ato sem palavras

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ato sem palavras Act without words, vertido para o francês por s. beckett Acte sans paroles, vertido para o brasileiro por accioly & michelotto@ [

> ESTE

MEMBROS DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE AUTORES TEATRAIS

ATO É ACOMPANHADO DE UM APEÇA MUSICAL DE

]

J. BECKETT

> PERSONAGEM: UM HOMEM. FAZ UM GESTO FAMILIAR: DOBRA E DESDOBRA SEU LENÇO. >CENA: >

DESERTO. ILUMINAÇÃO FORTÍSSIMA CÓDIGOS DE LEITURA ( DE TRADUTORES): HORIZONTAIS: D > = DIREITA LD>= LATERAL DIREITA

//

E< = ESQUERDA LE< = LATERAL ESQUERDA

//

VERTICAIS:

DC∀= VINDO DE CIMA

//

OUTROS: T >= > C ^>___ LSL .^ LP """" R >:<

[ TROPEÇA ] [ CAI ] [ LOGO SE LEVANTA ] [LIMPA A POEIRA] [ REFLETE ]

PC^

=

PARA CIMA


AÇÃO:

LANÇADO DE COSTAS PELA LD > O HOMEM TROPEÇA, CAI, LOGO SE LEVANTA, LIMPA A POEIRA, REFLETE. APITO SOA NA

LD

>

ELE REFLETE, SAI À DIREIA. É IMEDIATAMENTE REENVIADO PARA O PALCO. TROPEÇA. CAI, LOGO SE LEVANTA, LIMPA A PORIRA, REFLETE. APITO NA

LE

<

ELE REFLETE, SAI À ESQUERDA. É IMEDIATAMENTE REENVIADO PARA O PALCO. TROPEÇA, CAI, LOGO SE LEVANTA, LIMPA A POEIRA, REFLETE. APITO À E< ELE REFLETE, CAMINHA PARA A LATERAL ESQUERDA, PÁRA ANTES, SE JOGA PARA TRÁS, TROPEÇA, CAI, SE LEVANTA IMEDITAMENTE, LIMPA A POEIRA , REFLETE.

UMA PEQUENA ÁRVORE DESCE DO TETO. POUSA NO CHÃO. TEM APENAS UM PEQUENO GALHO, A 3 METROS DO SOLO. EM SEU CUME, UM PEQUENO TUFO DE PALMAS, QUE PROJETA UMA SOMBRA TÊNUE ELE REFLETE O TEMPO TODO. APITO VINDO DC∀ ELE SE VOLTA, VÊ A ÁRVORE, REFLETE, VAI EM DUA DIREÇÃO, ASSENTA-SE À SOMBRA, OLHA PARA AS MÃOS. UMA TESOURA DE ALFAIATE DESCE DO TETO. SE IMOBILISA DIANTE DA ÁRVORE, A 1 METRO DO CHÃO. ENQUANTO ISSO ELE CONTINUA A OBSERVAR AS MÃOS. APITO VINDO DC∀ ELE LEVANTA A CABEÇA, VÊ A TESOURA, REFLETE, APANHA-A


E COMEÇA A CORTAR AS UNHAS.

.

AS PALMAS SE ABAIXAM SOBRE O TRONCO. A SOMBRA DESAPARECE. ELE LARGA A TESOURA, REFLETE. UMA PEQUENA GARRAFA, COM UMA GRANDE ETIQUETA RÍGIDA, TENDO A INSCRIÇÃO: "ÁGUA", DESCE DO TETO. SE IMOBILISA A 3 METROS DO SOLO . ENQUANTO ISSO ELE REFLETE. APITO VINDO DC∀

LEVANTA OS OLHOS, VÊ A GARRAFA, REFLETE, SE LEVANTA, VAI ATÉ DEBAIXO DA GARRAFA, TENTA EM VÃO ALCANÇÁ-LA, DÁ-LHE AS COSTAS. UM GRANDE CUBO DESCE DO TETO. POUSA NO SOLO. ELE CONTINUA A REFLETIR. APITO VINDO DC∀ ELE SE VOLTA, VÊ O CUBO, OBSERVA-O BEM, COLOCA-O SOB A GARRAFA, EXPERIMENTA SUA ESTABILIDADE, SOBE NELE, TENTA EM VÃO PEGAR A GARRAFA, DESCE, COLOCA O CUBO EM SEU LUGAR PRECEDENTE, DÁ DE COSTAS, REFLETE. UM SEGUNDO CUBO, MENOR, DESCE DO TETO. POUSA NO SOLO. ENQUANTO ISSO ELE REFLETE. APITO VINDO DC∀ ELE SE VOLTA, VÊ O SEGUNDO CUBO, OBSERVA-O, COLOCA-O SOB A GARRAFA, TESTA SUA ESTABILIDADE, SOBE NELE, TENTA EM VÃO ATINGIR A GARRAFA; DESCE, PENSA EM RECOLOCAR O CUBO EM SEU LUGAR, IMAGINA ALGO E RECOLOCA-O NO CHÃO; VAI BUSCAR O CUBO MAIOR, COLOCA-O SOBRE O MENOR, TESTA O EQUILÍBRIO, SOBE, O CUBO MAIOR ESCORREGA, ELE CAI, SE LEVANTA IMEDIATAMENTE, SACODE A POEIRA, REFLETE. PEGA O CUBO MENOR, COLOCA-O POER SOBRE O MAIOR, EXPERIMENTA O EQUILÍBRIO,


SOBE NELE E VAI CONSEGUIR PEGAR A GARRAFA QUANDO ELA, LIGEIRAMENTE, SOBE UM POUQUINHO MAIS E SE ESTABILISA FORA DE SEU ALCANCE. ELE DESCE, REFLEETE, RECOLOCA OS CUBOS EM SEUS LUGARES, UM DE CADA VEZ, VIRA AS COSTAS PARA ELES, REFLETE. UM TERCEIRO CUBO, MENOR AINDA, DESCE DO TETO. POUSA NO SOLO. ENQUANTO ISSO ELE REFLETE. APITO DC" ELE SE VOLTA, VÊ O TERCEIRO CUBO, OBSERVA-O, REFLETE, LHE DÁ AS COSTAS, REFLETE. O TERCEIRO CUBO SOBE . DESAPARECE AO ALTO. AO LADO DA GARRAFA, DESCE DO TETO UMA CORDA, CHEIA DE NÓS. SE IMOBILISA 1 METRO DO SOLO E ELE A REFLETIR APITO DC

ELE SE VOLTA, VÊ A CORDA,REFLETE, SOBE NA CORDA E VAI CONSEGUIR PEGAR A GARRAFA, QUANDO A CORDA COMEÇA A DESCER, LEVANDO-O DE VOLTA AO SOLO.

ELE DÁ AS COSTAS PARA A CORDA, REFLETE, PROCURA COM OS OLHOS A TESOURA, A VÊ, VAI APANHÁ-LA, VOLTA PARA A CORDA E TENTA CORTÁ-LA. A CORDA É PUXADA, O LEVANTA DO CHÃO, ELE SE AGARRA CONSEGUE CORTÁLA, CAI, SE LEVANTA, LARGA A TESOURA, CAI, SE LEVANTA IMEDIATAMENTE, SACODE A POEIRA, REFLETE. A CORDA VOLTA A SUBIR RAPIDAMENTE DESAPARECE AO ALTO.

.

COM SEU PEDAÇO DE CORDA, ELE FAZ UM LAÇO COM O QUAL EXPERIMENTA PEGAR A GARRAFA. A GARRAFA SOBE RAPIDAMENTE. DESAPARECE AO ALTO.


ELE DÁ AS COSTAS, E REFLETE. COM O LAÇO À MÃO, VAI ATÉ A ÁRVORE, OBSERVA O GALHO, SE AFASTA, OBSERVA OS CUBOS, PEGA O MENOR, COLOCA-O SOB O GALHO, VOLTA PARA PEGAR O MAIOR, E LEVÁ-LO ATÉ DEBAIXO DO GALHO; VAI COLOCAR O MAIOR SOBRE O MENOR, PÁRA; COLCOCA O MENOR SOBRE O MAIOR, EXPERIMENTA O EQUILÍBRIO, OBSERVA O GALHO, VIRA DE COSTAS PARA PEGAR O LAÇO. O GALHO ARREIA AO LONGO DO TRONCO. ELE SE LEVANTA, LAÇO À MÃO, VIRA DE FRENTE PARA O GALHO, CONSTATA. VIRA DE COSTAS, REFLETE. RECOLOCA OS CUBOS, UM A UM, EM SEUS LUGARES ANTERIORES, ENROLA CUIDADOSAMENTE O LAÇO E COLOCA-O POR SOBRE O CUBO MENOR. VIRA DE COSTAS E REFLETE. APITO VINDO DA LD< ELE REFLETE, SAI À DIREITA. É IMEDIATAMENTE REENVIADO PARA O PALCO, TROPEÇA, CAI, LEVANTA-SE IMEDIATAMENTE, SACODE A POEIRA, REFLETE. APITO À E< ELE NÃO SE MEXE. OLHA PARA SUAS MÃOS, PROCURA COM A VISTA A TESOURA, A VÊ, VAI APANHÁ-LA, COMEÇA A CORTAR AS UNHAS, PÁRA, REFLETE, PASSA O DEDO POR SOBRE O FIO DA LÂMINA, LIMPA-A COM O LENÇO; VAI COLOCAR A TEOSURA E O LENÇO SOBRE O CUBO MENOR, VIRA-SE DE COSTAS PARA A ELE, ABRE O COLARINHO, DEIXA LIVRE O PESCOÇO E O APALPA. O CUBO MENOR SOBE. DESAPARECE NO ALTO, LEVANDO LAÇO, TESOURA E LENÇO. ELE SE VOLTA PARA PEGAR A TESOURA ASSENTA-SE SOBRE O CUBO MAIOR.

,

CONSTATA,

O CUBO MAIOR SE MOVIMENTA, FAZENDO-O CAIR POR TERRA. SOBE E DESAPARECE. ELE SE MANTÉM CAÍDO, DEITADO DE LADO, COM A FRENTE VOLTADA PARA A PLATÉIA, COM O OHAR FIXO. A GARRAFA DESCE. SE IMOBILISA MAIS OU MENOS A

ELE NÃO SE MEXE

1/2

METRO DE SEU CORPO.


A GARRAFA DESCE AINDA MAIS. SE BALANÇANDO PARA CIMA E PARA BAIXO, DIANTE DE SEU ROSTO.

ELE NÃO SE MEXE

A GARRAFA SOBE . DESAPARECE AO ALTO. O GALHO DE ÁRVORE SE

LEVANTA, AS PALMAS SE ENTREABREM, VOLTA A SOMBRA.

ELE NÃO SE MEXE A ÁRVORE SOBE DE NOVO E DESAPARECE AO ALTO.

ELE FICA A OBSERVAR SUAS MÃOS.

***

NOTAS PARA UMA LEITURA DO ATO SEM PALAVRAS

I

1BECKETT, DIZ A LENDA, PREFERIA ESCREVER EM FRANCÊS DO QUE EM INGLÊS, SUA LÍNGUA NATIVA. TALVEZ DESSA PREDFER6ENCIA TENHA NASCIDO O ATO SEM PALAVRAS I. NUMA DESSAS BRINCADEIRAS QUE A LINGUAGEM NOS ARMA, BECKETT DEVE TER TRADUZIDO, OU MELHOR TRANSLITERADO "COMÉDIE" EM "COMICS". POIS ESSA É UMA PEÇA EM QUADRINHOS... ATO SEM PALAVRAS É UMA EXPERIÊNCIA DE LEVAR AO PALCO TODA A FORÇA FORMAL DOS DESENHOS E DE SEUS BALÕES CARREGADOS DE EXCLAMAÇÒES, INTERROGAÇÕES, SONS DE VIOLÊNCIA E DE TODA UMA ORDEM QUE A LITERATURA ( MESMO A TEATRAL ) HAVIA RELAGADO PARA FUNDO DE CENA DO TEXTO. ESSE APITO INSISTENTE - POR MAIS QUE SE O POSSA LIGAR À ENTÃO FAMOSA CAMPAINHA DE PAVLOV - É, FUNDAMENTALMENTE, E EM GRANDE PLANO - UM BALÀO DE HISTÓRIA DE HQ, COM UM PRIIIIIIII ESCRITO DENTRO EM GARRAFAIS LETRAS DESENHADAS , COMO AS QUE APARECERÃO NA GARRAFA ( MENOS GARRAFAIS , TODAVIA...). POIS NO DESLIZE, DENTRO DA CADEIA PARADIGMÁTICA, AO NÍVEL DO SOM, FOI QUE BECKETT PASSOU DA COMÉDIA AOS COMICS. E POR ISSO MESMO, UMA CENA SUPOSTAMENTE MUDA, COMO ATO SEM PALAVRAS I, É TERRIVELMENTE MARCADA PELA AUSÊNCIA DE QUALQUER OUTRO ELEMENTO FONÉTICO DE NOSSA HABITUAL CONVERSAÇÀO HUMANA; E É, AO MESMO TEMPO, MARCADA POR SUA "PRESENÇA NEGATIVA" POR ASSIM DIZER, PELO CONTRAPONTO COM ESSE PRIIII MALDITO, QUASE QUE INJUSTIFICÁVEL GRAMATICALMENTE. POIS O PRIIII DENTRO DE UM BALÃO DE HQ, REÚNE EM SI, NESTE SEU ENCLAUSURAMENTO, TODAS AS CATEGORIAS DO REGRAMENTO E PESO DE UMA LINGUAGEM: ELE É ADVÉRVIO, É INTERJEIÇÀO, É VERBO, É SUJEITO AUSENTE, É ETC...


HÁ APENAS UM SENÀO, QUE É MARCADO POR BECKETT: DIANTE DE TODA A "TEORIA FUNCIONALISTA/ HUMANÍSTICA DA LINGUAGEM", NEM TODOS OS CÃES SALIVAM ! O HOMEM DE BECKETT NÃO PRECISA SALIVAR : TEM DIANTE DE SI AS PRÓPRIAS MÃOS, QUE ELE PASSA A OBSERVAR COM MAIOR INSISTÊNCIA... ATO SEM PALAVRAS I PODERIA SER TOMADO POR UMA FÁBULA QUE COMPORTASSE UMA INFINIDADE DE ENSINAMENTOS MORAIS... A FAMOSA "MORAL DA FÁBULA"... ALGUMAS DESSAS "MORAIS" NÓS JÁ ANUNCIAMOS AQUI, COMO A DO "CONDICIONAMENTO REFLEXIVO DO SUJEITO", OU A DO "MAIS VALE UM ATO QUE MIL PALAVRAS ". ESSA ÚLTIMA É UMA VERSÃO MAL FEITA E DESAVERGONHADA DE UM PENSAMENTO DE MAO, PENSAMENTO QUE SÓ PODE SER ENTENDIDO DENTRO DE UMA ESCRITURA E UM PENSAMENTO PICTÓRICO, IDEOGRAMÁTICO, IMAGINAL. PREFERIMOS ANUNCIAR TAIS MORAIS, SEM NOS ASRRISCAR A PISAR NESSE TERRENO LODOSO. E ISSO POR SUSPEITARMOS QUE BECKETT ESTAVA SE LIXANDO E TEM POUCO A VER COM TODO O CÊRCO FILOSÓFICO QUE LHE FIZERAM. O QUE NÃO QUER DIZER QUE ELE NÀO FÔSSE UM GRANDE PENSADOR CONTEMPORÂNEO, PELO CONTRÁRIO... A "FILOSOFIA" QUE LHE QUISERAM VERTER EM TEATRO, TRANSCRITA AQUI E ALI EM LITERATURA, É E SERÁ SEMPRE DE OUTRA ORDEM. SOBRETUDO SE SE TRATA DE CENA. EM CUJA RAIZ ESTÁ ESPETÁCULO E RISO. NÀO HÁ HOMENS DESESPERADOS E CONDICIONADOS EM BECKETT: HÁ HOMENS ASSISTINDO E RINDO DO DESESPÊRO E DO CONDICIONAMENTO HUMANO, O QUE É COISA DE OUTRA ORDEM, O QUE É COISA BEM DIFERENTE. TÀO DIFERENTE QUANTO DIFERENTES SÃO LITERATURA, PENSAMENTO, MUNDO DAS IDÉIAS E COMICS. NO MUNDO DAS IDÉIAS E DOS PENSAMENTOS, O CÔMICO É SEMPRE UMA OPUTRA IDÉIA DE UM OUTRO PENSAMENTO, FILHOTES ESES REPRODUZIDOS EM DESLIZES, LAPSUS E TODAS ESSAS COISAS QUE ENCHEM DE MATÉRIA UM SIMPLES SONHO E ENCHEM DE SONHOS E ANGÚSTTIA UM SIMPLES MORTAL [ E, POR QUE NÀO, ENCHEM DE SIMPLES MORTAIS OS CONSULTÓRIOS PSIQUIÁTRICOS !..]. SUSPEITAMOS QUE BECKETT ESTÁ SEMPRE A TOMAR DISTÂNCIA EM RELAÇÃO A ESSE UNIVERSO LÍTERO-REFLEXIVO. ESTAMOS A AFIRMAR QUE ELE CONTEM SUA DOSE DE RISO E SUA DOSE DE TRAGÉDIA. NADA TÀO DIVERTIDO, AINDA MAIS PARA OS QUE ASSIM FORAM CONDICIONADOS, QUE UMA RÉCITA, UM CHÁ LÍTERO-QUALQUER-COISA... HÁ INÚMERAS CENAS QUE TRABALHARAM TAL ASPECTO, DE MOLIÈRE A SHAKESPEARE. OU VOCÊ ESQUECEU QUE OBRA PRIMA DE HUMOR-NEGRO ELE PRODUZIU, POR EXEMPLO, AO REFLETIR SOBRE A VIDA E O SER - DENTRO DE UM CEMITÉRIO; E SOBRE A GRANDEZA, DIVIDINDO-A COM YORICK, UM BOBO DE CORTE... O QUE ESTAMOS TENTANDO DIZER É QUE BECKETT TRABALHOU UM OUTRO ASPECTO DE TUDO ISSO, E QUE SE ELE NÀO O TIVESSE FEITO, ALGUÉM TERIA QUE FAZÊ-LO. EM SUA VIDA PARTICULAR, PARECE QUE TEVE O HUMOR NEGRO DE FAZER LONGOS SARAUS LITERÁRIOS COM JOYCE E VÁRIOS OUTROS "CRÂNIOS" ASSEDIADOS EM PARIS. EM SUA OBRA, ELE NOS PARECE REPRODUZIR COM ESTREMA FIDELIDADE AQUELA SITUAÇÀO DE "HUMOUR" DA CENA INDICADA EM SHAKESPEARE.

NUM MUNDO DE LIVROS E IDÉIAS, BECKETT ESTAVA MAIS PARA BÁRBARA CARTLAND, ESTAVA MAIS PARA O RÁDIO, O CINEMA E A TV; E, NOS PARECE QUE EM SEUS DOIS ATOS SEM PALAVRAS E OUTRAS PEÇAS, ESTAVA MAIS PARA O CIRCO - ESSE AVÔ DESVAIRADO DE NOSSO FAZER TEATRAL E DE NOSSAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS.


SUSPEITAMOS QUE BECKETT ESTAVA A QUILÔMETROS, MILHAS E LÉGUAS DE DISTÂNCIA DE TODAS ESSAS POSIÇÕES DE "FILOSÓFICO-ARREPENDIMENTO-DIANTE-DA-VIDA" QUE QUEREM OS TRISTES LHE IMPUTAR . BECKETT FAZIA CENA. EM TODOS OS SENTIDOS. 2SE INSISTIMOS NAS RELAÇÕES COMÉDIA/ COMICS, LITERATURA/ MUNDO DAS IDÉIAS, MUNDO DAS IDÉIAS/ MUNDO NOVO, FOI SOBRETUDO PARA PODERMOS MARCAR ALGUMAS DISTÂNCIAS DE BECKETT EM RELAÇÃO AO TEATRO - QUE ESTÀO BEM DELINEADAS NA TRAMA DE FUINDO DE SUAS PEÇAS E TAMBÉM EM ATO SEM PALAVRAS I. SERIAM ELAS: A- A DISTÂNCIA PARA COM UMA CERTA RELAÇÀO TEATRO/TEXTO. RELAÇÀO SEMPRE MAIS FAVORÁVEL AO TEXTO; E SEMPRE MAIS PREJUDICIAL AO TEATRO E À CONSTITUIÇÀO DA CENA. A ELIMINAÇÃO DE TODO "SOM DE CORDA VOCAL", A ESTRUTURAÇÀO DE UM ETXTO PURAMENTE DIDASCÁLICO, A OBSESSIVIDADE DESSE APITO DE MÚLTIPLOS SIGNIFICANTES, DE SIMPLICIDADE E NULIDADE ALTAMENTE EXPLOSIVAS; A TROCA DE UM TEXTO TEATRAL POR U M TEXTO EM BRANCO, CIRCENSE, SÃO UMA SÉRIE DE INDICADORES DESSA RELAÇÀO BECTIANA DIFERENCIADA ENTRE TEXTO/ TEATRO. B-

TEATRO/ AUTOR:

NOVA RELAÇÃO MARCADA EM ATO SEM PALAVRAS I. ELA DECORRE DO IMPERIALISMO EXISTENTE NA ANTERIOR ( TEXTO/TEATRO ). TODO AUTOR DISSEMINA AQUI E ALI EM SEU TEXTO, MARCAS DE UMA SEGUNDA ASSINATURA - COMO SE A PRIMEIRA NÀO BASTASSE ... SÀO AQUELAS VINHETAS ( OU DIDASCALIAS ) COM AS QUAIS ELE NÀO QUER JAMAIS DEIXAR UMA PEÇA SAIR DE SUAS GARRAS. "COM AR DISTANTE", " SAI APRESSADAMENTE ", "LEVANTA-SE IMEDIATAMENTE" E COISAS TAIS, SÀO MARCAS QUE FORMAM UM CONJUNTO DE TENTATIVAS DE POSSESSÕES SUCESSIVAS, NÀO MAIS DO TEXTO, DO LITERÁRIO, SOBRE A CENA; MAS AGORA DA PRÓPRIA CENA SOBRE O TEXTO, AGORA SOB O CONTROLE DO AUTOR. A TODO CUSTO, PENSARÍAMOS, O AUTOR QUER SER DONO DO ESPETÁCULO FINAL, DA MISE-ENSCÈNE... E ASSIM PENSEI EU TAMBÉM QUANDO ESCREVI ESSE TEXTO PELA PRIMEIRA VEZ... HOJE PORÉM ME PARECE BEM NÍTIDO QUE ESSE USO DO TEXTO NÀO SE DEVE A RAZÕES DE ORDEM DE PSICOLOGIA DA POSSESSIVIDADE, MAS QUE É UMA MARCA TEXTUAL DE LIBERAÇÀO DA CENA, O TEXTO É "EMPOBRECIDO LITERARIAMENTE" EM VISTA DE SE ENRIQUECER CENICAMENTE. NÃO ME PARECE QUE BECKETT QUEIRA IMPINGIR SUA AUTO-DIREÇÃO, MAS APENAS DAR MARCAS SUFICIENTES DE QUE ISSO AQUI É CENA, ISSO AQUI É TEATRO, ISSO AQUI NÀO É FILOSOFIA EXISTENCIALISTA BARATA, ISSO AQUI NÀO É LITERATURA MODERNOSA...

A PER-VERSÃO DE TEATRO QUE PODEMOS DESIGNAR DE "MODERNA", DEU-SE EXATAMENTE PELA PASAGEM A PRIMEIRO PLANO DESSE ASPECTO TEATRAL QUE É A ENCENAÇÀO . A ORIGEM DO ESPETÁCULO NÀO SE SITUANDO MAIS NO VISUAL DE UM VERBUM ESCRITO ( TEXTO), MAS NO TRABALHO DE ESPETACULARIZAÇÀO A PARTIR DELE. APENAS A PARTIR. NO EXTREMO DESSE TRABALHO DE "REPRESENTAÇÀO FIGURAL", OBJETAL DO TEXTO, SE SITUA ATO SEM PALAVRAS I. NADA MAIS É QUE UMA PEÇA DE TEATRO EM QUE CONSTAM \APENAS AS DIDASCALIAS , A GARRA DO AUTOR, EVACUADOS TODOS OS OUTROS ENCHIMENTOS DE TEMPO/ ESPAÇO. TODO OUTRO POSSÍVEL TEXTO SONORO OU VISUAL ESTÁ AMARRADO A SE ORIGINAR APENAS AÍ - O QUE NÀO SE PASSA COM A INCOMEDIDA POLIVALÊNCIA SIGNIFICANTE DE OUTROS TEXTOS ( SUGERIDA AQUI E ALI COMO "RIQUEZA LITERÁRIA, SIMBÓLICA" E OUTRAS TOLICES DE IGUAL QUILATE). ESSE TEXTO VISUAL QUE SE CONSTITUE POR SE REMETER À VISUALIDADE ,E NÀO


MAIS A NENHUMA SUB-DIVISÃO TOMÍSTICA, ME LEMBRA A HISTÓRIA DOS QUARKS QUE SE REMETEM UNS AOS OUTROS E QUE SE OS TENTARMOS DIVIDIR ELES SIMPLESMENTE JAMAIS TERIAM EXISTIDO... O ÚLTIMO PERSONAGEM AQUI É O AUTOR, ELE O ÚLTIMO CORTE TÔMICO E SUA EXISTÊNCIA ASSIM REMETE À CENA - ESSA TAMBÉM O ÚLTIMO PERSONAGEM DESSA PEÇA ESTRANHAMENTE QUÁRQUICA...O PALCO É RODEADO POR UMA INFINIDADE DE PERSONAGENS ANÔNIMOS, QUE APITAM NA LATERAL DIREITA OU DE CIMA, QUE BAIXAM ÁRVORES EM DESERTOS DE LUZ, CORDAS, CUBOS, TESOURAS. FINCANDO DEFINITIVAMENTE SUAS GARRAS DE AUTOR NO TEXTO " INDICIAL" (= DIDASCÁLICO ),BECKETT SÓ O FAZ - NOS PARECE- PARA DEVOLVÊ-LO A TODOS NÓS E À HISTÓRIA QUE SE CONSTRÓI ANÔNIMA. NÃO NOS COMPETE,PORÉM, ENTRAR MUITO NESSA RELAÇÀO NOVA CURIOSA ENQUANTO TEATRAL ( NÀO NOVA ENQUANTO TEATRAL ...), DITA "MODERNA". POIS ELA É UMA CONJUNÇÀO DE RELAÇÒES TEXTO/ TEATRO/ AUTOR/ CENA/ ENCENAÇÀO . APENAS A INDICAMOS, A SUGERIMOS COMO LEITURA, POR NOS PARECER FAZER PARTE DAQUELE LEVANTAMENTO DE FIGURAS DA RETÓRICA DA MODERNIDADE QUE TENTAMOS ELABORAR EM NOSSAS PESQUISAS SOBRE O DIFERENCIAL NO TEXTO MODERNO (1). ESSE CONJUNTO VAI DE PAR COM MODALIDADES RETÓRICAS DO TEXTO COMO MANIFETOS, PALIMPSESTOS E OUTRAS FIGURAS DA TEXTUALIZAÇÀO MODERNA E QUE NOS PARECEM ABERTAMENTE EM OBRA ( E NÀO EM OBRA ABERTA, COISA QUE NUNCA NOS PARECEU TER GRANDES SIGNIFICAÇÕES ), NOS TEXTOS DE BECKETT. RELEMBRAMOS APENAS AQUI QUE, PARTE DESSAS FIGURAS DE RETÓRICA DA MODERNIDADE, NOS ENVIAM A ESSA QUESTÃO DA OBSESSÃO DE POSSE E ASSINATURA DE TEXTO E PARA ESSA INTERESSANTÍSSIMA E ESQUERDÍSSIMA ATITUDE DE APROPRIAÇÀO INDIVIDUAL DO PATRIMÔNIO COLETIVO DA LINGUAGEM. QUANDO DIZEMOS ISSO, NÀO ESTAMOS LONGE DE DIZER QUE ESSAS MODALIDADES ESTRUTURAIS DE FIGURAS RETÓRICAS SÃO ESTRUTURANTES E ESTRUTURADAS PELOS SISTEMA CAPITALISTA...E QUE TALVEZ ESSA SEJA A MAIOR CONTRIBUIÇÀO DESSE SISTEMA PARA UMA DIFERENCIAÇÀO CULTURAL OU CIVILIZATÓRIA.

ATO SEM PALAVRAS I É UM GRANDE PROCLAMA DE NOSSA PROTESTANTE-CAPITALISTA, MAS QUE NÀO PROTESTA MAIS NADA. É UM MONUMENTO À NOSSA BARBÁRIE E CULTURA OCIDENTAL.

ERA

OCIDENTAL,

****************************************************************** (1) ACCIOLY MICHELOTTO, ROSELI, INTERTEXTUALITÉ BRÉSILIENNE AUX ANNÉES 60. PROJET DE THÈSE. DOCTORAT EN SOCIOLOGIE. QUÉBEC, QUE, UNIVERSITÉ LAVAL -, 1983.

NB.: A LISTAGEM DE TEXTOS CONSULTADOS PARA A PRESENTE TRADUÇÃO SE ENCONTRA NOS ARQUIVOS DO BANCO DE DADOS. O ORIGINAL FRANCÊS, ACTE SANS PAROLES, É DAS EDITIONS DU MINUIT. OS TRADUTORES SÀO MEMBROS DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE AUTORES TEATRAIS E TËM SEUS DIREITOS COBERTOS PELA MESMA SOCIEDADE..



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