Entrevista ao Presidente da Câmara de Alenquer

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ercê da sua disposição em encosta, partindo do topo de um outeiro em direção ao vale, há muito que Alenquer conquistou o epíteto de “Presépio de Portugal”. Berço de Damião de Goes e predileta de Camões, desempenhou papel preponderante em cada época da história. Testemunho disso mesmo é o seu riquíssimo património: sítios pré-históricos, castelos, conventos, igrejas, ermidas, quintas e casas senhoriais. Cabeça, há oito séculos, de um vasto concelho – terceiro em área no distrito de Lisboa – limitado a norte pelas faldas do Montejunto e a sul, pela campina do Ribatejo, apresenta uma paisagem característica, transição entre o campo outeirado da Estremadura e a planície, onde a vinha é predominante e base ancestral da sua economia.

“O Municipal” – A Romaria de Santa Quitéria de Meca é a mais importante festividade do concelho. Qual a tradição desta festa? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – O concelho de Alenquer é muito rico em festividades e tradições, sendo difícil afirmar perentoriamente qual é a mais importante. A título de exemplo enumero, sem qualquer ordem de importância, o Cantar os Reis, os Círios, o Dia da Espiga (quinta-feira da Ascensão, que é tida como “o dia mais santo do ano”), as grandes Festas do Império do Divino Espírito Santo (as antigas

festas imperiais do Espírito Santo, iniciadas em Alenquer pela Rainha Santa Isabel e por D. Dinis, porventura as maiores do concelho, foram interrompidas há perto de 200 anos em Alenquer, reconstituíram-se por uma única vez em 1945, para renascerem em 2007, sob o lema “o Espírito sopra onde quer”), o Leilão dos Cargos, o Presépio de Alenquer, a Procissão dos Passos, entre outras. No caso específico da romaria de Santa Quitéria de Meca, a procissão, a bênção do gado e o grande arraial são os componentes obrigatórios e constantes desta antiga festividade. A festa começa com as cerimónias do “dia da Santa”, o primeiro domingo depois de 22 de maio, dia assinalado no calendário cristão com a invocação de Santa Quitéria mártir. Nesta data surgem romeiros com os seus rebanhos e manadas, para a tradicional “bênção do gado”, o momento mais característico e pitoresco da festa. A crença popular admite que esta bênção tradicional preserva as pessoas e os animais presentes dos malefícios da raiva. “O Municipal” – O Concelho de Alenquer tem um vasto património natural, arqueológico e arquitetónico. O que aconselha a visitar? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso - Felizmente, o concelho de Alenquer tem um património riquíssimo e com especificidades únicas, pelo que é um grande desafio enumerar algum património em detrimento

de outro. De qualquer forma, em termos naturais destaco as Serras do Montejunto e da Ota, arqueologicamente, o Castelo de Alenquer e arquitetonicamente, as inúmeras quintas senhoriais, a Capela da Igreja de São Pedro, a Capela do Espírito Santo / Paço da Rainha Santa Isabel, o Celeiro Real, o Convento de São Francisco (o primeiro em Portugal), a Igreja da Misericórdia de Alenquer e a Basílica de Santa Quitéria de Meca. De qualquer forma, reforço a ideia de que o património público e privado do município é vastíssimo e quem nos visitar não dará o seu tempo por desperdiçado. Pelo que lanço um desafio a todos os que lerem esta entrevista, venham conhecer as belezas naturais, arquitetónicas e arqueológicas bem como, as gentes locais e deixem-se enamorar pela “verde e cara Pátria minha, Alenquer”, tão bem definida e imortalizada por Luís de Camões. “O Municipal” – Os campos de ténis, o muro bate bolas exterior e o recinto polidesportivo junto ao Complexo Municipal Victor Santos já se encontram em funcionamento, bem como o Pavilhão Desportivo Municipal. Que outros equipamentos colocam o Município de Alenquer aos seus munícipes? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso - Dado o atual contexto socioeconómico julgamos que a aposta deverá incidir nos setores

ENTREVISTA JORGE MANUEL DA CUNHA MENDES RISO PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE ALENQUER

da educação, da ação social e da saúde. As autarquias nacionais, à semelhança do país, estão a passar por momentos muito delicados, em virtude da diminuição das suas receitas. Esta situação obrigou-nos, apesar de todo o realismo e rigor que impusemos na nossa gestão, a redefinir as nossas prioridades e nesse sentido, os setores prioritários foram os que enunciei. Daí termos apostado nos últimos anos na construção de Complexos Escolares. “O Municipal” – Como caracteriza a Serra de Montejunto no que diz respeito à sua riqueza natural? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – A Serra do Montejunto é uma área de paisagem protegida lindíssima que está inserida na Rede Natura 2000. Erguendo-se abruptamente entre o litoral e o vale do Tejo, a Serra do Montejunto demarca-se da paisagem envolvente pela altitude e pelas suas características naturais. Numa região caracterizada por intensa atividade agrícola o Montejunto apresenta-se como um refúgio para muitas plantas - a serra alberga considerável diversidade florística tendo sido identificadas cerca de 400 espécies de plantas em que se incluem alguns endemismos


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ENTREVISTA

das zonas calcárias - e animais. Destes últimos destacam-se as aves, aqui nidificando mais de 70 espécies, e os quirópteros, que aproveitam a existência de cavidades para aí hibernar e se reproduzir. “O Municipal” – Em que consiste o projeto “Despertar”. Tem tido adesão? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Fruto de uma parceria entre o Centro de Saúde de Alenquer e a autarquia, o “Despertar” é um espaço destinado ao atendimento do adolescente. Criado para responder às necessidades da população jovem, pretende acompanhar, ajudar e informar os jovens no âmbito de temas como a sexualidade, a transmissão de doenças sexualmente transmissíveis, a gravidez na adolescência, o consumo de substâncias lícitas e ilícitas, as alterações do comportamento alimentar, entre outros. O “Despertar” é composto por uma equipa multidisciplinar, com técnicos do Centro de Saúde e da Câmara Municipal de Alenquer, nomeadamente médico(a) de clínica geral, enfermeiros (as) e psicólogos (as) que prestam um atendimento personalizado, desburocratizado, gratuito e confidencial, sem marcação prévia, a adolescentes. A adesão tem sido considerável o que muito nos apraz. “O Municipal” – Em que áreas atua o Banco Local de Voluntariado e quais os seus objetivos gerais? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – A Câmara Municipal de Alenquer, através do pelouro da Ação

Social, criou o Banco Local de Voluntariado de Alenquer. Este projeto pretende ser um local de encontro entre pessoas que expressam disponibilidade e vontade para serem voluntárias e entidades promotoras que reúnam condições para integrar voluntários e coordenar o exercício da sua atividade em vários domínios. Por outro lado, ambiciona ser um espaço de fácil acesso, onde qualquer cidadão que queira ser voluntário possa recolher informação sobre voluntariado ou inscrever-se como voluntário. Os objetivos gerais passam pela valorização e promoção do voluntariado, promoção do encontro entre a oferta e a procura de voluntários e organizações, sensibilização dos cidadãos e as instituições para o voluntariado, divulgação dos projetos e oportunidades de voluntariado e contribuição para o aprofundamento do conhecimento do voluntariado. “O Municipal” - Este é o primeiro mandato como Presidente da Câmara Municipal. Que iniciativas e projetos gostaria de realizar? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso - Face às condicionantes orçamentais e mesmo sabendo que é sempre possível otimizar recursos, será muito complicado fazer frente aos cortes das transferências da Administração Central e das receitas. De qualquer forma, temos objetivos estratégicos definidos dos quais tentaremos não nos desviar, são eles: melhorar a prestação de serviços à população gerindo com rigor e eficiência os recursos municipais e valorizar e qualificar os recursos próprios; apostar nos setores da educação, da ação social, da saúde e da juventude; consolidar o município enquanto território ordenado e multifuncio-

nal com qualidade de vida, tanto nas freguesias urbanas como nas rurais, dinamizar o concelho enquanto um espaço de excelência das artes, cultura e desporto e promotor do desenvolvimento integrado e sustentado. “O Municipal” - Que análise faz da evolução das competências e atribuições das autarquias locais? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Atendendo à consolidação das políticas de proximidade, entendemos o princípio da descentralização de competências para os municípios, o que não podemos aceitar é o aumento das mesmas sem que o financiamento das mesmas pela Administração Central seja devidamente acautelado. Refira-se aliás que esta situação é das que mais contribui para o estrangulamento financeiro das autarquias. “O Municipal” - A propósito da reorganização da rede de escolas do 1.º ciclo do ensino básico, que comentário faz sobre o encerramento de algumas e a concentração dos alunos em estabelecimentos de maior dimensão?

petências para os municípios no domínio da educação? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso - Como princípio, a descentralização de competências, se acompanhada dos recursos correspondentes, permitirá uma resolução mais atempada dos problemas, resultando numa mais-valia para o desenvolvimento educativo local. Sublinhe-se, no entanto, que quando a Administração Central não cumpre com rigor e em tempo útil os seus compromissos este processo consubstancia um prejuízo financeiro para as autarquias. Do ponto de vista técnico, a descentralização de competências acarreta um aumento do volume de trabalho para os serviços da autarquia, nomeadamente na área da gestão dos recursos humanos e do parque escolar. No entanto, caso sejam cumpridos todos os requisitos pré-acordados, as vantagens superam largamente as desvantagens. “O Municipal - Qual é a sua opinião sobre a perda de mandato por não avaliação dos trabalhadores?

Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Considerando que as escolas de acolhimento, por norma, têm melhores condições do ponto de vista físico, os alunos deslocados passam a usufruir de espaços específicos como salas polivalentes e refeitórios. A reorganização da rede educativa permite uma melhoria da oferta educativa, assim como, nalguns casos, a superação de situações de isolamento e o fomento de uma maior socialização dos alunos.

Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Obviamente, não posso concordar. Sempre que existe uma obrigatoriedade legal, seja ela qual for, e a mesma não seja cumprida, deverá haver penalizações dirigidas a quem prevaricar. Porém, julgo que deverá haver uma justa proporcionalidade entre a obrigação e a penalização, e neste caso concreto, não existe. Em abono da verdade e de maneira simpática, podemos afirmar que próprio Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho da Administração Pública é um instrumento repleto de incoerências e de eficácia muito questionável.

“O Municipal” - Como avalia a descentralização de com-

“O Municipal” - A respeito da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de de-


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zembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2012, que comentário faz às disposições aplicáveis aos trabalhadores do sector público, em especial, as que se referem à redução das remunerações e à proibição de valorizações remuneratórias, não esquecendo a forma como passa a ser efetuada a determinação do posicionamento, no âmbito dos procedimentos concursais? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Uma vez mais, tenho sérias dificuldades em compreender. Neste caso, existe um claro desfasamento entre os direitos e os deveres. A título de exemplo, não é sensato que um trabalhador que ascenda a um lugar de chefia, e que por inerência tenha um acréscimo de responsabilidades e competências, não possa ser remunerado de acordo com o cargo que exerce. “O Municipal” - Perante as restrições em matéria de endividamento municipal, para o ano de 2012, como encara o futuro da gestão autárquica? Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – O cenário não é de facto o melhor. No fundo, a gestão autárquica refletirá a gestão da Administração Central e o Orçamento de Estado 2012. As transferências da Administração Central para a Administração Local sofrerão um corte substancial e as receitas das autarquias continuarão a decrescer. Estes fatores, em conjunto, elevarão as dificuldades de tesouraria e de liquidez dos municípios.

Na verdade, o recurso ao endividamento e aos empréstimos não é, nem pode ser, uma solução estrutural mas, em questões pontuais e imediatas, constitui, muitas vezes, a única forma de responder convenientemente a alguns problemas de tesouraria. Além do mais, as restrições elencadas colocarão em causa a capacidade de investimento das câmaras municipais. Esta questão da gestão autárquica conduz-nos, invariavelmente, a um problema que é transversal a todos os municípios e que urge ser resolvido, que é a Lei das Finanças Locais. A crise financeira que o país atravessa veio comprovar que o atual modelo de financiamento dos municípios é inadequado e insustentável. As transferências da Administração Central para as autarquias têm sido alvo de cortes constantes, situação que obriga a uma redefinição permanente de objetivos e compromete muitos dos projetos previstos. Caso este paradigma não seja alterado, o que está em causa é a própria sustentabilidade dos municípios.

municípios, os organogramas já tinham sido reajustados às suas necessidades, pelo que um novo reajustamento e consequente diminuição das chefias poderão ser inviáveis e ter efeitos perniciosos no funcionamento dos mesmos e na qualidade dos serviços prestados.

Documento Verde da Reforma da Administração Local, que apreciação faz do mesmo, nomeadamente, em face da discussão que tem gerado? Qual é a sua opinião sobre a reorganização do mapa autárquico, envolvendo a fusão e extinção de freguesias?

“O Municipal” - Para além da limitação à admissão de novos trabalhadores, que comentário faz ao objetivo de diminuir o número dos que existem, de forma a atingir a redução prevista no artigo 48.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro?

“O Municipal” - O que acha da diminuição dos cargos dirigentes até ao final de 2012?

“O Municipal” - Ao nível do setor empresarial local, considera razoável a intenção de proceder à redução das entidades atualmente existentes, por extinção ou fusão?

Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Julgo que há uma questão de fundo que ainda não foi esclarecida nem, caso exista, divulgada. Qualquer reforma deverá ser fundamentada porém, no caso específico, desconhecemos qualquer estudo onde conste a relação custo/benefício desta reorganização. Afinal, de que forma esta reestruturação do mapa autárquico beneficiará as populações? Não sei. O que eu acho é que constituirá um retrocesso em termos de políticas de proximidade e que os critérios que constam no Documento Verde da Reforma da Administração Local são demasiadamente amplos e pouco concretos. Enfim, dadas as circunstâncias, julgo que a gestão do processo deveria ser da inteira responsabilidade da Administração Local e não da Administração Central.

Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Diz-nos o bom senso que cada realidade tem especificidades diferentes, pelo que é com sérias dificuldades que vejo viabilidade e sensatez em processos que à partida, independentemente do contexto, são estandardizados. A diminuição dos cargos dirigentes, sem uma prévia avaliação, caso a caso, é difícil de sustentar. Dependerá do histórico e das particularidades de cada município e assim sendo, estes deveriam ter total autonomia em relação ao assunto. Em muitos

Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Tal como referi anteriormente, é com extrema dificuldade que encaro as reformas feitas a “regra e esquadro”. No entanto, admito que haja pessoas a mais em algumas funções e a menos noutras. Como tal, dever-se-ia poder, dependendo das situações, fazer ajustamentos pontuais de acordo com as necessidades das respetivas estruturas.

Jorge Manuel da Cunha Mendes Riso – Sim, concordo com o princípio que lhe está adjacente. Em muitos municípios existem empresas públicas locais a mais, muitas das quais não são financeiramente sustentáveis. Pelo que, a bem da transparência e das contas públicas, em inúmeros casos, a extinção e fusão será, porventura, a solução mais sensata. “O Municipal” - A respeito do


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