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Um dos maiores ícones da nossa cultura, cantor e compositor vive uma fase inédita em sua carreira. Perto de completar 69 anos, alça voos cada vez mais internacionais ao mesmo tempo em que se volta musicalmente às influências juninas da sua infância 42
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por davi carneiro FOTOS divulgação
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FOTOS Beti Niemeyer
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encantador do mundo W W W. L E T S G O BA H I A .CO M . B R
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Presente, com sua militância musical ou política, nos principais eventos dos últimos 40 anos, a carreira do baiano Gilberto Gil se confunde com a história da cultura brasileira. Ícone da MPB, ministro da Cultura de janeiro de 2003 a julho de 2008, dono de uma carreira antológica, Gil foi corresponsável pelo movimento Tropicalista, nos anos 60. Hoje, já senhor - com a cabeça tomada pelo branco do tão cantado Tempo Rei, mas conservando a elegância de sempre - Gilberto Gil vai adentrando uma fase inédita em sua vida profissional. Ao mesmo tempo em que alça voos cada vez mais globais, ora cantando na China ora filosofando em meio a uma tribo aborígene na Austrália, Gil parece partir em busca dos seus interiores: seja o do ambiente externo, com a regionalidade das primeiras influências, seja o da essência pessoal, com a serenidade conquistada ao longo dos anos. O cantor e compositor anda empenhado, com o gás de um iniciante, em diversos projetos, que vão desde turnês no plano regional e internacional, passando pela trilha da novela Cordel Encantado, da Rede Globo, até chegar ao documentário cinematográfico Connecting South, do qual é o protagonista.
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Ê volta do mundo, camará “Antes mundo era pequeno/ Porque Terra era grande/ Hoje mundo é muito grande/ Porque Terra é pequena/ Do tamanho da antena/ Parabolicamará” Assim como nos versos da música Parabolicamará, Gilberto Gil vai, atualmente, seguindo sua volta do mundo. Gilberto Gil alçou voos mais globais em seu último giro com o espetáculo The String Concert. A turnê aconteceu entre março e abril e contou com 19 shows. O repertório do concerto faz parte do disco Bandadois, elaborado e apresentado durante dois anos com o seu filho Bem Gil, que toca violão e percussão, e com o talentoso violoncelo de Jaques Morelenbaum. “Um concerto de cordas em uma sala de visitas” é como Gilberto Gil gosta de apresentar o trabalho. A turnê aclamada passou por cidades como Los Angeles e Chicago (EUA), Paris (França), Ljubljana (Eslovênia), Viena (Áustria) e Macau (China). No repertório, o cantor revisitou sucessos como Metáfora, Estrela, Andar com Fé e Expresso 2222. Apesar da agenda movimentada, o baiano afirmou que quer fazer uma música mais pessoal: “O corpo e a alma me pedem uma música mais íntima, mais interior”, admitiu à Agence France Press.
Ainda no plano internacional, Gilberto Gil assumiu um novo desafio. E dessa vez no cinema. Ele protagoniza o documentário Connecting South, TheNnew World, do francês Pierre-Yves Borgeaud. No filme, Gil viaja pela conexão política-geográfica que começa a unir países e povos do eixo sul do planeta, expondo, discutindo e refletindo experiências existenciais, musicais, poéticas, políticas e filosóficas. Depois de Salvador, onde visitou terreiros de candomblé e afoxés, Gil foi à África do Sul, onde teve encontros personalidades, como o Bispo Desmond Tutu, e à Austrália. “O objetivo é colocar em discussão as diferenças entre os hemisférios norte e sul. A História tem mostrado o norte como colonizadores e o sul como as vítimas desse processo. A música tem sido um dos elementos de sobrevivência e sustento da cultura popular, além de uma poderosa ferramenta de comunicação entre povos de diferentes culturas”, afirmou o artista ao sitede notícias sul-africano IOL. O longa tem previsão de estreia para 2012 na Europa.
Não falo aqui do homem que o tempo tem polido com sabedoria, nem do chefe tribal que ele é com a família. Hoje falo sobretudo do cantor que atende, como poucos e raros, ao deus do ritmo” Tom Zé, músico e compositor
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ÍCONe De VÁRIAS GERAçÕES Em 1965, o baiano de Ituaçu Gilberto Gil morava em Salvador, onde concluiu o curso de Administração de Empresas da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e onde conheceu Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gal Costa e Tom Zé. Com eles, em 1964, inaugurou o Teatro Vila Velha, lançando a base da Tropicália. “Meus sonhos e de toda uma geração continuam até hoje em suas músicas, Gil tem a capacidade de me emocionar como poucos”, diz Sônia Robatto, uma das fundadoras do espaço cênico. O cantor e compositor Jorge Mautner conheceu o artista em 1970, durante o exílio político do artista em Londres, e lançaram o movimento Figa Brasil. “A carreira de Gil toda é possuída pelo fogo do Espírito Santo, cantar e compor são funções da missão religiosa que o impulsiona, sem explicação em plena densidade dos mistérios inexplicáveis”, filosofa. Tom Zé, uma das figuras mais originais da música popular brasileira, participou da Tropicália ao lado de Gil. “Ele põe no que canta o encanto rítmico da Bahia. É um afortunado
toque de Midas que lhe coube. De seus outros atributos, certamente os que depõem aqui vão falar: do grande compositor, do que arriscou como homem público. Mas veja lá, cantando baião, samba, verso jamaicano, seja o que for que precise de seu escandir, não tem pra ninguém”, exclama Tom. Já o escritor Muniz Muniz conheceu Gil em 64 em um bar de Salvador e considera que ele “foi convocado pelos orixás para jogar na seleção nacional desses criadores que, há muito tempo, substituem os partidos políticos como intelectuais coletivos das massas. Não só astro da canção, Gil é um reencantador de mundo”, conclui. Daniela Mercury, que gravou várias canções com o cantor e compositor, como Toda Menina Baiana, Vamos Fugir e Amor de Carnaval, o considera um mestre, “uma grande influência na minha carreira e um amigo muito querido. Aprendi muito com ele no início da minha caminhada e continuo aprendendo. Sou uma admiradora do seu talento musical, que é único”, declara Daniela cheia de admiração.
Gilberto Gil é, ao mesmo tempoespaço, um clássico e um moderno, um erudito e um popular, um conservador e um revolucionário” Jorge Mautner, músico e filósofo
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FOTOS Marcos Hermes FOTO Arlette Kotchounian
FOTOS Christian Rôças
FOTO Arlette Kotchounian
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ANDAR COM FÉ, eu vou Festa e fé são velhas conhecidas da cultura brasileira. Parceiras que, muitas vezes, se entrelaçam em uma coisa só, especialmente na Bahia. E o ciclo junino é um desses momentos em que essas expressões populares se expressam fortemente, daí o nome do novo álbum de Gilberto Gil, Fé na Festa. O álbum, composto quase todo por músicas inéditas e totalmente dedicado ao universo das festas juninas, foi concebido tendo a tradição da sanfona, zabumba e triângulo como referência, mas com inclusões de elementos pouco convencionais ao forró como a guitarra e elementos eletrônicos. Graças a esse trabalho, Gil foi laureado com um dos maiores prêmios internacionais da música, o Grammy Latino na categoria melhor álbum de músicas de raízes brasileiras. Além do prêmio por Fé na Festa, o cantor ganhou o de melhor álbum de música popular brasileira, pelo CD/DVD Bandadois. Com o show dedicado ao forró, o músico se programou para abrir os festejos juninos do Rio de Janeiro, na Quinta da Boa Vista, e da Bahia, com shows em Salvador, São Sebastião do Passé e Imbassaí. Da Bahia o tour de Gil seguiu para os estados da Paraíba e Ceará. Em Julho, ele leva o Fé na Festa e para vários festivais, o Úmbria Jazz, em Perugia, o Jazz à Vienne, em Viena, Martigues, Antibes, Cartagena, só para citar alguns. Quando perguntado sobre os motivos que o fizeram voltar ao forró, Gil é enfático ao responder: “Nasci em 1942 e passei os primeiros momentos interessantes da minha infância no sertão, no interior da Bahia, daqueles com pracinha com uma igreja, coreto e tudo o mais. Sou fruto desse mundo e meu primeiro mestre foi Luiz Gonzaga. É por isso que tenho essa paixão, por isso é coisa de infância. Gosto de revisitar a música inicial de minha vida, que está infiltrada em meu coração.” É a chegada dos anos levando o cantor ao início do seu tempo, quando ainda era um pequeno menino fascinado por música.
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contoS globaIS Foi justamente ao voltar para o universo nordestino que Gil manteve a sua doce rotina de emplacar sucessos nacionais. Seu mais novo hit, todo em ritmo de forró, é a música Minha Princesa Cordel, música da abertura da novela da faixa das 18h da Rede Globo, Cordel Encantado. A música-tema da novela conta com a participação da cantora Roberta Sá na segunda parte da canção. De acordo com a diretora Amora Mautner, a ideia de convidar Gil para escrever a canção de abertura partiu da autora, Duca Rachid . “O Gil é como meu tio, porque é um dos melhores amigos do meu pai (o compositor Jorge Mautner). Quando estávamos pensando na música, a Duca sugeriu o nome do artista, mas ela pensou nisso como um sonho. Marcamos um almoço e fizemos o convite. Contamos a história da novela e ele logo se animou”, diz a autora no site oficial da Globo. Ainda segundo Amora, Gil levou apenas uma tarde para fazer a composição e deixou todos muito satisfeitos com o resultado: “Parecia que ele tinha lido a trama inteira. A música é genial. Foi uma benção para a novela”.
Lembro bem da primeira vez que o vi no Vila. Sua música tinha alma, sonhos, vinha diretamente do coração” Sonia Robatto, cofundadora do TEATRO Vila Velha
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