking for a moment in the industrial revolution with similarities to the current computing transformation. His book “The Technology Trap” he recalls that the long-term benefits
“A G L O B A L I Z A Ç Ã O F O I CONTRIBUINDO DE F O R M A D E C I S I VA PA R A TORNAR O MUNDO MENOS DESIGUAL, REDUZINDO A D I S PA R I DA D E E N T R E O S PA Í S E S M A I S D E S E N V O LV I D O S E O S Q U E P A R A A Í C A M I N H AV A M .”
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A C H I N A A S S U M I U - S E D E F I N I T I VA M E N T E C O M O U M A P O T Ê N C I A G L O B A L , G R A Ç A A U M A M I S T U R A P E R I G O S A D E N A C I O N A L I S M O E C O N Ó M I C O , C A P I TA L I S M O D E E S TA D O E D I P L O M A C I A M U S C U L A D A
de forma abrangente o estado do ciclo económico que presidiu à globalização e que está agora a reformatar o mundo, com consequências graves para a democracia. Mas vale a pena tentar um enquadramento histórico mais amplo, que encontre referência em paralelos com o passado. Foi isso que fez Carl Benedikt Frey, que foi à procura de um momento na revolução industrial comparável com a actual transformação computacional. O seu livro “The Technology Trap” recorda que os benefícios que a revolução industrial trouxe no longo prazo não apagam os cinquenta anos de miséria a que foram sujeitos os trabalhadores manuais. O mesmo é dizer que os luditas tinham razão e que a deriva tecnológica aumentou de forma real a desigualdade. Se isso hoje acontecer com a revolução computacional, será mais um problema dramático que as democracias terão de resolver – e há cada vez mais dúvidas de que estejam preparadas para o fazer. O problema não é tanto a transformação científica e tecnológica: desde o iluminismo que esta representa uma ameaça às instituições, que por regra são imobilistas e conservadoras. A questão é a rapidez com que tudo acontece agora, deixando mais exposta a impreparação das democracias liberais para lidar com esta transformação tecnológica. O aparelho de estado (seja ele transnacional, nacional ou local) não está preparado para responder com rapidez, aumentando os riscos sobre a democracia com a inépcia da acção. O Institute for Democracy and Electoral Assistance, fundado em 1995, publicou em 2017 um estudo chamado “The Global State of Democracy” em que explorava a ideia de resiliência das instituições – e definia como princípios essenciais a flexibilidade, a inovação e a capacidade de adaptação de forma a sobreviver a ameaças e crises. É este ciclo que hoje está em falha, porque não consegue responder com a velocidade necessária às transformações do mundo. Temos uma sociedade e uma economia do século XXI governadas por um sistema político do século XIX. E isso torna a incerteza face ao futuro muito mais assustadora. l
that the industrial revolution has brought did not erase the fifty years of misery that manual workers were faced with. The same is to say that the Luddites were right and that technological drift really increased inequality. If the same happens today with the computing revolution, it will become another dramatic problem that democracies will have to solve - and there is growing doubt as to their capacity to act accordingly. The problem is not so much scientific and technological transformation: since the illuminism it has been posing a threat to the institutions, which have a tendency to be immovable and conservative. The big issue is the pace at which everything happens now, exposing even more the unprepared liberal democracies to the need to cope with this technological transformation. The state apparatus (be it transnational, national or local) is not prepared to respond quickly, thereby increasing the risks for democracy given its incapacity to take action. The Institute for Democracy and Electoral Assistance, founded in 1995, published in 2017 a study called “The Global State of Democracy” which explored the idea of institutions’ resilience - and defined flexibility, innovation and adaptability as key principles to survive threats and crises. This is the missing cycle today given the inability to quickly respond to the transformations taking place in the world. We have a 21st century society and economy rules by a 19th century political system. And that makes uncertainty about the future even more frightening. l
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P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S
OPINIÃO MANUEL MONTEIRO, PROFESSOR UNIVERSITÁRIO E EX-LÍDER DO CDS
1. Quem possui responsabilidades partidárias responderá a esta pergunta em função de critérios próprios, que sempre incluem – e com total naturalidade – objectivos muito específicos em relação aos respectivos partidos. Como não possuo essas responsabilidades, não me sinto em condições de responder a tal pergunta. De qualquer modo, espero que a área política na qual me situo e que é representada pelo CDS-PP possa alcançar uma representatividade parlamentar que lhe permita positivamente influenciar a governação do país. 2. De melhor, a capacidade demonstrada pelo Primeiro-Ministro para estabelecer uma das mais excelentes relações políticas entre o Governo e a Presidência da República. Quanto a mim essa excelente relação não só permitiu ao Governo, apesar de suportado pelo PCP e pelo BE, ganhar o conforto necessário ao nível da União Europeia, como ao mesmo tempo lhe deu margem de aceitação junto de um eleitorado que não gosta nem dos comunistas, nem dos bloquistas. Penso, pois, que a avaliação do Governo ao longo desta legislatura não poderá nunca deixar de contemplar este relevante aspecto. De pior, a ausência de uma estratégia de desenvolvimento nacional. Ao não possuir essa estratégia o Governo nada fez para, por um lado, combater a contínua desertificação do interior e, por outro, para potenciar a produção e o consumo nacionais. Mesmo reconhecendo que esta ideia de governar para o imediato é sempre mais fácil, é grave que aqueles que deveriam pensar para além de si próprios actuem politicamente sem terem o futuro como horizonte. 3. Antes de responder a esta pergunta gostaria de dizer que para mim a acção política não pode ser um exercício avulso de medidas. Se não existir uma ideia integrada sobre o Homem e a Comunidade em que ele se integra, a Política transforma-se em mero exercício de resolução de casos e de 48
problemas, sem que as soluções tenham harmonia e ligação entre si. A Casa comum não é apenas um somatório de divisões sem articulação. Ela é muito mais do que isso e daí ser necessária uma ideia global, alicerçada em valores, a partir da qual surgem as políticas públicas. Insistir no contrário é consentir na substituição dos Políticos por gestores melhor ou pior preparados, que “receitam” soluções avulsas e que por isso mesmo só sabem navegar à vista. É partindo deste pressuposto que enuncio as cinco medidas, assumindo a impossibilidade de agora as fundamentar e enquadrar num contexto geral. 1ª – Promover as Regiões, sem condenar o país à regionalização. Como? Defendendo uma revisão constitucional que, entre outros aspectos, contemplasse a existência de duas Câmaras de representação nacional. Uma, que teria 130 Deputados; a segunda, com 100 Deputados correspondendo a 5 eleitos por cada um dos 18 Distritos e por cada uma das Regiões Autónomas. 2ª – A revitalização das linhas férreas nacionais, que abrangesse todas as capitais de distrito. Penso que tão importante quanto a urgência de voltarmos a ter comboios de qualidade a servir cidades como Bragança, Viseu e Vila Real, é a necessidade de construirmos uma segunda linha que faça a ligação entre Lisboa, Porto e Braga. 3ª – Voltaria a apostar nas Regiões Demarcadas, contrariando o interesse na sua extinção, como forma de potenciar as especificidades próprias de cada região, especificidades essas que teriam de conciliar os seguintes factores: produtos, território, clima. 4ª – Defenderia a alteração profunda das regras de acesso ao Ensino Superior, através da realização de exames de admissão promovidos por cada uma das instituições de candidatura. A média obtida no ensino secundário, apenas seria ponderada em caso de empate nesse mesmo exame. Está por provar que alguém será melhor médico pelo facto de ter entrado numa Faculdade de Medicina com média de 18,4, em relação a
alguém que nela não entrou por possuir uma média do secundário de 17,9. 5ª – Constituiria uma Comissão, formada por académicos, com a incumbência de avaliarem se os princípios orientadores da nossa legislação penal se mantêm em consonância com a realidade dos tempos actuais e nomeadamente com os crimes de corrupção e de tráfico de pessoas. 4. Trazer de novo a Política ao debate político. 5. Eu sou um defensor do sistema eleitoral maioritário a duas voltas. Admito que seja um sistema menos amigo de uma presença parlamentar de muitos partidos, mas creio que é um sistema que pode apesar de tudo conciliar as vantagens da escolha uninominal dos representantes, com uma representatividade eleitoral bem superior à que existe nos sistemas maioritários simples. Ainda assim, louvando o trabalho de quantos seriamente têm vindo a defender uma reforma do sistema eleitoral, penso que neste momento a prioridade das prioridades é a da representação da maioria do nosso território independentemente do número de eleitores que nele se encontram recenseados. Veja-se o que já se passa com Portalegre, que tem menos de 100.000 eleitores e só elege dois Deputados. Defendo assim uma reforma sobre a natureza de todo o edifício, que não se esgota na reforma de uma das suas partes. E daí ter defendido o que defendi anteriormente quando propus a existência de duas Câmaras, sendo uma delas destinada à representação dos Distritos e das Regiões Autónomas. 6. Admito que seja difícil, muito difícil, pelo que a solução passa pela cobertura dada pelos órgãos de comunicação públicos, nomeadamente a RTP e a Antena 1. Se são públicos deverão, obrigatoriamente, ter um tratamento mais rigoroso e abrangente, independentemente de se saber se os partidos já possuem ou não representação parlamentar. l
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OPINIÃO
JOSÉ MANUEL PUREZA, DEPUTADO E UM DOS RESPONSÁVEIS PELO PROGRAMA ELEITORAL DO BLOCO DE ESQUERDA
1. Só a força da esquerda – e do Bloco de Esquerda, em especial – permitiu que, na legislatura que agora acaba, se tivesse ido bem além do programa do PS na recuperação de rendimentos e na devolução de direitos. Por isso, um bom resultado será sempre o aumento da força política (em votos e em deputados) de quem se manteve fiel à exigência de mais respeito por quem trabalha e de mais qualidade dos serviços públicos. 2. O melhor foi, indiscutivelmente, a capacidade de se ter impedido que se congelassem pensões (como propôs o PS) ou até que se reduzissem (como propôs a direita). O melhor foi ter-se adotado um calendário mais rápido para a reposição de salários e para a eliminação da sobretaxa de IRS do que propunha o PS. O melhor foi ter-se demonstrado insofismavelmente que o caminho de cortes de rendimentos e de direitos não era uma inevitabilidade, como a direita fazia crer. O pior foi o compromisso do PS com os partidos de direita para manter na legislação laboral o que a Troika lá colocou e para impedir que se acrescentasse respeito pelo trabalhador a leis que o humilham. 3. O Bloco de Esquerda apresenta-se a eleições com um programa com uma meta: repor o nível de investimento (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
público em, pelo menos, 5% do PIB, o valor que tinha antes da eclosão da crise financeira de 2008. Apontamos prioridades para a mobilização desses 10.000 milhões de euros: reestruturação da dívida para reduzir a despesa em 2.000 milhões de euros/ ano, englobamento obrigatório dos rendimentos de capitais, prediais e outros para efeitos de IRS, combate à evasão e à despesa fiscal injustificada. E apontamos prioridades para a aplicação estratégica desse investimento público: uma resposta determinada e justa às alterações climáticas (na mobilidade, na energia, nas políticas para o território), uma qualificação robusta da escola pública e do Serviço Nacional de Saúde e um investimento na segurança das vidas das pessoas (aumento do salário mínimo e das pensões contributivas, um programa de arrendamento de 100.000 casas entre 150 e 500 euros ou a reversão das privatizações dos CTT ou da REN, por exemplo). Estas são medidas absolutamente necessárias para um país mais justo e para uma vida mais segura. 4. Serem os partidos claros nas suas propostas e fazerem com que elas incidam sobre as prioridades reais que as pessoas identificam para as suas vidas concretas. E prestarem contas, a tempo inteiro, pelas propostas que
concretizam e por aquelas que não conseguem concretizar. 5. Usar a engenharia eleitoral para obter supostos ganhos de adesão popular ao sistema político é duplamente errado. Primeiro, porque o resultado concreto dessas reformas é invariavelmente a distorção da proporcionalidade. Segundo, porque não há engenharia eleitoral que resista quando fica patente que as alternativas oferecidas são idênticas no essencial que é a manutenção de níveis de pobreza, de discriminação e de passividade perante as urgências coletivas (a emergência climática, por exemplo). É a maturidade da democracia que desaconselha truques eleitorais e que exige determinação para ir ao essencial: propostas claras, exequíveis e capazes de mudar as vidas para melhor. 6. O Bloco de Esquerda é um caso de indiscutível sucesso na afirmação de uma proposta política diferenciada no espectro partidário português. Porque a clareza do que temos proposto nos dá crédito na sociedade. O nosso ponto de partida foi sempre o mesmo: o debate aberto entre as diferentes propostas é um tónico para a democracia. É isso que deve ser exigido no espaço mediático. l 49
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OPINIÃO
ASSUNÇÃO CRISTAS, PRESIDENTE DO CDS-PP
1. O CDS apresenta-se, nestas próximas eleições legislativas, com propostas construtivas e diferentes. Algumas destas propostas, apesar do sucesso noutros países, nunca foram tentadas em Portugal. Queremos um resultado que permita que estas propostas – que explicarei melhor mais à frente – possam ser postas em prática. Por isso, um bom resultado é aquele que permite desenvolver esta visão diferente para Portugal. 2. O melhor dos últimos anos foi a diminuição do desemprego. O crescimento do emprego foi fruto também de reformas laborais do anterior governo, que não foram revertidas. A economia beneficiou duma conjuntura internacional favorável, o que permitiu a Portugal crescer, ainda que menos do que deveria quando comparado com economias próximas ou de dimensão semelhante. Esta incapacidade de aproveitar a melhor conjuntura externa foi uma oportunidade perdida, agravada pela subida – em termos nominais – do endividamento público. Ao contrário do que foi anunciado, tivemos um enorme aumento da carga fiscal, a mais alta de sempre, em contraste inexplicável com a degradação dos serviços públicos – da saúde ao processamento de reformas, do cartão do cidadão ao passaporte – e um baixíssimo nível de investimento público, inferior a 2015, nos hospitais, na ferrovia, nas infraestruturas, na ativação dos fundos comunitários. Seguindo escolhas questionáveis e não preparadas, como as “35 horas” ou a ultra centralização no Ministro das Finanças, temos na Saúde o exemplo mais flagrante do estrangulamento atual. Para o CDS, 50
o foco das políticas públicas deve ser a solução dos problemas das pessoas concretas e não um prejudicial estigma ideológico. Por isso, e por exemplo, se o SNS não consegue dar resposta a tempo e horas, então deve ser dada a possibilidade de aceder a uma consulta de especialidade num hospital do setor social ou do setor privado, independentemente da carteira, morada ou idade do doente. 3. Das propostas do nosso programa eleitoral, apresentado a 29 de agosto, posso destacar aqui cinco: - Uma reforma fiscal, baixando 15% a taxa média efetiva de IRS e iniciando uma baixa do IRC até aos níveis da Irlanda havendo excedente orçamental para a financiar, esta é a melhor forma de tornar as pessoas mais livres do Estado e a economia mais competitiva. Entendemos que a competitividade fiscal deve ser uma prioridade para Portugal, se queremos – e queremos – reter talentos e ancorar e atrair investimento; - Contratualizar com o sector social e privado tanto consultas médicas em falta no SNS como vagas para creches, porque se há capacidade nesses sectores não faz sentido que as pessoas fiquem em listas de espera – e só mesmo por preconceitos ideológicos é que isso não se faz ainda; - Executar uma política de apoio à natalidade inspirada nos melhores exemplos europeus, alargando as licenças parentais até um ano e regulando com eficácia o trabalho a partir de casa - os outros países já o fizeram; - Fazer uma revolução na formação profissional, que tem de estar ao serviço da economia e não a dar cursos sem empregabilidade para cumprir estatísticas; - Direcionar fundos europeus para um plano de armazenamento de água, porque
somos o país da Europa mais sujeito à seca. A questão do clima é um problema global, mas mais que proclamações ideológicas, é urgente trabalhar na mitigação dos efeitos das alterações climáticas no nosso país. 4. Se por um lado temos cada vez mais pessoas envolvidas na discussão política, o crescimento da abstenção é um sinal preocupante de afastamento dos eleitores. Não faz sentido, no mundo de hoje, continuar a votar como sempre se fez. No CDS, entendemos que é preciso pôr em prática novas formas – seguras, porque é a legitimidade da soberania que está em jogo – de facilitar o exercício do voto. 5. O sistema eleitoral não é tabu – pode, e deve ser discutido com ponderação. Tem de ser repensado garantindo a representação proporcional das forças políticas – como advém da Constituição – e, também, a representatividade do território nacional. Se, por um lado temos tido a perda de representação do interior, que nestas eleições voltaram a reduzir deputados (na Guarda e em Viseu), por outro, o maior número de deputados nos grandes centros metropolitanos do litoral pode levar – se não existirem circunscrições de dimensão média – a um maior desconhecimento dos representantes eleitos. 6. O espaço político tem muitos atores e a oportunidade de divulgação é sempre limitada. É difícil, para qualquer partido que não faça parta de uma solução de governo, conseguir a mesma exposição das suas propostas. Mas hoje, com as redes sociais e meios digitais, há formas criativas e, bastante eficazes, de chegar junto dos eleitores. l (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
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OPINIÃO
JOÃO COTRIM FIGUEIREDO, INICIATIVA LIBER AL, CABEÇA DE LISTA POR LISBOA
PORTUGAL: 25 ANOS A MARCAR PASSO Em finais de 1995, tomava posse o primeiro governo de António Guterres, eleito com maioria relativa debaixo do ‘slogan’ “Razão e Coração”. Durante a campanha dessas eleições, o tema dominante foi a preparação de Portugal para poder fazer parte do primeiro grupo de países que aderiria ao Euro, a moeda única europeia vista como um passaporte para o desenvolvimento económico e para a plena integração europeia. Sem a adesão ao Euro, dizia-se, Portugal perderia o comboio que o aproximaria dos níveis de prosperidade dos nossos vizinhos europeus. Passados quase 25 anos, é justo dizer que apanhámos um comboio, mas deve ter sido o errado, já que o nosso destino não foi o da convergência com a União Europeia. Nesse ano, o nosso PIB per capita era de 79% da média dos países da UE; em 2018 baixou para 77%. A produtividade, por seu turno, teve um comportamento ainda pior: em 1995 a produtividade portuguesa atingia 68% do nível da UE, o número mais recente é de 64%. Esta quebra é especialmente desanimadora, já que não é possível crescer sustentadamente e subir o nível de vida dos cidadãos sem claros aumentos de produtividade. Voltarei ao tema mais à frente. Como é possível explicar estes resultados tão medíocres? O que correu mal? As conjunturas desfavoráveis não oferecem grande explicação já que afetaram todos os países de forma idêntica. Também não (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
são aceitáveis as tentativas de explicar o nosso atraso com a menor capacidade ou qualificação dos portugueses pois é manifesto que, a esse nível, assistimos a uma melhoria assinalável neste quarto de século. É verdade que a crise financeira de 2008-10 atingiu Portugal numa altura de grande desequilíbrio (em parte camuflado) das contas públicas, só que esse não era o problema, era o sintoma de uma doença causada por muitos anos de desgoverno e despesismo público. Para que conste, nestes 25 anos a esquerda esteve no poder 18, a direita 3 e a Troika 4 anos. Há dois fatores, um de natureza mais quantitativa, outro mais qualitativo, que explicam mais convincentemente este nosso pobre desempenho. O primeiro fator é o continuado e impiedoso aumento da carga fiscal (inevitável para pagar o desvario de investimento público e má gestão) em Portugal neste período, de cerca de 28% para o triste recorde 35,4% do ano passado. Não há economia que consiga respirar debaixo de tal sufoco. O segundo fator, foi a gradual menorização da iniciativa privada nos mais variados domínios, desde a economia até à prestação de serviços sociais. Os portugueses ficaram cada vez mais dependentes do Estado para tudo: um emprego, um papel, um serviço, um favor. Sem alternativa, sem escolhas, vivemos sob a tutela do Estado e definhamos numa tristeza larvar. Será de espantar que
sejamos o país europeu com um maior consumo de ansiolíticos e antidepressivos ‘per capita’, ao mesmo tempo que nos garantem que vivemos uma nova era dourada socialista? E assim regressamos, como prometido, ao tema da produtividade e à relação desta com os sistemas políticos e os ambientes sociais em que se vive. Numa sociedade moderna de conhecimento, a produtividade, entendida como o valor daquilo que se produz numa dada unidade de tempo, já não depende sobretudo do investimento em sistemas e equipamentos produtivos. Depende, cada vez mais, da incorporação de criatividade e do conhecimento no produto ou serviço final. Se assim é, torna-se inevitável colocar a seguinte questão. Será possível esperar que uma sociedade imobilizada sob jugo dos impostos excessivos, da burocracia paralisante, do estigma da iniciativa privada, do compadrio mais descarado está a criar as condições mínimas para que os portugueses contribuam com o seu conhecimento e a sua criatividade para inverter este estado de coisas? A Iniciativa Liberal responde, claramente, que não. Acreditamos nos portugueses, nas suas capacidades e na sua coragem. E acreditamos, sobretudo, que só um enfase renovado na liberdade e na responsabilidade individuais, permitirá que cada um de nós faça o seu pedaço e possamos sair deste marcar passo que já dura há tempo de mais. l 51
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OPINIÃO
DUARTE ALVES, DEPUTADO DO PCP E CANDIDATO DA CDU PELO CÍRCULO ELEITORAL DE LISBOA
1. A CDU parte para as eleições de 6 de Outubro com o objecto de reforço da expressão eleitoral, da sua votação e do número de deputados. 2. De positivo, destaca-se o que foi possível com a intervenção decisiva do PCP e do PEV defender, repor e conquistar em salários e direitos. De negativo, o que ficou sem resposta por opção do Governo do PS de submissão ao Euro e às imposições da União Europeia, e de subordinação aos interesses do grande capital, em particular o insuficiente investimento público, essencial para assegurar serviços públicos de qualidade e para impulsionar o investimento em sectores produtivos. 3. Mais do que medidas, o que um governo com uma política patriótica e de esquerda tem de assumir é uma clara opção pela valorização do trabalho e dos trabalhadores, pelo investimento e o apoio à produção, pelo reforço do financiamento dos serviços públicos, pela recuperação para o Estado do controlo de empresas e sectores estratégicos a começar pelo sector financeiro. Especificando algumas medidas de política fiscal apresentadas pelo PCP: o englobamento obrigatório de todos os rendimentos acima de 100 mil euros, em sede de IRS (acabando com 52
situações em que, por via de diversas taxas liberatórias, há contribuintes com elevados rendimentos de capital que pagam taxas de IRS abaixo de contribuintes com rendimentos de trabalho inferiores); redução da taxa máxima do IVA para os 21% e redução do IVA da eletricidade e gás para a taxa reduzida de 6% (considerando que a energia é um bem essencial); criação de impostos sobre as transações e o património mobiliário (hoje isento); criação de um regime de conta corrente entre as micro e pequenas empresas e o Estado; redução dos impostos sobre os rendimentos de trabalho e de baixo valor, taxando de forma mais adequada os rendimentos de capital e o património de elevado valor. Com estas medidas, pretendemos dar melhores condições para que o Estado possa cumprir com as suas obrigações e responsabilidades, assim como aumentar a progressividade e justiça fiscal, o que tem de ser articulado com uma maior prioridade ao combate à grande fraude e evasão fiscal
4. O melhor contributo para o combate à abstenção é fazer, a exemplo da CDU, uma campanha baseada no esclarecimento directo, no rigor e na verdade. 5. O que é preciso no plano da legislação eleitoral é preservar e reforçar o seu carácter proporcional combatendo projectos de redução de deputados ou de criação de circuitos uninominais, a par de medidas que garantam a fiabilidade e segurança do processo eleitoral. 6. É conhecido o papel que órgãos de comunicação social têm na menorização ou na promoção de forças políticas muito para lá do que seria legítimo. l
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OPINIÃO
ANDRÉ PINOTES BATISTA, DEPUTADO DO PS
FAZER AINDA MAIS E MELHOR POR PORTUGAL Os últimos quatro anos registar-se-ão na nossa história como um período de aprofundamento do parlamentarismo português e, como seu corolário, de uma governação rigorosa, equilibrada e estável sob a liderança de António Costa e do Partido Socialista. Esquerda, estabilidade e confiança são hoje a síntese semântica de uma governação forte, não na aceção clássica de musculada, austera ou castigadora, mas, ao invés, de uma liderança capaz de equilibrar vontades com firmeza. Desde logo, aplicando integralmente o programa a que se propôs e que resultou na diminuição do desemprego, da pobreza e das desigualdades. Tudo isto enquanto, em simultâneo, apresentava as melhores contas públicas do Portugal democrático e edificava um ambiente económico que colocou o nosso país a prosperar, sustentadamente, acima da média europeia. O prestígio internacional conquistado no decurso do Governo da República, a par da recuperação do sistema bancário nacional, bem como do reforço generalizado da qualidade de vida das famílias portuguesas, são algumas das muitas materializações do sucesso da
alternativa que outros catalogavam jocosamente de “aritmeticamente impossível”, e que o Partido Socialista colocou em prática. Os milhões de euros de investimento captado nos últimos anos, pela economia portuguesa, retiram margem a qualquer incerteza. Cumprimos integramente todos os nossos compromissos e fomos mais longe onde tal se afigurou como necessário. O valor da palavra dada e avassaladoramente honrada sustenta, simultaneamente, uma imensa fonte de tranquilidade no presente e o garante da manutenção da confiança no futuro da nossa nação. Com efeito, os próximos anos serão marcados por quatro desígnios estruturantes que, pelo seu impacto económico, social e ambiental, constituem um desafio intergeracional que exige a mobilização da todos os quadrantes da nossa sociedade. Portugal deve continuar a assumir uma agenda política audaz que prepare, desde já, os desafios que no horizonte se nos exibem. A aposta em políticas de redução das desigualdades sociais, a preparação da nossa sociedade para os desafios da digitalidade, o combate acérrimo à
aceleração das alterações climáticas e a aplicação de novas respostas aos desafios demográficos, constituem pedras basilares da ação governativa que propomos executar. Por outro lado, o combate à corrupção e o reforço do ritmo de recuperação dos serviços públicos, nomeadamente, na Saúde, Educação e Transportes são também essenciais à manutenção da coesão social, à confiança nas instituições democráticas e, por fim, mas não menos importante, à elevação dos padrões éticos e de rigor na gestão pública. Perante o risco de uma recessão económica a médio prazo, nenhuma oportunidade pode ser desperdiçada, sob pena de, pela inércia de desígnios menores, se permitir a destabilização de um percurso de prosperidade que, com enormes sacrifícios, as famílias e empresas portuguesas trilharam. Por tudo isto, as eleições Legislativas de 6 de outubro de 2019 constituem uma oportunidade crucial para, através de uma maioria parlamentar inequívoca, conferir um resultado ao PS que se materialize em mais estabilidade e melhores resultados para Portugal e para os portugueses. l 53
P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S
OPINIÃO
HUGO SOARES, EX-LÍDER PARL AMENTAR DO PSD
UM GOVERNO QUE FEZ O ESTADO FALHAR Finda uma legislatura em que governou quem não colheu votos suficientes nas urnas, somos todos chamados a fazer novas escolhas. A 6 de outubro, Portugal escolherá um governo para mais 4 anos. O que deve presidir à escolha de cada um? Na resposta devemos encontrar o sentido de voto. António Costa governou Portugal em condições excecionalmente positivas do ponto de vista de vários fatores que influem diretamente nas opções de políticas públicas: herdou um país com credibilidade reforçada nas instituições europeias e mundiais e com uma almofada financeira muito razoável, um défice estabilizado e controlado, um país a crescer economicamente, desemprego a descer vertiginosamente, exportações a contribuírem decisivamente para a composição do PIB, juros controlados pelo BCE e o preço do petróleo em baixa. Qual era então o desafio para a legislatura que cessa? Continuar uma agenda reformista capaz de nos catapultar para outros patamares de crescimento, investir nos serviços públicos e continuar a agenda de libertar a economia de privilégios injustificados. O que fez o PS? Talvez por estar agrilhoado à extrema esquerda (não esquecer que o BE e PCP 54
que deram vida a este governo só o fizeram com o propósito de evitar que Passos Coelho continuasse a governar e assim salvar um punhado de sindicatos e impor uma agenda civilizacional de esquerda), o PS preferiu reverter medidas estruturais (lembro a reversão da reforma do IRC, do quociente familiar ou revisitação dos escalões do IRS em matéria fiscal, a reversão da privatização da TAP ou a “renacionalização” dos transportes urbanos do Porto e Lisboa com as consequências que se conhecem ou ainda o fim das 35 horas na administração pública) e preferiu apostar numa política de distribuição de dinheiro a funcionários públicos e aumentos nas prestações sociais que, imediatamente, com o aumento simultâneo dos impostos indiretos retirou a todos os portugueses por via indireta. O PS preferiu colocar os serviços públicos em níveis inferiores a nunca antes vistos. Saúde, educação, segurança e proteção civil passaram a patamares em que o Estado deixou de cumprir as suas obrigações e falhou às pessoas. O caos instalou-se em serviços fulcrais em qualquer sociedade moderna e, não poucas vezes, com consequências fatais para muitos portugueses. O PS preferiu voltar a deixar manchar o Estado por um conjunto de
comportamentos que nos devem repugnar do ponto de vista ético e republicano. Convém não esquecer o que foi a novela e o branqueamento à volta da Caixa Geral de Depósitos; o que foram as contratações de amigos pessoais do Primeiro Ministro para sem qualquer vínculo com o Estado tratarem de assuntos de fulcral importância para o nosso futuro coletivo; as contratações aos magotes de familiares para o governo e para a administração pública… E o PS preferiu estagnar o país no que diz respeito a reformas estruturais. A governação foi sempre “à vista”, sem ousadia ou arrojo, sem vontade de mudar verdadeiramente. À pergunta que reforma estrutural empreendeu este governo (seja em matéria de segurança social, na justiça ou na educação) a resposta é um silêncio elucidativo. Foi assim a governação: presa amarras ideológicas em desuso, sem contribuir para as novas gerações. Volto, por isso, ao início deste texto. A presidir às nossas escolhas no dia 06 de outubro não pode deixar de contar a avaliação que fazemos do Governo. E essa é altamente negativa. O Governo falhou e os Portugueses não podem deixar o PS voltar a governar sob pena de perdermos mais 4 anos... l (Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
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DIOGO QUEIROZ DE ANDRADE
O COMBATE À ABSTENÇÃO ESTÁ P OR FAZER THE FIGHT AGAINST ABSTENTIONS HASN’T STARTED YET
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COM UM NOVO ACTO ELEITORAL A CHEGAR, O RISCO DE UM NOVO RECORDE A B S T E N C I O N I S TA É R E A L . E S T E FA C T O D E V E R I A P R E O C U PA R O S R E S P O N S ÁV E I S E L E VÁ - L O S A P R O C U R A R A S R A Z Õ E S E E N C O N T R A R S O L U Ç Õ E S PA R A C O M B AT E R O E L E VA D O N Í V E L DA A B S T E N Ç Ã O E M P O R T U G A L .
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uando se conheceram os valores da abstenção das últimas eleições europeias, o lamento foi comum a todas as vozes: foi “uma derrota para todos os partidos”, um “sintoma da crise da democracia”, entre outros chavões mais ou menos estafados que se ouvem ciclicamente por parte dos líderes políticos do país. Os dados confirmam que Portugal esteve em contraciclo com a maioria dos países europeus, onde o recuo da abstenção foi notório e se deu uma renovada importância ao tema Europa – no espaço da UE houve em média mais 8% de eleitores nas urnas do que nas últimas eleições para o Parlamento Europeu, o que contrasta com a irrelevante variação nacional. Com um novo acto eleitoral a chegar, o risco de novo recorde abstencionista é real e isso deveria preocupar os responsáveis para lá de citações de circunstância. A participação eleitoral é um elemento fundamental para a credibilização do sistema político-social. Uma democracia saudável precisa da participação dos seus cidadãos
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hen the abstention figures in the last European elections were reported the lament was common in all fronts: it was “a defeat for all parties”, a “symptom of the crisis of democracy”, among other more or less common buzzwords uttered every now and then by the country’s political leaders. Data confirm that Portugal was in countercycle with most European countries where the decline in abstention was notorious and were there was a renewed importance given to European issues - in the EU zone there were on average 8% more voters at the polls than in the last elections for the European Parliament, which contrasts with the irrelevant national variation. With a new election coming up, the risk of a new abstention record is real and this should worry those responsible beyond occasional remarks. Electoral participation is a fundamental element for the credibility of the political and social system. A healthy democracy needs the participation of its citizens - whether through candidacy or voting - in order to continue to be called
EUROPEIAS 2019
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P O R T U G A L L E G I S L AT I VA S
FONTE: SGMAI-AE
– seja através de candidaturas seja através do voto – para que se possa continuar a denominar como representativa. O mecanismo pernicioso que se cria quando a abstenção aumenta muito é que os cidadãos deixam de se sentir representados e os próprios políticos têm menos estímulos para responder aos anseios dos cidadãos, visto que apenas precisam de satisfazer uma minoria da população para manter o seu cargo. Com uma abstenção acima dos 40% e uma previsível tendência para crescer, é urgente inverter a tendência e levar de novo os cidadãos à mesa de voto. A questão é como fazê-lo. Falta estudar as razões O primeiro passo para combater a abstenção será perceber as razões de fundo que motivam esse comportamento. Este é um tema sobre o qual há muitas percepções mas poucas conclusões reais, porque não há dados suficientes sobre o tema. O único estudo abrangente e representativo, da autoria de André Freire e Pedro Magalhães, data já de 2002 – e esta distância temporal torna difícil aceitar as suas conclusões como actuais. O principal justificativo para a abstenção identificado na viragem do século era a desadequação entre 58
representative. The harmful mechanism that arises when abstention figures are high is that citizens no longer feel represented and politicians themselves have less incentive to respond to citizens’ wishes, as they only need to satisfy a minority of the population to maintain their posts. Given the abstention figures above 40% and its tendency to grow, we need to reverse the trend and bring citizens back to the polling station. The question is, how? The reasons need to be studied The first step to fight abstention will be to understand the underlying reasons behind this behaviour. This is a topic on which there are many perceptions but few real conclusions given the lack of enough data on the topic. The only comprehensive and representative study by André Freire and Pedro Magalhães dates back to 2002 - and this temporal distance makes it difficult to accept their conclusions as current. The main reason for the abstention identified at the turn of the century was the mismatch between supply and demand, meaning that citizens were not interested because they could not find references in the party spectrum. And
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FONTE: CNE
a oferta e a procura, o que significa que os cidadãos se desinteressavam porque não encontravam referências no espectro partidário. E a verdade é que hoje o cenário é substancialmente diferente do que era no início do século, com mais partidos disponíveis que correspondem a maior variedade de expressões identitárias. Ainda assim, é natural admitir que este problema se mantém como um dos factores que inibe a participação eleitoral, mas outros haverá. Depois de identificados os grupos e as suas motivações, seria fundamental tomar decisões estratégicas sobre que grupos prioritizar e o que fazer para resolver os problemas identificados. Algo que a investigação académica já confirmou é que o voto é um hábito que se forma, pelo que é mais fácil levar à urna um eleitor que já tenha votado do que um que nunca votou.
the truth is that the scenario today is substantially different at the beginning of the century given the greater number of parties available, which correspond to a wider range of identity expressions. Still, we have to concede that this problem remains one of the factors that inhibits voter turnout, but there are certainly others. Once the groups and their motivations have been identified it would be critical to make strategic decisions about which groups to prioritize and what to do to solve the identified problems. One thing that academic research has already confirmed is that voting becomes a habit, hence it’s easier to get someone to take to the polling station who has already voted than someone who has never voted. And this also means that a voter who is duly mobilized for an election he feels is less 59
E isto quer dizer também que um eleitor que esteja devidamente mobilizado para uma eleição que sinta como menos relevante para o seu futuro será mais facilmente mobilizável para uma eleição mais importante. Por isso o esforço para incentivar o voto nas eleições europeias seria sempre rentável não só nessas eleições mas também nas próximas legislativas, o que joga a favor dos cenários com actos eleitorais próximos (como se verifica este ano). E procurar soluções Em relação a questões comportamentais, as soluções mais comuns são a permissão do voto por correspondência e do voto antecipado. Ambas são já permitidas em Portugal, embora a experiência das últimas europeias tenha demonstrado uma preocupante incapacidade dos serviços em responder à procura. O voto eletrónico (presencial) é também outra medida deste calibre, que foi ensaiada com sucesso nas Europeias e que poderá alastrar a mais regiões depois da experiência em Évora. O aumento do número de locais onde votar, conjugado com a abertura antecipada de algumas mesas de voto, poderia também facilitar o acto – há países europeus onde são montadas mesas de voto nas universidades, para estimular a participação eleitoral dos mais jovens. Aliás, os jovens são o grupo etário mais referido quando se aborda a questão da abstenção. Há especialistas que apontam para que a grande maioria dos 500 mil eleitores que entraram no sistema desde o final dos anos 90 nunca tenham votado, o que faz deles um alvo preferencial para campanhas que estimulem ao voto. É nesta lógica que se insere a ideia do voto aos 16 anos, que pode fazer sentido por levar mais cedo o eleitor à mesa, facilitando a repetição do gesto na eleição seguinte. Por outro lado, alguns partidos estão a fazer um esforço redobrado para atrair os eleitores mais jovens: não só os temas que apelam mais aos jovens estão a ser discutidos com mais intensidade, com a questão ambiental a ser reclamada por várias forças políticas, como há uma acção deliberada por parte de um dos partidos do sistema, o PSD, para colocar jovens à frente das listas distritais. Um último aspecto que importa realçar prende-se com o efeito limitado que as campanhas de apelo ao voto têm quando decorrem em cima das eleições. O esforço para o interesse eleitoral tem de ser continuado e está directamente relacionado com a educação - porque só um eleitorado informado e capaz de avaliar os temas em discussão quererá tomar parte no debate e nas opções em jogo. A esta problemática também não é alheia a crise do jornalismo, que condiciona o livre fluxo de informação numa sociedade livre. As soluções que se ensaiem terão de ser estruturadas numa lógica de longo prazo e deverão envolver várias dinâmicas sociais de forma a serem eficazes. l 60
relevant to his future will be more easily mobilized for a more important election. Hence, the efforts to encourage voting in the European elections would always be positive not only in those elections but also in the coming general elections, thus bringing benefits also as regards close elections in the near future (such as the one taking place this year). And find solutions Regarding behavioural issues, the most common solutions are postal voting and early voting. Both are already allowed in Portugal, although the experience of the most recent European elections has shown a worrying inability of services to meet the demand. Electronic voting (onsite) is another major measure, successfully tested in the European elections and which can be replicated in more regions after the experience that took place in then city of Évora. Increasing the number of polling stations, coupled with the early opening of some polling stations, could also facilitate the act - there are European countries where university polling stations are set up to stimulate young voters turnout. In fact, young people are the most referred age group when addressing the issue of abstention. Experts point out that the vast majority of the 500,000 voters who have entered the system since the late 1990s have never voted, making them a prime target for campaigns to encourage voting. This is one of the main reasons behind the idea of voting at the age of 16, which makes sense as it brings the voter to the polling station at an earlier age, thereby making it easy for them to repeat this in the in the next election. On the other hand, some parties are making a double effort to attract younger voters: not only are the themes that appeal most to young people being discussed more intensely, with the environmental issue being claimed by a number of political forces, but there is deliberate action by one of the system parties, the PSD, to put young people as main candidates in district lists. A final aspect worth highlighting is the limited effect that call-to-campaign campaigns have when they take place only when elections are nearly there. The effort toward increasing voting has to be continued and is directly related to education - only an informed electorate capable of assessing the issues under discussion will want to take part in the debate and in the options at stake. This issue is also linked to crisis in journalism, which conditions the free flow of information in a free society. The solutions being tested will have to be structured on a long-term basis and should involve a number of social dynamics in order to be effective. l
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ELEIÇÕES
LEGISL ATIVAS REGIONAIS MADEIRA 2019
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ANTE S DA S L EG I SL AT I VA S N AC I O N A I S O CO R R E M AS E LE IÇÕ E S PAR A O PAR L AME NTO DA R E GI ÃO AU TÓ N O M A DA M A DEI R A . AS E LE I ÇÕ E S PAR A O Ó RG ÃO IDÊ NT ICO DA R E G IÃO AU TÓNO M A D O S AÇO R ES T ÊM LU G AR E M 2 02 0. AS E L E I ÇÕ ES N A M A DEI R A E N O P O RTO S ANTO T Ê M U M Q U Ê DE PART ICU L AR . À S E M E L H A N Ç A D O Q U E ACO N T EC E NO S AÇO R E S CO M O PS , O PS D NA MADE I R A T E M D OM I NA D O A P O L Í T I C A N O S Ú LT I M O S Q UAR E NTA ANO S . E STA É A PE DR A DE TO Q U E DA CAM PAN H A Q U E O S SO C I A L I STA S MADE IR E NS E S , LI DE R AD O S P O R U M PR E S I DE NT E Q U E NÃO É C A N DI DATO A DI R I G I R O G OV E R NO R E G IO NAL, T Ê M V IND O A FAZ E R : É PR E CI S O M U DAR , DI Z PAU LO C A FÔ FO E R EPE T E E MANU E L CÂMAR A. D O L AD O D O PSD A PR ESEN TA M - S E FACTO S Q U E DE MO NST R AM O PRO G R E S S O DA R E GI ÃO AU TÓ N O M A CO M O B A N DEIR A Q U E PR E T E NDE M Q U E O S MADE IR E NS E S E P O RTO S ANTE N SES ERG A M N O DI A 22 DE S E T E MBRO, DATA DA VOTAÇÃO. A BANDE IR A DA M AD E I R A E DA LU TA CO N T R A O C ENT R ALIS MO DE LIS BOA, A BANDE IR A DA AU TO NO MI A Q U E , D I Z M I G U EL A L B U Q U ERQ U E, TANTO CU STO U A CO NQ U ISTAR E Q U E NÃO S E P O DE P E R D E R PA R A Q U EM SERV E L I SB OA S ÃO O S ARG U ME NTO S D O PS D. A P RÉ M I O N ÃO EM I T E O PI N I ÃO NE M CI TA S O NDAG E NS . O S R E STANT E S PART ID O S TE R ÃO U M A PA L AV R A A DI Z ER M A S Q UALQ U E R DE LE S , D O MAI O R AO MAI S PE Q U E NO, S Ó P OD ER ÃO T ER R EPR ESEN TAÇ ÃO FO RT E S E O S CIDADÃO S R E CE NS E AD O S NA R E G IÃO AU TÓNO M A DA M A DEI R A FO R EM VOTAR .
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M A D E I R A L E G I S L AT I VA S R E G I O N A I S
OPINIÃO
CARLOS PEREIRA, DEPUTADO SOCIALISTA
DA AUTONOMIA DE COMBATE À AUTONOMIA PLENA
S
ão dois actos eleitorais que ocorrerão quase em simultâneo. Para os madeirenses é a grande oportunidade para colocar na agenda política o que é verdadeiramente estrutural e decisivo para o nosso futuro: aprofundar o processo autonómico para melhorar a vida dos cidadãos da Madeira e do Porto Santo. Quem conhece a nossa história contemporânea sabe bem o que custaram as conquistas da autonomia. Elas não caíram no colo, foram obtidas com trabalho, resiliência e combate. Muito combate. Nem sempre da forma certa, nem sempre com os resultados desejados. Esta autonomia de combate que, em minha opinião se esgotou, trouxe o que temos hoje. Muitas coisas boas, algumas coisas desajustadas e um mundo de incerteza que termina num vazio. Por isso, baixar os braços não é uma opção. A autonomia não está garantida e é quase sempre o elo mais fraco na relação de forças de uma nação tipicamente centralista. Quem não se lembra dos efeitos da dívida oculta que geraram um Plano de Ajustamento Económico e Financeiro que apanhou duramente os madeirenses, violando princípios básicos autonómicos conquistados e que todos nós (autonomistas) julgávamos intocáveis? O subsídio de insularidade ou a perda da liberdade de adaptação dos impostos previstos no Estatuto Político Administrativo são apenas dois exemplos que demonstram quão frágil é a nossa autonomia. Sem estabilidade e sem estrutura jurídico constitucional à prova dos ciclos mais ou menos favoráveis ao processo das autonomias portuguesas, dificilmente 64
construímos uma região mais forte e mais preparada para os desafios futuros. O caminho para a autonomia plena (que deve substituir esta autonomia de combate) deve estar na agenda e deve marcar as opções políticas dos partidos que concorrem em nome dos eleitores madeirenses e porto-santenses. Por isso, o fim do representante da república é o símbolo do fim da autonomia do combate. Mas não deve ser o fim do aprofundamento autonómico. Pelo contrário. É o início de uma nova era: a da construção da autonomia plena. Um caminho que corrige erros, defeitos de execução em virtude de contextos diferentes e vivências que trouxeram novas lições, mas também que agenda novas opções e novas soluções, tendo em conta que o mundo mudou, o país mudou e a própria Região amadureceu e está preparada para uma nova fase. Enganem-se aqueles que pensam que esta nova era da autonomia plena é tudo mais fácil. Que os ganhos se limitarão a pequenos ajustes dos resultados, algumas vezes menos adequados, da autonomia de combate. Não é. É uma nova era de complexidade acrescida porque enfrentará o país que olha de
soslaio para a autonomia. O país que observa com desdém e desconfiança a capacidade de decisão de quem está longe dos centros de decisão e pensa de forma desalinhada com Lisboa. A autonomia de combate gerou soluções nem sempre justas como, por exemplo, a regionalização da educação e da saúde. É consensual que hoje jamais se faria daquela forma, mas é uma consequência do combate que tinha de ser travado para serem obtidos ganhos consistentes em áreas estruturais. A agenda para a autonomia plena deve ter tudo isso em atenção e reescrever os instrumentos e o enquadramento constitucional que afirma a capacidade dos madeirenses de decidir o seu futuro: a continuidade territorial, a política fiscal, a política de saúde, a política da educação, o financiamento, o diálogo externo, entre outros. Para isso é preciso passar do combate duro e primário à capacidade política capaz e sofisticada. É preciso partidos capazes de gerar consensos na Região para ganhar a batalha da autonomia plena em Lisboa. Não pode ser mais a Madeira contra a Madeira, mas a Madeira a favor dos madeirenses. l
M A D E I R A L E G I S L AT I VA S R E G I O N A I S
OPINIÃO
JOSÉ PRADA, SECRETARIO GER AL DO PSD MADEIR A
AUTONOMIA, PROGRESSO E ESTABILIDADE. É AQUI QUE FAZEMOS A DIFERENÇA!
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utonomia, progresso e estabilidade. Palavras-chave que marcam a nossa forma de estar e de agir em política. Objetivos que diariamente nos guiam, naquela que é uma atuação responsável, honesta e, acima de tudo, de verdade, junto da nossa população. Uma atuação que nos distingue dos demais partidos, precisamente porque se baseia na defesa intransigente do que é melhor para a nossa Região e para cada Madeirense e Porto-Santense. Ao contrário de outros, não é a ambição pelo poder que nos move nem é, muito menos, a vontade de afirmar que a Madeira quer mudar ou que o futuro das novas gerações passa por uma rutura com o passado. Sabemos exatamente o que queremos e, não, não queremos este salto para o vazio que muitos agora resolveram propor, como sendo a única alternativa válida para o futuro. Não queremos uma aventura que coloque em causa o esforço e todo o trabalho desenvolvido por milhares e milhares de Madeirenses e Porto-Santenses, para que a Região chegasse, hoje, aos níveis de desenvolvimento e qualidade de vida que chegou. Nem queremos, tampouco, o regresso ao passado e à submissão aos
(Texto escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)
interesses e comandos de Lisboa. E não queremos por várias razões. Acima de tudo, porque na Madeira mandam os Madeirenses e Porto-Santenses. Porque aqui, na nossa Região, sabemos pensar pela nossa cabeça e dispensamos os ensinamentos falhados que, vindos de Lisboa, nada de novo ou de bom representam. Porque sabemos olhar para o futuro e identificar, exatamente, qual o caminho a seguir para atingir os nossos propósitos, da mesma forma que o fizemos ao longo dos últimos 40 anos. Porque a defesa da Autonomia – que outros só agora abraçam – é a base da nossa luta e é a essência da Social-democracia. E é por tudo isto e muito mais que o PSD/Madeira faz a diferença. E, claro, também fazemos a diferença porque cumprimos aquilo que prometemos e não criamos falsas expetativas nem muito menos enganamos aqueles que acreditam em nós. Fizemos o nosso percurso e continuaremos a fazê-lo, em nome da nossa população e ao lado dos nossos militantes. Estamos confiantes e ainda mais motivados para o trabalho que temos pela frente e é nesse trabalho que estamos concentrados, tal como desde a primeira hora. Não entramos nem entraremos em jogadas de bastidores com o poder central, nas falsas promessas que
não passam disso mesmo, na mania de prometer mundos e fundos para, depois, nada cumprir. À demagogia, estamos a responder com trabalho. À falta de ideias, estamos a responder com um projeto sério, concreto e verdadeiramente assente no que são as opiniões, sugestões e aspirações da nossa população. A contrariar a presunção daqueles que julgam que já ganharam porque sentem, segundo dizem, a vontade da mudança, nós, PSD/Madeira, estamos a esforçar-nos por cumprir e corresponder ao que as pessoas mais precisam e esperam de nós, trabalhando, conjuntamente, no encontro de soluções para os seus problemas. Em nome da Madeira e do Porto Santo, é esta a diferença que estamos a fazer, contra aqueles que ainda não perceberam que o nosso Partido é e será sempre, em primeiro lugar, a Região. E da mesma forma que o eleitorado confiou em nós, nós também confiámos na decisão de cada Madeirense e Porto-Santense. Com humildade, seriedade e, acima de tudo, com verdade, faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para que, ao lado da nossa população, possamos garantir que, a 22 de setembro, seja, novamente, a Região a sair vitoriosa! l 65
ELEIÇÕES
P R E S I D E N C I A I S GUINÉ-BISSAU GER AIS MOÇAMBIQUE
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ELEIÇÕES NA ÁFRICA LUSÓFONA A C V&A T EM H I STÓ R I CO N A M AT É R I A Q U E DÁ T ÍT U LO A E ST E PE Q U E NO T E XTO I NTROD U TÓ R I O. U M A EN T R EV I STA E XCLU S IVA CO M O PR E S I DE NT E DA R E PÚ BLI CA DA GUI NÉ - B I SSAU, J O SÉ M Á R I O VA Z , E UM ART IG O S O BR E O PR IME I RO MANDATO DE FI LI PE JACI NTO N Y U SI CO M O PR ESI DEN T E DA R E PÚ BLI CA DE MO ÇAMBI Q U E S ÃO AS PE ÇAS CH AV E D E STE C A PÍ T U LO. U NE - OS U M A B OA R EL AÇ ÃO PESSOAL E A VO NTADE DE CO NST RU IR A PAZ NO S S E U S PAÍ S E S . JOS É M Á R I O VA Z CO N SEG U I U CO N C LU IR O PR I ME I RO MANDATO DA H ISTÓ R I A DA J OV E M D E M O CR AC I A G U I N EEN SE SEM A SSA S S I NATO S , G O LPE S DE E STAD O, E XIL AD O S , PR IS Õ E S AR B I TR Á R I A S E A SSEG U R A N D O A L I BE R DADE DE E XPR E S S ÃO E DE IMPR E NS A. NU M R EG I M E SEM I - PR ESI DEN C I A L N ÃO DE T É M O P O DE R E XE CU T IVO E APE NAS E XE RCE A M AGI ST R AT U R A DE I N FLU ÊN C I A P O S S ÍV E L. S E É V E R DADE Q U E O P OVO G U I NE E NS E TE M PAZ E T R A N Q U I L I DA DE H Á C I N CO ANO S , TAMBÉ M É V E R DADE Q U E O S S U CE S S I VO S GOVE R N O S D O PA Í S N A DA T ÊM CO NS E G U ID O FAZ E R PAR A ME LH O R AR A V I DA D O P OVO. F I L I P E JAC I N TO N Y U SI CO N SEG U I U AG O R A FIR MAR CO M A R E NAMO U M T E RCE I RO ACORD O DE PA Z, Q U E TO D O S DESE JAM S E JA DE FINIT I VO. O PAÍS T E M E NO R ME S R E CU R S O S , U LTR APA SSO U O S PRO B L EM A S R EPU TACI O NAI S Q U E AS Q U E STÕ E S FINANCE IR AS E A P ROM I S C U I DA DE L H E H AV I A M C AU S AD O E P O DE PE RCO R R E R NO S PRÓXIMO S ANO S U M CAM I NH O DE PRO G R ESSO.
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GUINÉ-BISSAU ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS
“O VOTO T E M U M PA P E L F U N DA M E N TA L N A D E M O C R A C I A”
P R E S I D E N T E D E PA Z E L I B E R DA D E , C O M B AT E N T E D E M O N N A L A M A E D E D I N H E I R O D O E S TA D O N O S C O F R E S D O E S TA D O .
P R E S I D E N T I D I PA Z K U L I B E R DA D I . C O M B AT E N T I D I M O N N A L A M A C O M B AT E N T I D I D I N H E R U D I S TA D U N A K O F R I D I S TA D U .
J O S É
M Á R IO VA Z
P R E S ID E N T E DA G UIN É -B IS S AU
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E N T R E V I S TA
SOFIA ARNAUD
E M E N T R E V I S TA À P R É M I O , J O S É M Á R I O VA Z F E Z U M B A L A N Ç O D O S E U M A N DAT O , D E S TAC A N D O A C O N Q U I S TA DA PA Z E DA L I B E R DA D E N A G U I N É - B I S S AU E A I M P O R TÂ N C I A D E C O N T I N UA R A L U TA R PA R A A C O N S T R U Ç ÃO D E U M PA Í S D E IGUALDADE, JUSTIÇA E DESENVOLVIMENTO, NAS SUAS VERTENTES EDUCACIONAL, DE SANEAMENTO, SAÚDE E ECONÓMICO. O ACTUAL PRESIDENTE DA REPÚBLICA DA G U I N É - B I S S AU E C A N D I DATO À S P R Ó X I M A S E L E I Ç Õ E S P R E S I D E N C I A I S , M A R C A DA S PA R A N O V E M B R O P R Ó X I M O , A P E L A AO V OTO E R E L E M B R A O D E V E R D O C I DA DÃO EM EXERCER ESSE DIREITO DE CIDADANIA.
Que balanço faz do presente mandato? O balanço que faço do meu mandato é necessariamente positivo. Em 2014 encontrámos o país numa situação difícil e com muitos desafios. O objectivo primeiro era trabalhar para devolver a normalidade e encontrar a solução para todos os desafios, tais como criar condições para a paz civil, tranquilidade interna, liberdade e estabilidade. Penso que conseguimos, apesar de todas as tentativas exteriores e interiores, de todos os interesses inconfessáveis que procuraram manter a Guiné-Bissau ingovernável. Depois da abertura democrática, como sabe, o país continuou a viver à sombra da violência e de abusos do poder e por isso houve em vários momentos interrupção da normalidade constitucional. Como é sabido, nenhuma legislatura se cumpriu integralmente e, até este mandato que agora termino, podia dizer-se o mesmo sobre a função presidencial: nenhum Presidente da República tinha cumprido o seu mandato até ao fim, nos termos previstos pela nossa constituição. Inverter o estado de coisas, nestes cinco anos, foi a minha grande preocupação enquanto Presidente de Todos os Guineenses. O Estado é património de todos e não apenas de uma pequena
elite. Esta foi sempre a minha luta e a razão de tanta incompreensão e de tantos ataques da referida pequena elite à figura institucional do Presidente da República. Esses ataques prendem-se com a intransigente defesa que sempre fiz dos interesses da Guiné-Bissau e do seu Povo. Hoje e como sempre ao longo destes cinco anos, pautei-me por ser o Presidente de Todos os Guineenses, um Presidente eleito na expectativa de mudanças profundas no país e na vida do nosso povo continuo a lutar. Foi para isso que os Guineenses me elegeram, para mudar e dar novo rumo ao país, falando sempre a verdade, trazendo a paz civil, tranquilidade interna e bem-estar para cada família, para cada cidadão, devolvendo aos Guineenses a esperança de uma vida digna. Mas houve momentos difíceis durante este mandato. Acha que os Guineenses não o souberam compreender? Os momentos de crises político-institucionais que vivemos inscrevem-se no quadro desta minha luta pelo primado da lei e pela igualdade dos cidadãos, não podendo haver um grupo que seja detentor de todo o poder e de toda a riqueza e a maioria dos nossos irmãos Guineenses apenas com deveres e condenados à subserviência e a viver dos “restos” dos outros. Este nosso país tem de ser de todos
e para todos, não pode haver cidadãos de primeira e cidadãos de segunda. Respeito todos os partidos políticos, respeito todas as confissões religiosas, todas as origens não importando o número de integrantes de cada uma. As minhas convicções pessoais nunca estiveram à frente da minha condição de Presidente da República. Para o bem da maioria e sacrificando a minha tranquilidade decidi lutar contra os interesses instalados que impediram a Guiné-Bissau de avançar nos últimos 46 anos. Destaco, sobretudo, a luta contra a corrupção e daí o meu apelo ao “Dinheiro do Estado no Cofre de Estado”. Outros desafios tais como a erradicação da pobreza, a educação das crianças e a auto-suficiência alimentar constituíram e constituem também a grande preocupação enquanto Presidente da República. Foi para ajudar a cumprir este desiderato, realizar a igualdade e a justiça, que, há cinco anos, o cidadão José Mário Vaz, um cidadão que ama a sua Terra, assumiu o cargo de Presidente da República. Os Guineenses souberam e sabem compreender-me. Alguns interesses instalados e outros que querem instalar-se é que não. E grande parte da ajuda à instabilidade veio de países que acreditamos ser amigos, mas que estão mal informados. 69
GUINÉ-BISSAU ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS Passados cinco anos, a nossa Guiné-Bissau é um país de Paz Civil, de Tranquilidade Interna e de Liberdade. As imagens do passado transmitiam conflitos, espancamentos, assassinatos, prisões arbitrárias, violência, terror e comoviam o mundo. Muitas vidas foram perdidas por divergências políticas. Qual o objectivo que mais lhe tenha dado gosto cumprir? Foi a conquista da Paz e da Liberdade para o nosso povo, algo impensável no passado. A Paz e a Liberdade não são palpáveis, mas são visíveis. E nós os Guineenses sentimos na vivência do nosso dia-a-dia essa Paz e a Liberdade com que coabitamos nas nossas casas, com os nossos vizinhos, nas bancadas e até mesmo nos convívios familiares e sociais, com total liberdade de dizer publicamente o que pensamos em qualquer lugar sem que a nossa opinião se transforme num pesadelo como foi no passado. Devemos defender e preservar esta conquista que muito nos custou. A Guiné-Bissau construiu o caminho da Paz e da Liberdade, agora temos que percorrer o caminho do desenvolvimento. A primeira cabe ao Presidente da República, às Forças Armadas, às quais muito temos de agradecer, ao Governo e ao Povo, claro. Depois da conquista que foi o caminho da Paz e da Liberdade, estamos em condições
de enfrentar os desafios da erradicação da pobreza e de auto-suficiência alimentar através de muito trabalho, determinação e com “Mon-na-Lama”, eu acredito que conseguiremos tudo o que sonhamos para a nossa terra e para o nosso povo. Esta já é uma tarefa que é do poder executivo, mas na qual o Presidente deve ter um papel forte através daquilo a que chamamos a magistratura de influência. Desde o início do meu mandato cada criança que nasceu conheceu uma sociedade diferente, ou seja, um país sem violência. Este é o trabalho que eu fiz para dar uma nova esperança ao cidadão novo, a uma nova geração. E este é um sinal de nova esperança para o nosso país, para o nosso futuro colectivo. Esta conquista foi um trabalho conjunto de todos os Guineenses e em especial, repito, das nossas Forças de Defesa e Segurança, os nossos Militares e Paramilitares, cujo papel foi determinante para a Guiné de Paz e de Liberdade que hoje vivemos. Enquanto Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas, sinto-me orgulhoso pelo contributo que prestei a esta causa nacional. Qual ou quais os objectivos que ficaram por terminar? Ainda falta muito por fazer, mas o mais importante é manter o que conquistamos com muito sacrifício. E ao longo destes cinco anos permitiu-nos fazer um grande
exercício democrático, embora ainda numa situação frágil conseguimos manter a união, a coesão e a solidariedade entre os Guineenses. Acredito no meu país, esta Guiné onde todos testemunhámos a mudança nestes cinco anos e proponho a todos os Guineenses que continuemos a trabalhar juntos, para construirmos um país de Igualdade, Justiça e Desenvolvimento, nas suas vertentes educacional, de saneamento, saúde e, claro, económico. Qual é para si a importância do voto? Apelo aos Guineenses em qualquer acto eleitoral para que votem sempre em consciência, pois o voto é uma escolha individual, mas deve ter em conta o que será melhor para todos, porque o resultado das eleições irá afectar a vida de todos, individual e familiarmente. O voto tem um papel fundamental na democracia, é, mesmo, a sua semente. Por isso, o cidadão deve ter a consciência da sua relevância no processo democrático do seu país, e nunca deixar de exercer esse direito de cidadania. Votar é honrar a nossa Bandeira, os heróis tombados em combate na luta pela independência e ser dignos da nossa Pátria. Incentivar a participação eleitoral, por todo o mundo, tem sido um desafio e levar os mais jovens a votar parece ser cada vez mais difícil. Essa tem sido
“ D E V E M O S D E F E N D E R E P R E S E RVA R E S TA C O N Q U I S TA Q U E M U I T O N O S CUSTOU. A GUINÉ-BISSAU CONSTRUIU O C A M I N H O DA PA Z E DA L I B E R DA D E , AG O R A T E M OS Q U E P E R CO R R E R O C A M I N H O D O D E S E N V O LV I M E N T O .”
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E N T R E V I S TA uma questão na Guiné-Bissau? Como acha que se conseguem atrair as populações mais jovens para a actividade política? A maioria da população da Guiné-Bissau é jovem e é determinante a participação dos jovens – a par dos Guineenses em geral - no pleito eleitoral. A não participação massiva dos jovens na política poderá dever-se a falta de referência nas elites políticas. Hoje as nossas elites políticas não lutam pelas causas, mas sim pelos interesses pessoais, de um grupo ou da família. Não sendo a luta pelo bem comum, isso desencoraja muitos jovens no momento de votar, porque sentem que o seu voto, ao invés de contribuir para a mudança que todos desejamos, vai manter os ‘status quo’ existentes há mais de 46 anos.
“A M U LT I P L I C I D A D E D E C A N D I D AT O S , P O D E R Á S I G N I F I C A R M A I S E M E L H O R E S P R O J E C T O S PA R A O N O S S O P OV O E PA R A O N O S S O PA Í S . C A B E A S S I M A C A DA C I DA DÃO E L E I TO R FA Z E R A S UA E S CO L H A E M C O N S C I Ê N C I A E E M F U N Ç ÃO DA S P R O P O S TA S A P R E S E N T A D A S P E L O S C A N D I D AT O S .”
Tendo a Guiné-Bissau uma grande população a residir em zonas rurais, como garantir a inclusão dessas pessoas nas eleições? Nesta questão o papel do Executivo é essencial, para permitir criar condições de não exclusão de qualquer Guineense que queira exercer o seu direito. O direito a exercer o voto não pode ser negado a nenhum Guineense por dificuldades ligadas a infra-estruturas ou de outra natureza burocrática/administrativa.
que vivem da corrupção do aparelho do Estado, das ligações internacionais a negócios menos transparentes e protegem interesses de certas elites guineenses contra outros não devem merecer o voto popular. Todos os restantes são bem-vindos.
As eleições Presidenciais de 2019 são marcadas por uma multiplicidade de candidatos. Acha isso benéfico para a democracia? Sim, porque a multiplicidade de candidatos, poderá significar mais e melhores projectos para o nosso povo e para o nosso país. Cabe assim a cada cidadão eleitor fazer a sua escolha em consciência e em função das propostas apresentadas pelos candidatos. O que é importante é que haja liberdade de voto, recenseamento correcto e actualizado e que o povo saiba que a Guiné está acima de tudo. Os interesses daqueles
Quais os principais desafios, caso vença as eleições, para um próximo mandato? Manter as duas grandes conquistas destes últimos cinco anos do mandato e, com a magistratura de influência legitimada pelo voto popular, influenciar o Governo para dar aos Guineenses aquilo que mais ambicionam: saúde, educação e auto-suficiência. Se conseguirmos manter a Paz e a Liberdade as condições estarão, também, criadas para uma magistratura de influência direccionada para o crescimento e desenvolvimento económico. Neste sentido, entendo que o país deve concentrar-se na economia verde,
ou seja, fazer uma forte aposta na agricultura, a fim de resolver alguns problemas como a auto-suficiência alimentar e o combate à pobreza. Reforço a necessidade de maior aposta na vigilância do princípio “Dinheiro do Estado no cofre de Estado”, a fim de direccionar uma boa fatia dos recursos deste para melhorar a Educação, Saúde e Infra-estruturas, não permitindo que se percam em bolsos de terceiros. Reforçar os laços de amizade e de cooperação com os nossos parceiros bilaterais e multilaterais para bem dos nossos respectivos países e povos. Esta amizade não pode, em momento algum, ser entendida como servência ou permitir ingerência na política interna. A Guiné-Bissau, através da luta armada, com o sacrifício de muitos dos seus filhos, conseguiu derrotar aquelas que, ao tempo, eram as forças militares do colonizador e tem a obrigação de honrar os seus heróis. Reciprocidade é a palavra chave nas relações internacionais. 71
GUINÉ-BISSAU ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS Caso vença as eleições de 24 de Novembro, como gostaria que a sua Presidência fosse recordada em 2024? Como um Presidente diferente e como um Presidente de Paz e de Liberdade que consegui consolidar a Paz e Liberdade na Guiné-Bissau e colocou um fim ao ciclo da violência no país. Um Presidente próximo de todos os Guineenses e que luta lado a lado em defesa dos mais carenciados. Um Presidente de mãos limpas, que nunca enriqueceu à custa do Povo, que sairá um dia da Presidência com o mesmo dinheiro com que entrou, e espero que seja uma referência para a nova geração dos políticos comprometidos com o futuro da Guiné-Bissau e com o povo.
“O C AMINHO FAZ-SE C A M I N H A N D O E M U I TA S VEZES COM ESPINHOS NO NOSSO PERCURSO, M A S Q UA N D O S E LU TA PELO BEM DA MAIORIA E CO M CO N V I CÇ ÃO, O S O B S TÁC U LO S S ÃO U LT R A P A S S ÁV E I S .”
longo destes cinco anos. Deixo um agradecimento pelo facto de participarem activamente na prática democrática. Não posso é aceitar que discordar signifique insultar, denegrir, difamar. Peço que me acompanhem nos próximos cinco anos com maior maturidade e elevação nas suas opiniões, porque a Guiné-Bissau é de todos e para todos e ninguém deverá ser excluído neste exercício democrático na luta pelo bem comum. O caminho faz-se caminhando e muitas vezes com espinhos no nosso percurso, mas quando se luta pelo bem da maioria e com convicção, os obstáculos são ultrapassáveis. Termino com um enorme “obrigado a todos Guineenses” e com o pedido para que vão votar. l
Quer deixar uma mensagem aos Guineenses? Agradeço a todos os Guineenses que me acompanharam e encorajaram ao longo desta caminhada, que não foi fácil, pois só juntos conseguimos chegar onde estamos hoje. Sozinho não o conseguiria fazer. A caminhada não terminou e conto com todos para prosseguirmos juntos rumo ao segundo mandato. Todavia, não poderia também esquecer todos os que, com seriedade, me criticaram ou de mim discordaram ao
A TÍTULO DE EXEMPLO E REVISITANDO O PERÍODO ENTRE 23 DE JUNHO DE 2014 E A PRESENTE DATA POSSO DIZER, ORGULHOSAMENTE, QUE O NOSSO PAÍS MUDOU:
• Durante os cinco anos do meu mandato não houve um único tiro nos quarteis ou qualquer golpe de estado; • As questões de desrespeito pelos direitos humanos hoje não se colocam, porque não há registo de violações de direitos humanos. Isso incomodou muita gente e em muitas ocasiões houve tentativa de manipular e de “inflamar” a opinião pública nacional e internacional, através de envio de fortes mensagens para a comunidade internacional e para os nossos irmãos da diáspora, através de forte campanha de desinformação e até ao ponto de fazer apelos à desobediência civil e incentivos à violência e à insurreição militar; • No nosso país há total liberdade de imprensa, de expressão e de manifestação. Essa liberdade até tem sido abusivamente usada em campanhas de difamação e injúria contra o mais Alto Magistrado da Nação, algo que era impensável antes do meu mandato como Presidente. Mas a tolerância é apanágio deste cidadão que dirige um povo com justiça e bom coração. Estas foram as verdadeiras mudanças; • Durante o meu mandato acabámos com a prepotência e o velho princípio de quero, posso e mando “bu sibi mê quim ku na papia ku el” ou “bu sibi a mi i kim”?; • Tenho dito que os meus maiores legados são a Paz e a Liberdade. Durante o meu mandato os Guineenses, finalmente, conheceram dias e noites sem sobressaltos e sem medo, porque ninguém foi morto ou espancado, nem tivemos crianças órfãs ou mulheres viúvas por questões políticas, não houve prisões arbitrárias, já não temos exilados políticos como no passado e acabaram-se as perseguições por questões políticas ou por alguém discordar de alguma decisão ou opinião.
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O QUE DISTINGUE A LOJA DAS CONSERVAS Informação sobre a indústria conserveira nacional – todas as conserveiras presentes têm o seu próprio painel informativo onde é contada a sua história que se confunde com a própria história do sector, em espaços com uma decoração industrial. A Loja das Conservas tem como um dos seus principais objectivos promover as conservas nacionais e, para tal, definiu uma política de preços razoáveis, tendo em conta a relação preço/qualidade do produto que vende. Venda personalizada — a equipa de loja acompanha todos os visitantes para apresentar o sector conserveiro e aconselhar os melhores produtos, tendo em conta os gostos de cada um.
SERVIÇOS DISPONIBILIZADOS PELA LOJA DAS CONSERVAS Organização de eventos A Loja das Conservas tem à sua disposição três amplos e versáteis espaços, em Lisboa (120 m2), Porto (80m2) e Macau (80m2), localizados em zonas centrais e dinâmicas da cidade, para a organização de eventos da mais diversa natureza com catering associado, tendo sempre como base as conservas portuguesas. Gifts empresariais A Loja das Conservas tem à sua disposição uma variedade de gifts empresariais adaptáveis às exigências da sua empresa e dos seus clientes com um Packaging inovador as nossas caixas e as latas de conservas surgem com uma imagem renovada e, para além de apetitosas, já se tornaram um objecto de colecção.
A Loja das Conservas é uma iniciativa da ANICP – Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe, é a maior loja das conservas nacional e reúne, num só espaço 19 conserveiras, que totalizam mais de 800 referências. Como loja bandeira da indústria conserveira nacional, a Loja das Conservas vende e promove as melhores conservas do mundo – as portuguesas. Assentes na experiência de décadas (o início da indústria conserveira portuguesa remonta a 1853), as nossas conservas são conhecidas e reconhecidas internacionalmente pela longa tradição que se traduz na qualidade de um produto saudável e acessível a todos. As opções de escolha são, por isso, mais que muitas. Para além das mais conhecidas como a sardinha, a cavala ou atum, as revelações surgem com o polvo, a truta, o bacalhau, as enguias, a chaputa, os carapaus ou as ovas de sardinha, o chamado “caviar português”, uma verdadeira iguaria que faz as delícias de quem conhece ou decide experimentar pela primeira vez. www.facebook.com/lojadasconservas
Restaurante A Loja das Conservas conta com dois restaurantes conexos às lojas de Lisboa e Porto, onde é possível provar pratos concebidos unicamente com as conservas de pescados produzidas pela industria portuguesa. As receitas desenvolvidas pelos chefes Tiago Neves e André Palma tem alcançado grande notoriedade dada a sua qualidade gastronómica e de confecção. Receitas perfeitas para experimentar nos nossos restaurantes ou apresentar em catering na sua empresa ou evento. A Loja das Conservas está disponível para celebrar protocolos e parcerias com outras entidades ou empresas com as quais seja possível definir objectivos comuns, tais como a promoção dos produtos portugueses, divulgação das conservas nacionais ou instalação de pontos de venda.
LOJAS Rua do Arsenal 130 1100-040 Lisboa Contacto: 911 181 210 Seg-Sáb: 10-21h Dom: 11h30-20h
Rua Mouzinho da Silveira 240 4050-417 Porto Contacto: 960 472 930 Seg-Sáb: 11-21h Dom: 13h30-19h30
lojadasconservas@gmail.com
Macau Rua do Aterro Novo 9 Contacto: +682 85689 Seg-Dom: 11h-21h
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MOÇAMBIQUE ELEIÇÕES GERAIS
UM MANDATO QUE PODE FICAR PARA A HISTÓRIA O MANDATO DE FILIPE JACINTO NYUSI, QUE AGORA TERMINA, NÃO FOI FÁCIL. MAS FOI SUPERADO COM SUCESSO CULMINANDO COM O DESEJADO ACORDO DE PAZ COM A RENAMO. O MANDATO QUE IRÁ A VOTOS A 15 DE OUTUBRO DE 2019 SERÁ IGUAL OU AINDA MAIS DESAFIANTE. O ACTUAL PRESIDENTE DE MOÇAMBIQUE TEM ISTO EM MENTE QUANDO SE PREPARA PARA CONCORRER AO SEU SEGUNDO MANDATO.
F IL IPE N Y US I
J AC IN TO
P R E S ID E N T E DA R E P ÚB L IC A DE MOÇAMBIQUE
SALVADOR PACHECO
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F
criação e reforço de meios de subsistência e na criação de emprego, três necessidades prementes de muitos moçambicanos. Confirmem-se, ou não, as melhores perspectivas na resolução destes desafios, o próximo mandato presidencial pode ser determinante para o futuro do país, sendo necessário uma aceleração económica e a criação de postos de trabalho para uma população em que cerca de 50% da população tem menos de 18 anos. Com o crescimento económico, as receitas fiscais subirão e isso permitirá ao novo Governo investir na educação e outras áreas prioritárias, que a forte crise económica e financeira tem impedido de financiar de acordo com as necessidades, durante o mandato prestes a findar. Depois de um mandato cuja principal missão de Nyusi foi de estabilização económica, o mandato que irá de janeiro de 2020 ao final de 2024, terá de ser de crescimento e forte desenvolvimento do país, num período que se espera de forte instabilidade mundial e em que o aquecimento global ameaça ter ainda mais impacto. O mandato que agora termina não foi fácil, mas foi superado com o pragmatismo do Presidente Nyusi, e que gerou um sucesso possível, de acordo com as condições que tinha para trabalhar. O mandato que irá a votos a 15 de Outubro de 2019 será igual, ou ainda mais desafiante. Mas pode ficar na história do país por razões positivas, olhando para o horizonte promissor ancorado na expectativa das receitas do gás, e do resultado da sua diplomacia económica. l
DR
DR
DR
ilipe Jacinto Nyusi, engenheiro mecânico de formação, certamente não deveria esperar um mandato tão agitado quando tomou posse a 15 de Janeiro de 2015 como Presidente da República de Moçambique. Desde essa quinta-feira, Moçambique confirmou-se como uma potência mundial em recursos minerais, com foco no gás natural, o País iniciou uma grande investigação nacional e internacional ao caso das “dívidas ocultas” que levou à detenção de várias importantes figuras da Capital, começou a ser alvo de ataques de grupos extremistas no Norte do País, foi afectado por dois ciclones (ambos em 2019) devastadores, com impactos humanos e económicos muito relevantes, e assinou o 3º Acordo de Paz e Reconciliação com a RENAMO. Isto em concomitância com os esforços de recuperar uma economia e sistema financeiro muito afectados pelo corte de apoio ao orçamento do Estado pelos parceiros, cujo déficit era de cerca de 40%. Enquanto isso, o seu vizinho com economia mais dominante, a África do Sul, vive um período de incerteza e uma das maiores crises económicas da sua história. Face a estas conquistas e desafios, facilmente se conclui que este mandato foi positivo para o País e para o Presidente Nyusi, tendo estes cinco anos tido um papel fundamental para a criação de fundações para um mandato que, não sendo o do tudo ou nada, pode ser o início da mudança da história económica e social de Moçambique. E certamente que Filipe Nyusi tem isto em mente quando se prepara para concorrer ao seu segundo mandato. Há conquistas que têm de ser concretizadas, com a exploração comercial do gás natural no topo das oportunidades, prioridades e questões que têm de ser resolvidas, como o problema dos ataques extremistas na Província de Cabo Delgado. Isto enquanto o Governo irá certamente continuar a trabalhar para potenciar a agricultura no país, para além do turismo, dois sectores da economia com enorme impacto no combate à fome,
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MOÇAMBIQUE ELEIÇÕES GERAIS
A IMPORTÂNCIA DO VOTO PARA
O FUTURO DE MOÇAMBIQUE
OS SUCESSIVOS GOVERNOS MOÇAMBICANOS E INSTITUIÇÕES ESTATAIS TÊM FEITO UM GRANDE ESFORÇO PARA RECENSEAR CADA VEZ MAIS PESSOAS, COMBATENDO A DISPERSÃO GEOGRÁFICA E UMA POPULAÇÃO LOCALIZADA MAIORITARIAMENTE EM REGIÕES RURAIS. ASSIM, DESDE 1994, O NÚMERO DE CIDADÃOS MOÇAMBICANOS VOTANTES, ORGULHOSOS DE EXERCER ESSE DIREITO, TEM VINDO A AUMENTAR SIGNIFICATIVAMENTE.
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M
uitos dos que saem das assembleias de voto em Moçambique erguem no ar o dedo tingido, em sinal de orgulho, uma tradição em inúmeros países por esse mundo fora, e que serve como testemunha de que o cidadão cumpriu com o seu dever cívico de votar. E desde 1994, ano das primeiras eleições presidenciais e parlamentares (gerais), que o número de cidadãos moçambicanos votantes, orgulhosos de exercer esse direito, tem vindo a aumentar. As últimas eleições gerais, em 2014, que elegeram Filipe Jacinto Nyusi para o cargo de Presidente da República, registaram um aumento de 35% de eleitores face às eleições presidenciais anteriores, em 2009, tendo atingido os cerca de 5,33 milhões de eleitores, o número mais elevado de sempre no país. Estes valores impressionam pelo crescimento e contrariam os mesmos problemas que afectam muitas democracias no século XXI, que é a baixa participação eleitoral, considerando o número de eleitores registados. Nesse mesmo ano de 2014, apesar do crescimento substancial do número de votantes, a abstenção superou os 50%, um aumento face aos cerca de 44% nas eleições anteriores. Neste capítulo, as eleições de 1994 foram as que registaram o menor número de abstencionistas, com cerca de 80% dos eleitores recenseados a exercer o seu direito de voto. As seguintes, em 1999, que reelegeram Joaquim Chissano para a Presidência da República, foram
SALVADOR PACHECO
as que tiveram mais adesão, com cerca de 70% dos eleitores a ir às mesas de voto. O que justifica a conjugação destas tendências contraditórias são três factores, os quais, obviamente, podem ser impactados por outros mais momentâneos, como o momento político, se as eleições são para eleger ou reeleger um Presidente, entre outras. Moçambique continua a ser um país com uma população maioritariamente rural. De acordo com os últimos censos, de 2017, 67%, dos cerca de 27,9 milhões de habitantes de Moçambique, residem em zona rural. Esta condição torna mais morosa a ida das pessoas às mesas de voto as quais existem nas zonas rurais, mas estão mais distantes. Adicionalmente, devido à dispersão geográfica, a comunicação política também é menos intensa. Tudo conjugado, isto tem um efeito negativo na participação eleitoral, ainda que haja um esforço claro para que os votantes se dirijam às mesas de voto. Outro factor de relevo que, por sua vez justifica uma maior abstenção, é a tendência global, atrás referida, de um maior afastamento da população mais jovem das ações de participação cívica, como as eleições. Recorde-se que uma grande fatia da população moçambicana tem menos de 25 anos. No sentido inverso, o que justifica
o aumento de eleitores, mesmo num período de aumento da abstenção, é o esforço extraordinário que os sucessivos governos moçambicanos, instituições estatais e seus colaboradores fazem para recensear cada vez mais pessoas, combatendo a dispersão geográfica e a menor participação cívica dos mais jovens. Em 1999, havia cerca de 7,1 milhões de pessoas recenseadas, face aos quase 11 milhões em 2014. No recenseamento eleitoral para as eleições municipais de 2018 e eleições gerais de 15 de outubro de 2019, foram registados cerca de 13 milhões de eleitores. Estes três factores conjugados têm um papel fundamental para atingir estes números quase paradoxais, mas que, para já, se encaminham para um aumento do número de eleitores. O desafio seguinte será assegurar que votar se torna num processo mais fácil, rápido e atraente para as camadas mais jovens da população, por forma a que cada vez mais Moçambicanos possam ter orgulho na participação democrática, essencial para o futuro de Moçambique. l 77
ORDEM DOS ADVOGADOS ELEIÇÕES
GU IL H E R M E F IG UE IR E D O B A STO N Á R IO DA O R D E M DOS ADVOGADOS
“UMA ADVOCACIA PRESENTE E COM FUTURO” E S T E É O ‘ S L O G A N ’ D A C A M PA N H A D E G U I L H E R M E F I G U E I R E D O PA R A B A S T O N Á R I O D A O R D E M D O S A D V O G A D O S PA R A O T R I É N I O 2 0 2 0 - 2 0 2 2 . O A C T U A L B A S T O N Á R I O É U M D O S C A N D I D AT O S À S P R Ó X I M A S E L E I Ç Õ E S D A ORDEM DOS ADVOGADOS, A DECORRER NO PRÓXIMO MÊS DE NOVEMBRO.
FOTOS: FERNANDO PIÇARRA
A MODERNIZAÇÃO DA ORDEM SER Á A PRIORIDADE SE FOR REELEITO.
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E N T R E V I S TA
SOFIA ARNAUD
Que balanço faz do seu mandato enquanto Bastonário da Ordem dos Advogados entre 2017-2019? Faço um juízo bastante positivo, porque definimos, à partida, algumas áreas de intervenção fundamentais. A primeira passou por colocar a “casa em ordem”, com procedimentos de natureza legal, com uma reestruturação interna, com alterações nos recursos humanos, com uma gestão eficiente, que não existia, com uma diminuição das despesas que não faziam sentido e imputação de superaves a questões fundamentais. Sem esta reforma interna não haveria hipóteses para passarmos à fase seguinte que consistirá em desburocratizar os serviços da Ordem, tornando-os mais simples, eficientes e eficazes na resposta aos advogados. Para além de todo este trabalho, conseguimos criar uma ponte directa e importante com o poder político e outras instituições, nomeadamente com a Assembleia da República (AR), com o Governo, com o Ministério da Justiça, com as Secretarias de Estado da Justiça, com os partidos políticos, com as Universidades, com as instituições que de alguma forma trabalham e defendem os direitos humanos, nomeadamente o Fórum Penal e outras associações que são fundamentais para a vivência colectiva, e com algumas organizações internacionais. No fundo, colocámos a Ordem dos Advogados (OA) como uma instituição reconhecida, ouvida nas matérias mais importantes no que toca à justiça, ao estado de direito democrático e aos advogados. Quais as suas maiores conquistas nestes três anos? Para além do já referido e que estava nas “nossas mãos”, foram feitas várias diligências no sentido de pressionar quem
tem poder para o fazer relativamente a outras matérias que não conseguimos resolver sozinhos, mas que podemos encaminhar para que cheguem a “bom porto”. Essas mesmas diligências têm já os seus frutos em algumas matérias como por exemplo podemos destacar o processo de inventário (mais conhecido como o processo de partilhas litigiosas), uma matéria na qual trabalhamos imenso e influenciamos o poder político mostrando a realidade que parecia para muitos ser desconhecida, tendo sido aprovada no último dia antes das férias parlamentares deste ano; ou até a proposta de lei do governo relativa ao sistema do acesso ao direito e aos tribunais que o próprio Governo acabou por retirar da votação, tendo a Ordem dos Advogados tido um papel fundamental nesse recuo tal como se viu no debate parlamentar sobre a referida proposta, onde foi referenciado pelos partidos da oposição o parecer da Ordem dos Advogados. Isto é demonstrativo daquilo que vamos trabalhando e vamos conseguindo. Mas, por exemplo, no caso das custas judiciais ainda não conseguimos que todo o trabalho desenvolvido fosse traduzido numa alteração legislativa, absolutamente central para o acesso ao direito e aos tribunais. Outro exemplo é o caso das questões de natureza fiscal, nas quais temos trabalhado afincadamente, conjuntamente com o Senhor Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais, tendo algumas delas já visto a luz do dia, tal como a recente alteração ao Código do IMI e que permite aos advogados ter acesso aos dados dos prédios confinantes dos seus clientes, permitindo assim a notificação daqueles para a preferência, o que não era possível atenta a interpretação da AT que se escudava no RGPD. Podemos destacar, de igual modo, o papel fundamental que a OA teve no OE de
2018 no sentido de travar as alterações que o Governo pretendia introduzir aos sujeitos passivos titulares de rendimentos da categoria B e que iriam penalizar muito os profissionais liberais. No entanto, muitas outras alterações foram propostas e estávamos convictos que iria ser tema para o OE 2019 e que não veio a acontecer, mas esperamos que esteja em agenda para o orçamento de 2020. Existem muitas outras matérias, como a alteração da tabela de honorários no âmbito do apoio judiciário, que não é alterada desde 2004 (2009 não foi uma verdadeira alteração) e que, apesar do imenso trabalho que o Conselho Geral tem vindo a fazer no sentido desta alteração, tendo apresentado uma proposta de nova tabela, ainda não viu resultados. No entanto, não podemos esmorecer, temos de avançar, continuar a pressionar o poder político mantendo as boas relações com todos os partidos, com a AR e com o Governo no sentido de ir mostrando o que são as nossas pretensões. Nesta matéria iremos fazer uma pressão ainda mais intensa. Por outro lado, com as universidades a relação é hoje muito boa. Recentemente foi lançado o livro “Em Defesa dos Direitos Fundamentais”, uma obra jurídica da autoria do docente universitário e juiz do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, Paulo Pinto de Albuquerque, e o que iremos lançar no mês de Novembro com a participação de mais de 100 doutores em direito e que será um marco da doutrina portuguesa sobre essa matéria e, simultaneamente, um marco na reflexão sobre a área mais importante que o direito pode ter que são os Direitos Humanos. Também destacamos o Congresso dos Direitos Humanos que se realizou no passado mês de Junho no Porto e em Lisboa, onde participaram quase 150 conferencistas, 79
ORDEM DOS ADVOGADOS ELEIÇÕES
C O N H E Ç A O S P R I N C I PA I S N Ú M E R O S Q U E M A R C A R A M O M A N D AT O D E G U I L H E R M E F I G U E I R E D O 2 0 1 7 - 2 0 1 9 :
1.8
MILHÕES DE EUROS EM REDUÇÃO DE CUSTOS ANUAIS
90
PARTICIPAÇÕES NO PROCESSO LEGISL ATIVO
1.2 tendo a OA merecido um louvor do Senhor Presidente da República e que vai resultar na edição da maior obra sobre Direitos Humanos alguma vez editada em Portugal. Repare, também fizemos um congresso e duas convenções de delegações, descemos as quotas, principalmente para os mais novos, o que nunca tinha sido feito, e fizemo-lo como consequência de uma gestão cuidadosa. Alterámos o Boletim e a Revista; e preparamos o caminho para o voto electrónico. Por último, deve relevar-se o trabalho imenso no âmbito da política legislativa e termos conseguido, juntamente com a OSAE e, acima de tudo, com a Direcção da CPAS alterar o regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores que foi sujeita a uma alteração em 2015 sem os advogados se terem pronunciado, com a conivência de muitos que agora dizem o contrário, e cuja preparação apenas teve uma posição contrária da representante do Conselho Distrital do Porto. Aqui ainda há um caminho a fazer, com o objectivo de conjugar a sustentabilidade da CPAS com a sustentabilidade dos Advogados. O que vai ficar por fazer para o próximo mandato? Estas matérias que já referi e que vamos ter de potenciar. Continuar o trabalho relativo às custas judiciais, reflectir quais as áreas de investimento que a OA deverá fazer e para que fim, a alteração estatutária é um trabalho que vai ter de ser feito no futuro, isto é, colocar os 80
MILHÕES DE EUROS/ANO EM REDUÇÃO DE QUOTAS
estatutos da Ordem no tempo actual. Temos também de continuar o trabalho relativamente aos estabelecimentos prisionais, que está em andamento com o Fórum Penal, e que não vamos conseguir concluir. Uma outra matéria que vai ser central no futuro é a tabela dos honorários a pagar aos advogados no âmbito do acesso ao direito e aos tribunais. O acesso à profissão e a formação dos estagiários são assuntos fundamentais para serem tratados, e que pretendemos dar uma resposta mais estruturante e diferente. Por outro lado, é importante olhar para outras matérias do ponto de vista interno como, por exemplo, a redistribuição das receitas, relacionada com as quotas dos advogados, conjugada naturalmente com a alteração do próprio estatuto. Alterar o estatuto vai ser um objectivo a concretizar. A OA tem um caminho longo ainda a percorrer, já com as questões internas fixadas. Existe um trabalho enorme que precisa ser feito do ponto de vista de continuidade. No futuro, o OA pode preocupar-se mais com a relação externa, dar mais força à política legislativa e às questões importantes para a vida dos advogados portugueses, que muitas delas passam por matérias de natureza cultural, que é preciso esclarecer. A OA tem de dar o “pontapé de saída” para uma cultura interior, não apenas para advogados, mas também para juristas. Hoje, existem problemas de natureza pratica que têm a ver com direitos, liberdades e garantias do
cidadão, isto é, com direitos fundamentais de cidadania. Esta é uma preocupação da OA, é preciso intensificar as iniciativas conjuntas com as magistraturas, seja judicial, Ministério Público, mas também incluir funcionários judiciais. É preciso defender a advocacia de uma perspetiva economicista. Não queremos a partir de um mundo economicista criar um mundo kafkiano. Com o estado a que chegamos de trabalho, podemos agora avançar mais sobre matérias que têm a ver com o trabalho quotidiano dos advogados, na defesa das suas prerrogativas, o que já temos feito, mas poderemos intensificar. Podia referir aqui cerca de 90 itens de medidas e propostas que trabalhamos, umas concretizadas e outras em via de concretização, outras, ainda, que têm tido obstáculos de quem tem o poder para que se concretize. Actualmente, quais os principais problemas da justiça em Portugal? Dependendo da área para onde olhamos, temos matérias que melhoraram muito, ignorar isso é não perceber do que se está a falar, quer no âmbito civil, no tratamento e tempo de duração de uma acção, no âmbito dos tribunais da Relação, no âmbito do Supremo Tribunal. Contudo, estamos na altura de olhar para as coisas de maneira diferente. O tempo percorrido desde o 25 de Abril de 1974 é suficiente para termos uma maturidade política para discutir as coisas no lugar certo e sem que as posições divergentes sejam entendidas como posições contra
E N T R E V I S TA este ou aquele, têm de ser assumidas com maturidade e também com liberdade de reflexão e pensamento. Temos que colocar em causa determinadas matérias, como o tempo de duração de alguns processos penais, do ponto de vista criminal temos de nos interrogar se não deverá existir controlo de natureza jurisdicional, pôr em causa a própria actuação do próprio Ministério Público (MP), se deve continuar nos tribunais ou se deve ter estruturas físicas fora do tribunal e até a própria arquitectura do tribunal deve ser repensada. É preciso ter esta discussão, sem que isso signifique desvalorização do MP ou da sua autonomia. Temos ainda matérias do ponto de vista da justiça, o problema das custas obviamente, o que significa ter um olhar diferenciado para a justiça como bem essencial e não como bem económico, criando prioridades da acção do Estado e dos Governos relativamente aquilo que é a justiça. Justiça essa que tem um papel agregador da própria sociedade, como elemento de coesão social. Depois há outras matérias fundamentais como o problema dos tribunais administrativos e fiscais, que não tem tido solução, e que afectam os direitos dos cidadãos, desde logo, em face ao Estado, e prejudicam o desenvolvimento económico do país. Temos de começar a olhar para questões estruturantes do sistema, vendo onde funcionam mal e tratá-las. Temos também o problema de uma política do edificado no âmbito na justiça, que não existe, sabendo, importa dizê-lo, não por razões subjectivas, mas por razões objectivas: é preciso olhar para a justiça como um bem essencial e um bem essencial que tem relação com a
soberania do Estado, ou seja, que este deve cuidar. Há muitas matérias que o Estado regula e que não têm relação com a soberania. A justiça do futuro, que passa pela utilização das novas tecnologias como um ‘plus’ para a acção da justiça, é um outro tema a ter em conta. As novas tecnologias na justiça têm que ser o “colesterol bom” e nunca o “colesterol mau”. Por vezes há deslumbramentos do poder com as novas tecnologias que se importa para o corpo da justiça o “colestrol mau”.
O que o levou a recandidatar-se a um próximo mandato? Tudo isto que falámos. Estamos a meio do caminho de um trabalho em áreas fundamentais para a OA, advogados e justiça em geral. Tivemos muito trabalho interno por fazer, isso acabou por determinar que o segundo mandato poderia permitir concluir todo este ciclo. É isso que está em causa neste momento, e interrogar e colocar nas mãos dos advogados a possibilidade de permitirem ou não que se finalize um trabalho que se começou, mas que precisa de mais tempo.
Como avalia credibilidade da justiça? Não temos nenhum estudo sobre a percepção do cidadão relativamente à justiça. Eu, o antigo presidente do Supremo Tribunal de Justiça e a antiga Procuradora Geral da República estávamos a preparar esse estudo, mas infelizmente não foi concluído por cessação de funções destas duas personalidades. No entanto é um trabalho que tem de ser retomado, sendo esta uma questão central. Contudo, na minha opinião julgo que existe uma confiança na justiça e que as pessoas a procuram porque ainda confiam nela. Muitas vezes vê-se o lado da justiça mais negativo, por aquilo que passa nos media e depois não existe o contraponto, e a justiça ainda não encontrou um mecanismo de informação no sentido contrário. Também sucede que quando um juiz numa sala de audiência é arrogante, não trata com urbanidade os intervenientes – o que ainda sucede - a imagem da justiça fica diminuída. Também sucederá se um advogado tiver um comportamento contra princípios éticos.
Quais os grandes temas que defende para um próximo mandato? Alterar o estatuto da OA e desburocratizar os seus serviços, caminhar para o equilíbrio entre as duas supra referidas sustentabilidades que a CPAS deve assegurar, intensificar a capacidade no âmbito de política legislativa, encontrar um novo olhar sobre o acesso à profissão e formação de estagiários, alterando profundamente o seu regulamento, discutir e desenvolver a distribuição das receitas da ordem relativamente a todos os seus órgãos, a afirmação da advocacia no âmbito da justiça, que passa por alterar a tabela de honorários do apoio judiciário, a redução das custas judiciais, densificar as prerrogativas dos advogados e facilitar o seu quotidiano profissional, e intensificar a campanha relativa ao prestigio e acção da advocacia, o que também passa por termos órgãos disciplinares com decisões muito mais rápidas. Por último, sem nunca ceder a populismos e demagogias, ter o Bastonário uma maior intervenção no espaço público em nome dos Advogados e na defesa dos direitos fundamentais. l
“A O A T E M U M C A M I N H O L O N G O A I N D A A PERCORRER, JÁ COM AS QUESTÕES INTERNAS FIX ADAS. EXISTE UM TR ABALHO ENORME QUE P R E C I S A S E R F E I T O D O P O N T O D E V I S TA D E C O N T I N U I D A D E .”
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OPINIÃO
FRANCISCO DE MENDIA, ADMINISTRADOR DA CV&A
DEIXEM QUE VOS DIGA
Q
ue a CV&A está cada vez mais na liderança. Este ano o accionista maioritário decidiu aceitar escrever, mensalmente, no Meios & Publicidade. Por essa razão, quando a redacção daquele jornal nos pediu os dados para eleger os nomeados para os prémios informámos que não estávamos disponíveis. Não nos pareceu bem concorrer a um prémio sendo o nosso presidente colunista no meio que o atribui. Maneiras de ser, mais do que maneiras de estar. E é esta a liderança que importa. Quanto a números não se fala. Apenas temos uma empresa. Não temos outras com as quais cruzar facturações. Não temos outras às quais atribuir clientes que são conflituantes com os nossos. Preferimos assim. Quanto a números vamos no terceiro ano consecutivo em que estamos onde sempre quisemos: entre as três primeiras agências/consultoras portuguesas. E, peço, não acreditem em nós. Consultem as contas das empresas que cumprem a lei e as depositam e poderão constatar a evolução dos últimos três anos. Nuns casos somos os terceiros classificados, outras vezes ficamos em segundo lugar e em outras ainda em primeiro.
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Este ano recrutámos três pessoas seniores e perdemos dois colaboradores. Até final de 2019 contamos ter o quadro fixado em 31 trabalhadores, objectivo que estava definido, a par de um crescimento do volume de negócio em cerca de 20%, com equivalente crescimento do EBITDA. Os negócios internacionais – mercado Europeu – continuam a ser o nosso forte. A nível nacional o conflito de interesses existente dada a pequena dimensão do mercado tem-nos impedido de “ir a jogo” em muitos projectos. Uma vez mais liderámos a área financeira. Como coroa de glória, depois de termos estado com o Fundo Elliot na OPA à EDP, assessorámos o primeiro IPO de Moçambique. A Hidro-Eléctrica de Cahora Bassa confiou-nos a comunicação e o trabalho de ‘investor relations’. Em breve haverá mais para contar. No desporto continuámos a merecer a confiança da UEFA. Desde 2004 que a CV&A é a agência escolhida pela UEFA para as suas actividades em Portugal. No Brasil continuamos com uma actividade intensa
e a nossa presença em Espanha e na Colômbia continua ao seu melhor nível. Em 2019 voltaram as actividades políticas, ou melhor, eleitorais. Estamos envolvidos em diversas campanhas e as nossas equipas dão cartas em três continentes. Esperamos por 2020 para poder continuar a marcar a agenda na política, na promoção de Portugal no estrangeiro, na preparação das eleições autárquicas de 2021, na dinamização das nossas actividades noutras geografias, na promoção das melhores condições de trabalho aos nossos colaboradores e na participação na vida em sociedade através dos actos de mecenato em que somos uma empresa do sector de comunicação com uma marca relevante. Deixem que vos diga que sabe bem trabalhar na CV&A. l
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É um dia maravilhoso quando salvamos um recém-nascido
para todas as crianças
Priscilla, 7 dias de vida
A pequena Priscilla não teria sobrevivido ao parto sem o recurso a uma cesariana. Como a sua família vive numa aldeia remota do Peru, a sua mãe, Celia, teve de permanecer na "Casa das Mães", para ficar perto da única clínica local e beneficiar de acompanhamento regular de saúde para si e para os seus bebés.
Saiba como ajudar outros recém-nascidos como a Priscilla em www.unicef.pt 84