E STA D O D E M I N A S
36
●
D O M I N G O ,
2 6
D E
N O V E M B R O
D E
2 0 0 6
37
ESPORTES
CAMPEONATO
BRASILEIRO
SÉRIE B
PAULO FILGUEIRAS/EM
COM O OBJETIVO DE VOLTAR À ELITE DO FUTEBOL BRASILEIRO ALCANÇADO, CLUBE VOLTA-SE AGORA PARA AS ELEIÇÕES, CONTRATAÇÕES E RENOVAÇÕES
Autor do primeiro gol, Danilinho reconhece que o adversário teve qualidades e o resultado ficou de bom tamanho
PAULO GALVÃO Com o campeonato encerrado, as atenções agora se voltam para a sucessão presidencial no Atlético. Ontem, o diretor de futebol Ziza Valadares admitiu disputar a eleição pela chapa da situação, devendo anunciar oficialmente a candidatura, terça-feira. Para viabilizar financeiramente o clube, a diretoria acertou um convênio com a Cemig. Assim, a partir da próxima conta de luz, o torcedor poderá doar R$ 5, R$ 10, R$ 20 ou R$ 30 por mês, que serão repassados ao clube depois de descontados os gastos da empresa energética. Assim, a diretoria espera ter condições de não só cumprir os compromissos já assumidos, como também contratar reforços. Muitos nomes estão sendo cogitados, mas a definição só deverá sair depois que for decidido quem será o treinador. Há interesse na permanência de Levir Culpi, mas pode haver dificuldade de acerto financeiro. O certo é que os jogadores cujos contratos não se encerram em 31 de dezembro e os que forem contratados se reapresentam em 3 de janeiro. A partir de então, será feita a pré-temporada, que vai durar até o dia 21, quando o Galo fará a estréia no Campeonato Mineiro, contra o Villa Nova, no Mineirão. Quanto ao jogo de ontem, o empate por 2 a 2 com o América-RN interrompeu a série de 12 vitórias seguidas do Atlético no Mineirão. Mas nem por isso os jogadores consideraram o resultado ruim. Afinal, o time já havia alcançado o objetivo de subir para a Primeira Divisão e conquistado o título da Série B do Campeonato Brasileiro, e o clima de festa esteve presente a semana inteira na Cidade do Galo, Para os atletas alvinegros, o objetivo era se despedir da temporada 2006 com uma vitória, mas a igualdade acabou sendo justa. “Buscamos o tempo todo os gols, mas não con-
seguimos marcar mais. Já o América-RN teve méritos para chegar ao empate e está de parabéns por ter subido também”, afirmou o zagueiro Lima, que voltou ao time no jogo de ontem depois de cumprir suspensão diante do Ceará. Segundo ele, o importante é que o Galo manteve a invencibilidade em casa. A última vez que a torcida deixou o Mineirão amargando uma derrota foi há mais de seis meses – perdeu para o Ituano por 2 a 1, em 19 de maio. Desde então, foram três empates e 12 vitórias. O armador Danilinho concorda com o companheiro. “Abrimos 2 a 0 e poderíamos ter segurado, mas não conseguimos. É preciso reconhecer também que o adversário teve qualidade para buscar o empate, lutou muito e se superou. Então, acho que ficou de bom tamanho para todo mundo. Agora é comemorar e depois descansar bastante para voltar bem para 2007”, declarou.
NAS RUAS Bares lotados, torcedores eufóricos e muita desordem na comemoração dos torcedores, depois do jogo no Mineirão. Na Praça Sete, vários rojões estouraram próximo ao monumento do Pirulito o que obrigou a Polícia Militar a intervir. A multidão que se aglomerou nos canteiros centrais da Avenida Afonso Pena foi direcionada, pela PM, para o quarteirão fechado da Rua Rio de Janeiro. Na Savassi, região Centro-Sul, além dos belo-horizontinos, um grupo de torcedores do interior se reuniu.
O Paulista de Jundiaí até que fez, ontem, sua parte, vencendo o Brasiliense fora de casa por 4 a 3, pela última rodada da Série B do Campeonato Brasileiro. Mas o resultado foi insuficiente para levar o time à Série A, uma vez que a última vaga ficou com o América-RN, que arrancou o empate por 2 a 2 com o campeão Atlético. Sport e Náutico, como o Galo, já haviam garantido o acesso anteriormente. Os paulistas precisavam vencer e contar com derrota do América, pois no caso de empate em número de pontos, como aconteceu, a equipe potiguar se classificaria por ter maior número de vitórias na competição. Emoção mesmo teve o torcedor da Portuguesa, que sofreu até os 44min do segundo tempo, quando um gol de pênalti, marcado por Alex Alves, impediu a derrocada da equipe. Com o triunfo por 3 a 2 sobre o vice-campeão Sport, em plena Ilha do Retiro, a Lusa escapou da degola para a Terceira Divisão. Por sua vez, o Guarani, único time do interior que já foi campeão brasileiro, em 1978, foi rebaixado à Série C, apesar de ter goleado, em Anápolis, o Vila Nova por 5 a 1. O resultado também levou a equipe goiana, que entrara na rodada fora da zona de rebaixamento, ao descenso. O Guarani terminou a competição com o mesmo número de pontos de Paysandu e CRB, mas ficou atrás na classificação por contar com uma vitória a menos e pagou caro por ter sido punido pela Fifa, no início do campeonato, perdendo três pontos. O Paysandu venceu o Marília, por 4 a 1, mas também foi rebaixado por ter menos saldo de gols que o CRB, que escapou da degola graças à vitória sobre Remo por 2 a 1. Guarani, Paysandu e Vila Nova se juntaram ao São Raimundo, que já havia caído para a Série C desde a rodada anterior. Outros resultados de ontem: Ituano 4x1 Ceará, Coritiba 4x2 Avaí, Santo André 1x1 Náutico e São Raimundo 2x0 Gama.
H
R O
S E T N O Z I
RICARDO FERNANDES/DIÁRIO DE PERNAMBUCO
Com um gol aos 44min do segundo tempo, a Portuguesa vence o Sport e comemora
LILIAN MONTEIRO O torcedor só queria festejar. No pódio, os jogadores com medalha e faixa no peito e o capitão Marcos erguendo a taça de campeão foram ovacionados. Beijavam os símbolos da conquista e batiam no peito, em sinal de paixão e respeito ao Galo na volta olímpica. Mais de 75 mil alvinegros faziam ecoar em cada canto do estádio o grito: "É campeão, é campeão". A comemoração foi embalada pelo "segundo hino", a música Vou festejar, da cantora Beth Carvalho, adotada pelos atleticanos desde o fim da década de 1970. Convidada especial da festa, ela cantou seus principais sucessos e sacudiu o Mineirão depois do jogo, acompanhada pelo coro de milhares de vozes. Ao erguer o Galo de Prata que recebeu do clube, agradeceu o carinho da torcida com o grito: "É campeão, Galôôôô". Os portões do Mineirão abriram às 13h30 e o atleticano chegou com antecedência, para não perder um minuto sequer da festa. Veio de todos os lugares de Minas Gerais e do Brasil. Quem não conseguiu ingresso não pôde ficar longe. Ouvia a partida pelo rádio, nos bares em volta e curtia o som que vinha de dentro do Mineirão. O cantor
Wilson Sideral e sua banda deram o pontapé inicial da festa. O ator Daniel de Oliveira, que interpretou Cazuza no cinema, também deu uma canja, ao lado da namorada, a atriz Vanessa Diácomo. O delírio aumentou com a chegada, no helicóptero da Polícia Civil, da cantora Beth Carvalho. Às 14h45, ela surgiu no centro do gramado, vestida com a camisa do Atlético, que trazia seu nome grafado. Foi saudada com aplausos e se emocionou. E olha que o show dela seria só às 19h, depois do jogo. Nas arquibancadas, a torcida cantava o hino do clube. Com toda força, do fundo do coração, o bordão "é campeão" fazia muitos atleticanos chorarem de felicidade. Do lado do gol da cidade, a camisa 12 foi içada com o nome da massa, para entrar para a história. O momento foi de arrepiar. Nenhum outro jogador vestirá o uniforme de nº 12. Ontem, o goleiro Édson teve esse privilégio pela última vez. Às 16h, com um foguetório ensurdecedor, 2 mil balões pretos e brancos, fumaça alvinegra e chuva de papel picado, os jogadores entraram em campo como verdadeiros heróis. Pena que não puderam encerrar a campanha com a 13ª vitória no Mineirão. Era tudo o que queriam os torcedores.
SAGRADA TORCIDA DÉA JANUZZI
Fervor preto-e-branco MARCOS MICHELIN/EM
No Independência, 6 mil atleticanos comemoram título, com fé e raça
Música empolga a massa
Torcedores não medem sacrifício para festejar primeiro título nacional, desde 1971
DANIEL CAMARGOS O nó no peito atleticano se transformou em um grito de alívio, entoado por toda a nação alvinegra e teve um coro afinado no Estádio Independência. Regidos por um telão instalado acima do vestiário, os mais de 6 mil torcedores expulsaram o ranço da Segunda Divisão. Nem o gol de empate do América-RN abafou o fervor, que se prolongou com o show da cantora Carla Visi e a repetição incessante do hino do Galo. Antônio do Nascimento, de 74 anos, chegou três horas antes do início da partida e assistiu ao jogo da equipe de júniores do Atlético contra o Democrata de Sete Lagoas, que terminou empatado por 3 a 3. Atleticano desde o tempo em que a escalação do time começava com Kafunga, o aposentado emenda: “A primeira vez que fui ao campo foi contra o Cruzeiro, no antigo estádio do Barro Preto. Ganhamos de 1 a 0”, lembra, com orgulho. Pai de cinco filhos atleticanos, ele está em paz com o retorno à Primeira Divisão. “Eu senti uma tristeza mortal quando o Galo caiu. Nosso lugar é na elite”. Segundo ele, o remédio para a dor da queda e pela volta à Série A é o mesmo: rezar. Apesar de professarem a mesma religião – o atleticanismo –, as jovens Aline Lopes, Izabela Cristina e Jéssica Araújo só faziam dançar. Vestidas com o mínimo de roupa que o pudor permite, elas rebolavam a cada acorde saído das caixas de som. Aline, a mais velha, com 20 anos, lamentou não ter comprado ingresso para assistir ao jogo no Mineirão, mesmo passando a noite na fila. Já Izabela e Jéssica, ambas de 15 anos, não escondiam que estavam mais interessadas no show de axé. A fé no Atlético também estava estampada na alegria dos garotos Alessandro Bispo, de 9 anos, e Bruno Willian, de 12, que pintaram o rosto de com tinta guache preta e branca. As mesmas cores que embalavam a garrafa de cachaça “Atleticana”, exibida pelo comerciante Cristóvão de Assis. “É para a turma tomar lá no bar”. Copo de cerveja na mão, Leandro Silva, o “Zezé Bola Preta”, desfilava sua toalha com o escudo do Atlético presa à cintura, com se acabasse de sair do banho, aos gritos de Galôôô.
INDEPENDÊNCIA
S O V O N
Lusa escapa no finalzinho
MINEIRÃO
AUREMAR DE CASTRO/EM
2006
GALO CAMPEÃO A VOLTA POR CIMA
PAULO FILGUEIRAS/EM
Beth Carvalho empolgou o Mineirão, mas também se encantou com a torcida alvinegra
Ele acordou cedo, vestiu a camisa preta-e-branca, almoçou às 10h da manhã, para pegar um lugar melhor na geral e ver o time da sua devoção dar adeus à Segunda Divisão. Pela primeira vez, em seus 64 anos de vida, Pércio Trezinari Luizi assistiria ao jogo da geral, porque não encontrou mais ingresso para a arquibancada. Jamais, por nada deste mundo, ele deixaria de ir ao Mineirão, pois aprendeu a amar a Deus e ao Clube Atlético Mineiro sobre todas as coisas. Para Pércio, ser atleticano é mais do que uma religião. É um sentimento de fé, de bem-aventurança, de transcendência, que ele compartilha com a torcida mais fiel do mundo. Na alegria e na tristeza, o Atlético pode contar com o torcedor, até que a morte os separem. Pércio sofreu tanto com o rebaixamento, que fez um juramento: “Vou assistir a todos os jogos do Galo de perto. Tratou, então, de fazer uma camisa para todos, com os seguintes dizeres na frente: “Sou Galo na 2ª!” E atrás: “Na 3ª, na 4ª, na 5ª, na 6ª, no sábado e no domingo”. Ontem, ele reafirmou seus votos perpétuos: “Clube Atlético Mineiro uma vez até morrer”. Com atleticano é assim. Faça sol ou chuva, caia raio ou relâmpago, Mário Augusto Ferreira Costa, de 33 anos, deixa pai, mãe, irmãos, mulher, filha e vai assistir o Galo jogar. Na derrota ou na vitória, com o estômago vazio, porque o Galo sacia a sua fome, mata a sua sede. “O mundo todo está ali no Mineirão. Eu esqueço os problemas, as angústias, a dor, não penso em nada nem em ninguém”. O amor pelo Atlético não tem fronteiras, é escancarado, como o do engenheiro Marcos José Mendes Teixeira, de 56 anos, que mora no Rio de Janeiro, mas não ia perder o jogo de ontem. Pediu a um amigo que se virasse para comprar ingresso, fizesse milagre, comesse o pão que o diabo amassou. Às 8h de ontem, tomou o avião em direção a BH, já vestido com a camisa preta e branca. Entrou no avião, quando ouviu um comentário a bordo: “Essa camisa é do Botafogo ou do Atlético?” Marcos esqueceu a idade, o posto, a pose, a compostura e gritou: “É Galôôô!”, com a voz a uma altura de 36 mil pés. Coisa que os atleticanos não professam é a ingratidão. Por isso, é preciso falar em Roberto Drummond, o maior cronista que o Atlético já teve, que torceu contra o vento. É preciso confessar que o Atlético para mim tem um outro nome – Guaracy Januzzi, Guará, o Perigo Louro, um dos maiores artilheiros de todos os tempos, responsável pelo título de campeão dos campeões, em 1937 – e meu pai. Todas as vezes que a torcida canta “nós somos campeões dos campeões, o nosso time é imortal”, sinto minha alma subir aos céus, afinal, os ídolos não morrem.