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Conde Francisco Matarazzo: O Empreendedor do Século XX

Transformações profundas mudavam o perfil da sociedade nos campos da literatura, da arte e da música: desde a revolucionária Semana de Arte Moderna de 1922 até a nova música que surgia carregada de folclore e brasilidade na maestria criativa de Heitor Villa Lobos

Ao mesmo tempo que a crise de 1929/30 abalava, de forma definitiva, as estruturas econômicas e sociais da sociedade brasileira, havia algo de novo, havia esperança: era a crescente industrialização paulista! O grande fluxo migratório trazido em sua grande maioria para a cafeicultura, passou a dar nova característica à sociedade paulista: muitos vieram tentar uma nova vida, ou como dizem, para “fazer a América!”

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A crescente industrialização abrangeu muitos setores, mas para que o cenário mágico da realidade paulista, em 1934, possa ser bem compreendido e avaliado vamos focar, como exemplo, as industrias Matarazzo, que ocupavam indiscutível liderança nesse importante segmento da economia.

No ano de 1934, o ano do cenário mágico paulista, o Conde Francisco Matarazzo estava comemorando seus 80 anos... “Ottant’anni !” Nessa época, as industrias Matarazzo representavam realmente a maior força econômica do Brasil, depois dos orçamentos da União e do Estado de São Paulo... Não se pode falar em processo de industrialização no país sem que se destaque a presença forte do imigrante italiano Francisco (Francesco) Matarazzo.

O ESTADO MATARAZZO

“Assis Chateaubriand vai chamar, em 1934, esse grupo industrial de “O ESTADO MATARAZZO”, lembrando que São Paulo tinha uma renda bruta de 400 mil contos e o parque industrial Matarazzo uma receita de 350 mil, acima de qualquer outra unidade federativa brasileira...O Conde Matarazzo, financeira e economicamente é o segundo Estado do Brasil...”

“Monteiro Lobato na mesma época, compara-o a Henry Ford: a atuação de ambos no criar foi um permanente “rush” para cima...”

“Miguel Couto, Presidente da Academia Brasileira de Letras: “Aos que buscavam e rebuscavam na sua prosápia o sangue azul que achavam que estava faltando, Napoleão Bonaparte, feito Imperador da França, respondeu desdenhosamente: “Eu sou filho de mim mesmo”. Felizes os que, de menor altura embora, podem dizer com o mesmo orgulho – eu sou filho de mim mesmo... Isto é, sou o exclusivo produto do meu trabalho, do meu descortínio, da minha inteligência. Tal é Francisco Matarazzo”.

HISTÓRICO – Em Castellabate, distante 180 km de Nápoles, nascia Francesco Matarazzo, em 09 de março de 1854. Francesco era filho de um médico e rico proprietário, Costábile e de Mariângela. Seu pai faleceu quando ele tinha 19 anos Com a depressão econômica que vivia a Itália, foi obrigado a abandonar os estudos para cuidar da família Aos 27 anos, sabendo das condições favoráveis para os imigrantes no Brasil, imigra. Traz junto uma boa quantidade de queijos e vinhos, além de um reforço em liras italianas.

Queijos e vinhos se perdem quando o navio atraca no Rio de Janeiro, afundados com a embarcação que ligava o navio ao porto. Sem desanimar, parte para São Paulo disposto a multiplicar as suas liras. Contando com a colaboração de outros imigrantes que o precederam, entra firme no comércio, participa de caravanas, conhece outros estados e se estabelece em Sorocaba, então limite das paralelas poderosas da Estrada de Ferro Sorocabana que levava o progresso e o desenvolvimento para o interior inexplorado.

Logo, passou a ter um grande rebanho de suínos. Passou a fazer banha e a comercializá-la, em latas. Importa e vende farinha e monta uma tecelagem para fazer os sacos de farinha... Daí para frente foi num crescente, num multiplicar inacreditável.

Resumindo: em 1934, as Industrias Matarazzo assumiam o seu auge que foi crescente até 1950, quando chegou a possuir 38 mil e setecentos funcionários, com controle acionário majoritário ou expressivo em 365 empresas, possuindo 12 unidades navais, uma Casa Bancária, enfim, um complexo industrial que chegou a ter o terceiro orçamento do Brasil! É indiscutível a grandiosidade do “Império Matarazzo” no processo de industrialização do Estado de São Paulo e, portanto, do Brasil. O interior do estado e todo o Brasil se espelhava na força, ousadia e competência desse empreendedor valoroso.

Matarazzo motiva o Empreendedorismo dos imigrantes italianos

No inicio dos anos 20, a então poderosa colônia italiana no Brasil e, em especial no Estado de São Paulo, atingia o auge de sua prosperidade. Era mais unida e o sentimento da origem comum ainda era forte. A colônia italiana tinha a sua escola, a sua banda musical, o seu jornal, o seu clube social, o seu teatro, os seus estabelecimentos comerciais, as suas fábricas e até a sua loja maçônica. Longe deles qualquer sentimento divisionista, ao contrário, o que havia era uma natural aglutinação de pessoas com a mesma origem, os mesmos costumes, a mesma paixão pelas coisas Como ocorrera, com muito sucesso, na capital, onde a colônia italiana erguera o imponente Hospital Umberto Primo (Hospital Matarazzo), em 1904, ampliando-o sucessivamente, o exemplo passou a ser seguido pelos núcleos mais expressivos dos imigrantes italianos nas cidades do interior do estado.

E, como exemplo, vamos retratar uma cidade do interior paulista: Botucatu. Estava situada no limite de onde chegara a Estrada de Ferro Sorocabana, em 1889 e dali partindo para a conquista do interior, “plantando” cidades com o progresso que as suas poderosas paralelas levavam: Lençóis Paulista, Bauru, Assis, Ourinhos e Presidente Prudente se destacando entre tantas outras...

Na segunda metade dos anos 20, Pedro Delmanto (Pietro Del Manto) já tinha completado seu ciclo produtivo: com fazenda de gado, curtume, fábrica de calçados (máquinário importado da Alemanha) e loja de comércio, sendo que exportava calçados para a França e a Alemanha. Era um imigrante empreendedor de sucesso. Mas tinha um grande sonho: um hospital para atender a forte colônia italiana de Botucatu e dirigido por seu filho primogênito, Aleixo, que se formara em Medicina pela Real Universidade de Parma, na Itália. Assim, construiu e inaugurou a Casa de Saúde Sul Paulista, em 1928, trazendo como seu Diretor Clínico, o Professor Titular de Cirurgia Clínica da Real Universidade de Nápoles, Dr. Ludovico Tarsia que tivera que se exilar no Brasil por problemas políticos na Itália.

O exemplo de Botucatu é meramente referencial a mostrar o Empreendedorismo dos Imigrantes a se espalhar por todo o Brasil.

Elege o irmão para o Senado Italiano

Por duas vezes é convidado para o Senado Italiano. Por fim, indica seu irmão, André Matarazzo que foi eleito para a Câmara Alta Italiana. Com sua “Casa Bancária” representa no Brasil o Banco de Nápoles, liderando a arrecadação para ajuda financeira dos italianos residentes no exterior para envio para a Itália (cerca de 85 mil contos, 50% do déficit nacional). Esse grande e patriótico trabalho levou o Rei Vittorio Emanuelle III a lhe conferir o título nobiliárquico de Conde, em 1917, concedendo-lhe, em 1926, a hereditariedade ao título.

NO ANO MÁGICO DE 1934 - Afora as comemorações pelos oitenta anos, o Conde Matarazzo viveria seguidas vitórias: foi considerado o “Empreendedor do Século”; o sucesso da publicação do livro “Il Conde Matarazzo a ottant’anni”; a conquista do Tri-Campeonato Paulista de Futebol (1932/33/34) pelo Palestra Itália (Palmeiras), clube da Colônia Italiana presidido por Dante e a eleição, com a maior votação do estado, do Deputado Estadual Constituinte, Dante Delmanto. Dante era filho de seu conterrâneo (Castellabate) e amigo, o imigrante italiano Pedro Delmanto, industrial no interior do Estado (Botucatu).

O OCASO DO IMPÉRIO – Quem poderia imaginar que o “Império Matarazzo” poderia acabar?!? Quem imaginaria o ocaso?!? É o fim, a pobreza? Não, seguramente, não! A família continuará, por gerações, a viver bem, mas é o ocaso do complexo industrial Estudos acadêmicos nos mostram que duas empresas seguiram rumos diferentes, ambas empresas familiares: IBM e IRFM. Os donos da IBM abriram o capital social, perderam o controle direto, mas ficaram acionistas da que é hoje uma das maiores empresas do mundo A IRFM, optou , após a morte do Conde (1937), pela administração familiar. Com o falecimento do sucessor, Conde Matarazzo II (início dos anos 80), com as desavenças entre os filhos pelo controle acionário do grupo, ficou inviabilizada economicamente a empresa...

A verdade é que tudo mudou e apenas restou a imagem lendária do menino que naufragou nas costas do Brasil, perdeu uma partida de queijos e vinhos, iniciou a revolução industrial brasileira e virou Conde... (AMD)

Comentários (Blog do Delmanto):

Caro Delmanto,

1 - Recebi com muito prazer a matéria que fez sobre Francesco Matarazzo. Realmente um homem que mudou o Brasil e nos deixou um exemplo incomparável. Muitos de seus princípios nos norteiam até hoje. Seja como industrial como também na vida pública. Gostei demais dos comentários sobre a matéria. Significam que as pessoas sabem separar as coisas. Te agradeço a atenção. Um forte abraço Andrea (Andrea Matarazzo - amatarazzo@sp.gov.br). 14 de julho de 2011

2 - Prezado Armando, Agradeço pelo material enviado. O abraço, Senador Eduardo Matarazzo Suplicy. 5 de julho de 2011

3 - Caríssimo Armando. Foi nessa Casa de Saúde Sul Paulista que Dr. Tarsia operou meu pai de uma apendicite aguda no ano de 1932, época da revolução. Ainda quero lhe contar: Meu avô Luiz Smaniotto trouxe da cidade italiana de Trento um navio de imigrantes pelo ano de 1800 e não sei quantos, aportou nas costas de Santa Catarina, adquiriu um pedaço de terra e fundou a cidade de Nova Trento (terra de irmã Paulina, hoje Santa Paulina) Com duas mulheres meu avô foi pai de 33 filhos. Em l895, alí nasceu minha mãe. Hoje, Nova Trento é uma cidade bonita e orgulha os catarinenses por ser a terra de Santa Paulina e abriga grande número de turistas devotos. Parabéns pelo belo artigo neste blog, exaltando os imigrantes italianos. Lembro-me perfeitamente das famílias ali citadas, desde a cervejaria Bacchi perto do pontilhão da Sorocabana. A filha do “patriarcha” Bacchi foi a primeira mulher a dirigir carro em Botucatu. Tempo muito saudoso. Abraço forte. Neide (neidesanches@uol.com.br). 5 de outubro de 2011 19:47

Delmanto disse Salve, Neide. Seu comentário é muito valioso. É preciso resgatar esse período tão importante para Botucatu, como foi o da implantação e existência da Casa de Saúde Sul Paulista. O seu testemunho sobre o Prof. Tarsia é o primeiro caso concreto que temos conhecimento sobre a sua atuação em Botucatu. No início dos anos 30, era uma honra para uma cidade de porte médio contar com a experiência e competência de um Cirurgião Catedrático de uma Universidade da Europa (Nápoles). E sobre a colônia de Nova Trento é uma verdadeira riqueza. Obrigado por seu interesse. Grande abraço,5 de outubro de 2011

4 - Caro Sig. Delmanto, È con enorme piacere che ho avuto conoscimeto del tuo lavoro. “Momento MAGGIORE Italia/Brasile = Conte Matarazzo!” Già conoscevo la fama del Conte Matarazzo, essendo certo che negli anni1930/40 lui era considerato l’italiano piu ricco del mondo! Questo lavoro ritratta bene l’importanza dell’immigrazione italiana per il Brasile . La stesso è occorso in altri Paesi come Stati Uniti, Canada e L’Australia. A compitua integrazione della Colonia Italiana con i brasiliani à il principale distaco per aspetto positivo di questa immigrazione. Saluti per il bello e ricco lavoro. Cordialmente, Paolo Trevisani (paolo.trevisani@comune.bologna.it) 4 de outubro de 2011

“Assis Chateaubriand em 1934, esse grupo industrial de “O ESTADO MATARAZZO”, lembrando que São Paulo tinha uma renda bruta de 400 mil contos e o parque industrial Matarazzo uma receita de 350 mil, acima de qualquer outra unidade federativa brasileira...O Conde Matarazzo, financeira e economicamente é o segundo Estado do Brasil...”

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