debaixo do
BULCร O poezine
Nยบ47
debaixo do
BULCÃO poezine
Adelaide Arsénio | António Barros António Pedro Ribeiro | AV2017 Francisco Cardo | João Gomes João Soares | Mariana Leitão Mônica Quinderé | Norma D'Alma Odete Espelhos Ínvios | Ondina Pires Rômulo Ferreira | Sílvia Isidoro Sónia Oliveira | Thina Curtis | Zé Carlos grafismo & Ilustrações helena barbagelata simões
com o apoio:
natália restaurante e tapas 2
Póvoa de Varzim
numero 47 | abril 2018
colaboram nesta edição
basalto uma arma de fogo , 2017 I Antรณnio Barros
3
ADELAIDE ARSÉNIO
apocalipse Era o fim do começo, e ninguém supunha, nem imaginava, e todos viviam, como se aquele, fosse mais um dia. Era o principio do fim, todos se assustaram, todos se aterraram, e o pânico começou. Como foi, ninguém teve tempo para ver, só houve tempo para a salvação, uns tiveram sorte, outros não. Foi o final do fim, e era só silêncio, e a paz imensa, de ser nada, de ser de novo. E todos voltaram a viver, como se fosse o último dia, mas já não eram os mesmos, os que se salvaram, eram outros, os que já sabiam e supunham.. Era o começo de outro tempo, que retorna, ao outro que já foi.
4
basalto uma arma de fogo , 2017 II Antรณnio Barros
5
António Pedro Ribeiro
incendio
Incêndio. Estou em brasa. O país arde. O whisky queima. Não consigo dormir, nem sequer permanecer na cama. Os olhos ardem. Sou poeta ébrio. A Câmara em fogo. Incêndio na minha alma. Suspiro por água. Bebi muito vinho. Incêndio. Celebro o apocalipse. O novo tempo. Bebo água. Amanhã apetece-me conquistar o mundo. Derrubar muros, muralhas. Ai, mãe, estou tão louco. Reinos e impérios só para nós, Gotucha. Partir em busca de mim no universo. Festas, festins. Com Morrison, com Zaratustra. Incêndio. O mundo a meus pés. No grito. Na dança. AMR. Tenho que ser mais expedito a falar. Tenho que incendiar. São 4 da madrugada. Casa de Vilar do Pinheiro. Estou em fogo. No Porto, a partir de certas horas, em certos lugares, há personagens que me vêm abraçar. Devo um pedido de desculpas ao Zé Silva. O André Sá fez uma interpretação brilhante da minha obra. A vida corre e eu ardo. Incêndio em mim, no meu cérebro, na minha alma. Está a chegar o Grande Meio-Dia. Os galos cantam. A Gotucha em Braga. Incêndio. Estou em fogo. O álcool queima.
6
basalto uma arma de fogo , 2017 III Antรณnio Barros
7
AV2017
grande plano de actividades para a cultura
os artistas fazem arte porque há liberdade de expressão
os poetas poetizam porque há liberdade de expressão
os actores actuam porque há liberdade de expressão
os jornalistas ouvem o que nós dizemos publicam o que nós dizemos e não fazem perguntas chatas porque isso seria um atentado à nossa liberdade de expressão
viva o poder local democrático e a liberdade de expressão
(o presidente? oh, ele adora a ideia. ;) )
8
maquina de pau Rรณmulo ferreira 9
FRANCISCO CARDO
dilema Quão incómodo me sinto na minha pele de prosaico actor rebelde e dissidente a razão amotinou-me de forma tão cruel que subversivo me libertou consequente quão incómodo me sinto na minha pele neste amor ódio resvalando num tropel
A impaciência é uma constante destes dias imprevidentes como o suceder de temporais em que a rima cobre libertária de iguarias o verbo indomável quase sitiado de sinais a impaciência é uma constante destes dias passados na agridoce exaltação das utopias.
contradicçao Qual o preço por ser voz e ir à frente qual o peso e a medida diferente para os primeiros dos gestos inteiros
10
a desafiar o presente No espectral poente de árvores nuas pelo areal de silêncios capicuas a forca dos dias..... aponta heresias pela noite estreita das ruas Existe um código de canga e arnês filão pródigo a pautar o entremês de obediências e cautelas pelas entretelas da pragmática sensatez Mas pelo crivo de cada palavra assim subversivo a mudança se alinhava seja ou não preciso ter um dia do juízo em cada hora que se lavra.
11
12
JOÃO GOMES
absolutus Absoluto é o amor! Mesmo perdido na agua. Parido do erro e da dor! Absoluto é a flor! Que bebe da agua! Que a suga com amor! absoluto é a paixão! Da carne que se mistura com o calor do perdão! Á morte do sentimento quando se acaba a tesão! A nosso corpo que levam inerte para dentro do caixão! Absoluto é o momento! Onde olhas para o amor em vão! Onde perdes a razão e te moldas ao absoluto do pulmão! Absoluto é o ar! Que dele respiras e te faz expirar! Absoluto é o suspiro! Que das a cada batida do coração a cavalgar! Absoluto é a razão! O teu cerebro escravo. Que chicoteado executa a obrigação. Absoluto é o fim! O tempo que não podes parar! O fim do eu do teu e do que nunca vai perpetuar! Absoluto é o eu! 13
Que transpoem a barreira de ser! Acenta a tinta no papel! E com ela salta sobre o seu eu que está aqui até se ir embora! Sendo absoluto que acaba! Como o que escrevo nesta hora! Absoluto em si mesmo! Como tudo acabará absoluto no agora!
14
15
JOÃO SOARES
florestar inteiramente
Ser vegetal florido fruto virgem por vezes despido sem pétalas milenário centenário jovem fóssil vivo guardador de água, de seiva e de luz de amores, impérios, pão, noivados, fotografias bolos, declarações, quintas e turismo Vergonha não aliarmo-nos em sangue, em genes em estarmos na mesma linguagem das sua folhas dos ramos e escutarmos a água que conserva em seus troncos Que nos defende do clima Dos ruídos das cidades Dá-nos sombras e muitos dedos de conversa com elas e com "gente" dentro- pássaros, lagartos, borboletas- e entre gente Dá-nos sorrisos e pureza Todo o ano. Inteiramente.
16
17
MARIANA LEITÃO
flor vermelha Flor vermelha! Haja nesse vermelho uma magia! Nessa luta uma cor! Haja sempre essa força que nos guia até ao brotar da nossa flor! Cantem-me uma canção de liberdade nesta imersa madrugada… Quero ouvir a verdade que nos traz a alvorada! Que toque a emoção! Deixe-se soar a rádio em tom de oração! Dispam as vossas fardas e vistam a rigor a vossa mente! Larguem as vossas espingardas e disparem a ideia que vos mente! Soltem essa gaivota que quer dizer à
multidão
que prefere a sua solidão a esta sociedade devota! Acabemos com toda esta adoração que nos impede de crer... que não nos deixa ver... Seja feita a revolução! 18
19
Mônica Quinderé
decifra- me Só não exceda as medidas Pois irá soar como ameaça Em esgotar as investidas Ao final perderá toda graça.
Bem que te seduz um certo enigma O eterno gozo do perigo Como um real estigma Revelando um castigo.
Cautela com teu tesouro Não exponha tua descoberta Não haja como um calouro O bom senso em alerta.
Um pouco de mistério Nas sutilezas presentes Pouco importa o banal critério Pois o desfecho se pressente.
Percebera as faces De meus supostos segredos Que te atraiam os enlaces Dos meus doces enredos.
20
21
Norma d’alma
ocidentalmente
do que poderíamos beber vinho esquecimento restou a espuma flácida pós - naufrágios pequenos quereres escassos dividendos a rechear abrigos aquosos rectângulos
POR INÉRCIA
só um ror de insectos deambula em torno de lâmpadas esvaindo-se em módulos de tempo segregado
quanto fel entre súplicas perenes quocientes de envelhecer e de restos fenecendo
NA ORLA
22
23
ODETE ESPELHOS ÍNVIOS
solidariedade impontual ao espírito da quadra
alguns raríssimos atributos que se atribuem e se tributam a um tal palestino que esquecido dos seus ancestros se abstém de intifadas a adúlteras privilegiando a dádiva da face outra em detrimento doutras anatómicas partes com que se senta com tanto à vontade à direita do pai quão se tenta no baloiço do retrovisor de um bê eme dâblio e no embalo se vai preparando para a anual deita nas palhinhas por esse mundo afora de deus que teima em não dar ar de sua graça pois jamais se viu a sua dele assinatura nas inúmeras petições que para aí pululam em prol dos famintos e sedentos de justiça sejam eles justos comedores de faisão e bebedores de moët&chandom ou outros igualmente justos adeptos da sandes de torresmos e do copo três ou ainda outros muitos mais de mil que pouco ou nada mordem mas persistem em mover-se entre montanhas de fezes e fezadas enfeitando emblemas de lapela reconhecidamente importantes para a obtenção de um lugarzinho nos presépios sem remuneração em cargos não executivos com direito a celestiais reformas seguramente solidárias a meio da quaresma sem pontuação. ! ...
Dia de São Cesário Nazianzo, vigésimo quinto de fevereiro do ano da graça de dois mil e dezoito, segundo domingo da quaresma.
24
25
Sílvia Isidoro
visualiza um “se”… Visualiza um "se" E depois sem Perguntar nada Faz da premissa Uma verdade Da consequência Também uma verdade E assim Vai ganhando galardões Para acrescentar No seu casaco. E inventa o alquimista Da alma."
in “Contos Acabados”
26
27
SÓNIA OLIVEIRA
una os pontos una os pontos 1 pari-me um nada morto um pedaço de carne só coração cujo movimento re pugna sou assimétrica in acabada 2 a minha mãe perdão a minha mão não soube arrancar-me do fundo do ventre redondo e turvo onde me agarrei 3 a minha mão segura apenas um coração e não sabe o que fazer com ele a minha mão segura-se ao coração 4 cada vez que te enganas a ler-me eu morro depois renasço como posso e deixo que me leias de novo só para poder ver os teus olhos 5 cada vez que te enganas maior é a tua certeza afiada tens de sentir (tens de sentir) como a tua certeza (errada) corta o atilho que me prende a alma a um dedo
28
6 sente 7 piso as presas da calçada uma_______a______uma pisarorisconãovale 8 cada vez que nasço põem-me num frasco já não sei como se faz para nascer inteira vou nascendo às prest acções 9 confio nos números nos rótulos dos frascos
THINA CURTIS
devaneios Natureza morta Na cidade industrial Zumbis vagueiam Cyber-homens conectados no universo digital Homens destroem a mĂŁe natureza Tudo cinza Paisagem de concreto Pela noite adentro Ainda sinto a noite como um ritual A loba que habita em mim Arde em chamas Vagueia Noites e noites Madrugas adentro Labirintos e tempestades em mim.
29
o extraterrestre sedutor ONDINA PIRES 30
ZÉ CARLOS
II poemas
Como Uma múmia Hermeticamente selada Nos destroços do Titanic...
O poeta é aquele que disfarça a desfaçatez sob o deslumbre das palavras...
31
32