O MUNICIPAL N.º 365 - Junho/2011
ASSOCIAÇÃO DOS TÉCNICOS ADMINISTRATIVOS MUNICIPAIS
entrevista
D r . M anu e l Av e l ar C un h a S antos P re s i d e nte da Câmara Municipal de Santa Cruz da Grac i o s a
SA N TA C R U Z DA G R AC I O SA A Ilha Graciosa inclui-se no grupo central do arquipélago dos Açores e apresenta 61,66 km2 de superfície, com 12,5 km de comprimento e 8,5 km de largura. De clima temperado, é a ilha menos húmida de todas as outras. Com uma população de cerca de 4.393 habitantes (Censos 2011), o concelho de Santa Cruz é o único existente na Ilha Graciosa. É igualmente designada por Ilha Branca, devido aos seus toponímicos, Pedras Brancas, Serra Branca, Barro Branco. A data da descoberta da Graciosa é incerta, pensa-se que os primeiros que ali chegaram foram mareantes da vizinha Ilha Terceira, cerca de 1450. Um dos seus primeiros povoadores foi Vasco Gil Sodré. A prosperidade económica da Ilha Graciosa, baseada essencialmente no comércio agrícola, levou a que Santa Cruz fosse elevada a vila em 1486, e a Praia perdeu essa categoria, devido à sua limitação em termos de rendimentos. No final do século XVI, e prolongando-se pelo século XVII, a Graciosa enfrenta um período difícil, causado pelo ataque de piratas e corsários. Esta situação obrigou à construção de fortificações, ao longo da ilha, para sua defesa. No decurso dos séculos, Santa Cruz foi visitada por ilustres viajantes. O primeiro foi o padre jesuíta António Vieira, que ali veio parar em 1654, depois do naufrágio do barco em que regressava a Lisboa, vindo do Brasil. Seguiu-se-lhe o escritor francês Chateaubriand, em 1791, quando ia de França para a América, fugindo da Revolução Francesa. Em 1814, o escritor Almeida Garrett escreveu ali os seus primeiros versos, já então reveladores do seu talento. Finalmente, em 1879, o Príncipe Alberto de Mónaco, que se distinguiu pelos seus trabalhos hidrográficos e estudos da vida marinha, aporta à Graciosa e visita a Furna do Enxofre. Foi dos primeiros a descer à mesma, por uma escada de corda. A construção do Porto da Praia e do aeródromo quebraram parte do isolamento da Graciosa, sem lhe fazer perder as características de ilha rural e pacata, em que a agricultura, a pecuária e os lacticínios são os suportes da sua economia e progresso.
“O Municipal” - Foi inaugurado o Reservatório de Água e Posto de Abastecimento. A quem se destina este equipamento e que benefícios advêm do mesmo? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Destina-se ao abastecimento de água aos lavradores da freguesia da Luz, que beneficiam agora do factor proximidade e de um tanque com muito maior capacidade. “O Municipal” - Prevê-se que em 2018, 75% da electricidade da Graciosa venha de fontes renováveis. Como será o desenvolvimento deste projecto?
Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Sim, a empresa alemã Younicos, especializada em energias renováveis, está a testar um sistema inovador de produção de energia eólica e solar com capacidade de abastecer a Graciosa. Este teste consiste na simulação das condições naturais,
assim como do consumo de energia eléctrica na nossa ilha e pretende provar que uma ilha que possui esta dimensão, população e recursos energéticos pode efectivamente ser abastecida quase exclusivamente por energias renováveis. Para que isso seja possível, serão construídas baterias para armazenar a energia. “O Municipal” - Quais as grandes atracções turísticas da Graciosa? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Em primeiro lugar a Furna do Enxofre, na Caldeira, que é a maior cúpula da Europa, mas também, por exemplo, as Termas do Carapacho, o Ilhéu da Baleia, a Caldeirinha, o Porto Afonso, a Baía do Filipe, o Monte de N. Sra. da Ajuda, o Pico Timão e várias Igrejas, Ermidas e Impérios um pouco por toda a Ilha. “O Municipal” - Foi inaugurada a Estação de Monitorização de Ensaios Nucleares. Qual o objectivo desta instalação?
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Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - A Estação de monitorização de Infra-sons IS42 foi formalmente certificada pelo Secretariado Técnico Provisório (PTS) da Comissão Preparatória da Organização do Tratado de Proibição Total dos Ensaios Nucleares (CTBTO) no dia 02 de Dezembro de 2010 e tem como objectivo a monitorização do cumprimento do que está estipulado do referido tratado. Esta estação foi inaugurada este ano, tendo passado a integrar uma rede mundial de segurança com sede em Viena de Áustria. “O Municipal” - As quatro residências assistidas, que foram inauguradas, chegam para colmatar a falha existente? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Não são o suficiente mas são uma boa aposta para continuar a melhorar o apoio e a assistência a idosos. “O Municipal” - Em que termos a criação da Lota da Graciosa veio contribuir para a sustentabilidade económica e social das comunidades piscatórias? Quais os seus objectivos? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - A nova Lota da Graciosa veio aumentar a capacidade de armazenamento de peixe congelado para sete toneladas, de refrigeração do pescado para catorze toneladas e de armazenamento de gelo até nove toneladas, criando assim melhores condições de rentabilidade económica para a comunidade piscatória. “O Municipal” - O Conselho de Ilha defende a existência de um piloto de barra permanente. O que visa esta exigência? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - A fixação de um piloto de barra na Ilha Graciosa seria uma mais valia porque evitaria a deslocação constante de um técnico de outra Ilha. “O Municipal” - O Parque Florestal da Caldeira - único do género na ilha -, está a sofrer obras de requalificação. Que impacto tem este espaço na economia local? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - A beneficiação do parque Florestal da Caldeira, para além de criar um espaço de lazer e percursos pedestres, também traz mais condições ao viveiro de plantas endémicas. “O Municipal” - Este é primeiro mandato como Presidente da Câmara Municipal. Que iniciativas e projectos espera realizar e ver concluídos? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Entre vários projectos, pretendemos requalificar o Centro Urbano de Santa Cruz, várias estradas municipais, entre elas a que liga a Rochela à Lagoa, assim como embelezar a Ilha e melhorar várias infra-estruturas e espaços de lazer. Também ao nível do desporto, no primeiro ano de mandato foi já projectado e concluído o novo campo sintético da freguesia da Luz.
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“O Municipal” - Que análise faz da evolução das competências e atribuições das autarquias locais? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - É importante que as competências das autarquias aumentem, mas em contrapartida é necessário que sejam criadas condições humanas e económicas no sentido de as pôr em prática de forma eficiente. “O Municipal” - A propósito da reorganização da rede de escolas do 1.º ciclo do ensino básico, que comentário faz sobre o encerramento de algumas e a concentração dos alunos em estabelecimentos de maior dimensão? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Neste momento, a rede de Escola do 1.º Ciclo está devidamente consolidada na lha Graciosa e pensamos que não faz sentido que sejam efectuadas alterações num futuro próximo. “O Municipal” - Como avalia a descentralização de competências para os municípios no domínio da educação? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Na Região Autónoma dos Açores, a maior parte das competências na área da Educação são do Governo Regional, às Câmaras apenas compete a manutenção dos edifícios das Escolas onde funcionam o 1º Ciclo e o Ensino do Pré-escolar. “O Municipal - O que acha da Proposta de Lei n.º 25/XI, que altera o regime jurídico da tutela administrativa em vigor? Qual é a sua opinião sobre a perda de mandato por não avaliação dos trabalhadores? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - A Lei n.º 27/96, de 01 de Agosto, promoveu a seu tempo a autonomia do poder local, a evolução e o aperfeiçoamento do objecto da tutela administrativa. No entanto, a complexidade do leque e dos meios de intervenção do poder local, bem como a necessidade de intervenção em tempo útil, impõem a revisão do regime da tutela administrativa.
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Nesse sentido, o referido diploma, que vem adaptar a lei ao poder local, clarifica que as referências ao dirigente máximo de serviço devem considerar-se feitas nos municípios ao Presidente da Câmara. Tendo em conta que o Presidente da Câmara é eleito, tal como outros órgãos políticos, qual a razão para que a sanção não seja idêntica para todos? Existe, portanto, no meu entender, um tratamento desigual e uma descriminação relativamente aos municípios. “O Municipal” - A respeito da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011, que comentário faz às disposições aplicáveis aos trabalhadores do sector público, em especial, as que se referem à redução das remunerações e à proibição de valorizações remuneratórias, não esquecendo a forma como passa a ser efectuada a determinação do posicionamento, no âmbito dos procedimentos concursais? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Com efeito a partir de 2011, procedeu-se, à redução da remuneração dos trabalhadores em funções públicas, integrados nas carreiras gerais e nas carreiras especiais, dos gestores e dirigentes, bem como dos titulares de órgãos de soberania, de cargos públicos e de órgãos independentes. Atendendo a que a redução remuneratória é feita de forma progressiva, tendo sido isentas pessoas que recebam rendimento igual ou inferior a 1500 euros, a redução remuneratória procura assegurar a proporcionalidade transversal do impacto da mesma, de tal modo que quem aufere rendimentos mais elevados suporta uma percentagem mais alta de redução remuneratória e quem aufere rendimentos mais baixos uma percentagem mais baixa. Neste âmbito, o esforço de assegurar a sustentabilidade prevalece. Todavia este esforço não deveria incidir apenas sobre as remuneração dos trabalhadores, mas abranger outros sectores da sociedade. “O Municipal” - Perante as restrições em matéria de endividamento municipal, para o ano de 2011, como encara o futuro da gestão autárquica?
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processo da consolidação da democracia em Portugal, após o 25 de Abril de 1974, o poder local tem aparecido como uma das suas maiores realizações. “O Municipal” - No que diz respeito ao memorando de entendimento sobre os condicionalismos específicos de política económica (FMI/BCE/CE), qual é a sua opinião sobre a reorganização do mapa autárquico, envolvendo a fusão e extinção de municípios e freguesias? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - Em relação ao nosso município, pensamos que não haverá alterações uma vez que é único na Ilha e está bem dividido em quatro freguesias. Se se der início a um processo de extinção e fusão de municípios e freguesias poderá vir a criar-se situações de alguma instabilidade entre as populações. “O Municipal” - Para além da limitação à admissão de novos trabalhadores, que comentário faz ao objectivo de diminuir o número dos que existem, de forma a atingir uma redução anual de 2%, no período de 2012 a 2014? O que acha da diminuição dos cargos dirigentes e das unidades administrativas, em 15%, até ao final de 2012? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - O corte no número de dirigentes municipais insere-se no âmbito da reforma administrativa das autarquias, que assenta em quatro pilares fundamentais: o sector empresarial local, a reorganização do território, a gestão municipal, intermunicipal e financiamento e democracia local. Mas estes cortes devem ir para além das autarquias. A reforma na administração pública é uma exigência no sentido de diminuir a despesa na administração pública, uma vez que está para lá daquilo que é a capacidade económica do País. Talvez outros critérios devessem ser ponderados, isto é, é preciso conhecer a reestruturação no seu todo para perceber a organização dos recursos humanos intermédios e
Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - No ano de 2011, a contracção de novos empréstimos de médio e longo prazos está limitada ao valor resultante do rateio do montante global das amortizações efectuadas pelos municípios em 2009, proporcional à capacidade de endividamento disponível para cada município. Mas mais do que as restrições de endividamento preocupa-me a redução das transferências que tem vindo a ser feita. O Município de Santa Cruz da Graciosa recebeu do Orçamento do Estado no ano de 2010 o valor de 3M€ e com a redução prevista para o ano de 2011 as transferências do Orçamento do estado para este ano de 2011 ficarão pelos 2.6M€. É preciso não esquecer que são as autarquias que assumem a resolução da maior parte dos problemas das comunidades e no
evitar disparidades salariais. É preciso conhecer o que vai ser o resto da reestruturação das instituições. “O Municipal” - Ao nível do sector empresarial local, considera razoável a intenção de proceder à redução das entidades actualmente existentes? Dr. Manuel Avelar Cunha Santos - O nosso município, ao nível do sector empresarial local, apenas possui uma empresa de capital misto que trata dos transportes colectivos da Ilha e que terá de permanecer porque pratica um serviço de carácter social para as escolas e para os idosos.