COLAGENOSES E A DERMATOLOGIA

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COLAGENOSES E A DERMATOLOGIA



COLAGENOSES E A DERMATOLOGIA ARTUR ANTÔNIO DUARTE

2 a EDIÇÃO Revista e Ampliada


COLAGENOSES E A DERMATOLOGIA –gunda Se Edição – Revista e Ampliada ISBN 978-85-8053-029-2 Copyright © 2012 by Di Livros Editora Ltda. Rua Dr. Satamini, 55 – Tijuca Rio de Janeiro – RJ/Brasil CEP 20270-232 Telefax: (21) 2254-0335 dilivros@dilivros.com.br www.dilivros.com.br

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, total ou parcialmente, por quaisquer meios, sem autorização, por escrito, da Editora. Nota A medicina é uma ciência em constante evolução. As precauções de segurança padronizada devem ser seguidas, mas, à medida que novas pesquisas e a experiência clínica ampliam o nosso conhecimento, são necessárias e apropriadas modificações no tratamento e na farmacoterapia. Os leitores são aconselhados a verificar as informações mais recentes fornecidas pelo fabricante de cada produto a ser administrado, a fim de confirmar a dose recomendada, o método e a duração do tratamento e as contraindicações. Ao profissional de saúde cabe a responsabilidade de, com base em sua experiência e no conhecimento do paciente, determinar as doses e o melhor tratamento para cada caso. Para todas as finalidades legais, nem a Editora nem o(s) Autor(es) assumem qualquer responsabilidade por quaisquer lesões ou danos causados às pessoas ou à propriedade em decorrência desta publicação. A responsabilidade, perante terceiros e a Editora Di Livros, sobre o conteúdo total desta publicação, incluindo ilustrações, autorizações e créditos correspondentes, é inteira e exclusivamente do(s) autor(es) da mesma. A Editora

Revisão técnica: Prof. Dr. Jackson Machado-Pinto Projeto gráfico/capa: CLR Balieiro Editores Fotos de capa e miolo: Acervo pessoal do Prof. Dr. Artur Antônio Duarte Impresso no Brasil – Printed in Brazil


O AUTOR

Prof. Dr. Artur Antônio Duarte, nascido na cidade de Martinópolis, interior do estado de São Paulo, cursou Medicina na Faculdade de Medicina de Botucatu–UNESP, formando-se em 1981. Cursou Residência Médica na Área de Dermatologia na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP, por três anos, sendo o último dedicado inteiramente às colagenoses. Fez cursos de especialização dirigidos às colagenoses nos EUA e na Alemanha e, ao retornar, graduou-se Mestre em Dermatologia pela Escola Paulista de Medicina, hoje UNIFESP, e em seguida graduou-se Doutor em Dermatologia pela Universidade de São Paulo – USP, sempre estudando o envolvimento sistêmico das doenças cutâneas. Desde 1986 está radicado na Universidade de Santo Amaro, na Disciplina de Dermatologia, e desde essa época coordena o Ambulatório de Colagenoses e Imunobiológicos da Faculdade de Medicina; sendo, atualmente, Professor Titular de Dermatologia da Universidade.

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AGRADECIMENTOS

A meu Mestre e Amigo Prof. Dr. Luiz Carlos Cucé, por todo o apoio e confiança ao longo destes anos. Seu estímulo constante é parte desta obra. Obrigado. A minha mestre e querida amiga Profa. Dra. Maria Aparecida Constantino Villela que com entusiasmo me apresentou as “colagenoses” e me estimulou a estudá-las. Obrigado. A todos os colegas professores e residentes da disciplina de dermatologia da Faculdade de Medicina de Santo Amaro – UNISA, o apoio de vocês foi e continua sendo fundamental para a realização deste livro. Obrigado. Aos meus queridos pacientes, por me acompanharem ao longo de tantos anos, meus sinceros agradecimentos. Vocês são, sem dúvida, o objetivo principal deste livro – o bem-estar cada vez maior e melhor para vocês. Ao Prof. Dr. Jackson Machado-Pinto, Professor Chefe de Dermatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Belo Horizonte, MG, meus sinceros agradecimentos pela inestimável colaboração na correção técnica desta obra. Obrigada, acima de tudo, pela amizade, confiança e carinho.

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PREFÁCIO DA 2 a EDIÇÃO

As colagenoses, como todas as outras áreas da Medicina, sofrem atualmente uma revolução resultante dos avanços causados pela era molecular nos conhecimentos sobre a etiologia, a patogênese e a consequente abordagem terapêutica dos processos patológicos. Estou muito orgulhoso e envaidecido por prefaciar esta obra que resulta do desejo de desenvolver um guia prático, conciso, mas abrangente, para médicos que diagnosticam e tratam pacientes com doenças do colágeno, mas mais especificamente é voltado para o público dermatológico. Ela representa o destilado final da experiência do autor, acumulada em quase três décadas, conduzindo casos de pacientes com doenças do tecido conjuntivo. Prof. Dr. Artur Antônio Duarte correlaciona perfeitamente sua grande experiência pessoal com aquela relatada na literatura, mostrando que muitas vezes há pontos de vista conflitantes no que se refere às colagenoses, sem se furtar, porém, de emitir sua própria opinião, firme e consistentemente embasada em artigos científicos e na observação atenta de sua casuística. O texto, muito rico em todo o transcorrer da obra, mostra com clareza sua preocupação com a consistência científica. A estrutura geral dos capítulos, completamente escritos e revistos para esta nova edição, aborda aspectos gerais, etiopatogenia, manifestações clínicas, diagnóstico, roteiro diagnóstico, diagnóstico diferencial, terapêutica, roteiro terapêutico, evolução e referências bibliográficas. Em meio a cada uma dessas divisões, o leitor se vê surpreendido por notas do autor, em que oportunamente opina sobre pontos específicos e, quase sempre, difíceis e controversos.

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Esta é uma obra de estudo obrigatório para todos nós, dermatologistas compromissados com a função precí. pua da Medicina de trazer FELICIDADEe de fazer o BEM No entanto, com certeza contemplará outros profissionais da Medicina, como clínicos e reumatologistas. Prof. Dr. Jackson Machado-Pinto Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais Santa Casa de Belo Horizonte

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PREFÁCIO DA 1 a EDIÇÃO

As colagenoses são doenças sistêmicas com expressivas manifestações cutâneas e, portanto, de grande importância na Dermatologia. Estas doenças – lúpus eritematoso, esclerodermia, dermatomiosite, síndrome de Sjögren, artrite reumatoide –, além de outras patologias correlatas como síndrome dos anticorpos antifosfolípides e vasculitas, por acometerem praticamente todos os órgãos do nosso sistema, merecem o grande esforço dos pesquisadores no seu estudo. O autor deste livro há muitos anos se dedica ao estudo das colagenoses no Serviço de Dermatologia da Faculdade de Medicina de Santo Amaro – UNISA, em São Paulo (SP). Estes estudos foram divulgados em revistas nacionais e internacionais, congressos, assim como em capítulos de vários livros-textos. O marco principal desta caminhada do autor é a publicação completa do seu grande conhecimento do assunto, bem como da sua experiência pessoal acumulada através de tantos anos, trazendo uma obra completa e inédita na dermatologia. Obrigado por esta publicação, revelando para nós as bases profundas e minuciosas sobre este tema. Prof. Dr. Luiz Carlos Cucé Professor Associado da FMUSP Professor Chefe de Dermatologia da UNISA-SP

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SUMÁRIO

Prefácio da 2a edição ........................................................................ ix Prefácio da 1a edição ........................................................................ xi 1. Introdução às Colagenoses ................................................ 1 Aspectos gerais .......................................................................... 2. Experiência do Autor ............................................................

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3. Lúpus Eritematoso (LE) ....................................................... 14 Aspectos gerais .......................................................................... 14 Aspectos históricos .................................................................... 15 Etiopatogenia ............................................................................. 16 Etiopatogenia dos autoancicorpos ........................................... 18 Manifestações clínicas ............................................................... 22 Lúpus eritematoso cutâneo crônico – LECC ........................... 23 Lúpus eritematoso cutâneo subagudo – LECSA ..................... 27 Lúpus eritematoso cutâneo agudo – LECA ............................. 29 Manifestações cutâneas inespecíficas ....................................... 31 Manifestações sistêmicas........................................................... 37 Diagnóstico ................................................................................ 43 Exame anatomopatológico ....................................................... 44 Imunofluorescência direta ........................................................ 48 Diagnóstico sorológico ............................................................. 49 Alterações laboratoriais inespecíficas ....................................... 58 Roteiro diagnóstico ................................................................... 60 Terapêutica................................................................................. 61 Roteiro terapêutico .................................................................... 66 Lúpus eritematoso cutâneo crônico – LECC ........................ 66 Lúpus eritematoso cutâneo subagudo – LECSA .................. 67 xiii


Lúpus eritematoso cutâneo agudo – LECA ......................... 68 Medidas terapêuticas alternativas (LECSA/LECA) ............. 68 Lúpus eritematoso sistêmico – LES ...................................... 69 Terapêuticas alternativas para LES ............................................ 71 Como fazer o controle do paciente com lúpus eritematoso ... 71

Lúpus eritematoso na infância ................................................. 73 Lúpus eritematoso e gestação ................................................... 76 Manejo das pacientes durante a gestação ................................. 78 Outras drogas durante a gestação da mulher lúpica ................ 80 Lúpus eritematoso neonatal ..................................................... 81 Manifestações clínicas ................................................................ 82 Lúpus eritematoso e droga ....................................................... 84 Manifestações clínicas do LE droga-induzido .......................... 87 Diagnóstico do lúpus induzido por drogas .............................. 88 Referências bibliográficas ......................................................... 89

4. Esclerodermia ..........................................................................102 Aspectos gerais ...........................................................................103 Classificação...............................................................................105 Etiopatogenia ..............................................................................107 Manifestações clínicas ................................................................111 Diagnóstico .................................................................................118 Exame anatomopatológico ....................................................... 120 Investigação dos autoanticorpos .............................................. 121 Roteiro diagnóstico ................................................................... 123 Capilaroscopia e outras avaliações laboratoriais ..................... 125 Terapêutica ..................................................................................126 Avaliação da eficácia terapêutica .............................................. 135 Roteiro terapêutico ................................................................... 135 Prognóstico e evolução ..............................................................137 Esclerodermia adquirida, ocupacional e pós-implantes de silicones ..............................................................................138 Esclerodermia e gestação ...........................................................141 Referências bibliográficas ..........................................................141 xiv


5. Dermatomiosite ......................................................................148 Aspectos gerais ...........................................................................148 Aspectos históricos .....................................................................150 Etiopatogenia ..............................................................................150 Manifestações clínicas ................................................................153 Dermatomiosite amiopática – Dermatomiosite cutânea- like ..157 Diagnóstico laboratorial ............................................................158 Exame anatomopatológico ........................................................ 158 Eletromiografia .......................................................................... 159 Ressonância magnética.............................................................. 160 Enzimas marcadoras .................................................................. 161 Autoanticorpos ........................................................................... 162 Outros exames laboratoriais ...................................................... 164 Roteiro diagnóstico ....................................................................164 Diagnóstico diferencial ..............................................................167 Terapêutica..................................................................................168 Evolução......................................................................................172 Dermatomiosite e malignidades ...............................................174 Dermatomiositee gestação ........................................................175 Dermatomiositee drogas...........................................................175 Dermatomiositejuvenil .............................................................176 Dermatomiosite associada a outras colagenoses ......................177 Referências bibliográficas ..........................................................178 6. Síndrome de Sjögren .............................................................186 Aspectos gerais ...........................................................................186 Etiopatogenia ..............................................................................188 Manifestações clínicas ................................................................189 Diagnóstico .................................................................................190 Exame anatomopatológico ........................................................ 191 Terapêutica..................................................................................193 Evolução......................................................................................194 Referências bibliográficas ..........................................................195 7. Síndrome dos Anticorpos Antifosfolípides (SAAF) .........198 Aspectos gerais ...........................................................................198 Manifestações clínicas ................................................................203 xv


Diagnóstico .................................................................................207 Exame anatomopatológico ........................................................ 209 Terapêutica ..................................................................................210 Evolução......................................................................................213 Referências bibliográficas ..........................................................213 8. Dermovasculites .....................................................................219 Aspectos gerais ...........................................................................219 Etiopatogenia ..............................................................................220 Manifestações clínicas ................................................................222 Diagnóstico .................................................................................223 Exame anatomopatológico ........................................................ 223 Formas especiais de vasculites ...................................................226 Roteiro diagnóstico para vasculites cutâneas ...........................230 Referências bibliográficas ..........................................................231 9. Outras Manifestações Cutâneas de Doenças Reumatológicas ....................................................233 Artrite reumatoide .....................................................................233 Doença de Still ............................................................................235 Policondrite recidivante .............................................................235 Referências bibliográficas ..........................................................236 Pranchas de Figuras: Manifestações Clínicas e Exames Anatomopatológicos de Colagenoses ....................237 Lúpus eritematoso ......................................................................239 Esclerodermia .............................................................................251 Dermatomiosite .........................................................................255 Síndrome de Sjögren ..................................................................258 Síndrome dos anticorpos antifosfolípides ................................260 Dermovasculites .........................................................................261 Artrite reumatoide .....................................................................262

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INTRODUÇÃO ÀS COLAGENOSES

ASPECTOS GERAIS O termo colagenose ou doenças do tecido conjuntivo é relativamente recente e tem sido aceito universalmente, apesar de sabermos, hoje, que o colágeno não é o sítio primário da doença. Porém, por razões históricas, o termo colagenose consagra-se em detrimento de outras denominações como doenças cutâneas autoimunes etc. Dentro deste grupo, estudamos principalmente o lúpus eritematoso, a esclerodermia, a dermatomiosite, a artrite reumatoide e a síndrome de Sjögren, além de manifestações clínicas correlatas, como as vasculites e a síndrome dos anticorpos antifosfolípides. A denominação colagenose começou a ser usada a partir de 1932, envolvendo inicialmente a artrite reumatoide, posteriormente a esclerodermia e o lúpus eritematoso; o envolvimento destas diferentes manifestações foi justificado e baseado em observações realizadas em 1933 por Klinge, que demonstrou degenerações fibrinoides do tecido conjuntivo na artrite reumatoide e, posteriormente, na esclerodermia e no lúpus eritematoso. Estas degenerações foram interpretadas por Klemperer, em 1950, como reações de hipersensibilidade a proteínas estranhas, que se manifestariam primariamente no tecido conjuntivo – daí a denominação colagenose –, e definiu-as como um grupo de doenças que tinham em comum: “Sintomas e sinais obscuros, VHS aumentado, respondiam à corticoterapia e epidemiologica1


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mente se comportam de maneira semelhante”. Hoje, além desta definição simplista, porém pertinente, conseguimos demonstrar muitos outros fatores que permitem que este grupo, a princípio heterogêneo quanto a suas manifestações clínicas, continue sendo agrupado devido a outras semelhanças mais contundentes como, por exemplo: 1. clinicamente, apresentar-se como subtipos cutâneos localizados, até formas generalizadas e sistêmicas da mesma doença; 2. o envolvimento das interleucinas, em especial o aumento de IL-2 comum a todas as colagenoses; 3. antígenos de histocompatibilidade HLA-B8 (HLA-Dr3 e HLA DQ2); 4. marcadores imunológicos comuns e específicos (anticorpos antinucleares, citoplasmáticos, teciduais e tissulares); 5. respostas aos corticosteroides, além de outros quimioterápicos; 6. epidemiologicamente acomete preferencialmente o sexo feminino; 7. presença de teleangectasias periungueais; 8. predisposição a fotossensibilidades; 9. fenômenos vasculares: fenômeno de Raynaud, vasculites, livedo reticular etc.; 10. nódulos subcutâneos (eritema nodoso e outras paniculites); 11. artralgias; 12. calcinoses; 13. associação com síndrome de Sjögren; 14. associações de sinais e sintomas inespecíficos e comuns a todas as colagenoses: síndrome overlap (síndrome mista?); 15. anticorpos antifosfolípides, mais frequentes que os observados na população em geral. Assim, este grupo, a princípio heterogêneo nas suas manifestações clínicas, suporta-se devido a todas estas evidências, e o termo colagenose persiste pela importância histórica e não pelo envolvimento primário do tecido conjuntivo na gênese da doença. Devido a todas estas semelhanças, permito-me uma observação pessoal, conceituando as colagenoses como uma doença espectral ou sindrômica – síndrome das colagenoses – e justificável por todas as evidências já expostas, ressaltando que um dos mais importantes elos de ligação entre as 2


INTRODUÇÃO ÀS COLAGENOSES

diferentes colagenoses são os autoanticorpos, em especial os anticorpos antinucleares ou fator antinúcleo, que, salvo algumas exceções, são importantes marcadores de colagenoses e serão mais bem estudados nos capítulos subsequentes. O encontro do antígeno de histocompatibilidade HLA-B8 (Dr3 e DQ2) é um fator comum de pior prognóstico. Assim, o HLA-B8 pode significar maior tendência de as formas cutâneas do lúpus virem a ser manifestação de doença sistêmica, esclerodermia de evolução mais agressiva, tornando-se de múltiplas placas ou generalizadas, além da maior possibilidade de evoluir com sintomatologia sistêmica. Representa, ainda, pior prognóstico da dermatomiosite com resistência aos tratamentos habituais e artrite reumatoide muito mais grave, principalmente quanto à resistência a respostas terapêuticas habituais. Em relação à epidemiologia, as colagenoses comportam-se de maneira semelhante, sempre mais comuns no sexo feminino durante a idade fértil. São de ocorrência familiar, não predominam em nenhum tipo racial significativamente, porém, via de regra, são mais graves nos negros, de acordo com a minha experiência. A síndrome de Sjögren, que é uma expressão clínica associada e comum a todas as colagenoses, também pode ser considerada um fato independente e primário, isto é, ser única, com evolução estável, clínica peculiar da síndrome clássica (síndrome de Sjögren primária?), ou evoluir clinicamente, associando manifestações de qualquer das outras colagenoses (síndrome de Sjögren secundária?), podendo, inclusive, apresentar-se como clínica inicial da associação ou surgir posteriormente. Portanto, é um elo de ligação entre as diferentes expressões clínicas das colagenoses, associada à artrite reumatoide, ao lúpus eritematoso, à esclerodermia e à dermatomiosite, respectivamente nesta ordem de frequência. O estudo histológico das glândulas salivares menores (labiais) – exame de referência para diagnóstico da síndrome de Sjögren – mostrou o mesmo aspecto histológico, quando avaliamos as glândulas salivares labiais dos pacientes, com envolvimento sistêmico de lúpus eritematoso (LE), esclerodermia e artrite reumatoide, o que não é observado em outras doenças e mesmo na população em geral. Em relação ao número aumentado de capilares periungueais, exceto em alguns pacientes portadores de diabetes melito, só tem sido 3


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observado nos portadores de colagenoses e significa também um sinal de mau prognóstico e de provável doença sistêmica. Quanto aos antígenos fosfolípides (se são um epifenômeno, ou se estão diretamente ligados à gênese das colagenoses, ainda precisam ser mais bem avaliados), são muito mais frequentemente associados a pacientes portadores de colagenoses, em especial ao lúpus eritematoso, do que sua ocorrência independente (síndrome antifosfolípide primária), o que vem sendo considerado um sinal de predisposição à colagenose. Todas estas evidências e coincidências permitem-me continuar estudando este grupo de doenças dentro de um mesmo capítulo, já denominado de colagenoses, com especial interesse dentro da dermatologia, visto ser a pele um dos órgãos de acometimento precoce e preferencial para suas manifestações. Em relação ao lúpus eritematoso, mais de 85% dos pacientes têm seu quadro iniciado com lesões cutâneas, e o exato e precoce diagnóstico da doença evita, ou dificulta, uma evolução indesejável, quando instituímos a terapêutica adequada e precoce. Quanto à esclerodermia, previnem-se consequências funcionais e inestéticas importantes, além de retardarmos ou até impedirmos os efeitos da doença sistêmica. Na dermatomiosite, em que a pele também é sítio de manifestação precoce da doença, observamos que, quanto mais cedo iniciarmos o tratamento, melhor é a evolução da doença. Sendo doenças multissistêmicas, o ideal seria uma equipe multidisciplinar, para acompanhar o paciente, à medida que vamos diagnosticando diferentes órgãos acometidos. Porém, cabe ao dermatologista a responsabilidade do diagnóstico e acompanhamento terapêutico de cada paciente, quando o diagnóstico inicial foi feito por meio do exame dermatológico . Não é rara a ocorrência de concomitância de sinais e sintomas de mais de uma colagenose, por exemplo: sorologia sugestiva de lúpus eritematoso sistêmico (LES) e lesão cutânea compatível com esclerodermia, ou mesmo lesões esclerodermiformes associadas à artrite reumatoide, lesões discoides com fenômeno de Raynaud, esclerodactilia etc., enfim quaisquer das manifestações clínicas ou laboratoriais associam-se, recebendo a denominação de síndrome de sobreposição de colagenoses ou síndrome overlap, termo preferível à denominação de síndrome mista – descrita e caracterizada por anticorpos 4


INTRODUÇÃO ÀS COLAGENOSES

anti U1-Rnp, e que associa diferentes sinais e sintomas de colagenoses distintas. Estes pacientes portadores de sobreposição de colagenoses podem manter-se assim durante toda a sua evolução ou, depois de um período variável, ter a manifestação clínico-laboratorial predominante de LE, esclerodermia, artrite reumatoide, síndrome de Sjögren ou dermatomiosite, quando então o diagnóstico e o tratamento são dirigidos para a manifestação clínico-laboratorial predominante. Sinais e sintomas inespecíficos comuns a todas as colagenoses (vasculites leucocitoclásticas, púrpura palpável, fenômeno de Raynaud, livedo reticular e eritema nodoso, por exemplo) persistem ou evoluem em surtos, por tempo indeterminado, até que se caracterizem algumas das colagenoses e aqui podem ter um diagnóstico inicial de colagenopatia indeterminada. O mesmo acontece com as alterações sorológicas, isto é, autoanticorpos antinucleares (FAN) de padrões de depósitos variáveis ou mesmo de padrão periférico/homogêneo, assim como anticorpos específicos (anti Ro/anti La /anti Rnp, por exemplo), podem significar sinais precoces de colagenoses ou maior predisposição à colagenose – em especial ao lúpus eritematoso – principalmente na mulher jovem, caracterizando, ou não, na sua evolução, uma doença específica. Tais situações, mantidas por tempo indeterminado, sem que nunca se expresse tipicamente uma das colagenoses, são mais frequentemente observadas em familiares de portadores de LES e artrite reumatoide, principalmente. Estas condições mórbidas inespecíficas podem ser desencadeadas ou, se já preexistentes, caracterizar uma determinada colagenose em situações especiais, como gestação, exposição a determinadas drogas (procainamida, hidralazina, por exemplo, veja LE e drogas), exposição aguda e prolongada ao sol, infecções concomitantes, para citar as condições de fato, além de outras não comprovadas, como estresse.

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