Especial Advogado

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Advocacia, a voz da cidadania Arquivo Pessoal

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ivemos um período de grandes debates e de polarização na política. Esse extremismo de posturas e posicionamentos avança para outras áreas. Num olhar genérico, é possível afirmar que ninguém está isento de algum posicionamento mais radical ou exacerbado. Nesse ambiente conflituoso, existem interesses ocultos, trabalhando no sentido de enfraquecer instituições e de se criar um clima de animosidade cada vez maior. É uma tendência que preocupa e que não pode prosperar. Como entidade apartidária, representando mais de 100 mil advogados e advogadas gaúchos, a OAB/RS vem sendo cada vez mais acionada pela sociedade. Respaldada por pesquisas, como sendo uma das entidades de maior credibilidade pelos gaúchos, a Ordem gaúcha se mantém atuante na defesa da segurança jurídica, da justiça social e da luta pela cidadania através do atuar das prerrogativas profissionais. Em respeito aos direitos dos cidadãos e da democracia, este ponto merece um destaque especial. A luta pelo reconhecimento das prerrogativas advocatícias é legítima e necessária. A advocacia trabalha pelos direitos de milhões de brasileiros e brasileiras que não são alcançados ou respeitados. As ameaças são permanentes. Ameaças às prerrogativas são diárias. Em todo o Brasil temos, infelizmente, ofensas morais e físicas, cerceamento do trabalho, restrições da atividade profissional. Uma das nossas comissões mais atuantes é a Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas Profissionais (CDAP),

Ricardo Breier, Advogado e presidente da OAB/RS

que está 24 horas à disposição dos advogados e das advogadas para atender demandas que sejam necessárias. Neste 11 de agosto, se comemora mais um Dia da Advocacia. É um período para reflexões, avaliações e para reforçar o comprometimento institucional. As 106 subseções do Rio Grande do Sul estão de portas abertas para acolher os colegas que tiverem seu trabalho cerceado por arbitrariedades de agentes públicos. Entre elas, a atuante subseção de Carazinho. Temos muitas conquistas a comemorar, mas também temos que olhar para frente. A qualificação é um desafio permanente. Os desafios do futuro estão colocados. A advocacia, conforme consta na Constituição Federal, é indispensável à administração da justiça. Seguimos com nossa luta em nome da cidadania do povo brasileiro.

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m Carazinho a Subseção OAB tem 575 advogados inscritos e 03 estagiários. Na cidade a Ordem oferece aos seus integrantes uma ampla sede, com sala de reunião, sala de atendimento para os advogados e clientes, computadores, serviços de scanners, xerox e digitalização. Serve como um verdadeiro escritório de advocacia para os profissionais de Carazinho e de outras cidades e Estados em deslocamento. A estrutura conta com auditório de 50 lugares e salão de festividades a disposição dos advogados e estagiários. Presta ainda, serviços de cópias de processos, protocolos, cargas e demais rotinas que possam auxiliar os advogados. Cursos e seminários em diversas áreas do Direito também são ofertados. Em Carazinho a subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é presidida por Sandra Mara Zimmer, que é a primeira mulher a presidir. Em entrevista ao Diário a presidente fala sobre temas que tem movimentado a sociedade e da atuação da Ordem diante das atuais posturas.

DIÁRIO: NO ATUAL CONTEXTO, CONSIDERANDO EM ESPECIAL O CENÁRIO ECONÔMICO E POLÍTICO DO PAÍS – COMO A SENHORA OBSERVA O PAPEL QUE TEM A OAB? Sandra Mara Zimmer: A OAB tem em sua história a luta pela democracia, pelo bem comum, pela liberdade e pela igualdade. Enquanto representante da sociedade civil, sempre participou de forma ativa nas decisões do pais. Um marco importante foram as “Diretas Já”, momento difícil, onde saiamos de uma intervenção militar e supressão de direitos, e materialização de um projeto, a promulgação da Constituição Federal em 05 de outubro de 1988. E desta luta que devemos dar prosseguimento, convergindo esforços, pelo crescimento e desenvolvimento do país, mantendo o equilíbrio, a independência da instituição e a desvinculada de qualquer interesse próprio ou político partidário, mas num constante trabalho pela democracia, pela justiça, pelo respeito, pela igualdade, assegurando direitos ele-


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575 advogados compõem OAB Carazinho

DIÁRIO: A SOCIEDADE VIVE MOMENTOS QUE PARECE QUE PRECISA DE PACIFICAÇÃO, NESTE ASPECTO CORREMOS O RISCO ENFRAQUECIMENTOS DAS INSTITUIÇÕES? Sandra Mara Zimmer: Nos últimos anos o país passa por uma crise moral e ética sem precedente, e com consequência o enfraquecimento institucional. Para retomarmos o desenvolvimento econômico não basta somente combater a corrupção, mas é necessário resgatar a credibilidade e a confiança nas instituições, condição essencial para desenvolver e prosperar, para isso é necessário aperfeiçoar as regras existentes e crias novas que não permitam mais condutas corruptivas e oportunistas. O desenvolvimento social e econômico do país está diretamente ligado ao combate da corrupção e do oportunismo presentes na dinâmica dos Poderes, combater estas condutas representa o fortalecimento da democracia e o resgate da credibilidade das instituições. Não podemos falar em progresso, desenvolvimento, crescimento sem pensar em

uma sociedade livre, justa, ética e solidária, com governantes que busquem promovam o bem comum e eliminar toda e qualquer forma de preconceito, e o resgate das instituições, com cumpram legalmente seu papel, com princípios e valores democráticos. DIÁRIO: UMA PARCELA DA SOCIEDADE PARECE QUE ESTÁ, OU SE DEMONSTRA DISPOSTA A REVER SEUS CONCEITOS SOBRE VÁRIOS ASPECTOS DE TEMAS QUE SÃO DE INTERESSE COLETIVO, ALGUMAS PERCEPÇÕES COM TENDÊNCIAS A INTOLERÂNCIA, NESTE CONTEXTO QUAL O PAPEL DO DIREITO E DO PROFISSIONAL QUE NELE ATUA? Sandra Mara Zimmer: O país vive uma grande intolerância política, que resulta por muitas vezes em violência física e moral, confrontando a própria democracia. A população com o acesso facilitada à internet, começou a participar dos debates públicos, o que deveria ser uma inovação positiva, um processo educacional, transformou-se em disseminação do ódio, de intolerância e divulgação de notícias falsas. Perdeu-se a arte de conviver entre as pessoas, que não suportam, não aceitam e não compreendem diferenças, a intolerância ganha cada vez mais força e espaço no contexto social. Reações cada vez mais agressivas à adversidade, conflitos ideológicos e políticos criam cenários hostis. O diferente torna-se defeito, que aos olhos do divergente deve ser combatido. A falta de respeito e diálogo dividem a sociedade, estimulando as mais antigas formas de intolerância, de raça, de gênero e de classe, quando deveríamos viver tempos de igualdade e dignidade. Assim, nos operadores do direito temos o papel de criar movimentos de conciliação, trabalho a longo prazo, mas que valerá o

esforço, a tolerância deve ser usada para pacificar, aquietar os litígios. Podemos contribuir, como um instrumento pacificador, mantendo a ordem e a segurança jurídica, na busca da solução dos conflitos de um modo menos traumático possível, valorizando a conciliação, e a resolução dos conflitos recompondo o equilíbrio social, um novo olhar, uma justiça mais humanizada. DIÁRIO: SOBRE O CONTEXTO DAS ÚLTIMAS SEMANAS – EM RELAÇÃO AS MUDANÇAS NA COMISSÃO QUE INVESTIGA AS MORTES E DESAPARECIMENTOS DURANTE O PERÍODO DE REGIME MILITAR, COMO A SENHORA AVALIA? Sandra Mara Zimmer: A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) foi criada em 1995, no governo de Fernando Henrique. A comissão tem a missão de buscar o reconhecimento de pessoas que tenham desaparecido por participação ou acusação de participar em atividades políticas no período do regime militar (1964/1985). A comissão é composta por sete membros, cujos nomes são escolhidos pelo Presidente da República, e recentemente houve a troca de 04 dos 07 membros da comissão por assessores do PSL e militares, gerando uma preocupação para as famílias que ainda não tiveram resposta sobre o desaparecimento de seus familiares. A preocupação destas famílias parte de uma premissa de que militares e assessores do Presidente estariam compondo a comissão, perpetuando a desinformação e omissão. Contudo, o governo tem o dever de dar sequência ao trabalho que vinha sendo realizado, para garantir o respeito à verdade, o direito destas famílias em conhecer o verdadeiro paradeiro dos mor-

Fotos: Arquivo | Diário

mentares e garantias fundamentais. A OAB tem em sua missão assegurar a ampla participação da população na definição dos rumos da nação, porque falamos em nome do cidadão, assim como, temos o dever de garantir a democracia e sobretudo o respeito à cidadania, mas nesta caminhada, a única bandeira que deve ser erguida pela instituição é a do Brasil, sem qualquer vinculação com ideologia política ou partidária. O país avança na direção da implementação de reformas, econômicas e políticas, mas para efetivamente obtermos mudanças significativas necessário que combatam privilégios, sem exceção e protejam trabalhadores.

Sandra Mara Zimmer, presidente da OAB Subseção Carazinho

tos e desaparecidos, uma responsabilidade do Estado. A resposta significa respeito com as famílias das vítimas da ditadura, e que sofrem até hoje com a desinformação, e a nossa entidade, independente de ideologia política, preocupa-se com o equilibro e respeito dos valores constitucionais, em especial da dignidade da pessoa humana, na qual inclui o respeito a memória das vítimas. É preciso deixar muito claro que a OAB não tem partido, não se movimenta por paixões ideológicas, ainda que, alguns não respeitem e não compreendam a essência da Instituição. O que nos move é a defesa da advocacia, da cidadania e da Constituição Federal.


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Planejamento previdenciário: Em tempos de mudanças nos sistemas previdenciários, é fundamental que o servidor conheça todas essas possibilidades para realizar a melhor escolha

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ma das grandes polêmicas envolvendo a reforma da previdência que tramita no Congresso Nacional é a inclusão dos servidores públicos dos estados e dos municípios nas novas regras sobre aposentadorias e pensões. No texto aprovado na Câmara dos Deputados esses servidores foram excluídos da reforma, ou seja, eles não seriam impactados com as mudanças, embora no Senado a tendência seja pela inclusão. Pela proposta que se tem por ora apenas os trabalhadores da iniciativa privada e os servidores públicos

federais que teriam mudanças com a Emenda Constitucional nº 06/2019. O advogado Adriano Mauss, diretor de Processo Administrativo Previdenciário do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, explica que diante do que se tem até aqui os municípios e estados que quiserem fazer mudanças na aposentadoria dos seus funcionários terão que aprovar, por conta própria, na Câmara de Vereadores ou na Assembleia Legislativa Estadual uma reforma própria. “ Essa reforma da previdência local teria que respeitar, obviamente, as regras aprovadas

Arquivo Pessoal

O que a reforma deve nos ensinar no Congresso Nacional, ou seja, não pode uma Câmara de Vereadores criar critérios para aposentadoria mais rígidos do que estabeleceu a Constituição Federal. Entretanto se for entendimento do Poder Legislativo local que é possível manter as regras atuais de aposentadoria de seus servidores não será necessário mexer nesse tema” coque o Brasil tem mais de 2 mil municípios com regimes de previdência sendo que cada um possui uma realidade diferente. “Vale esclarecer que cada um desses fundos são independentes entre si e perante o INSS. Uns ros para se manter, então para eles uma reforma é imprescindível, mas em dia, com valores de poupança bastante vultuosos, nesse caso não haveria necessidade de reformar esse fundo. Então, deixar para cada município e estado fazer a sua reforma da previdência é muito interessante, pois evita que, para os trabalhadores que vivam do fundo é boa, tenham prejuízo em suas aposentadorias sem necessidade” opina Mauss. O advogado explica que de acordo com a reforma que está tramitando, os únicos servidores que não serão afetados pelas novas regras são aqueles que alcançam, no dia anterior a sua promulgação pelo Presidente do

Congresso, todos os requisitos para conceder o benefício, ou seja, tenham direito adquirido. Todos os demais servidores vão ser afetados, uns mais outros menos, mesmo que falte um dia para completar o direito ao benefício. “ O servidor possui diversas possibilidades de aposentadoria, no INSS, pedindo para utilizar o tempo de serviço público no RGPS, averbando tempo de insalubridade, havendo dentre outras. O importante é que ele faça um planejamento previdenciário. Principalmente nessa época de grandes mudanças, é fundamental que o servidor conheça todas essas possibilidades para realizar a melhor escolha” recomenda Mauss.


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Gabriel Loss | Diário

os últimos dias tem havido bombardeios de ideias, conceitos, preconceitos, intuições, adivinhações, informações, ideologias e lidade fortalecer teorias ou de conspiração ou de privilégios ou até de espalhar pânico àqueles que pouco conhecem de

A essência da advocacia

de informações tendenciosas, mercadoO caso mais recente disso está relacionado ao FaceApp, colocando tal como vilão em coleta e venda de informações, achando maior ameaça por ser de origem Russa. Me parece um pouco absurda a proposta de uma suposta ameaça. Esses dados, que o app eventualmente coleta, estão disponíveis o tempo todo na internet, nas redes sociais, em vários aplicativos em smartphones, computadores, máquinas de fotografar. Interessante, e sempre bom lembrar, mas, Facebook, Instagran, Spotify, Youtube...só para citar alguns, já fazem isso, inúmeros aplicativos, por mais inocentes que pareçam solicitam acesso aos nossos dados, fotos, e outros para funcionarem. E não é solução excluir todos e estará salvo, uma vez na nuvem, os dados fornecidos já se perderam na “grande galáxia” do ambiente virtual. O que poderão fazer com seus dados é uma incógnita. Pois bem, alguns estudiosos do assuncomo “Big Data, o boom do mundo TI”, incluso nesse boom a “4ª revolução, a e estudar o comportamento das pessoas, até mesmo um gostei - o joinha - é valido para estudos de comportamentos, preferências, ideologias, etc. Sendo assim, não há motivo para pânico - a meu ver - pois, o mundo gira pelo bem mais valioso atualmente que é a informação, porém, seu valor não é

intrínseco, é necessário haver demanda para se ter oferta. Devemos nos preocupar talvez para quem serão vendidos esses dados que, a princípio somente quem detém poder de investigação (Judiciário, MP, Polícia Judiciária), deveriam ter acesso a dados personalíssimos protegidos constitucionalmente e seguindo as regras do devido processo legal. O que menos temos hoje é respeito as leis, normas e instituições, o preço será alto. Se você tiver interesse em saber melhor sobre seus direitos e deveres em relação a internet e sua utilização, lamenta. Aponto: Lei nº 12.965, de 23 abril de 2014.

Cesar Machado Advogado OAB/RS 103.614

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m épocas de pouca tolerância com as opiniões contrárias, e onde grande parte das pessoas prefere simplesmente “ter um lado” a ouvir, pensar e analisar fatos e argumentos, não é de estranhar que Instituidas e venham a sofrer ataques. Alguns são extremamente injustos. Preocupa-me muito isso passar despercebido da maior parte da sociedade, especialmente quanto à advocacia, que sempre foi o contrapeso de quaisquer iniciativas abusivas ou autoritárias. Parece-me às vezes que os cidadãos não se dão conta de que as lutas do advogado não são suas lutas particulares, e que a advocacia, quando defende o Estado Democrático de Direito, a observância e o cumprimento da Constituição e das Leis vigentes, independentemente de a quem isso possa favorecer ou prejudicar, está lutando, em última instância, pelos direitos de todos. A convivência social pressupõe que existam regras. E estas regras devem ser respeitadas. Por todos. Sempre que isso não ocorra, é dever da advocacia denunciar e exigir que cesse a ilegalidade. Não é possível aceitar que os faça uma aplicação seletiva de leis, apenas quando isso possa interessar a um ou outro grupo. Para que a sociedade sobreviva de forma organizada e livre sempre que houver ilegalidade, ela tem que ser denunciada e combatida. E é isso que faz o verdadeiro advogado. A advocacia não tem cor, não tem raça, não tem religião. Não

Arquivo | Diário

“Não se importar com seus dados é um direito seu”

é de esquerda ou de direita. Defende todos, e cumpre um papel de apontar e combater sempre a ilegalidade, doa a quem doer. Se as leis não são boas, mecanismos e procedimentos. Mas todos tem de respeitá-las enquanto elas vigorarem. Sem temer desagradar quem quer que seja por dizer a verdade e defender a legalidade é que atua o advogado. E mesmo aqueles que hoje o criticam por isso, especialmente quando é preciso defender causas impopulares, podem ter a certeza de que, no dia em que precisarem exercer a sua própria defesa e combater arbitrariedades que os atinjam, terão advogados a seu lado para defendê-los. Porque assim é a advocacia...

Julio Eduardo Piva OAB/RS 38866


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Mulheres encarceradas: Sociedade e seus filhos D

ados do Departamento de Segurança e Execução Penal indicam que a população prisional nos presídios do Rio Grande do Sul é de 42.159 indivíduos sendo 39.974 homens e 2.185 mulheres. A advogada Fernanda Maria Ferreira Mendes é graduada em Direito pela PUC-PR e Pós-graduada em Direito Penal e Direito Processual Penal pela IMED-PF. Fernanda que foi agente penitenciária no estado do Paraná conversou com o Diário e opinou sobre temas que versam sobre o encarceramento feminino.

DIÁRIO: O QUE DIZER DA ESTRUTURA DO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO PARA MULHERES CONSIDERANDO SUAS DEMANDAS INTIMAS, AFETIVAS E DE FAMÍLIA? Fernanda Mendes: Recentemente houve a necessidade de aprimorar as casas prisionais femininas. Isso porque no passado, não era comum a prática de crimes por mulheres, seja pela realidade machista que existia naquele tempo, seja porque atualGabriel Loss | Diário

DIÁRIO: EM RELAÇÃO AO ENCARCERAMENTO DE MULHERES MÃES TEMOS UM DILEMA SOCIAL ENTRE O ANSEIO DA SOCIEDADE DE PUNIR QUEM ERROU, MAS COM ISTO ESTIGMATIZAR CRIANÇAS FILHOS DESTAS MÃES? Fernanda Mendes: Fui agente penitenciária por quatro anos, tendo trabalhado a maior parte do tempo na Penitenciária Feminina do Paraná de regime fechado, localizado em Piraquara. No Estado do Paraná a legislação estadual permite que as apenadas fiquem com os filhos até estes completarem seis anos de idade. Nesta penitenciária há uma creche, na qual as crianças moram e tem contato durante o dia com as mães. No Rio Grande do Sul, a legislação estadual é diferente, permitindo que as apenadas fiquem com os filhos até os seis meses de vida, existindo berçários apropriados na Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba e no Presídio Estatual Feminino Madre Pelletier de Porto Alegre. Segundo a agente penitenciária Luciane Martins Romano, que atua no Presídio Estadual de Carazinho, por ausência de estrutura física, não é permitido que a mãe apenada fique com a criança neste estabelecimento, de modo que ao nascer, a guarda do bebê é repassada imediatamente para um responsável, tendo a mãe direito à visitas. Aduziu a agente penitenciária que

atualmente não existem apenadas gestantes no presídio de Carazinho, e que estão custodiadas no presídio dez presas, alocadas em duas celas separadas. Após contextualizar, entendo como profissional do direito e advogada, que a melhor maneira de não estigmatizar crianças, filhos de apenadas, e de resguardar seus direitos, é na forma da legislação do Estado do Rio Grande do Sul, na qual a criança é afastada do ambiente prisional após o período de amamentação. Minha experiência na Penitenciária Feminina do Paraná, na qual muitas crianças moravam no presídio com a mãe, demonstra que estas crianças assimilam o ambiente prisional, o que interrompe seu desenvolvimento natural. Recordo-me que muitas crianças tinham dificuldades cognitivas, de relacionamento e de desenvolvimento intelectual. Essa realidade é tão evidente que algumas mães apenadas que conheci, enquanto agente penitenciária, já haviam vivido ali com suas mães, também apenadas, ou seja, repetiam o ciclo do aprisionamento que viveram com suas mães. Esclareço que acho importante que a mãe apenada tenha contato com o filho, todavia entendo que o ambiente prisional nunca será adequado para o desenvolvimento natural de uma criança. Tive certeza absoluta desse posicionamento depois de ser questionada por uma criança que vivia no presídio: “Dona Guarda, quando vai chegar meu alvará de soltura?”.

Advogada Fernanda M. Ferreira Mendes

mente, com a conquista dos direitos das mulheres, há uma liberdade maior até para que esta pratique crimes. As mulheres têm menos necessidades que os homens, sendo mais criativas e manobrando mais facilmente às limitações de recursos quando estão aprisionadas. O sistema prisional normalmente fornece materiais básicos de higiene, todavia nem sempre os referidos materiais são suficientes para atender a demanda, ficando as apenadas dependentes de doações. Quanto às necessidades afetivas, as mulheres sofrem mais quando aprisionadas, seja porque, em regra, seus parceiros também estão presos ou não enfrentam a realidade do aprisionamento, abandonando a companheira, seja porque, em sua maioria, são mães, e tem preocupação com os filhos. Na realidade, as mulheres tem mais apoio das mães, irmãs e filhos, do que dos companheiros. Enquanto existem 100 homens recebendo visitas no presídio masculino, existem 10 mulheres recebendo visitas no presídio feminino. Quando falamos em visita íntima, a diferença é ainda maior. Por exemplo, no Presídio Feminino do Paraná, de 600 apenadas, 3 recebiam visita íntima.

tando que as mulheres não têm capacidade de cometer crimes de forma autônoma, sem ajuda masculina. Na realidade, a maioria das mulheres praticam crimes conscientes da ilegalidade, existindo algumas que, inclusive, são líderes de facções e comandantes de crime organizado. Digo que, no Brasil, parcela significativa do encarceramento tanto de mulheres como de homens está ligado ao tráfico, assim, salvo melhor entendimento, a melhor maneira de combater o referido crime é a descriminalização do tráfico de forma gradual e programada, principalmente das drogas menos nocivas, como a maconha. A tentativa de repressão ao tráfico no Brasil e no mundo demonstra-se infrutífera, eis que reprimir o tráfico não impede o surgimento de novos usuários. Estudos demonstram que o uso de drogas é fato inerente à condição humana, e o ato de entorpecer-se é praticado desde os primórdios da humanidade. Portanto, a repressão ao uso de drogas deve ser focada no usuário, por meio de educação e conscientização dos malefícios e consequências do uso. Tal política já se mostrou eficiente com o tabagismo no Brasil que atualmente está menos presente nas novas gerações.

DIÁRIO: UMA PARCELA DO ENCARCERAMENTO FEMININO ESTÁ LIGADO AO TRÁFICO, COMO O PAÍS PODE ENFRENTAR ISTO JÁ QUE PARTE DAS SITUAÇÕES SE DÁ EM CONSEQUÊNCIA DOS VÍNCULOS FAMILIARES DESTAS MULHERES? Fernanda Mendes: Em que pese haver essa “crença popular” de que as mulheres só vão para o crime por conta dos maridos ou companheiros, a realidade é bem diferente. Como agente penitenciária no passado e, atualmente, como advogada, nunca conheci uma mulher que tivesse praticado crime, por exemplo tráfico, influenciada ou obrigada pelo marido. De certa maneira, a referida “crença popular” existe porque a população, digo homens e mulheres, ainda tende a ter pensamento machista, acredi-

DIÁRIO: DADO AO GRAU DE AFETIVIDADE QUE A SOCIEDADE AINDA “COBRA” DAS MULHERES, NO CASO DAQUELAS ENCARCERADAS APÓS TEREM ASSUMIDO FUNÇÃO NO TRÁFICO DADA A INFLUÊNCIA DE FAMILIAR, NA SUA OPINIÃO: DEVERIAM ESTAS TER PUNIÇÃO MAIS BRANDA? Fernanda Mendes: Na minha opinião, como já referido anteriormente, não há motivos para que a legislação penal diferencie homens de mulheres no que diz respeito à pena. Seria um retrocesso à conquista dos direitos das mulheres estas serem compreendidas como “vítimas” dos nossos companheiros. O empoderamento feminino pressupões a igualdade em todos os aspectos: salarial, nas funções domésticas, na forma de puni-


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Divulgação | Agência Brasil

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ção, etc. Como mulher e feminista, acredito que a igualdade deve ser plena, todavia, compreendo que há um grande caminho a ser percorrido até que essa igualdade exista de fato, cabendo a nós educarmos nossos filhos sem preconceitos.

A mudança legislativa é positiva e reconhece o papel essencial da maternidade, eis que fixa como primordial a presença da mãe no lar, para o natural desenvolvimento da criança e estreitamento da relação entre mãe e filho.

DIÁRIO: DAS MULHERES MÃES PRESAS AINDA SEM CONDENAÇÃO, OBSERVANDO O ASPECTO FAMÍLIA, NA SUA PERCEPÇÃO, MAIS DO QUE NO CASO DOS HOMENS, OS FILHOS TAMBÉM ESTÃO SENDO PUNIDOS INDIRETAMENTE? Fernanda Mendes: Evidente que os filhos de presas sem condenação são punidos indiretamente, eis que o afastamento da convivência materna não é benéfico para nenhuma criança. Por isso, recentemente, a Lei nº 13.769, de 19 de dezembro de 2018, estabeleceu em seu art. 1º o direito de prisão domiciliar para mulheres que, quando presas preventivamente, forem mães de crianças até 12 anos e gestantes.

DIÁRIO: QUAL A CONDUTA DO ESTADO HOJE PARA COM MULHERES QUE SÃO DETIDAS AO TENTAR INGRESSAR COM DROGAS NO SISTEMA PENITENCIÁRIO? Fernanda Mendes: Tentar ingressar com drogas no sistema penitenciário é crime de tráfico, tipificado no art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, com pena aumentada de um sexto a dois terços devido ao fato criminoso ser praticado em estabelecimento prisional (art. 40, inciso III da Lei nº 11.343/2006). Assim, o Estado trata as mulheres que tentam ingressar com drogas nos presídios como qualquer um que pratique o referido crime, sem distinção de gênero, e assim deve ser.


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Direito de família: As dúvidas mais frequentes

Especialistas nesta área, Maik Muller César (OAB/RS 43123) e Daniela Covolan (OAB/RS 46731), sócios da César & Covolan Advocacia (OAB/RS 5143) são membros associados do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família. DIÁRIO: O QUE CARACTERIZA UMA UNIÃO ESTÁVEL? César & Covolan Advocacia: Entende-se por união estável a convivência pública, contínua e duradoura, entre pessoas desimpedidas de se casar, com animus (intenção) de constituir família. Vale aqui dizer que a Corte Maior reconheceu de todo constitucional a união estável entre pessoas do mesmo sexo. O que caracteriza efetivamente a união estável é o animo de constituir família. DIÁRIO: COMO COMPROVAR A UNIÃO ESTÁVEL? César & Covolan Advocacia: Essa é uma dúvida bem recorrente e pertinente já que a união estável nem sempre é registrada e não é necessário provar o tempo de duração, nem a existência de filhos, nem mesmo morar junto. Na prática, a comprovação pode ser feita por intermédio de testemunhas, objetos pessoais que se encontram na residência um do outro, contas conjuntas, aquisição de bens em nome de ambos, fotos e inclusive postagens em redes sociais, desde que tenham o objetivo exclusivo de demonstrar a existência de uma relação de convivência com objetivo de constituição familiar. DIÁRIO: NAMORO PODE CONFIGURAR UNIÃO ESTÁVEL? César & Covolan Advocacia: Não, pois o namoro é uma relação afetiva pelo desejo de duas pessoas estarem juntas, mas sem estabelecer um vínculo matrimonial perante a lei civil ou religiosa e sem o animo de constituir família. A dúvida surge quando o namoro pode ser considerado uma união estável e aí há que se analisar caso a caso. Assim, quando os supostos namorados já vivem uma relação pública, contínua duradoura e passaram a conviver sob o mesmo teto, com o compartilhamento da moradia, por exemplo, já migraram da relação de namoro para a união estável, porque a estabilidade e o animo de constituir família aí são presumidos. DIÁRIO: EM CASO DE SEPARAÇÃO, TODA MULHER TEM DIREITO À PENSÃO OU HÁ SITUAÇÕES ESPECÍFICAS? César & Covolan Advocacia: Na grande maioria dos casos as mulheres tinham direito à pensão alimentícia, contudo, com a entrada da mulher no mercado de trabalho, também passando a ser fonte de sustento da família, a questão da pensão alimentícia para a mulher também sofreu modificação. Nem toda mulher após a separação (divórcio ou descons-

tituição da união estável) tem direito à pensão alimentícia e aí novamente há que se analisar caso a caso. Por exemplo, se o casal divorciado tem características do modelo antigo, onde a esposa era dependente do esposo, o pensionamento pode ser vitalício, desde que a esposa não possua mais idade ou saúde para regressar ao mercado de trabalho. Já se o casal conota o novo modelo, há diversas situações distintas. Se ambos os cônjuges trabalham e gozam de boa saúde, em regra não há porque um ter que pagar ao outro pensão alimentícia. Os direitos da ex-companheira de união estável são os mesmos da ex-cônjuge do casamento em relação ao pagamento de pensão alimentícia. DIÁRIO: HOMEM PODE PEDIR PENSÃO A EX? E EM QUE CONDIÇÕES É MAIS COMUM QUE SEJA CONCEDIDA? César & Covolan Advocacia: Com certeza. Nossa legislação não permite discriminação devido ao sexo e atribui ao homem e à mulher os mesmos direitos e deveres no casamento e na união estável. Portanto, recaem sobre cada um as mesmas obrigações quanto ao pagamento de pensão alimentícia. Se ele provar que precisa e que a ex-mulher pode pagar, o homem poderá receber pensão alimentícia dela. Em regra geral, podem cobrar pensão alimentícia: os filhos podem cobrar dos pais e os pais podem cobrar dos filhos; os netos podem cobrar dos avós e os avós não podem cobrar dos netos, mas neste caso podem haver exceções; irmãos e irmãs podem cobrar um do outro; cônjuges e ex-cônjuges, companheiros e ex-companheiros podem cobrar pensão alimentícia um do outro. Diário: A guarda da criança é de total direito da mãe? César & Covolan Advocacia: Não. A guarda pode ser unilateral (ou exclusiva - nos dias atuais, apesar de não ser a regra, ainda é bastante utilizada), compartilhada ou ainda alternada. Há que se entender que a guarda é o exercício do poder de família e, portanto, não é direito exclusivo da mãe. DIÁRIO: EM CASO DE MORTE, PARA ONDE VÃO AS DÍVIDAS E COMO FICA A HERANÇA? César & Covolan Advocacia: Patrimônio é o conjunto de bens, direitos e obrigações de uma pessoa. Quando alguém falece o patrimônio passa a ser chamado de espolio. Sendo assim, em caso de pessoas vivas é o patrimônio que responde pelas dívidas. Já em caso

Advogados Maik Muller César e Daniela Covolan

de pessoas falecidas será o espolio o responsável pelas dívidas. Se a pessoa falecida não tem herdeiros nem deixou testamento, a herança ficará em poder do Estado. O regime de comunhão de parcial de bens (união estável) dá direito às partes ao que foi adquirido em conjun-

to durante o relacionamento. Os filhos concebidos dentro ou fora do casamento, assim como os adotados, têm os mesmos direitos sobre a herança. Sogros, genros, noras e enteados não estão incluídos na sucessão legítima, mas podem ser incluídos na herança por testamento.


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6 dúvidas sobre a Reforma da Previdência DIÁRIO: OBSERVANDO O QUE SE TEM POR ORA DA REFORMA DA PREVIDÊNCIA, HÁ JOVENS QUE ESTÃO DESESPERANÇOSOS COM A POSSIBILIDADE DE SE APOSENTAR. O TRABALHADOR TEM A POSSIBLIDADE DE SOLICITAR VIA JUDICIAL O DIREITO DE NÃO CONTRIBUIR COM O INSS? Marlene de Moraes: O Regime Geral de Previdência Social (RGPS) é administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com sede em Brasília, que é uma autarquia federal, organizada de modo estatal, tendo como características a compulsoriedade e o caráter contributivo. A seguridade social é um direito social, mas para fazer jus, deve haver contribuição para a Previdência Social. Os segurados do Regime Geral da Previdência Social são divididos em obrigatórios e facultativos. Os segurados obrigatórios são aqueles vinculados obrigatoriamente ao sistema previdenciário, não havendo a possibilidade de exclusão por vontade própria. Nos termos do que dispõe o artigo 12, da Lei n. 8.212/91 e o artigo 11, da Lei n. 8.213/91, os segurados obrigatórios são divididos em cinco espécies: segurado especial, contribuinte individual, trabalhador avulso, empregado doméstico e empregado. Assim, para tais segurados a filiação é imediata, bastando o início do efetivo exercício da atividade remunerada, sendo a inscrição realizada posteriormente. Já para a filiação como segurado facultativo, nos termos do artigo 11, do Decreto n. 3.048/99, bastam ser atendidos dois requisitos simples: não ser segurado obrigatório e ser maior de 16 anos. Assim, o primeiro requisito excetua os trabalhadores de forma geral (segurados obrigatórios) e o segundo requisito exclui qualquer pessoa menor de 16 anos e, como exemplo de segurados facultativos temos a dona de casa e o estudante. Com base no que foi exposto acima, em se tratando de segurado obrigatório inexiste a possibilidade de requerer em juízo a desobrigação do recolhimento previdenciário. DIÁRIO: NA SUA PERCEPÇÃO A DISCUSSÃO SOBRE O TEMA PREVIDÊNCIA TRAZ A NECESSIDADE DAS PESSOAS “SOCIEDADE” DISCUTIR SEU PLANEJAMENTO PREVIDENCIÁRIO? Marlene de Moraes: Sem dúvida, as pessoas precisam pensar no futuro e fazer um planejamento previdenciário, procurando um profissional de sua confiança, a fim de encontrar a melhor alternativa para cada situação específica. O que eu percebo no dia a dia do escritório são pessoas que estão preocupadas com o seu futuro previdenciário, mas que nem sempre estão cientes de sua responsabilidade tributária. Não ignoro o atual cenário do Brasil,

Gabriel Loss | Diário

Com a Reforma da Previdência em tramitação agora para análise do Senado, não são poucas as dúvidas dos trabalhadores sobre o futuro de sua aposentadoria. Para esclarecer partes destas dúvidas o Diário ouviu a advogada Marlene de Moraes que atua na área do Direito Previdenciário. com muitas pessoas desempregadas e outras tantas na informalidade, situação que não propicia o recolhimento previdenciário, pois as pessoas precisam eleger prioridades. Contudo, é preciso ter em mente que para fazer jus aos benefícios da Previdência Social, excetuados os benefícios assistenciais, os quais, independem de recolhimento previdenciário, deve haver a filiação e o regular pagamento das contribuições previdenciárias. DIÁRIO: DIANTE DO TEMPO MAIOR DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E A TENDÊNCIA POR “MERCADO CADA VEZ MAIS LIVRE”, SE PERCEBE A TENDÊNCIA DE MIGRAÇÃO DE TRABALHADORES ASSALARIADOS PARA PESSOAS JURÍDICAS EM ALGUMAS FUNÇÕES? Marlene de Moraes: Na minha visão, essa migração se deve a crise financeira pela qual passa o país e não necessariamente aos impactos da reforma da previdência em razão do aumento do tempo de contribuição para fins de aposentadoria, até porque a reforma da Previdência irá impactar em maior grau àqueles que irão se filiar a Previdência Social após a promulgação e a vigência da reforma como segurados obrigatórios e/ou facultativos. DIÁRIO: COM AS MUDANÇAS QUE ESTÃO SENDO PRETENDIDAS, PARA PESSOAS DE MEIA IDADE QUE CONTRIBUEM POR CONTA PRÓPRIA PARA A PREVIDÊNCIA, VALE A PENA CONTRIBUIR COM TETO OU FAZER OUTROS INVESTIMENTOS PARA RENDIMENTOS? Marlene de Moraes: Essa é uma pergunta de difícil resposta, uma vez que cada situação deve ser analisada com a cautela e a peculiaridade que o caso exige. O que não podemos esquecer é que o empreendedor individual, enquanto segurado obrigatório da Previdência, deve recolher a contribuição previdenciária com base nos seus rendimentos sob pena de incidir no delito de sonegação previdenciária. Assim, não seria tão simples optar por recolher ou não sobre o teto da Previdência. Ainda, é importante considerar que a idade não é o único requisito a ser considerado, pois devemos considerar também quando o contribuinte se filiou ao Instituto Nacional de Seguro Social, se houve recolhimentos e sobre quais valores os recolhimentos estão sendo feitos. Em razão disso, a melhor alternativa é buscar a ajuda de um especialista e assim, fazer o planejamento previdenciário, a fim de encontrar a melhor alternativa. DIÁRIO: DIANTE DO TEMA REFORMA DA PREVIDÊNCIA, HOUVE CRESCIMENTO DA PROCURA POR

REVISÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR QUEM JÁ ESTÁ APOSENTADO? Marlene de Moraes: O tema reforma da Previdência trouxe bastante insegurança jurídica, uma vez que as pessoas não sabem se serão afetadas e em sendo, em que grau. Na minha realidade em meu escritório de advocacia, houve um crescimento dos atendimentos visando o requerimento da aposentadoria propriamente dita, mas que em sua grande maioria não preenchem os requisitos. É importante ter em mente que àqueles que preencherem os requisitos na data da promulgação da reforma da Previdência não serão afetados em nenhum grau, pois possuem o seu direito adquirido. DIÁRIO: CONSIDERANDO O QUE SE TEM POR ORA DA REFORMA, QUEM DEVE SER AFETADO PELAS REGRAS DE TRANSIÇÃO E AO QUE DEVE SE ESTAR ATENTO? Marlene de Moraes: Nem todos os trabalhadores serão atingidos pela reforma da Previdência proposta pelo atual governo.

Assim, serão afetados todos os trabalhadores que, até a data de promulgação da reforma previdenciária, não tenham preenchido todos os requisitos para se aposentar pelas regras atuais. Quem já preenche os requisitos de aposentadoria pelas regras atuais tem direito adquirido, mesmo que não tenha requerido o benefício. Ou seja, poderá se aposentar conforme a legislação atual, meses ou anos depois que a reforma entrar em vigor. Os atuais aposentados e pensionistas também têm direito adquirido. A mudança na legislação só afeta quem se aposentar depois que a reforma entrar em vigor e quem, até a data de promulgação da reforma não tiver preenchido os requisitos de aposentadoria pelas regras atuais. Por fim, ante o caráter essencialmente contributivo da Previdência Social as pessoas devem atentar para o fato de que devem estar filiadas e efetuar as suas contribuições previdenciárias em dia, a fim de usufruir dos benefícios ofertados pelo Instituto Nacional do Seguro Social sem maiores prejuízos.


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Gabriel Loss | Diário

Nesse mês dos advogados, nada melhor que lembrar da importância que a nossa classe tem para com a sociedade como um todo. O trabalho da advocacia vai muito além de realizar audiências, elaborar peças jurídicas e passar horas elaborando teses de defesa. A advocacia traz em sua essência uma função social, por esta razão, cada causídico é indispensável à administração da justiça, intermediando as mais diversas relações, com juizes, com o Estado, com órgãos, entre as partes, etc. Defendendo os interesses e direitos de seus clientes com base nas leis vigentes no País. Cada vez mais, é latente este tema. Como exercer na plenitude as prerogativas profissionais. Como advogar em 2019, frente a um cenário muitas vezes confusos de direitos, onde a tecnologia nos auxília muito e nos prejudica ao mesmo tempo? E é através dessas prerrogativas que é possível exercer nossa profissão de forma ampla. As prerrogativas dos advogados(as), decorrem da profissão da classe, agindo muitas vezes como uma proteção, mas jamais se confundindo com privilígios. Estes direitos estão elencados na Lei 8.906/94, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil. Algumas destas: ter vista dos processos judiciais ou administrativos, se comunicar com seu cliente, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis, entre outras. Entretanto, não se trata tão somente dessas garantias especificadas, mas de todo tipo de violação ou mitigação de direitos que resulte em prejuízo aos cidadãos, seja dentro do próprio processo, ou fora dele, em quaisquer instuições e órgãos. As prerrogativas nada mais são, que um conjunto de garantias fundamentais, criadas para que todos os advogados possam exercer a profissão de forma plena, com maior autonomia e independência, garantindo aos cidadãos a eficácia de princípios primordiais, como: o acesso a justiça, contraditório, ampla defesa e devido processo legal, todos consagrados na nossa Constituição Federal. Quando falamos em violação a prerrogativas, é importante frisar

Advogado e sua importância Arquivo | Diário

A importância das prerrogativas dos advogados

que estamos falando diretamente de violações aos direitos dos cidadãos, direitos usados em defesa da própria sociedade. Por isso, é necessário cada vez mais, falarmos sobre o assunto, como referiu o Presidente da OAB/RS, Ricardo Breier: “Prerrogativas são sinônimos de trabalho e o nosso trabalho precisa ser respeitado”, e, para que isso ocorra, a OAB RS dispoe da CDAP – Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas dos Advogados, que atuam em todo Estado, bem como, em cada Subsessão. Ou seja, em cada comarca em que haja sede da OAB existe uma comissão que trata especificamente desse assunto, garantindo a liberdade e o respeito pelo exercício da advocacia, com canais diretos para denúncia, via telefone, e-mail, para que sejam devimente apurados os desacatos a estes direitos. Podemos citar como exemplo, se um colega advogado estiver em atendimento na delegacia, no INSS ou em audiência na Vara do Trabalho, e seja tenha qualquer direito afrontado, é possível acionar a Comissão imediatamente via telefone, pois, quando lhe é negado um direito o problema deve ser sanado ou esclarecido no momento em que está ocorrendo. Podemos falar que se trata de uma luta diária para garantir a cidadania. Pois quando um advogado não consegue trabalhar, quem perde é você cidadão, que tem na pessoa do profissional da advocacia o interlocutor e defensor de seus direitos. Nós advogados, quando recebemos nossa Carteira Profissional, prometemos exercer a advocacia com dignidade e independência, observar a ética, os deveres e prerrogativas profissionais e defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social, a boa aplicação das leis, a rápida administração da Justiça e o aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas. Para isso, precisamos ter uma base de apoio para que possamos honrar nosso juramento, trabalhando com amor e dedicação na profissão que escolhemos.

Patrícia Wagner OAB/RS 112.303

No dia 11 de agosto, comemoramos o dia do advogado, sendo a profissão essencial para a manutenção da justiça na sociedade. A profissão do advogado foi constitucionalizada na Carta Magna de 1988, no artigo 133, reconhecendo o legislador a sua indispensabilidade à administração da Justiça e a inviolabilidade do advogado por atos e manifestações no exercício profissional. A advocacia trabalha em prol do cidadão e para garantir que os direitos dos brasileiros que não são alcançados sejam respeitados. O papel social do advogado é imprescindível nos regimes democráticos. Somente o advogado, pode assegurar, na esfera jurídica ou administrativa, que os direitos constitucionais e legais do indivíduo sejam observados. Ao ser consultado, o advogado além de dar clareza aos problemas de seu cliente, faz o papel de conselheiro e de defensor de seus direitos, além de ser uma espécie de negociador ou conciliador, capaz de solucionar um conflito. A sociedade vai se transformando, dia após dia são criados novos parâmetros de justiça, todo advogado deve manter-se em constante atualização interpretando as inovações legislativas para que se possa assegurar os direitos do cidadão de forma clara e bem analisada. É papel do advogado a garantia e o cumprimento do direito do seu cliente, em meio a uma sociedade que está cada dia mais complexa e burocrática. Assim, é preciso que exista um profissional responsável por interpretar o emaranhado de informações que acomete o cidadão diariamente. Muitas vezes a própria opinião pública vira-se contra o advogado, de maneira equivocada, pois jamais se pode generalizar a classe baseando-se em poucos exemplos de má conduta ante ao papel do advogado. Os cidadãos e leigos não devem confundir a figura do advogado com a do seu cliente, o profissional não deve ser hostilizado pela opinião pública ou estar sujeito a qualquer julgamento por defender este ou aquele indivíduo, pois atuação acontece no âmbito do devido processo legal na defesa do direito de seu cliente, este trabalha em prol da sociedade e não para si. Por fim, os cidadãos devem valorizar e respeitar o advogado reconhecendo sua importância na sociedade. Cabe somente a este profissional que foi habilitado e possui conhecimento para defender direitos quando estes forem negados ou violados. Em síntese, a nobreza da profissão do advogado “é falar por quem não tem voz”, advogado valorizado é o cidadão respeitado.

Sheila Alessandra Ribeiro de Mello OAB/RS 78832


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DIÁRIO DA MANHÃ - CARAZINHO SÁBADO e DOMINGO, 10 e 11 DE AGOSTO DE 2019

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m 01 de agosto de 2019 o Plenário do Supremo Tribunal Federal suspendeu o artigo 1º da Medida Provisória (MP) 886/2019 mantendo a competência para demarcação de terras indígenas com a Fundação Nacional do Índio (Funai) e não com Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Tudo indica que a justificativa para o deslocamento da competência para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) era uma estratégia para diminuir a concessão de demarcações de terras e impulsionar obras em áreas próximas aos grupos indígenas. A Constituição Federal de 1988 consagrou aos índios os direitos originários sobre as terras por eles ocupadas tradicionalmente, especificadamente em seu artigo 231: “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. A Funai é autarquia responsável pelos direitos dos povos indígena no Brasil e responsável pelo procedimento administrativo de demarcação de suas terras. Atualmente existem 462 terras indígenas regularizadas, que representa cerca de 12,2% do território nacional, segundo a Funai. A demarcação de maior importância e que serviu de marco histórico foi a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, localizada em Roraima, que iniciou sua demarcação na década de 90 e perdurou por anos os conflitos entre produtor e grupos indígenas. O Superior Tribunal Federal (STF) tem entendimento consolidado a respeito da demarcação das terras indígenas, considerando a data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988, como marco temporal de ocupação da terra pelos índios e a vedação à ampliação de terras indígenas já demarcadas (PET 3.388/RR). Esse entendimento vem sendo utilizado como base em outras decisões. Assim, nos processos de demarcação de terras indígenas deverão ser observadas além do entendimento consolidado do Superior Tribunal Federal, as seguintes salvaguardas institucionais: (I) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas pode ser relativizado sempre que houver como dispõe o artigo 231 (parágrafo 6º, da Constituição Federal) o relevante interesse público da União na forma de Lei Complementar; (II) O usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso Nacional; (III) O usufruto dos índios não abrange a pesquisa e a lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando aos índios participação nos resultados da lavra, na forma da lei. (IV) O usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem

a faiscação, devendo se for o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira; (V) O usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da Política de Defesa Nacional. A instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico a critério dos órgãos competentes (o Ministério da Defesa, o Conselho de Defesa Nacional) serão implementados independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai; (VI) A atuação das Forças Armadas da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica garantida e se dará independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai; (VII) O usufruto dos índios não impede a instalação pela União Federal de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além de construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e de educação; (VIII) O usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade imediata do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; (IX) O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área de unidade de conservação, também afetada pela terra indígena, com a participação das comunidades indígenas da área, que deverão ser ouvidas, levando em conta os usos, as tradições e costumes dos indígenas, podendo, para tanto, contar com a consultoria da Funai; (X) O trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes; (XI) Deve ser admitido o ingresso, o trânsito, a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela Funai; (XII) O ingresso, trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas; (XIII) A cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público tenham sido excluídos expressamente da homologação ou não; (XIV) As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico, que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena; (XV) É vedada, nas terras indígenas, qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária extrativa; (XVI)

As terras sob ocupação e posse dos grupos e comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto no artigo 49, XVI, e 231, parágrafo 3º, da Constituição da República, bem como a renda indígena, gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos taxas ou contribuições sobre uns e outros; (XVII) É vedada a ampliação da terra indígena já demarcada; (XVIII) Os direitos dos índios relacionados as suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis. (XIX) É assegurada a efetiva participação dos entes federativos em todas as etapas do processo de demarcação. Apesar das condições para demarcação das terras indígenas, a existência de conflitos de interesse entre índios e não índios tem aumentado no país, em razão de arrendamentos ilegais, cobrança de tarifas pelos índios nas rodovias, explorações ilegais de recursos minerais, principalmente na Amazônia, e morosidade na licença de obras para o desenvolvimento do escoamento de grãos. Portanto, a alteração da competência para demarcação das terras indígenas deverá voltar a discussão no plenário futuramente.

Acervo Pessoal

Demarcação das Terras Indígenas

Darusa Alves do Nascimento Advogada - OAB/RS 84.784

Especialista em Direito Agrário e Ambiental aplicado ao Agronegócio


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