Monografia Diego Oli - Artes Visuais - URCA 2015

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO CARIRI - URCA CENTRO DE ARTES REITORA VIOLETA ARRAES DE ALENCAR GERVAISEAU LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS

FRANCISCO DIÊGO VIEIRA DE OLIVEIRA (DIEGO OLI)

DO RETRATO TRADICIONAL AO AUTORRETRATO NA ARTE CONTEMPORÂNEA: CRIAÇÃO DE IDENTIDADES A PARTIR DA FOTOGRAFIA

Juazeiro do Norte - CE 2015


FRANCISCO DIÊGO VIEIRA DE OLIVEIRA (DIEGO OLI)

DO RETRATO TRADICIONAL AO AUTORRETRATO NA ARTE CONTEMPORÂNEA: CRIAÇÃO DE IDENTIDADES A PARTIR DA FOTOGRAFIA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção do grau de Licenciado no Curso de Artes Visuais da Universidade Regional do Cariri. Orientador: Prof. Ms. Rubens Venâncio

JUAZEIRO DO NORTE - CE 2015


O148f

Ficha catalográfica Oliveira, Francisco Diêgo Vieira de. Do retrato tradicional ao autorretrato na arte contemporânea: criação de identidades a partir da fotografia./ por Francisco Diêgo Vieira de Oliveira − 2015. 100p. il. Orientador: Prof. Ms. Rubens Venâncio Cópia de computador (printout) Monografia (Graduação) − Universidade Regional do Cariri, Curso de Artes Visuais, Juazeiro do Norte, 2015. 1. Fotografia. 2. Autorretrato. 3. Contemporaneidade. I Venâncio, Rubens (Orient.). II. Universidade Regional do Cariri – Curso de Artes Visuais. III. Título. CDD: 770


FRANCISCO DIÊGO VIEIRA DE OLIVEIRA (DIEGO OLI)

DO RETRATO TRADICIONAL AO AUTORRETRATO NA ARTE CONTEMPORÂNEA: CRIAÇÃO DE IDENTIDADES A PARTIR DA FOTOGRAFIA

Trabalho

de

apresentado

Conclusão como

de

Curso

requisito

para

obtenção do grau de Licenciado no Curso de

Artes

Visuais

da

Regional do Cariri.

Aprovado em: _____/______/______

BANCA EXAMINADORA

__________________________________ Prof. Ms. Rubens Venâncio - URCA Orientador

__________________________________ Profa. Ms. Ana Cláudia Lopes de Assunção - URCA Membro

__________________________________ Prof. Dr. Marcelo Eduardo Leite - UFCA Membro

Universidade


“O que caracteriza um artista é ele olhar para dentro de si mesmo. Toda experiência em arte é um experimentarse, é a experiência de si mesmo, é uma pesquisa em você mesmo. […] Este silêncio do olhar para dentro à procura da origem das coisas é que é o grande problema da arte. Procurando a origem, você fica original, e não querendo fazer uma coisa diferente. É por isso que eu acho que criar está junto com viver, que arte e vida são a mesma coisa”. Amílcar de Castro


Ao(s) Grande(s) Ser/es superior/es. Aos meus avôs e minhas avós. A toda a minha família, em especial aos meus pais.


AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus, pela força, por todas as conquistas;

Ao meu orientador, Prof. Ms. Rubens Venâncio, por toda a orientação e paciência;

Ao meu pai e a minha mãe, Calixto e Tetê, que mesmo sem tanto conhecimento sobre as Artes Visuais, esforçaram-se para apoiar-me com garra desde o início nessa minha decisão/carreira;

Ao meu irmão Lucas, companheiro também nas Artes Visuais;

Aos meus tios, Egrimar e Ivete, meus primos, Yuri, Hortência, Beatriz e Arthur, por todo o apoio na minha vida acadêmica. Sem eles isso não teria sido possível;

A minha Tia Telma, que muito batalhou para me proporcionar uma vida acadêmica de sucesso;

Ao Prof. Dr. Fábio Rodrigues, a quem dedico parte das minhas maiores conquistas como aluno do Centro de Artes Visuais Reitora Violeta Arraes Gervaiseau;

A minha insubstituível professora de fotografia, Ruth Sousa Regiani, a qual me mostrou um leque de possibilidades na arte e me abriu as portas da fotografia na/como arte contemporânea;

Aos demais professores do Curso de Artes Visuais: Ana Cláudia Assunção e Frederick Sidou Piedade;

Aos meus companheiros de Universidade e de vida, principalmente Samara Lopes, Ísis Xenofonte, Vivian Santos, Edvânia Santos, Rachel Gomes, Isadora Barroso e Karol Luan Oliveira;


Aos companheiros de Curso e da Híbrido Produções: Carlos Robério, Charles Farias, Jaildo Oliveira, Kathylene Furtado, Ricardo Campos e também Elvis Pinheiro;

Ao meu amigo-irmão, Antonio Facciorusso e a amiga Jéssica Vasconcelos, por todo o esforço e apoio para a minha primeira exposição coletiva internacional em Veneza – Itália; Ao PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência, pela oportunidade de aprendizado no ensino de arte nas escolas do município;

Ao maravilhoso Projeto Ciência Sem Fronteiras pela oportunidade de participar de um intercâmbio estudando Artes Visuais na Università di Bologna. A essa experiência e a essa cidade dedico também parte do meu amadurecimento enquanto homem, artista, professor e pesquisador;

A Pró-reitora de Assuntos Estudantis: Dra. Maria Arlene Pessoa;

Ao Sr. Raimundo Rodrigues de Lacerda, pelas contribuições nas idas e vindas à Universidade;

A Maria da Conceição Xenofonte Andrade, por toda a colaboração e apoio quando necessário dentro da Universidade;

A todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram na minha trajetória pessoal e acadêmica.


RESUMO Essa pesquisa consiste no estudo da trajetória do autorretrato fotográfico, a partir do daguerreotipo e sua criação no séc. XIX, até chegar ao autorretrato digital, a partir dos selfies e suas hashtags utilizadas em redes sociais, o qual exponho uma reflexão sobre o lugar dessa imagem na contemporaneidade e os avanços conceituais como a introdução do termo “autorretratos acéfalos” a partir do pensamento de Annateresa Fabris, e da ideia de “isto foi encenado” de François Soulages. Bem como, mostro-vos essa produção no âmbito das Artes Visuais, apresentando ainda como parte fundamental do desenvolvimento desse trabalho, um estudo do processo de criação da minha produção artística, em específico dos projetos: Cinema Imóvel, os quais é apresentado uma série fotográfica de cartazes de filmes imaginários, dialogando com os Untitled Film Stills de Cindy Sherman, Born in Nowhere de Laís Pontes e Cuide de Você, da artista Sophie Calle, trazendo essa ligação da produção do artista a partir de situações vivenciadas pelo mesmo; Autorretrato acéfalo, no qual construo autorretratos sem os elementos que compõem a imagem do rosto, trazendo como referencial o trabalho de John Coplans; e Autorretrato nº4, em que apresento uma discussão das inúmeras formas de se mostrar a imagem do homem na contemporaneidade, com a participação do mesmo em 2014 no Festival Morphos Sustainable Empires – Pixels of Identities, realizado em Veneza. Palavras-chave: fotografia, autorretrato, contemporaneidade.


ASTRATTO Questa ricerca consiste nello studio dell'evoluzione dell'autoritratto fotografico, partendo dal dagherrotipo e la sua creazione nel diciannovesimo secolo, fino ad arrivare all'autoritratto digitale, con i "selfie" e i loro "hashtag" utilizzati nelle reti sociali. In questo studio presento una riflessione sul ruolo che questa immagine ricopre al giorno d'oggi e la sua evoluzione concettuale, come l'introduzione del termine "autoritratto senza volto", a partire dal pensiero di Annateresa Fabris, e l'idea del "questo fu inscenato" di François Soulages. Inoltre, mostro un lavoro nell'ambito delle arti visive, presentando come parte fondamentale dello sviluppo di questo lavoro, uno studio del processo di creazione della mia produzione artistica. Nello specifico, essa si compone di tre progetti. Nel primo, "Cinema Imóvel", è presentata una serie fotografica di locandine di film immaginari, facenti riferimento a "Untitled Film Stills" di Cindy Sherman, "Born in Nowhere" di Laís Pontes, e "Prenez soin de vous" dell'artista Sophie Calle. In esso è anche mostrato il collegamento esistente tra il lavoro dell'artista e le situazioni da lui vissute nel quotidiano. Il secondo progetto è "Autorretrato acéfalo", nel quale realizzo autoritratti privi degli elementi che compongono l'immagine del viso, facendo riferimento al lavoro di John Coplans. Per concludere, "Autorretrato n°4", dove presento una discussione sugli svariati modi di mostrare l'immagine dell'uomo al giorno d'oggi e la sua partecipazione all'edizione 2014 del Festival Morphos Sustainable Empires – Pixels of Identities, tenutosi a Venezia. Parole chiave: fotografia, autoritratto, contemporaneità.


LISTA DE ILUSTRAÇÃO Imagem 1

Diêgo de Oliveira, Sem título, fotografia, 2009 ..................

20

Imagem 2

Diêgo de Oliveira, Sem título, fotografia, 2009 ..................

20

Imagem 3

Diêgo de Oliveira, Sem título, fotografia, 2009 ..................

20

Imagem 4

Primeiro retrato / autorretrato fotográfico feito por Robert Cornelius – 1839 ................................................................ 26

Imagem 5

Casa-Museu Carlos Relvas, 1871 .....................................

Imagem 6

Estúdio fotográfico europeu do século XIX ........................ 28

Imagem 7

Sem título ........................................................................... 31

Imagem 8

Sem título ........................................................................... 31

Imagem 9

Sem título ........................................................................... 31

Imagem 10

Descanso de ferro .............................................................. 32

Imagem 11

Autorretrato D. Pedro II, 1855 ............................................ 36

Imagem 12

Sem título ........................................................................... 40

Imagem 13

Sem título ........................................................................... 40

Imagem 14

KOSSOY, Boris. Salão de pose ........................................

41

Imagem 15

Leonardo Da Vinci, Autorretrato, Desenho,1512 ...............

45

Imagem 16

Rembrandt, Detalhe da obra: Autorretrato aos 34 anos, óleo sobre tela, 1640 .........................................................

Imagem 17

– –

46

Vincent Van Gogh, Autorretrato como artista, óleo sobre tela, 1888 ...........................................................................

Imagem 18

27

46

Primeiro autorretrato (selfie) fotográfico do século XX – Joseph Byron, 1909 ...........................................................

48 49

Imagem 19

Joseph Byron, selfie com amigos, 1909 ............................

Imagem 20

Selfie do fotógrafo Joseph Byron com seus amigos .......... 50

Imagem 21

Da esquerda para a direita: David Cameron, Helle Thorning-Schmidt e Obama. Ao lado, Michele Obama ............................................................................................

51 51

Imagem 22

Selfie durante o Oscar, 2014 .............................................

Imagem 23

Arnold Hogg, Primeiro autorretrato com pau de selfie, 1926 ...................................................................................

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Imagem 24

Obama com pau de selfie para campanha do seu programa de saúde Obamacare (2015) ............................

Imagem 25

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Cindy Sherman, Untitled Film Still No.21, Black and white photograph 40.6 x 50.8 cm

16 x 20" (1978) …………….. 57

Imagem 26

Laís Pontes, Julia, 2011 ..................................................... 58

Imagem 27

Laís Pontes, Stacy, 2011 ...................................................

58

Imagem 28

Laís Pontes, Lucia, 2011 ...................................................

58

Imagem 29

Laís Pontes, Camila Angel, 2011 ....................................... 58

Imagem 30

John Coplans, Self-portrait Back with Arms Above, fotografia,1984 .....................................................................

Imagem 31

61

John Coplans, Self-portrait, Hands Spread on Knees, Fotografia, 1985 ................................................................. 61

Imagem 32

Diêgo de Oliveira – Autorretrato nº 6 | Frame de filme Imaginário, 2014 ................................................................

62

Imagem 33

Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 5, fotografia, 2014 ........

63

Imagem 34

Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 3, fotografia, 2011 ........

64

Imagem 35

Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 1, fotografia, 2011 ........

69

Imagem 36

Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 2, Fotografia 40x60, 2011 ........................................................................................... 69

Imagem 37

Frida Kahlo, autorretrato com colar de espinhos e beijaflor, 1940 ............................................................................

70 71

Imagem 38

Cindy Sherman -Untitled Film Still No.13, 1978 …………..

Imagem 39

Michel Zózimo, 2005 .......................................................... 72

Imagem 40

Rion Sabean, 2012 ............................................................

72

Imagem 41

Diêgo de Oliveira, Nº1, fotografia, 60x80 cm, 2011 ...........

76

Imagem 42

Diêgo de Oliveira, Bolonha, Fotografia, 2013 ....................

77

Imagem 43

Diêgo de Oliveira, 364, fotografia, 2014 ............................

78

Imagem 44

Diêgo de Oliveira, App, Fotografia, 2015 ........................... 79

Imagem 45

Diêgo de Oliveira, Papà, Fotografia, 2015 ......................... 80

Imagem 46

Resposta do formulário ...................................................... 82

Imagem 47

Man Ray, Rrose Sélavy, fotografia, 1921 ..........................

Imagem 48

Diêgo de Oliveira – Autorretrato nº 4 – Fotografia - 60x80 cm, 2013 ............................................................................

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Imagem 49

Vista da exposição Pixels of Identities – Venice, 2014 ...... 85

Imagem 50

Vista da exposição Pixels of Identities – Venice, 2014 ......

87

Imagem 51

Vista da exposição Pixels of Identities – Venice, 2014 .....

87

Imagem 52

Matéria no Jornal do Cariri, 2014 ....................................... 88


LISTA DE TABELAS Quadro 1

KOSSOY, Boris ................................................................

36

Quadro 2

KOSSOY, Boris ................................................................

37

Quadro 3

KOSSOY, Boris ................................................................

38

Quadro 4

KOSSOY, Boris ................................................................

38

Quadro 5

Produção em autorretratos fotográficos na contemporaneidade ..........................................................

54


SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................... 1

18

A TRAJETÓRIA E A PRODUÇÃO DOS RETRATOS E AUTORRETRATOS FOTOGRÁFICOS ...................................................

23

1.1

A FOTOGRAFIA (AUTO)RETRATISTA EUROPEIA NO SÉCULO XIX ..

25

1.2

O RETRATO E O AUTORRETRATO FOTOGRÁFICO NO BRASIL IMPERIAL .................................................................................................

33

2

O AUTORRETRATO FOTOGRÁFICO NA CONTEMPORANEIDADE ..

42

2.1

A TRAJETÓRIA DOS SELFIES ...............................................................

44

2.1.2 SELFIES ...................................................................................................

47

2.1.3 SELFIES ATUAIS .....................................................................................

50

2.1.4 EXPLORANDO A PRODUÇÃO AUTORRETRATISTA FOTOGRÁFICA NAS ARTES VISUAIS ..............................................................................

55

2.1.5 CYNTHIA "CINDY" MORRIS SHERMAN ................................................

55

2.1.6 LAÍS PONTES ..........................................................................................

57

2.1.7 AUTORRETRATOS ACÉFALOS .............................................................

59

3

A REALIDADE FICCIONAL EM FOTOGRAFIAS ...................................

66

3.1

PROCESSOS DE INVESTIGAÇÃO NA FICCIONALIDADE FOTOGRÁFICA .......................................................................................

68

3.2

A AÇÃO DA CRIAÇÃO: CINEMA IMÓVEL ..............................................

71

3.3

TEXTO E CONTEXTO FICCIONAIS .......................................................

81

CONSIDERAÇÕES FINAIS .....................................................................

92

REFERÊNCIAS ........................................................................................

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INTRODUÇÃO Imagens fotográficas, desenhos rabiscados com representações da família, pinturas de paisagens nos quadros comprados por minha mãe, já eram elementos das artes visuais comuns na minha infância. O que eu não imaginava era que o futuro me surpreendesse com a graduação em Artes Visuais. Por volta de 2006/7 aos 15 anos de idade, fazer retratos fotográficos e até montar pequenos estúdios em casa era algo comum nas tardes obsoletas da minha juventude em Ibicuã, um distrito de Piquet Carneiro no interior do Ceará. Me auto fotografava e fotografava também o meu irmão, com uma câmera analógica emprestada. Não tinha a fotografia como uma grande realização, mas me sentia prazeroso ao me fotografar, ao ver todas as fotografias, após esperar por alguns dias para revelá-las e recebê-las, uma vez que, o filme era mandado para a cidade de Acopiara, em seguida para Iguatu, local onde as fotos seriam reveladas e depois retornariam a Ibicuã. Nos momentos finais do Ensino Médio (2008), já morando em Juazeiro do Norte, busquei ingressar em um curso superior de arte. Porém, tinha mais conhecimento e portanto mais curiosidade e interesse na Publicidade e Propaganda, curso que não tinha em nenhuma faculdade ou universidade da região Caririense, e a instituição mais próxima que oferecia o curso era em Fortaleza. Nesse período, me mudar para a capital cearense não era viável. Foi quando em um dia na sala de aula cursando a 3ª série do Ensino Médio, recebi um panfleto com uma propaganda dos cursos superiores oferecidos pela Universidade Regional do Cariri – URCA. A partir de então tive conhecimento sobre o Curso de Licenciatura em Artes Visuais, e após pesquisas sobre, decidi graduar-me no mesmo. Tudo ocorreu sem que a minha família soubesse, até que tivesse o resultado de aprovação no vestibular e divulgar que não iria cursar Direito, como esperavam. Ao ingressar no Curso de Licenciatura em Artes Visuais, no Centro de Artes da Universidade Regional do Cariri – URCA em 2009, comecei a fazer parte do Grupo de Pesquisa O Ensino de Arte em Contextos Contemporâneos - GPEACC e atuei como Mediador Cultural pela empresa Híbrido Produções, do Prof. Dr. Fábio José Rodrigues da Costa, nas galerias de arte do Serviço Social do Comércio –


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SESC e do Centro Cultural Banco do Nordeste do Brasil – CCBNB, ambas instituições em Juazeiro do Norte. Consegui, ao passar do tempo, ser bolsista de pesquisa em um projeto do Prof. Dr. Fábio Rodrigues, intitulado Impactos provocados pelo Centro Cultural Banco do Nordeste do Brasil – CCBNB no Cariri Cearense, financiado pelo Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. Após ter ganhado minha primeira câmera digital, comecei a fazer ensaios fotográficos a partir de letras de músicas compostas e/ou cantadas por artistas brasileiros e que de alguma forma dialogavam com a minha vida nesse período. Já trabalhando a ideia de fotografia encenada (François Soulages), mas ainda sem saber da existência desse conceito, realizei o primeiro ensaio (imagem 1, imagem 2 e imagem 3) a partir da música “Caminho das Águas”, composta por Rodrigo Maranhão e cantada por Maria Rita. Foi apenas ao ingressar na graduação que me veio o desejo de estar sempre produzindo fotografia. Concomitante a esse período, comecei a realizar também outros ensaios mais voltados para o âmbito da moda, como Look books, (catálogos para lojas), books para modelos, entre outros por encomendas. A partir da disciplina Fotografia II, com orientação da Prof. Dra. Ruth Sousa Regiani, comecei a produzir mais retratos, autorretratos, procurar novos meios de trabalhar o suporte da fotografia impressa para ser exposta em uma galeria. Meios que me mostravam a fotografia “como arte contemporânea” (Charlotte Cotton). Desde então, passei por uma mudança considerável qualitativa, no que diz respeito a minha produção na fotografia e o meu posicionamento como aluno de Artes Visuais/Artista. Acredito que foi nesse período que abri os olhos de fato para o mundo das Artes Visuais. Em que pesquisas por materiais, por artistas com os quais eu me identificava com a sua produção ficaram mais firmes. Quando dei início a minha produção fotográfica a partir de 2011, busquei mostrar narrativas da minha própria história de vida nos trabalhos. De forma um tanto quanto limitada ainda, me apropriava também de relatos de experiências de amigos. E cada vez mais fui amadurecendo as minhas ideias, a minha produção. Em 2012, aconteceu o que eu considero ter sido uma das grandes e mais produtivas experiências na minha vida como ser humano, como estudante de artes, como artista: consegui uma bolsa de estudos pelo Conselho Nacional do


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Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, no Programa Ciência Sem Fronteiras – CsF, o qual me permitiu fazer um intercâmbio de estudos durante um ano na Universidade de Bolonha (UNIBO) – Itália, reconhecida como a primeira universidade do ocidente1. Múltiplas visualidades, país respeitado principalmente quando o assunto envolve as artes, cidade que transpira e respira todas as linguagens das artes visuais diariamente. Na UNIBO cursei as disciplinas: Técnicas da arte contemporânea, Laboratório de Cinema, Produção de Multimídia, e Estágio de arte, (no qual atuei novamente como mediador cultural no Museo di Pallazzo Poggi) além do curso de língua estrangeira – italiano. Todo o aprendizado acadêmico e experiências gerais contribuem hoje para a minha produção artística. Busco sempre dialogar com o pensamento de Cotton (2010), Soulages (2010), Rouillè (2009), e tenho sempre como referência a série fotográfica “Untitled Film Still” da artista estadunidense Cindy Sherman e “Cuide de Você” da artista britânica Sophie Calle, em que busco trazer um diálogo da produção artística a partir da trajetória de vida. Na arte contemporânea a fotografia nos vem apresentada de forma mais ampla, expandida. O que víamos comumente nos séculos passados, era a fotografia revelada em um papel dito adequado, ou em tecidos/camisas para comercialização. Hoje, podemos ver fotografias impressas além desses suportes tidos como tradicionais, como por exemplo a exibição das mesmas em caixas de luz (back light) 2 , tendo a iluminação acoplada dentro de uma caixa, como suporte para a fotografia que vem fixada à frente das lâmpadas, causando uma iluminação por trás da imagem fotográfica. Neste contexto, tenho como objetivo abordar a fotografia mais voltada para o retrato e autorretrato individual, contendo na composição apenas a representação de uma pessoa, e vos apresento no primeiro capítulo uma parte da produção autorretratista

na fotografia

do

século

XIX,

com

a

criação

do

primeiro

retrato/autorretrato, dialogando com a produção tanto na Europa, quanto no Brasil, com a contribuição de D. Pedro II e sucessivamente a criação dos estúdios fotográficos em nosso país. 1

http://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_de_Bolonha - acessado em 08 de agosto de 2014. Modelos de caixas de luz podem ser vistos como suporte para propagandas em paradas de ônibus, entre outros espaços. 2


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No segundo capítulo, venho tratar dessa produção na contemporaneidade, mostrando de que forma os autorretratos renascentistas feitos a partir da técnica da pintura contribuíram para o que hoje chamamos de selfie. Abordando também essa proliferação do autorretrato em redes sociais, como instagram, facebook, twitter, o uso das hashtags para identificação dos mesmos e o autorretrato fotográfico nas artes visuais a partir de conceitos abordados por pensadores que influenciam na minha produção, como por exemplo: “Autorretrato acéfalo”, a partir do pensamento de FABRIS (2004). Além de abordar também a produção de alguns artistas brasileiros e estrangeiros que contribuem para minha pesquisa. Já no terceiro capítulo, apresento-vos a trajetória da minha produção em fotografia iniciada dentro do curso de Artes Visuais, outros artistas que influenciam no meu processo de criação, trazendo a produção artística também a partir de momentos vividos na minha trajetória pessoal enquanto ser humano, artista e pesquisador. Tendo como instrumento principal deste trabalho, a minha produção em fotografias compondo cartazes de filmes imaginários para o projeto “Cinema Imóvel”, e a exposição Pixels of Identities dentro do MORPHOS – Sustainable Empires, Festival de fotografia, vídeo-arte, instalação e arquitetura, que participei expondo o meu trabalho “Autorretrato nº 4”, na cidade de Veneza, na Itália.


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1 A TRAJETÓRIA E A PRODUÇÃO DOS RETRATOS E AUTORRETRATOS FOTOGRÁFICOS 1.1 A FOTOGRAFIA (AUTO)RETRATISTA EUROPEIA NO SÉCULO XIX Re.tra.to sm (ital rittrato) 1 Imagem de uma pessoa, reproduzida pela fotografia, pela pintura ou pelo desenho; fotografia. 2 Cópia exata das feições de alguém. 3 Pessoa muito parecida com outra, moral ou fisicamente. 4 Descrição, em prosa ou em verso, das feições ou do caráter de uma pessoa. 5 Caráter. 6 Descrição exata. 7 Cópia de alguma coisa. 8 Modelo, exemplo. R. a meio corpo: aquele que só representa a metade superior do corpo humano. R. a três quartos, Bel-art.: o que é feito numa posição intermediária entre a face e o perfil, pelo que apresenta mais ou menos as três quartas partes do rosto. R. de pé: aquele em que a pessoa é representada em pé e a descoberto.3 O semblante do retratista/retratado raramente se apresenta em momento de relaxamento ou felicidade. Em geral, a visão do artista sobre si próprio é sombria, angustiada e até mesmo cruel, quando se evidenciam defeitos físicos ou mutilações. 4

Muito se trata de fotografia na contemporaneidade; os retratos e autorretratos, palavra atualmente resumida para a expressão inglesa selfie, originariamente vinda de selfportrait, em que grande parte das pessoas exibem uma identidade construída como uma forma de ostentação para o próprio ego e para a sociedade. Feita em formato bidimensional e possivelmente palpável, na contemporaneidade vem com a possibilidade de exibição digital diretamente nas redes sociais, como forma de atingir um maior número de admiradores, fãs, curtidas. Não muito diferente no século XIX, os retratos eram encomendados inicialmente pela burguesia como uma forma de vanglória, de ostentação. Vemos como principal característica, a representação do corpo humano e principalmente do rosto como primeiro plano e fator principal para a composição da imagem. Desde 1826, após dez anos de pesquisas constantes realizadas pelo francês Joseph Nicéphore Niepce na primeira tentativa bem sucedida de uma imagem feita a partir da ação direta da luz, até os dias atuais, ressaltando principalmente a descoberta decisiva da fotografia em 1835 a partir de um incidente causado pelo também francês Louis Jacques Mandé Daguerre, que despretensiosamente guardou uma chapa de cobre revestida com prata e sensibilizada com iodeto de prata em um armário e obteve a primeira imagem permanente, entendemos a fotografia como

3 4

Retrato – Dicionário Michaelis Auto-retrato – Enciclopédia Itaú cultural.


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prova de uma realidade, “testemunho de verdade”5 de uma fragmentação (recorte espacial), que é determinado assunto selecionado do real, ocorrido e registrado, congelado em sua natureza documental. No ano de 1839, pouco após a descoberta do daguerreótipo (1835), tivemos o registro do primeiro retrato fotográfico da história, feito por Robert Cornelius, um químico da Filadélfia. Na verdade, a imagem feita pelo supracitado, se tratava de um autorretrato produzido utilizando o mesmo processo desenvolvido por Louis Daguerre, do positivo-direto em uma folha de cobre espelhada, coberta com uma fina camada de cristais de prata sem o uso do negativo, porém, com algumas alterações, que tornava menor o tempo de exposição dos objetos.

Imagem 4- Primeiro retrato / autorretrato fotográfico feito por Robert Cornelius – 1839 Fonte: Site Focal Fixa

5

KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. 4.ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009. P. 19.


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Com rapidez, o daguerreótipo, a então máquina desenvolvida por Louis Daguerre, foi inserido no comércio e uma parte da população teve acesso ao mesmo.

Contudo, devido ao alto custo dos materiais e a necessidade de

conhecimentos técnicos, leitura de manuais, podemos afirmar que em grande parte a aquisição do aparelho deu-se principalmente por parte dos fotógrafos que de imediato investiram na criação de estúdios, proporcionando com essa inovação o crescimento econômico do mercado impulsionado pela Revolução Industrial, levando os burgueses com seu ar de vanglória a procurarem essa nova forma de se expor a amigos e à grande massa como demonstração de magnitude. Nesta época, a única fonte de luz para a fotografia era a luz solar, portanto os estúdios eram propositalmente montados nos últimos andares dos prédios, trocando muitas vezes os telhados comuns por de vidros e/ou grandes janelas, possibilitando uma melhor penetração da luz do sol para uma melhor composição/resultado da imagem. (imagem 5 e 6).

Imagem 5 - Casa-Museu Carlos Relvas, 1871. Fonte: Site Tinta fresca


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Imagem 6 Estúdio fotográfico europeu do século XIX. http://www.slideshare.net/OswaldoHernandez/retrato-fotogrfico-no-sculo-xix

Fonte:

Na imagem 5 podemos observar modelos dos janelões nos laboratórios e estúdios em grandes cidades. Já na imagem 6, o modelo do telhado adaptado para o estúdio, produzido com placas de vidros. O tecido utilizado como fundo de imagens nas fotografias, era propositalmente posto de frente para a entrada da luz. Com toda essa produção e consequentemente alto custo para os fotógrafos e artistas, para se ter uma fotografia em Paris, era necessário desembolsar no mínimo 50 francos 6 . Um valor não acessível para pessoas desprovidas de uma boa economia.

6

FABRIS, Annateresa. Fotografia: usos e funções no século XIX. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. P. 09. A autora cita como exemplo as fotografias feitas por um fotografo especifico, no caso, André Adolphe-Eugène Disdéri.


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Mudanças ocorreram e o daguerreótipo permaneceu insistentemente no mercado até por volta de 1860. Já existiam novas formas e equipamentos que facilitavam a produção fotográfica. Um pouco antes, em 1854, o custeio do retrato diminuiu e passou a ser mais acessível àqueles que até então não tinham a oportunidade de possuir essa oitava arte com a sua representação. Tal fato ocorreu a partir da criação dos cartões de visita fotográficos (carte de visite photographique) desenvolvidos pelo então francês, André Adolphe-Eugène Disdéri. Fotografias que ampliam o campo de ação dos retratos, criando novas formas de concepção e apresentação da imagem, a partir das mesmas técnicas utilizadas até então, porém, com um menor tempo de revelação por seu formato em pequena escala. Isso proporcionava ao fotógrafo mais tempo para uma maior produção das imagens, demonstrando acima de tudo um interesse mais prático e comercial disponível para todas as classes. No intuito de aumentar suas economias, Disdéri ver-se forçado a aumentar também o seu número de clientes e consequentemente as encomendas por retratos, usando todos os artifícios possíveis para seduzir a clientela. Como o próprio nome já diz, tais fotografias são “cartões de visitas”, utilizadas para serem repassadas como lembranças, assim como, trocadas entre as pessoas. Para entendermos melhor essa mudança no valor dos retratos fotográficos, as imagens produzidas por Disdéri mediam 6 x 9 centímetros, segundo Annateresa Fabris (2008), e traz como inovação a produção em série a partir de uma tomada simultânea que produz imagens idênticas. Cada ser fotografado pode adquirir 12, 24 ou 36 imagens iguais, tendo a oportunidade de retornar ao laboratório/estúdio fotográfico posteriormente, para a aquisição das mesmas imagens, uma vez que o negativo permanece arquivado no estabelecimento. “Uma dúzia de cartões de visita custava vinte francos, enquanto um retrato convencional não saía por menos de cinquenta ou cem francos”. (FABRIS, 2008, p. 20). Muito ambicioso por dinheiro e interessado em riqueza, Disdéri chega a patentear a sua criação e abre o mais famoso laboratório/estúdio fotográfico na Europa nesse período. Com todo o reconhecimento e fama, tudo isso ainda parecia ser pouco para Disdéri. Pois, diferenciando-se dos retratos convencionais feitos até então, onde a imagem era composta apenas pelo busto ou meio corpo do representado, com as cartes de visite novamente o mesmo inova e dá início a sua produção em retratos mostrando o corpo inteiro do retratado, trazendo também toda a encenação teatral


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na composição do cenário que compõe o retrato fotográfico, pois telões pintados com cenas de paisagens, decorações exóticas com forte referência do estilo Barroco, colunas, cadeiras, tapetes, entre outros objetos, foram inseridos no retrato. Além disso, indumentárias eram oferecidas a seus clientes, trajes elegantes para que os de classe menos favorecida pudessem aparecer de forma alinhada, distintas das suas vestimentas do dia-a-dia. Entretanto, alguns retratados optavam por mostrar na tão desejada imagem, sua própria personalidade, e com isso, posavam orgulhosamente com seus objetos de trabalho. Com o sucesso do estúdio de Disdéri, os demais ateliês da cidade resolvem investir na mesma ideia e passam a criar os cenários teatrais para a composição dos retratos. Para não se “rebaixar” à classe menos econômica, os burgueses investiam nas fotografias de grande formato, optando também pelos retratos pintados. Mas não é que todos os inseridos na burguesia estavam concentrados a não fazerem as cartes de visite, quando se propuseram a tal, ficou quase impossível não saber distinguir as diferenças sociais quando se observava o retrato de um senhor burguês e de um senhor apresentado como comum. O pobre travestido de rico não se caracteriza apenas por uma pose demasiado rígida. Trai seu acanhamento na timidez com que se localiza num ambiente estranho e nas roupas que não lhe servem, muito justas ou muito largas, corroborando a informação de Carlos Lemos de que havia fotógrafos que forneciam a seus clientes vestes descosturadas nas costas para que se ajustassem a todo tipo de talhe. (FABRIS, 2008, p.21)

A moda tinha um papel respeitável nessa época, por isso a importância das vestimentas na hora do retrato. Mas com tal situação supracitada, os retratos dos senhores e senhoras da alta sociedade se diferenciavam dos demais feitos pelos menos favoráveis economicamente, uma vez que até observando a expressão facial das duas classes retratadas, era possível dizer quem era o rico e quem era o pobre, mesmo com toda a mis-en-scéne, que apesar de tudo, primava pelo conforto do cliente, devido ao tempo que o retratado permanecia posando e em seguida no atelier até a finalização do serviço. A escolha da vestimenta, ideias da possível posição oficial que ficaria o cliente, escolha de cenário, tudo era decido pelo retratado antes de dirigir-se ao estúdio, posicionar-se, e o fotógrafo fazer o esperado retrato. A moda sempre presente influenciava na escolha de todos os elementos. Existiam geralmente três tipos de painéis postos ao fundo; para dar uma profundidade na imagem, alguns traziam pinturas com representações de


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perspectiva dos salões europeus, ricos em arabescos e detalhes arquitetônicos; outros, traziam representações de paisagens, sempre com a inspiração do universo europeu; e em outros casos eram colocadas cortinas e mobílias que davam maior comodidade e conforto ao retratado durante o período de exposição em frente à câmera. Vejamos os detalhes nas imagens abaixo:

Imagem 7. Fonte: LEITE, Marcelo. Interin, 2011.

Imagem 8. Fonte: Marcelo. Interin, 2011.

Imagem 9. Fonte: LEITE, Marcelo. Interin, 2011.

LEITE,


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Podemos observar nas imagens acima, as principais características das fotografias cartes de visite. Além dos elementos anteriormente citados, devemos saber que as fotografias eram reveladas utilizando a técnica de impressão em albumina, que por desenvolver maior contraste e evidenciar imagens com maior riqueza de detalhes, fez crescer a procura pelo mesmo. Chegando a ser fabricado de forma industrial ainda no ano de 1854, o papel albuminado tornou ainda mais prático o trabalho do fotógrafo. As molduras que as acompanhavam, conhecidas por suas clássicas bordas arredondadas, mudavam de acordo com o atelier. Eram fabricadas em uma espécie de papel cartão rígido um pouco maior que a fotografia, 6,5 x 9,5 cm ou 7,0 x 10 cm comumente, permitindo um espaço maior para a assinatura do fotógrafo e divulgação do seu atelier (imagens 7 e 8), além de servirem como suporte para proteger as imagens, evitando que ao serem manuseadas e repassadas como uma lembrança, as pessoas tivessem contato direto com a fotografia, impedindo maior desgaste. Como as poses dos retratados eram escolhidas em um diálogo entre fotógrafo e fotografado, os estúdios dispunham de revistas e catálogos de moda da época, com imagens de modelos em posturas diversas, além dos álbuns de controle, que permitiam a visualização de fotografias feitas anteriormente no mesmo estúdio. Mas como era necessário um tempo de no mínimo 5 minutos parado na mesma posição, uma vez que, cada movimento, por menor que fosse, viria a interferir no resultado final da fotografia, deixando-a tremida e desfocada, foram criados suportes chamados de descansos de ferro, que seguravam os modelos vivos ou mortos com estabilidade na posição escolhida para ser retratado.

Imagem 10. Descanso de ferro. Fonte: http://www.slideshare.net/OswaldoHernandez/retratofotogrfico-no-sculo-xix


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Devia-se portanto, ter o cuidado para que a estrutura de ferro não aparecesse na fotografia. Na América do Sul como veremos mais adiante, os fotógrafos aderiram a ideia de Disdéri, e dentre os estúdios mais conhecidos podemos citar os das imagens 7 e 9, feitas respectivamente no atelier Photographia Allemã, em São Paulo, e Fotografias Montevideo, no Uruguai.7 Um outro fator importante que veio a ocorrer nas fotografias de caráter industrial nesse período, foi a intervenção na imagem fotografada. Retoques feitos com lápis, e muitas vezes com carmim, corante extraído da cochonilha, e processos de esfumação utilizando grafite e esfuminho, e até mesmo retoques de coloração utilizando óleo, aquarela e anilina. Todo esse trabalho inicialmente pensado e realizado por razões técnicas, por pequenas falhas que devido ao longo período de exposição, levava detalhes pequenos como os olhos à quase desaparição, ou muitas vezes retratado em um tamanho inferior ao real; também pela ausência de cor que vinha se tornando um impasse nas encomendas das cartes de visite, não dialogando com a verossimilhança do real. Para a coloração na fotografia, o fotógrafo já obtinha de informações necessárias para desenvolver tal trabalho, como por exemplo: a cor da roupa, do sapato, da pele do cabelo e dos olhos do modelo. Trazendo na pintura feita sobre a fotografia, a ideia de representação mais próxima da realidade. Devemos lembrar que no processo de daguerreotipia, essas intervenções não se faziam necessárias para que pequenos detalhes pudessem ser bem representados.

1.2 O RETRATO E O AUTORRETRATO FOTOGRÁFICO NO BRASIL IMPERIAL

Em 1824, aportou na cidade do Rio de Janeiro o francês Antoine Hercule Romuald Florence. Reconhecido por seus preciosos desenhos, logo é solicitado para viajar em uma expedição científica com uma equipe pelo norte do Brasil, ficando responsável por registrar as imagens em desenho. Após anos de trabalhos diversos como desenhista, como caixeiro numa casa de roupas, e também vendedor de tecidos, vendo as dificuldades com relação à comunicação impressa, e a

7

LEITE, Marcelo Eduardo As fotografias cartes de visite e a construção de individualidades. Interin, Curitiba, v. 11, n. 1, p. 01-16, jan./jun. 2011.


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necessidade de criar uma oficina impressora, criou em 1832, poucos anos antes de Daguerre, o seu próprio instrumento de impressão, chamando-o de Poligraphie. Com o breve conhecimento da importância do nitrato de prata, iniciou seus estudos sobre a fotografia, tendo suas primeiras experiências com a câmera obscura datadas em janeiro de 1833. Decide em seguida utilizar um novo método de reprodução “artesanal” no qual utiliza a luz natural solar. Em linhas gerais, Florence levou adiante seu objetivo utilizando-se de pranchas matrizes de vidro recobertas com uma massa constituída de goma arábica e fuligem; com o buril delineava seus desenhos e textos e os copiava, por contato, sob a ação da luz do sol em papéis sensibilizados com cloreto de prata e, preferencialmente, cloreto de ouro, obtendo imagens printout. (KOSSOY, 2002, p.142-143).

Ainda com suas pesquisas sobre a fotografia, de acordo com o pensamento de Kossoy, Florence foi o primeiro a utilizar o termo “Photographie” em 1833/34, cinco anos exatos antes que o nome viesse a ser usado pela primeira vez na Europa.8 Assim como Florence, outros pesquisadores conseguiram com materiais símiles ou diversos reproduzir imagens utilizando a luz do sol. Mas o registro do primeiro daguerreotipo feito no Brasil é consolidado a outro francês, o abade Louis Compte, capelão do navio-escola franco-bela L’Orientale, que estava dando a volta ao mundo e chegou ao Brasil em 17 de janeiro de 1840, (cinco anos após a descoberta do daguerreotipo na Europa). Toda a sua produção em fotografia no Brasil ocorreu na região central da cidade do Rio de Janeiro, sendo a primeira imagem aqui feita, a representação do Paço Imperial na cidade carioca. Não diferente do ocorrido na Europa, o processo foi apresentado primeiramente àqueles que faziam parte da alta sociedade. O Imperador D. Pedro II, interessado pela nova mídia do século, ainda com seus 14 anos de idade, foi um dos pioneiros a conhecer a técnica e adquirir seu próprio equipamento para uso próprio e para melhor se familiarizar com o processo, encomendando seu daguerreotipo em Paris, e tornando-se o primeiro cidadão de origem brasileira a realizar uma fotografia.

8

KOSSOY, Boris. Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). P. 37. Instituto Moreira Salles. São Paulo, 2002.


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O registro dos primeiros retratos contendo como foco principal o rosto humano, o meio corpo e até mesmo a representação completa do corpo humano, de forma individual por frames, antes das inovadoras cartes de visite em nosso país, deu-se a partir do daguerreotipista norte-americano Augustus Morand, que residiu e trabalhou na Rio de Janeiro entre 1842 e 1843 e foi possivelmente o primeiro a retratar o Imperador D. Pedro II, acreditando-se que no período em que Louis Compte esteve no Brasil, as imagens feitas pelo mesmo eram de representações de paisagens e prédios ricos em detalhes arquitetônicos no Rio de Janeiro. Foi Morand, juntamente com seu sócio Smith, um dos responsáveis pela criação de um dos primeiros estúdios fotográficos no Brasil, localizado na casa nova do hotel Pharoux, no largo do paço. Retomando à questão da fotografia comercial, é comum nos perguntarmos quanto era preciso desembolsar para se ter um retrato, um autorretrato aqui no Brasil durante esse período. Muitos dos fotógrafos tinham outras profissões, desde dentistas a ourives, relojoeiros, cabeleireiros e comerciantes. No Ceará, um joalheiro e fotógrafo que se destacou por seu trabalho, foi o Michel Torá, em meados de 1860, que além do seu trabalho com as vendas de joias, se utilizava da fotografia para presentear com um brinde os seus clientes que adquiriam determinado valor nos produtos. O brinde nesse caso, eram 6 retratos em formato cartes de visite. Vale aqui fazer uma ressalva, trazendo a importância do primeiro autorretrato fotográfico no Brasil ter sido feito pelo então fotógrafo amador, o Imperador D. Pedro II9 em 1855 aos 29 anos de idade.

9

http://iconica.com.br/site/170-anos-de-fotografia-no-brasil-viva-a-fotografia-brasileira/


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Imagem 11 – Autorretrato D. Pedro II (1855) Fonte: Site iconica.com.br

Como grande parte da população não tinha na época, condições de assim como D. Pedro II, obter seu próprio daguerreótipo e precisavam se deslocar aos estúdios para adquirirem seus retratos, veremos nas tabelas a seguir, de acordo com a pesquisa para a tese de livre docência de Boris Kossoy, defendida em 2000, quanto as pessoas pagavam em réis aqui no Brasil, em diversos Estados e períodos, por um retrato:

1840 - 1849 Ano

Produto/Serviço

Preço

Nome

Local

1842

Daguerreotipo*

5$000

Schmidt, H.

Rio de Janeiro

1843

//

5$000

Anônimo 1

Bahia

1844

//

5$000

Gerbig, C.

Rio de Janeiro


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1845

//

6$000

Roberto

Pernambuco

1847

//

5$000

Micolci, C.

Bahia

1848

//

5$000

Walter, F.

Ceará

*formato não determinado Quadro 1 - KOSSOY, Boris. Fonte: Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). P. 29. Instituto Moreira Salles. São Paulo (2002).

1850 - 1859 Ano 1850

Produto/Serviço

Preço

Nome

Local

Daguerreótipo*

4$000

Paul, J.

Rio de Janeiro

1850

Calótipo*

3$000

Anônimo 7

Rio de Janeiro

1857

Daguerreótipo**

6$000 a

Villela, J.F.

Pernambuco

Azzaly, J.

Santa

16$000 1859

Ambrótipo**

3$000 a 30$000

*formato não determinado

Catarina

**conforme formato ou acabamento

Quadro 2 - KOSSOY, Boris. Fonte: Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). P. 30. Instituto Moreira Salles. São Paulo (2002).

Para quem não viveu tal temporada onde a moeda utilizada no Brasil era o réis, devemos entender que em seguida veio o cruzeiro e posteriormente o real. E que por exemplo, 5$000 réis foi equivalente a CR$ 5.000,00 cruzeiros e equivale R$: 1,81818 reais. Entendendo que o último valor cobrado em Cruzeiro Real em 30/06/1994, foi CR$ 2.750,00 e corresponde a R$ 1,00, moeda em vigor desde 01 de Julho de 1994. Veremos abaixo uma outra tabela, divulgada pelo Jornal do Commercio em 1854, com preços de alguns produtos a venda no mesmo período. Podendo assim, fazermos um comparativismo para melhor compreendermos também, o que mais poderia ser comprado com o valor pago em uma fotografia.


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Produto

Preço

Bacalhau (arroba*)

2$500

Chouriço (libra**)

$320

Gravata de seda ou cetim

1$500 a 2$400

Luvas de pelica

$320 a 1$200

Papel de parede (peça)

1$000

Pêras

em

lata

de

Lisboa 1$200

(Libra**) Tecido para escravos *equivale a 14,69 quilos

$140 **equivale a 459,5 gramas

Fonte: Jornal do Commercio (1854) Quadro 3 - KOSSOY, Boris. Fonte: Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). P. 30. Instituto Moreira Salles. São Paulo, (2002).

Na década de 1860 ocorreu uma mudança no mercado fotográfico que interfere diretamente nesses valores cobrados por um retrato. Já existe um maior número de estúdios, evidentemente concorrentes. Se no início dos anos 1860 uma dúzia de cartes de visite custava 15$000, em um estúdio no mesmo local em meados de 1869 esse valor caiu por mais de 65%. O valor pago então, passou de 15$000 para 5$000, como podemos observar na tabela abaixo:

1860 - 1869 Ano

Produto/Serviço

Preço

Nome

Local

1862

Carte de visite (dúzia)

15$000

Camara, N.P.

São Paulo

Ambrótipo

2$ a

Camara, N.P.

São Paulo

10$000 1863

Carte de visite (dúzia)

15$000

Basto, M.

Rio de janeiro

Ambrótipo

3$ a

Basto, M.

Rio de janeiro

12$000 1863

Carte de visite (dúzia)

15$000

Vasconcellos, T.A.

Rio de janeiro

1863

Carte de visite (dúzia)

15$000

Ribeiros, M.A. da

Rio de janeiro


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S. 1864

Carte de visite (dúzia)

10$000

Nogueira, P.J.

Rio de janeiro

Ambrótipo

3$ a

Nogueira, P.J.

Rio de janeiro

30$000 Carte de visite (dúzia)

6$000

Villa, G.

Rio de janeiro

Ambrótipo

3$000

Villa, G.

Rio de janeiro

1867

Carte de visite (dúzia)

10$000

Janvrot, A.

Rio de janeiro

1867

Carte de visite (1/2

6$000

Potter, G.

Amazonas

4$ a

Potter, G.

Amazonas

1865

dúzia) Ambrótipo

10$000 Ferrótipo

10$000

Potter, G.

Amazonas

1868

Carte de visite (dúzia)

10$000

Sampaio, P. de

Ceará

1869

Carte de visite (dúzia)

6$000

Barros, J.J. de

Rio de janeiro

1869

Carte de visite (dúzia)

5$000

Villa, G.

Rio de janeiro

1869

Carte de visite (dúzia)

5$000

Vasconcellos, T.A.

Rio de janeiro

Quadro 4 - KOSSOY, Boris. Fonte: Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). P. 31. Instituto Moreira Salles. São Paulo (2002).

Com essa diminuição no valor das cartes de visite, houve um aumento no número de encomendas vindas também daqueles com menor poder financeiro, mas que desejavam ter a sua imagem reproduzida bidimensionalmente nas fotografias. Entre os daguerreotipistas, fotógrafos profissionais da época, atuantes no Brasil, o que teve maior destaque foi o Alemão Alberto Henschel, que chegou a Recife – PE em maio de 1866 e começou

atuando no Estado, intitulando seu

estúdio de Alberto Henschel & Cia, mudando posteriormente para Photographia Allemã. Em seguida passou a trabalhar com sua equipe em Salvador e posteriormente nas cidades Rio de Janeiro e São Paulo. Abrindo três estúdios fotográficos em somente dois anos no Brasil, ficou conhecido como o empresário da fotografia no País, fazendo imagens paisagistas e retratos, cujo trabalho hoje permite-nos entender

com visualidade a história do

nosso passado. Nas imagens 12 e 13, podemos ver retratadas as duas classes econômicas do nosso país e a diferença na expressão facial de ambos.


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Imagem 12. Fonte: fotogravura.blogspot.com.br

Imagem 13. Fonte: portaldarte.com.br

Alberto Henschel, entre outros, ficou conhecido no país como o Photographo da Casa Imperial na segunda metade do século XIX, retratando o cotidiano da família em seu segundo reinado, e ocasionando maior procura dos demais por seu trabalho e concomitante a valorização nos valores da sua produção. Como já citado inicialmente, vimos que a iluminação dos retratos nos salões de fotos desse século ocorria através da luz natural. No Hemisfério Norte, devia-se ter o salão defronte para o norte, para que o estúdio não fosse atingido diretamente pelos raios solares. Já no Brasil ocorre o contrário, a face sul é que deveria ser a utilizada. Com a ajuda das cortinas era possível obter a iluminação mais desejada na época, para compor a imagem; claro e escuro poderiam ser controlados.


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Imagem 14 - KOSSOY, Boris. Fonte: Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). P. 37. Instituto Moreira Salles. São Paulo, (2002).

Outro fator que podemos observar, inclusive na imagem acima, é que homens eram maioria nos estúdios durante esse período. Tanto como fotógrafos, como clientes. O que não significa consequentemente que as mulheres não estivessem presente nessa produção, uma vez que as mesmas, em maior parte aquelas com maior poder financeiro inevitavelmente, estavam frequentemente representadas nas carte-de-visite. Com esse aparato de informações, podemos pensar sobre como ocorreu essa produção em autorretrato fotográfico na arte contemporânea. Os selfies e essa fotografia divulgada não mais necessariamente em galerias, museus, como troca de lembranças, mas também voltada para as redes sociais.


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2 O AUTORRETRATO FOTOGRÁFICO NA CONTEMPORANEIDADE 2.1 A TRAJETÓRIA DOS SELFIES

Inicio este capítulo trazendo a fotografia na contemporaneidade tratando dos selfportraits, selfies, autorretratos. Não podemos esquecer que essa prática não teve início na nossa atualidade, mas que já percorre quase dois séculos desde a primeira tentativa registrada de se auto representar utilizando uma câmera fotográfica e não mais o desenho, a pintura rupestre ou a pintura a partir da tinta óleo, fabricada pelos próprios artistas como era comum nos séculos passados. Mas, o que de fato significa selfie? Como já falado anteriormente, há no ser humano uma intenção de se ver representado pela melhor forma possível no que diz respeito a uma encenação que nos permite melhor aparição em imagens. A pintura é capaz de nos reproduzir em uma tela, ou outros suportes, mostrando-nos uma bela composição. Mas, é visível que com o advento da fotografia uma outra forma do processo de reprodução em formato bidimensional passou a acontecer de maneira mais rápida que a pintura. Além disso, tivemos ainda a fotopintura que nos permite um melhor aperfeiçoamento por cima da fotografia. Um photoshop do século passado, utilizado ainda hoje, no qual por meio da pintura é possível dar cor a fotos em preto e branco, e criar elementos que até então não estavam presentes na imagem, como colares, broches, desenhos estampados nas roupas, e outros acessórios. Mais uma forma de trazer a ficcionalidade na fotografia. Voltemos à questão inicial para que entendamos o surgimento dos selfies. Artistas renomados da história da arte sempre utilizaram sua própria imagem para a confecção de retratos, seja por meio do desenho ou da pintura. Ou seja, sempre produziram autorretratos, além de outros trabalhos. Porque então não inserirmos nessa pesquisa, artistas como o italiano Leonardo Da Vinci (imagem 15), Rembrandt Harmenszoon Van Rijn, artista holandês com seus autorretratos, principalmente o produzido em 1640, retratando-o aos seus 34 anos de idade (imagem 16), no qual vemos presente a representação do seu busto como elemento principal da composição; ideia que vem sendo utilizada nessa pesquisa como a escolha dos


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autorretratos; e o artista, tambĂŠm holandĂŞs, Vincent Van Gogh (imagem 17). O Conceito de selfie se aplica a estes trabalhos?

Imagem 15 - Leonardo Da Vinci, Autorretrato, Desenho (1512) Fonte: DisponĂ­vel em: http://www.theartwolf.com/self-portraits/leonardo-autorretrato.htm


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Imagem 16- Rembrandt, Detalhe da obra: Autorretrato aos 34 anos, รณleo sobre tela (1640) Fonte: http://www.sabercultural.com/template/obrasCelebres/Rembrantautorretratos.html

Imagem 17 - Vincent Van Gogh, Autorretrato como artista, รณleo sobre tela (1888) Fonte: http://www.vangoghgallery.com/es/catalogo/pinturas/2111/Autorretrato-delante-delcaballete.html


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O conceito de selfie nasce de um neologismo como um abreviamento do substantivo selfportrait que significa autorretrato, e limita-se que a palavra surge a partir da expressão inglesa self “eu”, “própria pessoa” em junção com o sufixo ie – ou selfy, para designar “um tipo de fotografia de autorretrato, normalmente tomada com uma câmera fotográfica de mão ou celular com câmera”.10 A partir dessa definição supracitada, deveríamos entender que os trabalhos dos artistas mencionados anteriormente não se enquadrariam no padrão selfie, mesmo sendo intituladas de self-portraits. Mas é possível que na nossa contemporaneidade esqueçamos essa importante produção em desenho, pintura e seus títulos, e até mesmo esculturas, para definirmos essa tendência na fotografia, uma vez que a história da fotografia na história da arte surge também em decorrência da pintura e consequentemente do desenho? O termo selfportrait já era utilizado nas pinturas do renascimento. O que acontece hoje é a utilização apenas da abreviação, selfie, a qual com o advento da internet e redes sociais, juntamente com as famosas hashtags11 e concomitante a isso a evolução e massificação dos celulares smartphones, entre outros, e a facilitação de se andar com uma câmera fotográfica no bolso, poder erguer o braço com o celular apontado para si e obter sua própria imagem fotográfica e digital, foi possível a banalização do termo mais utilizado em 2013, segundo o dicionário inglês Oxford English.12

2.1.2 SELFIES

Pelo tamanho das primeiras máquinas fotográficas, entendemos que não era tão simples quanto atualmente autorretratar-se tendo como resultado final uma fotografia. Principalmente quando o próprio autorretratado deveria manter a câmera devidamente segura em suas mãos, considerando questões como o tempo de exposição para penetração da luz, a permanência do corpo e dos braços em estado 10

http://pt.wikipedia.org/wiki/Selfie Hashtag é uma expressão utilizada entre nas redes sociais. “Consiste de uma palavra-chave antecedida pelo símbolo #, conhecido popularmente no Brasil por ‘jogo da velha’ ou ‘quadrado’. As hashtags são utilizadas para categorizar os conteúdos publicados nas redes sociais, ou seja, cria uma interação dinâmica do conteúdo com os outros integrantes da rede social, que estão ou são interessados no respectivo assunto publicado. Com o uso da hashtag em uma publicação, o conteúdo ficará disponível para qualquer pessoa que acesse o mesmo hashtag sobre o assunto, permitindo-a comentar, compartilhar ou curtir o conteúdo. http://www.significados.com.br/hashtag/ 12 http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/11/131119_selfie_oxford_fn 11


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imóvel, para que o resultado final da imagem não viesse trêmulo, borrado, devido, acima de tudo, ao peso da câmera. Já vimos que o primeiro retrato e autorretrato fotográfico pertencem ao já citado no primeiro capítulo, Robert Cornelius, feito em 1839. Porém, Cornelius posicionou-se diante do seu aparelho de fotografia que estava suspenso por um outro suporte que não eram suas mãos, uma vez que, seus braços aparecem cruzados na imagem referida. Agora vejamos a o que seria a primeira foto datada já no início do século XX, da produção de um autorretrato, selfportrait ou selfie, no qual o autor se autorretrata utilizando a câmera suspensa com suas próprias mãos, como é comum vermos hoje em redes sociais.

Imagem 18 - Primeiro autorretrato (selfie) fotográfico do século XX – Joseph Byron (1909) Fonte: The Byron Collection. http://www.dailymail.co.uk/news/article-2554816/If-thought-selfiesnew-craze-think-Amazing-self-portraits-taken-pioneering-photographer-1909-Instagramshame.html


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Joseph Byron, um fotógrafo alemão, é considerado o autor do primeiro autorretrato fotográfico segurando a câmera em suas mãos, como hoje intitulamos de selfie, segundo os registros expostos pelo seu bisneto, também fotógrafo, Tom Byron. Era possível a execução de outros autorretratos fotográficos, porém as primeiras câmeras não tinham a flexibilidade de serem portáteis, assim como essa utilizada para capturar a cena representada na imagem 18. Conhecido por sua produção, Joseph Byron foi ainda o fotógrafo que fez o primeiro selfie coletivo no qual podemos ver mais de uma pessoa no enquadramento da fotografia. Abaixo, podemos ver a imagem do resultado.

Imagem 19 - Joseph Byron, selfie com amigos (1909) Fonte: The Byron Collection. Fonte: http://www.dailymail.co.uk/news/article-2554816/If-thought-selfies-new-craze-think-Amazingself-portraits-taken-pioneering-photographer-1909-Instagram-shame.html

A partir das fotografias exibidas por Tom Byron, podemos ver a seguir, a imagem do registro do exato momento em que foi produzida a selfie acima. Observemos o modelo/formato e o tamanho da câmera utilizada:


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Imagem 20 –Selfie do fotógrafo Joseph Byron com seus amigos (1909). Fonte: Acervo de Tom Byron, disponível em: http://www.dailymail.co.uk/news/article-2554816/If-thoughtselfies-new-craze-think-Amazing-self-

Como podemos ver, foi necessário que duas pessoas segurassem a câmera para obter uma imagem com melhor qualidade, evitando movimentos bruscos se a mesma fosse segurada apenas por um lado, devido ao seu peso.

2.1.3 SELFIES ATUAIS

Hoje para se ter uma fotografia, seja digital, vista apenas em computadores, tablet’s, celulares, entre outros meios, seja em formato impresso, tendo como elemento a cor pigmento, é bem mais simples do que seria com os métodos e ferramentas utilizados nos séculos XIX e XX.


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Contando também com a possibilidade de manipulação de imagens através de ferramentas como o photoshop, além de aplicativos para celulares, é possível vermos inclusive os selfies coletivos mais famosos (imagens 21 e 22), que não foram feitas tendo como intuito o registro como arte, mas que estão mais associadas ao conceito de “isto existiu”, de Roland Barthes, como prova de realidade. Inclusive essas imagens citadas, chegaram a obter o maior número de selfies compartilhadas nas redes sociais, sendo a nº 21, feita no velório de Nelson Mandela, na África do Sul, ‘retuítada’ 778.000 vezes, e a nº22, no Oscar em 2014, 1.2 milhões de vezes 13. Podemos ressaltar aqui a diferença dessas imagens para a de alguns artistas que se apropriam intencionalmente da fotografia como linguagem para a criação dos seus trabalhos.

Imagem 21 - Da esquerda para a direita: David Cameron, Helle Thorning-Schmidt e Obama. Ao lado, Michele Obama. Fonte: http://fotografiatotal.com/a-fotografia-e-a-moda-das-selfiesou-a-evolucao-do-auto-retrato#prettyPhoto

Imagem 22 - Selfie durante o Oscar 2014.Fonte:http://entertainment.time.com/2014/03/02/oscars -ellen-meryl-streep-selfie/ 13

http://entertainment.time.com/2014/03/02/oscars-ellen-meryl-streep-selfie/


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Além do termo selfie, tivemos um objeto que veio para propagar mais ainda a moda pelas redes sociais com o uso das hashtags: O pau de selfie como é conhecido, ou até mesmo bastão de selfie. Um objeto longilíneo que se assemelha a um cabo de vassoura, serve como suporte para celulares smartphones fixados a uma ponta do objeto que fica mais afastada do busto, do corpo do fotografado, proporcionando melhor enquadramento enquanto o mesmo pressiona um botão na parte inferior do objeto, fazendo automaticamente o disparo sem o toque na tela do celular.

Imagem 23 - Arnold Hogg, Primeiro autorretrato com pau de selfie (1926). Fonte: http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/fotografia-de-1926-mostra-uso-pioneiro-depau-de-selfie-14908747

Existe alguns casos recente de pessoas que dizem ter sido os criadores do objeto. Porém, nenhum desses está contando com o registro dessa imagem supracitada, na qual o britânico Arnold Hogg utiliza um bastão para se autorretratar com sua esposa no dia de seu casamento. Segundo o Jonal O POVO, “em seu rodapé a imagem ainda contém a observação ‘tirada por mim, Out, 1926’”14. Seria essa a primeira imagem a retratar a utilização do pau de selfie. Contudo, em relação ao pau de selfie atual, datado de 2014, sua origem é asiática e foi escolhido como a grande invenção do ano pela revista Time. Acredita-se que foi criado com o intuito de se fazer selfies em viagens sozinhos ou acompanhado, sem a necessidade de pedir ao outro para que fizesse o 14

http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/fotografia-de-1926-mostra-uso-pioneiro-de-pau-deselfie-14908747


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registro. Possibilitando ainda que sejam feitas várias tomadas, vários click’s, de acordo com o gosto do retratado. Vejamos a imagem a seguir:

Imagem 24 Obama com pau de selfie (2015). Fonte: http://www.opopular.com.br/editorias/mundo/obama-usa-pau-de-selfie-para-promoverprograma-1.779774

O atual presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, utilizando um pau de selfie com um iphone se auto fotografando para uma campanha do seu programa de saúde em parceria com o site BuzzFeed, este responsável pela produção do vídeo de divulgação. Além do pau de selfie utilizando o celular como mecanismo de registro, temos as câmeras GoPro em pequeno formato que fazem fotos e vídeos e são facilmente portáteis, podendo ser colocadas em um suporte semelhante ao pau de selfie, porém sem a necessidade do aparelho celular. Voltemos agora para o fotografado e os autorretratos os quais trabalharemos questões referentes a produção, o desejo e muitas vezes a necessidade de se ter uma selfie, iniciando pelos elementos do autorretrato fotográfico (selfie). Assim como nos autorretratos em desenho, pintura, escultura, as selfies nos colocam como sujeito e objeto da ação. “O autorretrato é o único retrato que reflete um criador no próprio momento do ato da criação” (DUBOIS, 1994, p.156). Sabemos ainda que em um autorretrato podemos assumir inúmeras identidades, de como gostaríamos de ser e como queremos que as pessoas nos vejam.


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Segundo BARDON (2010) 15 , existem três elementos característicos do autorretrato; são eles: pose, encenação e simulação. Três elementos básicos, que poderíamos dizer, estão presentes diariamente na prática do selfie e em outros momentos. Vendo a produção em autorretratos fotográficos na contemporaneidade, observemos o gráfico montado a partir da pesquisa de Carla Gottlieb, Apud ARAÚJO 200316:

Características mais pertinentes no autorretrato do século XX:  Cabeça fragmentada;  Autorretrato em série;  O objeto como alter-ego;  O disfarce;  O narciso;  A autobiografia visual;  O par, a família e o grupo. Quadro 5 - produção em autorretratos fotográficos na contemporaneidade. Fonte: Dados da pesquisa

A partir desses dados já podemos ver elementos que não se faziam presente no século XIX, uma vez que o ponto mais importante do autorretrato nesse período era a representação do rosto, da cabeça que identificaria o retratado como uma forma de provar sua existência. Isso deixa de ocorrer quando um retratado busca se distanciar de sua imagem tida como natural, trazendo elementos que, postos na composição do cenário e ao seu corpo, farão parecer mais com um personagem criado, fictício, trazendo uma identidade alternativa, do que de fato com uma ideia de semelhança. Há, portanto, um elemento que configura o autorretrato desde o início dos tempos; seja quando a imagem fotográfica traz a representação real do retratado, seja quando traz a representação de personagens criados para composição, (que também não deixa de ser uma realidade): a ideia de narcisismo. Aqui, o artista

15

Lílian Patrícia Bardon em O autorretrato fotográfico: encenação, despersonificação e desaparecimento. 16 ARAÚJO, Virgínia Gil. O auto-retrato fotográfico: um estudo sobre a construção fisionômica como arbitrariedade em Artur Barrio. 2003.


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busca se autorrepresentar através de um elemento principal: a imagem do seu próprio rosto. Pode acontecer que nessa produção utilizando o próprio corpo ou busto como instrumento, o artista esteja apenas aproveitando a oportunidade de sempre que quiser produzir, retratar, não haver a dificuldade de procurar modelos, pois o mesmo está naquele momento, disponível para a criação.

2.1.4 EXPLORANDO A PRODUÇÃO AUTORRETRATISTA FOTOGRÁFICA NAS ARTES VISUAIS

Comumente vemos imagens a nossa volta, fotografias, retratos, autorretratos, e talvez pouco nos questionamos sobre essa produção dentro das artes visuais, o que aborda Rouillé ao falar da fotografia feita por artistas. Veremos a seguir, reproduções de imagens dos trabalhos de artistas que estão com uma vasta produção dentro desse tema abordado, no circuito da arte contemporânea. Nesta pesquisa seria impossível abarcar todos os artistas dentro dessa temática, uma vez que a produção em autorretratos fotográficos tem um grande espaço, seja a partir da produção nacional, seja da internacional. Todos os artistas com seus trabalhos aqui analisados serviram/servem como referencial para a produção artística do autor deste trabalho, e um dos principais elementos que vem em destaque para que os mesmos fossem escolhidos, é a representação do autorretrato e a conexão dos mesmos em diálogo com suas histórias de vida, experiências que perpetram a partir do incômodo, da inquietação, a pesquisa e suas produções artísticas. Veremos como a produção dos mesmos aborda questões como a mise-en-scène, trazendo para a construção de seus autorretratos toda uma criação teatral. Portanto, iniciaremos com uma artista estadunidense, conhecida por sua produção em autorretratos fotográficos, os quais veremos retratados personagens femininos em cenas do cotidiano.

2.1.5 Cynthia "Cindy" Morris Sherman

Mais conhecida como Cindy Sherman, a norte-americana nascida aos 19 de janeiro de 1954 em Nova Jersey, é uma das artistas mais importantes da arte


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contemporânea, principalmente por sua produção em fotografia. Teve seu reconhecimento no início de 1980, mas, com sua produção voltada para a fotografia desde os anos 70. Dentre sua produção, trataremos aqui, inclusive trazendo essa produção como referencial para o autor deste trabalho, da série “Untitled Film stills”, composta por fotografias que representam frames de filmes inexistentes. Neste trabalho a artista nos mostra em fotografias preto e branco, cenas do cotidiano vivida por mulheres estereotipadas pela mídia, através de personagens criados por si. (imagem 25) Para Sherman, fotografar consiste menos em apontar a câmera para alguma coisa preexistente e fixar sua imagem na película que em criar cenários em situações imaginárias para serem oferecidas por ela, tal como acontece no cinema de ficção. A fotografia é concebida como criação dramática e cenográfica, ou como mise-en-scène, na qual a fotografa interpreta ao mesmo tempo os papéis de diretora, dramaturga, desenhista de cenários e atriz. (MACHADO, 2001, p.134, Apud BARDON, 2010, p. 8)

Podemos ver o conceito de fotografia encenada abordado de todas as formas, desde a criação do cenário pela própria artista, a criação do figurino, da pose. Toda pose é teatral, “o indivíduo deseja oferecer à objetiva a melhor imagem de si, isto é, uma imagem definida de antemão, a partir de um conjunto de normas [...]”. (FABRIS, 2004, p.34-35 apud BARDON, 2010, p. 8). Sherman, busca oferecer uma imagem convincente de seus personagens, de seus autorretratos, apesar de ser discutida por muitos se de fato seu trabalho é autorretrato 17, uma vez que a artista tenta se distanciar de sua própria imagem enquanto Cynthia Morris Sherman.

17

Das Origens à contemporaneidade do autorretrato. Centro de fotografia ESPM, 2011.


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Imagem 25 - Cindy Sherman, Untitled Film Still No.21, Black and white photograph 40.6 x 50.8 cm 16 x 20" (1978). Fonte: saatchigallery.com

Podemos observar a forte influência do cinema em suas fotografias, desde o enquadramento até os cenários criados pela artista, sejam ruas ou espaços fechados, como hotéis, entre outros, que não deixam de ter a influência da autora. A escolha do local faz parte do processo de encenação. É o que nos permitirá fazer uma maior leitura de seu trabalho e possivelmente contextualizá-la. Digamos que o cenário seria uma das primeiras cenas pensadas para compor a imagem.

2.1.6 LAÍS PONTES

Artista Brasileira, nascida em Fortaleza, atualmente residente em Londres, fez sua especialização nos Estados Unidos onde desenvolveu seu projeto “Born Nowhere”, que em tradução livre significa “Nascida em lugar nenhum” e é composto por uma série de 25 autorretratos de personagens femininos, criados a partir de estereótipos que a mesma ouvia sobre como são as mulheres brasileiras e de outras nacionalidades.


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Imagem 26 – Laís Pontes, Julia, 2011. Fonte: facebook.com/laispontes

Imagem 28 - Laís Pontes, Lucia (2011). Fonte: facebook.com/laispontes

Imagem 27 – Laís Pontes, Stacy, 2011. Fonte: facebook.com/laispontes

Imagem 29 - Laís Pontes, Camila Angel

2011.

facebook.com/laispontes

Fonte:


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Além de criar os personagens para as fotografias, Laís Pontes insere-as nas redes sociais mantendo um diálogo com os expectadores. Cada personagem tem uma idade, informações a seu respeito, e dividem uma coisa em comum, nasceram em lugar nenhum, que intitula o projeto da artista. O público que acompanha o seu trabalho no facebook, pode deixar comentários abaixo das imagens postadas nos álbuns, sobre como imagina ser aquela mulher, aquele personagem. Stacy, uma de suas personagens, tem sua própria página no facebook, espaço em que a mesma posta fotos de suas viagens e mantém uma interação direta com o expectador. Sobre a criação dos personagens, Laís Pontes fala: Elas surgem inspiradas em diferentes sentimentos: felicidade, raiva, ansiedade, saudade. Algumas representam fantasias sobre a vida alheia. Eu passo algum tempo atuando da maneira que penso que os personagens agiriam: vendo filmes, ouvindo música, indo a lugares que elas iriam e interagindo com pessoas que ela gostaria de ter como amigos. Escolho uma roupa e uma maquiagem baseada nesta personalidade que imaginei. Eu gasto de sete a 10 horas de photoshop para criar a estética de cada uma. Depois, posto no facebook e os usuários comentam as características delas e ajudam a delinear melhor a personalidade de cada uma, desde o nome até características psicológicas e a história de vida de cada uma. A partir dos comentários construo as biografias. (PONTES, 2015). 18

Podemos observar que diferente dos autorretratos de Cindy Sherman, Laís Pontes traz nesse seu projeto um cenário mais minimalista, como se uma parede coberta por uma tinta cor de cinza ou um tecido posto para que a imagem de fundo não venha a interferir diretamente em seus personagens.

2.1.7 - AUTORRETRATOS ACÉFALOS

Chegamos aqui, a um ponto importante da fotografia na arte contemporânea. “O que importa num retrato fotográfico não é a identidade, e sim a alteridade secreta, aquela máscara que torna o indivíduo singular, que o transforma em ‘coisa entre as coisas’”. (FABRIS, 2004, p.14 apud BARDON, 2010, p. 11). Os retratos e autorretratos não trazem a necessidade da presença visual do busto na composição da imagem, principalmente do rosto humano. Um autorretrato acéfalo permite que o objeto principal que identifica o retratado e/ou o autorretratado sejam objetos que os mesmos utilizam no seu dia-a-dia, “exclui‘-se’ a parte do corpo que constitui os 18

Entrevista cedida para o site Moda para http://www.modapraler.com/2015/03/lugar-nenhum-aqui-agora.html

ler.

Disponível

em:


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elementos principais de identificação do indivíduo, evitando fazer referências de sua identidade”. (FABRIS, 2004, p.11) Logo, o autorretrato e o retrato podem ser compostos por qualquer outra parte do corpo a qual não apareça a imagem do rosto; por uma peça de roupa, acessórios, objetos que são ou fazem parte do circulo diário do retratado. Por isso, a afirmação de CANTON, 2001 (apud PEREZ, p.3789) 19 quando diz que na construção do autorretrato contemporâneo pode não se ter mais aquela representação narcísica do autor, presente nos autorretratos do renascimento. John Coplans, artista britânico que vem trabalhando com a fotografia desde 1984 tem se apropriado da linguagem fotográfica com foco no registro do seu próprio corpo. Em seu trabalho “Costas com os braços acima” (imagem 30), podemos ver a imagem de um autorretrato acéfalo construído 31 anos atrás. Não vemos imagens dos elementos que compõem o seu rosto, muito menos do rosto completo, vemos suas costas e suas mãos acima dos ombros causando-nos uma sensação de surrealismo. Não é possível vermos nem mesmo a representação do pescoço do artista. O próprio está virado sobre os seus peitos e sua barriga propositalmente para que não vejamos nada além de suas costas e suas mãos, que expressam uma força nitidamente visível.

PEREZ, Karine Gomes. Autorretratos contemporâneos: revelando uma “identidade-idem” ou subvertendo a lógica do espelho? UFSM, 2010. Disponível em: http://www.anpap.org.br/anais/2011/pdf/cpa/karine_gomes_perez.pdf 19


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Imagem 30 - John Coplans, Self-portrait. Back with Arms Above, Fotografia, 1984. Fonte: www.tate.org.uk

Imagem 31 – John Coplans, Self-portrait, Hands Spread on Knees, Fotografia, (1985). Fonte: www.tate.org.uk


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Em “Autorretrato, Mãos sobre os Joelhos” (imagem 31) temos outro exemplo do assunto que estamos tratando. A imagem é composta pela representação dos punhos do artista e parte de suas pernas mostrando seus joelhos. As mãos firmemente sobre os joelhos, segurando o peso da parte superior do seu corpo. Vejamos agora outros exemplos:

Imagem 32 - Diêgo de Oliveira – Autorretrato nº 6 | Frame de filme Imaginário-2014. Fonte: Do autor.

Acima, podemos ver um outro autorretrato construído a partir de diferentes partes do corpo sem a presença figurativa do rosto, como fez Coplans. “Autorretrato nº 6” faz parte de uma série de fotografias para o projeto “Cinema Imóvel”, tendo neste caso como propósito, a atuação do corpo do artista para o seu próprio olhar. No sentido de como o mesmo se posiciona para a câmera, como gostaria de ser autorretratado. Não está inserido, porém, na série dos cartazes de filmes imaginários. Vem apresentado como um frame de um filme, assim como os “Untitled Film Stills” de Cindy Sherman já citados.


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Imagem 33 – Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 5, 2014. Fonte: Do autor.


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Imagem 34 - Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 3, 2011. Fonte: Do autor

Acima, mais exemplos do conceito aqui abordado. Em “Autorretrato nº 5”, o rosto desfigurado pela presença de folhas, flores e galhos que compõem a imagem. Não é possível observamos a composição completa do rosto contendo olhos, nariz e boca. Em “Autorretrato nº 3”, não se vê na imagem a presença de elementos que formam o corpo humano, tampouco a imagem mais comum na representação de um autorretrato, que seria o rosto. Elementos utilizados no dia-a-dia pelo próprio autor da imagem compõem o trabalho. Por fim, Partindo do suposto de que o narcisista se considera auto suficiente a partir da sua imagem e seu reflexo, John Coplans e Diêgo de Oliveira trazem nos exemplos acima um considerável distanciamento do conceito narcísico, uma vez que


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as imagens não revelam a sua identidade visual, o que seria o primeiro componente do retrato e do narcisismo. Partiremos agora para o processo de criação e a produção artística de Diêgo de Oliveira.


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3 A REALIDADE FICCIONAL EM FOTOGRAFIAS

3.1 PROCESSOS DE INVESTIGAÇÃO NA FICCIONALIDADE FOTOGRÁFICA

Os estudos dos conceitos “isto existiu” e “isto foi encenado”, apresentados respectivamente por BARTHES (1984) em A câmara clara e por SOULAGES (2010) em Estética da fotografia: perda e permanência, levaram-me a utilizar os dois autores como referência e consequentemente ter maior propriedade ao falar da construção dos meus trabalhos, em especial dos cartazes de filmes imaginários para o projeto “Cinema Imóvel”, dialogando-os com demais autores e artistas que discutem tais conceitos nas artes visuais. Como resultado dos meus primeiros trabalhos fotográficos já discutindo a encenação na fotografia, desde a pose à indumentária a partir do fotografado, até a encenação por parte do fotógrafo ou da câmera fotográfica programada para o disparo automático, uma vez que foi intencionalmente escolhida um ângulo para a captura da imagem, temos os primeiros: autorretrato nº 1 (imagem 35) feito como proposta de retratar uma identidade alternativa, escolhendo como referencial o Ensaio de Man Ray, o qual o mesmo retrata o Marcel Duchamp (imagem 47) como um personagem em vestimentas que se assemelham ao do universo feminino, intitulado Rrose Sélavy.


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Imagem 35 - Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 1, fotografia (2011). Fonte: Do autor.

Imagem 36 - Diêgo de Oliveira, Autorretrato nº 2, Fotografia 40x60 (2011). Fonte: Do autor.

Autorretrato nº 2 foi o primeiro trabalho com o qual participei de uma exposição fora do meu estado natal. A exposição como programação do XV Encontro Nacional dos Estudantes de Arte – ENEARTE, ocorrida em Natal – RN durante cinco dias, trouxe para mim o primeiro diálogo direto com curiosos telespectadores que queriam me conhecer para saber mais sobre o trabalho exposto. Como referencial artístico, a mexicana Frida Kahlo com seu “autorretrato com colar de espinhos e beija-flor” produzido em 1940. (imagem 37)


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Imagem 37 – Frida Kahlo, autorretrato com colar de espinhos e beija-flor, 1940. Fonte: lasmilhistoriasdelarte.wordpress.com

Podemos ver na imagem a representação de um macaco e um gato de cor preta, em “Autorretrato nº2”, busquei apresentar uma releitura do trabalho de Frida utilizando métodos mais usados pelos jovens na contemporaneidade, que é a fotografia, mostrando porém a representação de uma cobra envolvida sobre o meu busto, o que possibilitou não apenas maior curiosidade dos frequentantes, mas a constante pergunta e consequentemente um diálogo do estudante artista com os mesmos sobre a criação do trabalho e se a cobra era de fato verdadeira, réptil vivo ali presente, ou se era fictícia.


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3.2 A AÇÃO DA CRIAÇÃO: CINEMA IMÓVEL

Durante a disciplina de fotografia 2 ofertada na Licenciatura em Artes Visuais, a professora Ruth Sousa lançou a proposta de que os alunos produzissem um ou mais autorretrato, a partir das ideias discutidas em sala de aula sobre os conceitos anteriormente citados de identidade alternativa, fotografia encenada, e trazendo um referencial do que o aluno já estava trabalhando, pesquisando há um tempo. Eu já tinha uma produção em fotografias feitas por encomendas, de clientes que queriam books para lançar coleções de roupas, books de debutantes e ensaios temáticos. O universo dos cartazes com propagandas de lojas, marcas, filmes, folders, outdoors, já estava presente no meu imaginário e concomitante a isso veio a ideia de fazer um cartaz de filme utilizando meu próprio rosto como a representação do personagem protagonista. Para essa produção, fiz pesquisas a partir das orientações passadas pela professora, e um dos artistas que contribuíram para a produção do mesmo, foi a estadunidense Cindy Sherman com o seu projeto “Untitled film stills”. Neste, a artista apresenta uma série contendo sessenta e nove fotografias em preto e branco como frames de filmes inexistentes.

Imagem 38 - Cindy Sherman -Untitled Film Still No.13 (1978). Fonte: saatchigallery.com


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Imagem 39 - Michel Zózimo (2005). Fonte: veiculosdaarte.ufrgs.br

Imagem 40 - Rion Sabean (2012). Fonte: www.rionsabean.com

Com este referencial inicial, surgiu a inquietação de coletar e pesquisar cartazes de filmes reais, existentes, observando a disposição e informações contidas nos créditos, logomarcas de prêmios, produtora, tudo para que uma representação mais próxima da realidade viesse a compor o primeiro cartaz do projeto “Cinema Imóvel”, que seria apresentado como trabalho final da disciplina. Em seguida, uma nova inquietação surge, a de pesquisar artistas que já trabalhavam com a ideia de cartazes de filmes que não existem, no Brasil e no exterior, trazendo uma proximidade desses trabalhos como referência, sem que houvesse portanto elementos idênticos em ambos. Dos pesquisados, os que mais se destacaram e contribuíram no meu processo de criação, foi o artista brasileiro Michel Zózimo, com uma série de cartazes de filmes que não existem, criados durante 2007 e 2009 em parceria com Fernanda Gassen e Juliano Lopes para o projeto “Cinema Impossível” (imagem 39). Para esse projeto, Zózimo, Gassen e Lopes se apropriam de imagens já existentes, feitas por artistas e/ou terceiros, e a


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partir delas compõem um cartaz. A minha proposta, diferentemente, estava em eu mesmo criar a imagem que comporia o meu trabalho. Rion Sabean, o outro artista, também estadunidense, traz em seus cartazes de filme a repetição do seu nome como diretor, roteirista, ator protagonista, criador das músicas da trilha sonora, todas as profissões que contribuem para a criação de um filme existente (imagem 40). Diversamente do que quis trazer para a minha produção, que seria histórias vividas com meus amigos, familiares, minhas paixões, inclusive as inevitavelmente dolorosas. Experiências reais, escritas em minha vida, como um roteiro para o filme que estava tão-somente esperando o cartaz de divulgação. Além do roteiro, o trailer também já existia em minhas memórias. Agora tudo seria transformado em ficção e passado para o público. É a partir desse pensamento, do transformar minhas vivências mais marcantes em ficção, sendo apresentadas de forma bidimensional que surge o “Nº1” (imagem 41). Mostrando-nos esses acontecimentos passageiros, efêmeros, líquidos, porém acentuados, como possibilidades de criação na arte. O roteiro para a criação desse cartaz surgiu excepcionalmente quando aos meus 21 anos de idade, descobri-me mergulhado em uma paixão e em questões de poucos meses acompanhei a mesma tornar-se um fracasso. Um roteiro escrito em minha vida, o qual em momento algum esperei devido final para o “filme”. Porque alguns questionarão se o “Cinema Imóvel” é arte? Porque é tão difícil descriminar o que é arte e o que não é? Seria por que a arte, principalmente a arte contemporânea é uma realidade das nossas vidas, cujos acontecimentos estão se tornando tão líquidos, tão efêmero, que já não sabemos diferenciar? Sophie Calle em seu trabalho “Prenez soin de vous” (Cuide de você), nos mostra o quanto a vida cotidiana está presente na produção artística, quando no trabalho supracitado a artista recebe uma carta do seu namorado terminando o relacionamento, e propositalmente a envia para 107 mulheres em diversos países, escolhidas de acordo com a profissão, pedindo para que as mesmas analisem a carta recebida e a escrevam com o registro do momento da análise, seja uma fotografia ou vídeo do momento em que estivessem lendo. Tudo isso para permitir que houvesse um tempo maior nesse rompimento do relacionamento 20, como diz a própria artista. 20http://www2.sescsp.org.br/sesc/videobrasil/up/arquivos/200908/20090812_162153_Programa_Cuid

edeVoce_P.pdf


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No processo de criação do “Nº1”, tentei me afastar dessa paixão que no momento me causava uma sensação prolongada de sofrimento. Sendo assim, enviei um e-mail para quem ainda com angústia, acreditei ser possível termos um futuro juntos. Foi a partir de então que surgiu a sinopse do filme, na frase que convida o espectador a refletir e entender que o cartaz do filme imaginário, no seu roteiro, no seu filme, trata de um relacionamento onde ambos não podem, pelo menos até o exato momento, continuarem “juntos” e devem seguir em frente separados. A fotografia foi produzida especificamente para o cartaz “Nº1”, o qual houve todo um trabalho na composição do cenário, escolha de figurino, e aqui retomando o conceito de “isto foi”, de Barthes (1984), trago o que foi concretamente real, pelo fato da existência dos objetos de composição, figurinos, cenário, a cena, e ao mesmo tempo, dialogo com o conceito de “isto foi encenado”, de Soulages (2010), o qual todos os elementos passam a fazer parte de uma ficção, onde já se faz presente toda a proposta de apresentar um cartaz de um filme que não existe, trazendo a fotografia não como prova de realidade, ou como prova de uma realidade criada para ser fotografada, mas que não prova a existência de um filme. A partir de então que surge o termo realidade ficcional. Devo ressaltar que foram várias tentativas de fotografias até chegar a um resultado final do “Nº1”, e que, assim como neste, todos os nomes postos nos cartazes construídos posteriormente, as datas, as frases, têm ligações direta com minhas vivências. Com o encerramento da disciplina e posteriormente a minha mudança para um intercâmbio na Universidade de Bolonha, na Itália, o qual fui contemplado com uma bolsa do projeto Ciência Sem Fronteiras, permanecendo em tal país pelo período de um ano, 2012 a 2013, estudando outrossim no curso de Artes Visuais da mesma Instituição, o projeto teve continuidade, e com isso vieram os novos cartazes de filmes imaginários contribuindo para a criação de uma série. Devemos também saber que o título “Cinema Imóvel” foi criado a partir da relação do cinema existente, filmes reais, com a ideia de pensamento a partir do utópico, das nossas lembranças e dos nossos sonhos. “Imóvel”, do incapaz de se mover, mas que não é impossível de um dia ser gravado, podendo vir a existir um novo projeto. Com o passar do tempo fui buscando um certo minimalismo nos meus cartazes, criando-os com semelhança de pôsteres os quais não se faz presente todos os créditos informativos dos profissionais que contribuíram com a criação do


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filme, mas apenas o nome do diretor, o roteirista, o título e a data de lançamento nos cinemas em determinados países. Não deixando de produzir no formato com todos os créditos. É o que vemos no tríptico “364”, “App” e Papà” (imagens 43, 44 e 45). Cartazes distintos de uma suposta trilogia, lançada em três países dessemelhantes, sendo consequentemente Brasil, Reino Unido e Itália.


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77

Imagem 42 - DiĂŞgo de Oliveira , Bolonha, Fotografia (2013). Fonte: Do autor.


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Imagem 43 – Diêgo de Oliveira, 364, fotografia (2014). Fonte: Do autor.


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Imagem 44 - DiĂŞgo de Oliveira , App, Fotografia (2015). Fonte: Do autor.


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81

3.3 TEXTO E CONTEXTO FICCIONAIS

Em julho de 2014 durante a renomada Bienal de Arquitetura de Veneza, na Itália, chega na cidade supracitada pela primeira vez a edição do Morphos Sustainable Empires – Pixels of Identities Venice, festival internacional de arquitetura,

instalação,

fotografia,

vídeo-arte

e

performance,

tendo

como

organizador, o curador e arquiteto italiano Luca Curci. O evento foi acolhido pelo prestigioso Palazzo Albrizzi, um palácio incrivelmente rico por sua história e arquitetura, construído no século XIX. Como todos os jovens, adolescentes, adultos, idosos, estou frequentemente conectado em redes sociais que permitem um contato rápido com amigos, notícias, entre outras informações. Em um desses dias, vejo no facebook, divulgado por uma ex-professora de fotografia da universidade em que curso Artes Visuais, um link com uma chamada de artistas. Para que entendamos melhor, chamada de artistas, é um edital que busca artistas de um único ou diversos países para comporem uma exposição. Ao clicar no link, vi que se tratava de uma chamada convidando artistas do mundo inteiro a participarem de um processo seletivo para expor em um festival em Veneza. Quando ingressei no curso de Artes Visuais na Universidade Regional do Cariri, um dos meus maiores sonhos era poder visitar a Itália e participar de uma exposição no mesmo país com diversos artistas. No edital informava que qualquer artista poderia participar, desde que, após ter o trabalho aprovado pela curadoria e sua equipe na primeira etapa de seleção, pagasse a quantia de € 150,00, o equivalente a mais ou menos R$: 500,00 no período, e enviasse o trabalho selecionado para o endereço onde ocorreria a exposição. Preenchi o formulário de inscrição e como proposta enviei a imagem do trabalho que gostaria que fosse exposto, juntamente com um breve currículo. Os formulários com as propostas deveriam ser enviados até o dia 22 de maio do referido ano. Cumprindo o prazo determinado, obtive a resposta no dia seguinte:


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Imagem 46 – Resposta do formulário. Fonte: Do autor

A partir de então, ainda movido pela emoção, iniciei juntamente com minha família e amigos todo o trabalho para cumprir os demais prazos, e o mais importante: que a obra chegasse pronta para ser exibida no endereço solicitado. Conheçamos agora a imagem selecionada e o seu processo de criação. O que caracteriza um artista é ele olhar para dentro de si mesmo. Toda experiência em arte é um experimentar-se, é a experiência de si mesmo, é uma pesquisa em você mesmo. […] Este silêncio do olhar para dentro à procura da origem das coisas é que é o grande problema da arte. Procurando a origem, você fica original, e não querendo fazer uma coisa diferente. É por isso que eu acho que criar está junto com viver, que arte e vida são a mesma coisa. (MIRANDA, 2008, p. 34 apud CASTRO, s/d)

A vida do artista muitas vezes passa por momentos em que encontra-se com a criatividade inópia. Aquele momento em que não se faz presente o seu estado de poésis, tido como o momento do processo criativo, o estado em que o artista permanece em produção na criação de um trabalho. Não estamos todos os dias, 24 horas sendo criativos e criando obras de artes para disseminá-las mundo a fora.


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Federico Fellini cineasta italiano nos mostra em seu filme 8½, um período em que um famoso artista, roteirista, diretor de cinema, não encontra inspirações para discorrer como se desenvolverá o seu novo filme. Na vida real não é distinto, mas não podemos falar que todos os artistas são iguais, porém reitera-se que grande parte dos artistas precisam de inspiração para que essa criatividade volte a funcionar e sua produção a existir. Houve uma fase no início da minha graduação em Artes Visuais que o que eu mais desejava era ser um artista famoso, reconhecido por minhas obras diferentes. O que eu entendia por esse diferente? Todo o aprendizado no curso vinha expondo essa resposta diariamente, mas, foi quando em minhas leituras encontrei a colocação de Amílcar de Castro, supracitada, que passei a compreender cada vez mais o que é, e como é ser um artista original, com trabalhos tidos como diferentes. Como grande referencial para o meu trabalho, além de artistas visuais que trabalham com fotografia, vídeo-arte, instalações, objetos, entre outras linguagens, tenho a música como um elemento estratégico na minha produção. Quando encontro-me envolvido com certas inquietações relacionadas a essa figura do homem na contemporaneidade e enredado com algumas músicas, torna-se mais fácil criar, produzir, uma vez que tais músicas me inspiram. Músicas relacionadas ao meu humor do dia. Para Marina Abramovic (2015), segundo uma entrevista dada para uma revista brasileira, “quanto pior a sua infância, melhor a sua arte”21. Trago aqui essas duas citações, de Castro e Abramovic, dialongando-as para entendermos que o que está presente na vida do artista, desde a sua trajetória, antes mesmo de ser um artista, suas histórias vividas, juntamente com referencial teórico adquirido posteriormente é que vai lhe permitir ter um bom trabalho, ser um bom artista. Inicialmente a criação do “Autorretrato nº 4”, o trabalho selecionado para o festival em Veneza, surgiu a partir da ideia de compor um novo cartaz de filme imaginário para o projeto “Cinema Imóvel”. Ao mesmo tempo que busquei criar uma imagem que partisse dos conceitos de “fotografia encenada”, por François Soulages, e de identidade alternativa, a partir de uma série fotográfica de Marcel Duchamp feita por Man Ray intitulada Rrose Sélavy (imagem 47), nome imposto por Man Ray como um pseudônimo do próprio artista fotografado para o personagem criado para 21

Entrevista disponível em: http://revistamarieclaire.globo.com/Revista/Common/0,,ERT32019417735,00.html acessado dia: 29 de Março.


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a imagem. Duchamp ainda contribuiu com outras fotos para Man Ray, vestido de mulher, levando sempre o mesmo nome para a representação da personagem.

Imagem 47 – Man Ray, Rrose Sélavy, fotografia (1921). Fonte: wikiart.org

Para o “Autorretrato nº 4”, diferentemente de outros já criados, como por exemplo o “Autorretrato nº1”, não tive como proposta o travestir-me de mulher, mas sim mostrar uma imagem masculina, utilizando o meu próprio rosto como uma representação das inúmeras formas que pode se portar um homem na


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contemporaneidade. A imagem do homem forte, mas também frágil, sensível, mais aceitada na contemporaneidade. Surgiu da minha mente tudo o que compôs o retrato, desde o cenário, passando pelo figurino, acessórios e o click. O último, um pouco mais complicado, uma vez que eu deveria colocar a máquina fotográfica programada no automático e em seguida correr para encenar a pose desejada para a tomada que viria em 10 segundos. Foram vários disparos e poses diversas até que se enxergasse a fotografia ideal dentro da proposta pensada. Todas passaram por processos de edição, e todo esse processo com mais de 50 fotos resultou em duas que poderiam formar um díptico, mas que foi decidido apresentá-las separadamente. Expondo a que veio fazer parte do festival MORPHOS (imagem 48. p.86). A exposição teve um vernissage apenas para convidados um dia antes da abertura oficial a todo o público, ficando aberta para visitação de 6 a 13 de junho de 2014 no Palazzo Albrizzi, contando com a participação de 2 nomes brasileiros, o meu e o de um coletivo do estado de São Paulo. Segundo o curador, Luca Curci “A exposição foi revista por toda a imprensa e meios de comunicação internacionais, e visitada todos os dias por pessoas de diversos países particularmente sensíveis à arte contemporânea e novas linguagens.” (CURCI, 2014)22

Imagem 49 - Vista da exposição Pixels of Identities onte: http://www.lucacurci.com/artexpo/morphos-first-event.htm

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http://www.lucacurci.com/artexpo/morphos-first-event.htm

Venice

(2014)


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Imagem 50 - Vista da exposição Pixels of Identities http://www.lucacurci.com/artexpo/morphos-first-event.htm

Venice (2014) Fonte:

Imagem 51 – Vista da exposição Pixels of Identities – Venice (2014). Fonte: http://www.lucacurci.com/artexpo/morphos-first-event.htm


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Com a repercussão da exposição sendo divulgada por diversos meios, inclusive em redes sociais, as quais amigos e admiradores da arte contribuíram para a propagação da mesma divulgando o “Autorretrato nº4”, tive a oportunidade de ser convidado pelo Jornalista Joaquim Júnior para dar uma entrevista para Jornal do Cariri, que tem distribuição gratuita principalmente nas cidades de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, mas ocorre também na cidade de Fortaleza e no Distrito Federal Brasília. Algumas das perguntas da entrevista podemos ver a seguir, acompanhada da imagem com a impressão no jornal.

Jornal do Cariri: Você trabalha com questões ligadas à imagem do homem e sua representação na contemporaneidade. Explique melhor sobre o seu trabalho, citando, por exemplo quais suas inspirações. Diêgo de Oliveira: Esse vem sendo um tema específico que venho abordando na minha produção desde 2011 quando iniciei meu projeto “Cinema Imóvel”, em que produzo cartazes de filmes imaginários, me colocando como protagonista, buscando referenciais no meu dia a dia, na minha história de vida e nas minhas pesquisas. Para esse trabalho exposto em Veneza, trago a imagem do homem mais sensibilizada, e forte ao mesmo tempo, deliberando a flor como representação do nascimento desse homem contemporâneo.

Imagem 52 – Matéria no Jornal do Cariri (2014). Fonte: Do autor.


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J.C: Entre 2012 e 2013 você teve uma vivência na Itália. Como essa fase contribuiu para o seu crescimento como artista? D.d.O: Morando em um país onde eu não conhecia a cultura, nem o idioma inicialmente, pude amadurecer pessoalmente e profissionalmente, conhecendo outros artistas, estudantes de Artes Visuais, Cinema, Dança e de outras áreas. Pude conhecer técnicas diversas utilizadas por inúmeros artistas para a exposição de suas obras. Através dos contatos, conhecer salões, editais, chamadas de artistas, mergulhar, beber de uma fonte a qual eu não tive a oportunidade no Brasil. Não que não tenhamos no nosso país grandes artistas, o trabalho da Tete de Alencar é incrivelmente maravilhoso. Eu diria que, ver imagens de obras de artes em livros é totalmente diferente de você se ver frente a frente com obras clássicas de artistas como Van Gogh, Marina Abramovic, Yves Klein, entre tantos outros. É uma experiência enriquecedora em todos os sentidos.

J.C: Além de você, apenas outro brasileiro expõe na Morphos. O que tal conquista representa para você? D.d.O: Primeiro, eu vejo como uma responsabilidade enorme, mas também como um ‘peso-leve’ que me faz pensar: eu estou no caminho certo! O artista precisa ter o seu trabalho, o seu nome em circulação. Não é interessante fazer obras de artes para tê-las encobertas em seu ateliê, sua casa. Esse é o meu primeiro trabalho artístico em uma exposição internacional, pretendo ter outros ainda. Espero, também, que mais artistas brasileiros possam viver essa experiência, precisamos mostrar a arte contemporânea brasileira produzida também por jovens artistas.

Essa foi a primeira entrevista cedida por mim falando sobre o meu trabalho, sobre o meu processo de criação enquanto artista. Para a minha surpresa, também não foi a última, ainda falando sobre a Pixels of Identities e “Autorretrato nº4”, pois ao final da exposição em Veneza, o curador da mesma selecionou cinco artistas, entre todos os que exporam, para concederem uma entrevista falando sobre a experiência e disseminar mais o trabalho do mesmo. Tal seria divulgada em versão digital, online, acessível para maior parte da população. Fui um dos cinco convidados e uma das perguntas que mais me inquietou como graduando em Artes Visuais, como artista, foi: “O que é arte para você?”. Confesso que foi a resposta


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mais difícil de ser elaborada. Hoje compreendo com mais facilidade, e teria mais tranquilidade ao responder tal pergunta, e com o passar do tempo, conceitos que tenho hoje se ressignificarão, assim como a arte vem mudando, se ressignificando com o passar dos anos, dos séculos. A resposta e a entrevista podemos acompanhar a seguir23: Luca Curci: Seu trabalho foi exibido durante MORPHOS – Sustainable Empires em Veneza: você pode falar sobre a sua experiência pessoal em Veneza com a International Artexpo? Diêgo de Oliveira: Infelizmente não pude estar presente fisicamente em Veneza durante o evento, mas o meu trabalho estava lá! Foi a minha primeira participação em uma exposição internacional desse porte, tendo o meu trabalho exposto em uma cidade importante para a divulgação de artistas locais e internacionais, acontecendo no mesmo período da Bienal de Arquitetura e visto por pessoas do mundo inteiro.

L.C: Você pode falar sobre a obra de arte que você apresentou em Veneza? Como é que é ligado com o tema do festival? D.d.O: Meu “Autorretrato nº4” foi executado a partir das minhas pesquisas e inquietações da imagem do homem na contemporaneidade. O homem no plural que pode contar com várias identidades na sua forma de ver, apreciar e se apresentar ao mundo, ao universo. Nessa obra me coloco como referência desse homem! O meu trabalho se insere em uma das formas mais diretas e tradicionais relacionadas ao tema do festival: Pixels of Identities, a junção dos pixels, na era digital, dando forma à minha identidade retratada em fotografia.

L.C: O que você está trabalhando atualmente? D.d.O: Venho trabalhando nas minhas pesquisas com relação ao homem e produções na fotografia, instalação e vídeo-arte. Desenvolvendo ainda o meu projeto “Cinema Imóvel”, desde 2011, que são cartazes de filmes imaginários em que me coloco como protagonista.

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Link para acessar a entrevista completa online: http://www.itsliquid.com/interview-diego-deoliveira.html#


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L.C: O que é arte para você? D.d.O: Para mim, arte é todo conhecimento adquirido a partir de estudos em que parte da minha trajetória pessoal e inquietações como humano vêm inseridas em uma produção. Seja bidimensional ou tridimensional.

Eu diria que todo esse processo da minha criação, tanto quanto do projeto “Cinema Imóvel”, quanto do “Autorretrato Nº4”, contribuiu para o meu crescimento e amadurecimento. O artista-professor-pesquisador, deve estar sempre em contato com outras culturas. Como diz Ana Mae Barbosa (2007)24, não é possível construir uma identidade cultural sem ter o conhecimento de outras culturas. Assim como dizia Simone de Beauvoir (2009), que não se nasce mulher, torna-se mulher, acredito que não se nasce artista, torna-se artista. No sentido de que, o artista nasce a partir da sua cultura, da sua interação com o outro. Tanto quanto em seu país, como nos países vizinhos e os demais que compõem o nosso planeta. E porque não, também nos outros planetas? A exposição em Veneza foi a primeira a partir também do meu contato com o idioma italiano e com o conhecimento que obtive no país. Outras experiências são possíveis,

24

assim

No livro Tópicos Utópicos

como

com

elas,

surgirão

novos

trabalhos.


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CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolver desse trabalho permitiu-me ter maior conhecimento sobre assuntos os quais, mesmo já com uma prática na fotografia eu não conhecia e/ou não dominava. Foi este o fator primordial que levou-me ao desenvolvimento dessa pesquisa, possibilitando com que eu reconhecesse o meu espaço de produção dentro da fotografia como arte contemporânea. Afirmo que, a minha produção fotográfica ganhou ainda maior qualidade estética, tanto nas composições como nos formatos de montagem, e ainda suportes que as abrigam. Uma vez que criar imagens a partir de conceitos abordados por autores e a contextualização do meu trabalho com os de demais artistas não se fazia presente no meu pensamento. Até aqui, acompanhamos desde a criação do daguerreotipo até a inserção do mesmo no mercado para que outros tivessem acesso ao aparelho, entendo este como fator principal para a produção de autorretratos fotográficos, assim como outros modelos criados que facilitaram a criação da imagem fotográfica, permitindo a produção em séries e a comercialização, como por exemplo, as cartes de visite. E anteriormente, a criação dos primeiros espaços considerados estúdios fotográficos, com os tetos de vidro e grandes janelas, possibilitando a criação, a montagem de um cenário para compor a imagem, recebendo ainda a penetração da luz natural para a iluminação na fotografia. Todo esse processo, desconhecido ainda por mim, mas necessário para a compreensão histórica da fotografia hoje. No entendimento das selfies e do próprio termo que deriva da palavra selfportrait, exponho a importância de entendermos que isso já existia na pintura, assim como existiu nos desenhos produzidos por Leonardo Da Vinci. Na arte contemporânea, ocorre inevitavelmente um processo de diálogo com a arte produzida nos séculos passados. Inclusive para conceituar um trabalho produzido hoje, vemos que tem uma parte conectada a produção que já foi contemporânea de Van Gogh, de Salvador Dalí, por exemplo. Na minha produção, trago no processo de criação o que não foi muito comum nos primeiros semestres da faculdade em minha produção artística, que é primeiro a criação do trabalho, da obra e posteriormente a contextualização da mesma. Em


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“Autorretrato nº 4” surge primeiro a fotografia e em seguida a contextualização com conceitos, envolvendo tanto a parte teórica, como também a artística. A ideia de compor a imagem tendo a iluminação focada no meu rosto, vem a partir das pinturas, dos autorretratos feitos no renascimento italiano. Pude perceber que após as investigações para a contextualização da obra, o “Autorretrato nº 4” traz uma bagagem do renascimento, uma vez que insiro referências do meu período vivido na Itália, e quando retorno ao Brasil em 2013 crio o trabalho que coincidentemente é exposto pela primeira vez no país do renascimento, na cidade de Veneza. No “Cinema Imóvel” as fotografias surgem tendo como ponto de partida situações já vividas por mim. Designadamente aquelas que trazem especificamente uma potencial carga dolorosa, mas que não se limita a isso, uma vez que dentre esses acontecimentos que causaram a sensação de dor, tiveram também momentos de alegria. Toda essa pesquisa, esse projeto, não se encerra por aqui. Trago esse repertório do autorretrato desde o daguerreotipo, para que por fim possamos entender como se deu essa trajetória, e para que eu tenha melhor aparato científico ao apresentar e defender a minha produção. A trajetória da produção autorretratista fotográfica não está limitada ao que vos apresento. E ter o meu trabalho “Autorretrato nº4” participando de um Festival de arte e arquitetura em um país que contou com a participação de diversos outros países, é uma honra a qual oferto a todas as disciplinas cursadas, a todos os professores do Departamento de Artes Visuais, que direta ou indiretamente contribuíram para o artista-professorpesquisador que me tornei, ao Centro de Artes Reitora Violeta Arraes de Alencar Gervaiseau. Ressalto ainda que essa pesquisa foi de suma importância para que surgissem novas indagações acerca do meu trabalho artístico, que me permitirão desenvolver uma nova pesquisa tendo esta como base inicial, a qual relacionarei a minha produção no “Cinema Imóvel” com os estudos da psicanálise, a partir do pensamento de Sigmund Freud, discutindo a produção dos cartazes de filmes imaginários a partir do alter-ego. Tratarei nessa, os meus autorretratos como um “suporte” que por meio dele represento minha segunda ou inúmeras identidades.


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Patricia

Lilian.

O

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