fotos samuel silveira lima uma iniciativa lab ssj
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Copyright © 2007 by LAB SSJ
Concepção / Idealização
Alexandre Santille e Conrado Schlochauer
direção
Bob Wollheim
redação Danielle Barg
fotos
Samuel Silveira Lima
Design e Direção de Arte Daniel Stanczyk
revisão Sheila Kurc
ISBN 978-85-87911-08-7
Edição e Produção
Nova Bandeira – Produções Editoriais Rua Turiaçu, 390 cj. 115 - São Paulo Fone: 3677-3388 novabandeira@novabandeira.com
Digitalização e tratamento de imagens Oesp Biro
Impressão e Acabamento CLY
Printed in Brasil
fotos samuel silveira lima uma iniciativa lab ssj
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a razĂŁo
ele ri de si mesmo
ritmo de mudança
O corpo como instrumento
mĂşsica por todos os lados
eu digo com os olhos
quem faz o lab ssj
a razão Este livro pretende mostrar por meio de fotos e breves histórias de vida, um pouco daquilo que acreditamos quando falamos de educação. Essa área tem sido a nossa vida desde 1992, ano que nos formamos em Administração de Empresas, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP). A educação de adultos, ou Andragogia, é uma ciência ainda pouco explorada no ambiente corporativo. No nosso País, o número de cursos voltados ao estudo profundo desse assunto é extremamente pequeno, embora a demanda por novas formas de orientar adultos a aprender seja crescente nas organizações.
Neste contexto, nossa “formação” se deu por meio de muito autodidatismo e experiência prática. Foram mais de 130 mil participantes em cursos abertos até 2001 e mais de 10 mil treinamentos para empresas. Entre as coisas que aprendemos, uma foi fundamental: sem prazer e profundidade não é possível criar um bom programa de educação para adultos, principalmente no meio organizacional. 8
A começar pela profundidade. De maneira geral, a velocidade e o excesso de informações, associados a uma extensa carga de trabalho, fazem com que o profissional não tenha o hábito de se aprofundar nos assuntos. Simplesmente, o tempo é curto demais para isso. Por esse motivo, ao longo dos treinamentos aproveitamos para construir – em conjunto com cada participante – uma base de pensamentos, atitudes e conhecimentos técnicos extremamente sólidos que sejam capazes de auxiliar na correria do dia-a-dia.
O prazer, por sua vez, funciona como principal catalisador ou “abridor” de mentes. Na maioria dos casos, o participante não está na sala por vontade própria. Ele foi indicado pelo chefe ou pela empresa para integrar-se ao programa. E são raros os casos que a carga de trabalho é diminuída para que o participante possa estar presente integralmente em sala de aula sem ser interrompido no celular a cada meia hora, ou mesmo sem ter medo de abrir sua caixa de e-mails ao voltar ao trabalho. Sendo assim, o prazer tem sido o grande atrativo para garantir 9
participação e, conseqüentemente, o aprendizado. O prazer pode ser obtido de diversas formas: desafio intelectual, ludicidade, competição, humor, entre outros. Mas, na maioria das vezes é a combinação ou o uso alternado dessas ferramentas que faz com que a pessoa sinta vontade de mergulhar na aprendizagem.
Neste livro, resgatamos a trajetória de cinco mestres que desde o início nos auxiliaram a sermos inovadores nessa abordagem. Todos eles trabalham com arte e educação: um palhaço, um percussionista corporal, um maestro e dois professores de dança de salão. Felizmente, sempre buscamos – e encontramos – professores que são destaque em sua área de atuação. Assim como o LAB SSJ, estes artistas continuam em constante aprimoramento profissional por meio do binômio profundidade e prazer.
O êxito dos nossos treinamentos somente se torna possível a partir do talento destes artistas. Por meio deles, conseguimos fazer com que o participante seja o protagonista do seu desenvolvi10
mento, e não simplesmente um aluno. E por esses motivos, até mesmo a seleção da pessoa que tiraria as fotos para este livro também se deu de forma pouco convencional – procuramos alguém que tivesse a capacidade de olhar cada um destes artistas de uma maneira nova, espontânea e quase ingênua.
A profundidade e o prazer, na verdade, são os pontos que ligam estas interessantes histórias e que permearam todas as escolhas feitas neste livro, das fontes às fotos. Acima de tudo, este livro trata de pessoas e da forma como lidam com o “apre(e)nder”, que é a verdadeira essência do nosso trabalho.
Esperamos que vocês gostem. Conrado Schlochauer e Alexandre Santille 11
ele RI DE
SI MESMO
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ELE FOI À FRANÇA PARA SE APROFUNDAR NA ARTE DO CLOWN, ATUOU EM CAMPOS DE REFUGIADOS E, A PARTIR DE UM PROFUNDO CONTATO COM O SER HUMANO, PASSOU A ENXERGAR AS PESSOAS DE OUTRA FORMA. COM BASE NESTES APRENDIZADOS, HOJE ATUA COMO “CLOWN-ARTISTA” E COMO “CLOWN-PROFESSOR”, LEVANDO PARTICIPANTES A EXPERIMENTAREM A LINGUAGEM DO PALHAÇO. MARCIO BALLAS É DO TIPO QUE TEM HISTÓRIA PRA CONTAR, COMO MOSTRA O CAPÍTULO A SEGUIR. AS FOTOS FORAM TIRADAS EM UMA AULA MINISTRADA POR ELE, REALIZADA NO GALPÃO DO CIRCO, EM SÃO PAULO, NA QUAL ENSINA TÉCNICAS DE CLOWN PARA UM GRUPO DE ATORES INICIANTES.
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Quando Marcio Ballas decidiu estudar a arte do clown – o palhaço que atua em teatro – tinha muitas dúvidas e apenas uma certeza: a de que gostaria de trabalhar a relação entre as pessoas. Ainda criança, embora fosse muito tímido, já demonstrava sinais da habilidade em lidar com os amigos e sempre foi o mais engraçado da ”turma do fundão”. Aprendeu sozinho a lutar contra a timidez e volta e meia via-se envolvido em projetos teatrais amadores.
Nascido em uma família de classe média, aos 17 anos se deparou com a grande responsabilidade de ter que trabalhar para contribuir com a renda familiar, logo após a morte precoce do pai em um acidente. Sua família era agora a mãe e o irmão mais velho, que prontamente assumiu o pequeno negócio herdado pelo pai, uma papelaria. Sem muita certeza sobre a carreira profissional, matriculou-se no curso de Propaganda e Marketing da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPMSP) e tomou a frente das vendas da loja, auxiliando o irmão. Com o tempo, os dois reestruturaram a papelaria e Ballas passou a ganhar um salário acima da média dos seus colegas de classe, que a essa altura eram ainda estagiários. Em paralelo aos estudos e à loja, fazia teatro na própria faculdade.
Mas o que aparentemente parecia confortável e concreto mudou de figura quando ele viu um pequeno anúncio no jornal sobre um curso de clown. Se interessou, fez e se encantou: “Foi um curso relativamente curto, mas abriu as portas para que eu passasse a me interessar por tudo o que via sobre clown.” Em seguida, conheceu o trabalho dos “Doutores da Alegria”, mas como o grupo só aceitava profissionais, não pôde participar. Encontrou então uma ONG que realizava um trabalho similar e passou a fazer voluntariado em hospitais.
Ao passo que a dedicação pela arte do clown aumentava, a rotina na papelaria ficava mais difícil. Insatisfeito com o trabalho que fazia, propôs ao irmão que ficasse com sua parte na loja, para que pudesse mergulhar de cabeça nos estudos sobre o clown. “Não era simples começar a fazer teatro. Ainda não tinha know-how para poder sobreviver do clown, já estava com 26 anos e me sustentava sozinho. Além disso, viver de arte no Brasil é uma loucura. Foi a maior decisão da minha vida.”
Era o início de um grande impasse, que fez com que Ballas ficasse dois meses pesando prós e contras antes de apostar em algo completamente abstrato. Em busca de referências, resolveu ir para Nova York. Pegou o dinheiro poupado no período em que trabalhou na loja, vendeu o carro e foi bater na porta dos “Doutores” de lá. Chegou a se oferecer para estagiar sem remuneração, mas o grupo não tinha nenhum tipo de programa de estágio ou aula assistida. Fez alguns cursos e, para conseguir dinheiro, animava festas infantis nos bairros afastados de hispânicos e negros de Manhattan. Também vendia sanduíches em prédios comerciais a dois dólares.
Mas ao contrário do que imaginava, NY não oferecia o nível de aprendizagem que buscava. Após se deparar com algumas portas fechadas, uma outra se abriu - Ballas procurou um dos mais conceituados clowns dos Estados Unidos, que o incentivou a ir à Paris para estudar na escola internacional do pedagogo e diretor teatral Jacques Lecoq. “Ele era o mestre e já estava com 78 anos. Eu precisava ir e logo!”, recorda.
Quando ligou para a escola, a rigorosa secretária responsável pelas turmas informou que, se ele quisesse estudar lá, teria que mandar o currículo para seleção e esperar o início do próximo ano letivo. Mas ele tinha pressa. Mandou seu material e fez de tudo para ganhar a confiança da secretária: enviava fax, ligava a cada dois dias, usava a emoção para persuadi-la. “Ela dizia: ‘No way, no way!’, porque a seleção já estava encerrada há três meses, e eu dizia: ‘Por favor, estou rezando aqui’. Fui aceito na escola e isso foi uma grande vitória. Tive aulas fantásticas como máscaras teatrais, mímica, improvisação e análise dos movimentos.” A persistência para entrar na escola foi recompensadora, Ballas integrou a última turma de Lecoq, que veio a falecer três meses depois que ele havia concluído o programa de aulas.
Descobriu então um curso de palhaço em hospital na Bélgica, no qual obteve experiências em institutos psiquiátricos e asilos. “Mais tarde fui entender que aquela era uma nova forma de ver 16
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o mundo. Percebi que era assim que eu queria ser na vida e nas minhas relações”, reforça. Nessa época, uniu-se ao grupo francês “Palhaços sem fronteiras”, especializado em expedições para lugares de guerra. Viajou para diversos países como Albânia, em 1999, e Madagascar, em 2000, levando a alegria para campos de refugiados. “Foi maravilhoso, porque naqueles lugares não acontecia nada a não ser a chegada de mantimentos e cobertores. Muitos pais tinham morrido, outros, desaparecido. A recepção era incrível. Uma vez, na África, uma criança encostou em mim e começou a passar a mão no meu braço. Depois me explicaram que aquilo acontecia porque eles nunca tinham visto brancos. Impressionante, né?”, lembra. 18
Após essas experiências, Ballas sentiu que o seu período de estudo na Europa estava se esgotando e era hora de dar início a uma carreira sólida no Brasil. De volta ao País, estudou Psicodrama na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e montou seu próprio workshop. Entre as mil e uma atividades que realiza atualmente, é um dos criadores do grupo “Jogando no Quintal”, espetáculo de improvisação encenado por um grupo de clowns, no qual é o palhaço “João Grandão”. O “Jogando” começou no quintal de uma casa, para uma platéia de aproximadamente 40 pessoas. Sem grande divulgação, o grupo mudou-se para um espaço maior e hoje chega a receber cerca de 700 pessoas por apresentação.
Na área corporativa, Ballas atua desde 2003 em parceria exclusiva com o LAB SSJ. No início, nem ele mesmo acreditava ter o que ensinar dentro de uma empresa, mas hoje percebe com facilidade o quanto as pessoas aprendem com a figura do palhaço, especialmente, no que diz respeito à aceitação dos próprios erros. “O clown é o contraponto dos outros artistas que estão mais próximos dos deuses: o trapezista que voa pelos ares causando admiração e tensão no público, o acrobata que dá um salto triplo mortal, o malabarista que joga bolinhas pelos ares desafiando a gravidade... já o palhaço é aquele que erra, cai, tenta, mas às vezes não dá certo... e ele aceita isso.” Ballas afirma que o homem é, por natureza, um ser espontâneo e criativo. Por isso, ensina que “brincar é essencial para a saúde” e que às vezes é necessário encarar os problemas com humor, deixando um pouco o racional de lado.
Em suas aulas transmite aos participantes, em princípio, um pouco do que aprendeu sobre o relacionamento humano, a partir do olhar de um clown: ser verdadeiro, viver as relações intensamente, olhar no olho, rir dos próprios erros e questionar sempre. Ballas também ensina o que ele mesmo busca aplicar no seu dia-a-dia - trazer todos esses elementos para a vida real diante de qualquer adversidade - seja dentro de uma empresa, em um espetáculo ou em um país em guerra. 19
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ELE ERA UM BEM-SUCEDIDO GERENTE DE VENDAS. ELA ESTUDAVA PARA SE TORNAR PSICÓLOGA. UNIDOS PELA DANÇA, MARCELO CUNHA E KARINA SABAH PASSARAM POR CIMA DOS OBSTÁCULOS E RESOLVERAM APOSTAR NA PAIXÃO COMO ATIVIDADE PRINCIPAL. COM MUITA DEDICAÇÃO E PERSISTÊNCIA, CHEGARAM AO COMANDO DE UM DOS PRINCIPAIS NÚCLEOS DA DANÇA DE SALÃO DE SÃO PAULO, COM CERCA DE MIL ALUNOS. AS FOTOS DESTE CAPÍTULO MOSTRAM UMA AULA DA FILIAL PAULISTA DA ESCOLA JAIME ARÔXA, NA QUAL SÃO SÓCIOS E PROFESSORES.
ritmo de mu 28
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Com um dom nato para vendas, Marcelo Cunha pegou no batente logo cedo. Aos 14 anos, já ajudava o pai na representação de uma grande marca nacional de malhas e, circulando diariamente com mala e mostruário a tiracolo pela Rua da Alfândega, no Rio de Janeiro, aprendeu a vender seu peixe para árabes e judeus. Depois de muito negociar camisetas, cuecas e pijamas, trabalhar com a exportação de seda pura e como representante de alimentos dietéticos em restaurantes, optou pela faculdade de Administração.
Seguindo as oportunidades que a vida havia lhe oferecido até então, começou a estagiar na área de Vendas de uma importante multinacional. “Eu era muito bom no que fazia, mas meu pai ainda não acreditava que a minha alma estava em vendas”, recorda. Nesta época, ele estava com 25 anos e começou a se interessar por dança de salão. Influenciado por amigos e pela namorada, que freqüentavam bailes aos finais de semana, notou que tinha certo jeito pra coisa. “Eu dançava muito com a minha mãe, e o meu pai era um verdadeiro pé-de-valsa.”
Em busca de uma escola, acabou se lembrando do período em que trabalhava com o pai na representação de malhas. Alguns anos antes, havia feito as primeiras camisetas promocionais do Centro de Dança Jaime Arôxa, hoje uma das mais bem conceituadas escolas de dança de salão do País, sediada no Rio de Janeiro. Começou a freqüentar as aulas e apaixonou-se pela dança. No auge da sua carreira como gerente de marketing, contava os minutos para as seis da tarde, horário que entrava na escola para sair somente após a última aula, às onze da noite.
Com o passar do tempo, o dançarino e dono da escola, Jaime Arôxa, notou em Marcelo especial facilidade para lidar com o público e também muita habilidade com os passos. Seu destino no mundo da dança não poderia ser diferente: em pouco tempo, passou a auxiliar nas aulas, atuando como bolsista da escola, até que veio o convite: “O Jaime chegou e me perguntou o que eu precisava para sair da empresa em que estava. Eu disse que precisava de no mínimo três turmas e ele me deu. Aí virou vício! Eu costumo dizer que a dança escolhe você, não é você que escolhe a dança”, ressalta.
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O desafio estava lançado. Seria possível resistir à tentação de transformar a paixão em fonte de renda? Mas o incentivo da família foi um grande diferencial na decisão. Contrariando o senso comum dos pais que anseiam pelo sucesso de filhos advogados, médicos e executivos, o pai de Marcelo reagiu de maneira inusitada: “Ta aí! Essa sim é a profissão que tem tudo a ver com você – foi o que meu pai disse quando decidi abandonar a empresa e investir na dança de salão”, recorda.
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Dificuldades à parte, Marcelo trabalhou muito, se especializou, ganhou a confiança de Jaime Arôxa e há dez anos abriu em São Paulo uma filial da escola, hoje com mais de mil alunos, em sociedade com a dançarina e professora Karina Sabah, que também ocupa o cargo de sua esposa. Karina já fazia parte do mundo da dança de salão quando conheceu Marcelo. Pisou em uma escola pela primeira vez aos 16 anos – também no Jaime Arôxa, no Rio – e desde então não saiu mais. Ao contrário de Marcelo, Karina sofreu certa pressão em casa. “Quando atingi a idade para entrar na faculdade, meus pais ficavam me perguntando se eu ia deixar de estudar para viver da dança”, ela lembra.
Decidida, persistiu no seu objetivo e hoje ri do preconceito que, segundo ela, atinge os profissionais da dança: “Quando vou abrir um crediário, por exemplo, prefiro me apresentar como empresária, porque se eu falar que sou dançarina vão achar que eu não vou ter dinheiro para pagar!”, conta, com humor. Formou-se psicóloga, mas preferiu aplicar a teoria aprendida na faculdade na forma como lida com os diversos tipos de alunos, ao invés de atuar em consultórios. “A dança não deixa de ser uma terapia, pois interfere no relacionamento entre as pessoas, no contato, nas carências, inseguranças e na aceitação de críticas”, explica a professora.
Somando o lado psicológico da dança à vivência adquirida no universo empresarial, Marcelo e Karina estabeleceram uma parceria com o LAB SSJ em 2002 e conduzem a atividade “Mudança de ritmo”, na qual ensinam a profissionais dos mais diversos níveis hierárquicos passos de salsa, forró e até mesmo samba no pé. Como no mundo corporativo o contato físico soa desnecessário e pessoal demais, a atividade inicialmente desperta reações adversas. “Só o fato de pedir que um participante pegue na mão do outro já é um choque”, comenta Marcelo.
Os passos são na verdade a justificativa utilizada para se trabalhar metáforas de uma rotina empresarial, porque o foco da aula é a pessoa, e não a qualidade do passo. Mais do que coordenação motora e ritmo – dois dos principais elementos que compõem um movimento – a dança propõe uma série de descobertas: aceitar os próprios erros, demonstrar fraquezas, se expor, conduzir e ser conduzido, sugerir e saber aceitar idéias, se adaptar a qualquer tipo de situação. “As pessoas percebem que nem sempre uma mudança é algo ruim. É preciso olhar o mundo com outra visão, de transformação, para crescer e amadurecer”, acrescenta Marcelo.
Ao longo de sua experiência, o casal de professores vem colecionando debriefings interessantes, histórias de superação e de mudança de atitude. “Em uma ocasião, tivemos dois grupos de participantes e, entre eles, havia certa rivalidade. Ao final da aula, estavam todos rindo e se abraçando, e a moça do RH me olhou e disse – Aqueles ali se odiavam!”, lembra o dançarino.
O prazer que a dança e a música proporcionam, mesmo para os mais tímidos, permite que a mensagem transmitida seja infiltrada com mais facilidade. E para compor uma aula que proporcione prazer, os professores se utilizam da paixão pela dança para se manter em constante busca por aprendizados, técnicas e novidades que chegam do mundo inteiro a todo o momento. Para Marcelo, os resultados são notáveis: “Quando você faz algo que realmente gosta, é nítido, seu olho brilha. E as pessoas não conseguem ficar apáticas a isso, porque percebem que você faz aquilo com amor”, conclui. 34
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FERNANDO BARBA SEMPRE SOUBE QUE SEU DESTINO ERA A MÚSICA. QUANDO CRIANÇA, DESCOBRIU AS NOTAS SOZINHO, O QUE DEU INÍCIO A UM INTENSO CAMINHO DE DESCOBERTAS. CRIADOR DO GRUPO BARBATUQUES, ESPECIALIZADO EM PERCUSSÃO CORPORAL, JÁ VIAJOU O MUNDO EM APRESENTAÇÕES E OFICINAS PARA PÚBLICOS DIVERSOS - DE EXECUTIVOS AOS ARTISTAS DO CIRQUE DU SOLEIL. AS FOTOS MOSTRAM UM GRUPO DE ESTUDOS DO BARBATUQUES, QUE UTILIZA O PRÓPRIO CORPO COMO INSTRUMENTO.
umento 39
Na década de 70, despontava na TV a versão brasileira da Vila Sésamo, programa infantil famoso por seu formato lúdico e pedagógico que seduzia pequenos expectadores pelo mundo todo. Foi nessa época que, precocemente, o compositor e multi-instrumentista Fernando Barba começou a demonstrar a curiosidade e a sede de aprendizado que o acompanhou durante toda a sua trajetória profissional. Prestes a completar quatro anos de idade, enchia a mãe de perguntas, tentando descobrir como as letras exibidas no programa infantil formavam as palavras.
Logo após aprender a ler e escrever, descobriu algo que o divertia ainda mais, a música. Embora nascido em uma família sem influências musicais diretas, o gene musical era algo bastante presente. O avô tinha sido um amante da música e o pai, engenheiro, era dono de um ouvido excelente: tirava melodias sem precisar de partituras.
E foi brincando de descobrir as notas que, com seis anos de idade, Barba começou a arranhar um piano, o violão da irmã e um órgão eletrônico comprado pelo pai. “Estava claro que existia um dom para a música, os instrumentos eram meus brinquedos. Eu gostava de batucar, inventar e descobrir novos sons”, lembra.
Percebendo isso, os pais trataram de presentear o filho com aquele que foi o seu principal instrumento por vários anos, uma guitarra. Aprendeu a tocar sozinho, mas aos 12 sentiu a necessidade de se aprofundar mais nos estudos musicais, passando a frequentar aulas de guitarra.
Durante o Ensino Fundamental passava as horas vagas em ensaios com amigos que, igualmente, levavam a sério a paixão pela música. Barba tinha apenas 14 anos, mas já sabia o que queria ser quando se tornasse adulto. “Era um grupo grande de amigos que respirava música o tempo todo. Isso foi muito forte e desde a minha infância estava se formando. Naquele momento, tomei consciência de que era aquilo que eu queria. Foi uma coisa muito rápida, uma percepção que durou um segundo. A partir daí fui me orientando pra isso.”
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Como a relação com a música sempre foi algo inerente à sua natureza, a busca por novos sons e ritmos foi muito além dos diplomas. Barba fez curso no exterior, estudou Música Popular na Universidade de Campinas (Unicamp-SP) e teve excelentes professores que o auxiliaram nesse processo de descoberta. Ainda assim, procurou na simplicidade dos sons cotidianos a tradução para uma nova forma de expressão: surgia aí a sua história com a percussão corporal.
Andando pela rua, na fila de um banco, nos intervalos das aulas da faculdade, junto aos amigos ou em qualquer outra situação corriqueira, o músico reproduzia a melodia que estava em sua mente por meio de batuques no próprio corpo. E assim foi criando um repertório de estalos, palmas e diversos meios de emitir sons usando o corpo como instrumento. “Aquilo era uma maneira pessoal que eu tinha de fazer um som com o corpo, uma forma de a mão traduzir um acompanhamento. Mas isso também estava ligado a outras pessoas, era sempre uma brincadeira”, explica. 45
Os amigos começaram a achar a brincadeira interessante e passaram a pedir para que Barba desse pequenas aulas daquilo que, até então, era encarado apenas como diversão. Era a primeira etapa para que o passatempo virasse coisa séria.
Tendo como referência músicos que já estudavam a percussão corporal, começou a se aprofundar na técnica e a reunir material suficiente para montar uma oficina, que funcionasse como um laboratório. “A idéia da percussão não é minha, vem do tempo das cavernas. Cada cultura tem seus sotaques e tons, em todo o mundo. No começo era uma coisa muito intuitiva, que eu comecei a fazer e as pessoas se envolveram. Aos poucos, desenvolvemos a linguagem, a técnica, os conteúdos.”
Nascia assim o grupo Barbatuques, que deu nome e consistência a tudo o que o percussionista havia construído ao longo de sua carreira musical. Inicialmente eram as oficinas, mas depois o trabalho começou a enveredar para a área artística e os músicos passaram a se apresentar em diversos lugares do País, não demorando muito para avançar para territórios internacionais.
As proporções estruturais também foram aumentando no mesmo passo em que eram descobertas novas aplicações para a percussão corporal tanto no aspecto terapêutico, quanto educacional, físico, artístico e empresarial.
Atualmente o Barbatuques apresenta 14 músicos no palco, que também são “oficineiros” e multiplicadores. O interesse pelas oficinas vem de públicos diversos como ONG´S, portadores de necessidades especiais, grupos de teatro e dança, além, é claro, do LAB SSJ, que leva o workshop à área corporativa.
Com dez anos de estrada, dois CDs gravados e um DVD no forno, o Barbatuques já mostrou seu trabalho em inúmeros eventos importantes no cenário musical. “Hoje as nossas referências aumentaram muito, temos o olho aberto para o mundo”, afirma Barba. 46
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Entre as turnês realizadas na Europa e América Latina, o grupo ganha cada vez mais força e, recentemente, teve a oportunidade de fazer um intercâmbio cultural com artistas tradicionais dos mais variados países, como França, Nova Zelândia e Israel.
Entre as últimas conquistas, Barba comemora a utilização das trilhas sonoras do grupo em três campanhas publicitárias mundiais para a Copa do Mundo de 2006, além do convite para ministrar oficinas ao elenco do Cirque du Soleil, que esteve em temporada no Brasil. “No começo, eu não achava que ia existir grupo. É legal reconhecer que isso foi uma coisa natural que encontrou uma forma de expressão. Não fiquei me forçando a ter uma boa idéia. Foi um resgate pessoal que eu permiti crescer.”
Para atender a públicos tão distintos, o músico procura estimular nas pessoas a capacidade de acessarem o próprio processo de aprendizagem. “Uma pessoa que vê um show nosso ou faz uma oficina entende que ela mesma pode fazer, porque a percussão corporal é acessível. E o que é melhor, ela descobre que pode fazer do jeito dela, entrando em contato com os próprios sons, características, limites e qualidades.”
A partir desse conhecimento sobre as dificuldades pessoais e dos demais, a assimilação com a “vida real” passa a ser automática, segundo Barba: “Alguns exercícios de improvisação trazem a percepção auditiva, sensorial, e, especialmente, noção do todo. É importante aprender a buscar um ritmo comum.”
De um modo geral, a oficina do Barbatuques busca propagar o poder da superação. A superação que motiva o ser humano a enfrentar desde os problemas ingênuos, como aprender a ler e escrever, até os mais complexos, como escolher uma profissão, apostar e persistir em uma idéia, mesmo que esta tenha surgido de uma simples brincadeira. 49
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música por todos os CERCADO PELO MUNDO DA MÚSICA DESDE PEQUENO, O MAESTRO
LUIS GUSTAVO PETRI CONSTRUIU SUA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL COM OS OLHOS BEM ABERTOS PARA AS OPORTUNIDADES. NESTE TEXTO, ELE FALA SOBRE AS REFERÊNCIAS QUE TEVE DENTRO DA PRÓPRIA CASA, AS ESCOLHAS E EXPERIÊNCIAS QUE O LEVARAM A SER CONSIDERADO UM DOS MAIS TALENTOSOS MAESTROS BRASILEIROS DA ATUALIDADE. AS FOTOS FORAM CAPTURADAS DURANTE ENSAIO ABERTO DA ORQUESTRA SINFÔNICA DE SANTOS, EM EVENTO DO PROJETO “DÓ-RÉ-MI”. A INICIATIVA APROXIMA CRIANÇAS DA REGIÃO À MÚSICA CLÁSSICA, À ORQUESTRA E A SEUS INSTRUMENTOS. 54
lados
Era um almoço típico de família italiana: mesa abarrotada de gente e de comida, muito falatório, crianças correndo pra lá e pra cá. Mas um detalhe em especial chamava a atenção de Moema, que há poucas semanas havia começado a namorar Luis Gustavo Petri, regente titular da Orquestra Sinfônica de Santos. Na ponta da mesa, o pai de Luis Gustavo desmanchava-se em lágrimas. A família, sem expressar espanto, continuava a refeição como se nada estivesse acontecendo, uma vez que aquele era um fato corriqueiro, logo explicado pelo regente à nova namorada. A trilha sonora que embalava o almoço era uma das óperas preferidas do seu pai, fervoroso apreciador de música.
Este é apenas um capítulo entre as inúmeras histórias do maestro, que bem antes de nascer já estava destinado ao mundo da música. “O meu pai consumia música ‘25’ horas por dia e, sempre que ouvia essa sinfonia, chorava. Mas não era de tristeza, era de emoção”, explica. Filho de um químico apaixonado por música e de uma meteorologista que preferiu cantar profissionalmente em corais a seguir estudando as oscilações climáticas, o regente pôde perceber, desde muito cedo, que não havia nascido em uma família das mais tradicionais.
O casal se conheceu em um coral e a mãe, que já atuava profissionalmente na área musical, cantou até uma semana antes de Luis Gustavo nascer. Enquanto os filhos ainda eram crianças, viu-se obrigada a parar de cantar, mas bastou os filhos crescerem um pouco para que prestasse um concurso no Theatro Municipal de São Paulo, onde atua até hoje em concertos. Em função dessa ligação dos pais com a música, Petri cresceu em um lar visitado por grandes personalidades musicais, maestros e cantores. E foi essa ligação que também permitiu maior acesso a um mundo que poucas pessoas conhecem ainda na infância. “Sempre fui rodeado de música, por todos os lados. Lembro da primeira vez que meu pai me levou ao Theatro Municipal para assistir a um concerto. Fiquei maravilhado com o tamanho e o luxo”, recorda. 57
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Com sete anos de idade, Luis Gustavo começou efetivamente a receber influências diretas e deu início ao aprendizado musical. A mãe passou a lhe explicar sobre as notas, porém, mais como uma brincadeira do que como algo metódico. Nessa época, a família mudou-se para Santos e o destino se responsabilizou por mais um encontro do maestro com a música. Sua nova vizinha era uma pianista, que havia abandonado a carreira artística por causa da família. Ela tocava diariamente um piano de calda que mantinha em casa, o que rapidamente despertou a atenção de Petri. “Ela passou a me dar aulas particulares de graça, porque gostava de mim e do meu interesse”, conta.
A vontade de aprender era tanta, que Luis Gustavo passou a buscar outras fontes de informação ainda muito cedo. A descoberta sobre o gosto pela regência aconteceu quando ele tinha apenas dez anos. Revirando um dos quase dois mil volumes que o pai mantinha em sua biblioteca particular, encontrou as partituras das nove sinfonias de Beethoven. Com a curiosidade típica de uma criança, começou imediatamente a analisar as notas. Questionou o pai sobre algumas coisas, pesquisou várias outras, até conseguir destrinchar, de maneira autodidata, os mistérios da música clássica. Como em Santos não existiam grandes conservatórios para que pudesse estudar, aprendeu a manter-se atento aos mínimos detalhes que a atmosfera musical presente em sua casa lhe proporcionavam.
Na adolescência, mudou-se com a família para São Paulo, e, ao contrário do que parecia óbvio, na hora de optar por um curso universitário, prestou vestibular para Física na Universidade de São Paulo (USP), pois tinha interesse em Matemática e Astronomia. Mas não demorou muito para que 60
encontrasse amigos músicos na própria faculdade, formando uma banda de rock na qual tocava piano e teclado. Com a “Banda de Choque” passou a receber propostas de trabalho, ganhar festivais e abrir shows de grupos do gênero na década de 80 – o que só veio reafirmar a vontade de unir a paixão à profissão. Nessa época, a música já era mais que lazer, e, após dois anos de Física, passou para o curso de Música na mesma universidade.
A banda se desintegrou depois de cinco anos de parceria, mas a carreira musical de Petri estava apenas começando. “Talvez se eu tivesse começado a trabalhar com música antes, teria abandonado a Física”, afirma o maestro, lembrando dos mitos e rótulos que dificultam a vida das pessoas que optam pela música como profissão: “Para muita gente, quando você gosta do que faz, você não está trabalhando. Mas um músico tem os mesmos problemas que todo mundo tem, de dinheiro, de conseguir emprego”, observa.
A faculdade era então o pano de fundo para algo que já estava se consolidando. Nesta época, o regente começou a receber várias propostas significantes, tanto financeiramente como para a projeção do seu trabalho. Entre inúmeros cursos e viagens para aperfeiçoamento, Luis Gustavo estudou regência com um conceituado maestro, que logo o convidou para ser seu assistente na Orquestra Experimental de Repertório do Theatro Municipal de São Paulo . “Neste período, tive contato com o dia-a-dia de um regente e aprendi o que funcionava e até mesmo o que não funcionava. Comecei a freqüentar o maior número de ensaios possível dentro do teatro com os mais diversos regentes que passaram por lá”, lembra. 61
Com muito esforço e dedicação, o maestro chegou à regência da Orquestra Sinfônica de Santos e obteve vários prêmios, tanto como diretor musical quanto como compositor. Em paralelo ao trabalho que desenvolve na área musical, Petri atua nos treinamentos do LAB SSJ, nos quais faz interessantes analogias do mundo empresarial com as histórias que vivencia na música.
A atividade mostra o trabalho do regente e da orquestra, o que, em princípio, parece contestável. “A surpresa acontece quando me apresento como maestro: há certa dúvida sobre a relevância disso para a carreira. Mas a atividade permite entender que fazer parte de uma equipe, seja como membro, seja como líder, pode e deve ser ao mesmo tempo eficiente e prazeroso e, quanto mais destes dois aspectos são conquistados, mais o resultado do trabalho é gratificante”, ressalta. E é mostrando que uma organização não é diferente de uma orquestra na necessidade de integração e de suporte mútuo, que o regente conduz, fora dos palcos, a busca pela sincronia ideal nos desafios profissionais.
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SAMUEL SILVEIRA DESCOBRIU AOS 15 ANOS UM INTERESSE ESPECIAL PELA FOTOGRAFIA E PASSOU A OLHAR DE OUTRA FORMA COISAS QUE, PARA ELE, ERAM BANAIS. A PARTIR DESSE OLHAR, VISITOU OS CINCO MESTRES PRESENTES NESTE LIVRO EM BUSCA DE ÂNGULOS E PERSPECTIVAS QUE TRADUZISSEM A MANEIRA DO LAB SSJ DE EDUCAR ADULTOS. O TEXTO A SEGUIR FALA SOBRE A RELAÇÃO DELE COM A FOTOGRAFIA, QUE EXPLICAM O PORQUÊ DE TER SIDO A PESSOA ESCOLHIDA PARA REGISTRAR ESTES MOMENTOS. NAS FOTOS, SAMUEL REGISTRA UMA AULA RECREATIVA DE MÚSICA PARA CRIANÇAS DE UMA ESCOLA ESTADUAL LOCALIZADA NO BAIRRO DE SANTO AMARO, EM SÃO PAULO.
eu digo com os
olhos
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Ao contrário do que parece evidente, este livro não surgiu da idéia de falar sobre a maneira que se trabalha a educação de adultos no LAB SSJ. De fato, essa é a alma desse projeto, mas sua concepção ocorreu principalmente a partir da sensibilidade fotográfica ainda não lapidada, porém notória, de Samuel Silveira Lima, fotógrafo amador e autor das fotos que ilustram este livro.
Em 2005, Bob Wollheim, parceiro do LAB SSJ e sócio em várias frentes, descobriu Samuel em uma exposição do Fotosite, empresa especializada em soluções de fotografia e imagem da qual é diretor. Com 15 anos na época, o fotógrafo amador era um dos participantes de um projeto chamado “Olho Mágico”, promovido em parceria com a Prefeitura de São Paulo e conduzido pelo fotógrafo Davilym Dourado. Esta iniciativa levava técnicas de fotografia a alunos de diversas escolas municipais e o resultado de alguns dos trabalhos foi exibido nessa exposição. “Achei interessante trabalharmos com uma pessoa que estava vivenciando um processo educacional, que é o core business do LAB SSJ. O Samuel é um exemplo de talento em estado bruto que está esperando para ser descoberto”, observa Bob. 68
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Extremamente tímido e aparentando menos idade do que tem, Samuel nasceu e foi criado no bairro paulista Jardim Sapopemba, gosta de jogar futebol e tem os pais como referência de vida. Antes de participar do projeto Olho Mágico, não tinha noção alguma de fotografia. “A fotografia pra mim significa parar para refletir em determinadas coisas que parecem insignificantes, mas que, quando pensamos, descobrimos que aquilo tem uma história. Depois que comecei a ter aulas, aprendi a olhar de outra maneira coisas que eu via todos os dias”, ele conta.
E foi assim que aprendeu a retratar a simplicidade das coisas cotidianas, até então imperceptíveis para ele. Para o professor Davilym Dourado, Samuel demonstra um interesse especial pela fotografia. “Ele tem as qualidades de um fotógrafo - é observador, tem o olhar atento, se movimenta em busca de novos ângulos. É isso que faz um fotógrafo encontrar imagens impactantes e interessantes”, afirma. Dessa forma, Samuel começou a se destacar no grupo de alunos e a ter um maior espaço nas repercussões que o projeto teve, como suas fotos publicadas na revistas “Ocas” e “Revista V”. Também participou do projeto “Povos de São Paulo”, organizado por fotógrafos renomados, que retratou a miscigenação na cidade em comemoração aos seus 450 anos.
“Além do talento, o Samuel tinha uma vontade especial, tinha a cabeça diferente para a idade dele, era dedicado e disponível. O projeto do livro, na verdade, foi uma das primeiras vezes em que ele havia recebido um briefing corporativo para um trabalho. Até então, tinha fotografado apenas o que ele próprio havia percebido. Também era a chance de ter um trabalho remunerado e publicado”, atesta Bob. 71
Ao ser selecionado para fazer as fotos de alguns dos instrutores que ministram treinamentos no LAB SSJ, Samuel abraçou a responsabilidade. Ele acompanhou as aulas e, nesse período, além de passar a acreditar mais no próprio talento, conseguiu também absorver novas informações: “A aula que mais me chamou a atenção foi a da Orquestra. Eu nunca tinha entrado em um teatro tão grande, nem visto uma orquestra ao vivo. Alguns instrumentos eu nunca nem tinha visto de perto”, revela.
Para que a realidade dos nossos artistas pudesse ser fotografada com profundidade, foi pedido a Samuel que os acompanhasse durante a execução dos trabalhos em seus próprios ambientes, e não em um treinamento ou em um estúdio. Assim, seria possível flagrá-los na prática do que sabem fazer de melhor, e registrar em imagens o talento que cada um agrega aos programas do LAB SSJ. A idéia era justamente mostrar cada
Foto: CIA DE FOTO
um dos fotografados a partir da ótica de alguém que estava ao mesmo tempo fora do contexto dos treinamentos, porém, ligado à essência do LAB SSJ de alguma forma. Neste caso, foi por meio do processo de desenvolvimento no qual Samuel estava completamente imerso, com intensa dedicação e comprometimento.
Quem faz o lab ssj Por um amigo (*)
O desafio estava lançado e topado: desvendar um pouco do LAB SSJ através de seus criadores, ou quem sabe desvendar seus fundadores através do LAB SSJ. Programo nosso papo fora da empresa, num café. Conrado e Santille presentes, ligo o gravador e deixo a coisa acontecer.
“Abacate maduro, fresquinho, recém-colhido... vai querer?”. Era assim que Alexandre Santille, então com seus 13 anos, ganhava um dinheirinho extra para aumentar a mesada e poder usufruir aquilo que ele julga ser a coisa mais importante na vida: a liberdade e a independência. Era assim também que talvez começasse uma vida empreendedora, onde está sempre presente a sensação de que a vida que se tem é a vida que se busca, que se constrói, e não aquela que o simples destino nos oferece.
Com a mãe concertista profissional e apaixonada por música erudita e o pai executivo de uma grande multinacional, a infância de Conrado Schlochauer é repleta de atividades: aulas de música (ele toca violoncelo e baixo e já teve até uma banda), judô, muito esporte e muitos livros. Aos 16, 17 anos, começa a construir seu próprio caminho dando aulas particulares de Matemática, Física e Química para os alunos mais jovens da escola. 74
Perguntados se educação foi algo presente nas suas vidas desde a infância, ambos evitam a saída fácil, óbvia e totalmente clichê de dizer que sim: “Era algo ok, algo que tinha que ser feito e pronto”, diz Alexandre sobre a escola. “Olhando minhas notas outro dia, vi que eu era bem normal...”, concorda Conrado.
Conrado e Alê eram amigos de infância e por essas coincidências da vida, ambos resolvem cursar a Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) onde justamente nasce o embrião do que viria a se tornar o LAB SSJ de hoje. “A gente queria ganhar algum dinheiro, daí vimos que os calouros eram recebidos com um trote e mais nada, e resolvemos criar uma festa. Fomos nós quatro (aqui nascia a SSBJ, Schlochauer, Santille, Bontempo e Jucá) que criamos e organizamos a primeira Gioconda Venuta, a hoje famosa festa semestral da GV que já está em 33ª edição”, explicam.
A festa repercute e os quatro recebem um convite do Diretório Acadêmico da GV para montar um seminário. Fácil, pensam eles. “Pro Movendo a Noite” foi o tema do primeiro evento que já contou com participações ilustres como do aventureiro Beto Pandiani, na época sócio do Aeroanta, e de Hélio Mattar, então sócio do restaurante América. O que os motivava nessa época? Ganhar algum dinheiro, claro, mas não só isso. “Ser autor, criador de algo”, diz Santille. “Realizar”, completa Conrado. Educação? “Não exatamente. Essa ficha não tinha caído pra gente. Gostávamos de organizar os eventos (ao todo fizemos uns seis), e vimos que sabíamos fazer aquilo bem e que dava uma grana boa pra gente na época”, diz Conrado.
Se o leitor acha que a história segue por aqui com os quatro jovens se formando e montando a empresa em seguida, está enganado. Eles queriam ser “gente grande” e foram estagiar em grandes empresas, pensando nas brilhantes carreiras que construiriam. Santille na Mercedes, Conrado na Listel e Jucá na Young & Rubicam (o Bontempo já se afastara do grupo). Pouco depois, por 75
outra coincidência da vida, os três são convidados para trabalhar na Procter & Gamble, empresa americana que estava recém desembarcando no Brasil.
Se a vida os coloca nesse “re-re-encontro”, ela também lhes prega uma peça: na busca por se tornar “gente grande” eles puderam constatar que esse jeito de ser não era nada do que queriam para suas vidas. “Olhei um dia pro chefe do meu chefe, onde eu poderia chegar, e fiquei fritando: não é isso que eu quero pra mim...” recorda Santille. Mas quem se rebela primeiro é Conrado, que avisa o departamento de RH que não topa a oferta que tinham feito para ele. “Naquele dia cheguei em casa e caí no choro... não tinha muita noção do que eu tinha feito.” Um dia, Conrado já fora da P&G, pergunta aos amigos: “Vou procurar um emprego ou montamos algo juntos?”. “Vamos pesquisar o que podemos fazer”, resolvem os três, em coro.
Os meses vão passando e a pesquisa anda, mas não empolga. Nada é bacana o suficiente até que um dia eles se perguntam: mas afinal, o que sabemos fazer? “Seminários!”, respondem imediatamente... e assim nasceu o LAB SSJ. O ano é 1992 e a visão é ser a ponte - prática, efetiva e eficiente - entre a faculdade e o mundo do trabalho. A proposta é muito bem aceita pelo mercado, a empresa cresce rápido e em sua primeira década de vida passam pelas suas salas mais de 130 mil alunos em todo o Brasil. E educação? “Na realidade a gente fazia algo muito bacana, que as pessoas queriam e que as ajudava de fato na vida profissional. Fazíamos seminários bem feitos, super inovadores e que funcionavam. Na nossa cabeça de então isso não era educação... no máximo um excelente treinamento”, explica Conrado.
O tempo passa e a situação do mercado de educação no País muda radicalmente. Para pior. Há um excesso de oferta e uma baixa generalizada de qualidade, o que joga os preços para baixo e o custo para atrair alunos lá pra cima. O modelo até então de sucesso passa a ser questionado. Santille e Conrado (Jucá já tinha saído da empresa) se reúnem, fazem seus mind-maps, estudam 76
muito, se debruçam no desafio e formulam uma saída: o mundo corporativo. Montam uma estratégia para entrar nesse universo, com o empurrão final do amigo Carlos Eduardo Lacaz, ex-diretor de RH e consultor: “Isso aqui está prontinho pro mundo corporativo”, embarcam no novo mercado. Com a mesma determinação e garra, mais uma vez a coisa acontece, a empresa volta a crescer e o mesmo modelo – programas práticos, inovadores e eficientes – torna-se um enorme sucesso junto a grandes empresas nacionais e multinacionais.
Mas afinal, Conrado e Santille, e a educação? Eu insisto. “Pois é. Hoje sabemos que sempre fizemos educação, mas essa palavra é meio viciada, meio pesada... e não é o que fazemos exatamente”, explica Conrado, com um sorriso maroto no rosto, ao que Santille completa: “Vivemos em um tempo de enorme complexidade, de relações interpessoais super intrincadas, trabalhamos com gente que não conhecemos em uma competição fortíssima e onde – paradoxalmente – nos pedem constantemente para colaborarmos. Isso é complicado demais para as pessoas e o nosso papel no LAB SSJ é de ajudá-las a se adaptarem a esse ambiente inóspito. É isso o que fazemos. É educação, mas é diferente!.”
De acordo!
Desafio cumprido, boa sorte amigos!
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Bob Wollheim é empreendedor, amigo e admirador do
trabalho de Conrado e Santille no LAB SSJ. 77
agradecimentos Agradecemos a todos os artistas entrevistados. De formas diferentes, todos eles participam do nosso próprio processo de aprendizado. Fora da sala de aula, temos o privilégio de conviver com o Marcio, Luiz Gustavo, Barba, Karina e Marcelo de uma maneira direta,
Foto: CIA DE FOTO
bebendo na fonte a energia, o conhecimento e a visão de mundo de cada um deles.
E, principalmente, um obrigado especial ao Samuel, ao Bob, ao Daniel e à Danielle, pela possibilidade de mostrar o nosso trabalho e nossa crença em relação à educação de adultos da maneira que mais gostamos: com emoção, beleza, inteligência e inovação.
Conrado Schlochauer e Alexandre Santille 78
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O Laboratório de Negócios SSJ é uma escola de educação corporativa que visa maximizar o desempenho do verdadeiro diferencial competitivo das empresas: as pessoas. Acreditamos na inovação e na força da experiência como impulsionadores do conhecimento. Por isso, utilizamos uma tecnologia de aprendizagem que abrange casos, vivências, jogos e simulações, em busca de um aprendizado efetivo e profundo.
Criamos soluções de treinamento e desenvolvimento inovadoras, adaptadas para a realidade e expectativas de cada cliente. O nosso principal objetivo é fazer com que todo programa de treinamento reflita as necessidades estratégicas da organização e produza resultados concretos. Empresas como Unilever, Votorantim, Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), Embraer, Unibanco, Boehringer-Ingelheim, Souza Cruz, Vivo já conheceram e aprovaram o Laboratório de Negócios SSJ.
O TEXTO DESTE LIVRO FOI COMPOSTO EM MYRIAD PRO CORPO 9 PONTOS, COM TÍTULOS EM PERPETUA TITLING MT CORPO 70 PONTOS. O PAPEL UTILIZADO PARA O MIOLO FOI O COUCHÉ MATT 140G. E PARA A CAPA O PAPEL DUO DESIGN 300G. TIRAGEM DE 1500 EXEMPLARES. VERÃO DE 2007