SÁBADO, 26 DE ABRIL DE 2014
Universidade bombardeada
Contra as versões, deve prevalecer a verdade: a UFSC, com 54 anos de história, sobreviverá, não sem cicatrizes, aos ataques POR MOACIR LOTH *
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Ministério Público esteja solicitando a aplicação da Lei de Segurança Nacional (LSN), como saiu na imprensa. Monstrengo da ditadura, foi usada na Novembrada de 1979. A impressão que fica é de que, 50 anos depois do golpe, a democracia continua ameaçada. A “anistia” a torturadores e assassinos cobra o seu preço! Revisar a lei é uma questão de justiça. E a PM fez o seu trabalho? Ela não questionou a origem das ordens? E se Hitler ou um fanático estivesse no comando da “operação fiasco”? E não foi armação “abandonar” os carros depois da barbárie? A reação das vítimas da violência não fazia parte do roteiro? Nem Obama, para matar Bin Laden, produziu tanto estardalhaço! A perseguição política é uma injustiça que jamais será perdoada. Quem escreveu esta triste página ficará para sempre na história como inimigo da democracia. Ditadura nunca mais! Daqui a 50 anos ainda estaremos tentando “entender” o que aconteceu. Teria sido uma forma singular de lembrar o golpe de 1964? Foi um malsucedido teste para a Copa do Mundo? Uma simples afronta à universidade? Ou mera incompetência? Historiadores, como Paulo Pinheiro Machado – que elucidou a Guerra do Contestado – ajudarão a destrinchar as razões e objetivos do famigerado atentado contra estudantes, professores, trabalhadores, crianças e jornalistas. Pedir a cabeça da reitora é fazer coro com o delegado e enfraquecer a universidade. A Copa se ganha, olimpicamente, em campo. O mandato vai até 10 de maio de 2016. * É jornalista, ex-diretor da Agência de Comunicação da UFSC, e membro da Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas
A reação às forças repressoras não enxovalhou nem envergonhou a universidade como fazem acreditar seus inimigos internos e externos. Ao contrário, provou que a UFSC continua digna do nome e representativa na sua tradição de luta. A sua coragem é motivo de orgulho. O golpe não foi só contra a UFSC. É um golpe contra todas as universidades e instituições democráticas.
Professor da universidade e estudantes em negociação com a tropa de choque da Polícia Militar na ação que resultou em confronto no campus da Trindade, após a operação da Polícia Federal contra o consumo de drogas no local em março passado
MARCO FAVERO, 25/3/2014
conceito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) não foi arranhado em um milímetro com o ataque covarde e imperdoável cometido no dia 25 de março pelas forças de segurança. Já a imagem da Polícia Federal, ao convocar a tropa de choque da Polícia Militar para atentar contra a vida da comunidade universitária, ficou manchada de sangue. Ao reagir, a UFSC deu exemplo de dignidade ao país e uma demonstração de apreço à democracia. Fazendo lembrar os piores momentos do golpe militar de 1964, as polícias espancaram e violentaram a comunidade universitária como nunca antes na história desta universidade. Uma “operação fiasco”, com pastores farejadores, foi montada e executada no campus Trindade. Policiais paisanos, com veículo descaracterizado e com placas frias, podiam ser confundidos até com sequestradores! A universidade soube responder legitimamente e, apesar de violada na sua autonomia, defendeu, com insistência, uma saída negociada, honrosa para as partes. Os fatos e a verdade demonstraram claramente que o delegado da PF fez ouvidos moucos e preferiu a barbárie ao apelar para a tropa de choque. Cumpria, dessa forma, um roteiro traçado para um filme de aventura e terror! Enquanto dialogava, procurando um caminho sem violência, a comunidade universitária foi surpreendida com um ataque cruel, brutal, inimaginável num regime democrático. Bombas, balas de borracha, gás lacrimogêneo, spray de pimenta, cassetetes e pastores,
tudo a que polícias desorientadas não deveriam ter direito, foram usados massivamente contra um povo desarmado e dentro de uma universidade pública, num local próximo a uma creche com crianças de zero a seis anos. O delegado só faltou prender a reitora e dar voz de prisão à comunidade universitária. Os excessos resultarão, certamente, em processos. Autorizados ou obedecendo ordens, não interessa, o fato é que as ações irresponsáveis levadas a cabo no bosque da UFSC se configuram em verdadeiras tentativas de homicídio. Artefatos bélicos com validade vencida há um ano foram lançados na direção de pessoas desarmadas em pleno exercício de sua cidadania. Antes do desfecho, o delegado falava ao celular. Esperase que não tenha recebido ordens de “Deus”! A UFSC, com 54 anos de história e relevantes serviços ao país, sobreviverá – não sem cicatrizes – aos ataques. Sétima melhor no Brasil, figura entre as principais instituições da América Latina. A reação às forças repressoras não enxovalhou nem envergonhou a universidade como fazem acreditar seus inimigos internos e externos. Ao contrário, provou que a UFSC continua digna do nome e representativa na sua tradição de luta. A sua coragem é motivo de orgulho. O golpe não foi só contra a UFSC. É um golpe contra todas as universidades e instituições democráticas. A presidente Dilma, aliás, deveria tomar uma posição firme e clara a respeito. Corporativista, a Associação dos Delegados Federais faz defesa incondicional à operação. Não era hora de reconhecer os erros e pedir desculpas às famílias, à universidade e à sociedade? Parece pouco crível, por outro lado, que o
MOACIR LOTH Jornalista