Onde a vida faz a curva

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Diário da Manhã

OPINIÃOPÚBLICA

GOIÂNIA, SEGUNDA-FEIRA, 28 DE NOVEMBRO DE 2011

OPINIÃOPÚBLICA opiniao@dm.com.br (62) 3267 1147

Editora: Sabrina Ritiely

ONDE A VIDA FAZ A CURVA Batista Custódio Editor-geral do

Diário da Manhã

G

OSTO de escrever como o pássaro de voar. Ausente dos artigos, estou condor na gaiola. Sou na companhia dos leitores o irmão na casa da família. Não vivo dinheiro. Existo sonhos. Não meço dificuldades. Estendo otimismo. Vou para as lutas como quem sai para receber a vida. Viajo nos horizontes a esperança nascendo. Visto o branco do noivado das alvoradas beijando os dias. Tinjo o olhar no poema dos crepúsculos bordando as noites. Ouço a canção dos ermos no namoro das estrelas. O mundo busca-me no coração. E vejo o eterno do perfume no breve das flores. Ando o tempo todo dentro da cabeça para estar sempre onde irão chegar as gerações seguintes e ir-me atualizado na evolução do conhecimento. A pessoa que ficar parada na calçada de uma esquina não conhecerá a sua cidade. Também todo aquele que permanecer paralisado na atividade exercida e não se movimentar na inteligência não descobrirá a sua vocação, que é o dom da utilidade realizadora inata em Ludwing van Beethoven, a música; em Albert Einstein, física e a química; em William Shakespeare, a literatura; em Mohandas Karamchand Gandhi, a paz; em Odilon Santos, de Araguari, o transporte coletivo, e em José Pereira Cardoso, de Ponte do Norte, a quitanda. Esses dois mineiros fizeram de si o sucesso em Goiás. Porque trabalharam com o material da sua vocação. A sede no ideal de transcender-me ao que estou na imprensa, para cum-

Einstein

prir o que sou na vocação do jornalismo, esmagame de angústia no conviver com jornalistas desabitados de caráter. Estar frequente na labuta diária das edições no jornal, e não estar presente na autoria dos editoriais submetem-me àquele jejum de um diabético produzindo pudim, manjar, rosca, brevidade nas doçarias para outros se deliciarem. Nunca escrevi tantos artigos como neste ano. Estão às dezenas no prelo da gaveta em minha biblioteca. Vários passam de 50 laudas. Serão editados quando me vier no tempo o momento propício de ser rodada a chave que fecha o percurso das armadilhas e abre o roteiro sem as trapaças contra a estabilidade do jornal. O fato de haver parado de publicar meus artigos é o ato de abstinência a que me obriguei como única condição de manter o Diário da Manhã, com a liberdade aberta para a sociedade opinar, e sem despertar a conjunção do autoritarismo no corredor polonês dos corruptos, que se montou na

Gandhi

Shakespeare

política, fora e dentro do poder em Goiás. O trabalho estafante tem sido-me a receita na serviceira para reerguer o jornal, tão despedaçado, como se ali estivera uma facção de desordeiros missionários endemoniados para reduzir aos cacos o meu sonho, enquanto eu estava ausente e escrevendo o livro SagaSonho. Jazia em tudo a comoção de vida se apagando com desesperante súplica de salvação. Todas as dores que me ficaram caladas das golpeadas recebidas, anos a fio, para não deixar o Cinco de Março e o Diário da Manhã caídos, estavam ali sangrando-me nos sentimentos. Flagelava-me aos olhos a realidade que eu não queria ver. A pilhagem amoitada na inoperância administrativa. O saqueamento escondido na penúria financeira. O esbulho encoberto no deszelo das máquinas. A decomposição moral ocultada no lixoso dos cômodos. O conluio dos aproveitadores na cedição destilada no desestímulo dos funcionários. A

Beethoven

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infiltração macia de tendências cavilosas conjurando manchosamente no invólucro da amizade contra a ética histórica da minha resistência no jornalismo livre das tendenciosidades em proveito próprio. Reassumi em janeiro o comando do Diário da Manhã na tapera das esperanças. Tudo era acabado nos ânimos esmorecidos. Rosto a rosto as incertezas desenhavam nos semblantes o aguardo do momento final no não há mais. A luz que resplandecera na calva do peito raiava o fogo do interno na chaga das gotas. Os olhos segurando choro, a saúde matando as doenças, o esforço vencendo os cansaços no corpo dobrado na carga dos 76 anos, a alma sofria na cisão das amizades idas na gratidão não lembrada por pessoas esquecidas das derrotas revertidas em vitórias. Olhei, um velho conhecido me esperava: o chão, e nele os meus rastros, com o cavado dos calcanhares nas descidas e com a marca dos dedos nas subidas; era só pisar

Odilon Santos

decidido nas adversidades e firmar a cabeça nas ideias criativas, que daria no tropeção das quedas o salto para o triunfo. Já fui empurrado por trás a esse chão. Ele é duro. Mas é o único lugar consistente para se pisar com firmeza e subir quantas vezes cair. É onde a vida faz a curva: os fracos se apequenam e os fortes se agigantam. Vai-se à forja no baque das mudanças no doloroso. Sumi no mundo e revi a solidão das apreensões desoladoras no íntimo e não compartilhada sequer pelo alívio das solidariedades externadas. A vida leva-nos e traznos sozinhos na gente às horas da morte. Às vezes sentimos ser menos temeroso o instante de morrer que perigoso o momento a viver. O temerário observa-nos de todos os olhos nessas horas sem a alternativa da pendência. Singrei travessias nas tormentas de golfos transbordados nas virações de tufões que me deixavam confuso se o que via era delírio no azul dos céus se mexendo ou se era realidade o azul se movendo nas ondas. Talvez fosse apenas a enchente dos dias de dois tempos afogando-me na mente – antes represados nas marés montantes das águas contrárias que passaram na proa e depois arrombadas nas calmarias das águas que se esvaziaram na popa. Velejei à deriva nos trapos da decepção pelo caudal dos ingratos e não desestendi o manto do perdão na correnteza das traições. Suei dores. Escrevi orações no sentimento. Respirei fadigas. Busquei ar na compressão das asfixias. Comi remédios. Sobrevivi a centavos. Economizei até raivas ultrapassadas da tolerância humana. Jogado às baixezas que desnivelam os caráteres

J. Pereira

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Os caroços da corrupção na licitação de compra da Montanha-Russa do Mutirama

OPINIÃOPÚBLICA rastejantes, voltei intocável nos trunfos do digno. Nas forças do combate estãome as energias do vencedor. Rebatizo na sequidão da lágrima o velho jornalista com o suor do moço no jornalismo. A nau da imprensa construída no perenal da utopia, às vezes navio, às vezes submarino, não encalha nos naufrágios, e, se preciso, às vezes trator, às vezes aeronave, não encrava no litoral nem abalroa nos horizontes. Os obstáculos são naturais, o destino os traz, o destino os leva. Só caem vencidos nos reveses os que negam na pessoa o destinado no espírito, co-

mo o jornalista que se agacha nas nomeações oficiais ou se ajoelha nas verbas de propaganda. As premonições são visões extrassensoriais pressagiando o que vai acontecer a tempo de ser evitado. O pressentimento abre-me nos olhos o vértice do ângulo que permite enxergar por trás das montanhas os precipícios e a via estreita por onde passar a salvo. Os que me avaliam como precipitado nos embates desnecessários com o poder, não percebem que são etapas em que estou desamarrando a imprensa da arrogância dos governantes. A intuição percep-

tiva é a minha bússola, ampliada pelas lentes do conhecimento da política como ciência, que as troco conforme as variações das tocaias no panorama, e não adianta me provocarem na paisagem das artilharias, pois reajo apenas quando o alvo está no alcance da mira certeira. A experiência mostroume no reduto de onde sopram favoráveis os ventos dos desafios no núcleo dos perigos. Os embalos nas descidas movem os impulsos nas subidas. Não há mistério para encontrar o ponto onde se dobra da destruição para reconstrução.

A obstinação é o fenômeno impulsor dos idealistas ousados. A tenácia do determinismo no timão é o segredo de o Diário da Manhã haver sido mantido à tona no dilúvio das pressões de autoritarismos à borda das mentalidades medievais. O jornal já navega seguro, a terra à vista, a bandeira da liberdade hasteada no mastro amostra no fim do nevoeiro, o sol luzidio a estibordo, o azul dos céus dissolvendo no azul das águas as últimas manchas brancas dos icebergs, as âncoras já arriadas na enseada do Porto Povo. Ainda estou atravessando horas que me estão

amargas na Terra e me são doces no Céu. Olhem no coração dos goianos. Estou lá. Os que trabalham nas eleições de seus mandatos no povo, a serviço do povo de sua casa, podem continuar tentando reduzir-me a pó do jornalismo nas terras de Goiás. Será em vão, a não ser no dia que conseguissem enterrar de vez a liberdade de imprensa nas exéquias da consciência das perebas do populismo, já vivendo os seus dias de velório na clientela eleitoral e com atestado de óbito nas feridas da freguesia dos superfaturamentos nos negócios públicos.

EM ALGUM LUGAR NO CORAÇÃO cas do mapa nas redondezas do Paço. As metrópoles estão sufocadas pelo congestionamento de ruas, de avenidas, de praças e de casas construídas nas áreas públicas – como São Paulo e Rio de Janeiro – e se pudessem voltar no tempo, não fariam a devastação que o prefeito de Goiânia usa a Câmara Municipal para legalizar a especulação imobiliária predadora nos cerrados do Paço. A área dá para fazer do crime ecológico um pasto de engorda na campanha eleitoral. Mas o Paulo Garcia twitta: “A minha resposta será o trabalho pela cidade.” A obra que ficará do trabalhador na derrubada das árvores nativas nos alqueires do Paço Municipal, será uma cruz à espera de Paulo Garcia na história de Goiânia. O jornalista Luiz Carlos Bordoni provocou no próprio twitter do prefeito: “Por que não chegam na cara do Batista Custódio e lhe dizem que o jornal dele é comprado, está a serviço desse ou daquele? Porque não são homens.” Bordoni merece cachê do meu agradecimento. Tenho notado a coceira na vaidade de chefes de partidos, jogando a meiocampo como atacantes da

A

imprensa do País mostra a faxina da corrupção que a presidenta Dilma Rousseff está fazendo no Brasil, que, positivamente, evoluirá para o arrastão do patrimônio dos corruptos e, necessariamente, expandirá para os Estados e os Municípios. Mas o prefeito de Goiânia, médico Paulo Garcia, parece estar sofrendo em sua visão política – ou de astigmatismo, que deforma a realidade no cenário; ou de ambliopia, que embaça a imagem das vistas; ou de amaurose, que é a cegueira –, pois é do seu opaco boato de líder que pareceu com a visibilidade empanada pelas remelas do equívoco na internet em seu twitter. Paulo não está conseguindo entregar a Mensagem a Garcia que recebeu de Iris. E twittou, arrogante: “Sinceramente, não sei o que oDiário da Manhãtem contra mim. Corrupção? Eu? Só quem não me conhece ou age de má-fé. Me desculpem o desabafo.” Reconheceu a grosseria ao pedido de desculpa e prosseguiu enrustido na petulância: “Eu sei que vão me criticar por falar isto aqui, mas estão ultrapassando o limite do razoável.” O prefeito da Capital é um zum-zum nos votos do irismo e um diz-quediz-que bamboleteando no elo de fichas sujas no petismo em sua gestão. Não adianta tirar fotos com Dilma Rousseff. O retrato que moldura a sua administração é o da licitação da Montanha-Russa do Mutirama. A brincadeira com dinheiro público está fotografada no voto do conselheiro Sebastião Monteiro, do

Paulo Garcia

TCM, com os caroços da corrupção, sem retoques. Na twittagem, o prefeito adverte que o Diário da Manhã está “ultrapassando o limite do razoável”.O que está extrapolando é a tolerância do alcaide com os desmandos arrolados no relatório do íntegro Wagner Guimarães, que se demitiu do cargo de Con-

trolador Geral do Município de Goiânia, escandalizado com o rosário das contas no cruz-credo dos pecados administrativos. O vereador Elias Vaz, voz da oposição na Câmara Municipal, tem ensurdecido o silêncio do prefeito ante o vendaval das grilagens oficiais que ameaçam varrer as áreas públi-

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Bordoni

Czepak


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Elias Vaz

Wagner Guimarães

A petição

oposição em Goiás e como laterais no estádio da situação em Brasília, comichando o desejo de verborrarem seus cochichos: “O Diário da Manhã está comprado pelo Marconi Perillo.” Marcariam gol contra. Era a oportunidade para eu dizer para as arquibancadas os nomes dos políticos goianos donos das fortunas roubadas nos governos do País, do Estado e dos Municípios. Seria o prélio aberto ao público. A herança latifundiária que abandonei pela pobreza no jornalismo versus a penúria dos que subiram para a fortuna na política. Antes. Precisam medir o tamanho de minha história nas lutas a fogos intensos. Depois. Necessitam medir a curta metragem de suas figurações nos artigos sem passagem por dentro dos temas polêmicos. Final. Polêmica é o duelo das armas na versão literária. Nos duelos, não vence o da arma cara, mas vence o da pontaria melhor. Nas polêmicas, não ganha o de colete no poder, mas ganha o da melhor munição no conhecimento e com reflexo rápido nas respostas seguidas nos argumentos aos ataques. Para polemizar com o Paulo Garcia, eu nem precisaria usar o cérebro. Em algum lugar do coração, o sentimento não gostaria que o dedo no gatilho estivesse na mão que fosse do braço do Paulo. Ele é um bom na pessoa do prefeito desaforado co-

migo no twitter. Seria sacudir orvalho em talo de capim. Bastaria abalá-lo com um jato de água benta para descascar a petulância incrustada no cargo a que não chegou levado nos ombros de eleitores seus, mas na garupa dos eleitores do Iris. Mas se o prefeito da Capital é desses habitantes na vaidade do poder e deseja experimentar o exercício de uma polêmica com intensidade carbonária, franqueio-lhe espaço garantido nas páginas do Diário da Manhã. Mas que não saia a sol brando no qual se temperou na política às fogueiras filtradas nas penumbras de jornalistas encapados nas redomas do servilismo. E que venha nos latidos o dono da casa. Porque só miro a cumeeira e não os hospedados nos cômodos, para que o senhor da festa combata ao som animado de seus cães ladrando em retirada no terreiro restado às cinzas. Os assistentes imaginarão estar vendo nas cinzas os vultos deles à luz do crepúsculo. Os participantes verão no fogo, não cinzas, lavas inflamadas do vulcão das ideias. Paulo não pode continuar com a sua generosidade pendurada no cabide de aluguel à solidariedade cúmplice às brigadas ideológicas. Deve recorrer à compreensão de que toda briga é burra. Têm os mais errados e os menos errados. O prefeito tem entre seus garcianos os sujados para a vida pública

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O prefeito e seus garcianos sujados na Lei da Ficha Limpa

Sebastião Monteiro

O voto

O relatório

na Lei da Ficha Limpa na política. Eles carecem sair do armário da mentalidade de vítimas para a lucidez de que seus próprios algozes são si mesmos. O veneno que mata o mal é o remédio do bem. Na página 190 de Doutrina VIVA, ditado pelo espírito de Francisco Cândido Xavier e psicografado por Carlos Baccelli – o kardecista com espiritualidade catequizada pelo iluminado de Uberaba e autor do livro não difundido como merece, por ser uma ponderação advertidora aos médiuns –, está escrito: “Mal trabalha contra si mesmo.” Volte a ser a pessoa humilde que fora, Paulo Garcia! Desvista-se da arrogância que a síndrome de importância trajou na personalidade do prefeito, com corte e costura nas alfaiatarias com as ilusões no poder, sob medida dos figuristas da bajulação especializada na criação de fantasias. A roupa do carisma de populista e tocador de obras de Iris Rezende não assenta no figurino político no mandato de prefeito por empréstimo da vice. O prefeito está fora de moda no modelo alinhavado com remendos do prestígio popular do antecessor. Ao Paulo Garcia impõe-se ao sacrifício intelectual de ler A roupa nova do rei. Ou recomendar ao primata de erudição embalsamada, o secretário de Imprensa Rodrigo Czepak, a inaugurar a sua inteligência no leitura do conto de Hans Christian Andersen.

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A ROUPA DO REI “Era uma vez um rei, tão exaHans Christian geradamente Andersen amigo de roupas novas, que nelas gastava todo o seu dinheiro. Ele não se preocupava com seus soldados, com o teatro ou com os passeios pela floresta, a não ser para exibir roupas novas.Para cada hora do dia, tinha uma roupa diferente. Em vez de o povo dizer, como de costume,com relação a outro rei: “Ele está em seu gabinete de trabalho”, dizia: “Ele está no seu quarto de vestir.” A vida era muito divertida na cidade onde ele vivia. Um dia, chegaram hóspedes estrangeiros ao palácio. Entre eles havia dois trapaceiros. Apresentaram-se como tecelões e gabavam-se de fabricar os mais lindos tecidos do mundo. Não só os padrões e as cores eram fora do comum, como, também, as fazendas tinham a especialidade de parecer invisíveis às pessoas destituídas de inteligência, ou àquelas que não estavam aptas para os cargos que ocupavam. “Essas fazendas devem ser esplêndidas”, pensou o rei. “Usando-as, poderei descobrir quais os homens, no meu reino, que não estão em condições de ocupar seus postos, e poderei substituí-los pelos mais capazes... Ordenarei, então, que fabriquem certa quantidade deste tecido para mim.” Pagou aos dois tecelões uma grande quantia,adiantadamente, para que logo começassem a trabalhar. Eles trouxeram dois teares nos quais fingiram tecer, mas nada havia em suas lançadeiras. Exigiram que lhes fosse dada uma porção da mais cara linha de seda e ouro, que puseram imediatamente em suas bolsas, enquanto fingiam trabalhar nos teares vazios. – Eu gostaria de saber como vai indo o trabalho dos tecelões – pensou o rei. Entretanto, sentiuse um pouco embaraçado ao pensar que quem fosse estúpido, ou não tivesse capacidade para ocupar seu posto, não seria capaz de ver o tecido. Ele não tinha propriamente dúvidas a seu respeito, mas achou melhor man-

dar alguém primeiro, para ver o andamento do trabalho. Todos na cidade conheciam o maravilhoso poder do tecido e cada qual estava mais ansioso para saber quão estúpido era o seu vizinho. – Mandarei meu velho ministro observar o trabalho dos tecelões.Ele,melhor do que ninguém, poderá ver o tecido,pois é um homem inteligente e que desempenha suas funções com o máximo da perfeição – resolveu o rei. Assim sendo, mandou o velho ministro ao quarto onde os dois embusteiros simulavam trabalhar nos teares vazios. – “Deus nos acuda!!!”,pensou o velho ministro, abrindo bem os olhos.“Não consigo ver nada!” Não obstante, teve o cuidado de não declarar isso em voz alta. Os tecelões o convidaram para aproximar-se a fim de verificar se o tecido estava ficando bonito e apontavam para os teares. O pobre homem fixou a vista o mais que pode, mas não conseguiu ver coisa alguma. – “Céus!”,pensou ele.“Será possível que eu seja um tolo? Se é assim, ninguém deverá sabê-lo e não direi a quem quer que seja que não vi o tecido.” – O senhor nada disse sobre a fazenda – queixou-se um dos tecelões. – Oh, é muito bonita. É encantadora! – respondeu o ministro, olhando através de seus óculos. – O padrão é lindo e as cores estão muito bem combinadas.Direi ao rei que me agradou muito. – Estamos encantados com a sua opinião – responderam os dois ao mesmo tempo e descreveram as cores e o padrão especial da fazenda. O velho ministro prestou muita atenção a tudo o que diziam,para poder reproduzi-lo diante do rei. Os embusteiros pediram mais dinheiro, mais seda e ouro para prosseguir o trabalho. Puseram tudo em suas bolsas. Nem um fiapo foi posto nos teares, e continuaram fingindo que teciam.Algum tempo depois, o rei enviou outro fiel oficial para olhar o andamento do trabalho e saber se ficaria pronto em breve. A mesma coisa lhe aconteceu: olhou, tornou a olhar,mas só via os teares vazios. – Não é lindo o tecido? – indagaram os tecelões,e deram-lhe as

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OPINIÃOPÚBLICA mais variadas explicações sobre o padrão e as cores. “Eu penso que não sou um tolo”, refletiu o homem. “Se assim fosse, eu não estaria à altura do cargo que ocupo.Que coisa estranha!!”... Pôs-se então a elogiar as cores e o desenho do tecido e, depois, disse ao rei: “É uma verdadeira maravilha!!” Todos na cidade não falavam noutra coisa senão nessa esplêndida fazenda, de modo que o rei, muito curioso, resolveu vê-la, enquanto ainda estava nos teares. Acompanhado por um grupo de cortesões, entre os quais se achavam os dois que já tinham ido ver o imaginário tecido, foi ele visitar os dois astuciosos impostores. Eles estavam trabalhando mais do que nunca,nos teares vazios. – É magnífico! – disseram os dois altos funcionários do rei. – Veja Majestade,que delicadeza de desenho! Que combinação de cores! – apontavam para os teares vazios com receio de que os outros não estivessem vendo o tecido. O rei, que nada via, horrorizado pensou: “Serei eu um tolo e não estarei em condições de ser rei? Nada pior do que isso poderia acontecer-me!” Então, bem alto,declarou: – Que beleza! Realmente mere-

ce minha aprovação! Por nada neste mundo ele confessaria que não tinha visto coisa nenhuma. Todos aqueles que o acompanhavam também não conseguiram ver a fazenda, mas exclamaram a uma só voz: – Deslumbrante!! Magnífico!! Aconselharam eles ao rei que usasse a nova roupa,feita daquele tecido, por ocasião de um desfile, que se ia realizar daí a alguns dias. O rei concedeu a cada um dos tecelões uma condecoração de cavaleiro, para ser usada na lapela, com o título “cavaleiro tecelão”.Na noite que precedeu o desfile,os embusteiros fizeram serão. Queimaram dezesseis velas para que todos vissem o quanto estavam trabalhando, para aprontar a roupa. Fingiram tirar o tecido dos teares, cortaram a roupa no ar, com um par de tesouras enormes, e coseram-na com agulhas sem linha. Afinal,disseram: – Agora, a roupa do rei está pronta. Sua Majestade, acompanhado dos cortesões, veio vestir a nova roupa. Os tecelões fingiam segurar alguma coisa e diziam: “Aqui está a calça,aqui está o casaco, e aqui o manto. Estão leves como uma teia de aranha. Pode parecer a alguém que não há nada cobrindo a pessoa, mas aí é

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que está a beleza da fazenda.” – Sim! – concordaram todos, embora nada estivessem vendo. – Poderia Vossa Majestade tirar a roupa? – propuseram os embusteiros. – Assim poderíamos vestir-lhe a nova, aqui, em frente ao espelho.O rei fez-lhes a vontade e eles fingiram vestir-lhe peça por peça. Sua majestade viravase para lá e para cá, olhando-se no espelho e vendo sempre a mesma imagem,de seu corpo nu. – Como lhe assentou bem o novo traje! Que lindas cores! Que bonito desenho! – diziam todos com medo de perderem seus postos se admitissem que não viam nada. O mestre-de-cerimônias anunciou: – A carruagem está esperando à porta, para conduzir Sua Majestade durante o desfile. – Estou quase pronto – respondeu ele. Mais uma vez, virou-se em frente ao espelho, numa atitude de quem está mesmo apreciando alguma coisa. Os camareiros que iam segurar a cauda, inclinaram-se, como se fossem levantá-la do chão, e foram caminhando, com as mãos no ar, sem dar a perceber que não estavam vendo roupa alguma. O rei caminhou à frente da carruagem, durante o desfile.

Atualmente, matar um tatu para comer é mais crime que assassinar uma pessoa O povo, nas calçadas e nas janelas, não querendo passar por tolo,exclamava: – Que linda é a nova roupa do rei! Que belo manto! Que perfeição de tecido! Nenhuma roupa do rei obtivera antes tamanho sucesso! Porém, uma criança que estava entre a multidão, em sua imensa inocência, achou aquilo tudo muito estranho e gritou: – Coitado!!! Ele está completamente nu!! O rei está nu!! O povo, então, enchendo-se de coragem,começou a gritar: – Ele está nu! Ele está nu! O rei, ao ouvir esses comentários, ficou furioso por estar representando um papel tão ridículo! O desfile, entretanto, devia prosseguir, de modo que se manteve imperturbável e os camareiros continuaram a segurar-lhe a cauda invisível. Depois que tudo terminou, ele voltou ao palácio, de onde, envergonhado, nunca mais pretendia sair.Somente depois de muito tempo,com o carinho e afeto demonstrado por seus cortesões e por todo o povo, também envergonhados por se deixarem enganar pelos falsos tecelões, e que clamavam pela volta do rei, é que ele resolveu se mostrar em breves aparições... Mas nunca mais se deixou levar

pela vaidade e perdeu para sempre a mania de trocar de roupas a todo momento. Quanto aos dois supostos tecelões, desapareceram misteriosamente, levando o dinheiro e os fios de seda e ouro. Mas, depois de algum tempo, chegou a notícia na corte de que eles haviam tentado fazer o mesmo golpe em outro reino e haviam sido desmascarados, e agora cumpriam uma longa pena na prisão.”

Leão de Judá simboliza o poder com majestade máxima e foi inspirado na cultura dos assírios e dos babilônios, que identificavam nesses felinos a figura da soberania imperial. As Tábuas Coroadas eram sustentadas por Leões de Judá empinados esculpidos em pedra e que atualizados no simbolismo, pelo menos na imobilidade do granito, servem de alegoria à empáfia de Paulo Garcia no cargo de prefeito da Capital. O Leão de Judá em carne e osso com poder de rugir prestígio é Iris Rezende.

AS MUITAS FACES DA VERDADE

Tenente-coronel Ricardo Rocha

O

falso na responsabilidade de muitos, estampada na culpa de um na imprensa, insulta-me como a presença da víbora ofende a vida nascendo nos ninhos. O apetite que devora na peçonha das serpentes os passarinhos sem asas tem a mesma voracidade na impunidade das honrarias que voam quais aves de arribação pelos céus do poder e deixam abandonados em sua toca sendo estraçalhada no chão do poleiro a honra dos que foram usados como patos adestrados por eles. As minhas dores não me ferem e sofro muito nas feridas dos outros. Não consigo conter minha indignação e manter-me calado perante o injusto nas razões da piedade humana e é justo nas leis que codifi-

cam a qualidade dos mesmos delitos nos crimes, de forma diferenciada nas sentenças de absolvição sem tanto e de condenação para tantos. Ao ler as peças da Operação Sexto Mandamento antevi – na busca bem-intencionada da Polícia Federal aos grupos de extermínio da Polícia Militar de Goiás – a abertura no teto do Brasil, onde corrupção pinga do poder e respinga os bandidos da criminalidade em todos os fundos dos Três Poderes da República para células do organismo social. O crime organizado é uma sífilis. Contaminou as estruturas institucionais nos governos no Brasil. Como se faz exame de sangue e urina, radiografias, tomografias para se diagnosticarem as doenças ocultas no corpo, faz-se indispensável um

checkup moral da austeridade nos organismos do poder. A febre da corrupção está alta nos termômetros. E mascarada nos sintomas da consciência. Controlada a emplastros nos inchaços da ratonice corporativista. Altíssima na pressão arterial dos subornos e das propinas em conluio amistoso nas franquias circulatórias do narcotráfico, dos roubos de carros, das pistolagens, das lavagens de dinheiro à esquerda e à direita no centro dos escalões partidários, por cima e por baixo nos poderes. Olhei com profundidade os porões do escândalo do crime de extermínio da Polícia Militar do Estado de Goiás. É a casa dos horrores. A Operação Sexto Mandamento assombra no pesadelo dos espectros vagando tontos nos labirintos dos depoimentos. As contradições escondem vultos nas gravações transcritas. As escapadas estratégicas nas declarações levam às janelas, às saídas abertas de dentro e de fora nas leis. Percebi que há muita corrupção estancada no telhado da política e no piso da polícia. O grupo de extermínio da PM é apenas uma das goteiras. Há outras fechadas que gotejam mais jorrantes e estão estancadas em Goiás. A Polícia Federal faz o que pode. Os políticos fazem o que não podiam. Fizeram nas bancadas dos partidos no Congresso Nacional o crime nas leis. Os bandidos estão matando pessoas à vontade, endeu-

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sados pela idolatria ao crime organizado na mentalidade do Estatuto dos Direitos Humanos. Matar atualmente um tatu para comer nos campos é mais crime que assassinar uma pessoa nas cidades. Todo cidadão goiano só já não sabe quem será o próximo a ser morto a qualquer momento em toda parte no Estado. Sabe apenas que a polícia está desorganizada e que o crime organizado continuará matando a todo instante. E sabe também que a próxima vítima poderá ser qualquer um, inclusive o próprio. As frutas caem das árvores, espalham-se no chão e nascem viçosas no húmus das folhas apodrecidas. Assim está o crime. A corrupção cai do poder, espalhase na sujidade dos cargos e nasce fertilizada no povo. Como as árvores de enxerto dão frutos de qualidade modificada da espécie nativa, quando são adicionados ao poder gestores sem capacitação específica para as atribuições da função, o resultado produzido é condizente com o desempenho das malinações administrativas artificializadas. Existem árvores enxertadas que geram dois tipos de frutas: a congênita do tronco e a transgênica no galho. Na fauna humana, o fenômeno é o mesmo da flora frutífera. Há gestores com a imagem da moralização florida na borda das frondes e botões da corrupção granados no intermeio das folhas na copa. A marginalidade que está ceifando vidas nas áreas

metropolitanas e urbanas é irrigada pela cumplicidade nos canteiros policiais, assim como a sonegação suga a rentabilidade da arrecadação dos impostos na permissividade fiscal. O Brasil está uma roleta do carteado na política. Até o jogo não é legalizado nos cassinos, quando representa uma fonte de renda substancial aos países civilizados, e não liberado aqui para que as autoridades continuem extorquindo mensalinhos da jogatina clandestina. Muitas leis servem de trapézios a acrobatas da corrupção no circo do poder lotado de caça-níqueis na plateia dos eleitores. O contrassenso contesta nas controvérsias do mistério a realidade das hipóteses no factual. O grupo de extermínio da Polícia Militar de Goiás segreda responsabilidades de dívidas quitadas por avalistas para os emitentes. Na Operação Sexto Mandamento, percebe-se que todo inocente tem alguma culpa nas inocências e que todo culpado tem alguma inocência nas culpas. Um dos militares envolvidos expôs-se a peito aberto nos confrontos de vida e morte com facínoras de altíssima periculosidade e fortemente armados, todos com passagens pregressas na reincidência de homicídios de chefes de família que subsistiam do trabalho honesto e mantinham o lar com o salário. Esse oficial penalizado não traz na farda a nódoa das execuções nos truci-


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OPINIÃOPÚBLICA damentos de encomenda. Ele viveu a boemia da ilusão doutrinada nos quartéis de se acabar com o crime à força. Não vegetou na embriaguez do dinheiro a soldo das empreitadas. O sangue derramado nos confrontos estancou o sangue que jorraria de pessoas pacatas dizimadas pelo crime organizado. Muitos acham bonito defender os bandidos nos movimentos sociais, nas praças públicas, até o dia em que perceberem como é feio quando a movimentação dos bandidos entra em sua casa. O dilema traz dentro o contraditório no suposto no real. Cabe aos lúcidos discernirem o impreciso e o exato nas situações confusas. Essa, a alternativa pendente no imbróglio do grupo de extermínio da Polícia Militar. Dos 17 presos, apenas um oficial permanece encarcerado na cadeia da Academia da PM. É o tenente-coronel Ricardo Rocha, logo ele!, que agiu tão-somente em confrontação sob a mira dos armamentos do crime organizado e não atuou nas execuções dos rendidos. Mesmo nos defrontamentos arriscados, ainda não era tenente-coronel, mas apenas até a major e cumprindo ordens dos coronéis comandantes dos quartéis. Foi usado. Subcondicionaram-no à mentalidade cartesiana da obediência incondicional à hierarquia militar rude e bruta. Ricardo Rocha é um herói que os galões superiores se serviram de sua bravura. O oficialato da época o manipulou no subconsciente como massa de manobra nos dogmas do belicismo de que se mata o crime ao matar-se o criminoso. A sua prisão é um banimento e sugere a figura de um bode expiatório peado pelas leis como

Coronel Macário

oferenda no holocausto pelas raposas da clandestinidade organizada no grupo de extermínio. A honestidade é explícita na retidão da carreira militar e na pobreza franciscana da esposa Lilian, tão moça e já tão consumida na súbita amargura, e das filhas Jordana e Raquel, tão meninas e já tão esmaecidas na tristeza funda, morando de aluguel no regado das despesas custeadas pelo soldo de Ricardo Rocha, conforme o documento da quebra de seu sigilo bancário. O semblante sulcado da família pelas humilhações à frente na indiferença da sociedade e às costas viradas dos coronéis prestando continência às conveniências. Essa mãe, à beira do extermínio na vontade de viver, e as filhas, às vizinhanças da jovialidade desfalecida na infância, vieram a mim com o apelo por um consolo que as aliviasse na travessia incerta. Na primeira vez, estiveram em minha sala no jornal, com a humildade suave do chinelo para não machucar o chão, e sem saber, traziam os passos que me levaram para dentro do seu martírio. O segundo encontro foi na biblioteca de minha residência. Era uma tarde calma como aquelas em que os sinos chamavam para a hora de rezar. Entregaram-me uma carta do seu amado Ricardo Rocha, escrita no cativeiro da Academia da Polícia Militar. Uma prece do desespero ao altar do meu sentimentalismo. Talvez a rememória do local do Cárcere do DI, onde estive preso oito meses na ditadura militar, por Crime de Opinião, a sua leitura trouxe-me os choros da minha família nas lágrimas do tenente-coronel Ricardo Rocha. Muitos veriam no pranto dele o

GOIÂNIA, SEGUNDA-FEIRA, 28 DE NOVEMBRO DE 2011

Os que choram os filhos assassinados ao voltarem da escola

O original da carta de Rocha

choro na casa dos mortos nos confrontos. Eu enxerguei no choro dos parentes dos bandidos o pranto dos familiares nas vítimas dos criminosos. Agora chorem na carta do Ricardo Rocha o pranto da orfandade e da viuvez pelos que irão morrer nos assaltos às portas dos bancos, nos roubos de carro a dias abertos, nas moças estupradas a caminho do emprego, nos filhos assassinados ao voltarem da escola, nos latrocínios do crime organizado dentro dos lares. E se sobrar uma lágrima, chorem por si, porque poderão ser as próximas. E chorem por último ao ler a carta do Ricardo Rocha até encher com o seu pranto os dois pratos da balança da Justiça, para ver se percebem qual das lágrimas pesa mais. Se é a que molha os olhos dos pais dos bandidos mortos ou se é a que não secará mais nunca no coração no dia em que matarem o seu filho! Se querem saber qual, antes que aconteça, perguntem ao desembar-

Major Alexandri

CONTINUA

gador José Lenar. Ele a chora sempre. “Sr.Batista Custódio, Peço somente ajuda. A pergunta é: por que só nós sete PMs ainda continuamos presos? Fomos presos no dia 15/02/11 por força da Operação Sexto Mandamento. Onde estão as provas? Os cemitérios? As vítimas? Por que ainda estamos presos? Éramos dezessete. Hoje somos apenas sete PMs presos. Estamos presos por força de somente um mandado de prisão da comarca de Alvorada do Norte. Um processo baseado apenas em denúncias anônimas e infundadas. Nenhuma testemunha nos reconhece. Não há provas. O excesso de prazo da Justiça em nos julgar é de 81 dias. Para todos os outros PMs, o excesso de prazo foi concedido. Para nós que ainda estamos presos não nos concede.Hoje faz 09 meses de prisão. Não fomos presos em flagrante. Não somos condenados. Temos direito de responder nossos processos em liberdade como qualquer outro preso. Pedimos ajuda ao senhor. Precisamos voltar para nossas casas. Estamos aqui na base de remédios antidepressivos e soníferos. Não somos bandidos.Não representamos perigo para a sociedade. O que pedimos ao Sr. é direito nosso! Responder nossos processos em liberdade. O juiz de Rio Verde já revogou minhas outras duas prisões preventivas. Por que a Comarca da Alvorada e o Tribunal não nos soltam. Esse é o meu questionamento! Se há grupos de extermínio, onde estão os outros? Por que somente nós ainda estamos presos? Há perseguição em relação à minha pessoa? Nos ajude,Sr.Batista.

Um abraço no Sr.! 14/11/2011”

Estou ciente de haver entrado no beco sem comiseração dos prejulgadores que lavam as mãos na bacia de muitos Pilatos. Mas flamulo na bandeira da clemência o pano da misericórdia de Verônica, por outro filho de Deus que está sendo crucificado no lugar dos Barrabás soltos nos grupos de extermínio civis e militares. Intriga-me a indignação daquela santa ira não contida no apedrejamento da Madalena pelos que também agora não podem atirar a primeira pedra no tenente-coronel Ricardo Rocha. A premonição traz-me nas tábuas da intuição perceptiva os cravos dos muitos fincados na cruz de Ricardo Rocha por martelos das chefias militares, das delegacias de polícia, da casta empresarial e da elite política, de medo de o tenente-coronel revelar em seu depoimento na Justiça os nomes dos carrascos do gólgota da corrupção que armaram em seu calvário. A conspiração para mantê-lo confinado na Academia da Polícia Militar é de que fugirá se for posto em liberdade condicional. A trama zomba do tirocínio acurado e só induz aos incautos da lógica que o tenente-coronel Ricardo Rocha evadirá se vier a ser posto em liberdade vigiada. Um absurdo. Será a oportunidade que lhe permitirá a provar a sua inocência nas culpas. Ele é as condecorações de frente nas suas medalhas por heroísmo. Assumiu com galhardia a autoria de todos os confrontos em que seria morrer e seria sair vivo. Não foragiu nem deixou na chapada os seis milita-

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OPINIÃOPÚBLICA res que enfrentaram ao seu lado a resistência armada das quadrilhas. Não recua nos confrontos nem avança nas execuções. Honra a farda em todos os limites da decência pessoal e cívica. A conjura para segurá-lo na prisão evidencia a preocupação de esticar o tempo, a fim de ser dopado com psicotrópicos, que são drogas legais necessárias nos surtos de transtorno mental, desde que ministrados por médicos psiquiatras, com tratamentos farmacológicos. Rocha está sedado por soníferos e calmantes no presídio da Academia do quartel. Mas se o efeito colateral dos remédios não danificar a sua estabilidade psíquica, ao ponto de justificar a arguição a sua insanidade, o testemunho em juízo do tenente-coronel Ricardo Rocha poderá ser, ao contrário do entendimento convenientemente consensual, a salvaguarda do mistério que angustia a tantos. Levantará a capa das elites com real poder de ir encobrindo inocentes e culpados do grupo de extermínio por trás da cortina dos tempos até ao final no esquecimento na memória da população. Na figuração do grupo de extermínio da Polícia Militar contracenam a coragem dos destemidos nos perigos e a valentia perigosa dos covardes nas fraquezas. Como no enredo e no elenco dos filmes, o que está em cartaz no telão da opinião pública é a série Crime Organizado, e reprisa-se a prática do mistério para dar audiência. Os atores iniciam representando papéis, uns como heróis, outros como bandidos, e só ao final é revelado o segredo da trama. Os que interpretavam os bandidos é que são os heróis e os que protagonizam os heróis é que são os bandidos. Os heróis são PMs personificados nos confrontos com o crime organizado e os bandidos estão personalizados nas execuções do grupo de extermínio. Na dramaturgia dos confrontos, os militares também morrem alvejados ao chumbo grosso dos membros de quadrilhas. Dentre tantas vítimas fardadas estão os tenentes Antônio Coelho, Alexandre Alencar Lacerda Rosa, Daniel Dantas, Euler Deolindo Justino Franco e José Albino Junior; os sargentos Divino Albino Batista, Josias Alves da Silva, Jean Clayton Gouveia Moreira, João Otto Correia, Paulo Ricardo de Moura Rezende e Wermiton Emi-

Diário da Manhã

OPINIÃOPÚBLICA

Estão dopando o tenente-coronel Ricardo Rocha com psicotrópicos no presídio da Polícia Militar

Lilian Garcia Rocha, Jordana Garcia Rocha, Raquel Garcia Rocha e o jornalista na biblioteca

lio Borges Taquary; os cabos Clodoaldo Vieira do Nascimento, Luís Hipólito de Rezende, Marco Aurélio Silva Santos, Sandro André de Souza, Sérgio Alves Feitosa e Robson da Silva Dourado; os soldados Adevone Mesquita, Célio Márcio da Silva, Claudomiro Gerônimo Oliveira Freitas, Danilo Souza Campos, Ednaldo Gonçalves dos Santos, Edgar Elias da Silva, Georgeton dos Passos Rodrigues, José Filho Queiroz e Tarcisio Caixeta Rodrigues. Na tragichanchada das execuções, os policiais são dublês bem ensaiados para figurar nos atos dos cenários com lugar marcado pelos artistas e só morrem nas queimas de arquivo das películas os de má audiência, como os que interpretaram mal as novelas de Boadyr Veloso, Polyanna Arruda Borges Leopoldino, Ilmar Gomes Marçal, Túlio José Jayme, Fabrício Alves Costa e Sane Pereira de Carvalho. O espetáculo da sétima arte nas execuções tem especiais que não foram ao ar no casting de Camila Lagares Lima, Murilo Soares Rodrigues, Bruno Elvys Lopes, Adriano Souza Matos e Marcelo Mendonça. Qualquer semelhança nos confrontos com as execuções é mera coincidência. Mas toda semelhança das execuções aparenta realidade. E nenhuma semelhança dos confrontos é realista na aparência com as execuções. Nos atores das execuções podem figurar inocentes úteis como astros figurantes nos papéis dos autores da culpa. A filmadora do tempo tem as câ-

maras ligadas. E nas autorias dos confrontos, as encenações dos fatos como sendo execuções estão retocadas na filmoteca nos atos do grupo de extermínio. O projetor do episódio tem câmaras ocultas e registra tudo. Quando forem exibidos e comparados nas telas os dois filmes, todos constatarão que as atuações heroicas dos confrontos, por ideal, não podem ser confundidas com as ações bandidas das execuções, por encomenda, do grupo de extermínio da Polícia que tem ligações com os quartéis e com as delegacias. O tenente Ricardo Rocha não peca no covil da bandidagem suas medalhas. Batiza no altar do idealismo suas condecorações. A verdade tem muitas faces. Uma delas está em diversas estátuas nos monumentos erigidos aos libertadores por seus contemporâneos compatriotas. E a posteridade mostra que a História é neles a verdade dos vencedores, tão certamente como as tempestades das mudanças vão jogando ao chão as estátuas nos monumentos de todos os ditadores. Outra face da verdade é atual em Goiás. E já está riscando os traços da sua silhueta nos rascunhos do grupo de extermínio da PM. Caso o tenentecoronel seja cerceado no direito de contar a verdade em juízo, então a mancha das execuções que esconde bandidos nas fardas passará a ser o confronto, à vista de todos, do grupo de extermínio da honra e da bravura do tenente-coronel Ricar-

do Rocha na estampa dos antigos Doutores da Lei na civilização moderna. Não clamo por absolvição tendenciosa para Ricardo Rocha. Rogo aos magistrados libertarem da cela da Academia Militar o tenente-coronel e possam enxergar os vultos, inteiros e corporificados em seu depoimento, que se movem às sombras nos casarões do grupo de extermínio da Polícia Militar. E, assim, o magistrado teria praticado um extermínio. Na honra do Ricardo Rocha. O erro cria erros. Crime não se lava com crime. Lava-se com a razão. Morte não se lava com morte. Lava-se com a vida. Sangue não se lava com sangue. Lava-se com remorso na consciência. Choro não se lava com lágrimas nos olhos. Lava-se com arrependimento no coração. Não se lava mentalidade criminosa com pancadas no adulto. Não se lava a delinquência com pancadas nas punições. Lava-se com a educação nas escolas. Não se lava a violência com balas. Lava-se com as ideias da pacificação. Não vim para essa suplicação pública vendo a face da verdade no meu rosto, mas o respeito à Justiça na cabeça. Estou finalizando um artigo (VIAGEM ÀS CONSCIÊNCIAS MORTAS), com previsão de espaço para 30 páginas no Diário da Manhã, ilustrado com depoimentos fornecidos por oficiais e informações reveladoras de PMs sobre o que aconteceu nos quartéis dos bastidores dos confrontos com bandidos e nas execuções. Não é uma rasgadura ou tapação das tantas feridas,

mas a remoção de algumas cicatrizes na pele para onde estão os cortes no corpo dos acontecimentos. Há cartas endereçadas a mim, quando estavam no presídio de segurança máxima de Campo Grande, do coronel Carlos César Macário, do tenente-coronel Ricardo Rocha, do major Alexandri da Rocha Almeida, e informações sigilosas das causas da desmotivação em toda a corporação, como também relatos de soldados, cabos e sargentos descrevendo momentos em que só faltam apanhar ao abordarem um membro do crime organizado. Ao invés de algemas nos punhos dos bandidos, a segurança pública está atada pela incompetência às mãos das chefias das polícias Civil e Militar. É tema para livro. Consagraria o autor nas edições no mercado nacional. O leitor se horrorizaria com a realidade superando as ficções nas páginas. Dá filme épico. O espectador assistiria nos cinemas um faroeste na corrupção. O leitor e o telespectador conscientizar-se-iam que o tragicômico dos personagens aquartelados na clandestinidade é a ramificação da corrupção nos quintais do poder e lastrada nos terreiros da sociedade brasileira. Ou se rouba no poder ou se rouba no povo. Ou se é roubado dos dois lados. O Rocha é rocha no caráter de simplicidade singular e de pudor plural.

BATISTA CUSTÓDIO


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