Documento informativo do WRM
Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Uma nova ameaça para comunidades e florestas Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Gostaríamos de agradecer a “Salva a Selva” por sua importante contribuição para este documento, bem como a Almuth Ernsting e Jutta Kill por seus comentários e sugestões. Também agradecemos a nossos colegas de organizações aliadas que têm contribuído com seu conhecimento sobre os casos citados no capítulo 3. © Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais Secretariado Internacional Maldonado, 1858 – CP 11200. Montevidéu – Uruguai Telefones: + 598 2 4132989 / + 598 2 4100985 Email: wrm@wrm.org.uy Página na internet: www.wrm.org.uy O conteúdo desta publicação pode ser reproduzido total ou parcialmente, sem autorização prévia. Contudo, o crédito deve ser dado ao Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais, que deve ser notificado de sua reprodução. Publicado em março de 2013. Esta publicação está disponível em inglês, francês e espanhol. Foto de capa: Incinerador de biomassa, tirada por Josh Schlossberg (The Biomass Monitor/Energy Justice Network). Projeto Gráfico: Paulina Veloso A elaboração desta publicação foi possível graças ao apoio financeiro da Sociedade Sueca para a Conservação da Natureza (SSNC). As opiniões presentadas neste documento não refletem necessariamente a opinião oficial da SSNC.
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Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Ìndice
5 Introdução Capítulo 1 7 Biomasa, bioenergía y plantaciones de árboles 7 1.1 De que estamos falando? 7 Biomassa e bioenergia 7 Agrocombustíveis, e não biocombustíveis 8 1.2 O uso de plantações monocultoras de árvores para gerar bioenergia 8 Agrocombustíveis de primeira geração: dendê e pinhão-manso, e agrocombustíveis “avançados” 8 Agrocombustíveis de “segunda/terceira geração” 9 Bioenergia a partir de biomassa de madeira 9 1.3 Por que se está promovendo a bioenergia? 10 1.4 O que há por trás da “explosão” da bioenergia? Capítulo 2 12 Bioenergia a partir da madeira 12 2.1 Por que cresce tanto a bioenergia a partir da madeira? 14 2.2 A União Europeia (UE) 19 2.3 Projetos de biomassa em alguns países da Europa 19 Usinas de biomassa no Reino Unido 20 A biomassa energética na Alemanha 26 Polônia: a maior plantação de biomassa prevista da Europa 26 Finlândia: o país da indústria de madeira 27 2.4 Outros países relevantes 28 2.5 Impactos e resistência no Norte Capítulo 3 29 Plantações de árvores para bioenergia no sul 29 3.1 Por que precisam do Sul? 29 3.2 Planos e projetos no Sul 36 3.3 Os impactos das plantações energéticas para biomassa 38 3.4 A certificação de plantações de árvores para bioenergia Capítulo 4 40 Bioenergia: uma solução real para a crise energética e climática? 40 4.1 Os agrocombustíveis ajudam a resolver a crise energética? 41 4.2 Os agrocombustíveis e a biomassa de madeira ajudam a frear a mudança climática? 42 4.3 Considerações finais Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Introdução A Biomassa é a mais antiga fonte de energia utilizada pelo ser humano e continua sendo importante para um vasto número de pessoas, concentrada nos países do Sul global. Sobretudo nos últimos séculos, desde a Revolução Industrial, começaram a ser usadas outras fontes de energia, sobretudo energias fósseis. Esse consumo, no entanto, tem ocorrido historicamente no hemisfério Norte do Planeta. Mas, em função da crise climática e pelo fato de que os combustíveis fósseis se esgotarão em algum momento no futuro próximo, ocorreu, nos últimos 10 a 15 anos, especialmente no Norte global, uma “explosão” na produção e no consumo de agrocombustíveis de etanol, bem como de óleo produzido a partir de vegetais. Para obter esse tipo de combustível, expandiram-se, no Norte e no Sul globais, monocultivos agrícolas em grande escala, como milho, soja, cana-de-açúcar, mas também monocultivos, como dendê e pinhão-manso. Muitos relatórios de ONGs e pesquisadores já alertaram para as graves consequências dessa tendência, como uma nova onda de concentração de terras e os efeitos negativos sobre a soberania alimentar, além de outros impactos sociais e ambientais que são inerentes ao modelo de produção de monocultivos em grande escala, inclusive mais emissões de carbono e, portanto, mudanças climáticas. Nos últimos anos, presenciamos o início de uma outra “explosão”, principalmente na Europa, e também nos Estados Unidos e no Canadá: a geração de energia a partir de biomassa de madeira. Embora parecesse promover, em um primeiro momento, um tipo de reciclagem aproveitando resíduos de madeira, como a serragem, cada vez mais se usam árvores inteiras e se promove o plantio de árvores na forma de monoculturas especialmente com esse fim no Sul global. Ao mesmo tempo, métodos de corte mais agressivos e destrutivos são cada vez mais usados, incluindo a remoção do tronco, galhos grandes e pequenos, e folhas. Para esse novo mercado, a grande indústria busca promover novos tipos de commodities à base de madeira, como cavacos, ou chips, e também os chamados granulados, ou pellets, especificamente para fins energéticos. A expansão dos agrocombustíveis e, hoje em dia, as plantações de biomassa de madeira, expandem ainda mais as monoculturas industriais para exportação sobre terras que, se fossem utilizadas de outra forma, poderiam garantir a sobrevivência de comunidades locais. Este novo relatório do WRM tem como objetivo informar sobre essa nova tendência. O objetivo principal é alertar sobre os impactos de uma expansão desse tipo de plantação de árvores para atender à demanda nova e recente de biomassa de madeira, concentrada no Norte, sobre as comunidades rurais, que dependem do acesso a terra e a biomassa localmente disponíveis para atender sua demanda de energia, e sobre a conservação de florestas e outros ecossistemas em países do Sul. Também se buscam identificar projetos já em curso ou planejados. Esperamos gerar consciência em relação a este novo problema entre organizações do Sul, mas também do Norte. Além disso, é importante fortalecer as lutas e alianças para deter esse fenômeno que gera impactos negativos - mais uma vez, principalmente no Sul, mas também no Norte. Quanto mais investem em energia de biomassa, mais os países do Norte adiam a busca de soluções estruturais para a crise climática e ambiental, pela qual são historicamente responsáveis, mas cujas consequências afetam toda a humanidade. Quem já sofre com essas consequências são as populações camponesas, indígenas e tradicionais do Sul, as mesmas que agora enfrentam um novo problema, que é a expansão de plantações em seus territórios para abastecer o Norte com energia de biomassa. Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Capítulo 1
Biomassa, bioenergia e plantações de árvores 1.1 De que estamos falando? Biomassa e bioenergia No decorrer da história, a humanidade utilizou a biomassa que se encontra abundantemente em quase todo o planeta, por exemplo, como lenha para gerar calor e para cozinhar, ou na forma de óleos de origem vegetal ou animal para iluminação. Até hoje, mais de 2 bilhões de pessoas dependem da madeira como fonte de energia para cozinhar e para calefação, principalmente nos países do Sul global. A energia que resulta disso é chamada de bioenergia. Pode-se gerar bioenergia a partir de biomassa em forma sólida, como lenha de madeira, cavacos ou granulados, ou líquida, tendo o etanol e os óleos vegetais como matéria-prima, ou ainda em forma, gasosa, como o biogás. Como resultado da promoção recente das “energias renováveis”, existem cerca de 2.000 usinas energéticas de biomassa em 50 países de todo o mundo, com mais de 1.000 delas ativas só na Europa.1 Essas variam em tamanho, desde usinas muito pequenas até a maior usina de biomassa do mundo, chamada Tilbury B, na Inglaterra, que pode queimar 7,5 milhões de toneladas de granulados de madeira por ano. Atualmente, 10% da energia primária2 total usada globalmente provêm da bioenergia. A biomassa tradicional no Sul global ainda representa a maior parte disso, mas políticas defendidas na Europa, na América do Norte e em nível internacional- por exemplo, através da Iniciativa Energia Sustentável para Todos3 -buscam reduzir o uso tradicional de bioenergia e substituí-lo, inclusive por combustíveis fósseis- enquanto fomentam a bioenergia industrial, em larga escala, incluindo eletricidade baseada em madeira e agrocombustiveis. Na UE, a expectativa é que a maior parte das metas de energias renováveis se concretizem com a biomassa, enquanto o governo dos EUA espera que a bioenergia cresça muito mais do que as energias renováveis em geral. Agrocombustíveis, e não biocombustíveis Na década de 1970, o Brasil e, mais tarde, os EUA, foram os primeiros países que, com seus programas de etanol, respectivamente à base de cana-de-açúcar e milho, começaram a promover o uso dos chamados “biocombustíveis” em escala nunca antes vista, sendo seguidos por vários países na última década e gerando uma “explosão” desse tipo de combustível. Estados Unidos, Brasil, Alemanha e França estão hoje entre os principais produtores. A matéria-prima vem de monocultivos como milho e cana-de-açúcar, no caso de etanol, e canola (espécie de couve de cujas sementes se extrai óleo), soja e dendê, no caso do óleo. Para se ter uma ideia da expansão, no ano 2000 foram produzidos 16 bilhões de litros de “biocombustíveis” mundialmente, e para 2010, a cifra alcançou os 100 bilhões.4
1 Geração de energia a partir de biomassa em nível mundial, ver artigo em inglês (http://www.energias-renovables.com/articulo/ power-generation-from-biomass-booms-worldwide). 2 Energia primária é aquela disponível na natureza, que pode ser usada de forma direta; é o caso do petróleo, do carvão mineral, do gás, da biomassa, da energía eólica, etc. 3 http://www.sustainableenergyforall.org/ 4 Schneider, 2012 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Em geral, seus promotores têm apontado que a energia produzida a partir da biomassa é sustentável e não prejudicial ao meio ambiente; em uma palavra, é energia “verde”. Mas o prefixo “bio” não converte automaticamente esses conceitos em ecológicos ou mais positivos para com a natureza e seus habitantes. A expansão em grande escala de monocultivos para a produção de “biocombustíveis” tem sido promovida através de incentivos e subsídios, ao contrário do que sucede com a agricultura em pequena escala e diversificada, em sua grande maioria destinada à produção de alimentos. Este é um dos diversos motivos pelos quais movimentos camponeses, como a Via Campesina, consideram esse tipo de combustível como uma ameaça a comunidades camponesas e à soberania alimentar, e decidiram chamar os biocombustíveis de agrocombustíveis, eliminando o prefixo “bio”, que significa vida. De fato, trata-se, acima de tudo, de um negócio dominado por grandes empresas e que concentra cada vez mais terras, além de causar outros impactos sociais e ambientais graves. 1.2 O uso de plantações monocultoras de árvores para gerar bioenergia Agrocombustíveis de primeira geração: dendê e pinhão-manso, e agrocombustíveis “avançados” Biodiesel, etanol e óleo vegetal também são chamados de “agrocombustíveis de primeira geração”. Nessa categoria estão incluídos os provenientes dos monocultivos de dendê, soja e pinhão-manso, apesar de o fiasco geral com o plantio de pinhão-manso fazer com que ainda não tenha sido usado comercialmente para a produção de agrocombustíveis.5 A Finlandesa UPM, maior produtora de papel do mundo, investiu em uma refinaria na Finlândia para obter o chamado “agrocombustível avançado”. Trata-se de uma técnica que usará como matéria-prima o tall oil, um resíduo da fabricação de pasta química de papel. O produto obtido é o “biodiesel avançado”. A fábrica começará a funcionar em 2014.6 Agrocombustíveis de “segunda/terceira geração” Os agrocombustíveis chamados de “segunda ou terceira geração” são aqueles produzidos a partir de biomassa sólida, com diferentes tecnologias. Em termos gerais, podemos dividir essas tecnologias em duas abordagens: as que se baseiam em calor e pressão (sobretudo a gasificação) e as que se baseiam em métodos bioquímicos que geralmente envolvem enzimas e micróbios geneticamente modificados (como o etanol celulósico). Por enquanto, os agrocombustíveis de segunda geração ainda estão mais na fase de pesquisa e desenvolvimento e não estão comercialmente disponíveis – isso porque seu saldo de energia é extremamente baixo (ou seja,, sua produção custa significativamente mais energia do que a gerada ao queimá-los.) Há dúvidas cada vez maiores sobre as perspectivas de longo prazo dos agrocombustíveis de segunda geração, pelo fato de a BP ter saído de um projeto grande de produção de etanol e vários outros investimentos não terem dado resultados positivos, havendo até mesmo quebra financeira, pois o custo atual de investimentos nesse tipo de tecnologia é muito alto.7
5 Aqui, chamamos esse tipo de plantação de “plantações de árvores”, apesar de, por exemplo, a FAO chamar as plantações de dendê africanas de “cultivos agrícolas”. 6 Overbeek et al, 2012 7 Study casts doubt on alternative ethanol´s fuel viability (http://minnesota.publicradio.org/display/web/2011/10/03/study-development-lags-cellulosic-ethanol-fuel/) 8
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Bioenergia a partir de biomassa de madeira Cada vez mais se produz bioenergia à base de madeira, resíduos de madeira, cavacos (chips) e granulados (pellets) de madeira, com o objetivo de gerar eletricidade e calor para a indústria e residências. A madeira procede de florestas naturais, mas, cada vez mais, de chamadas “florestas secundárias” em diferentes escalas, como na Europa, e também de grandes monocultivos industriais de árvores. Empresas europeias de energia estão trabalhando ativamente junto a produtores de granulados de madeira e consultores para criar -e dominar- um novo mercado global em granulados de madeira,8 que antes eram produzidos em pequena escala e comercializados no próprio país ou em nível de UE. 1.3 Por que se está promovendo a bioenergia? A economia globalizada ainda está baseada na energia fóssil; que depende de petróleo, do carvão mineral e do gás natural para a maior parte do seu consumo de energia. Estima-se que, nos últimos anos, o abastecimento de petróleo “fácil de explorar” tenha entrado em declínio, enquanto novas jazidas de petróleo e gás têm se tornado acessíveis, aplicando tecnologias novas que possibilitam a extração dessas reservas. O medo em relação a “segurança energética”, em especial, o acesso a petróleo “fácil”, tem proporcionado, sobretudo na UE e nos EUA, apoio a metas e incentivos para o uso de bioenergia, a qual, portanto, tem se tornado relevante para as principais empresas de energia. Ao mesmo tempo, a energia fóssil também é a principal causa do aquecimento global, provocado pela mudança climática resultante das excessivas emissões de dióxido de carbono desde a revolução industrial, principalmente nos países do Norte. Diante dessa situação, governos e empresas das maiores economias do mundo se associaram, supostamente para enfrentar o amplamente anunciado fim da era da energia fóssil com energias alternativas que eles dizem reduzir as emissões de dióxido de carbono. Por agora, a maior parte do financiamento estatal e apoio na forma de políticas no Norte global fomenta as chamadas energias renováveis, como a bioenergia (de biomassa), a eólica ou a solar. No entanto, a energia gerada assim, em grande parte, é produção adicional e não substitui o uso de combustíveis fósseis. Além disso, estudos científicos mostram que os impactos sobre o clima da bioenergia industrial, incluindo agrocombustíveis e bioenergia baseada em árvores inteiras, podem ser piores do que os dos combustíveis fósseis que essas energias substituem.
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http://www.laborelec.be/ENG/initiative-wood-pellet-buyers-iwpb/
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Quadro 1: Energia renovável versus energia fóssil O que é energia renovável? O Conselho Mundial de Energia9 a define como aquela “disponível a partir de processos permanentes e naturais de conversão de energia, exploráveis economicamente nas condições atuais ou em um futuro próximo”.10 De acordo com essa definição, a energia renovável tem diversas formas: a bioenergia, a energia eólica, hidroelétrica, geotérmica ou maremotora. Os investimentos em energias renováveis mais do que duplicaram nos últimos cinco anos, supondo-se mais de 260 bilhões de dólares11 globalmente em 2011, dos quais 187 bilhões foram para produzir eletricidade. No entanto, há sérias preocupações sobre essa definição ampla de “energia renovável” que inclui tipos de energia insustentáveis e com alto teor de carbono, como usinas hidrelétricas em larga escala, agrocombustíveis e biomassa industrial. Afinal, as terras e ecossistemas destruídos para produzir esses tipos de energia não são “renováveis”. O que são energias fósseis? As energias fósseis se produzem a partir de fontes como petróleo, carvão mineral e gás natural. Esses três elementos são, em realidade, biomassa produzida e acumulada mediante processos muito lentos que requerem milhões de anos. Encontram-se na Terra em uma forma muito concentrada e provêm de restos orgânicos de plantas e animais mortos depositados no fundo de mares, lagos e pântanos. Por definição, não são fontes renováveis de energia, já que não podemos repor as reservas na velocidade e na escala em que se consomem. Todos os anos queimamos combustíveis fósseis que equivalem a 400 anos de material vegetal ou animal, concentrado nesses combustíveis como resultado de um processo de milhões de anos.12
1.4 O que há por trás da “explosão” da bioenergia? Primeiramente, é importante assinalar que o consumo de energia no mundo é muito desigual. Nos Estados Unidos, cada pessoa consome mais de onze vezes a energia de um africano e, na União Europeia, cerca de cinco vezes mais.13 Enquanto os países do Norte consomem quantidades excessivas de energia, principalmente a fóssil, a grande maioria das pessoas nos países do Sul não consegue sequer atender suas necessidades básicas. No mundo, mais de 1,3 bilhão de pessoas carecem de acesso a eletricidade - a grande maioria, no Sul. No entanto, governos e grandes corporações privadas do Norte não têm previsão de reduzir seus níveis de consumo, e sim de complementar os combustíveis fósseis com outras fontes, apostando nas energias renováveis, principalmente na bioenergia.
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O Conselho Mundial de Energia é uma rede integrada por 93 comitês nacionais, que representa mais de 3.000 organizaçõesmembros, incluindo governos, a indústria e as chamadas instituições especializadas. (http://www.worldenergy.org/) Diccionario da Energía, Consejo Mundial da Energía, 1992 McCrown, 2012 http://www.monbiot.com/archives/2005/12/06/worse-than-fossil-fuel/ http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_energy_consumption_per_capita
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A bioenergia fomenta setores importantes da economia, como o florestal, o agrícola e o energético, por exemplo, promovendo os monocultivos de matéria-prima ou criando toda a infraestrutura e a tecnologia necessárias para colheita, transporte, armazenagem e conversão de biomassa em bioenergia. Isso está levando a novas e poderosas alianças, por exemplo, entre empresas do agronegócio, biotecnologia e petrolíferas, para agrocombustíveis, e empresas de energia e que utilizam madeira, para biomassa baseado nesse material. E sobretudo, isso incentiva uma nova concentração de terras e recursos. A biomassa pode resultar em produtos com potencial para ser transformados em commodities, como etanol de cana-deaçúcar, ou pellets de madeira, a ser transportados e vendidos globalmente como acontece hoje com o petróleo, o carvão mineral e o gás. Dessa forma, podem-se criar mercados globais de bioenergia para investidores e empresas transnacionais, com grandes possibilidades de negócio s- muito bem-vindos em um momento de crise econômico-financeira mundial, sobretudo no Norte global. Além do mais, a bioenergia, considerada de forma mais ampla, abre outras possibilidades de negócio, por exemplo, a conversão de biomassa não apenas em bioenergia, mas também em produtos industriais como os chamados bioplásticos ou biofertilizantes, através de processos químicos e de biotecnologia, de grande interesse por parte das corporações e por quem elabora políticas. Por último, trata-se de um dos pilares da promessa de uma “economia verde” ou “bioeconomia”, que é apresentada pelo grande capital como a resposta ideal para continuar fazendo negócios e lucrando com a promessa de um mundo futuro sustentável.
Plantação nova de dendezeiro. Autor: EIA/ Telapak
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Capítulo 2
Bioenergia a partir da madeira 2.1 Por que cresce tanto a bioenergia a partir da madeira? A maior parte da biomassa utilizada para calor e eletricidade é de madeira, a menor parte vem de restos da agricultura (como resíduos de dendê e cana-de-açúcar ou palha) e uma parte muito pequena vem da produção de madeira de galhos, por exemplo, de salgueiro ou miscanthus, produzida em ciclos curtos. Alguns países classificam também diferentes tipos de incineração de lixo como “biomassa”. Vários fatores contribuíram para a atual “explosão” da bioenergia a partir da biomassa de madeira, uma tendência que deve fomentar em muito as plantações de monocultivos de árvores. A bioenergia à base de madeira é promovida através de uma série de subsídios e, em alguns casos, metas obrigatórias, na Europa e América do Norte. Estas incluem subsídios à energia renovável estabelecidos por países membros da UE para alcançar a meta geral de 20% em 2020, regras para a co-combustão como as anunciadas na Holanda, inclusão de biomassa no Conjunto de Critérios para Renováveis (Renewable Portfolio Standards) em 30 estados dos EUA, e também incentivos fiscais nos EUA. Outro elemento a destacar é que a expansão dos monocultivos agrícolas para produzir agrocombustíveis recebeu críticas em função de seus impactos ambientais e sociais. Sua expansão tem sido duramente criticada não apenas pelos movimentos sociais e ambientais que denunciam seu impacto negativo na soberania alimentar de países e continentes, mas também por autoridades, como o ex-relator especial da ONU para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, que declarou em 2007 que a conversão de cultivos alimentares em cultivos para agrocombustíveis era um “crime contra a humanidade”. Além disso, por exemplo, o monocultivo de dendê, usado para produzir biodiesel, foi fortemente criticado por ser uma causa direta de desmatamento, principalmente na Indonésia e na Malásia, os principais países produtores. As críticas motivaram a Comissão Europeia a publicar, em outubro de 2012, uma proposta que limitaria a conversão de terras para produzir agrocombustíveis. Connie Hedegaard, membro da Comissão para a Ação Climática, declarou: “Para que os agrocombustíveis nos ajudem a combater a mudança climática, temos que utilizar biocombustíveis verdadeiramente sustentáveis. Devemos investir em biocombustíveis que alcancem cortes de emissões reais e não concorram com os alimentos”.14 No entanto, a proposta não significa um limite real à expansão de cultivos para biocombustíveis; além disso, agrocombustíveis “verdadeiramente sustentáveis” sempre precisarão de terras férteis e água e, portanto “qualquer espécie de planta – seja um cultivo para alimentação ou uma planta não comestível e invasora como pinhão-manso ou mamona – cultivados para agrocombustíveis, terão basicamente o mesmo impacto sobre a soberania alimentar”.15 A bioenergia de biomassa de madeira foi propagandeada por empresas e governos que incentivam seu uso como forma de aproveitamento dos resíduos de madeira e florestais, e eles afirmam que a remoção de resíduos de florestas e plantações cortadas proverá “benefícios”, como evitar emissões de CO2 e metano de biomassa em decomposição, bem como 14 EC press release: new commissiom proposal to minimize the impacts of biofuel production (http://europa.eu/rapid/press- release_IP-12-1112_en.htm) 15 http://peopleforestsrights.wordpress.com/2012/10/19/the-food-fuel-conundrum-have-we-been-bio-fooled/ 12 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
prevenirá incêndios florestais. Contudo, este argumento é falso porque o aproveitamento de resíduos florestais para bioenergia afeta negativamente o ciclo de nutrientes no solo, esgota seu carbono, causa erosão e compacta solos, afeta a capacidade de armazenar água, reduz o crescimento futuro de árvores e dizima a biodiversidade. Cada vez mais, métodos agressivos de corte como a colheita da árvore inteira (envolvendo a remoção de todas as partes) e a colheita do tronco, são usados, tanto em plantações de árvores existentes como em florestas biodiversas. Além disso, resíduos florestais, seja do corte de árvores, seja de restos de serrarias, estão longe de poder atender à demanda atual, e muito menos à futura, de biomassa de madeira. Por isso, as empresas buscam cada vez mais a saída de queimar granulados e cavacos de árvores, cortadas para esses fins, seja nos EUA, seja no Reino Unido.16 Outro fator que promove o uso de madeira em termos gerais é o fato de que as árvores não são cultivos alimentares e, portanto, aparentemente, não haveria o dilema de encher o prato ou o tanque de combustível, - apesar de as plantações de eucalipto deslocarem a produção de alimentos exatamente como acontece com as terras utilizadas para plantar trigo ou milho para etanol. Mais do que isso, as plantações de monocultivos de árvores são promovidas como “boas” porque são definidas como “florestas” pela FAO17 e estariam “recuperando” terras “degradadas”. Quadro 2: Monocultivos de árvores não são florestas A definição da FAO basicamente considera qualquer área com uma certa quantidade de árvores como uma floresta. Isso tem muito a ver com a estreita relação que a organização mantém com a indústria da madeira, em especial o setor de produção de celulose e papel. O fato de legitimar essas plantações como “florestas” ajuda as empresas que as promovem a convencer as autoridades e o público de que elas não causam danos ambientais, e sim aportam os mesmos benefícios que as florestas. Plantar “florestas” também serve para atrair investidores interessados em projetos de bioenergia.18
Plantação de eucalipto em Uruguai. Autor: Grupo Guayubira
16 See for example www.dogwoodalliance.org/2012/11/new-report-discredits-uk-energy-company-claims-that-pellets-comefrom-wood-waste/, and this picture of a Scottish biomass power station: www.mottmac.com/projects/?id=66058 17 Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação 18 Overbeek et al, 2012 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Os estudos de consultores e instituições nos quais se apresentam cenários futuros indicando que há tanto uma determinada “necessidade”, uma “demanda”, quanto um abastecimento futuro significativo de biomassa a base de madeira e outros produtos, são fatores a estimular o setor da bioenergia de madeira. Por exemplo, a Agência Internacional de Energia (AIE), financiada pelos governos das economias que mais consomem energia e com forte influência de empresas energéticas, assinala em seu “guia tecnológico” que a produção de energia de biomassa alcançará 7,5% da demanda global de eletricidade, em 2050. A AIE sugere que, para 2050, seriam necessárias entre 5 e 7 bilhões de toneladas de biomassa seca (madeira) para a produção de eletricidade e, além disso, entre 3 e 4 bilhões de toneladas de biomassa seca (madeira) para a produção de biocombustíveis. Segundo a AIE, estudos indicam que, para alcançar essas metas, além de resíduos de madeira e restos florestais e de serrarias, é necessário realizar “cultivos energéticos plantados para este fim” (mais provavelmente plantações de árvores, apesar de plantações de espécies de capim normalmente invasivas como o switch grass e miscanthus também serem fomentadas). Com dados, inclusive da FAO, sobre a futura demanda de terras para agricultura, chegam a sugerir que haveria, em 2050, cerca de 300 milhões de hectares de terras de pastagens e florestas disponíveis “com boa aptidão para os cultivos (energéticos)”, principalmente no leste da África, na América do Sul e no leste Europeu. O estudo também afirma que, em geral, os investimentos para gerar eletricidade a partir da bioenergia deveriam alcançar os 500 bilhões de dólares.19 Outros estudos sugerem um potencial ainda maior que poderia ser convertido em cultivos bioenergéticos.20 Os estudos, por sua vez, são usados pela indústria para fazer lobby junto aos governos com vistas a obter incentivos e subsídios, considerados por ela necessários para que as metas sejam atingidas. Obviamente, os subsídios também servem às empresas envolvidas, não apenas como um incentivo a mais para seus (novos) negócios, mas, sobretudo, como uma das condições para investir neles. O crescimento atual do uso de madeira para bioenergia pode ser observado parcialmente na produção de pellets. Entre 2006 e 2011, a produção mundial aumentou de cerca de 6 a 7 para 14,3 milhões de toneladas (mt). A capacidade produtiva instalada é maior na América do Norte (Estados Unidos e Canadá), seguida por Alemanha, Rússia e Suécia. O Sul dos EUA é atualmente o maior produtor de granulados (pellets) no mundo, e os principais consumidores de madeira são Bélgica, Holanda, o Reino Unido, Suécia e Dinamarca.21 2.2 La Unión Europea (UE) A Diretiva de Energias Renováveis22 da UE, aprovada em 2009, é uma lei central que estimula o uso de bioenergia na Europa. A diretiva aponta a diversificação das fontes de energia e fixa a cota das energias renováveis em 20% até 2020. Na legislação europeia, a biomassa está incluída na definição de energia renovável.23 19 OECD/IEA, 2012 20 Berndes, G. et al, 2003. The contribution of biomass in the future global biomass supply: a review of 17 studies. Biomass & Bioenergy, volume 25. 21 http://www.enplus-pellets.eu/wp-content/uploads/2012/04/Industrial-pellets-report_PellCert_2012_secured.pdf 22 Diretiva 2009/28/CE, de abril de 2009. Faz parte do Pacote sobre Energia e Mudança Climática da UE (EU Energy and Climate Change Package CCP). (http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2009:140:0016:0062:es:PDF) 23 Diretiva 2003/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003, sobre normas comuns para o mercado interno de eletricidade, pela qual se suspende a Diretiva 96/92/CE e se definem como “fontes de energía renováveis” as fontes de energía renováveis não fóssiles (energía eólica, solar, geotérmica, das ondas, das marés, hidráulica, da biomasa, gases de aterro sanitário, gases produzidos em estações depuradoras de águas residuais e biogases). 14 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Doze por cento de toda a energia consumida pela UE em 202024 deverá ser bioenergia, ou seja, proceder de biomassa,25 comparados com 5,4% em 2005, o que significa, pelo menos, duplicar a produção, e a meta da UE para energia renovável será sobretudo alcançada a partir da bioenergia. A biomassa de madeira é queimada cada vez mais em grandes usinas de energia - seja através de co-combustão com carvão mineral (e, cada vez mais. através da conversão de usinas de energia de carvão mineral para biomassa) e em usinas específicas de energia de biomassa. Alguns países, como a Alemanha, também promovem o uso em larga escala de madeira através de usinas, tanto para calor quanto para energia. Os países-membros da UE implementam a Diretiva de Energias Renováveis da Europa em ritmos diferentes.26 Porém, o consumo de pellets de madeira já aumentou em 43,5% entre 2008 e 2010, chegando a 11,4 milhões de toneladas em 2010, quase 85% da demanda global. Os incentivos estatais, acima de tudo, estimularam a demanda geral pelo uso de biomassa de madeira na Holanda, na Bélgica, na Dinamarca e, recentemente, também no Reino Unido.27 Quadro 3. Óleo de dendê para transporte, geração de eletricidade e calor Para o tráfico rodoviário, a UE estabelece o objetivo de misturar obrigatoriamente os combustíveis fósseis com agrocombustíveis; para 2020, pelo menos 10% devem vir de fontes renováveis. Na prática, este objetivo se cumpre com agrocombustíveis porque não existem outras fontes de energia renováveis suficientemente desenvolvidas que possam aspirar a cobrir a demanda atual. E tampouco existirão, em um prazo de alguns anos. A redução da demanda por combustíveis fósseis em 10% não está sendo considerada no conjunto de alternativas. Também se podem queimar agrocombustíveis para gerar calor e eletricidade se os governos optarem por subsidiar esse uso. O óleo de dendê é a principal matéria-prima porque, de longe, é o óleo vegetal mais barato e disponível em grandes quantidades. Nos últimos anos, quantidades muito significativas desse óleo foram queimadas em usinas energéticas na Holanda e Alemanha. Em função de campanhas de protesto de organizações ambientalistas contra os impactos sociais e ambientais da produção de óleo de dendê no Sul global, ambos os governos decidiram terminar gradativamente os subsídios para gerar calor e eletricidade a partir de agrocombustíveis. Isso eliminou a queima de agrocombustíveis nesse setor na Holanda e a reduziu para uma pequena fração do que era usado na Alemanha. É sabido que quantidades significativas de óleo de dendê continuam sendo queimadas em usinas energéticas na Itália (subsidiadas através de “créditos de energia verde”), apesar de não haver dados atualizados disponíveis. O governo do
24 Atanasiu, 2010 25 A Diretiva Europeia sobre Energias Renováveis define biomassa como a “fração biodegradável dos produtos, restos e resíduos de origem biológica, procedentes da agricultura (incluídas as substâncias de origem vegetal e de origem animal), da silvicultura e das indústrias conexas, incluídas a pesca e a aquicultura, assim como a fração biodegradável dos resíduos industriais e municipais.” 26 National renewable energy action plan data from member states (http://www.eea.europa.eu/data-and-maps/figures/nationalrenewable-energy-action-plan) y http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:52010DC0639:EN:HTML:NOT 27 Overbeek et al, 2012 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Reino Unido propôs recentemente subsídios de longo prazo para eletricidade a partir de agrocombustíveis que, se as propostas avançam, poderiam resultar numa duplicação da importação do óleo de dendê nesse país. Nos EUA, quantidades desconhecidas de agrocombustíveis estão sendo misturadas com o óleo de combustão e queimadas em usinas de energia. A maior parte vem de soja colhida nos EUA, no entanto, em 2011, quantidades significativas de óleo de dendê do sudeste Asiático foram queimadas em duas grandes usinas no Havaí. Se a empresa envolvida (HECO) retomasse ou aumentasse esse nível de queima de óleo de dendê, poderia se tornar uma das maiores importadores desse óleo dos EUA.
Não obstante, a maior parte dos agrocombustíveis importados é usada para o transporte rodoviário na UE. Em 2011, uma quinta parte dos agrocombustíveis consumidos teve que ser importada.28 No entanto, as evidências mostram que os maiores impactos que os agrocombustíveis têm causado na Europa sobre plantações de óleo de dendê até agora têm sido indiretos: com a UE utilizando dois terços de sua produção de óleo de canola para agrocombustíveis, as indústrias de alimentos, cosméticos e química começaram a substituí-lo pelo óleo de dendê. Também em 2011, o biodiesel foi o agrocombustível mais utilizado para o transporte na União Europeia. Com um volume de 70% do mercado de agrocombustíveis, o etanol teve uma cota de 28% e o óleo puro, de 2%. Além disso, até 2020, a indústria aeronáutica europeia planeja dispor de 2 milhões de toneladas de bioquerosene por ano.29 Várias companhias aéreas já fizeram voos de prova. A única empresa com capacidade suficiente para produzir quantidades significativas de agrocombustíveis apropriados para o uso em motores de avião no futuro próximo é a Neste Oil. A empresa já é o maior produtor mundial de agrocombustíveis de óleo de dendê. Por isso, espera-se que ele venha a ser a principal matéria-prima para companhias aéreas.
Subsídios e incentivos Os objetivos e subsídios da energia “verde” da UE supõem um apoio definitivo à grande indústria agrária e florestal e à geração de bioenergia, pois elas dão confiança e estabilidade ao mercado.30 E apoio é o que não falta. A produção de biomassa e de biocombustíveis recebe na EU, em média, 75% dos subsídios às energias renováveis, e os 25% restantes se repartem entre as outras energias renováveis,31 provocando o desequilíbrio no qual dois terços da energia, classificada como renovável na UE provêm da biomassa e só um terço vem das outras energias renováveis - solar, eólica, hidráulica, etc. Os subsídios se determinam em nível nacional e, por isso, variam entre diferentes países, onde cada governo estabelece as medidas concretas para alcançar os objetivos energéticos.32
28 Global Agricultural Information Network Gain Report, realizado por técnicos del Departamento de Agricultura de Estados Unidos USDA, http://gain.fas.usda.gov/Recent%20GAIN%20Publications/Biofuels%20Annual_The%20Hague_EU-27_6-222011.pdf 29 FOE Europe, 2011 30 Ver, por exemplo: The European wood pellet markets: current status and prospects for 2020. (http://robins.ee/wp-content/ uploads/2011/12/2011-Wood-Pellets-market-trends.pdf) 31 www.biofuelwatch.org.uk 32 Renewable energy: Action plans and forecasts (http://ec.europa.eu/energy/renewables/action_plan_en.htm) 16 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Quadro 4. A política agrária comum e o incentivo a “cultivos energéticos” Um elemento comum aos países europeus é a Política Agrária Comum, PAC, que significou o fim da agricultura tradicional na Europa. Neste momento, ampliar os cultivos energéticos é um dos objetivos mais ambiciosos dentro das políticas para energias renováveis na União Europeia. A PAC fomenta o reflorestamento de terras, incluída a conversão de terras agrícolas em plantações e a transformação e a comercialização de produtos florestais. Prevê também possíveis subvenções para o florestamento de terras agrícolas. Em 2005, a produção de biomassa com fins energéticos havia ocupado 3,6 milhões de hectares de solo agrícola da UE. Segundo projeções, 19 milhões de hectares de terras agrícolas na Europa estarão sendo exclusivamente destinados à produção bioenergética em 2030, o que terá um impacto sobre a biodiversidade, bem como sobre a produção de alimentos e a soberania alimentar em geral, aumentando as importações de alimentos e matérias-primas para sua produção.33
Garantir a matéria-prima Em vista das projeções sobre a demanda de biomassa para bioenergia na UE, que dispara com os objetivos e incentivos concedidos, será necessário importar a matéria-prima para poder mantê-la. Em 2010, a indústria europeia de painéis de madeira calculou que, para alcançar os objetivos de biomassa dos diferentes estados-membros para 2020, serão necessários 700 milhões de metros cúbicos de madeira para queimar por ano.34 Recordemos que, segundo as projeções na Europa, há apenas 800 milhões de metros cúbicos de madeira (florestal e reciclada) disponíveis anualmente, os quais, em sua maioria, destinam-se a outros usos, como a construção, a produção de móveis ou de polpa de celulose para papel. Esses usos demandam até 500 milhões de metros cúbicos anuais. Somando-se esta cifra à demanda por biomassa, chega-se a um total de 1,2 bilhões de metros cúbicos. Na União Europeia, faltarão 400 milhões de metros cúbicos de madeira em 2020,35 segundo estas estimativas, as quais coincidem com as da FAO. Outra análise de dados e tendências feita em 201136 estima que haverá um aumento no consumo de biomassa de madeira até 2020 na União Europeia, entre 100 e 200 milhões de metros cúbicos, e que a maioria dos estados-membros não tem condições de atender a esse aumento com seus próprios recursos madeireiros. No entanto, esses dados tendem a ser seriamente subestimados, dado a tendência mais recente de converter usinas a base de carvão mineral para biomassa, e também o aumento massivo da co-combustão, introduzindo a biomassa, por várias empresas Europeias de energia. Hoje em dia, os resíduos de madeira já
33 Agência Europeia do Meio Ambiente, 2010. 34 El sector de la madera secunda mañana el paro europeo para cuestionar las primas a la biomasa (http://www.evwind. com/2010/10/29/el-sector-del-tablero-secunda-manana-el-paro-europeo-para-cuestionar-las-primas-a-la-biomasa/) 35 Holzwerkstoffindustrie protestiert morgen gegen Holzverbrennung zur reinen Energiegewinnung (http://www.presseportal.de/ pm/79403/1707252/holzwerkstoffindustrie-protestiert-morgen-gegen-holzverbrennung-zur-reinen-energiegewinnung) 36 Hewitt, 2011 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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não são suficientes para atender à demanda de bioenergia e se começam a demandar cada vez mais árvores inteiras para esse propósito, e madeira de qualidade,37 incentivando, assim, a expansão de monocultivos de árvores com fins energéticos na União Europeia, no Canadá, na Rússia, nos Estados Unidos, na América Latina, na África e na Ásia, além de aumentar a pressão sobre as florestas nativas. No Canadá, as exportações de pellets para a Europa cresceram 700% em menos de oito anos até 2010, chegando a quase 1 milhão de toneladas.38 A demanda por pellets na UE supera em muito a oferta doméstica desde 2008, tendo sido importadas mais de três milhões de toneladas métricas em 2011. Os estudos prevêem o uso de pellets principalmente como fonte de cogeração de eletricidade em grandes plantas, e também para uso doméstico.39 No mesmo estudo, estima-se, para o ano de 2020, uma grande expansão de monocultivos de árvores de rápido crescimento no Sul para exportação à União Europeia. Em um dos cenários, prevê-se um total de cerca de 15 milhões de toneladas de pellets, dos quais muitos poderiam estar sendo produzidos no Sul, principalmente no Brasil, no Uruguai, em Moçambique e na África Ocidental.40 Considerando-se os anúncios recentes de empresas Europeias de energia sobre seus planos de biomassa, o dado real pode ser bem mais alto. Quinze milhões de toneladas exigiriam uma área de, pelo menos, 450 mil hectares de plantações, caso fosse de eucalipto para biomassa no Brasil, de curta rotação (2-3 anos), uma produtividade muito maior do que outras fontes.41
37 Ernsting, 2012 38 Briefing: First biofuels, now biomass: is the EU driving another BioMess (http://www.greenpeace.org/belgium/Global/belgium/ report/2011/biomass.pdf) 39 Cocci, 2011 40 Cocci, 2011 41 Com base em informações de André Dorf, diretor da Suzano Renewable Energy, de que se necessitam 30 mil hectares de eucalipto de curta rotação (2 a 3 anos) e rápido crescimento para produzir 1 milhão de toneladas de pellets por ano (http://www.dci.com.br/Suzano-investe--US$-1_3-bilhao-na-producao-de-biomassa7-336378.html)
Troncos inteiros antes de serem transformados em chips de madeira.Autor: Josh Schlossberg. The Biomass Monitor y Energy Justice Network 18 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
2.3 Projetos de biomassa em alguns países da Europa
Usinas de biomassa no Reino Unido A Grã-Bretanha se situa à frente da expansão da bioenergia industrial na Europa. De acordo com a organização Biofuelwatch, a indústria de biomassa planeja queimar, no futuro, mais de 90 milhões de toneladas de madeira verde ou bruta42 para eletricidade por ano, nove vezes mais do que a que atualmente está disponível no país.43 O Reino Unido subsidia generosamente44 e com garantias a biomassa sólida e, assim, está acontecendo um desenvolvimento sem precedentes da geração em grande escala de energia de biomassa. O governo britânico previu subsídios generosos, que são os principais impulsores do investimento empresarial no ramo da eletricidade a partir de biomassa. Seriam necessários pelo menos 3 bilhões de libras em subsídios por ano para cumprir esses planos ambiciosos anunciados pela indústria.45 O objetivo principal da estratégia do governo britânico para bioenergia é estimular a conversão de usinas de carvão mineral em usinas de bioenergia. A capacidade de uma destas centrais de carvão, Tilbury B, da RWE Npower, é substancialmente maior do que a de qualquer outra central de biomassa do mundo, e requereria 7,5 milhões de toneladas de madeira verde por ano. Até o momento, as empresas de energia anunciaram planos para converter 5 usinas de carvão mineral no Reino Unido para biomassa que, ao todo, requererão granulados de madeira de cerca de 63 milhões de toneladas - um dado que não inclui a madeira necessária para um grande número de usinas de energia de biomassa propostas.46 Três usinas, planejadas pela Forth Energy na Escócia, queimariam 3,5 milhões de toneladas de madeira. A MGT Power espera iniciar a construção de uma usina de energia de biomassa de 300 MW, que será abastecida com granulados de madeira de eucalipto do Brasil. A empresa também indicou planos para outras mega-usinas do mesmo tamanho.
A biomassa energética na Alemanha A Alemanha é outro exemplo de país onde os próprios recursos da madeira não conseguem contribuir de forma significativa à demanda nacional. Se toda a madeira disponível naquele país se destinasse a fins energéticos, ela cobriria apenas 4% do consumo de energia primária. E ainda que, em suas florestas e plantações florestais, tenham sido colhidos, em média, em torno de 56 milhões de metros cúbicos de madeira entre 2002 e 2009, o governo alemão quer mobilizar muito mais para fins energéticos. O uso de biomassa na Alemanha está regulado desde 2003 pela Lei de Energias Renováveis (EEG, na sigla em alemão). Existem fortes subvenções para a produção de eletricidade e calor a partir da biomassa, na forma de plantações cultivadas e resíduos de granjas industriais
42 A madeira verde gera 9,5 MJ/kg, enquanto os pellets geram 19,8 MJ/kg (http://www.forestbioenergy.net/training-materials/ fact-sheets/module-5-fact-sheets/fact-sheet-5-8-energy-basics). 43 Ernsting, 2012 44 Por meio de Renewable Obligation Certificates, ROCs. Segundo a Wood Panel Industries Federation, esses subsídios no Reino Unido chegam a £75 por tonelada métrica de madeira queimada, um fator crucial na expansão de usinas de biomassa no Reino Unido. (Carbon Trade Watch: Nothing neutral here: large-scale biomass in the UK and the role of the EU ETS, 2012). 45 Ernsting, 2012 46 Biofuelwatch biomass power station map (http://www.biofuelwatch.org.uk/wp-content/maps/uk-biomass.html)
Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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de animais. Estas alcançam até 21 centavos de euro por kWh de eletricidade produzida, garantidas durante 20 anos, enquanto as subvenções para energia hidrelétrica chegam a 12,7 centavos/kWh e para energia eólica, a 9,4 centavos/kWh.47 Isso fez com que, na Alemanha, 62% da energia renovável se produzissem com biomassa. Atualmente, a biomassa aporta cerca de 8% da energia produzida, mas o governo alemão pretende triplicar essa proporção e chegar a 23% em 2050. Existem cerca de 1.000 usinas de biomassa sólida, ou seja, madeira; em 2011, existiam também 7.700 usinas de biogás, que funcionavam principalmente com milho, cultivado em quase um milhão de hectares. Neste ano de 2012, os cultivos energéticos já ocupam 21% das terras agrícolas, ou seja, 2,5 milhões de hectares, e seguem crescendo. Mais além, aproveitam-se os 11,1 milhões de hectares de florestas e plantações de árvores no país. O resultado do uso crescente da bioenergia é que se estão expulsando outros cultivos e usos, como a produção de alimentos e ração para animais, e a importação aumenta, inclusive de madeira. Ou seja, terras de todo o mundo alimentam o consumo alemão, como demonstra o caso da empresa estatal sueca Vattenfall. Quadro 5. Salve o clima com a Vattenfall A multinacional Vattenfall é a quinta produtora de energia na Europa. É uma das três maiores fontes de emissão de CO2. Sua filial Vattenfall Europe, com sede em Berlim, é uma das quatro maiores empresas no mercado energético alemão. Embora sua produção energética na Alemanha dependa principalmente do carvão mineral (65%) e da energia nuclear (26%), a empresa aposta também na madeira. Segundo sua página da empresa na internet, a Vattenfall tem 40 usinas de biomassa na Europa e se apresenta como “uma das companhias líderes neste setor em nível global”. A empresa afirma consumir anualmente mais de três milhões de toneladas de biomassa, apesar de este dado incluir uma proporção não especificada de turfa, que não é definida como bioenergia pela EU e pela ONU.
47 Vergütungssätze, Degression und Berechnungsbeispiele nach dem neuen Erneuerbare-Energien-Gesetz (EEG) vom 04. August 2011 (‚EEG 2012’) (http://www.bmu.de/files/pdfs/allgemein/application/pdf/eeg_2012_verguetungsdegression_bf.pdf) 20 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Comunidade no Departamento de Paysandú (Uruguai), cercada por plantações de eucalipto. Autor: Grupo Guayubira
Troncos enteros antes de ser transformados en chips de madera. Autor: Josh Schlossberg. The Biomass Monitor y Energy Justice Network
Chips de madeira sendo descarregados num incinerador de biomassa Autor: Josh Schlossberg. The Biomass Monitor y Energy Justice Network Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Imagem do corte numa plantações de árvores. Autor: Josh Schlossberg. The Biomass Monitor y Energy Justice Network 22 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Incinerador de biomassa. Autor: Josh Schlossberg. The Biomass Monitor y Energy Justice Network Uma nova ameaรงa para comunidades e florestas
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Troncos de árvores esperando para serem transformados em chips de madeira. Autor: Josh Schlossberg. The Biomass Monitor y Energy Justice Network//
Usina para gerar energia de biomassa. Autor: Chris Matera de Massachusetts Forest Watch
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Para reduzir as emissões de CO2 na capital alemã, cerca de 20% até 2020, o Senado em Berlim assinou, em 2009, um “Acordo Climático” com a Vattenfall Europe.48 Segundo o documento, a biomassa cumpre um papel central na estratégia, ao “ajudar a cidade a cumprir seus compromissos de proteger o clima”. Pelo menos no papel. Para a multinacional, significa um negócio altamente rentável, pois a queima de biomassa é financiada na Alemanha no marco da “Lei de Energias Renováveis”. Na época, a Vattenfall planejou construir duas usinas de energia de biomassa em Berlim com uma capacidade total de 222 MW. A empresa também planejou incorporar o uso de biomassa nas quatro usinas a carvão mineral existentes, contribuindo assim para uma geração adicional de 260 MW. De acordo com a empresa, isso requereria um abastecimento anual de 1,3 milhões de toneladas de biomassa. Apesar de os compromissos de Vattenfall sobre biomassa terem sido parcialmente adiados e reduzidos desde então,49 a empresa continua planejando usinas de energia de biomassa em Berlin, bom como em Hamburgo. Em Berlim e no estado federal de Brandeburgo, que circunda a capital, já existem outras 42 centrais de biomassa, sendo impossível adquirir toda a biomassa na região para atender aos planos da Vattenfall para 2009. A madeira disponível já é altamente demandada pelas indústrias de madeira, de granulados de madeira e de papel e celulose. Por isso Vattenfall declarou que utilizaria principalmente resíduos de madeira, como árvores de natal, restos de poda de parques urbanos, etc. Também sugeriu estabelecer plantações de árvores de rápido crescimento e identificou para isso cerca 300.000 hectares potenciais em torno de Berlim. Ao Sul da cidade, já existem amplos monocultivos industriais de pínus. Na primavera de 2010, a Vattenfall anunciou um acordo para a compra de um milhão de toneladas de cavacos de madeira de seringueira da Libéria.51 Naquele país africano, a Buchanam Renewables (BRE), fundada em 2008 por investidores norte-americanos, coletava seringueiras envelhecidas e as exportava na forma de cavacos. A Vattenfall AB, de Estocolmo, informou sobre a aquisição, por 20 milhões de euros, de 20% da Buchanam Renewables, e a organização estatal sueca para o desenvolvimento, Swedfund, também adquiriu outros 10% da empresa.50 Entretanto, depois de protestos internacionais por parte da organização Salva la Selva e outras, denunciando os impactos do projeto da BRE, em maio de 2012, Vattenfall e Swedfund decidiram se retirar da Libéria. A multinacional prescindiu da madeira tropical e anunciou a venda de suas ações na BRE. Ela argumentou que a madeira seria cara demais e não haveria quantidade suficiente no país. Agora, a Vattenfall pretende cortar florestas e promover plantações de árvores no Canadá e nos Estados Unidos, onde, segundo o porta-voz da Vattenfall, Hannes Hönemann, estão sendo negociados novos contratos.
48 Klimaschutzvereinbarung mit der Vattenfall Europe AG(http://www.berlin.de/sen/umwelt/klimaschutz/aktiv/vereinbarung/ vattenfall/index.shtml) 49 http://www.tagesspiegel.de/wirtschaft/berliner-klimapakt-vattenfall-verschiebt-kraftwerksbauten/7117062.html 50 Vattenfall press & news(http://www.vattenfall.com/en/press-kit-biomass.htm?WT.ac=search_success) 51 Vattenfall: Proteste stoppen Tropenholz aus Liberia (http://www.regenwald.org/erfolge/4293/vattenfall-proteste-stoppentropenholz-aus-liberia) Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Polônia: a maior plantação de biomassa prevista da Europa A empresa papeleira International Paper (IP), maior produtora de papel do mundo, e a Greenwood Resources (GWR), ambas com sede nos Estados Unidos, anunciaram, em março de 2012, um acordo para estabelecer na Polônia a maior plantação de árvores de ciclo curto para biomassa da Europa.52 A biomassa será utilizada para substituir o carvão mineral nas caldeiras existentes de energia e vapor na fábrica da IP em Kwidzyn, Polônia. Em seu comunicado, as empresas indicam que “os atuais suprimentos de biomassa na Polônia não são suficientes para suportar a crescente demanda da indústria devido aos objetivos da política energética da UE, enquanto a política atual do Estado polonês limita a quantidade de fibra das florestas que se pode utilizar para biomassa.” O acordo tem duração de doze anos. Ambas as empresas já executaram um projeto-piloto naquele país, com um híbrido de álamo de rápido crescimento plantado em um ciclo curto para a produção de biomassa. Segundo os planos, essa plantação de uma superfície total de 10.000 hectares se estabelecerá na região da Pomerânia. Está prevista a colheita de 300.000 toneladas de biomassa verde por ano. As terras para a “plantação de energia” serão arrendadas de agricultores locais com um ciclo de crescimento de três a quatro anos.
Finlândia: o país da indústria de madeira A Finlândia talvez seja o país no mundo com a economia mais baseada no “manejo sustentável de florestas” e na indústria de produtos de madeira, tanto dentro do país, com, por exemplo, muitas fábricas de celulose, quanto fora, através de empresas multinacionais como a Stora-Enso, a segunda maior empresa de papel do mundo, e a Poyry, uma gigante no trabalho de “consultoria”, principalmente em países do Sul. A Finlândia dispõe de um grande “reservatório” de madeira de florestas e plantações em grande parte de seu território, e vem utilizando madeira para fins energéticos há muito tempo. Mas agora, ambiciona aumentar em muito este uso. Para 2020, pretende usar 38% de energia renovável, grande parte de madeira, principalmente resíduos, para o consumo de energia, além de 20% de uso de madeira, principalmente cavacos, através de biorrefinarias, para o setor de transporte.53 Apesar de os cálculos indicarem que a Finlândia deveria chegar a essas metas até 2020, há sérias dúvidas sobre se, a partir daí, o país terá essa mesma capacidade, e também para abastecer outros países da Europa com demanda de madeira para fins energéticos. Além disso, a colheita de madeira para fins energéticos e suas características especificas, como a remoção do tronco e a intensificação de práticas de silvicultura, incluindo a remoção de madeira morta e resíduos de madeira, bem como o uso de áreas antes não exploradas, tem o risco de agravar a já decrescente biodiversidade das florestas finlandesas. Vale destacar também que, para abastecer as biorrefinarias, a lei que estabelece a meta de 20% de uso de energia renovável admite que se necessitará inicialmente importar óleo de dendê.54
52 International Paper & GreenWood Resources to Develop Europe’s Biggest Biomass Plantation (http://www.internationalpaper.com/documents/EN/Media/EMEAPL_BiomassPlanta.pdf) and Poland: US investors to develop Europe´s largest biomass plantation http://www.news2biz.com/article/2012/4/23/poland_us_investors_to_develop_europe_s_largest_biomass_plantation) 53 Eräjää, Sini, 2012 54 Eräjää, Sini, 2012 26 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
2.4 Outros países relevantes Além da UE, segundo a empresa de consultoria Poyry e outras, estima-se que uma demanda grande por pellets virá do leste de Ásia (Japão, Coreia do Sul e China), cerca de 5 a 10 mt para 2020,55 o que pode resultar em um crescimento das plantações de árvores para esse fim em países no Sudeste Asiático. Outro país relevante são os Estados Unidos, atualmente os principais consumidores de biomassa sólida, junto com a UE. Em 2011, as usinas do país usaram energias renováveis para gerar 13% de sua eletricidade, e a biomassa foi a segunda fonte mais importante, depois da energia hidrelétrica.56 O setor de biomassa prevê um crescimento de 8% por ano até 2040, comparado com um crescimento muito menor da energia classificada como renovável, de 3% ao ano.57 O uso crescente de bioenergia produzida a partir de madeira nos Estados Unidos depende cada vez menos de resíduos de serrarias e mais de madeira de procedência florestal, inclusive árvores inteiras. Estão sendo construídas novas usinas para a produção de bioenergia a partir de madeira em grande escala, e um grande aumento da co-combustão de carvão mineral com biomassa está previsto pelo governo do país.58 Além de um aumento massivo na demanda doméstica por biomassa, os Estados Unidos estão exportando cada vez mais granulados e cavacos de madeira para a UE, através de empresas como RWE, Enova e Enviva, investindo em grandes usinas de granulados para exportação. Quadro 6. O caso da RWE: uma empresa europeia investindo nos Estados Unidos Em 2011, a multinacional alemã de energia RWE inaugurou uma das maiores fábricas de pellets do mundo, no estado da Geórgia, Estados Unidos. Produz cerca de 750.000 toneladas métricas de pellets por ano (de 1,5 milhão de toneladas de madeira de árvores inteiras) para satisfazer necessidades europeias.59 “À diferença da Europa, os Estados Unidos têm importantes recursos madeireiros não utilizados”, indica a RWE. Para a empresa, que já conta com milhões de clientes fixos, o projeto significa máxima segurança nos Estados Unidos porque, desde seu ponto de vista, o país garante estabilidade política e jurídica para seus investimentos. Além disso, na Geórgia, não é preciso fazer os altos investimentos necessários para estabelecer novas plantações, porque eles já existem. Conforme Scot Quaranda, da Dogwood Alliance,60 uma ONG dos Estados Unidos que trabalha com o tema das florestas, uma tendência alarmante está ocorrendo no sul do país: “a madeira de nossas florestas é transformada em granulados que são exportados à Europa e queimados para gerar eletricidade a ser usada por grandes empresas de serviços básicos, atendendo a requisitos climáticos míopes. Atualmente, há 25 usinas de granulados para exportação na região, com mais 15 sendo planejadas no sul [dos Estados Unidos]. Essencialmente, estamos destruindo nossas florestas do sul para que Europa possa queimá-las e atender suas metas climáticas”. 55 56 57 58 59
Cocci, 2011 Renewable & Alternative Fuels (http://www.eia.gov/renewable/) http://www.marketwatch.com/story/biomass-power-consumption-projected-to-grow-through-2040-in-the-us-2012-12-10 Energy Information Authority, Annual Energy Outlook 2013 RWE, 2011.Biomass pellet factory Waycross/Georgia (http://www.rwe.com/web/cms/en/522380/rwe-innogy/sites/powerfrom-biomass/usa/waycross-georgia/) 60 http://www.dogwoodalliance.org/2012/10/tour-of-destruction-following-the-trail-of-the-newest-threat-to-southern-forests/ Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Contudo, empresas dos Estados Unidos também estão buscando matéria-prima fora de seu país, como se mostra no Capítulo 3. 2.5 Impactos e resistência no Norte Há crescente oposição às usinas de energia de biomassa, especialmente no Reino Unido, nos Estados Unidos e na Austrália. No Reino Unido, a oposição é liderada por grupos comunitários preocupados principalmente com os graves impactos da combustão de biomassa sobre a saúde pública. Usinas de energia de biomassa causam níveis muito altos de poluição, parecidos com usinas a carvão mineral, e várias são planejadas muito próximo a áreas residenciais. Em muitos casos, grupos comunitários têm tomado consciência também dos sérios impactos sobre florestas, terras e mudança climática, e têm se articulado com outros grupos de campanha nacionais e locais. A oposição comunitária tem contribuído para que várias solicitações nos Estados Unidos e no Reino Unido sejam retiradas ou rejeitadas.61 A agência dos Estados Unidos para a proteção ao meio ambiente estima que a queima de energia “limpa” de madeira emita 79 produtos contaminantes, relacionados a enfermidades respiratórias, cardíacas e ao câncer,62 sendo que o risco aumenta com resíduos de madeira quimicamente tratados, enquanto também existem riscos com madeira de plantações de monocultivos que são manejadas com agroquímicos. Uma investigação de 2009 no Reino Unido, elaborada a pedido do governo, advertiu que entre 340 e 1750 mil anos de vida podem ser perdidos se os “ambiciosos” planos de expansão das usinas de biomassa de madeira forem implementados até 2020. O governo argumenta que as políticas ambientais em curso vão proteger a população, mas a Biofuelwatch e outros grupos advertem que essas políticas são bastante insuficientes, pondo em risco a saúde da população.63
61 Carbon Trade Watch, 2012 62 Ernsting, 2012 63 Ernsting, 2012 28 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Capítulo 3
Plantações de árvores para bioenergia no sul 3.1 Por que precisam do Sul? Em primeiro lugar, como vimos no Capítulo 2, a demanda por biomassa de madeira é e será tão grande que o norte não poderá abastecer a si mesmo. De momento, a maior parte dessa madeira importada para produzir energia na própria UE, o principal mercado atualmente, provém da Rússia, do Canadá e dos Estados Unidos. As exportações destes dois últimos países para a UE passaram de 0,8 milhão de toneladas de cavacos em 2008 para 1,6 milhão em 2010. Porém, Hakam Ekstrom, porta-voz da Wood Resources International, prevê que “à medida que a demanda for aumentando nos próximos 10 anos, eles [os produtores de energia] não poderão obter todo o volume localmente e terão que recorrer a outros lugares, como Austrália, África, América do Sul e Ásia”.64 Nos últimos 30 a 40 anos, as plantações de monocultivos de árvores se ampliaram cada vez mais nos países do Sul, simplesmente porque as empresas, em especial as produtoras de celulose para papel, encontram ali mão-de-obra e terras baratas, normas ambientais menos rígidas e produtividade por hectare geralmente alta. Países como Brasil, Chile, Uruguai e Indonésia podem produzir 20 a 44 m3/ha/ano de madeira dura de eucalipto, contra os 4 a 6 m3/ha/ano das plantações em países do Norte que industrializam madeira, como Suécia e Finlândia. Não obstante, para as comunidades locais, as plantações industriais de árvores de qualquer tipo, assim como outros monocultivos em grande escala, costumam representar perdas incalculáveis e conflitos violentos.65 3.2 Planos e projetos Respondendo à crescente demanda, tanto na Ásia, na África quanto na América Latina, já se começam a conhecer planos e projetos de estabelecimento de plantações de madeira para energia. A seguir, listamos alguns dos projetos conhecidos, e aqueles em que os promotores apontam claramente que as plantações estão voltadas para a produção de bioenergia para exportação. É necessário considerar que o futuro preço da tonelada de madeira para energia deverá ser competitivo com o preço de outros usos que são dados à madeira, caso contrário, e como exemplo, a madeira poderia terminar abastecendo uma fábrica de celulose.
Asia No continente asiático, conhecemos pelo menos cinco projetos de plantações para energia por parte de empresas de origem japonesa e sul-coreana, a saber: 1. Em 2008, a gigante sul-coreana de eletricidade Kenertec recebeu do Conselho para o Desenvolvimento do Camboja a concessão de um total de 60.000 hectares de terra, uma área seis vezes o tamanho permitido conforme a legislação fundiária cambojana. Além de atividades de mineração, a empresa pretende desenvolver um complexo para processar madeira de seringueira, pinhão-manso e mandioca.66 Contatos locais no Camboja conta64 http://www.renewableenergyworld.com/rea/news/article/2011/03/eus-renewable-goals-driving-wood-pellet-growth 65 Overbeek et al, 2012 66 Kenertec develops a bio-complex in Cambodia (2008) (http://www.kenertec.co.kr/english/relations/whatsnew_read. asp?page=2&num=12) Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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ram ao WRM que a área concedida à Kenertex para o projeto de biomassa está localizada na região florestal de Prey Long, que abrange as províncias de Preah Vihear, Kompong Thom, Kratie e Stung Treng, no norte da país; lá vivem cerca de 350.000 indígenas, sobretudo do povo Kuy. Dessa forma, a área florestal de Prey Lang é a maior área continua de terra indígena que ainda resta no Camboja.67 2 Nas Filipinas, nos arredores da cidade de Butuan, uma empresa japonesa -a EJ Business Partners Co., Ltd.- está desenvolvendo um projeto de plantação de árvores para gerar energia em uma usina de eletricidade de 10MW. Pretende começar as operações em 2017.68 3. A Indonésia conta com vários projetos de plantação de madeira, somando, assim, mais e mais território ocupado por plantações voltadas para a produção de energia. Em 2009, através de um acordo de entendimento entre o Serviço Florestal da Coréia e o Ministério de Florestas da Indonésia, a Coréia do Sul obteve uma concessão por 99 anos sobre uma área de 200.000 hectares na região central de Kalimantan, para estabelecer plantações visando a produção de granulados.69 Da área total, 180.000 hectares seriam plantados pelo setor privado. Segundo informação de parceiros locais do WRM, a terra foi alocada à empresa Korindo, que plantou monoculturas de árvores em Kotawaringin Barat e Lamandau, na região central de Kalimantan, para alimentar sua fábrica de celulose em Kerawang (oeste de Java). Não há mais informações disponíveis sobre este projeto. Em 2011, foi anunciado que duas empresas da Coréia do Sul planejavam “desenvolver indústrias de granulados de madeira no Oeste de Sulawesi, em uma aposta na produção de energia de biomassa, uma vez que o pais está começando a mudar gradativamente a geração de energia baseada no carvão mineral”. De acordo com as informações disponíveis,70 o Ministério de Florestas deu concessões a duas empresas sul-coreanas, PT Bara Indoco e PT Bio Energy Indoco, para abrir uma área de 200.000 hectares a uma plantação industrial florestal no oeste de Sulawesi, com vistas a abastecer as indústrias de granulados planejadas. Uma outra empresa sul-coreana, a PT Solar Park Energy, também fez investimentos parecidos em Wonosobo, na região central de Java, em parceria com a estatal Perhutani, desenvolvendo uma fábrica de granulados de madeira com capacidade para 200.000 toneladas por ano. No mesmo país, mas na região de Papua Ocidental, estão sendo desenvolvidos dois projetos de plantação de madeira para energia. Um deles é da empresa britânica Carbon Positive, que está estabelecendo 160.000 hectares de plantações, e o outro é levado a cabo pela indonésia Medco, sendo um investimento da empresa Coreana LG International, e pretende estabelecer nada mais, nada menos, do que 1 milhão de hectares de plantações para a produção de cavacos e granulados de madeira.71 67 http://unsr.jamesanaya.org/cases-2010/08-cambodia-cambodia-land-laws-and-policies-and-the-situation-concerning-development-in-and-around-the-prey-lang-forest 68 Biomass power generation by Japonese companies in Asia (http://www.asiabiomass.jp/english/topics/1209_02.html) 69 Indonesia, South Korea Collaborates on Wood Biomass Energy (2009) (http://www.biofuelshub.com/component/content/ article/1-news/987-indonesia-south-korea-collaborates-on-wood-biomass-energy) 70 South Korean firms develop wood pellet industry in Indonesia, http://perumperhutani.com/en/2011/07/south-korean-firmsdevelop-wood-pellet-industry-in-indonesia/ 71 Overbeek et al, 2012 30 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
América del Sur Com relação à América do Sul, o Brasil vai se posicionando como um dos principais países que oferecerão madeira para a produção de energia no Norte. Desde a década de 1970, o país já tem mais de 1 milhão de hectares de plantações de eucalipto usadas para gerar energia, concentrados no estado de Minas Gerais. Depois de cortado, o eucalipto se transforma em carvão vegetal para alimentar cerca de 200 siderúrgicas que produzem principalmente ferro-gusa, tendo a indústria automobilística como principal cliente. A história desse tipo de plantação nos últimos 30 a 40 anos está marcada por graves impactos, por exemplo, a expulsão de centenas de comunidades tradicionais da região do cerrado (geraizeiros), a destruição da vegetação nativa (cerrado) e trabalho escravo na produção de carvão vegetal. Hoje em dia, está ocorrendo uma expansão das plantações de árvores no Brasil, objetivando especificamente a produção de energia com vistas a atender à demanda recente, inclusive na Europa.72 Desde 2005, começaram a ser realizados experimentos com eucaliptos plantados em maior densidade para comprovar o rendimento em termos de biomassa por hectare. Em 2007, no estado de São Paulo, estabeleceu-se um projeto-piloto de plantações de maior densidade para abastecer com energia uma usina de álcool. Em 2009, no estado do Tocantins, a empresa GMR Florestal estabeleceu sua primeira área-piloto com eucaliptos clonados para produzir 33MW de eletricidade; hoje, a mesma empresa tem planos de ampliar para 350.000 hectares suas plantações na região. No mesmo ano, mas no Estado de São Paulo, o Grupo Bertin também desenvolveu experiências-piloto com plantações de eucaliptos clonados para biomassa. Técnicos de Uruguai, Chile, México, Nicarágua e Guatemala já visitaram a região, o que demonstra um claro interesse de parte da indústria florestal desses países em desenvolver esses cultivos. Uma das últimas novidades é o projeto da Suzano Papel e Celulose73 de realizar grandes plantações de eucaliptos para produzir biomassa de madeira no nordeste do Brasil. A Suzano é uma empresa privada que funciona há 85 anos. É a segunda maior produtora de pasta de madeira do mundo, com cinco fábricas de celulose no Brasil, localizadas nos estados de São Paulo e Bahia, tendo produzido 2,7 milhões de toneladas de celulose e papel em 2008. Hoje em dia, controla 722.000 hectares de terra, dos quais 324.000 são plantações de eucalipto nos estados de São Paulo, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Tocantins e Maranhão. A Suzano tem planos ainda mais ambiciosos: investir em um novo tipo de plantações: as plantações para biomassa. Para isso, em meados de 2010, o Grupo Suzano criou uma nova empresa chamada Suzano Energia Renovável. O investimento proposto é de 1,3 bilhão de dólares e inclui cinco unidades de produção de pellets de madeira, com capacidade de produção total anual de 5 milhões de toneladas desse combustível de biomassa. A primeira etapa consiste em adquirir terras e construir três unidades de produção de pellets, de um milhão de toneladas cada uma, as quais começariam a funcionar em 2013. A Suzano espera conseguir uma receita líquida de 500 milhões de dólares em 2014 e já garantiu contratos de venda de 2,7 milhões de toneladas. Em agosto de 2010, a Suzano e a empresa britânica MGT Power Ltd assinaram uma carta de intenções nesse sentido.
72 Com base em informaçções da Rede Brasilera de Biomasa para Energia. 73 Overbeek, 2011 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Em 2009, foram realizadas plantações experimentais de eucaliptos e acácia no Piauí e no Maranhão. O diretor da empresa, André Dorf, declarou em 2010: “as terras já foram prospectadas e o processo de aquisição deve acontecer já neste ano,”, e afirmou também que o Nordeste “(...) tem nossa preferência por causa da proximidade de portos importantes que facilita o fluxo da produção, já que nosso objetivo é fornecer o continente europeu”. Segundo recentes notícias locais, a Suzano teria escolhido a região do Baixo Parnaíba, no Maranhão, para fazer as plantações e instalar as unidades de produção de pellets.74 As plantações para biomassa são muito diferentes de plantações para a produção de celulose. O ciclo de rotação é de dois ou três anos, em lugar dos sete anos habituais, e a densidade da plantação é maior. Ao contrário das plantações para a produção de papel, que requerem um máximo de celulose e um mínimo de lignina (o “adesivo” da árvore), as plantações para fins energéticos requerem um máximo de lignina. Segundo o diretor André Dorf, são necessários cerca de 30.000 hectares para produzir um milhão de toneladas de pellets de madeira. Considerando-se que pretende produzir 5 milhões de pellets por ano, a Suzano necessitará de um total de 150.000 hectares de terra. A aquisição de terras com vistas à plantação de eucaliptos para celulose já está provocando problemas no Nordeste do Brasil. Nessa região, por exemplo, as comunidades quilombolas seguem lutando para ter reconhecidos seus direitos sobre seus territórios tradicionais. Inaldo Serejo, coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Maranhão, afirma em uma entrevista que “há um avanço no Maranhão, por exemplo, de empresas como a Suzano Papel e Celulose que está comprando áreas imensas de terra, áreas ocupadas por comunidades tradicionais para plantar eucalipto.” Por conseguinte, pode-se supor que os problemas aumentarão com a expansão das novas plantações para biomassa. Uruguai e Argentina, onde também já se fizeram sentir os impactos das plantações florestais industriais, posicionam-se igualmente como possíveis fornecedores de madeira para energia, o que supõe ainda mais expansão em ambos os países.75 Na Guiana, a Clenergen, uma empresa registrada nos Estados Unidos, que pretende ser a principal produtora e distribuidora mundial de matéria-prima de biomassa para uso na produção de eletricidade, arrenda 2.000 hectares de terras para plantações de madeira para energia, a ser exportada aos Estados Unidos e ao Reino Unido (com a opção de arrendar outros 58.000 hectares). Além disso, ela também tem projetos em Madagascar, Tanzânia e Moçambique, para exportar cavacos para África do Sul e Índia, e outros, nas Filipinas e em Gana.76
74 Overbeek et al, 2012 75 Corrientes busca atraer inversores forestales de Suecia y Finlandia (2012) (http://www.misionesonline.net/ noticias/28/10/2012/corrientes-busca-atraer-inversores-forestales-de-suecia-y-finlandia). 76 Clenergen (http://www.clenergen.com/clenergen-corporation) 32 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
África Na África, também há várias empresas que, há alguns anos, vêm investindo em plantações de madeira destinadas à produção de energia. A Green Resources é uma empresa privada Norueguesa que desde 1995 começou a operar em Moçambique, Tanzânia, Uganda e Sudão do Sul. Segundo sua página na internet, seu negócio77 se concentra no estabelecimento de plantações florestais para sumidouros de carbono, elaboração de produtos de madeira e energia renovável. No total, tem 300.000 hectares de terra sob seu domínio nos países em que opera, dos quais plantou em 22.000 e aspira chegar aos 100.000 hectares para abastecer tanto a demanda regional de produtos de madeira quanto a global. Sua estratégia se baseia em produzir madeira para os usos tradicionais e também para o novo setor em crescimento: a bioenergia.78 Em Moçambique e na Tanzânia, pretende estabelecer duas plantações em grande escala. Em Moçambique, as plantações de árvores para madeira já geraram numerosos conflitos nas zonas onde se expandem. Em concreto, a província de Niassa é uma das zonas com mais expansão e maiores conflitos, e onde a Green Resources opera através da Fundação Malonda, da qual faz parte. Desde 2005, empresas que promovem os monocultivos de pínus e eucaliptos em grande escala começaram a se instalar em Niassa. O interesse dessas empresas se deve ao fato de que essa é a maior província de Moçambique, dispondo de terras planas e férteis e com uma população relativamente pequena, de um milhão de pessoas. Mas, mesmo que a população de Niassa seja relativamente pequena, nada menos que 70 a 80% dela vivem no campo. Desde 2007, quando as empresas começaram a plantar árvores, a União Nacional de Camponeses (UNAC), principal organização camponesa de Moçambique, advertiu e questionou o fato de que as empresas estão plantando eucaliptos em terras que pertencem a comunidades camponesas, reduzindo o acesso dessas famílias a terras para plantar. Segundo a UNAC, isso coloca em risco a segurança e a soberania alimentar das famílias e da região.79 Na Tanzânia, a Green Resources tem três áreas com plantações de árvores na região das montanhas do sul. No total, a empresa recebeu mais de 100.000 hectares em concessões de terras que se encontram em distintas etapas de aquisição, incluindo 34.000 hectares já titulados. Já houve conflitos com as comunidades locais, tal como documenta um relatório produzido pela Timberwatch em fevereiro de 2011:80 “[T]erra sendo perdida por comunidades desalojadas, más condições de trabalho, destruição da biodiversidade da qual as comunidades dependem para obter alimento, combustíveis e medicamentos, disponibilidade de água reduzida, bem como muitos outros efeitos diretos e indiretos que têm impactos negativos sobre os meios de subsistência das comunidades afetadas.”
77 Green Resources (http://www.greenresources.no/Home.aspx) 78 Boletín de prensa, Evaluaciones y auditorías de las plantaciones extensivas de Green Resources (2012) (www.greenresources.no/Portals/0/Green%20Resources%20assessments%20and%20audits%20October%202012.pdf) 79 Overbeek, Winfridus, 2010. The expansion of Tree Monocultures:Impacts on local communities in the Province of Niassa. World Rainforest Movement. (http://wrm.org.uy/countries/Mozambique/book.pdf) 80 Karumbidza y Menne , 2011 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Blessing Karumbidza, coautor do relatório da TimberWatch, descreve o projeto da Green Resources como “concentração de terras, uma forma de neocolonialismo apoiada pelas autoridades norueguesas.” Ele disse à publicação noticiosa norueguesa BT que “esta área tem sido de pastagens desde que os moradores conseguem se lembrar. Agora, temos uma plantação que não é floresta, e sim uma monocultura sem biodiversidade.” Tonje Refseth, do Departamento Internacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Noragric), escreveu sua tese de mestrado sobre as plantações da Green Resources na Tanzânia. Ela descobriu que algumas aldeias nas áreas da Green Resources perderam mais de 33% de sua terra - o limite segundo a Lei de Terras das Aldeias, de 1999. Uma delas, chamada Uchindile, perdeu 60% de sua terra para a Green Resources. Os moradores das aldeias, na prática, perderam a terra. A empresa adquiriu arrendamentos de terras renováveis por 99 anos. Em troca, os aldeões recebem emprego e projetos na comunidade (como escolas). Mas os trabalhadores contaram a Refseth que os salários não são adequados. Ela descobriu que a maioria está recebendo menos do que o salário mínimo estabelecido pelo governo.81 Mais ao centro do continente africano, na República do Congo, uma fábrica para produção de cavacos de madeira para energia está instalada desde 2005. Entre 1991 e 2001, a Shell Renewables -uma divisão da Shell Oil International- estabeleceu no país uma plantação de eucaliptos clonados de rápido crescimento, com o objetivo de criar uma fonte de biomassa de alta produtividade para futura geração de energia.82 Posteriormente, a Shell vendeu suas plantações. A MagForestry -a divisão florestal da MagIndustries, uma empresa canadense dedicada a projetos industriais e energéticos na África Central (mais especialmente, na República do Congo e na República Democrática do Congo)- assumiu o controle da antiga plantação de eucaliptos de 68.000 hectares da Shell mediante a aquisição do total de ações da Eucalyptus Fibre Congo S. A. (EFC), a empresa arrendatária da plantação industrial.83 Outras divisões da Magindustries exploram uma mina de potassa (Magmining) e estão construindo uma fábrica de potassa (Magminerals) na mesma área da concessão florestal. O governo outorgou a concessão à Magforestry até 2075. Atualmente, 70% da superfície estão cultivados com clones de eucalipto de rápido crescimento. A empresa começou a reflorestar os 20.000 hectares que estavam ainda sem cultivar. Em 2006, a empresa iniciou a construção de uma usina de cavacos de madeira na cidade portuária de Pointe-Noire. A biomassa é vendida ao mercado europeu e norte-africano e exportada a partir do porto pelo Oceano Atlântico. Com um investimento de 36,7 milhões de dólares, a fábrica entrou em funcionamento no ano de 2008 e tem capacidade de 500.000 toneladas por ano.
81 Green Resources’ carbon plantations in Tanzania. Curse or cure? (http://www.redd-monitor.org/2012/05/02/green-resourcescarbon-plantations-in-tanzania-curse-or-cure/) 82 WRM, 2001. Congo, R.: Shell’s eucalyptus plantations now provide even fewer jobs. Boletim 46 (www.wrm.org.uy/ bulletin/46/Congo.html). 83 WRM, 2007. Congo, Republic: Thousands of hectares of land for eucalyptus, oil palm and mining. Boletim 120 (http://www. wrm.org.uy/boletin/120/Congo.html) 34 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Segundo a empresa, pretendem-se produzir anualmente uns 25 metros cúbicos de biomassa por hectare a cada ano. Com um ciclo de rotação de sete anos, esperam-se coletar 175 m3/ ha de biomassa em sete anos. Pretendem-se aumentar as 500.000 toneladas de madeira por ano que são produzidas atualmente, até chegar a 1,5 milhão de toneladas em 2018. No entanto, de momento se frustraram os planos. Desde 2011, a concessão florestal vem sendo invadida e cortada. Sobre os autores e seus motivos, há diferentes versões. Um artigo sobre uma visita por parte das autoridades políticas à planície de Hinda e à zona de Nanga, em agosto de 2011, fala da “devastação da massa florestal por parte das populações”. Naquele momento, já se haviam cortado 7.750 hectares da plantação, com um prejuízo econômico de 22 bilhões de FCFA (cerca de 42 milhões dólares).84 Os cortes também continuaram em 2012, quando outra reportagem de imprensa indica que “a maior parte desse negócio está sendo repartida por muitos proprietários de terras com apoio de redes que envolvem militares, policiais, juízes e altos funcionários”. De sua parte, o sindicato dos empregados da EFC indica que a destruição do reflorestamento põe em perigo os 390 postos de trabalho na empresa.85 Na África Ocidental, tanto na Libéria como em Gana, já há projetos com biomassa de madeira. Na Libéria, opera a Buchanam Renewables Fuel (BR). A BR é uma empresa pertencente a uma firma de investimentos com sede na Suíça, chamada “Pamoja Capital”. A BR produz cavacos de madeira de seringueira e os exporta à Europa. A companhia se comprometeu a desenvolver uma empresa de energia para abastecer a Libéria antes de exportar os cavacos, mas, até agora, os planos não se concretizaram. Depois de anos de ditadura e duas guerras civis, a Libéria é um dos países mais pobres do mundo, e tem aproximadamente 260.000 hectares de plantações industriais de seringueira (Hevea brasiliensis). A multinacional nipo-estadounidense de pneus, Bridgestone-Firestone, maneja ali a maior plantação de seringueiras do mundo. ONGs locais, como a SAMFU,86 e relatórios da ONU87 indicam condições de trabalho e sociais catastróficas nas plantações, especialmente nas da Bridgestone-Firestone. Há denúncias, entre outras, de abusos de trabalho infantil, violência e descumprimento geral da lei. Inicialmente, a BR produzia cavacos a partir dos cortes que se realizavam nas propriedades dos camponeses. Muitos tinham plantado seringueiras em áreas lindeiras para delimitar suas propriedades - prática comum em um país onde ainda não se reconhecem integralmente os direitos territoriais das comunidades rurais.
84 Foresterie : le massif ´d´eucalyptus fibre congo´ menacé de disparition para des abattages sauvages (2011) (http://nerrati. net/infopage-congo/index.php?option=com_content&view=article&id=728&catid=2&Itemid=36) 85 EFC déplore la destruction de son massif d’eucalyptus à Pointe-Noire (2012) (http://www.mtm-news.com/article/4400/ efc-deplore-destruction-son-massif-d-eucalyptus-pointe-noire); y Les syndicats de la société Eucalyptus fibre du Congo s’insurgent (http://www.dailymotion.com/video/xohsyk_les-syndicats-de-la-societe-eucalyptus-fibre-du-congo-s-insurgentcontre-l-abattage-sauvage-d-eucaly_news) 86 SAMFU, 2008 87 Misión de la ONY en Liberia, 2006. Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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O corte de árvores por parte da empresa provocou vários problemas e descontentamento na população. O negócio se baseava principalmente em acordos verbais pouco claros, arbitrariedades em relação a espécies e volumes de madeira colhidos, estragos nos cultivos limítrofes, falta de pagamentos. A seguir, a Buchanam Renewables começou o corte mecanizado nas plantações industriais de seringueira da Bridgestone-Firestone, próximo a Kakata. Na Libéria, o fornecimento de energia dos habitantes se baseia em lenha e carvão vegetal. De acordo com o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, PNUD, 99,5% dos habitantes cozinham com lenha, da qual as selvas tropicais, os mangues e as seringueiras velhas são a principal fonte. O abastecimento se baseia principalmente em milhares de coletores informais e pequenos comerciantes. O Ministério de Energia escreveu, em 2007, no Plano de Ação de Energias Renováveis, que “a escassez de lenha se converte em um sério problema na maior parte da Libéria, principalmente no condado de Montserrado, próximo à capital, Monróvia”.88 No entanto, desde 2009, a Buchanam Renewables exporta os cavacos de madeira de seringueira para a Europa para gerar eletricidade, enquanto o povo liberiano continua sem eletricidade e com dificuldades de gerar energia. Em Gana,89 a empresa estadunidense Clenergem -a mesma que opera na Guiana- recebeu, declaradamente, uma concessão de 5.000 hectares de terra por um prazo de 49 anos, através de um acordo com o chefe tradicional da área de Bole. Ali, seriam estabelecidas plantações de bambu a serem transformadas em cavacos e utilizadas como insumo na produção de energia. No entanto, a página da Clenergen na internet não dá nenhuma indicação sobre se eles até hoje já plantaram algum bambu.90 Também em Gana, um acordo foi noticiado entre o Grupo de utilidade dinamarquês Verdo e a Africa Renewables Ltd. (Afriren), com sede no Reino Unido, para produção de 826.700 toneladas de cavacos em 5 anos, a partir de seringueiras.91 3.3 Os impactos das plantações energéticas para biomassa Atualmente, no Sul global, existem aproximadamente 60 milhões de hectares de terra ocupados por plantações industriais de árvores.92 Não há um só país no Sul Global onde se tenham estabelecido essas plantações no qual não tenha havido conflitos de terra. As plantações de árvores resultam na expulsão das comunidades locais de seus territórios -muitas vezes de forma violenta- e/ou na ocupação parcial ou total das terras que as comunidades tradicionais usam para sua subsistência.93
88 Ministry of Lands, Mines and Energy, 2007. Renewable Energy and Energy Efficiency Policy and Action Plan. (http://www. molme.gov.lr/doc/Microsoft%20Word%20-%20RE%20_%20EE_Policy_Liberia.pdf) 89 IIED, 2011 90 http://www.clenergen.com/ghana/projects/republic-of-ghana 91 http://biomassmagazine.com/articles/5890/rubber-tree-chips-to-fuel-danish-power-plant 92 Overbeek et al, 2012 93 Overbeek et al, 2012 36 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
A perda do território e a posterior ocupação com plantações de árvores em grande escala trazem consigo um sem-número de impactos que resultam em efeitos negativos sobre as vidas e os meios de subsistência das comunidades locais. A substituição dos ecossistemas locais acarreta a perda de biodiversidade, a falta de terras para a agricultura, problemas com abastecimento de água, contaminação dos recursos hídricos, destruição das zonas sagradas, perda de conhecimentos tradicionais. Mesmo quando os promotores das plantações de árvores argumentam que elas se estabelecem sobre “terras degradadas”, ocorre que essas terras são precisamente as áreas onde as comunidades realizam agricultura ou são terras em descanso depois de períodos onde se praticou a agricultura. Inclusive aquelas zonas de florestas que foram degradadas pela extração industrial de madeira são áreas que as comunidades muitas vezes recuperaram e nas quais a floresta secundária reabilitada lhes oferece vários benefícios (medicamentos, proteínas, frutas, zonas de retiro espiritual, etc). Ao mesmo tempo, as promessas de geração de emprego e de melhoramento das condições de vida das comunidades locais raramente se concretizam, e sim o contrário, além dos impactos mencionados no processo atualmente denominado de “concentração de terras”, que ameaça o uso e o controle do território por parte de populações locais na América do Sul, na África e na Ásia. De fato, um relatório do Parlamento Europeu de 2012 declara: “Os países em desenvolvimento que mais provavelmente exportarão biomassa de madeira para alimentar a demanda da Europa são os das regiões oeste e central da África, bem como da América Latina. Embora as relações claras entre o aumento da demanda na Europa por madeira para geração de energia e impactos nos países em desenvolvimento, sejam eles negativos ou positivos, precisem ser estabelecidas em nível de cada projeto, a demanda adicional por biomassa em nível global terá efeitos em nível macro. A crescente demanda por energia de biomassa de madeira tende a aumentar o preço global de madeira e, assim, a pressão sobre florestas e outros ecossistemas, pressionando por mais conflitos relacionados ao uso da terra. Entre os riscos mais específicos estão o desmatamento que ocorre quando florestas nativas são substituídas por plantações de monoculturas e os impactos de longo prazo sobre a segurança alimentar e energética local.”94 No Brasil, a implementação das plantações específicas para produzir os pellets e cavacos de madeira, com ciclos de rotação de 2 a 3 anos e plantadas de forma mais densa, ainda está em sua fase inicial, por isso é difícil avaliar os impactos diferenciados desse tipo de plantação comparados com as plantações, digamos, “convencionais” de eucalipto, cujos ciclos são de 6 a 7 anos. Não obstante, é de se supor que os ciclos mais curtos aumentarão a pressão sobre os nutrientes do solo e os recursos hídricos disponíveis, ainda mais do que no caso dos ciclos de 6 a 7 anos. Além disso, com rotações mais curtas (2 a 3 anos), é provável que se intensifique o uso de agrotóxicos -e, portanto, os problemas que seu uso gera- para evitar a competição de outros vegetais e permitir o melhor crescimento das árvores.
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Impact of EU Bionenergy Policy on Developing Countries http://www.ecologic.eu/files/attachments/ Publications/2012/2610_21_bioenergy_lot_21.pdf Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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O uso de árvores geneticamente modificadas Outro aspecto que preocupa nesse novo tipo de plantação é o uso de árvores geneticamente modificadas. Recentemente, a empresa FuturaGene anunciou que já fez modificações genéticas no eucalipto, para que se desenvolva 40% mais rapidamente e para que cresça 5 metros por ano, com 20-30% a mais de biomassa do que o normal. Segundo o diretorexecutivo da empresa, Stanley Hirsch, só falta a autorização de parte dos governos, bem como o respaldo de grupos de preservação e dos organismos de certificação, para liberar comercialmente esta espécie de laboratório. A FuturaGene fez plantações experimentais no Brasil, na China e em Israel, e atualmente se encontra nas etapas finais para a obtenção da autorização para plantação comercial no Brasil.95 A modificação genética também está sendo desenvolvida, por exemplo, para gerar resistência ao agrotóxico mais aplicado no monocultivo de eucalipto: o glifosato. Não surpreende que tenha sido exatamente a Suzano a comprar, em 2010, a FuturaGene. 3.4 A certificação de plantações de árvores para bioenergia A Biofuelwatch publicou recentemente um relatório97 em que realizou uma avaliação dos padrões e critérios dos selos de certificação oficiais e voluntários, existentes e propostos, em relação à biomassa industrial de madeira, para bioenergia. A organização observa que se pretendem utilizar selos de certificação existentes, como o FSC, e que também estão sendo desenvolvidos novos esquemas de certificação e padrões obrigatórios como têm sido anunciados no Reino Unido e discutidos na UE. O Conselho de Manejo Florestal (FSC, na sigla em inglês), criado em 1993, é considerado por ONGs ambientalistas conhecidas, como WWF e Greenpeace, como o sistema mais “confiável” de certificação de plantações de monocultivos de árvores. Seria um sistema transparente, com participação da sociedade civil. No entanto, o FSC tem sido duramente criticado por comunidades locais e por ONGs como o WRM, por haver certificado cerca de oito milhões de hectares de plantações de monocultivos de árvores, nenhuma das quais pode ser considerada “sustentável”, seja qual for o critério aplicado. Ainda que a certificação possa “mitigar” certos efeitos negativos de algumas plantações, sua função fundamental tem sido a de “autorizar” a expansão indefinida das plantações em detrimento das comunidades locais. Isso levou a um descrédito forte do FSC, e várias ONGs do Norte relevantes na luta pela defesa das florestas e dos direitos de suas populações, como RobinWood e, em grande medida por este motivo também, a FERN, abandonaram o Conselho.98 Quem se beneficia diretamente com a certificação são empresas de consultoria, como SGS, SCS e Imaflora. As empresas de certificação também se acostumam a usar outros esquemas de certificação com padrões ainda mais amigáveis para as indústrias do que o FSC, como o PEFC (Program for the Endorsement of Forest Certification). 95 Com base em informações publicadas pelo jornal The Guardian, matéria escrita por John Vidal, disponível em http://www. climatecentral.org/news/firm-claims-gm-trees-a-fuel-industry-game-changer-15251 96 Muito usado e propagado pelas multinacionais que o promovem como produto que não causa nenhum impacto grave; mas, cada vez mais se divulgam estudos que demonstram seus graves impactos sobre o meio ambiente e a saúde humana. E, com o uso de árvores transgênicas, tendem a aumentar as aplicações, apesar da propaganda da indústria, de que diminuiríam. Por exempo, pouco depois de o Brasil introduzir a soja resistente ao glifosato, o uso da Roundup Ready da Monsanto aumentou ainda mas. (Overbeek et al, 2012). 97 Ernsting, 2012 98 Overbeek et al, 2012 38 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Certificadores como SGS já estão entrando no novo mercado de certificação de plantações de biomassa para bioenergia, afirmando: “Somos pioneiros no desenvolvimento de sistemas de verificação e certificação que reconhecem a sustentabilidade da biomassa ...Nossos serviços de verificação e certificação de biomassa possibilitam que você aproveite mercados internacionais que reconheçam seu combustível como sustentável...”99 A partir de outubro de 2013, os critérios serão obrigatórios no Reino Unido para a produção de agrocombustíveis e também para biomassa de madeira, criando assim, mais um incentivo à “indústria de certificação”. De acordo com a Biofuelwatch, os critérios de sustentabilidade, anunciados pelo Reino Unido para a biomassa de madeira e discutidos como critérios em potencial para toda a UE, carecem de credibilidade, sobretudo porque se baseiam por inteiro em relatórios feitos pelas próprias empresas de energia, com a única “verificação” obrigatória conduzida por consultores que elas mesmas escolhem. FSC, PEFC e outras formas de certificação florestal voluntária serão aceitos no Reino Unido como evidência mas não serão obrigatórios. Os critérios de sustentabilidade da UE para agrocombustíveis, introduzidos junto à meta de uso de 10% de agrocombustíveis no setor de transporte, também carecem de qualquer verificação independente e verossímil e estão relacionados fundamentalmente a critérios falhos em relação ao uso e à conversão de terras e questões relacionadas ao efeito estufa. Não se levam em conta os impactos indiretos sobre a conversão de terras e tampouco critérios sociais ou de direitos humanos. Por esse motivo, por exemplo, considera-se que o óleo de dendê proveniente da região do Baixo Aguán, em Honduras, cumprirá os critérios de sustentabilidade da UE, apesar da continuada matança de dezenas de líderes camponeses nos conflitos de terra que envolvem esses camponeses e proprietários de fazendas de dendê.100 Existem também várias iniciativas “voluntárias” de certificações elaboradas pelas próprias empresas. Por exemplo, a britânica Drax, maior produtora de eletricidade a partir de biomassa no Reino Unido, contratou a empresa TerraVeritas para elaborar princípios de sustentabilidade. Esses princípios seriam transformados em um formulário a ser preenchido pelos provedores. A seguir, a TerraVeritas analisará os resultados, mas não está prevista qualquer visita de campo para ver in situ a plantação de árvores ou a floresta de onde vem a biomassa. A empresa Drax afirma que “espera estimular a liderança ambiental ...[e] participar com iniciativas de políticas e regulamentações aplicáveis, para compartilhar experiências” Consequentemente, a Biofuelwatch conclui que “os padrões de biomassa, portanto, não são um meio confiável de abordar os graves impactos negativos da bioenergia”.101
99 SGS Biomass Certification (http://www.sgs.com/en/Sustainability/Environment/Energy-Services/Biomass-Certification.aspx) 100 Palm oil in the Aguan Valley, Honduras: CDM, biodiesel and murders (http://www.biofuelwatch.org.uk/2011/palm-oil-in-theaguan-valley-honduras-cdm-biodiesel-and-murders/) 101 Ernsting, 2012 Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Capítulo 4
Bioenergia: uma solução real para a crise energética e climática? 4.1 Os agrocombustíveis ajudam a resolver a crise energética? Usando fontes locais de biomassa para produzir bioenergia em pequena escala voltada ao consumo local, poder-se-ia implementar esta forma de gerar energia sem prejuízo para a natureza e funcionar como um recurso local, sustentável e ecológico, apesar de que, no Norte global, isso demandaria reduções grandes na demanda existente por produtos de madeira, especialmente para papel. Mas dificilmente a bioenergia conseguirá substituir uma parte importante do consumo excessivo e em grande escala de combustíveis fósseis dos países do Norte global ou abastecer os grandes mercados globalizados. Um primeiro problema é que se necessitará de uma quantidade imensa de terra, se for para usar biomassa vegetal como substituto de combustíveis fósseis. O que o carvão, o petróleo e o gás fornecem atualmente em termos de energia é o equivalente à fitomassa de mais de 1,25 bilhão de hectares, com o detalhe de que os combustíveis fósseis ocupam hoje uma superfície de apenas três milhões de hectares (onde ocorre a extração, o processamento e o transporte desses combustíveis, e mais a geração e a transmissão de eletricidade de origem térmica).102 Hartmut Michel, diretor do Instituto Max Planck na Alemanha e Prêmio Nobel por suas pesquisas sobre a fotossíntese das plantas, explica a razão principal: a eficiência energética das plantas, comparada com a dos combustíveis fósseis, principalmente o petróleo, é muito baixa para converter a energia da radiação solar em biomassa.103 Apenas cerca de 0,5% da energia solar104 são recolhidos pelas plantas ao formar a biomassa.105 E para cultivar, colher e processar a biomassa é necessária muita energia fóssil, que ainda deve ser descontada dessa porcentagem. Podemos determinar, mediante um cálculo aproximado, que a geração de 1 MW de eletricidade por ano requer pelo menos 13.000 toneladas de madeira verde ou recém-cortada. Uma instalação de 50 Megawatts queimará, segundo esta estimativa, cerca de 650.000 toneladas de madeira por ano (50 x 13.000). Considerando, por exemplo, o Brasil, de maior produtividade de madeira por hectare no mundo com as plantações de eucalipto (44m3/ha/ ano), serão necessários 14.700 hectares, enquanto, por exemplo, na Suécia, com uma produtividade de madeira de 6 m3/ha/ano, seriam necessários 108.300 hectares.106 Considerandose o consumo total de eletricidade, por exemplo, do Reino Unido, de 2010, 1636 TWh,107 para abastecer essa demanda com pellets de plantações de madeira são necessários, no caso das plantações mais “produtivas” (do Brasil), em torno de 55 milhões de hectares de monocultivo de eucalipto. 102 Smil, 2010 in Overbeek et al, 2012 103 Michel, Hartmut, 2012 104 Para comparar: un panel solar moderno convierte la energía solar con una eficiencia de un 15%. 105 A energia solar total que chega por ano à superficie terrestre com vegetação (100 x 1012 m2) e que é absorvida está em torno de 0,5 x 1024 J (cerca de 170 W m-2; potência média durante 365 dias, 24 horas por dia, inclusive com nuvens). Desta energia, apenas cerca de 0,5% (2,2 x 1021 J) é coletado em escala global pelas plantas ao formar a biomassa (60 x 109 t C yr-1). 106 Overbeek et al, 2012 107 Análise do setor de energías renováveis do Reino Unido (http://www.al-invest4.eu/minisite/renováveis_port/uk/uk4.1.html). 40 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
Em seu estudo “Bioenergia: oportunidades e limites”,108 mais de vinte respeitados cientistas investigaram durante quase dois anos o potencial das bioenergias para a Alemanha. Eles chegam a conclusões devastadoras e a uma mensagem clara: “a bioenergia não pode proporcionar, nem hoje, nem no futuro, uma fonte sustentável de energia para a Alemanha”. Os cientistas fizeram um chamamento ao governo alemão e à União Europeia, em julho 2012, para que corrijam sua política. Para justificar sua conclusão, argumentam que a bioenergia implica enorme consumo de terras, aumento de emissões de gases do efeito estufa, esgotamento de nutrientes dos solos e águas, e ainda compete com a produção de alimentos. Mais do que isso, expõe a forma como a Alemanha -país pioneiro em iniciativas ambientais- se maquia de verde à custa dos outros, pois são importadas cada vez mais matérias-primas necessárias para seu consumo. O biodiesel de soja da Argentina e o etanol de cana-de-açúcar do Brasil, e, cada vez mais, pellets de madeira de América do Norte. 4.2 Os agrocombustíveis e a biomassa de madeira ajudam a frear a mudança climática? As árvores fixam o dióxido de carbono (CO2) da atmosfera durante seu crescimento e o convertem em biomassa. Para promover a bioenergia, por exemplo, a UE argumenta que, ao queimar biomassa, libera-se a mesma quantidade de CO2 que as árvores fixaram -ou seja, o processo é “neutro em carbono”- ou que, pelo menos, liberam-se menos emissões de carbono. Esta premissa é falsa e está baseada em cálculos parciais e incompletos.109 Todo o ciclo de produção de bioenergia requer grandes quantidades de recursos como água, fertilizantes e pesticidas, estes últimos para combater as pragas do monocultivo. Igualmente, há um uso intensivo de energia fóssil para a colheita, o transporte, o armazenamento e os processos industriais de conversão da biomassa em cavacos, pellets, biocombustível ou biogás. Para determinar o verdadeiro impacto dos agrocombustíveis sobre o clima, é preciso calcular o uso de todos esses recursos e as emissões desses processos, juntamente com seus impactos diretos e, acima de tudo, indiretos, principalmente a mudança no uso da terra. Uma vez feita a soma, os supostos benefícios para o clima desaparecem. As plantações para agrocombustíveis se estendem sobre zonas de floresta e outros ecossistemas, como as pastagens, que durante milhares de anos têm armazenado carbono. Ao destruir esses ecossistemas, são liberadas enormes quantidades de dióxido de carbono na atmosfera. Por isso, a economia de CO2 é mínima e, frequentemente, negativa. Por exemplo, os estudos dos especialistas encarregados pela UE concluem que os agrocombustíveis estão longe de ser neutros em termos de carbono. Pode-se chegar a liberar até mais CO2 do que com a queima das energias fósseis; por exemplo, usar dendê como agrocombustível provoca 25% mais emissões de carbono (CO2) do que usar o diesel fóssil.110 Para produzir 1 MWh através da queima de biomassa de madeira, são emitidos cerca de 50% mais de CO2, comparado com carvão mineral.111 108 Academia Nacional de Ciências Leopoldina da Alemanha, 2012: Leopoldina issues a critical statement on the use of bioenergy(http://www.leopoldina.org/en/press/news/leopoldina-critical-towards-use-of-bioenergy/) 109 Biomass burning is not “carbon neutral” (http://www.saveamericasforests.org/Forests%20-%20Incinerators%20-%20Biomass/Documents/Carbon%20Emissions%20-%20Pollution/Carbon%20Neutrality%20Myth.pdf). 110 Euractive, 2012: Biodiesels pollute more than crude oil, leaked data show (http://www.euractiv.com/climate-environment/ biodiesels-pollute-crude-oil-lea-news-510437) 111 http://www.rspb.org.uk/Images/biomass_report_tcm9-326672.pdf Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Levando-se em conta todos os aspectos do processo de produção, comercialização e uso de agrocombustíveis, fica claro que dificilmente se reduzem as emissões à atmosfera. 4.3 Considerações finais O presente relatório demonstra que as energias renováveis a base de bioenergia nada têm de “renováveis”. O crescimento de monocultivos de árvores para energia no Sul tende a aumentar as injustiças social, climática e ambiental. Insistir neste caminho da bioenergia com base no monocultivo em grande escala, que busca se legitimar com selos verdes de certificação, confunde a opinião pública. Além disso, tem um custo altíssimo: retarda ainda mais as medidas estruturais para enfrentar as crises social, energética e climática. Contudo, principalmente na União Europeia, que hoje é o principal consumidor de biomassa de madeira, existe a possibilidade de optar por outro rumo em vez de substituir combustíveis fósseis por bioenergia. Este informe pretende ser um incentivo a mais nessa necessária mudança nos sistemas de produção e consumo de energia excessiva e extremamente dependente de recursos energéticos externos - antes, os combustíveis fósseis, e hoje, cada vez mais, a bioenergia. Até que os governos tomem as medidas necessárias para frear o avanço das plantações para energia no Sul, mas também no Norte, resta à sociedade civil e aos movimentos sociais do Sul e do Norte trabalhar conjuntamente para enfrentar esta nova tendência, continuar a luta para conseguir que os territórios possam atender às demandas das populações locais, contribuindo com a soberania alimentar e, acima de tudo, com um mundo mais justo.
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Uma nova ameaça para comunidades e florestas
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Nos últimos anos, presenciamos o início de um novo “boom”, principalmente na Europa, e também nos Estados Unidos e no Canadá: a geração de energia a partir de biomassa de madeira. Ainda que isso tenha sido promovido inicialmente como um tipo de reciclagem que aproveita resíduos de madeira, como a serragem, cada vez mais se usam árvores inteiras e se estabelecem plantações de árvores em regime de monocultivo especialmente para esse fim, no Sul global. Para esse novo mercado, a grande indústria busca promover novos tipos de commodities à base de madeira, como os cavacos, ou chips de madeira, e também os chamados granulados, ou pellets, especificamente para fins energéticos. As plantações de árvores para a obtenção de biomassa aprofundam um modelo industrial de monocultivos orientado à exportação, sobre territórios que são ou poderiam ser usados para garantir os meios de vida das comunidades locais.
O Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais (WRM) é uma organização internacional que, trabalhando com temas vinculados a florestas e às plantações, contribui para que se conquiste o respeito aos direitos dos povos sobre suas florestas e seus territórios. 44 Plantações de árvores no Sul para gerar energia no Norte
World Rainforest Movement