A CONTRIBUIÇÃO DA ARQUITETURA HOSPITALAR PARA REABILITAÇÃO DE PACIENTES

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A CONTRIBUIÇÃO DA ARQUITETURA HOSPITALAR PARA REABILITAÇÃO DE PACIENTES Deyliane de Jesus Bicalho Souza RESUMO Ao longo da história da civilização a arquitetura hospitalar que lida com a saúde iniciou-se com a finalidade social de praticar obras de caridade. Com o passar dos anos o hospital passa por grandes evoluções até chegar no hospital com função de eliminar doenças. Com o crescimento urbano e a valorização das terras no século XIX e XX a arquitetura hospitalar se alia a tecnologia e transforma de forma radical o espaço hospitalar, por mais que este momento histórico tenha trago grandes benefícios tecnológicos e técnicos se perde as questões intangíveis ocasionadas pela sensibilidade necessárias em projetos de arquitetura hospitalar. Neste contexto, este estudo buscou compreender de que forma arquitetura hospitalar pode gerar espaços mais humanos e que respondem de uma maneira mais eficiente no processo de reabilitação das pessoas com necessidades especiais? Para isso, realizou-se uma pesquisa exploratória, seu procedimento é bibliográfico quanto ao referencial teórico. Além disto, analisou-se documento para levantamento de dados e verificou-se projetos buscando referências arquitetônicas. A humanização se dá através da concepção de projetos que levem em conta a subjetividade da pessoa humana, que deve ser pensado em qualquer-escala de produção, adquirindo à semiótica e a fenomenologia, e trabalhando a linguagem específica dos usuários, analisando suas necessidades e explorando seus sentidos, sentimentos e sensações. Desta forma os hospitais além de atender as questões de viabilidade econômica, expansibilidade, funcionalidade, segurança, fluxo e humanização (confortos) precisam ser encarados como uma ‟ferramenta‟ que promova a saúde. Palavras-chaves: Arquitetura. Arquitetura Hospitalar. Reabilitação de Pacientes. Hospital Sarah Kubitschek. 1 INTRODUÇÃO O artigo se trata da importância da arquitetura hospitalar no processo de reabilitação da pessoa com necessidades especiais, uma vez que a pessoa com algum tipo de


limitação apresenta demandas específicas, podendo ser ainda mais complexas se somada a uma deficiência mental, ou motora. A reabilitação de deficientes comumente se torna um processo longo e duradouro e, muitas vezes, os espaços para tratamento são estritamente funcionais, atentando somente para questões arquitetônicas técnicas desconsiderando as questões sensoriais do espaço, que são capazes de promover o bem estar do usuário contribuindo para um tratamento mais eficiente. Segundo o dicionário de língua brasileira Houaiss (2003), “Arquitetura é a arte e técnica de organizar espaços e criar ambientes para abrigar os diversos tipos de atividades humanas, visando também a determinada intenção plástica.” Hospital se define em, “estabelecimento próprio para internação e tratamento de doentes ou de feridos.” Reabilitação, “ação ou efeito de reabilitar (-se). Reabilitar, devolução de paciente, após lesão ou enfermidade, a suas atividades físicas e/ou mentais anteriores.” A questão da humanização é muito atual. Segundo o Mistério da Saúde (apud NOGUEIRA, 2015, p. 8), humanizar é: [...] resgatar a importância dos aspectos emocionais, indissociáveis dos aspectos físicos na intervenção em saúde. Humanizar é aceitar essa necessidade de resgate e articulação dos aspectos subjetivos, indissociáveis dos aspectos físicos e biológicos. Mais do que isso, humanizar é adotar uma prática em que profissionais e usuários consideram o conjunto dos aspectos físicos, subjetivos e sociais que compõem o atendimento à saúde. Humanizar refere-se, portanto, à possibilidade de assumir uma postura ética de respeito ao outro, de acolhimento do desconhecido e de reconhecimento dos limites.

A arquitetura hospitalar deve ser pensada com cuidado, pois o espaço pode ter um papel relevante no processo de reabilitação. Tem crescido consideravelmente o número de pessoas que sofrem acidentes, violências, pessoas com deficiência congênita ou adquirida, envelhecimento e problemas neurológicos. Segundo o Censo Demográfico de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Brasil teve uma evolução significativa no número de pessoas com deficiência em relação ao Censo de 2000. Entre elas, destacam-se em primeiro lugar a deficiência visual com 48,9%,em segundo lugar está a deficiência motora, ocorrendo em 7% da população. Em Minas Gerais a quantidade de pessoas


com deficiência motora corresponde a 22,62% na média de população residente e proporção. Os valores coletados, apontam um alto índice se comparado a população total, em virtude disto em 1999 foi vigorado o Decreto 3.298 que regulamenta sobre a integração de pessoas com necessidades especiais promovendo os direitos individuais e sociais. Existe regulamentos técnicos, portarias e resoluções desenvolvidas pelo Ministério da Saúde e Anvisa que

estabelece sobre a produção desses edifícios

arquitetônicos. Muitas delas estão voltadas para questões de qualidade do ar, gerenciamento de resíduos, condicionamentos, etapas do projeto arquitetônico, dimensionamento, fluxos, instalações assepsia, localização, confortos, entre outros. Devido a grande complexidade que caracteriza a edificação hospitalar tornou-se fundamental a elaboração do Plano Diretor Hospitalar (PDH), que traça as diretrizes de

desenvolvimento

envolvendo

o

programa

hospitalar,

infraestrutura,

equipamentos, edificação e investimentos. Desta forma o problema que move esta pesquisa é: A arquitetura hospitalar pode gerar espaços mais humanos e que respondem de uma maneira mais eficiente no processo de reabilitação das pessoas com necessidades especiais? Assim, a pesquisa tem como objetivo entender como a arquitetura hospitalar pode contribuir no processo de reabilitação de pacientes, analisando o desenvolvimento histórico da arquitetura hospitalar, entendendo como um ambiente mais acolhedor e agradável pode potencializar melhoras no tratamento de reabilitação do paciente e contribuir para a diminuição da tensão nesse espaço e desempenhar o papel de inclusão social e por fim, entender de que forma as legislações podem favorecem na construção desses espaços.

2 ARQUITETURA HOSPITALAR A instituição hospitalar é tão antiga quanto a humanidade no sentido de centros de caridades, mas para entendimento do tema começa-se a partir do século XVII. Para


construção deste capitulo usarei como referencia as ideias de Luiz Carlos de Toledo, doutor em Ciências da Arquitetura e Michael Foucault, filosofo. O histórico das instalações que lidam com a saúde iniciou-se com a finalidade social de praticar obras de caridade. Segundo Foucault, o século XVII desde a Idade Média na Europa o hospital era um morredouro não tinha função de curar o doente, mas de promover sua salvação espiritual, tido como uma instituição de assistência aos pobres cumprindo um papel religioso. Os responsáveis por esses equipamentos eram as ordem religiosas da época, e isso refletia na produção arquitetônica, o cuidado com a alma antes do cuidado com o corpo. “O personagem ideal do hospital, até o século XVIII, não é o doente que é preciso curar, mas o pobre que está morrendo. É alguém que deve ser assistido material e espiritualmente, alguém a quem se deve dar os últimos cuidados e o último sacramento” (FOUCAULT, 1979, p. 100).

O hospital passa por grandes evoluções, o primeiro passo para esta transformação não foi em função da medicalização e sim a de anulação dos efeitos negativos que o hospital tinha em relação a cidade, pois era considerado um grande propagador de doenças. De acordo com Luiz Carlos Toledo “A existência de hospitais e cemitérios no interior das cidades passou a ser considerada grave ameaça à saúde e à ordem urbana, sendo apontada como fator de poluição e transmissão de doenças” (TOLEDO, 2008, p.49). Entende-se assim, que para a eficiência no tratamento das doenças e até mesmo a prevenção de futuras, era preciso um novo arranjo na produção arquitetônica desses edifícios. A qualidade desses espaços comprometia no tratamento desses pacientes. Dessa forma, o cuidado com a doença caberia aos médicos e profissionais da área e o cuidado com a saúde caberia a um correto ordenamento dos espaços, promovido pelos arquitetos. Segundo Toledo, na Renascença, ainda no século XVII, Leon Batista Alberti (14041472) estabelece os cânones para a construção do hospital em ‟cruz‟, dessa forma o partido arquitetônico possuía duas alas de internação que se cruzavam e no centro delas encontrava-se a capela, de maneira que poderia ser visualizada por todos pacientes do hospital, neste momento surge o primeiro processo de cura de paciente, além de uma preocupação inicial em relação ao conforto ambiental e a higiene. Posso notar que esse arranjo é mais elaborado. Fragmentar em dois eixos


os doentes distribui também as doenças e o risco de novas infecções, o vento é capaz de circular com mais eficiência nesses ambientes, e a capela central tem a função de diminuir a dor espiritual, como uma força central. Figura 01: Partido Cruciforme

Fonte: TOLEDO, 2008, p.85

Figura 02: Partido Pavilhonar

Fonte: TOLEDO, 2008, p.86

O hospital teve um grande avanço no século XVIII, segundo Toledo (2002, p.54) o cirurgião Jaques Tenon (1724-1816) afirma que através de sua experiência como cirurgião e pesquisas sobre as principais precariedades físicas e operacionais nos hospitais europeus que estabeleceria as primeiras diretrizes que servem como base até os dias atuais para se pensar um hospital. Assim não só o tratamento, mas a necessidade de eliminar doenças passou a ser alvo desses edifícios. Surge então, o Hospital Terapêutico, não mais como alvo de exclusão e assistência espiritual, mas para assumir a função de curar. O partido arquitetônico Pavilhonar surge como uma forma de medicalização pois através da contribuição de Tenon entendesse que a setorização dos ambientes de acordo com a patologia clinica, o fluxo de pessoas (pacientes e funcionários) e a ventilação destes espaços estavam diretamente ligados ao processo de cura dos pacientes. Com o crescimento urbano e a valorização das terras no século XIX e XX a arquitetura hospitalar se alia a tecnologia e surge o hospital vertical, neste período, grandes surgimentos tecnológicos transformaram de forma radical o espaço hospitalar: menos espaços de circulações, presença de elevadores,


monta cargas, condicionamento do ar, entre outras tecnologias empregadas, agora um hospital totalmente voltado a atenção médica em combate as doenças. Por mais que este momento histórico tenha trago grandes benefícios tecnológicos e técnicos se perde as questões intangíveis ocasionadas pela sensibilidade necessárias em projetos de arquitetura hospitalar. Figura 03: Partido de Tipologia Mista (lâmina e placa)

Figura 03: Partido em Monobloco Vertical

Fonte: TOLEDO, 2008, p.86

Fonte: TOLEDO, 2008, p.87

Ainda no século XX surge o partido arquitetônico de Tipologia Mista, pois segundo Toledo (2008), este modelo busca eliminar os problemas dos hospitais pavilhonares e do monobloco vertical, visando dar melhores soluções de circulação, ambientais, infraestrutura urbana, distribuições das diferentes áreas funcionais e neste momento também começa o primeiro passo para humanização hospitalar, na valorização dos ambientes. No que se refere a arquitetura hospitalar brasileira , o Brasil foi o segundo país da América do Sul a construir uma edificação hospitalar, em 1543, Braz Cubas criou o primeiro Hospital da Santa Cruz de Misericórdia de Santos e tinha a função

exclusiva

de

receber

enfermos.

Segundo

Toledo

(2002),

as

‟Misericórdias„ era um sistema hospitalar de herança Portuguesa, depois de Santos todas capitais e posteriormente as cidadezinhas do interior possuíam sua Santa Casa da Misericórdia. O primeiro profissional a se especializar em projetos laboratoriais e hospitalares foi o engenheiro Luiz de Morais Júnior, seus primeiros projetos segue os antigos princípios do partido pavilhonar do final do século XVIII.


Suas últimas construções hospitalares, posteriores a 1930, já obedecem a uma lógica médica e a parâmetros formais e construtivos inteiramente diversos [...] Estes hospitais incorporam, então, as formas construtivas desenvolvidas nos Estados Unidos, precursores das construções verticais, em monobloco, utilizando o concreto armado. (TOLEDO, 2002 apud BENCHIMOL, 1990, p.189).

Encerrando este contexto histórico e concluindo o assunto com uma abordagem contemporânea, destaca-se no contexto brasileiro o arquiteto Lelé, com obras significantes em todo Brasil, seja pelas tecnologias pré-moldadas, a forte relação entre a arquitetura e o meio ambiente ou até mesmo o design dos equipamentos voltados ao campo médico-hospitalar, com um forte apelo artístico. 3 ESPAÇOS HUMANIZADOS

De acordo com o documentário „João Figueiras Lima, o Lelé, na Rede Sarah‟, exposto e discutido em seminário1, a linha de pensamento do arquiteto João Figueiras Lima, aborda que os espaços hospitalares devem ser sensíveis às fragilidades corporais e estimulantes para o espírito. Em entrevista, Lelé faz um relato que vale a pena registrar; Eu fiquei internado na unidade coronariana do INCOR, onde todos equipamentos são de última geração, uma coisa fantástica! Eu imagino que minha estada naquela unidade salvou minha vida, entretanto, depois de 15 dias internado, eu estava precisando de um tratamento psicológico. O ambiente na unidade coronariana era extremamente deprimente, não havia uma única janela, eu não sabia quando era dia ou noite, e perdi totalmente a noção do tempo (TOLEDO, 2002, p.154).

A produção da arquitetura contemporânea busca solucionar as necessidades que os ambientes têm de transmitir significados aos usuários, ampliando as visões modernistas, deixou de ser sustentada apenas por princípios racionalistas, formalistas e funcionalistas. É a partir desse período que a arquitetura, adere à semiótica e a fenomenologia, e trabalha a linguagem específica dos usuários, analisando suas necessidades e explorando seus sentidos, sentimentos e sensações. Os arquitetos pós-modernistas e contemporâneos tomaram consciência de que projetos arquitetônicos devem ser dotados de significância e, para tanto, é necessário ir além de conceitos estritamente funcionalistas. 1

Seminário da 25ª Semana Integrada da faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais.


Ainda neste contexto, no documentário “Arquitetura da felicidade” o filosofo Alain de Botton afirma que a arquitetura hospitalar ganha novos horizontes, desmistificando a ideia de que esses ambientes são sempre frios e tristes. Essa nova linguagem pode ser usada como importante instrumento de contribuição na reabilitação de pacientes, quando projetada levando em consideração não apenas a função, mas a humanização, ou seja, a capacidade de impulsionar a vida, garantir valor e sentido ao momento. A arquitetura hospitalar, quando tirando partido das análises do contexto, do entorno, das necessidades do cliente, tecnologia, sustentabilidade e fenomenologia pode influenciar na recuperação dos pacientes em tratamento. Segundo a OMS – Organização Mundial da Saúde (apud NOGUEIRA, 2015, p. 2), “a saúde é o estado de mais completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência da enfermidade”. A arquitetura deve ser capaz de proporcionar esse bem-estar aos usuários, através de ambientes bem planejados, confortáveis e estimulantes. Para a autora, “o ambiente físico hospitalar interfere no tratamento terapêutico do paciente hospitalizado, podendo, quando pobre em estímulos ambientais, agravar o stress hospitalar e afetar negativamente na recuperação do mesmo” (NOGUEIRA, 2015, p. 2). O conforto ambiental, entendido como a capacidade que o ambiente possui de proporcionar satisfação aos usuários, também interfere absolutamente no processo de tratamento do paciente, pois suas características perpassam sobre as responsabilidades de promovera boa qualidade do ar e do clima.

A síndrome dos edifícios doentes está diretamente relacionada a qualidade do ar no interior dos ambientes. Em busca de um conforto térmico os edifícios utilizam cada vez mais de sistemas mecânicos de ventilação, porém a falta de uma manutenção adequada e a ausência da circulação de ventilação natural nestes ambientes torna-os propícios a proliferação de doenças respiratórias. Em 1982, o Comitê Técnico da Organização Mundial da Saúde definiu a síndrome do edifício doente (SED) como o conjunto dos seguintes sintomas: dor de cabeça; fadiga; letargia; prurido e ardor nos olhos, irritação de nariz e garganta; anormalidades na pele e falta de concentração, em trabalhadores de escritórios. (SANTOS et al.,1992, p.1)


Para os arquitetos o efeito que o ambiente vai gerar no usuário deve ter bastante

relevância,

pois

todo

ser

reage

ao

meio,

mesmo

que

inconscientemente. Para Sommer (apud NOGUEIRA, 2015, p. 3), “os projetistas precisam de conceitos que sejam significativos para a forma física e o comportamento humano. Muitas coisas da arquitetura influem nas pessoas, embora nem tudo isso chegue à sua consciência”. A humanização para os arquitetos se dá através da concepção de projetos que levem em conta a subjetividade da pessoa humana, que deve ser pensado em qualquer -escala de produção. Uma construção sem humanização não é arquitetura, talvez possa ser um projeto de engenharia, com boas soluções volumétricas, com ritmo e simetria, mas nada, além disso. O arquiteto Roger S. Ulrich realizou um estudo acerca dos impactos da iluminação natural em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI) e concluiu que “o uso da iluminação natural nesses ambientes, diminui o tempo de internação, a dor e a depressão dos pacientes” (apud NOGUEIRA, 2015, p. 8). Na imagem 1, podemos perceber a especulação da iluminação natural no ambiente hospitalar. Criado pelo escritório Vitah Arquitetura, para o Hospital Israelita Albert Einstein em São Paulo, as UTI‟s Semi-Intensivas, passaram por um processo de modernização (retrofit), proporcionando mais segurança, conforto e bem estar aos pacientes. Imagem 05: Retrofit UTI semi-intenciva

Fonte: http://vitaharquitetura.com.br/projetos/retrofit-uti-semi-intensiva/. Acesso em: 01 junho 2016.


Outra constatação de Ulrich se refere ao uso de jardins internos destinados aos pacientes. Áreas verdes em unidades hospitalares proporcionam benefícios aos seus usuários, como: “redução do stress, da ansiedade, da depressão e da quantidade de medicamentos utilizados pelos pacientes”, além de reduzir as queixas relacionadas à saúde (apud NOGUEIRA, 2015, p. 9). Na imagem 2, projeto desenvolvido pelo escritório de arquitetura Foster + Partners, para a unidade da Maggie‟s em Manchester, conhecida como „casa longe de casa‟, pode-se perceber os ambientes margeados por jardins, isso torna o lugar uma espécie de refúgio para as pessoas em processo de tratamento de câncer , tornando este, um instrumento de estímulo à reabilitação. Imagem 06.07.08: Centro de Câncer Maggie em Manchester – Reino Unido

Fonte: http://www.fosterandpartners.com/projects/maggie-s-at-the-robert-parfett-building/. Acesso em: 01 junho 2016.

Mais um assunto relevante diz respeito à participação dos usuários nas mudanças propostas. Tomar opinião dos pacientes é de grande valia para que o projeto seja planejado de acordo com as necessidades destes. Por exemplo, pode-se solicitar ajuda dos beneficiados para se pensar o layout do mobiliário. As revistas de especializações médicas e campos afins dedicam considerável espaço à construção de hospital e ao planejamento de enfermarias, mas os planos publicados e os modelos revelam apenas paredes e salas vazias. A disposição dos móveis é deixada para a equipe da enfermaria que não compreende o potencial terapêutico dessa colocação (SOMMER, 1973 apud NOGUEIRA, 2015, p. 9).

As unidades hospitalares brasileiras que mais reverberam os conceitos de arquitetura contemporânea são as projetas pelo arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé. A rede Sarah Kubitschek é o maior exemplo da prática da boa


arquitetura, aliando funcionalismo e beleza. A arquitetura bioclimática também é um dos partidos arquitetônicos de Lelé. A busca do homem pelo conforto surge intuitivamente para garantir a sua sobrevivência, uma criança no ventre da mãe está em seu habitat perfeito, a partir do momento de seu nascimento ele vai sempre buscar uma forma de adaptação confortável no meio que a envolva, sendo assim, define-se o conforto a partir do desconforto. Sabendo da importância do conforto na vida do homem, o papel da arquitetura é proporcionar seu bem estar, sendo ele o conforto subjetivo ou o conforto ambiental. Schmid (2005) confirma que a sensação de conforto é algo pessoal. Sendo assim, difícil defini-lo de forma genérica. Schmid ainda afirma que conforto é um conjunto de valores que não são explicados por meio de itens precisos e definidos. Segundo o dicionário Michaelis (2016), a palavra conforto é “Ato ou efeito de confortar; bem-estar; comodidade material; cômodo, aconchego; Consolação ou auxílio nas aflições”. Para Aulete (2016) a definição de conforto é “aquilo que traz alívio, consolo; estado ou situação daquele que encontrou conforto, de quem se sente em paz, ajustado às circunstâncias”. O conforto subjetivo está ligado aos sentidos e emoções e pode variar de acordo com cada pessoa. A arquitetura lida com o conforto subjetivo porque é interpretada como uma arte. Para Schmid (2005), “o conforto disputa com a arte o poder de satisfazer as pessoas, e parte dessa disputa se refere à eficácia emocional”. Assim, a arquitetura utiliza de artifícios tangíveis para completar os desejos intangíveis, e se tornar eficiente uma vez que esta produção se torna aplicável. [...]é possível explorar expressivamente luz/sombra, ruído/silêncio, temperatura e odores no espaço, como anuncia a lei da arquitetura [...]o arquiteto é o localizador de sentimentos, e o espaço é matéria que desempenha o papel de criador e regulador de comportamentos. (HOLANDA, Frederico, pág.87)

Um bom projeto arquitetônico explora a percepção do usuário e vai além das formas físicas e funcionais, levando em conta a semiótica e a fenomenologia proporcionando ao usuário a uma imersão de sensações. Para Stenberg (2000)


percepção é “um conjunto de processos psicológicos pelos quais as pessoas conhecem, organizam e fornecem significação (no cérebro) às sensações recebidas dos estímulos ambientais (nos órgãos dos sentidos)”. Conforto ambiental é a forma de se adequar aos princípios físicos envolvidos as necessidades do ambiente, podendo ser dividido em diferentes áreas: conforto térmico, conforto lumínico conforto acústico e conforto ergonômico. É necessário, [...], esclarecer melhor quais as condições de conforto que deve-se proporcionar ao usuário, que afinal é o elemento central de toda a razão de ser da arquitetura. O controle do ambiente não é a totalidade da arquitetura, mas deve ser parte da ordenação básica de qualquer projeto. O arquiteto deve fazer controle da luz, som e do calor um problema seu. (VIANNA; GONÇALVES, 2001, p.3).

O clima, as características humanas e as atividades envolvidas, são fatores que influenciam na percepção do conforto ou do desconforto. Entendendo essas subáreas, a arquitetura vem como soluções para minimizar seus efeitos de desconfortos tonando as atividades mais produtivas e confortáveis de serem executadas. Discute-se muito sobre conforto térmico entre os arquitetos e urbanistas, pois o conforto térmico está ligado à sensação térmica do corpo, Freitas (2005) acredita que uns dos elementos climáticos mais percebidos pelas pessoas é a temperatura, por isso ela tem um grande peso no dia a dia da população. Para Lamberts (2014) o conforto térmico depende de três fatores: físicos, fisiológicos e psicológicos. Os físicos determinam as trocas de calor do corpo com o meio; os fisiológicos referem-se as alterações na resposta fisiológica do organismo; e os psicológicos, relacionam-se às diferenças na percepção e na resposta a estímulos sensoriais.

O ser humano é homeotérmico, pois ele possui um mecanismo que o mantem com a temperatura interna de 37ºC, mas para uma pessoa sentir-se confortável é necessário um equilíbrio entre o calor produzido pelo corpo e o calor liberado para o ambiente. Em busca deste equilíbrio o homem recorre a vestimenta ou a arquitetura, sendo a vestimenta considera a 2º pele do homem, pois ela pode ser adaptada de acordo com as necessidades individuais, e a arquitetura , considerada a 3ª pele. Segundo Schmid (2005) “o ambiente construído é capaz de modificar as variáveis climáticas que nos são impostas”, aqui entra o


importante papel da arquitetura através das estratégias de projetuais para interferir a seu favor nos fatores físicos do conforto térmico. De acordo com a ciência, o conforto térmico do individuo depende de quatro fatores físicos: a temperatura do ar, a umidade do ar, a velocidade do vento e as temperaturas das superfícies. Para todos estes fatores existe soluções arquitetônicas, algumas dessas soluções são a reflexão solar direta e indireta, sombreamento, isolamento térmico e ventilação cruzado, que podem manter o clima agradável ao usuário sem comprometer suas atividades diárias e ainda proporcionar um conforto térmico agradável. O Conforto lumínico está relacionado a iluminação natura e/ou artificial dos espaços. É através da luz que sabemos a diferença entre o dia e a noite. No decorrer do dia o homem está em constante atividade e cada uma delas, para seu melhor desenvolvimento, exige tipos de iluminação adequada, Schmid explica algumas situações: Pouco ajuda a luz de um lampião decorativo e aconchegante se alguém no ponto de ônibus, tenta ler um livro de bolso. E pouco vale a perfeita iluminação de uma sala de estar se o que eu mais quero é cochilar no sofá. (SCHMID, 2005, p. 288)

A luz distribui no espaço projetado sua intensidade, contraste e cor, e isso se dá por meio de parâmetros quantitativos ditados pelas exigências humanas e funcionais. O Sol é a fonte de luz primária para o homem, além de benéfica para saúde aliada ao projeto arquitetônico pode ser muito eficaz para proporcionar luz natural nos ambientes internos, porém em muitas atividades é necessário o uso de uma luz uniforme, que neste caso seria o uso da luz artificial. Com a invenção e fácil acesso da lâmpada artificial a arquitetura vem se tornando cada vez mais dependente da rede elétrica. Segundo Schmid (2005), por consequência os espaços se tornam frios e monótonos, além de gastos diurnos totalmente desnecessários com iluminação. O maior desperdício, que deve ser reconhecido, não é a energia consumida, mas a iluminação pobre, o efeito inadequado. E neste caso a luz traz ao ambiente uma expressividade ingrata: a expressividade do desnecessário, do desapropriado, do insensível. (SCHMID, 2005, p. 309)


Nos dias atuais a gravidade dos impactos ambientais força a busca por uma arquitetura mais consciente com baixos índices de consumos de energia. Assim como o conforto térmico, os preceitos da iluminação devem ser pensados na elaboração do projeto arquitetônico, adequando assim um equilíbrio entre a luz natural e artificial, proporcionando um ambiente saudável e oferecendo melhor qualidade de vida para seus usuários. O conforto que está relacionado a qualidade sonora nos ambientes é o conforto acústico. De certa maneira o som é tudo aquilo que conseguimos ouvir, segundo Souza, Almeida & Bragança (2012), pode-se dizer que o som na sua maioria tem sua origem na vibração de um objeto, que provoca vibração de partículas do meio e por fim sendo capaz de ser captado pelo ouvido humano. Porém vale lembrar que nem toda vibração pode ser captado pelo ouvido humano. Os sons revelam idéias sem que tenhamos de nos mexer para conhecê-las. O ruído do motor anuncia alguém chegando; o gotejar da água, que alguém está no banho; o silêncio numa casa onde moram crianças, que as mesmas dormem, ou estão entretidas com alguma novidade, dando aos pais o que pensar. A acústica é provavelmente o aspecto físico de maior complexidade do ambiente construído. (SCHMID, 2005, p. 246)

Segundo o autor Schmid (2005), a audição é um canal de comunicação sintetizada entre o meio e as pessoas, e delas entre si. Sendo assim, o espaço construído pode se tornar um condicionador importante para o que ouvimos. Há fatores que influenciam na boa qualidade sonora do ambiente: a origem do ruído pode ser externo ou interno. No caso de ruído externo trabalha-se o isolamento e para fonte interna trata-se as questões de condicionamento. Para Schmid (2005, p. 252) “buscamos ouvir aquilo que não causa dor nem estresse, nem distrai a atenção necessária à tarefa que porventura nos ocupe”. Entender como o som irá se propaga no espaço, pode influenciar no planejamento do projeto arquitetônico através da setorização que podem funcionar como barreira, proporcionando assim uma boa qualidade acústica no ambiente. O conforto ergonômico é a área da ciência que estuda a relação do homem com o espaço e busca torna-lo compatível as necessidades, limitações humanas e habilidades. Segundo o dicionário Michaelis (2016), a palavra


ergonomia é “Conjunto de estudos relacionados com a organização do trabalho em função dos objetos propostos e da relação homem-maquina”. Arquitetura muito se interessa pelo conforto ergonômico, pois é através dele que pode oferece espaços mais adequados fisicamente a fim de otimizar o bem estar humano de forma segura. Uma grande referencia que aponta de maneira prática todas essas teorias discutidas ao longo do artigo, expressando comodidade, conforto e bem-estar material e espiritual do homem é a unidade hospitalar da Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação. Segundo Toledo (2002), a Rede Sarah é uma instituição pública voltada para ortopedia e reabilitação do grande incapacitado físico e para o tratamento de deformidades, traumas, doenças e infecções do aparelho locomotor. As unidades da Rede Sarah caracterizam-se pela integração e flexibilidade em seus sistemas, que permitem causar o mínimo de impacto no conforto de seus usuários, não deixando de lado os projetos arquitetônicos, a que o arquiteto João Figueiras Lima, Lelé, se dedicou nos últimos 30 anos, que se destacam pela sua beleza, racionalização, contiguidade (expansão e zoneamento), qualidade espacial, humanização (conforto ambiental), tecnologia, meio ambiente, assepsia e plasticidade. Outro fator de grande importância é as inovações terapêuticas introduzidas a partir de um conjunto de posturas e procedimentos batizado por Campos da Paz como „Método Sarah‟. “O método é constituído por um conjunto de práticas e procedimentos de reabilitação desenvolvidos pelas equipes interdisciplinares do Rede” (TOLEDO, 2008, p.165). O método tem como objetivo aperfeiçoar a qualidade e a

eficácia

das técnicas de

reabilitação

promovendo o

empoderamento dos pacientes. A unidade escolhida para analise das aplicações foi o Hospital Sarah Belo Horizonte, inaugurado em maio de 1997, no Bairro Gameleira. A escolha dessa


unidade se deu pelo perfil de atendimento, que se trata de um hospital ortopédico-cirúrgico e por questões climáticas2. Para realização deste projeto escolheu-se uma área na qual já havia um hospital projetado por Oscar Niemeyer nos anos de 1950, um edifício composto por quatro andares e mais uma estrutura parcialmente subterrânea, em conexão com a inclinação existente no terreno. Todo o programa foi ajustado no edifício térreo para a mobilidade, no sentido amplo, de funcionários e pacientes. De acordo com o Zoneamento Bioclimático Brasileiro a cidade de Belo Horizonte está inseria na Zona Bioclimática 3, e para esta devem ser atendidas as diretrizes apresentadas nas tabelas 7,8 e 9 abaixo: Figura 01 Diretrizes

Fonte: ABNT Projeto 02:135.07-001/3

Pode-se perceber a aplicação das diretrizes na concepção do projeto arquitetônico, soluções como a presença de sheeds na cobertura e sheeds maiores localizados nas bordas dos edifício térreo na face norte, tais estratégias garantem boas condições do conforto térmico e luminico, através da filtração dos raios solares, higienização do ar, ventilação cruzada e iluminação natural. Uma abóboda presente na sala de espera e auditório proporciona ao ambiente luz zenital. 2

Para realização da segunda fase desse estudo será realizado um projeto para o Região Metropolitana do Vale do Aço, com o intuito de atender ao público com deficiências motoras.


Os apartamentos de internação encontram-se nos três andares mais altos, em cada andar os pacientes tem acesso as plataformas solares acopladas ao prédio. O brise-soleil presente no edifício tem o poder de controlar a iluminação de acordo com a necessidade do usuário. A acústica se aplica através das setorização do ambientes predefinidos, por exemplo: o setor de serviços gerais tem um grande problema com calor e ruídos, então ele é posicionado de forma não incomodar dos outros ambientes. A cobertura e a inclinação das cadeiras do auditório também foram pensadas para proporcionar um bom desempenho acústico. O mesmo cuidado que Lelé tem pelo projeto arquitetônico ele tem pelo conforto ergonômico, ele deixa isso bem claro no design dos mobiliários. A mobilidade do paciente é um fator de muita importância dentro do projeto, a maca desenvolvida por ele e a equipe de apoio (médicos, pacientes e outros) é pensada da melhor forma para garantir conforto e também para o paciente se locomover dentro das áreas internas e extas do hospital a qualquer momento. Por fim, o conforto subliminar aplicado por Lelé vem com toda sua sensibilidade de lidar com o ser humano inserido dentro do espaço, é o pensamento voltado para cada ação, para cada necessidade, é pensar na beleza que „alimenta o espirito‟, na cor, na interação com a natureza. Lelé conta que “[...] Aldary me mostrava a arquitetura nos livros, ficávamos noites inteiras conversando. Foi uma pessoa que me ajudou muito, durante o período da escola, a descobrir a arquitetura como arte” (LELÉ, 2004, p.23-24).

4 CONCLUSÃO O principal objetivo da pesquisa foi entender como a arquitetura hospitalar pode gerar espaços mais humanos e que respondem de uma maneira mais eficiente no processo de reabilitação das pessoas com necessidades especiais. Estudar a evolução dos projetos serviu de base para entender como a arquitetura hospitalar desenvolveu seus primeiros cuidados. Analisando este contexto pode-se concluir que os primeiros cuidados da arquitetura hospitalar


eram com a preocupação da alma, com o passar dos tempos a preocupação se volta para o processo de curar as doenças. A humanização se dá através da concepção de projetos que levem em conta a subjetividade da pessoa humana, que deve ser pensado em qualquer-escala de produção, adquirindo à semiótica e a fenomenologia, e trabalhando a linguagem específica dos usuários, analisando suas necessidades e explorando seus sentidos, sentimentos e sensações. Através deste estudo foi possível compreender que a arquitetura tem o poder de adoecer, de curar ou de estimular a reabilitação. Desta forma os hospitais além de atender as questões de viabilidade econômica, expansibilidade, funcionalidade, segurança, fluxo e humanização (confortos) precisam ser encarados como uma ‟ferramenta‟ que promova a saúde.

REFERENCIAS

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