VIVER E AJUDAR A VIVER
Dan Porto
© Dan Porto, 2014 Capa: Americo Kojo Porto, Dan. Viver e ajudar a Viver / Dan Porto. Porto Alegre, 2014. * Edição revisada e atualizada * Produção independente. Todos os direitos reservados ao autor. É proibida a reprodução parcial ou total deste livro com fins comerciais sem prévia autorização do autor.
Para Marco Aurélio (in memorian), que me mostrou dimensões diferentes da vida. Para Américo, que me reensina todos os dias a viver. Para Sandra, que me ajudou a viver em muitos momentos. Para mamãe, que me ensinou a não ter medo e construir a minha vida. Para Fozué. Para Murab. A O. e O.
O amor é uma experiência. E é uma construção.
Abertura Eu não quero abrir esse livro. A essência de qualquer coisa está na experiência, não no conceito. Este livro é uma experiência e um desabafo. É uma tentativa de ajudar e de evoluir. Há algum tempo eu ouvi essa frase em uma ligação telefônica: “viver e ajudar a viver”. E desde então ela fica se repetindo e ecoando dentro de mim como um mantra, um recado, uma necessidade de ajudar. Publicar esses temas e esse formato de texto é um rompimento, uma resistência, um desafio a mim mesmo. Nós nos habituados às regras e as transformamos em leis universais, sem possibilidade de fuga ou saída. Mas eu sempre quis um texto que pudesse falar com o leitor, uma palavra que saísse de mim e encontrasse eco e voltasse de lá para cá. Passamos a vida buscando tanta coisa: paz, felicidade, dinheiro, emprego, família, reconhecimento, fama, saúde. Mas quantos buscam a si mesmos? Quantos se reconhecem quando se olham no espelho? Portanto, não espero nada além de ajudar alguém com esse livro. Eu quero provocar.
Dúvida disfarçada de Paz A paz genuína é aquela que lhe deixa sereno no meio da guerra. Do contrário, se você perde o controle das situações logo na primeira dificuldade, não era paz aquilo que você sentia, mas dúvida. Dúvida disfarçada de paz. Nós vivemos em um mundo cheio de estímulo e cobrança de resultado, o que tem nos exposto a um nível absurdo de stress sem que saibamos ou conheçamos ferramentas capazes de nos permitir reagir a isso. Toda essa demanda nos coloca dúvidas sobre absolutamente tudo. Desde as básicas “quem somos?” e “para onde vamos?” até sobre a nossa aparência, nossos sonhos, nossas relações. Chega um momento em que nem mais os nossos sonhos nós sabemos se são verdadeiros. E esse é o momento em que a dúvida generalizada se instala e nos amassa contra nós mesmos ou contra o chão. Nada muda objetivamente. Seguimos fazendo sempre as mesmas coisas, com a mesma cara (ou máscara), indo aos mesmos lugares, cumprindo os compromissos e até assumindo outros mais na tentativa de escapar do círculo vicioso da dúvida. Aparentemente, somos os mesmos. Mas subjetivamente, por dentro, estamos nos decompondo (muitas vezes também sem perceber, porque o nosso espelho só retrata o objetivo), estamos perdendo camadas e mais camadas de vida na desgastante tarefa de nos sustentar em pé. Muitos gurus e livros, sites e espaços alternativos estão à disposição para nos ajudar e todos eles são importantes e feitos com carinho e verdade, mas: se o desgaste é interno, qual a efetividade desse tipo de ajuda? Não sabemos o que vai nos ajudar sem que experimentemos muitas coisas, mas, se me permitem, nada é de efeito mais rápido e contundente do que o remédio interno. A desordem que a dúvida causa foi gerada dentro de cada um de nós, então nada mais adequado que nós mesmos, em profunda
reflexão e observação do eu, encontremos a causa primeira do problema e tentemos resolver, amenizar, extirpar. Os gurus, os livros, as práticas e tudo o mais são imensamente úteis pelo aspecto de que podem nos despertar para inúmeras verdades e conexões que não conhecemos, perdemos ou nos esquecemos. Mas nada irá substituir o seu olhar sobre si mesmo. A meditação, a oração, a contemplação nada mais são, em primeira ordem, do que “ficar dentro de si”. E a partir delas é que damos o salto de compreensão das verdades universais. Também é imensamente útil o estudo e o aprendizado problematizado de inúmeras teorias e o constante avaliar e questionar dessas mesmas teorias em alinhamento com a vida e com os seres, porque somos mutáveis e mutável deve ser tudo! Portanto, sempre que a paz na qual acreditamos nos “abandonar”, vamos parar e examiná-la. E também a nós e àquilo que enxergamos como problema, assim como às causas e às soluções. Existem muitas ferramentas para isso, basta que aceitemos a vida como um caminho e nos ponhamos a aprender com tudo e em todos os momentos.
O que significa fazer a diferença na vida de alguém? A pessoa muda e você muda também. Não é um caminho que se percorre sozinho, nem um oceano que se atravessa comprando um bilhete de navio. Também não acontece em uma velocidade predeterminada ou com uma simples decisão. Fazer a diferença exige ação, interna e externa, de pensamento, de alma e de corpo. Não é uma atitude egoísta, como “eu ajudo você e você me ajuda”, nem algo que se possa programar como um depósito bancário. Exige igualmente de ambos os envolvidos uma abertura de consciência e uma disposição que muitas vezes pode chegar a requerer que se lance mão de disciplina a fim de prosseguir. E valem todos os esforços, todas as conversas, todas as catarses, porque acaba por adquirir um tom de missão, uma aura coletiva se instaura ligando os envolvidos e maximizando o entendimento e a visão de tudo o que acontece em volta. Você já fez a diferença na vida de alguém? Alguém já fez a diferença na sua vida? Eu não falo de dinheiro ou oportunidades, eu falo de lições, de evoluções, de aprimoramento dos pensamentos e das ações de ambos. Eu falo de mudança no mais profundo que isso possa atingir, de dentro para fora ou vice-versa, de uma, duas ou mais pessoas. Eu falo de construção, uma edificação subjetiva das almas que permite a fluidez de sentimentos novos e ações diferentes daquelas que se executava até então, porque, desde o início e principalmente, são movidas por uma compreensão totalmente diferenciada daquela com a qual nos envolvemos quando agimos com o automático acionado, sem refletir e considerar o ineditismo de cada momento, de cada ser, de cada interação que se dá, seja física ou espiritualmente.
Caso eu pudesse e devesse dar um conselho, eu diria: comece fazendo a diferença na sua própria vida, você é o condutor e possui a autonomia de decidir para onde vai, se vai seguir se repetindo eternamente ou se irá se permitir ser surpreendido por novas paisagens. Ouça alguém. Não aconselhe, pergunte. As perguntas provocam, remexem, nos desafiam a rever pontos de vista, certezas, verdades ou, ao menos, internamente nos sentimos tocados por elas. As perguntas respondem a verdade sobre cada um de nós, esteja a verdade onde estiver, escondida no fundo do porão ou piscando em uma fachada de prédio. Todos os dias, creia você ou não, todos nós temos a oportunidade de fazer algo pela coletividade, embora essa palavra não faça mais sentido, mas que seja fazer algo marcante que nos destaque no nosso próprio espírito, porque holofotes, meus caros, não trazem e nunca trarão paz e felicidade. A oportunidade é, portanto, de pensar e agir diferente de ontem, de se questionar, de não se engessar em lugares, coisas, pessoas e pensamentos. Mas e como fazer isso no meio dessa pressa cotidiana e desse pulsar tecnológico que nos oprime aqui ou ali ou aqui e ali, toda hora? Comecemos, agora, justamente por rever a relação que estabelecemos com a vida como ela se apresenta neste momento para cada um, porque queiramos ou não, somos e temos hoje aquilo que construímos no passado.
Teste de fé A sua fé será testada todos os dias em diversas situações. É preciso estar atento para perceber e ser capaz de olhar a situação de fora. Não deve haver julgamento, mas uma tomada de decisão sobre a sua reação. A sua reação interfere completamente no caminho do problema: chega-se à solução ou à floresta densa e escura por onde a situação se arrasta indefinidamente sem evolução. É uma dádiva quando sua fé é posta à prova. É uma oportunidade que você tem para verificar se realmente acredita naquilo que prega ou mesmo naquilo a que se propõe, ao modo de vida que leva. Muitas vezes a gente fraqueja e reage no modo padrão: rebate, revida, lamenta, desiste, esmorece. Conforme vamos nos fortalecendo e vibrando em uma energia mais limpa, a situação passa a ser vista sempre de fora. É como se você assistisse a um filme onde você contracena com outras pessoas. E então você pode prever a sua reação e determinar aquela que deseja, ou seja, uma maneira nova de ver as coisas, uma perspectiva amorosa sobre a vida e as pessoas. Todas as vezes em que a sua fé está em jogo você não deve se fechar cegamente no seu mundo e dar as mesmas respostas prontas, mas humildemente examinar se não está em desacordo com você mesmo e com as leis universais. E caso esteja, não hesite em reconhecer e mudar. Contudo, caso perceba que a sua fé sobrevive àquela situação, que a sua paz interior é maior e mais profunda do que um problema prático e terreno, agradeça ao Universo por estar lhe inspirando.
Paz interior é uma conquista, fruto de um caminho de amor alinhado com sua verdadeira essência. Quem se encontra no caminho, evoluindo, é capaz de reconhecer seus erros e também perceber os sinais sutis que nos mostram a verdade e a direção a seguir no caminho. Permita-se ter a sua fé testada. Aceite a batalha. Não fuja nem dê as mesmas respostas. É cego aquele que acredita que já aprendeu tudo e que a sua perspectiva é a única que está certa!
É a hora de encerrar? Você precisa saber a hora de se retirar, a hora de encerrar, abandonar algo ou alguém e seguir. É um sentimento forte e totalmente motivado por sua história pessoal (passado) e pelos desejos e sonhos que você alimenta para o presente e o futuro. Sempre sobram só duas opções: avançar ou recuar diante de qualquer situação. E é preciso tomar uma decisão. É preciso marcar aquele momento com uma ação, validar-se e assumir a responsabilidade. Em última análise, quantas vezes você já sofreu por ter que decidir sobre algo que, depois de pouco tempo, constatou que não era assim tão importante? Diversas vezes na vida supervalorizamos situações, pessoas ou fatos com base no equívoco de que tudo é pesado demais, grande demais e difícil demais. A vida é tão leve quanto uma pena ao vento. Somos nós com as nossas crenças e os nossos medos que pesamos demais as coisas para nos darmos uma importância que não temos. Podemos identificar este vício sempre que nos sentimos presos a uma situação ou pessoa. Dissemos que por isso ou por aquilo não podemos mais isso e mais aquilo e vamos permanecendo presos, amarrados, angustiados, sufocando a vida na sobrevida de uma tarefa cansativa e dolorosa ou em um andar duvidoso e que nos distancia da verdade e de nosso verdadeiro eu.
Hora ou outra o medo precisa ser vencido com a luz da verdade, mesmo que dar o próximo passo seja arriscado e incerto. A vida é incerta no próximo minuto e mesmo assim nós queremos continuar vivendo. É preciso desprender-se. Largar as pessoas, os lugares, as manias, os hábitos, os padrões. Tudo o que nos incomoda precisa ser enfrentado. Vivido ou afastado. Assim é com situações que nos perturbam porque o tempo de estar nelas já se encerrou. É necessário compreender isso e avançar, deixando para trás a felicidade de ter vivido aquela experiência com aquela pessoa ou naquele lugar.
Ouvi o som da morte O timbre da voz foi a morte em minha cabeça perdida A morte foi nesse dia a partida da alma. O timbre da voz foi o errado de tudo em todo crime O errado foi haver vida após a morte. O timbre da voz foi o tempo que deu na casa assombrada O tempo foi o que passou único, ileso.
O gato e a pomba Capturada, a pomba fica entre o gato e o muro. O gato brinca com ela: tapa para cá, bote para lá, não tem a intenção de matá-la, mas não há quem diga isso à pomba. Entre o muro e o céu, do outro lado, a pomba faz menção de voar para o muro, o que permite que o gato a ataque a cada tentativa de voo até que eu intervenha a fim de salvá-la. O gato é o problema da pomba e a única maneira de pelo menos tentar se livrar dele seria dar-lhe a face, mesmo correndo o risco de outro ataque, abrir as asas, ficar maior e tentar voar na direção contrária ao muro. Mas a pomba, aflita e ansiosa, procurava o muro e debateria ali até a morte caso alguém não intervisse e a salvasse. Problemas só são resolvidos quando deixamos de dar as costas a eles e o enfrentamos de frente e de olhos abertos.
A verdade ou a morte? O modo padrão dos relacionamentos já não é mais suficiente para as carências humanas. No modo padrão cada pessoa assume e demonstra as suas melhores características, preocupada com a imagem que está emitindo. Ou seja, assume uma postura mais tensa do que a verdadeira. Enquanto a verdade não imperar e os envolvidos na relação não optarem por alcançar o essencial e genuíno de cada um, estaremos vivendo em solo de areia movediça. Aquele tipo de relacionamento em que cada um a seu modo encolhe a barriga para as fotos, faz o cabelo dez minutos antes de acordar para não perder a imagem das redes sociais já não é mais suficiente para as carências humanas, fruto desse nosso estilo de vida isolado. É preciso rasgar tudo com a força da verdade. Mostrar-se a si mesmo cada vez mais real para, enfim, conquistar alguém de verdade e não um boneco.
Coisas Sempre acreditei que queria encontrar uma coisa ou outra, achava que queria encontrar a realização de meu sonho ou o produto final de meu trabalho, quando na verdade tudo o que queria encontrar, sem saber, era minha busca. O encontro que eu desejava era com aquilo que me fazia andar, com aquilo que me acordava todos os dias. O sabor estava guardado no caminho. A cor e a luz estavam radiantes e brilhantes ao lado de toda estrada. A busca era a única verdade. O prazer estaria escondido em cada passo dado e o gozo era o fim de cada passo e a possibilidade de me mover para o começo de outro. Tem um rumo claro, vou para chegar a algum lugar e vou saboreando mais e mais a cada dia o passo, a pedra, a colina, a floresta, o sol forte, a noite banhada pela lua aberta e livre. Bebo mais e mais a cada dia do vento quente que me sopra o rosto. Ouço mais o som de minha solidão e o barulho de meus amores. Arrisco a tocar a névoa densa que me cerca...
A vida nos alimenta, a solidão apodrece Eu lido bem com a solidão, diz um. E eu então, eu gosto da solidão, afirma outra. Habituamo-nos a viver sozinhos, isolados diante de nossas telas de tevê, celular, computador. Como bem diz a Lídia Martins “a solidão acabará nos apodrecendo”. Isolados, vamos nos desintegrando, desfragmentando pouco a pouco e diariamente perdendo um pedaço ou dois. Um dia, quando deixarmos a cadeira ou a poltrona e nos olharmos no espelho veremos que não vivemos nada, que o tempo passado no isolamento nos alienou a ponto de nem mesmo lembrarmos daquilo que fizemos. E se olharmos mais fundo haverá um vazio tremendo em nossos olhos, é a falta de um sorriso, do amor, a falta das trocas. Estaremos, então, vazios e podres, o que nos impede de fazer diferente. A vida nos alimenta, a solidão apodrece. A vida precisa de mesa de bar, teatro, música, natureza, felicidade, riso, amor. A solidão não precisa de nada.
Viver e sair Tudo isso que nos causa dor e nos assola a alma hoje, amanhã não existirá mais. O tempo passa, a gente passa e outro tempo e outros eus se achegam. De dentro do caos não se vê o Sol ou a Lua, nem se sente o vento ou a chuva; do meio do furacão só nos ocorre sobreviver, e sobrevivemos, agarrados a um tronco ou mesmo caídos no chão, sobrevivemos. Viver, a isso se resume a resolução do problema, não adiar. Viver, entrar de cabeça, se lambuzar com toda sujeira, dar um jeito ou resolver de vez e sair, imundo, mas mais leve. Sujeira a água limpa, feridas o tempo cicatriza e cicatrizes... cicatrizes todos temos as nossas e é isso que nos diferencia dos fracos. Os fracos não lutam, permanecem na acomodação, no conforto, no menor esforço, no “daqui não saio, daqui ninguém me tira”. Estar aqui, vivendo, é um constante ir e vir, amar e odiar, nascer e morrer, não há por que ser diferente com você ou comigo. Resta-nos, sim, dar à vida o melhor que dela podemos tirar, ou seja, alegrias, amor, paz. Uma vida bem vivida é aquela em que mais tempo se passou alegre, apaixonado, feliz e em paz. O que fazer de sua vida? Ficar? Lutar? Sair? “Infelizmente senhor, é política da empresa não trocar de VIDA, sua preferência é muito importante para nós, contudo, comprou, está comprado. Boa noite.”
Ser feliz sozinho? Falam as vizinhas que é preciso aprender a ser feliz sozinho. Ser feliz sem o beijo do meu amor, sem abraço apertado, sem dar a vida por alguém? Ser feliz sem oásis em uma vida que é caminho árido? Ser feliz só com o material? Casa, carro, viagens? Ser feliz com a fama? Ser feliz sem o olhar de quem me ama, aquele que me derrete e faz tudo ter sentido? Ser feliz sem ver o olho do meu filho e sem poder protegê-lo? Sem ter para quem voltar? Ser feliz sem ser importante para alguém? Sem dividir as alegrias e os triunfos, as tristezas e as derrotas? Felicidade é um estado momentâneo e individual. A sensação de felicidade é solitária, só um é que pode senti-la de fato, contudo, o que a deflagra é o detalhe, uma ligação inesperada no meio do dia, em e-mail carinhoso e bem escrito, um olhar, o Sol... É impossível ser feliz sozinho. Na maioria dos casos é algo externo que ateia a felicidade. E se ser feliz é viver sem ligação sensível com o mundo, não, obrigado, eu passo. Não há nada na vida que faça sentido, exceto o amor. É ele a única explicação para estarmos aqui. Então eu não quero viver se for sozinho.
Prostituir a palavra Temos sido cada vez mais negligentes e mentirosos e também mais moralistas com a palavra. Temos usado a palavra para esconder a verdade e o desejo que reprimimos e vai nos adoecendo emocional e fisicamente. Tenho observado que a cada nova geração o senso de moral tem aflorado mais forte e acredito que se trata de um processo natural e necessário de evolução. Contudo, também percebo que essa moral muitas vezes quase enfeitada, de tão essencial que se torna, tem prendido as pessoas em ações e reações repetitivas, tolhendo a curiosidade, o que limita as experiências. Mas não identifico essa mesma moral quando se trata de se valer da verdade nas relações e nos sentimentos. Começa que poucos se dedicam ao autoconhecimento
e autodesenvolvimento.
Mesmo a educação
está
dependendo de outro, de algo externo e até de uma motivação externa. Com esse desconhecimento da emoção, que poderia ser uma reação, escolhe-se o sentimento mais acessível, sem empenho, sem atenção, ou seja, sem saber o que sinto não sei como agir! Isso, em um grau maior causa a sensação de perda, de desorientação e, por conseguinte, leva a escolhas equivocadas, caminhos fáceis que não levam aonde queremos chegar, mas a cada vez mais nos perdermos de nós mesmos. O remédio: aceitar o caminho mais difícil, a investigação minuciosa de si mesmo todos os dias, a constante atenção às ações e reações. É um crime prostituir a palavra para esconder a verdade. Por mais demorado que possa ser, a palavra certa é a verdade e ela é mágica, é capaz de tudo. A palavra verdadeira rompe os limites.
25 horas É pressa. As notícias diárias coalhadas de desgraças, as ruas cheias, os celulares, a internet. É pressa. Estamos com pressa de tudo. Corremos, voamos e andamos com pressa, tentando acrescentar tempo em nosso dia. O ideal seria um dia com 30 horas, mas se não der, 25 já serve! Doença. Greve. Desacordo. Acidente. É tudo pressa, nos tornamos máquinas em busca de mais e mais rendimento, cada vez tentamos maximizar a rotação. O corpo não funciona assim. O Universo não roda em tal velocidade. O dia nasce e morre para dar lugar à noite. A Lua chega e vai embora iluminar outros amantes e brilhar em outros mares. A chuva precisa de corpo aberto para molhar. O Sol precisa de sorriso para brilhar mais forte. O tempo é invenção humana e por isso não existe na vida, nós é que o mantemos. Vivemos constantemente atrasados, em falta, ausentes, nem bem chegamos e já estamos atrasados para o próximo compromisso, que é tão importante e vital quanto o anterior. O que mesmo se faz importante hoje? É importante viver? Viver é se dar conta que não olhou no olho de seu amor hoje ou que não sabe a roupa que seu filho vestia pela manhã, quando você o “descarregou” na porta da escola porque já estava atrasado para a primeira reunião do dia? Há enxurradas de livros de autoajuda pregando a vivência do presente, e vendem tanto que todos estão vivendo o presente.
Que presente? Quando é o presente? É agora? Mas que agora, se não me permito parar e ouvir um pouco o som da chuva que pinga lá fora? Estamos no século 21 e nunca se soube tanto, nunca se dominou tanto os meios tecnológicos, porém nunca se viveu menos. Não creio se tratar de ter ou ser, mas sim de simplesmente viver. Não há regras para isso, não se aprende nos livros ou nos documentários da tevê. Aprende-se pura e simplesmente se deixando viver.
Pare e relaxe Assim como a maioria da humanidade você deve estar buscando realizar um sonho. Eu sei como é, dia e noite a gente tenta de tudo, é como se a cabeça fosse explodir na tentativa de encontrar a ideia perfeita e viabilizar essa ideia, mas por dias parece que não vai dar certo e você chega a pensar em desistir. Pare. Dê-se um momento de descanso, tire férias do trabalho, das ideias, tire férias de você. Respire. Leia um livro diferente, assista filmes bobos, encontre os amigos e faça programas familiares. Relaxe. Faça coisas que lhe fazem bem, por mais idiotas que possam parecer. Descubra atividades novas e se envolva com elas por um tempo. Descanse o quanto for preciso. Quando voltar estará com a disposição renovada e vai perceber que as ideias irão fluir melhor.
Café quente e com gelo, por favor! Há quem goste de café frio, café morno ou café quente. Aos que gostam de café frio, não pensem que será fácil, será muito difícil conseguir uma xícara em meio todos os cafés mornos e quentes, soltando fumaça pela cabeça. Aos que preferem a temperatura meio termo, morna, bem mais palatável que o frio e o quente, não pensem que será fácil, será preciso muitas vezes pedir que se acrescente água ao café quente ou levar ao fogo o café frio. E afinal, aos que preferem café quente, diminua o ritmo. Agora. Ou será preciso diminuir depois e perder espaço para o café morno. Moral da história: há pessoas frias, pessoas mornas e pessoas quentes. Não há um meio termo, se é uma coisa ou se é outra. Contudo, os frios se contentam com muito pouco, vivem reclamando daquilo que não conseguiram conquistar, enquanto os mornos brigam para tentar em vão ocupar espaços deixados pelos quentes, com a cabeça explodindo de tanto pensar e fazer. Você pode escolher qualquer temperatura, desde que não seja nenhuma das citadas anteriormente. Escolha uma temperatura que seja somente sua, para a qual não há concorrência, e ainda assim, faça o melhor trabalho, faça o seu trabalho. Os livros não trazem verdades absolutas. E são as pessoas que escrevem os livros, ou seja, elas também não trazem. E não trazem porque não existem verdades absolutas. As verdades vão sendo encontradas por cada um, em cada lugar, uma para cada hora. Portanto, ser verdadeiro nunca significará reproduzir verdades, mas sim, ser a verdade que acredita e defende.
Falar ou não a verdade? O meio social nos ensina a ser hipócritas, mentirosos, omissos. Tudo isso porque não se pode mais ter defeitos, temos todos que ser bonecos com sorrisos nos rostos e fichas limpas. A verdade, entendida aqui como acontecimento pela ideia de Michel Foucault, manda a regra que jamais pode ser dita, no máximo levemente sugerida no subtexto. Tudo o que importa é manter a imagem de bom moço e sem nunca revelar o quanto custa emocional e psicologicamente manter tal imagem. Nós estamos morrendo sem ter vivido. O materialismo nos impôs a racionalidade e a negação de tudo o que represente liberdade e verdade essencial. O ser humano evoluiu para os lados, a humanidade cresceu em apetrechos e novidades piscantes, mas regrediu no sentir e no viver. Quem olha no seu olho quando se dirige a você? Quem faz aquilo que realmente causa palpitação e consome as horas? Quem pode dizer o que pensa? Quem pode pensar? O buraco é bem mais embaixo e bem maior que nossa burguesia é capaz de permitir que imaginemos, meus caros! O trabalho vem nos adoecendo, nos atrofiando o corpo e a alma, suga um terço do dia diretamente e mais quantas horas de pré-ocupação?! Não há mudança real prevista, senhoras e senhores. Não há “se” ou “a menos que”. É isso o que temos. O movimento de mudança é lento, complexo e delicado porque precisa ser sutil. Não estamos preparados para mudanças bruscas. Talvez seja essa a resposta à pergunta do
título. As máscaras vão demorar a cair, e eu não tenho paciência! Não tenho diplomacia suficiente para esperar ou fingir. O que será de mim? Ser ou não ser faz todo o sentido. O mundo do trabalho nos pede que sejamos isto ou aquilo, sem jamais nos permitir ser o que realmente somos. A especialidade está nos enlouquecendo. Ninguém mais sabe e todos sabem um pouco, e fragmentam o que sabem e, talvez, tudo isso se resuma em egoísmo. É a necessidade de alimentar o ego que nos impele a vestir máscaras e querer máscaras nos rostos dos outros para que não tenhamos que tirar a nossa. No momento em que escrevo este texto minha mente tenta a todo custo me boicotar dizendo que minhas palavras vão chegar aos ouvidos certos e pode haver retaliação. Bem diz o Chopra que vivemos reproduzindo as mesmas reações para todas as ações, sem nos darmos conta do instante. Mas bem, se conviver com as diferenças significa aparar essas diferenças a fim de pôr todos no mesmo balde, eis outro dos tantos motivos para que o mundo do trabalho seja repensado, urgentemente, levando em conta o ser humano.
A história dos Mesmos O seu Mesmo e a dona Mesma se casaram e tiveram mesmices. Isso foi lá por 1940. Em princípio dos anos 60 as mesmices se deram conta de que não passavam de um monte de mesmas e se revoltaram. Mas em 1970 para 1980 se decidiram por se tornar mestres em mesmice e logo doutores em mesmice. Quando o século estava para ir embora, o mundo para acabar e o bug para começar eram doutor Mesmo Júnior e doutora Mesma em mesmices e toda essa história não passou de subterfúgio para contar a mesmice do mundo.
Sair melhores ou ficar piores É muito duro para qualquer artista enfrentar aquele trabalho formal que exige registro de ponto, horários fixos, encenações, formalidades e burocracias em geral. Mas muitas vezes a vida pede e, então, o que salva são as pessoas! Cada interação gera um fruto cujo sabor é uma escolha individual. Eu tento sempre escolher o aprendizado e os pontos que me tornam melhor, mas há, sem dúvida, embora raros, os casos em que a escolha é dispensável enquanto o encontro se torna amizade, indiscutivelmente, sem opção, sem julgamento pelos defeitos e qualidades de ambos. O amor é mais forte. E na nossa paranoia de não parar só percebemos o que significa o encontro no trabalho quando deixamos as pessoas ou elas nos deixam. Pelo prazer ou pela dor de conviver o encontro nos amplia, nos interroga, exige um olhar e uma ação, mesmo que agir, aqui, seja um verbo em silêncio. É impossível deixar o olhar do outro sendo o mesmo e mais ainda se o outro lhe puser à prova todos os dias, tirando de você o que você é de verdade. Pode parecer que isso só ocorra, ou devesse ocorrer, em um relacionamento no qual as pessoas se abrem totalmente e talvez soe estranho quando tratado no mundo do trabalho. Mas não é! Saiba que encontros ocorrem diversas vezes por dia, o que passa é que em muitas dessas oportunidades nossos sentidos estão bloqueados ou focados em um só ponto, muitas vezes em resolver um problema, e nisso perdemos a oportunidade e saímos iguais, como se a troca não tivesse existido, como se interagir fosse simples como ligar uma máquina.
E nesse ir e vir de repetições e Sóis que nascem e morrem são as pessoas que tornam o trabalho formal do artista, considerando, talvez, o próprio trabalho artístico (?), menos doloroso e mais desafiador, enfim, uma experiência. Sinta-se despido na frente de artistas. Eles estão, ou deveriam estar, todo o tempo bebendo da sua personalidade, do seu tom de voz, dos gestos, das palavras, do seu jeito de estar no mundo. Sem querer parecer generalista, o trabalho não deveria passar do lúdico. É brincando que o homem aprende e alcança a excelência. Eu tenho o prazer de desempenhar funções que me agradam profundamente, contudo, muitas e muitas vezes me sinto tolhido enquanto artista, mesmo nas atividades artísticas. Mas o problema não são as atividades, são os encontros. Também não são as pessoas, são os encontros entre as pessoas e eu. O que eu escolho de cada relação. Porque quem determina o sabor do fruto do encontro somos nós. Portanto, repensemos a escolha entre sair melhores ou ficar piores.
Saudade é um pouco como fome “Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: se quer absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida”. (Clarice Lispector) “É estranho sentir saudade sem ter tido. Do abraço sonhado, de um sono nunca dormido e nunca acordado, de um vento que nunca entrou a janela, de um beijo que nunca molhou.” É um tempo em que os corpos vivem separados e o corpo também deixou a alma lá nos anos, o que torna o humano menos humano e, por outro lado, cobra uma humanidade que nos carrega e nos perde mais. A presença não foi nem será substituída, está apenas ludibriada por uma série de coisas que criamos e, afoita, aguarda pela hora de voltar e unir os corpos, os olhos, as peles, os suores, as bocas; aguarda pela troca de dois em um, pela cumplicidade daqueles olhos que se falam. Essa ausência da presença é a causa da fome que sentimos na boca, no peito, no sexo, nos olhos, nos ouvidos, nas mãos. O ser humano sempre
desejou, mas nunca desejou tanto outro ser humano, porque vivia em bando, depois em comunidade, depois em cidades, até que o muito se tornou nada. É insustentável viver sozinho e o contrário não é uma escolha, a vida pode ser e ter tudo se nos servirmos dessa parafernália toda que criamos para nos ausentar menos, de nós e dos outros. “O Sol que brilhou hoje no meu olho, deve ter tocado pelo menos o casaco dela.”
Estar do lado de fora A rua se aperta à esquerda e se abre pela direita. Por onde seguir? Habituados ao conforto das casas, do casamento, da propriedade, da razão, do hábito e do grupo que nos aceita é difícil saber para que lado pisar. A proteção do muro e a distância do perigo ou a possibilidade de correr o risco e vivenciar novas coisas? “Na verdade, vossa paixão pelo conforto assassina as paixões mais nobres de vossas almas e, depois, zombeteira, acompanha seu enterro” nos diz Khalil Gibran no seu fabuloso O Profeta. É comum acalmar-se depois de correr pela vida e encontrar paradeiro, uma caverna para se esconder e uma companhia para contar os dias, tão comum que a maioria esmagadora de nós se põe ali e vai gostando, gostando, e acaba ficando para sempre. Jamais condenaria a calmaria, o silêncio e a paz, mas a vida não é toda assim. Quantas vezes você ou eu nos pegamos pensando ‘puxa vida, todas as vezes em que tudo parece estar bem e calmo, vem a vida e me derruba ou acaba com o que eu construí”? Não é a vida, propriamente, mas nós que buscamos aquilo que damos o nome de ‘problema’ para continuar aprendendo e crescendo. Que seria de uma vida parada, sem coisas para fazer, sem atitudes a tomar? Seria tão somente um esperar a morte. Escolher estar do lado de fora, correndo os riscos e me pondo a mercê do incerto me põe também à deriva de mim mesmo, daquilo que desconheço de mim. É preciso me colocar diante das coisas da vida para me testar, a fim de confirmar ou refutar verdades que creio.
Um papel que reencontro Diz uma folha esquecida sobre a minha mesa: Um dia, quiçá, o tempo se acalme e todas as coisas ocupem o seu lugar, e não mais vamos viver assolados pela dor de perder aquilo que ainda nem temos, ou sofrer antecipadamente com o medo de ser feliz. Nesse dia o Sol será o mesmo, o vento vai soprar igual, a chuva vai cair da mesma forma. A Lua vai seguir inspirando poetas e amantes. Mas teremos aberto os olhos para a realidade escondida por detrás do belo!
Os tempos Encontre a ordem original das coisas que você verá: o sistema que rege a sua vida passa a funcionar em torno do eixo da Terra e tudo passa a girar no tempo do mundo. Os objetivos se fazem e se realizam eles mesmos. Você fica com a parte de viver, sabe como é?! Simples assim, como beber água, a ordem natural das coisas não é o ritmo do tempo dualizado em dia e noite, muitas vezes a Lua, o Sol ou o vento influenciam, mas nunca é nas 24 ou 48 horas... a vida nunca acontece assim, ela ocupa mais tempo a fim de acomodar tudo, porque não é só o seu desejo para ser realizado. Para sua satisfação pessoal, o universo todo precisa se adaptar e isso não é uma coisa que ocorra enquanto você dorme. Precisa encaixar as peças todas. Então é apenas uma equação: subtrair o tempo cronológico e somar com as sensações ao quadrado é igual a uma vida alinhada com a VIDA.
O mundo dos insatisfeitos “A verdadeira espiritualidade não existe sem amor à vida” (Andrew Shreeve). Talvez a sociedade urgente, tecnológica e de relações descartáveis em que vivemos justifique a presença demasiada da insatisfação em nossas vidas. Quando faz frio implora-se pelo calor, para quando fizer calor orar-se pela chuva, que ao cair já se prevê o cessar. Gordos querem ser magros assim como quem tem cabelo enrolado o deseja liso. Pobres querem ser ricos e os ricos lamentam a prisão de suas casas e seus carros de luxo. E sem falar no nosso aparelho celular que sempre precisa ser trocado pelo último modelo lançado hoje! E nisso, assim como nossos antepassados, seguimos buscando um caminho espiritual. Mas o insucesso nos aflige a ponto de nem mesmo conseguirmos parar por meia hora para ficar em silêncio, sem fazer nada. Somos insatisfeitos até mesmo por hábito, talvez por assim termos aprendido e nunca parado e olhado a vida verdadeiramente. Urge ao que busca um encontro consigo mesmo, encontrar, antes, um sentimento genuíno de amor pela vida, pelas coisas e pelos seres todos da natureza. Nós todos... o Universo... a natureza... somos um.
Chegada e partida O amor é dois. É um ar e uma morte. É ir e vir. É gozo num riso. É vírgula e ponto final com tinta verde. É um livro aberto que o vento vira as folhas. Aquele Sol que bate no telhado é minha lembrança de você, porque era um fim de tarde quando chegou. E uma madrugada quando foi embora: “eu não te quero mais”. Assim como foi curto o tempo entre as horas, foi pouco o gosto do seu beijo. Cruzar um deserto atrás de você vai me secar mais que as lágrimas já o fizeram. Um balanço do vento traz de volta o olhar que eu jamais quis perder. A canção não toca, me penetra. Isso que você vê agora é um balanço, de dentro de mim. Não acredite que o amor morre. Ele treme no lábio e no sorriso para sempre.
Criar o viver Viver requer uma intensidade tão forte que tudo abaixo disso deixa de significar vida e nos joga em tédio ou marasmo. A vida é uma flor, plantada ontem e podre amanhã. Não há novidade nisso, o que há é que só aprendemos o que significa passado e presente quando eles vazam de nós, é quando se conclui que viver é sentir totalmente cada milésimo de segundo, em cada célula do corpo e na plenitude do espírito. É preciso dizer isso agora porque é agora que está a fazer sentido e pode ser que se houver amanhã nada se encaixe no pensamento ou na emoção. Entender o que é para sempre e o que passa é algo que chega com o andamento da vida, com a observação das pessoas e de como nos relacionamos com elas, e que não somos capazes de nos impedir de viver, de nos boicotar por qualquer que seja a razão. A vida precisa ser maior mesmo que o amor, e será, na medida em que o amor for o norte, o caminho, o meio e o fim. Viver implica assumir-se como seja, na pessoa, no desejo, na crença e na infinita liberdade de mudar. O livre arbítrio também toma sentido apenas quando viver significar alinhar-se com a verdade, e enquanto essa verdade não for autêntica, mesmo que para encontrá-la tenhamos que nos virar do avesso, todas as decisões e todos os passos nos conduzirão ao erro, ao abismo, à tristeza, à depressão, à cólera. A dois ou sozinho, viver é uma decisão individual. E quando decidida, a sustentabilidade do eu é mais importante do que o resto, assim como não há o
topo da montanha sem uma base. A realidade não deve ser entendida como isso que os olhos veem e isso que aparenta ser um mundo. Realidade é algo mais forte que eu mesmo, é intrincado sistema de ligações que se falhar, para, e a falha que o livre arbítrio causou precisa ser corrigida para que o eixo se reencontre e a vida siga. Que realidade e vida andem juntas, pois aí sim o verbo viver estará de fato sendo conjugado!
A síndrome de “Maria vai com as outras” Em havendo algo difícil de encontrar que se diga de pessoas diferentes. Na verdade, mais percebo o quanto todos acabamos por imitar uns aos outros quando justamente tenho por perto alguém diferente. Esse diferente eu digo de alguém que não vai com a manada, que demonstra não se importar com a enxurrada de palavras, atitudes e pensamentos compartilhados por uma massa que não reflete enquanto se deixa levar pelo vento, sopre de onde soprar e leve para onde levar (ou não leve para lado nenhum). Em grande escala pode-se observar o comportamento nas redes sociais. Compartilha-se o geral, sem atenção ao detalhe e menos ainda vai se gastar tempo com reflexões. E quando você o faz e socializa o ofendido lhe deleta ou bloqueia e está tudo bem, afinal basta deletar o problema! Nos grupos não virtuais me deixo ouvir os murmúrios de concordâncias que servem para se manter acolhido. Ser autêntico, ao passo que é admirável para alguns, pode significar não ser incluído no grupo, receber olhares tortos, desconfiança e desprezo para outros. O que esquecemos é que na essência somos todos diferentes. (O que você faz quando ninguém lhe vê fazendo?). Normas sociais não devem ser confundidas com perda de identidade. Aquele que se sabe e se conhece não se deixa levar pela enxurrada (digo enxurrada, por causa de toda a sujeira que carrega) nem se acanha diante do olhar que julga.
Podendo fazer uma retrospectiva, os grandes gênios e aquelas pessoas que marcaram a história em qualquer área, talvez mais que inventar o novo tenham mudado a forma de fazer. Estou certo de que se pensássemos mais antes de cada ação teríamos bem menos problemas e mazelas. O povo sairia mais às ruas, a dor seria menor, a felicidade maior. Como diz o Chopra, ao menos tente perceber o momento em que se deixa levar pela enxurrada ou pelo vento. Perceber é o início. Depois vem a decisão de permanecer igual ou assumir a mudança.
Estamos morrendo Estamos (sobre-vivendo), vamos a cada amanhecer saindo de nossas camas sem despertar, sem ver o espetáculo diário do Sol, escorregando para nossas atividades rotineiras, que de tão rotineiras chegam a ser parte de nós. O trabalho não deve ser parte de nós, é pesado demais para se carregar nas costas. Nossas atividades diárias devem permitir que se possa olhar em volta, levantar a cabeça, abrir os braços, mas muitas vezes o peso delas não nos deixa fazer outra coisa que andar e andar, mas andar em que direção é que não sabemos, apenas vamos indo rumo a coisa nenhuma, os objetivos vão se perdendo e vai ficando só o instinto primeiro de continuar respirando. Perdemos também o instinto de estar vivos. Estar vivo significa algo além de respirar. Estar vivo é sentir o ar que penetra no corpo e se deixar invadir pelo cheiro, pela consistência desse ar. É respirar um ar que esteve em outro pulmão, numa planta, na água, somos e seremos sempre todos, uma mistura de tudo o que nos rodeia e o que rodeamos. Vejo as pessoas nos ônibus, na rua, na faculdade, todos andam com a cabeça baixa e parece que o próximo passo não vai acontecer, a vida que há ali está sucumbindo, a respiração superficial, na altura do peito, é um sinal disso. Estamos respirando pouco, estamos oxigenando pouco e por isso não há mais ideias novas, não surgem mais gênios, as cabeças estão se fechando, o pouco de atividade que resta precisa manter a funcionalidade.
O medo tomou conta de nós e não é o medo do outro, é o medo de nós mesmos, estamos com medo de nos experimentar, estamos deixando a acomodação se acomodar em nós, está bom o ensino que recebemos, está bom o preço no supermercado, não conseguimos mais fazer nada, não temos mais força para lutar por aquilo que acreditamos. Ou pior, nós estamos deixando de acreditar. Por quê? Será por que a velocidade das informações é extrema a ponto de não nos deixar controlar mais nada ou porque realmente estamos, a cada dia, abandonando o que acreditávamos? Somos cada vez mais dependentes de coisas totalmente dispensáveis ao mesmo tempo em que acreditamos ser mais livres a cada dia, é uma liberdade aparente, uma ideia que compramos e cremos nossa e nos enganamos. Um exemplo típico é o telefone celular, não que eu seja contra, até uso e muito o meu, mas o fazemos na ilusão de que somos livres, sendo que enquanto andamos pela rua, submersos em nossas conversas ao celular, não olhamos mais no rosto das pessoas, nem sabemos se um homem ou uma mulher nos atendeu na loja, porque estávamos ao celular em um assunto que não poderia esperar nem um minuto. Estamos afogados em toda maluquice que criamos. Outro dia recebi um daqueles e-mails encaminhados, sobre a cidade de Dubai, com uma retrospectiva fotográfica desde 1990, quando ainda era quase um deserto. Fiquei pensando depois de ver todas as fotos atuais, de todos os prédios e maquetes: o poder do ser humano é imensurável, Dubai foi um sonho realizado em cinco anos! E pensei ainda: quando vamos a Dubai, vamos e voltamos com a sensação de que assistimos a um espetáculo artístico, cheio de beleza, riqueza e luzes ou voltamos só com a sensação de que cumprimos o dever, também conhecemos Dubai, agora podemos conversar nas reuniões, mostrar as fotos, opinar sobre a economia mundial?
A quem enganamos vivendo uma vida tecnológica, uma história contada, um conto infantil? Estamos morrendo porque nossa vida não tem mais a nossa vida, vamos sentindo e vivendo coisas que compramos, inconscientemente, e cremos ser a única possibilidade. Para não parecer um pensamento pessimista, aí vai uma proposta: romper, aos poucos para os mais tímidos, com convenções, ir aqui e ali operando mudanças pequenas mas prazerosas em nossa vida diária, na nossa casa, nos caminhos que percorremos, na maneira como olhamos para o outro, em como sentimos o olhar do outro em nós, no tom de voz, na cor da roupa... A proposta é aceitar o desafio de se mostrar verdadeiramente como somos, sem o medo do julgamento, e sim com a paz da verdade.
O encanto dos encontros Que encanto há nos encontros? Será a efemeridade destes, quando característicos de um mundo utilitário e em mutação? Ou será a total falta de controle sobre todos os aspectos que os envolve, o latente poder do que virá a acontecer? A singularidade envolvente de cada contato com qualquer ser vivo nos leva, em geral, a esperar algo, a antever as coisas, a “enquadrar” o ser, a fala, os gestos em algum espaço de nossa mente que abrigue conhecimento e, ora, nos dê norte e com isso, nos inclua. O que de fato temos dificuldade em exercitar é desprender-nos de nós mesmos, pulverizarmos nossas intenções, não esperar, vivenciar ao invés de analisar. Acredito que o desprender-se de nós mesmos nos levaria a um estado de plenitude com o outro que viria a favorecer o contato. Isso envolve concentrar-se. Concentrar-se no outro, no aceitar o outro, no permitir livremente o outro em mim. Isso é o avanço do meu amor por mim mesmo; quanto mais amo a mim em singularidade mais me possibilito amar o outro em sua singularidade. Quando me coloco cheio de intenções falseio os sentidos, me decepciono, posso desagradar ou ser desagradado, mas ainda assim a intenção permanece em meu corpo, na sensação de fracasso ou exclusão. É só na libertação do meu ser, no pleno vigor de meu ser desfragmentado que reside a amplidão sensorial, as emoções viscerais e verdadeiras e, por isso, a onipresente sensação de realização, entrega e amor a cada encontro com o outro.
A ausência de intenções ao encontrar permite o instante de intimidade onde os dois se entreolham e num passar curto de tempo decidem, juntos, o caminho que tomarão. O seu. O meu. O nosso. Outro caminho que nos leve até lá. Outro caminho que nos leve não sabemos bem onde. O importante é a decisão unânime de por onde seguir, o acerto consciente e espontâneo de dois corpos que em breve se entregarão ao estado sem limites, ao espaço de criação livre.
O tempo A inconstância da presença de nossas vidas aqui é que torna o caminho uma curva, e a cada uma dessas curvas um encontro. A efemeridade de nosso “estar aqui” é medida pela magia como chegamos e partimos, como vivemos e morremos, e mais que isso, é medida como caminhamos. Parar pode ser um ato de caminhar. O movimento independe de nosso querer, é um fluxo constante que pode ser percebido pela inconstância de nossa presença, mas o movimento é um andar infinito, imensurável. Nunca saberemos ao certo o tempo que estamos aqui e menos ainda o tempo que estaremos ou voltaremos. A relatividade do tempo em nosso corpo é inexplicável para a ciência atual. A espera da mãe pelo filho e do lavrador pelo brotar da semente é um ato de caminhar. Envolve o cuidar de si e do outro para depois caminharem juntos até que uma curva os separe, e o caminho prossiga. Caminhar é exatamente o ato inocente de criar, por vezes inconsciente. A maneira como passa o tempo em nós, no corpo, é uma maneira além de novo e velho, além de rigidez e flacidez, além de passado ou presente ou mesmo além de rugas e cicatrizes. O tempo nos passa assim como passamos no tempo e pelo tempo. Passar é se deixar dobrar pelas curvas e ir rasgando os pedaços de trilho num tempo incontável a fim de invadir o tempo contável. O lado incontável do tempo é esse fluxo interno e externo que nos permitimos apenas a refletir, sem podermos sentir, é um modo do universo de não nos deixar viver. Esse tempo ou modalidade de tempo é não cronológico. A única coisa que sabemos dele é que nos perpassa. Ao contrário do tempo contável, cronológico, consciente, programado ou programável. O contável do tempo é a sensação de calor ou frio, a fome ou sede, é a corporeidade do ser humano.
A sociedade está confusa Artistas viram políticos e se perdem na política, junto com os antigos. Civis, desesperados, carregados de boas intenções ou interessados em visibilidade, criam ONG’s e projetos sociais a esmo ou se envolvem na política sem conhecimento prévio fazendo do que já estava ruim, pior ainda. Na intenção de acertar, cada vez mais jogamos a educação no buraco. Somos farrapos de professores, alunos e pais, todos sem saber o que fazemos. Temos vivido perdidos entre o muro e o precipício, sem saber como chegar do outro lado e menos ainda voar. Corre-se de um lado a outro sem chegar a lugar nenhum e sem parar, ao menos. Longe de ser caos, essa é a realidade que nossos pensamentos criaram. Caminhamos na direção contrária à vida.
Em um canto qualquer Em um canto qualquer, sobre notas musicais, estão os dizeres dormindo. Em um canto qualquer está o olhar malicioso e esfomeado que se trocou no meio da multidão; está o riso com o lábio preso, misto de alegria e medo que sempre andou do lado de alguém; estão os embalos dos corpos e o cheiro morno do sexo; a letra de cada palavra escrita e o som de cada uma que foi dita. Em um canto qualquer jaz a voz embargada, as palavras contidas e não ditas ou pela metade escapadas da boca; um sonho que se rende à uma caixa de papelão que o prende e deixa nem o Sol entrar; o riso, aberto, se prende à sombra da parede. Em um canto qualquer vem sua lembrança. Em um canto qualquer vem a felicidade e o meu corpo dança porque minha dança é o meu jeito de chorar, é o meu jeito de rir e meu jeito de estar no mundo. Em um canto qualquer vem presa a sua voz, o seu som e o seu bom que eu tive e não sei perder; vem girando seu riso que me deu outro riso. Em um canto qualquer vêm as palavras vazias ou cheias, mas elas vêm e trazem você; fica; em um canto qualquer. Em um canto qualquer não está aquela mão que se enchia no meu corpo sem pressa, e seguia me apertando, sufocando minhas palavras e enchendo de lágrimas os meus olhos sujos. Em um canto não posso respirar o seu suor que eu tinha de cima de você e você; posso me perder em um caminho e lhe encontrar do lado, mas vai ser só imagem; não posso me deixar, alma e corpo, sem preocupação, porque você me cuida, não, você não vai estar para me
cuidar. Em um canto qualquer não existe a vibração enérgica das mãos sobre mim e o fluxo de luz do seu corpo para o meu; não existe. Em um canto qualquer Está, Perdido, O beijo úmido / no teu lábio / no meio do povo.
A minha roupa A minha roupa não combina com o ambiente. A minha estampa não cabe no meio daquelas pessoas. A minha alma não sabe se portar dentro de gaiolas. Eu não combino com o tom vigente nem com as cores das paredes. Os meus sapatos destoam totalmente do caminho que tenho seguido. Eu sou uma sobra nos lugares por onde passo e por onde ando com a cabeça erguida ou caída sobre o peito. Eu sou uma essência que não se manifesta, eu sobro em todo o lugar e não quero, talvez, entrar na forma que se multiplica pelos cantos. Mas o que isso me custa não consigo mensurar. Às vezes custa abrir os olhos. Em outras custa mesmo olhar. E as flores dos jardins quando me veem não sabem quem eu sou. Os meus olhos não conseguem enxergar esse mundo.
Lutar ou fugir? Quantas vezes você já não se deparou com uma situação em que quis se esconder ou fugir para não precisar enfrentar? Em algumas vezes é o melhor mesmo, para nos prepararmos e, mais fortes, enfrentarmos o que for. Mas na maioria das vezes já temos tudo o que precisamos e o melhor a fazer é ficar e enfrentar. A verdade salva. E isso significa que é preciso pôr luz sobre o problema, analisar e buscar as estratégias de enfrentamento. Do contrário, não estaremos evoluindo, pois, fugindo a gente adia a solução, adia a verdade, adia a paz. É certo que fugir, se esconder, se omitir parece mais fácil ou, no mínimo, mais cômodo. Mas hora ou outra a situação vai voltar e você vai fugir e ela vai voltar. E quando chegar o ponto em que será preciso resolver em detrimento de não mais andar, você não terá outra opção a não ser enfrentar. E acredite: quanto mais se pratica algo, mais fácil fica. Então, quando criamos o hábito de solucionar os impasses, de dar vazão à vida, ao fluxo, compreendendo que nem só de paz e bondade se constitui o mundo, para cada nova situação mais fortalecidos e prontos nos encontraremos. E adiar deixa de ser uma possibilidade diante da maravilha que é a sensação do caminho limpo, as arestas aparadas. Nossa mente repete a mesma reação diante de situações incômodas, a menos que estejamos atentos a ponto de perceber o fator estressante, conhecer a nossa reação padrão e dar o salto: reagir diferente para alcançar um resultado diferente.
Fugir é ficar A cada vez que jogamos qualquer situação para debaixo do tapete na expectativa de que se resolva sozinha ou com a justificativa de lidar com aquilo mais tarde, estamos, em verdade, entrando mais fundo na lama do pântano que é nosso subconsciente. Vale bem mais o esforço de se olhar no espelho sem máscaras e ver as rugas, as marcas dos acidentes e assumir a história pessoal do que fingir que não é com você. Não é o mais fácil. Exige esforço e sinceridade consigo. Mas é o melhor que se pode fazer: não deixar questões pendentes.
Duvide da dúvida Qualquer que seja o caminho, hora ou outra, a dúvida aparece. Ou o plural dela. É mesmo possível o que sonhamos? Será que o tempo não vai passar em vão? Como diz a canção, será que vamos conseguir vencer? A dúvida é nossa mente tentando encaixar o sonho na parte do cérebro que racionaliza e justifica tudo, que encontra probabilidades, que analisa. O sonho não cabe em um só lado do cérebro, assim como não cabe também em probabilidades. O sonho é uma centelha divina e não possui limites, assim como limites não aceita que lhe imponham, em detrimento de morrer ou sufocar. Duvide da dúvida quando ela aparecer. Questione a questão que sua mente, solta, lhe impõe. A dúvida pode ser positiva, levar a reflexões, adequações, mostrar coisas escondidas, mas não pode limitar, não podemos permitir que a dúvida seja maior que o sonho. O “mas” do sonho é a realidade. Você vive realidades ou cria a sua?
O poder do não Por muito tempo não pude ou não soube dizer não. As coisas me iam sendo empurradas e eu ia fazendo, vivendo, andando. Isso até descobrir que o não pode ser um ato de amor. Todos nós precisamos saber que podemos dizer não sem culpa; a mãe que toma uma decisão com os filhos, o casal que se separa, o trabalho que recusamos, o desrespeito que rejeitamos. Hoje disse um não pelo qual esperei por muito tempo e, confesso, a culpa apareceu. Mas não deixei que ficasse. Todos temos o dever de escolher nosso caminho e o que consideramos melhor para nós nesse momento. Diga não quando tiver que dizê-lo, sem culpa.
Não se cresce andando pelo caminho fácil Perguntou a aprendiz à velha bruxa: — Você percebe que quando tudo está bem e em paz, correndo no caminho escolhido com cuidado, a vida trata de nos desacomodar e pôr em movimento outra vez? E a velha respondeu: — Sim, isso acontece sempre, e muitas vezes é porque aquele caminho escolhido era o que conduziria ao erro, a estrada estava nos tirando da rota, a paisagem havia nos seduzido e feito com que esquecêssemos de continuar aprendendo. Caminho e crescimento necessitam de unidade, não se cresce andando pelo caminho fácil. Paz e acomodação não podem ser confundidas, o guerreiro no campo de batalha pode estar totalmente em paz enquanto desfere golpes e extermina o adversário.
Um novo caminho, ao menos por hoje Sentado no terraço de casa, tenho de um lado o céu azul pipocado de nuvens brancas e pesadas e uma palmeira; do outro um céu alaranjado pelo Sol que vai dormir e o sopro constante do vento. O resto é prédio, prédio, prédio. Vivemos cercados de prédios, família, casamento, empregos que nos bloqueiam a visão. Sempre há algo impedindo a verdadeira compreensão. Todos os dias reproduzimos as mesmas ações baseados na leitura limitada que fazemos da vida (ou que nos deram dela). E nos enganamos quando cremos que o horizonte se abriu e estamos livres. Como a felicidade, liberdade é um estado, e muitas vezes desencadeado pela plenitude, a sensação de se estar pleno (completo). Em arte se costuma dizer que para de fato algo ser considerado arte, precisa desacomodar a assistência, tirar do lugar comum. Observe quantas vezes fazemos isso na vida, quantas vezes quebramos o padrão. Quase nunca. A rotina e a ordem dão a falsa impressão de que tudo está bem e em paz, mas nem sempre está. Às vezes a felicidade e a liberdade são mais duradouras se as experimentamos de formas diferentes das que estamos habituados. "A presa que escapa ao ataque do predador é aquela que não andou pelo mesmo caminho dos outros."
Seguir pelo trilho Que maravilha parar e contemplar o vento dançando, carregando as folhas, saudando o Sol que se põe e prenunciando o sopro da Lua! Parar é uma estratégia porque o humano vive é andando. Explicam-se as tantas histórias sobre peregrinos: o homem é um ser curioso e evolui descobrindo e descobre mudando. Parar para contemplar, para se refazer, planejar. A estrada da alma não tem fim. O milagre é a beira do caminho, o andar e o parar. Mas se o homem construir abrigo e cercar uma área, a humanidade estará morta!
A vida escondida na vida Somos ensinados a nos enganar, na medida em que igualmente nos ensinam, porque assim também os ensinaram, a ter medo e sentir culpa. O ser humano utiliza dez por cento de sua capacidade, dizem. Creio, e afirmo que quanto mais nos despimos e distanciamos dos medos e das culpas mais ampliamos nossas possibilidades e despertamos nossas potencialidades. Ao passo que convivemos com a obrigação de ser o melhor, o mais potente, o mais sensual, bonito, bem sucedido, rico e alegre, e nem sempre o somos, nos defrontamos com os medos, mas não podemos expressá-los porque virou sinal de fraqueza. Nós carregamos até o medo de sentir medo. O medo nos impede inclusive de tentar nos encontrar, porque isso pode ferir alguém. Dane-se! Você só é pleno quando se encontra. Mesmo que encontrarse signifique se questionar diariamente sobre suas ações. E nas vezes em que nos atrevemos a enfrentar o medo e agir, vem logo a dona culpa a acusar a consciência. Até felicidade em excesso é pecado hoje em dia! Tudo precisa andar num aparente equilíbrio que não provoque ou desestabilize ninguém. Nossos instintos foram prensados a frio em sua maioria. Inclusive o sexo é condenado em meio a alardes de modernices e liberalidades. Aliás, liberdade é o que? Senhoras e senhores há uma vida tão imensa escondida nisso que chamamos de vida atualmente que eu não sei nem como é que cabe nessa lama toda em que estamos. Estou convencido de que neste momento só a
vontade individual de abrir os olhos em busca de verdade, harmonia e felicidade é que será capaz de fazer com que despertemos. Aos poucos, um aqui outro ali, vamos avolumando o grupo dos que experimentam viver a vida que foi escondida na vida de agora. E mais um. E mais um. Até que o grupo ocupe tanto espaço que a ampulheta se inverta e o mundo desabe. Quem escolhe encontrar essa diferença escolhe junto aprender, se reinventar, rir de si mesmo, trabalhar firmemente por aquilo que acredita e, principalmente, descobrir em si um poder de ação descomunal e divinamente criativo. Acredite que você pode ser feliz, que seus sonhos podem se realizar e trabalhe, mas trabalhe muito para realizá-los. Encontre dentro de si mesmo uma verdade que faça o seu coração palpitar e a defenda, pelo menos até mudar de verdade. Identifique e rompa com os medos, consciente da dificuldade que isso trará, já que você será um diferente num mundo de iguais. Racionalize as culpas e descubra se precisa mesmo senti-las.
O caminho até a porta Todos nós crescemos e vivemos bloqueados pelo medo que é plantado em nós ainda na gestação. É o medo de perder, de não andar, de não chegar, de não obter, da solidão, da velhice, da pobreza, de morrer, medo de morrer sem um final feliz. Ora, o final feliz não será aquele final dentro do caminho que se trilhou? Aqueles que dizem não os ter (os medos) estão se exercitando em perdêlos, porém, na extinção eu não creio. A única e bendita forma de matar os medos, pela minha experiência, é abrir-se diante deles, encará-los e lutar. Eu sou um menino do interior que, sem expectativa, poderia ter ficado lá e me contentado com o que eu tinha. Mas eu sonhei muito alto e me pus a caminho, sozinho, e sigo andando rompendo a estrada, ainda sozinho, porque peregrinar é um ato solitário. A mudança só acontece dentro do meu coração, na forma que acontece. Você sabe que a porta está lá, que a casa está lá. E sabe disso porque conhece cada detalhe do seu sonho e vem trilhando o caminho até a porta, consciente de cada pedra que removeu, cada rio que cruzou, cada céu que olhou. Até aqui você chegou como? Quando foi que você aprendeu mais? Esperamos “estar prontos”. A possibilidade aparece quando você está pronto. Então, não se prive de viver. Arrisque! O máximo que vai ocorrer é ser feliz!
Pessoas que não fazem cocô Quando você se encontra no seu caminho espiritual, conviver é um exercício. E entre tantas pessoas tem aquelas que não fazem cocô. Já cheguei a sentir ódio por elas, mas hoje me divirto quando as encontro. A pessoa que não faz cocô é aquela que você jamais verá “desmontar”. Ela não ri, não chora, não abraça, nunca parece estar falando a verdade e acredita que o mundo gira em torno de seu umbigo, de seu trabalho e de sua vida. É como se vivesse em um pedestal. Ela pensa que você acredita que ela é o personagem que montou. Porque na verdade ela vive é sobre um queijinho daqueles de boate barata, se remexendo pra lá e pra cá na tentativa de chamar as atenções para si, agarrada a algum título, cargo, sobrenome, casamento ou tudo isso junto. Está desesperada e estilhaçada, mas não vai correr o risco de demonstrar e ser vista como humana. Meus amores, acordem logo para a vida antes que morram e não a tenham vivido. Não estou querendo lhe impor o meu modo de vida, só chamar a atenção para verdades universais. Os títulos, os cargos, os sobrenomes, as relações nada são mais do que processos necessários para se viver na Terra, sendo a vida, os seres, a natureza, o amor o que mais importa. Nada vai salvá-lo na dor ou na morte senão o amor. E amor sem limite, sem regra, sem destino. Só amor. Esqueça do trabalho quando sair da empresa. Olhe mais as pessoas. Passeie com seu filho, cachorro. Olhe os pássaros. Pare. Olhe-se. Ouça-se. Pergunte-se se é feliz e onde a vida que leva
vai levá-lo. Perdoe se eu desmontar tudo. Quando você se reconstruir não me agradeça. As pessoas que não fazem cocô jamais confiam no outro. Mesmo na sua equipe de trabalho, família e no grupo de amigos elas vivem desconfiadas, “ligadas” para perceber qualquer tentativa de boicotá-la, ultrapassá-la, vencêla. Também está sempre atenta para detectar possíveis complôs contra sua pessoa que ameace o seu cargo e o seu status. E o que há de perigoso nisso é a crença de que a vida é aquele mundinho miúdo e medíocre onde a pessoa se instalou e acredita que seja o único. Mundos que em geral cheiram mal por conta das fezes guardadas nas bocas, já que eles não fazem cocô!
Matar os sofrimentos Quantos espaços há entre você e aquilo que você ama? A vida não cabe em um conceito ou um olhar. A vida não cabe, essa é a verdade. Cada um de nós faz algo que não quer em algum momento. Cada um de nós diz sim quando queria dizer não em algum momento. Porque para cada um a vida tem um sabor, uma estrada, um Sol. Perder-se ou encontrar-se, na vida, quase não tem sentido porque tudo é mudança o tempo todo! O que você quer e não tem? O que você sonha? O que você sonha e não sabe que sonha? O que você tem e não quer? A tristeza faz parte da vida como o amor ou a alegria e não deve ser negada ou escondida. O que deve ser evitado é o sofrimento. Sofrer é desconhecer a vida. Sofrer é acreditar que a vida cabe no agora. A vida não cabe. Matar os sofrimentos requer preencher esses espaços entre o que eu quero e não tenho, entre o que faço e o que gostaria de fazer, entre quem sou e quem gostaria de ser, entre o sonho e a ação. Mata o sofrimento aquele que anda e recusa o título de vítima, porque entende que a vida não dá paradas. O sonho só se realiza no caminho. Quando realizado, ele morre. São esses espaços entre você e aquilo que você ama que precisam ser preenchidos para que se mate os sofrimentos.
Raízes Aquilo que nos é ensinado como verdade durante a infância penetra tão fundo na alma da criança que chega a doer quando, mais tarde, você decide por arrancar aquelas que não fazem mais sentido. O hábito é o antivida. Comer quando se tem fome e dormir quando se tem sono deveria ser o natural. Mas nos ensinaram o contrário, nos ensinaram a tentar dominar a vida e o instinto. Ensinaram outra vida. Ensinaram a se adequar, a matar ou esconder a criança interior. E isso foi exterminando pouco a pouco a vitalidade até chegarmos ao estado atual: zumbis conectados desfilando pelas ruas presos em cápsulas de vidro resfriadas. Toda maneira de controle do que é natural e instintivo é antivida. E nós fomos ensinados a boicotar a nós e aos outros através do julgamento e do conceito de normal, a normose, “o que todo mundo faz”. Todo mundo faz e vem sendo letal para a maioria de nós! A minha experiência vem sendo resgatar a minha identidade, descobrir quem eu realmente sou todos os dias, em cada situação, com cada pessoa e comigo mesmo. Sim, melhorar não acontece tomando uma cápsula, é preciso constante vigilância e limpeza. Indo lá no fundo, nas raízes de mim mesmo, sou capaz de observar a essência, as raízes da árvore da minha vida e de mim mesmo e cortar aquelas que alimentam os vícios, e as perturbações. Dessa forma, diária e constantemente vou me limpando daquilo que boicota minha existência.
O amor na soleira da porta Desde que o homem conta histórias exalta o amor. Rendemos a arte, a vida e a história ao amor, essa palavra de sentido subjetivo que une a humanidade e dá direção à caminhada de todos nós. Que se perceba o amor como um ato de fé, como algo por quê viver, e não somente na relação entre as pessoas. Mas durante os dias que costuram a vida na Terra muitas são as vezes em que caímos, descrentes no amor e na vida. Cremos que estamos sozinhos e que o amor é para os outros. Nessa celeuma de origem superficial abrimos a porta de nossa casa e só vemos a rua. Andamos e só temos uma direção. Paramos, mas é só o corpo que para. Se abríssemos a porta com os olhos encharcados de amor veríamos que o verdadeiro amor está sempre na soleira de nossa porta, à espera de um sorriso para entrar. Mas amar o quê? O amor não pode depender do outro. Assim como também não pode esperar, amor é urgente e requer rigor nisso. Faz toda a diferença abrir a vida inteira para o amor ou somente amar alguém. O amor exige de nós algo bem simples: permitir-se, deixar-se, libertar-se. Liberdade. Ele só vai existir plenamente se houver liberdade. Liberdade de ação, de pensamento, de palavra, de vida. Sei que parece difícil compreender isso pela nossa cultura ocidental que prega o amor como uma prisão, mas vale, no mínimo, o exercício de conhecer o amor na sua totalidade. Vá até a porta. Abra-a. E deixe-a aberta.
O autor Como professor atuou com diversos grupos em diferentes espaços até dedicar-se ao envelhecimento humano. Como palestrante circulou por diferentes temas, especialmente qualidade de vida no trabalho, vestibular, envelhecimento e criatividade. Dedicado à literatura desde 2006 tem textos publicados em revistas, coletâneas, blogs, sites e jornais. Para saber mais, acesse o blog do autor. Twitter: www.twitter.com/DanPorto10 Facebook: www.facebook.com/DanPortoEscritor Blog: www.danporto.com
Outros livros do autor Raridades (Multifoco, 2011) Pequeno Manual do Vestibular (Novitas, 2009)