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Ideologias à parte, todos concordam que o Brasil passa por uma crise econômica que parece longe de um ponto final. Se já tivemos carnavais como o da meia-volta mangueirense na Apoteose e até mesmo o da genitália desnudada, volta e meia pinta na Avenida uma folia apelidada de “carnaval da crise”. E é aí que entra em cena a máxima do carnavalesco Fernando Pamplona (líder de uma geração de cenógrafos que dominaram a festa a partir dos anos de 1960, e falecido em 2013) – “tira da cabeça o que não tem no bolso” –, espécie de mantra gravado na alma dos barracões. Até porque, se pensarmos nos grupos de acesso, os desfiles já trazem embutido um histórico fantasma de escassez. O que não pode faltar é a tal da criatividade, e por isso os artistas encaram qualquer sinal vermelho de crise sob outra ótica: a da ruptura com eventuais marasmos no processo de criação, através da busca de alternativas mais simples. Tetracampeão da folia, o carnavalesco Renato Lage sabe como poucos extrair efeitos de recursos baratos. No começo da carreira, em 1981, na Unidos da Tijuca, desenvolveu “Macobeba: o que dá pra rir, dá pra chorar”, em que narrava a peleja do caboclo Mitavaí contra o monstro Macobeba. Sem dinheiro para ousadias estéticas, Lage estabeleceu um ponto ‣
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Luxury Artisans The crisis drives us on and we can’t stand idly by because the festival has a deadline. In some cases, lastminute creations are better than expected. That is the mystical side of carnival Besides ideologies, everyone agrees that Brazil is undergoing an economic crisis that seems far from finishing. If we already have had carnivals like Mangueira’s half-turn in the Apotheosis, and even of full frontal nudity, sooner or later a revelry nicknamed “carnival of crisis” appears. And that’s where the motto of carnival artist Fernando Pamplona (leader of a generation of set designers that dominated the festival in the 1960s, and who died in 2013) comes into play – “take from your mind what you don’t have in your pocket” (tire da cabeça o que não tem no bolso) –, a kind of mantra engraved in the heart of the work sheds. Because, when considering the access groups, their displays already have inbuilt the ghost of the past lack of resources. What cannot be missing is creativity, and this is why the artists confront any red light of crisis from another viewpoint: breaking with possible stagnations in the creative process by looking for simpler alternatives. Four times carnival champion, carnival artist Renato Lage knows like no other how to extract effects from cheap resources. In his early career in 1981 in Unidos da Tijuca, he developed “Macobeba: what makes ‣
A partir da construção da Cidade do Samba, os carnavalescos receberam um local com estrutura setorizada: uma verdadeira fábrica de sonhos After Samba City was built, carnival artists now had a place structured in sectors. A real factory of dreams
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de inflexão no uso de materiais: o carro que representava o monstro era todo feito em com copinhos de plástico. Foi um assombro! “A crise nos impulsiona, e porque não dá pra ficar de braços cruzados, a festa tem data marcada. Em alguns casos, a criação de última hora sai melhor do que o planejado. É o lado efêmero e místico da festa”, frisa. Já campeoníssimo e estrela da festa, em 1999 o carnavalesco repetiu a dose e usou copinhos plásticos para enfeitar a gola e o pompom de uma escultura que retratava um pierrô no antológico “Villa-Lobos e a Apoteose Brasileira”. “O Renato trabalha há muitos anos com uma equipe que tem a confiança dele. Isto ajuda demais, já que todos falam a mesma língua”, analisa Gustavo Melo, diretor cultural do Salgueiro. Esta característica de criação coletiva, e que envolve artistas variados, é o grande charme da festa. “São escultores, são pintores, bordadeiras. São jardineiros, vidraceiros, costureiras, figurinista, de-
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you laugh makes you cry”, in which he told the tale of caboclo Mitavaí’s battle against the monster Macobeba. Lacking money for aesthetic ventures, Lage marked a turning point in the use of materials: the float representing the monster was made completely of plastic cups. An amazing feat! “The crisis drives us on, and we can’t stand idly by because the festival has a deadline. In some cases, last-minute creations are better than expected. That is the ephemeral and mystical side of carnival”, he stresses. Already top champion and star of the show, in 1999 the carnival artist repeated the dose and used plastic cups to decorate the neck-ruff and pom-poms of a sculpture of a Pierrot in the iconic “VillaLobos and the Brazilian Apotheosis”. “Renato has been working for many years with a team he trusts. This is a great help, since everyone speaks the same language”, comments Gustavo Melo, Salgueiro’s cultural director. This characteristic of collective creation, involving various artists, is the festival’s valuable asset. “They
A alegoria As Saturnálias: Festança em honra ao Deus Saturno apresentava semelhanças aos navios e desfilavam na “avenida” enfeitada com flores para saudar o fim da primavera e a chegada do verão The float Saturnalias: Celebrating SAturn the God paraded like ships down the avenue decorated with flowers to welcome the departure of Spring and arrival of Summer
senhistas e artesão. Gente empenhada em construir a ilusão”, destacou Martinho da Vila em “Pra tudo se acabar na quarta-feira” (1984), samba e enredo da Vila Isabel que louvava justamente o “chão de fábrica”. Este trabalho fundamental dos profissionais muitas vezes anônimos foi tema de livro – “Artesãos da Sapucaí” (editora Olhares) – produzido pelo artista plástico Carlos Feijó e pelo fotógrafo André Nazareth. Para Feijó, são três os grandes “Papas” dos barracões. “Sergio Faria, aderecista que brilhou sobretudo na Imperatriz, foi o percursor do desmonte (fase de reutilização de matérias para o ano seguinte). Já o Jorge Mendes Tourinho, ferreiro, introduziu o motor nos carros alegóricos. E não poderia me esquecer do escultor Glinston Dias de Paiva, o cara que inventou o pêndulo, ferramenta de corte em isopor que permitiu agilidade e precisão na modelagem de peças grandes”, lista. Com a experiência de quase 25 anos no carnaval, a artista plástica Andrea Vieira, assim como Glinston, é uma das mais requisitadas quando o assunto é escultura. “Este é um dos elementos mais importantes numa alegoria. Mesmo de isopor, e não de pedra mármore ou granito, ainda carrega os princípios básicos da obra como arte e ofício”, diz ela, que se formou na Escola de Belas-Artes (UFRJ). Mas o trabalho de meses a fio, ‣
are sculptors, painters, embroiderers. Gardeners, glaziers, seamstresses, costume designer, draftsmen and craftsman. People committed to building the illusion”, Martinho da Vila emphasized in the Vila Isabel samba and theme “For all to end on Ash Wednesday” (1984), that praised precisely the “shop floor”. This basic work of the professionals – very often anonymous – was the topic of a book – “Artisans of Sapucaí” (published by Olhares) – produced by the artist Carlos Feijó and photographer André Nazareth. Feijó says that there are three “high priests” of the work sheds. His list includes: “Sergio Faria, prop man who was brilliant, especially in Imperatriz, and forerunner of recycling (phase of reusing materials for the next year). Then Jorge Mendes Tourinho, blacksmith, introduced the engine in the floats. And I couldn’t forget sculptor Glinston Dias de Paiva, who invented the pendulum, a polystyrene cutting tool that gave flexibility and precision when modeling large pieces”. Artist Andrea Vieira, graduate from the School of Fine Arts (UFRJ), with almost 25 years of carnival experience, as well as Glinston, is in most demand when the matter is sculpture. “This is one of the most important elements in a float. Although made of polystyrene and not stone, marble or granite, it still involves the basic principles of the work as an art and craft”, she explains. But the work of months ‣
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Os adornos e adereços dão vida à imaginação do carnavalesco. Esculturas ganham cores e tons à semelhança da realidade The adornments and trimmings bring life the carnival artist’s imagination. Sculptures are painted in real-life colors and tones
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São escultores, pintores, bordadeiras. São jardineiros, vidraceiros, costureiras, figurinistas, desenhistas e artesãos. Gente empenhada em construir a ilusão
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Após o período de gestação no barracão, a alegoria ganha vida na avenida em meio a uma explosão de cores e alegria After the working period in the shed, the float comes alive on the avenue amidst a burst of color and exhilaration
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muitas vezes com sol na moleira, se acaba nas Cinzas. De que forma lidar com o fato de que destruir e reconstruir são partes do processo? “Sei que muita coisa sumirá ou será reaproveitada no ano seguinte em outro contexto, ainda mais agora diante da crise. Com o tempo, aprendi que o carnaval é assim, feito para durar apenas sob os holofotes. Mas tive uma peça escolhida para ficar na praça da Cidade do Samba: os índios que ilustravam uma alegoria da Viradouro. Estão lá desde 2006 e viraram os guardiões do espaço. É um orgulho”, emociona-se. ★
on end, very often with the sun beating down on her, ends on Ash Wednesday. How does she deal with the fact that destroying and rebuilding are parts of the process? “I know a lot of things will disappear or be recycled the following year in another context, especially nowadays, considering the crisis. Over time, I learned that Carnival is like that, made to last only under the spotlights. But I had an item chosen for the Samba City square: the Indians that decorated a Viradouro float. They’ve been there since 2006 and have become the guardians of the space. I’m so moved”, she says proudly. ★ Rio Samba e carnaval 77