[E-Book] Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem UNIFACS

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PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM Autora: Profª Dra. Claudia Kober



SUMÁRIO O QUE É APRENDIZAGEM?................................................................................................... 7 Introdução............................................................................................................... 7 Objetivos............................................................................................................ 8 Qual é o seu estilo de aprendizagem?................................................................... 8 Lendo Paulo Freire.................................................................................................. 9 Referências........................................................................................................... 10 SKINNER E A TEORIA BEHAVIORISTA: APRENDIZAGEM POR ASSOCIAÇÃO........................... 11 Introdução............................................................................................................. 11 Objetivos............................................................................................................... 11 O cão de Pavlov.................................................................................................... 12 Watson e o pequeno Albert.................................................................................. 13 Skinner: o comportamento moldado pelas consequências.................................. 14 Skinner × Watson................................................................................................. 15 A construção do comportamento – parte 1..................................................... 15 A construção do comportamento – parte 2.......................................................... 16 Skinner e a educação............................................................................................ 17 Skinner e a máquina de ensinar...................................................................... 18 Críticas ao behaviorismo....................................................................................... 18 Referências........................................................................................................... 20 PIAGET: UM PENSADOR DA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO.......................................... 21 Introdução............................................................................................................. 21 Objetivos.......................................................................................................... 21 Jean Piaget: um pensador da construção do conhecimento................................ 22 Uma visão interacionista...................................................................................... 23 Referências........................................................................................................... 27 PIAGET: OS ESTÁGIOS SENSÓRIO-MOTOR E PRÉ-OPERATÓRIO............................................ 29 Introdução............................................................................................................. 29 Objetivos.......................................................................................................... 29 Avaliação.......................................................................................................... 30 Estágio sensório-motor: transformações extraordinárias, do caos ao cosmo...... 30 Estágio pré-operatório: linguagem e pensamento............................................... 32 Links...................................................................................................................... 34 Vídeos................................................................................................................... 34


Referências........................................................................................................... 34 PIAGET: OS ESTÁGIOS OPERACIONAL CONCRETO E FORMAL............................................... 35 Introdução............................................................................................................. 35 Objetivos.......................................................................................................... 35 Avaliação.......................................................................................................... 36 Estágio operacional concreto: operações nas pontas dos dedos......................... 36 Estágio operacional formal: em pensamento tudo se torna possível.................. 41 Links...................................................................................................................... 42 Vídeo..................................................................................................................... 42 Referências........................................................................................................... 43 VYGOTSKY E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA MENTE................................................................ 45 Introdução............................................................................................................. 45 Objetivos.......................................................................................................... 45 Avaliação.......................................................................................................... 46 Vygotsky, um pensador das relações entre indivíduo e sociedade..................... 46 O desenvolvimento de uma nova Psicologia....................................................... 47 A mediação simbólica: instrumentos e signos..................................................... 48 Os signos............................................................................................................... 49 Internalização........................................................................................................ 51 Referências........................................................................................................... 52 VYGOTSKY: DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM............................................................. 53 Introdução............................................................................................................. 53 Objetivos.......................................................................................................... 53 Linguagem e pensamento: uma relação indissociável........................................ 54 Desenvolvimento e aprendizado.......................................................................... 56 Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)........................................................... 56 Escola e desenvolvimento.................................................................................... 58 Referências........................................................................................................... 59 AUSUBEL E A TEORIA COGNITIVISTA................................................................................... 61 Introdução............................................................................................................. 61 Objetivos.......................................................................................................... 61 Teorias cognitivistas: múltiplas e diversificadas................................................... 62 Ausubel e os tipos de aprendizagem................................................................... 63 Leitura: tipos de aprendizagem significativa........................................................ 65 Ensino e aprendizagem.................................................................................... 66 Organizadores prévios.......................................................................................... 66


As condiçþes da aprendizagem significativa........................................................ 67 Mapas conceituais............................................................................................ 68 Referências........................................................................................................... 69



AULA 1 O que é aprendizagem? Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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uase sempre tendemos a associar aprendizagem com escola, com um ambiente organizado, no qual alguém está designado a ensinar e outros estão na posição de aprender. Mas se pensarmos bem vamos ver que aprendemos em muitos ambientes e de vários modos diferentes. Além disso, aprendemos muitas coisas diferentes. Aprendemos fórmulas que esquecemos rapidamente depois da prova, assim como a dirigir um automóvel, a andar de bicicleta, a escrever, tocar um instrumento, a costurar, a respeitar o próximo, a viver conforme certos valores etc. Todos nós aprendemos sempre, e essa é uma das atividades mais intensas, revigorantes e desafiadoras que a mente humana possibilita. Mas há muitas maneiras diferentes disso acontecer, certo? Reflita um pouco: » » Ao longo da sua vida, qual foi o momento em que você mais aprendeu? » » O que você aprendeu? » » Quais eram as condições presentes que facilitaram essa aprendizagem? » » Qual é o seu modo predileto de aprender?


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

OBJETIVOS » » Identificar as melhores condições, para você, para que a aprendizagem ocorra. » » Identificar o seu próprio estilo de aprendizagem. » » Refletir sobre o que é aprendizagem e como ela se relaciona ao ensino.

QUAL É O SEU ESTILO DE APRENDIZAGEM? Há muitas maneiras de se aprender e cada um tem o seu modo preferido de fazê-lo. Diversos autores têm trabalhado com essa ideia, chegando a conclusões e categorizações diferentes. Kolb (1984), em seu livro Experiential Learning: Experience as the Source of Learning and Development (Aprendizagem experiencial: experiência como fonte de aprendizagem e desenvolvimento), propõe um inventário de estilos de aprendizagem, que vem sendo bastante utilizado para identificar a forma predominante de aprendizagem de grupos de estudantes para o desenvolvimento de estratégias de ensino mais adequadas as suas características. Kolb divide as preferências de aprendizagem em quatro estilos: acomodador, divergente, convergente e assimilador, baseado na sua teoria de aprendizagem experiencial. Segundo esse autor, a aprendizagem experiencial acontece num ciclo de quatro estágios segundo a figura ao lado:

Figura 1 - Ciclo de Aprendizagem Experiencial segundo Kolb

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AULA 1 - O QUE É APRENDIZAGEM?

Esse ciclo se repete cada vez que aprendemos alguma coisa e pode começar em qualquer ponto. No entanto, com frequência, começamos pela experiência concreta, ou seja, nos envolvendo em novas experiências. O segundo estágio seria o de observar e refletir sobre essa experiência, as circunstâncias em que ela ocorre e os resultados obtidos. O terceiro estágio trata de configurar logicamente o princípio geral de funcionamento, de forma que ele possa ser aplicado a outras circunstâncias parecidas. O último estágio do ciclo refere-se, pois, a uma nova ação, norteada pelo princípio geral obtido. Ou seja, usar o princípio ou a teoria desenvolvida para tomar decisões e resolver problemas. Nesse sentido, pode-se dizer que o ciclo de aprendizagem vivencial, embora representado de forma circular, dá-se mais numa espiral, com níveis crescentes de complexidade. Para Kolb, a aprendizagem efetivamente acontece quando o indivíduo desenvolve as quatro habilidades relacionadas ao ciclo (habilidade de lidar com experiências concretas; de observar; de conceituar e generalizar; e de experimentar), no entanto, cada um de nós tem um estilo de aprendizagem que privilegia um dos momentos do ciclo. Esses estilos estão no centro da figura 1: Ativista, Reflexivo, Teórico e Pragmático. Para detectar os estilos preferenciais dos indivíduos, o autor desenvolveu o Inventário de Estilos de Aprendizagem. Nesse momento, vamos utilizar uma adaptação do Inventário de Estilos de Aprendizagem de Kolb como instrumento de autoconhecimento. Quanto mais você conhecer o modo como aprende, mais poderá utilizar seu modo preferencial de forma consciente e aperfeiçoar aqueles estilos, também necessários, com os quais você se sente menos confortável. Verifique agora qual é o seu estilo de aprendizagem: 1) Faça o download do inventário e complete-o. 2) Verifique as características do estilo obtido no resultado.

LENDO PAULO FREIRE Paulo Freire é um dos mestres da educação de todos os tempos. Autor traduzido em inúmeras línguas, tem muito a nos ensinar, especialmente a nós, que trabalhamos ou pretendemos trabalhar no campo da educação, que queremos formar pessoas críticas, envolvidas, participativas, reflexivas sobre o mundo e sobre si mesmo(a). Para avançarmos na reflexão sobre o que é aprender, sempre tão indissociável de ensinar, convido você a ler a Carta de Paulo Freire aos Professores, retirada do livro Professora sim, tia não. Cartas a quem ousa ensinar, escrito em 1993 e reproduzida na Revista Estudos Avançados em 2001. Como você verá, esse é um texto importante e intrigante, que pode ser lido e relido ao longo da nossa vida de educadores. Nesse momento, porém, ao ler o texto, procure responder à questão: » » Como você se vê em relação à postura proposta por Paulo Freire “daquele que estuda”, dos“leitores”?

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

REFERÊNCIAS FREIRE, Paulo. Carta de Paulo Freire aos professores. Estud. av., São Paulo, v. 15, n. 42, ago. 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010340142001000200013&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 26 out. 2011. KOLB, D. A. The Learning Style Inventory: Technical Manual. Boston, Ma.: McBer, 1976. ______. Experiential Learning: Experience as the Source of Learning and Development. Englewood Cliffs, N.J. : Prentice-Hall, 1984.

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AULA 2 Skinner e a teoria behaviorista: aprendizagem por associação Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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omo foi dito na Unidade 1, neste curso vamos estudar alguns dos principais teóricos da Psicologia da Aprendizagem. Nesta unidade vamos retomar a teoria behaviorista, com a qual você já teve contato na disciplina Desenvolvimento humano e social. Naquele momento, no entanto, o foco não estava na aprendizagem, mas em uma abordagem mais ampla dos diferentes campos da Psicologia. Nesta unidade, a aprendizagem será abordada do ponto de vista da teoria behaviorista.

OBJETIVOS » » Ao final desta unidade, espera-se que o aluno: » » conheça os princípios teóricos do behaviorismo; » » identifique práticas educativas baseadas nos princípios teóricos do behaviorismo;


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

» » empregue os princípios teóricos da teoria behaviorista no contexto pedagógico escolar; » » identifique os pontos positivos e negativos da teoria.

O CÃO DE PAVLOV Como você deve se lembrar, o behaviorismo deve seu nome à palavra behavior, que significa comportamento, em inglês. Por isso, muitos autores brasileiros a nomeiam também teoria comportamentalista. Ela teve seu início nos estudos do pesquisador russo Ivan Pavlov (1849-1936), sobre a salivação dos cães, nos na década de 1890, embora naquele momento a teoria ainda não tivesse esse nome. Pavlov investigava a função gástrica dos cães e a salivação em diferentes circunstâncias.

Assista ao filme e conheça mais sobre as pesquisas de Pavlov. Disponível em: <www.youtube.com/watch?v=YhYZJL-Ni7U>. Acesso em: 10 dez. 2011.

Pavlov fez uma importante descoberta científica (muitas pessoas que conviviam com animais provavelmente já haviam percebido, mas não haviam estudado cientificamente): é possível parear um estímulo (som, luz etc.) que não está ligado à função observada (salivação) e levar o corpo a produzir, no caso estudado, saliva. Pavlov conseguiu, por meio da coleta de saliva no tubo conectado à glândula salivar do cão, medir o volume de líquido produzido em cada fase do experimento, e mostrar, com dados científicos, que se pode alterar um comportamento inicialmente considerado apenas “fisiológico”– a salivação. A salivação é um reflexo incondicionado ou não condicionado. Os cães, como nós, salivam quando na presença de alimento (nós salivamos só de pensar em uma comida gostosa, não é?). Essa função faz parte do próprio sistema digestório, ajudando a deglutição e a digestão. É um reflexo que os cães (e nós, humanos) têm sem que lhes seja ensinado, um padrão de resposta básico, hereditário. Nesse caso, um estímulo (alimento) produz (ou elicia) uma resposta (salivação).

Figura 1 - Alimento (Estímulo incondicionado) e cão salivando (resposta)

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AULA 2 - SKINNER E A TEORIA BEHAVIORISTA: APRENDIZAGEM POR ASSOCIAÇÃO

Pavlov percebeu que, se oferecesse alimento sempre que um estímulo, como o som de uma campainha fosse produzido, após um tempo o cão teria associado o som à comida. Ou seja, o cão passaria a salivar ao ouvir a campainha, mesmo que o alimento NÃO fosse apresentado. Era possível, portanto, parear um estímulo inicialmente neutro (som, luz etc.) a uma resposta: a produção de saliva. A esse processo deu-se o nome de reflexo condicionado.

Figura 2 - Som (estímulo incondicionado [S]) e cão salivando (resposta [R])

O cientista notou que animais (assim como humanos) podem aprender a responder a um estímulo. Reflexos incondicionados podem, portanto, ser transformados em reflexos condicionados. Você pode experimentar condicionar o cachorro de um jogo. Disponível em: <www.nobelprize.org/ educational/medicine/pavlov/ pavlov.html>. Acesso em: 10 dez. 2011. O site é em inglês, mas a ideia é simples: treine o cachorro tocando a campainha e dando a ele comida. Não se esqueça de que ele vai demorar um pouco para aprender e fica mais fácil se você usar sempre o mesmo estímulo sonoro para condicionar a reposta de salivação.

WATSON E O PEQUENO ALBERT

Assista ao filme Watson e o pequeno Albert disponível em: <www.youtube.com/watch?v=KxKfpKQzow8>. Acesso em: 10 dez. 2011, e pense a respeito dessas perguntas:

» » Você acha que emoções podem ser aprendidas? Amor, medo, raiva etc. podem ser ensinadas? » » Qual é a relação entre o que é hereditário e o que é aprendido, para o ser humano? O experimento desenvolvido por Watson faz muita gente arrepiar os cabelos, não é? Certamente ele não seria possível hoje em dia, pois traz enormes problemas éticos. Mas aqueles eram outros tempos, nos quais essas considerações ainda não faziam parte das regras da produção científica.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

John B. Watson (1878-1958) foi um cientista americano que estabeleceu os princípios do behaviorismo, desenvolvendo experimentos com animais e crianças, em busca da compreensão do comportamento de modo científico e objetivo. Em 1913, escreveu um texto considerado um marco: Psicologia como os behavioristas a veem. Nele, o autor defende que o estudo dos comportamentos observáveis é a forma objetiva de se entender o ser humano. Assim, ele se afasta da tradição filosófica mentalista, fundada na introspecção e no emprego de palavras como mente, consciência ou sensação. Todo seu foco de estudo é o comportamento, que é sempre uma mudança observável no indivíduo e sempre uma resposta a um estímulo. Watson não nega a existência dos processos mentais, mas não os considera dignos de estudo, uma vez que não podem ser tratados de maneira experimental e objetiva. Com esses princípios, Watson funda a psicologia científica, buscando inserir a psicologia como parte das ciências naturais, ao lado de biologia, química e física. Com sua incursão no campo da educação, Watson tornou-se um importante formador de opinião na sociedade americana, pontificando em programas populares de rádio (a TV não existia até então) a melhor maneira de transformar crianças em cidadãos. Seu sucesso deveu-se principalmente pela ligação que estabelecia entre educação e ciência: seu intuito era mostrar o que a ciência e as pesquisas da época mostravam no campo da educação, em uma época em que as descobertas científicas eram admiradas e reverenciadas. Como você pode ver, não é de hoje que programas sobre como educar as crianças fazem sucesso! Importante notar também que o behaviorismo oferecia uma visão alternativa a algumas teorias da época, de que o ser humano já nasce predeterminado a certos comportamentos e atitudes, que seriam inatos. Ao afirmar que o ser humano nasce como uma “tábula rasa” (ou uma página em branco), o poder da educação, em formar pessoas da maneira como acredita ser correta, cresce imensamente. Cresce também o poder da sociedade, assim como as premissas de igualdade, importantes em uma sociedade que preza a democracia, como a americana.

SKINNER: O COMPORTAMENTO MOLDADO PELAS CONSEQUÊNCIAS Lembre-se Você se lembra daquela professora do Ensino Fundamental que dava estrelinhas ou balas para os alunos que faziam a lição de maneira caprichada ou que terminavam as tarefas no prazo estabelecido? Você sabe qual a origem dessas práticas? Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) deu continuidade às pesquisas e ao pensamento de Watson. Skinner desenvolveu o que chamou de behaviorismo radical, tornando-se um importante pensador do século XX. Para ele, todo comportamento pode ser aprendido por meio do condicionamento, posição que reforça o caráter anti-inatismo de seu predecessor.

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AULA 2 - SKINNER E A TEORIA BEHAVIORISTA: APRENDIZAGEM POR ASSOCIAÇÃO

Para Skinner, comportamento humano não difere essencialmente do comportamento animal, com o qual compartilha grande parte das suas características. No entanto, eles se distinguem em virtude de uma mudança fundamental na evolução do ser humano, que é o desenvolvimento da linguagem. Para estudar os princípios que regem o comportamento, esse autor realizou inúmeros experimentos com pequenos animais, como ratos e pombos.

Assista ao filme indicado a seguir, observando principalmente as diferenças entre a teoria de Watson e o que Skinner propõe. Disponível em: <www.youtube.com/watch?v=9XumLBjBCaQ>. Acesso em: 10 dez. 2011.

SKINNER × WATSON Como você pode ver, para Pavlov e Watson a aprendizagem acontece por meio do modelo do condicionamento clássico: ESTÍMULO (S) → RESPOSTA (R) Skinner analisa a aprendizagem de modo mais complexo, invertendo a direção da flecha: RESPOSTA → ESTÍMULO Quando um comportamento ocorre e é seguido de uma consequência, a probabilidade de ele voltar a ocorrer aumenta ou diminui, dependendo da consequência. Ou seja, “[...] o comportamento é formado e mantido por suas consequências” (SKINNER, 1972). Skinner constrói o conceito de condicionamento operante para explicar esse processo. Ou seja, o sujeito manifesta um comportamento (resposta), que produz uma consequência (estímulo), que, por sua vez, age sobre o sujeito, modificando a probabilidade de uma futura resposta, em uma interação dinâmica entre o sujeito e o ambiente.

A CONSTRUÇÃO DO COMPORTAMENTO – PARTE 1 Utilizando as “caixas de Skinner” para realizar seus experimentos, o autor demonstra que, ao se colocar um camundongo faminto nesse ambiente, ele irá explorá-lo. E aprenderá a apertar uma pequena alavanca. Ao ser acionada, essa alavanca libera uma porção de alimento. Em seguida, o camundongo pressionará repetidamente a alavanca para liberar a comida. O alimento, nesse caso, reforça o comportamento de pressionar a alavanca, aumentando a probabilidade de que ele ocorra. Comportamentos cada vez mais complexos podem ir sendo ensinados (como aparece no filme indicado, com o pombo), quando são divididos em partes menores. Por exemplo, o camundongo pode aprender a pressionar a barra apenas quando uma luz é acesa. Ou, reforçando apenas a pressão bem leve sobre a alavanca, pode-se levar o animal a responder apenas de modo leve, em um processo chamado de diferenciação, o que vai tornando as aprendizagens cada vez mais complexas e sofisticadas.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Figura 3 - Caixa de Skinner – modelo.

Assista ao filme indicado a seguir, atentando principalmente para a noção de reforço positivo. Disponível em: <www. youtube.com/watch?v=0NDK0OmDJ7Q&feature =related>. Acesso em: 10 dez. 2011.

A CONSTRUÇÃO DO COMPORTAMENTO – PARTE 2 Comportamentos podem ser mantidos ou não pela manipulação do ambiente em que eles ocorrem: 1) Para aumentar a probabilidade de ocorrência de um comportamento. REFORÇO » » positivo: introduz um elemento positivo no ambiente. Exemplo: fazer a lição de modo caprichado, ganha uma estrelinha; comer todo o espinafre, ganha sobremesa (certamente você consegue pensar em uma enorme lista de exemplos, não é?). » » negativo: retira do ambiente um elemento negativo ou indesejável. Exemplo: se o vendedor supera a sua meta de vendas da semana, pode tirar o sábado de folga. Nesse caso, o elemento negativo é ter de trabalhar aos sábados! Para diminuir a probabilidade de ocorrência do comportamento: EXTINÇÃO Ocorre quando uma resposta deixa de ser reforçada.

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AULA 2 - SKINNER E A TEORIA BEHAVIORISTA: APRENDIZAGEM POR ASSOCIAÇÃO

Exemplo: ignorar a pessoa quando ela conta piadas chatas ou ignorar a criança que está fazendo manha. PUNIÇÃO » » adição (punição positiva): adiciona ao ambiente uma experiência aversiva; Exemplo: levar um tapa porque não fez a lição de casa. » » subtração (punição negativa): retira do ambiente um reforçador positivo. Exemplo: ficar sem ver TV porque não fez a lição de casa. Para Skinner, um comportamento pode ocorrer porque é parte do desenvolvimento genético do indivíduo (bicam, ratos são animais curiosos...) ou porque foi reforçado em outro momento. Além disso, é sobre comportamentos mais simples que se constroem comportamentos mais complexos. No entanto, há aqueles reforçadores que são primários, ou seja, estão na base da cadeia de reforçadores e são responsáveis pela própria sobrevivência do sujeito: alimento, água e afeto (amor e comida...). Já os demais reforçadores adquirem a sua força ao serem pareados com esses reforçadores primários. Nesse sentido, a estrelinha no caderno reforça o comportamento de caprichar na lição, por estar ligado ao reconhecimento e ao amor da professora.

SKINNER E A EDUCAÇÃO Skinner mostrou que o condicionamento operante não apenas elicia o comportamento, mas também pode manter comportamentos, quando se mantém uma frequência de reforçamentos. Comportamentos estabelecidos, mas que não são mais reforçados, tendem a desaparecer. Se você já assistiu a algum episódio do programa televisivo Super Nanny, deve lembrar que o que estamos falando aqui está sempre presente nas recomendações daquela que tentará transformar os pequenos “diabinhos” em crianças com as quais se pode conviver normalmente. Ela fala com frequência da importância de se manter os “combinados”, de cumprir o que foi prometido e de reforçar continuamente os bons comportamentos. Embora Skinner estude e descreva esses procedimentos para a formação de comportamentos, ele não atribui o mesmo peso a todos eles. Para ele, a punição produz comportamentos evasivos e uma série de comportamentos negativos: “alunos que são punidos por não estudar, podem até estudar, mas podem também abandonar a escola, destruí-la, atacar os professores ou, teimosamente, não fazer nada” (SKINNER, s.d.). A punição pode trazer modificações temporárias no comportamento, mas seu foco é escapar da punição e não produzir um novo comportamento. Para esse autor, é sempre preferível focar no reforçamento positivo, que leva a comportamentos mais positivos socialmente e mais duradouros.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

SKINNER E A MÁQUINA DE ENSINAR A preocupação com a educação e com os efeitos que seus trabalhos de pesquisa poderiam ter sobre ela levou Skinner a produzir a máquina de ensinar: um aparelho que pretendia ensinar um conteúdo dividindo-o em pequenas partes, que o aluno deveria praticar, obtendo um feedback imediato sobre o seu desempenho. Veja como funciona a máquina de ensinar assistindo ao filme. Disponível em: <http://www.youtube. com/watch?v=EXR9Ft8rzhk>. Acesso em: 12 dez. 2011.

Você pode experimentar uma versão eletrônica da máquina de ensinar no site: <www6.ufrgs.br/psicoeduc/maquina-de-ensinar/>. Acesso em: 12 dez. 2011.

A proposta pedagógica de Skinner se apoia, portanto, nos seguintes princípios: » » o conteúdo deve ser apresentado de forma dividida, em etapas que possam ser compreendidas; » » comportamentos complexos podem ser ensinados se forem divididos em pequenas partes; » » o aluno deve produzir uma resposta; » » o aluno deve receber o feedback imediato a sua resposta, indicando se acertou ou errou; » » o processo de aprendizagem é controlado pelo aluno, que pode acelerar o processo ou adequálo às suas necessidades. Você consegue ver na educação atual onde esses princípios estão mais presentes?

CRÍTICAS AO BEHAVIORISMO Ao colocar grande ênfase no ambiente, como reforçador e/ou produtor de punições que moldam o comportamento, Skinner recebe muitas críticas, pois nem todos veem com bons olhos a possibilidade de controlar desse modo os comportamentos, retirando do indivíduo a possibilidade do livre arbítrio. Uma forma de responder a essas críticas está na utopia social que descreve em seu livro “Walden II”. Nessa sociedade imaginária, a vida comunal impera, não há dinheiro, mas todos são desde cedo condicionados, nos princípios do behaviorismo, a serem membros produtivos e felizes dessa comunidade. Todo o ambiente é desenhado para reforçar comportamentos adequados e desenhar uma cultura que seja mais adequada à felicidade do ser humano. No entanto, a questão permanece: quem escolhe que comportamentos são “adequados”, aqueles que fariam a sociedade e seus membros serem mais felizes? A muitos essa proposta é pouco democrática e mais afeita às ditaduras. O behaviorismo foi considerado por muitos uma teoria simplista; grandes psicólogos do seu tempo, como Carl Rogers e linguistas, como Noam Chomsky, discordaram dos escritos de Skinner.

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AULA 2 - SKINNER E A TEORIA BEHAVIORISTA: APRENDIZAGEM POR ASSOCIAÇÃO

Para Skinner e seus defensores, a compreensão de sua teoria ficou marcada pela ligação inicial com o behaviorismo de Watson, do qual Skinner se afastou, buscando justamente dar explicações para os aspectos mais complexos do comportamento humano. Concordando ou não com ele, Skinner foi um dos mais citados psicólogos do século XX e certamente marcou o campo da educação com a sua teoria.

Assista à continuação do documentário “A psicologia de B.F. Skinner”. Disponível em: <www.youtube.com/watch?v=Ch0RjRflZ_k&feature=relat ed> (parte 2) www.youtube.com/watch?v=xMV5Vfq_PQM&feature=related> (parte 3) www.youtube.com/watch?v=9_X2BZ5dt5Q&feature=related> (parte 4) <www.youtube.com/watch?v=Nq4nSAar-zU&feature=related > (parte 5) <www.youtube.com/watch?v=vFVNsXsXpb8&feature=relat ed> (parte 6) <www.youtube.com/watch?v=MsKYhpBl5io&feature=relat ed> (parte 7) <www.youtube.com/watch?v=VdRii3-VeNY&feature=related> (parte 8) <www.youtube.com/watch?v=g4_YlQ0NRpc&feature=related> (parte 9) Acessos em: 12 Dez. 2011.

Reflexão 1) Assista ao filme britânico “Laranja Mecânica” (1971) do diretor Stanley Kubrick, pois ele faz uma dura crítica ao behaviorismo. 2) Você pode assistir a um episódio do programa televisivo Super Nanny e tentar responder às duas primeiras questões anteriores analisando alguns dos conselhos que a personagem dá aos pais. 3) Leia a introdução e o primeiro capítulo do livro “Sobre o behaviorismo de B. F. Skinner”, no qual ele traça a defesa das suas posições. Disponível em: <http://books.google. com/books?id=gej5uGOa_OkC&pg=PA7&source=gbs_toc_r&cad=4#v=onepage&q&f=fal se>. Acesso em: dez. 2011. Preste atenção ao tratamento de reabilitação dado ao personagem principal e tente responder às questões: » » Quais os princípios ali utilizados? » » Qual foi o esquema de condicionamento utilizado? » » Como ocorreu o condicionamento referente à música?

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Lembre-se: “O ambiente não apenas aguilhoa ou chicoteia, mas seleciona.” (SKINNER, 1972). “O comportamento é formado e mantido por suas consequências.” (SKINNEE, 1972).

Você deverá entregar o conjunto das reflexões feitas ao longo das unidades na atividade da Unidade 9!

REFERÊNCIAS SKINNER, B. F. O mito da liberdade. Tradução: Leonardo Goulart e Maria Lúcia Ferreira Goulart. Rio de Janeiro: Bloch, 1972. ______. Sobre o behaviorismo. Tradução: Maria da Penha Villalobos. São Paulo: Cultrix, 1974. ______. A brief survey of operant behavior. Disponível em: <www.bfskinner.org/BFSkinner/ SurveyOperantbehavior.html>. Acesso em: 12 nov. 2011. WATSON, J. B. Psychology as the behaviorist views it. Psychological Review, p.158-177, 1913. Disponível em: <http://psychclassics.yorku.ca/ Watson/views.htm>. Acesso em: 12 nov. 2011.

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AULA 3 Piaget: um pensador da construção do conhecimento Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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esta e nas próximas duas unidades, abordaremos um dos mais importantes pensadores e pesquisadores do campo da Psicologia da Aprendizagem: Jean Piaget. Suas descobertas impactaram o campo da educação no mudo todo. No Brasil, sua teoria está presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais estabelecidos pelo Ministério da Educação (portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01. pdf), e permeia os projetos pedagógicos do país.

OBJETIVOS » » Conhecer os princípios teóricos postulados por Piaget referentes ao desenvolvimento cognitivo. » » Entender os mecanismos básicos envolvidos na construção do conhecimento e no desenvolvimento da inteligência. » » Reconhecer a importância de práticas pedagógicas sustentadas pela teoria construtivista.


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Lembre-se Reserve um bom tempo para estudar as unidades 3, 4 e 5 da disciplina, pois é importante para todo educador entender os princípios da teoria de Piaget, que são bastante complexos. E lembre-se: conte comigo para tirar dúvidas no fórum ou nos encontros presenciais!

Para as próximas unidades, você precisará ter em mãos o livro: PIAGET, Jean. Seis estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães de Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. Vamos trabalhar com a primeira parte do livro: O Desenvolvimento Mental da Criança.

AVALIAÇÃO Ao final dessa unidade, você deverá: » » responder as questões objetivas;

Lembre-se O material que você encontrará a seguir, e nas próximas unidades desta disciplina, é composto de conteúdos online, vídeos e textos de autores especialistas no campo que está sendo abordado. Eles foram dispostos em uma sequência lógica pensada para um melhor aproveitamento. Procure obedecer à ordem em que os textos aparecem.

JEAN PIAGET: UM PENSADOR DA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO “A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe.” Jean Piaget (1953)

Interessado inicialmente em Biologia, ainda jovem foi considerado um “garoto prodígio”. Seu primeiro artigo, aos 11 anos, foi sobre um pardal albino; aos 22 anos defendeu sua tese de doutorado: a respeito de moluscos!

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AULA 3 - PIAGET: UM PENSADOR DA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

Logo que se formou trabalhou com Alfred Binet, criador do teste de inteligência (Q.I.), o que lhe trouxe a oportunidade de observar que havia alguma coisa sistemática nos erros que as crianças faziam ao responder os testes, levando-o a desenvolver suas próprias teorias. Lecionou em diversas universidades na Suíça e de 1952 a 1963 trabalhou na Universidade Sorbonne, em Paris: “o segundo professor não francês indicado para dirigir uma cátedra na Sorbonne”, sendo que o primeiro foi Desiderius Erasmus [conhecido como Erasmo de Roterdã], em 1510! (MACEDO, 2005). Durante sua vida, buscou entender o desenvolvimento humano de uma perspectiva epistemológica, tentando responder questões relacionadas ao conhecimento humano: como aprendemos? Como o Homem constrói o conhecimento? Como o Homem alcança o conhecimento lógico-matemático? Ou seja, como acontece o desenvolvimento humano, que transforma um bebê incapaz e dependente em um indivíduo capaz de resolver problemas complexos? O trabalho de Piaget foi focado no desenvolvimento da inteligência (que para ele não se limita nem se traduz em Q.I.) e na construção do conhecimento, teoria que chamou de Epistemologia Genética. Não no sentido da genética, como campo da Biologia e que estuda o DNA, mas referindo-se à gênese, ao nascimento do conhecimento. Piaget levanta uma hipótese sobre a qual trabalhou praticamente a vida toda: entre o conhecimento alógico e o conhecimento lógico “[...] deve haver etapas intermediárias que provem a existência de um processo evolutivo” (CHIAROTTI-NO, 1972). E é por meio desse processo que o sujeito constrói o conhecimento. Por isso, a teoria elaborada por esse autor é chamada construtivismo. “Construtivismo significa isto: a ideia de que nada, a rigor, está pronto, acabado, e de que, especificamente, o conhecimento não é dado, em nenhuma instância, como algo terminado. Ele se constitui pela interação do Indivíduo com o meio físico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por força de sua ação e não por qualquer dotação prévia.” (BECKER, 1994)

Partiu da observação de crianças para buscar a resposta as suas perguntas, já que é a infância o período de maior aprendizado do ser humano. Parte de suas observações foi feita com seus próprios filhos; no entanto, ele não parou aí. Ao longo dos seus muitos anos de pesquisa realizou centenas de estudos empíricos, sozinho e com colaboradores. Curiosamente, apesar de ser um pensador importante no campo da educação, Piaget nunca desenvolveu um “método” de ensino.

UMA VISÃO INTERACIONISTA Piaget tem uma visão interacionista do desenvolvimento humano. A criança é um ser dinâmico e interage com o ambiente e aprende por meio dessa interação, que ocorre por dois processos simultâneos: organização interna e adaptação ao meio. Essa interação é apoiada em estruturas mentais, uma “estrutura biológica que seria responsável pela capacidade que o ser humano tem de adquirir conhecimento que implica uma lógica” (CHIAROTTINO, 1972). É nesse sentido que Piaget afirma: “[...] o conhecimento não procede nem da experiência única dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de construções sucessivas com elaborações constantes de estruturas novas.” (PIAGET 1976, apud TERRA, 2007).

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Essas estruturas desenvolvem-se em etapas ordenadas e previsíveis, que envolvem a maturação do indivíduo e a experiência com os objetos e com o mundo social. Um processo chamado de equilibração por Piaget: “[...] uma passagem contínua de um estado de menor equilíbrio para um estado de equilíbrio superior” (PIAGET, 1969), levando o indivíduo a uma adaptação cada vez mais precisa à realidade que o cerca. Embora utilize em seus textos também a palavra “equilíbrio”, Piaget faz uso da palavra “equilibração” para indicar que, enquanto a primeira expressão pode levar a uma ideia de que se atinge um determinado estado de maneira final, a segunda indica um processo que nunca termina e move o sujeito o tempo todo, em direção a um equilíbrio, que, paradoxalmente, nunca é alcançado, pois será novamente desafiado pelo ambiente. É por meio da ação que o sujeito exerce sobre o objeto e o meio ambiente que ele se constitui como sujeito cognitivo, atingindo estágios cada vez mais estáveis e com adaptações cada vez mais precisas à realidade. Quando o sujeito é posto frente a uma nova necessidade, engendrando uma ação, ele tende a assimilar essa realidade apresentada às estruturas mentais que já possui. No entanto, em alguns momentos, isso não é possível, pois essas estruturas não dão conta da situação apresentada, ou seja, é preciso que as próprias estruturas se modifiquem para acomodar os objetos externos. Ao observar bebês, é possível visualizar com mais facilidade o que Piaget propõe: um bebê que sabe virar o corpo e pegar objetos faz isso diversas vezes por dia, em um processo de assimilação. No entanto, ao tentar pegar um objeto fora do seu alcance, depara-se com um novo problema. Usar os braços para arrastar o corpo e desse modo alcançar o objeto pode ser a resposta a esse problema, ocorrendo então um processo de acomodação, ou seja, de formação de uma nova estrutura, que, no entanto, traz sempre em si mesma as estruturas anteriores na forma de subestruturas. Embora o exemplo ajude a entender esse processo, ele não é totalmente correto, pois dificilmente podemos separar assimilação e acomodação, uma vez que a cada momento o objeto impõe ao sujeito uma nova situação, com aspectos ao mesmo tempo conhecidos e novos. Podemos dizer, portanto, que esses processos são complementares. Podemos representar esse processo pela figura a seguir:

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AULA 3 - PIAGET: UM PENSADOR DA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

Ao observar a figura anterior, atente para o papel fundamental que tem o ambiente de provocar o desequilíbrio, tão necessário para o desenvolvimento cognitivo. Pense o quanto a escola pode afetar esse processo. O desenvolvimento cognitivo acontecerá por meio do processo contínuo de equilibração. No entanto, os estudos de Piaget mostraram que ele acontece em estágios ordenados e previsíveis e cada uma delas tem características próprias de organização, que levam o sujeito a perceber a realidade e responder a ela de maneira peculiar. “Cada estágio é caracterizado pela aparição de estruturas originais, cuja construção o distingue dos estágios anteriores. O essencial dessas construções sucessivas permanece no decorrer dos estágios ulteriores, como subestruturas, sobre as quais se edificam as novas características.”(PIAGET, 1969)

Ele divide esse desenvolvimento em grandes estágios, que estudaremos mais detalhadamente nas duas próximas unidades: » » 0 aos 2 anos: sensório-motor » » 2 aos 7 anos: pré-oratório » » 7 a 12 anos: operatório concreto » » 12 em diante: operatório formal Note que as idades são apenas referências. As crianças evoluem de modo diferente, embora passem sempre pela mesma sequência de fases, segundo Piaget. Você encontrará diversas formas de dividir esses estágios, conforme a precisão com que se quer estudá-los. Por exemplo, no texto Seis estudos de Psicologia, o autor divide o estágio sensório-motor em três subestágios. No filme que você vai assistir em seguida, Yves de La Taille coloca os estágios operatório concreto e operatório formal como subdivisões de um mesmo estágio, o operatório. Assista à primeira parte do documentário sobre a obra de Piaget, apresentado por Yves de La Taille, professor da USP e especialista na área (15 minutos). » » Atenção aos conceitos centrais da teoria de Piaget, que introduzimos até aqui: » » epistemologia genética; » » inteligência; » » equilibração; » » assimilação; » » acomodação. » » Você consegue ver em quais aspectos da teoria de Piaget revela-se a sua formação como biólogo? Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=8UYz8cTBfgg>. Acesso em: 10 jan. 2012.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Para entender melhor o que foi tratado até aqui, leia o texto: TERRA, M. R. O desenvolvimento humano na teoria de Piaget. Disponível em: <http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/ publicacoes/textos/d00005.htm>. Acesso em: 12 dez. 2012. Atente para: » » A natureza da interação entre sujeito e objeto. » » A relação entre as estruturas biológicas e aquelas que se constroem a partir da relação que o sujeito estabelece com o objeto e o meio. » » Equilibração como mecanismo de construção de estruturas cognitivas crescentemente complexas. Observação: O vídeo ao qual a autora se refere no texto é o que você acaba de assistir.

Os primeiros dois anos de desenvolvimento de um bebê são muito especiais, pois ele se transforma a cada dia. Todos os dias esse serzinho aprende uma coisa nova: a sorrir, acompanhar um movimento com o olhar, a virar-se, a sentar, a balbuciar etc. Nesse período, aquele bebê, incapaz de quase tudo, transforma-se em um(a) charmoso(a) garotinho(a), que tem vontades próprias, anda, já fala algumas coisas e interage intensamente com o mundo. Observe os bebês, faça perguntas a si mesmo(a): por que ele(a) faz...? Como ele(a) reage a...? Você conseguirá vislumbrar porque Piaget dedicou uma vida a entender como o Homem constrói o conhecimento.

BECKER, F. O que é construtivismo. Série Ideias n. 20. São Paulo: FDE, 1994. Disponível em: <http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a. php?t=011>. Acesso em: 12 dez. 2011.

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AULA 3 - PIAGET: UM PENSADOR DA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

REFERÊNCIAS BECKER, F. O que é construtivismo. Série Ideias n. 20. São Paulo: FDE, 1994. Disponível em: <http:// www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a. php?t=011>. Acesso em: dez. 2011. CHIAROTTINO, Zélia R. Piaget: modelo e estrutura. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972. MACEDO, L. de. O ancestral do humano e o futuro da humanidade. Coleção Memória da Pedagogia. Rio de Janeiro: Ediouro; São Paulo: Segmento Duetto. 2005. PIAGET, J. The origins of intelligence in children. Londres: Routledge & Kegan Paul, 1953. ______. Seis estudos de psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense, 1969. TERRA, M. R. O desenvolvimento humano na teoria de Piaget. Disponível em: <http://www. unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/ d00005.htm>. Acesso em: dez. 2011.

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AULA 4 Piaget: os estágios sensório-motor e pré-operatório Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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a unidade 3, você teve oportunidade de aprender alguns dos principais conceitos presentes na teoria de Piaget, especialmente aqueles ligados à equilibração: assimilação e acomodação. Nesta unidade, serão estudados os dois primeiros estágios de desenvolvimento: o sensório motor e o pré-operatório.

OBJETIVOS » » Conhecer os princípios teóricos referentes ao desenvolvimento cognitivo postulados por Piaget. » » Entender a lógica das estruturas mentais dos estágios sensório-motor e pré-operatório. » » Identificar os princípios da evolução do comportamento propostos por Piaget na atividade infantil.


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Para esta e para a próxima unidade, você precisará ter em mãos o livro: PIAGET, Jean. Seis estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães de Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. Vamos trabalhar com a primeira parte do livro: O desenvolvimento mental da criança. Você deverá ler a Introdução e os itens I: O recém-nascido e o lactente e II: A primeira infância: de dois aos sete anos.

AVALIAÇÃO Ao final desta unidade, você deverá: » » responder às questões objetivas. Como parte do trabalho desta e das próximas unidades, você deverá ler o texto de Piaget indicado anteriormente e escrever um relato de leitura, que também será entregue na Unidade 9.

ESTÁGIO SENSÓRIO-MOTOR: TRANSFORMAÇÕES EXTRAORDINÁRIAS, DO CAOS AO COSMO Você já parou para pensar quão enorme é diferença entre um bebê recém-nascido e um garotinho ou garotinha de dois anos? Entre aquele ser que “não sabe fazer nada” e aquele outro que já anda, está começando a falar, interage com você, brinca, dá risada? Quando o bebê nasce, a única coisa que “sabe” fazer é sugar – um reflexo hereditário fundamental à sobrevivência, pois é o que permite que ele se alimente. A sucção passa a ser a forma de assimilação do universo que o cerca e aperfeiçoa com o exercício. Observando os bebês, você pode notar que ele suga, não apenas o seio da mãe, mas tudo o que lhe é oferecido, o vazio, os dedos, os brinquedos etc. Ele generaliza essa ação. É sobre esse reflexo que o bebê constrói seus esquemas de ação. Bebês têm outro reflexo importante: o de pegar. Você já notou como bebês muito pequenos fecham os dedos em torno de um objeto que lhe é colocado na palma da mão? Sobre a articulação desses dois reflexos, eles constroem uma ação mais complexa: pegar um objeto e colocá-lo na boca. Ao assimilar esquemas cada vez mais complexos, o bebê vai construindo “[...] um universo objetivo, onde o próprio corpo aparece como elemento entre os outros, e ao qual se opõe a vida interior, localizada nesse corpo” (PIAGET, 1969). Nesse período o bebê passa da indissociação completa entre o eu e o mundo externo à construção de um universo objetivo, do qual faz parte. Uma “revolução copérnica”, como diz Piaget (1969), que leva a criança do “caos” perceptivo ao “cosmo”, do qual ainda é o centro, no entanto. Nesse período, quatro processos importantes acontecem: a construção de categorias de objeto, do espaço, da causalidade e do tempo.

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AULA 4 - PIAGET: OS ESTÁGIOS SENSÓRIO-MOTOR E PRÉ-OPERATÓRIO

Assista agora a segunda parte do documentário sobre Piaget, com Yves de La Taille. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=TxtcB XOz8ZU&feature=related>. Acesso em: jan. 2012.

Como você viu no filme, a conquista da noção de permanência do objeto é central neste estágio de desenvolvimento. E o bebê trabalha muito nessa construção: sabe aquela brincadeira que todo bebê por volta dos 7-8 meses adora, quando o adulto esconde o rosto atrás de alguma coisa e ao aparecer, diz “achou!”? Ele está nesse processo de construção, de perceber que um objeto pode existir apesar de não estar no seu campo de visão. Pode parecer pouco, mas esse processo é fundamental para o desenvolvimento posterior da linguagem. Não é por meio dela que nomeamos coisas que não estão presentes, que simbolizamos?

Ao brincar com um bebê de aproximadamente 8-9 meses, esconda um brinquedo embaixo de um pano ou almofada. Deixe o bebê ver o que você está fazendo (a ideia não é enganá-lo). Será que ele vai procurar o brinquedo ou simplesmente ignorar? Crianças que ainda não construíram a noção de permanência do objeto vão agir como se o objeto não existisse mais, as mais velhas vão procurá-lo. É fascinante!

Leia agora a parte introdução do texto de Piaget Seis Estu-dos de Psicologia e a parte que se refere ao período sensório--motor: I: O recém-nascido e o lactente. Atente para: » » a relação que Piaget estabelece entre o desenvolvimento da inteligência e o desenvolvimento da afetividade; » » a construção de esquemas progressivamente mais complexos de ação e ao modo como o bebê incorpora, ao encontrar-se face a novos objetos, esquemas de ação que já conhece, assimilando-os entre si. Pense em outros exemplos, diferentes dos relatados no livro; » » a distinção que o autor faz entre inteligência prática e pensamento; » » a progressão entre a indissociação entre o eu e o mundo exterior para a construção de um universo objetivo, no qual a criança pode se ver como um elemento entre outros.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

A leitura de Piaget não é uma tarefa fácil. Ele é um autor complexo, mas fundamental para todos aqueles que querem trabalhar com educação. Desafie-se!

ESTÁGIO PRÉ-OPERATÓRIO: LINGUAGEM E PENSAMENTO Pense nas crianças entre 2 e 7 anos que você conhece. A diferença entre a menor e a maior é enorme, não é verdade? A primeira está começando a falar, apresenta uma autonomia muito restrita e ainda é pouco socializada, já com 6 ou 7 anos é completamente diferente: a criança expressa-se verbalmente com bastante precisão, é autônoma para muitas atividades e decisões e tem sociabilidade mais avançada. É impressionante a transformação pela qual passa a criança nesses anos! Você viu no filme que assistiu há pouco que a capacidade de representação, “de pensar um objeto através de outro objeto”, como diz La Taille, é central na passagem do estágio sensório-motor para o pré-operatório e modifica qualitativamente a inteligência da criança. A criança passa a desenvolver a fala, a desenhar e a brincar com os objetos de uma nova maneira: eles passam a representar outra coisa. A criança pode então pegar uma vassoura e “transformá-la” tanto em cavalo e a si mesma em cavaleiro ou pode transformá-la em um objeto voador e a si mesma em bruxa. “Piaget constatou em suas pesquisas que não é a linguagem que explica essa transformação (capacidade de inserir objetos e fatos no tempo, relatar fatos passados ou referir-se a eventos futuros [nota minha]), mas sim a função semiótica, ou seja, a capacidade de distinguir o significado do significante – sem a qual a própria linguagem não seria adquirida. A linguagem aparece depois da brincadeira simbólica e a imitação na ausência do modelo correspondente, as quais implicam a existência de uma imagem mental, reflexo da presença da função semiótica. Portanto, o pensar é anterior ao falar. Prever é anterior ao falar, reconhecer indícios, sinais e antecipar, são todas capacidades anteriores à linguagem. (CHIAROTTINO, 2005)

La Taille aponta duas outras características importantes dessa fase: o nascimento da moralidade e o egocentrismo. A criança nesse estágio de desenvolvimento está centrada em seu ponto de vista e não consegue entender ou se colocar no lugar do outro. O que pode levá-la a muitas disputas com amigos e irmãos e a jogarem sem se preocupar em seguir uma ordem ou as regras estabelecidas. Para a criança pequena, é sempre “minha vez!”. A moral da criança desse período é heterônoma, ou seja, ela é dependente do exterior, em geral da figura de autoridade, sejam os pais ou a professora. A criança aqui toma regras e orientações ao pé da letra (mesmo que desobedeça).

Para se aprofundar mais nesse estágio do desenvolvimento, leia agora o item II: A primeira infância: de dois a sete anos, do livro Seis Estudos de Psicologia de Piaget. Neste trecho, o autor traz noções fundamentais para o entendimento desse estágio. Atente para:

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AULA 4 - PIAGET: OS ESTÁGIOS SENSÓRIO-MOTOR E PRÉ-OPERATÓRIO

» » o desenvolvimento da linguagem: ele é central nesse estágio, permitindo à criança a socialização das ações, a reconstrução de ações passadas, por meio da narrativa, bem como a antecipação de ações futuras. No entanto, a criança ainda não abandona totalmente o seu ponto de vista egocêntrico, mas vai incorporando os dados da realidade ao seu eu e à sua atividade. Observe uma conversa entre crianças entre 3 e 6 anos de idade ou um momento em que elas estão brincando sem interferência do adulto para entender mais completamente o que Piaget quer dizer. Observe ainda como ela fala consigo mesma enquanto está brincando: ela produz monólogos narrando o que está fazendo, o que vai fazer ou qual o papel da boneca, por exemplo. “Agora eu era a mamãe”. Esses monólogos ajudam a criança a organizar a usa ação imediata. Uma característica dessa idade que será analisada também por Vygotsky, de perspectiva totalmente diferente. Chico Buarque, na música João e Maria, utiliza essa linguagem infantil. Disponível em: <http://www.youtube.com/ watch?v=K2dqYhkXHWk>. Acesso em: jan. 2012. » » a linguagem está intrinsecamente ligada à gênese do pensamento: a criança vai se passando da assimilação dos dados à sua realidade interna (egocentrismo) a um “[...] pensamento adaptado aos outros e ao real” (PIAGET, 1969). » » o jogo simbólico: o tão conhecido “faz de conta”, tão característico dessa idade, no outro está o pensamento intuitivo, que Piaget chama de “[...] lógica da primeira infância” (PIAGET, 1969). Por meio do jogo simbólico, a criança busca compreender a realidade, assimila o mundo social e revive conflitos e prazeres. Tem papel importante nesse processo a imitação. » » Intuição: para Piaget, quer dizer a “[...] interiorização das percepções e dos movimentos, sob a forma de imagens representativas”. A criança “confia” apenas na sua percepção para suas conclusões.

O caráter das infinitas perguntas que a criança dessa idade faz, bem como muitas das suas respostas, revelam sua posição egocêntrica. Como quando responde que a noite existe para que possamos dormir. Também os objetos e animais são vivos em função dessa posição. Como você pode ver, essa é uma etapa fascinante do desenvolvimento infantil. Agora que estudou diversos aspectos da teoria de Piaget, observe as crianças e procure relacionar suas brincadeiras e perguntas com o que você aprendeu.

MACEDO, L. de. A perspectiva de Jean Piaget. Série Ideias n. 2, São Paulo: FDE, 1994. Disponível em: <http://www.crmariocovas. sp.gov. br/dea_a.php?t=004>. Acesso em: jan. 2012.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

LINKS A página sobre Desenvolvimento e Aprendizagem do site do Centro de Referência em Educação Mário Covas traz ótimos artigos sobre as teorias de Piaget e Vygotsky. Disponível em: <http://www. crmariocovas.sp.gov.br/dea_l.php?t=001>. Site da Jean Piaget Society traz muitas informações e permite baixar livros do autor de graça (em inglês). Disponível em: <http://www.piaget.org/index. html>. Acessos em: jan. 2012.

VÍDEOS O filme Piaget on Piaget traz o próprio autor discutindo sua teoria, no entanto, tem apenas versão em inglês. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=I1JWr4G8YLM&feature=related>. Uma versão dublada pode também ser encontrada no YouTube, mas de qualidade bastante duvidosa. Disponível em: <http://www. youtube.com/watch?v=rclZJ6z4MqI&feature=related>. Veja no link a seguir uma prova de permanência do objeto. Disponível em: <http://www.youtube. com/watch?v=yLJNYHNN7v w&feature=related>. Acessos em: jan. 2012.

REFERÊNCIAS CHIAROTTINO, Z. R. Piaget: modelo e estrutura. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972. ______. Os “estágios” do desenvolvimento da inteligência. Jean Piaget. Coleção Mestres da Pedagogia, n.1. Rio de Janeiro: Ediouro; São Paulo: Segmento-Duetto, 2005. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense, 1969.

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AULA 5 Piaget: os estágios operacional concreto e formal Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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as unidades 3 e 4, você estudou o mecanismo básico de equilibração, que é aquele presente em todo o desenvolvimento mental da criança até o adulto, e os estágios sensório-motor e pré-operatório. Nesta unidade, vamos continuar essa trajetória, estudando agora os estágios operacional concreto e formal.

OBJETIVOS » » Conhecer os princípios teóricos postulados por Piaget referentes ao desenvolvimento cognitivo. » » Entender a lógica das estruturas mentais dos estágios operacional concreto e formal. » » Identificar na atividade infantil os princípios propostos por Piaget da evolução do comportamento.


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Para o acompanhamento desta unidade, você precisará ter em mãos o livro: PIAGET, Jean. Seis estudos de Psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães de Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. Vamos continuar trabalhando com a primeira parte do livro: O Desenvolvimento Mental da Criança, itens III. A infância de sete a doze anos e IV. A adolescência.

AVALIAÇÃO Ao final desta unidade, você deverá: » » responder às questões objetivas. Como parte do trabalho desta unidade, você deverá ler o texto de Piaget indicado anteriormente e completar o relato de leitura que você iniciou na Unidade 4, que também será entregue na Unidade 9. O relato de leitura é a respeito de toda a primeira parte do livro.

ESTÁGIO OPERACIONAL CONCRETO: OPERAÇÕES NAS PONTAS DOS DEDOS Faça uma experiência: 1) coloque na frente de uma criança de 5 anos dois copos iguais; 2) despeje neles quantidades iguais de suco; 3) peça que a criança concorde que os dois têm a mesma quantidade (acerte a quantidade de líquido até ela achar que os dois copos estão com o mesmo tanto de líquido); 4) despeje o conteúdo de um dos copos em uma vasilha rasa (na frente da criança, não se trata de nenhum truque!) e pergunte em qual dos recipientes a criança acha que tem mais líquido e por que. A criança vai achar que há mais líquido no copo porque ele é mais alto ou na vasilha porque ela é mais larga, mas não vai achar que a quantidade de líquido é a mesma. Impressionante? O que acontece com a criança que ela não percebe que a quantidade de líquido não se modificou? Não se preocupe: ela opera baseada na intuição, avalia a situação pela sua qualidade perceptiva: altura ou largura do recipiente, mas não faz a análise das relações entre altura e largura.

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AULA 5 - PIAGET: OS ESTÁGIOS OPERACIONAL CONCRETO E FORMAL

Assista ao vídeo com esse experimento e mais dois outros, com moedas e com biscoitos. Observação: existem inúmeros vídeos com essas provas piagetianas no YouTube, a maioria é resultado de trabalhos feitos por alunos em cursos de Psicologia. Escolhi esse, por ser bem aplicado e mais claro. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=GELep ogJmY0&feature=related>. Acesso em: jan. 2012.

Como vimos na unidade anterior, a criança está no estágio pré-operatório dos 2 aos 7 anos: “A criança permanece pré-lógica, incapaz de argumentar e tirar conclusões coerentemente, supre essa falta pelo mecanismo da intuição, graças à qual, diante de um problema prático em uma brincadeira ou em um jogo, suas respostas se apoiam nas configurações perceptivas ou nos tateios empíricos de suas ações.” (RAMOZZI-CHIAROTTINO, 2005)

Essa forma específica de cognição se modificará profundamente por volta dos 7 anos de idade. As relações intuitivas vão se agrupar, transformando ações em operações. A criança desenvolverá a capacidade de operar e raciocinar de forma lógica. No entanto, o “[...] pensamento infantil só se torna lógico por meio da organização de sistemas de operações, que obedecem às leis de conjuntos comuns” (PIAGET, 1974), tais como: » » composição: 1+1=2; » » reversibilidade: toda operação pode ser invertida; » » identidade: operação combinada com sua inversa é nula; » » associatividade: operações podem ser associadas de diversas maneiras. Operações são ações interiorizadas reversíveis e coordenadas, que só são possíveis quando a criança desenvolve a “[...] noção de conservação de um todo, independentemente do arranjo de suas partes” (RAMOZZI-CHIAROTTINO, 2005. No exemplo anterior, a criança ainda não tem essa noção de conservação de substâncias, por isso afirma que a quantidade de líquido é diferente, mesmo quando vê que o líquido apenas mudou de recipiente.

Assista à terceira parte do documentário narrado por Yves de La Taille a respeito do estágio operatório concreto. Disponível em: <http:// www.youtube.com/watch?v=h3EzpmEK6yU>. Acesso em: jan. 2012. Atente para a explicação a respeito da ação interiorizada reversível, central para o entendimento dos estágios operacional concreto e formal; e para o desenvolvimento moral da criança, explicado pelo narrador.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Observe as provas piagetianas disponíveis no livro de Francesco Tonucci Com os olhos de criança (1997).

A noção de conservação evolui conforme a criança fica mais velha. Veja a seguir a idade, em média, em que elas iniciam a aquisição de noção para as medidas listadas. » » Substância: 7-8 anos. » » Peso: 9-10 anos. » » Volume: 11-12 anos. As observações de Piaget e seus seguidores permitem afirmar que a criança passa de um estágio em que não tem nenhuma noção de conservação, para um em que a conservação é suposta sem certeza, apenas para certas transformações, e finalmente evolui para a conservação afirmada como evidente. Faça o mesmo experimento com uma criança de 12 anos e ela vai olhar para você como se a pergunta que você está fazendo fosse a mais sem sentido possível. Veja a seguir a sequência da aplicação das provas piagetianas de conservação: Figura 1 - Conservação de líquidos

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AULA 5 - PIAGET: OS ESTÁGIOS OPERACIONAL CONCRETO E FORMAL

Figura 2 - Conservação de matéria

Figura 3 - Conservação de peso

No entanto, a criança nesse estágio opera de forma concreta, daí o nome do estágio: operacional concreto. Ou seja, os esquemas referem-se a objetos ou situações que podem ser manipulados ou imaginados de forma concreta. Por isso, nas primeiras séries utilizam-se materiais diversos nas aulas de Matemática: material dourado, pedrinhas, pauzinhos etc. E pede-se para que a criança desenhe a solução dos problemas propostos. Trata-se de uma lógica ainda elementar, vinculada aos processos temporais de manipulação. As crianças não conseguem fazer um raciocínio se a questão for colocada de forma verbal: “Elisa é mais alta que Ana e ao mesmo tempo mais baixa que Suzana. Qual delas é a mais alta?”: essa resposta só vem por volta dos 10 anos.

Assista ao vídeo para outro exemplo, mostrando que a criança no estágio operacional concreto não consegue raciocinar logicamente segundo uma regra, se essa regra contradisser aquilo que ela sabe por experiência própria. Disponível em: <http:// www.youtube.com/ watch?v=1p_o7nXMiqs&feature=related>. Acesso em: jan. 2012.

Para se aprofundar nas características desse estágio de desenvolvimento leia agora o item III. A infância de sete a doze anos do livro de Piaget Seis Estudos de Psicologia. Atente apara os seguintes aspectos, além daqueles que já tratamos anteriormente: » » o desaparecimento quase total da posição egocêntrica, que tem impacto importante na socialização, na linguagem e nas brincadeiras, especialmente os jogos com regras;

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

» » desenvolvimento das operações racionais que se manifestam na evolução da capacidade de seriação, no estabelecimento das relações lógicas de igualdade, bem como de classificação, que a criança de 5-6 anos só fará considerando um atributo, enquanto a criança de 8-9 anos fará considerando 2 ou 3 atributos, por exemplo: círculos pequenos azuis ou quadrados grandes vermelhos, ou no desenho de Francesco Tonucci no livro Com os olhos de criança (1976);

» » a nova organização dos valores morais que aparece nesse estágio do desenvolvimento, e modifica a relação com as regras, que se tornam agora combinadas com os demais, bem como o sentimento de justiça e o respeito mútuo. Experimente fazer as provas piagetianas. Você verá como é muito interessante verificar as respostas das crianças às questões que propomos. Acima de tudo, observe as crianças brincando e as maneiras como solucionam os problemas que lhes são oferecidos e tente entender porque respondem desse ou daquele modo.

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AULA 5 - PIAGET: OS ESTÁGIOS OPERACIONAL CONCRETO E FORMAL

ESTÁGIO OPERACIONAL FORMAL: EM PENSAMENTO TUDO SE TORNA POSSÍVEL Aproximadamente a partir dos 12 anos o indivíduo muda muito. A criança no estágio operacional concreto opera concretamente, ou seja, encontra soluções para os problemas, sem encontrar princípios gerais que se aplicariam a todos os problemas semelhantes. Já o adolescente passa a operar dentro de uma lógica formal, sem que lhe sejam necessários os apoios concretos antes utilizados. Passa a executar em pensamento ações sobre os objetos. Assim, agora ele é capaz de responder a questões expressas em palavras ou em símbolos matemáticos (agora ele é capaz de operar problemas de álgebra, por exemplo): “Edith tem cabelos mais escuros que Lili. O de Edith é mais claro que o de Suzana. Qual das três tem cabelos mais claros?”. Essa possibilidade abre um mundo inteiramente novo ao adolescente, uma vez que a reflexão passa a ser livre e destacada do real, permitindo que se construam sistemas e teorias próprias. Nesse sentido, a transformação do mundo torna-se possível, o que tem muitas implicações afetivas também (pense em todas aquelas discussões acaloradas que você teve com seus pais...). Piaget destaca, no entanto, a presença ainda de uma forma de egocentrismo intelectual que se: “[...] manifesta pela crença na onipotência da reflexão, como se o mundo devesse submeter-se aos sistemas e não estes à realidade. É a idade metafísica por excelência: o eu é forte o bastante para reconstruir o Universo e suficientemente grande para incorporá-lo. (Piaget, 1969) ”

Esse egocentrismo se desvanecerá aos poucos, conforme o pensamento formal vai sendo desafiado pela realidade, mas, enquanto isso não ocorre, traz em si traços de megalomania ou de messianismo. É uma época de intensas descobertas, de construção de uma personalidade própria e da inserção em um mundo de adultos: tarefa nada fácil.

Leia agora o item IV: A adolescência, para melhor entender essas ideias de Piaget. Atente para: » » o papel do egocentrismo na formação do pensamento formal e como finalmente ele vai desaparecendo; » » a sociabilidade adolescente, como entendida pelo autor; » » a relação entre afetividade e inteligência apontada por Piaget. Reflita a respeito da passagem transcrita a seguir e no papel que a escola deve ter na construção de “programas de vida” dos adolescentes: “Percebe-se, em geral, comparando-se as realizações dos indivíduos aos seus antigos comportamentos de adolescentes, que aqueles que, entre 15 e 17 anos, nunca construíram sistemas inserindo seus programas de vida em um vasto sonho de reformas, ou aqueles que, no primeiro contato com a vida material, sacrificaram seus ideais quiméricos a novos interesses adultos, não foram os mais produtivos. A metafísica própria ao adolescente, assim como suas paixões e megalomanias, são preparativos reais para a criação pessoal.”(Piaget, 1969)

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Para finalizar as Unidades 3, 4 e 5, nas quais tratamos da teoria construtivista, como cunhada por Jean Piaget, assista à quarta parte do documentário a respeito desse autor, com Yves de La Taille. Disponível em: <http://www.youtube.com/ watch?v=13qkS1TITbI>. Acesso em: jan. 2012. Atente especialmente para os mitos a respeito da teoria construtivista apontados pelo narrador. O que foi mais difícil de entender? Por quê? O que foi mais fácil? Por quê? Quais dos meios utilizados nessa unidade facilitaram/dificultaram sua aprendizagem?

» » Essa coletânea de textos de autores espanhóis conhecidos no campo da educação discute as concepções construtivistas no dia a dia da escola: » » COLL, César et al. O construtivismo na sala de aula. Tradução: Cláudia Schilling. São Paulo: Ática, 2009. » » As práticas construtivistas vêm sendo bastante contestadas nos últimos tempos, principalmente em função dos maus resultados dos estudantes brasileiros nos testes padronizados como o internacional PISA, o nacional Prova Brasil e os estadual Saresp. Leia o artigo da revista Veja que aponta alguns dos problemas do construtivismo na sala de aula, segundo seus críticos. Veja, no entanto, que um dos grandes problemas apontados é a falta de compreensão do professor da teoria. Você viu que a teoria não é fácil, faça a sua parte: dedique-se a entendê-la e tirar suas próprias conclusões.

LINKS O site <www.scielo.br> é um portal de revistas científicas com acesso gratuito. Ele traz inúmeros artigos que abordam o construtivismo nas mais diferentes áreas da educação: linguagem, matemática, ciências, epistemologia etc.

VÍDEO Assista ao trecho do DVD Construtivismo e práticas pedagógicas, produzido por ATTA Mídia, no qual o professor Lino de Macedo, do Instituto de Psicologia da USP, comenta fragmentos de aulas. Disponível em: <http://www.youtube. com/watch?v=cclgw2Iy6R0>. Acesso em: jan. 2012.

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AULA 5 - PIAGET: OS ESTÁGIOS OPERACIONAL CONCRETO E FORMAL

REFERÊNCIAS PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Tradução: Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense, 1969. RAMOZZI-CHIAROTTINO, Z. R. Piaget: modelo e estrutura. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972. ______. Os “estágios” do desenvolvimento da inteligência. Jean Piaget. Coleção Mestres da Pedagogia, n.1. Rio de Janeiro: Ediouro; São Paulo: Segmento Duetto, 2005.

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AULA 6 Vygotsky e a construção social da mente Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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as unidades anteriores, estudamos um dos mais importantes pensadores da Psicologia do século XX, Jean Piaget. Nesta e na unidade 7, vamos voltar nossa atenção para outro autor que influenciou (e influencia) muito o campo da educação, no Brasil e no exterior: Lev Semenovich Vygotsky (você encontrará o nome desse autor grafado de inúmeras maneiras: Vigotsky, Vigotski, Vygotski, dependendo da tradução ou do autor da obra).

OBJETIVOS Atenção Para esta unidade, você precisará ter em mãos o livro:


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 2010. Você vai ler para esta unidade os capítulos 1 e 2 do livro. Observação: a indicação de vídeos e leitura foi feita em uma ordem que facilitará a compreensão. Procure respeitar essa ordem.

AVALIAÇÃO Ao final desta unidade, você deverá: » » responder às questões objetivas.

VYGOTSKY, UM PENSADOR DAS RELAÇÕES ENTRE INDIVÍDUO E SOCIEDADE Tradicionalmente, a Psicologia e a Sociologia têm perspectivas diferentes. A primeira tende a focar seus estudos no que acontece com o indivíduo, os seus processos mentais e de desenvolvimento; a segunda tende a olhar a organização social e suas transformações. Mas há aqueles que questionam quais as relações entre indivíduo e sociedade: como a organização social impacta/constrói o desenvolvimento e a mente humana? Por meio de quais mecanismos o indivíduo se torna o que é? Um dos mais importantes pensadores desse campo, Vygotsky buscou conceber uma nova Psicologia, que incluísse essa relação entre indivíduo e sociedade. Sua trajetória de vida marca profundamente a sua obra, bem como os acontecimentos históricos posteriores à sua morte marcam a sua entrada tardia no cenário acadêmico mundial. Vygotsky nasceu em 1896 na cidade de Orsha, na Bielorrússia, em uma família bastante letrada. Formou-se em Direito em 1917 e estudou Literatura, História, Psicologia, Filosofia, graduando-se mais tarde também em Medicina. As profundas transformações sociais trazidas pela Revolução Russa em 1917, a implantação de um governo socialista e a adesão às ideias marxistas marcaram as pesquisas e teorias desse autor, que morreu aos 37 anos de tuberculose. Em 1936, sob a ditadura stalinista, sua obra tornou-se proibida, permanecendo assim por 30 anos. Foi só com a tradução de Pensamento e Linguagem para o inglês, em 1962, que seus trabalhos começam a ficar conhecidos. Entre 1982 e 1984 publicaram-se na URSS (União Soviética, atualmente Rússia) as obras completas de Vygotsky. Foi somente nesse ano que a coletânea de textos A formação social da mente foi publicada no Brasil, intensificando o interesse por esse autor e suas ideias.

Para completar essa introdução à vida e obra de Vygotsky, leia o Capítulo 1 – História pessoal e intelectual do livro Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico, de Marta Kohl de Oliveira.

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AULA 6 - VYGOTSKY E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA MENTE

O DESENVOLVIMENTO DE UMA NOVA PSICOLOGIA As pesquisas de Vygotsky tinham como fonte teórica do seu trabalho o materialismo histórico e dialético de Marx e Engels. Seu pano de fundo o desenvolvimento de uma nova Psicologia, que integrasse os mecanismos cerebrais subjacentes ao funcionamento psicológico e a constituição do sujeito e da espécie humana ao longo do processo histórico-cultural, em um mesmo modelo explicativo. Mas, palavras de Oliveira (2005, Vygotsky busca “[...] integrar em uma mesma perspectiva o ser humano enquanto corpo e mente, enquanto ser biológico e cultural, enquanto membro de uma espécie animal e participante de um processo histórico.” Para Vygotsky, todo o processo psíquico tem bases biológicas que definem os seus limites e suas possibilidades. No entanto, o funcionamento do cérebro de uma pessoa hoje foi sendo moldado tanto ao longo da história da espécie, como ao longo do desenvolvimento desse indivíduo (ideias bastante compartilhadas pelos neurocientistas atualmente): “O desenvolvimento psicológico não pode ser pensado como um processo abstrato, descontextualizado, universal: o funcionamento psicológico, particularmente no que se refere às funções psicológicas superiores, tipicamente humanas, está baseado fortemente nos modos culturalmente construídos de ordenar o real.” (OLIVEIRA, 2005)

Por isso, Vygotsky postula que o desenvolvimento do indivíduo tem quatro planos: filogenético, ontogenético, sociogenético e microgenético. O filogenético refere-se ao desenvolvimento da espécie humana e suas características peculiares, ao longo da história da espécie: o fato de sermos bípedes, de podermos falar, de termos um cérebro grande, por exemplo. O ontogenético refere-se ao desenvolvimento do indivíduo propriamente dito, principalmente nos seus aspectos biológicos: por exemplo, a evolução do andar, da fala etc.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

O plano sociogenético tem relação com a interação do indivíduo na cultura e como essa relação define seu funcionamento psicológico: pense, por exemplo, na relação que as pessoas têm com a tecnologia hoje e o quanto isso nos torna pessoas diferentes daquelas que foram nossos avós (há estudos atuais sobre o impacto do uso da internet na estrutura do pensamento, por exemplo). Já o plano microgenético refere-se ao desenvolvimento de um fenômeno psicológico específico: por exemplo, como Pedrinho aprendeu a ler. É principalmente esse plano que permite a individualização e a singularidade dos indivíduos, uma vez que a maior parte das características dos dois primeiros planos é compartilhada com todos os membros da espécie humana e com os demais indivíduos pertencentes a certa cultura no plano sociogenético. Assista a primeira parte do documentário, produzido por ATTA mídia, a respeito de Vygotsky, narrado por Marta Kohl de Oliveira, uma das maiores especialistas brasileiras sobre esse pensador. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=2qnBE_8A6Fk> Acesso em: jan. 2012. Marta dá dois exemplos no filme de elementos culturais que mudaram muito nos últimos tempos e que implicam formas diversas de funcionamento psicológico: o fenômeno da adolescência e o da terceira idade. Você consegue pensar em outras transformações sociais que modificaram muito a psique humana na nossa cultura recentemente?

A MEDIAÇÃO SIMBÓLICA: INSTRUMENTOS E SIGNOS Para Vygotsky, a relação do ser humano com o mundo não se dá apenas de maneira direta, mas é fundamentalmente uma relação mediada por elementos (instrumentos, signos, elementos de significado cultural) que são construídos nas relações entre os seres humanos.

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AULA 6 - VYGOTSKY E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA MENTE

Os instrumentos são os elementos que trazem uma mediação mais concreta entre o homem e o seu ambiente. Por exemplo, uma marreta usada para quebrar pedras, um lápis usado para escrever, uma panela usada para cozinhar etc. E é por meio do trabalho, com o uso do instrumento, que a ação transformadora do homem sobre a natureza cria a cultura e a história humanas. No entanto, ao mesmo tempo em que transforma a natureza, o homem transforma a si mesmo: ele pensa, planeja, cria, aprende, avalia. A cada ação sobre o mundo, o homem muda. Nesse sentido, o trabalho é o fundamento da sociedade humana e o que o distingue dos demais animais. Essa ideia central na teoria de Vygotsky revela a influência das ideias marxistas sobre o homem como ser histórico, que transforma o mundo com suas ações e que se distingue dos animais pela sua capacidade simbólica, como nos ensina Marx: “Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colmeia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador. Ele não transforma apenas o material sobre o qual opera; ele imprime ao material o projeto que tinha conscientemente em mira, o qual constitui a lei determinante do seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade. E essa subordinação não é um ato fortuito. Além do esforço dos órgãos que trabalham, é mister a vontade adequada que se manifesta através da atenção durante todo o curso do trabalho.” (MARX, O Capital, Cap. VII)

Assista ao pequeno trecho do filme 2001: uma odisseia no espaço, em que o diretor Stanley Kubrick exibe sua versão cinematográfica do “amanhecer do homem”, momento em que o macaco se apropria de um osso e o utiliza como instrumento, dando início às transformações que nos trouxeram até aqui. Atente para a linda imagem que o diretor coloca ao final dessa cena, quando o osso se transforma em nave espacial. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=QSxI0 OOjR0Y&feature=related>. Acesso em: dia jan. 2012. Sugestão: se você não assistiu a esse filme ainda, faça-o. Ele é tido pelos críticos como uma das obras mais importantes da história do cinema.

OS SIGNOS Já com a construção dos signos, formas posteriores de mediação, o ser humano passa a controlar não apenas o mundo exterior, como o faz quando utiliza os instrumentos, mas a construir e controlar o mundo interior e seus processos psicológicos. Podemos dizer que os signos estão por toda parte na nossa cultura, e o compartilhamento dos sistemas simbólicos permite comunicação, construção de significados, interpretação de objetos e de situações do mundo real.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Você consegue identificar o que essas imagens simbolizam? Eles nos parecem tão estranhos porque não pertencem à cultura que compartilhamos, não tem significado para nós e não podemos nos comunicar com base neles. Já os mostrados a seguir são bem fáceis de identificar, e sabemos exatamente o que representam, não é?

O surgimento da linguagem, um sistema simbólico altamente complexo, é uma das mais importantes conquistas da evolução, provavelmente advinda da necessidade de intercâmbio durante o trabalho, essa atividade especificamente humana. Vygotsky atribui a ela enorme importância, pelo seu papel no desenvolvimento dos processos mentais superiores e pela possibilidade que ela traz da construção de significados compartilhados, bem como no compartilhamento de experiências dos outros, proporcionando a imersão na cultura e na história. Boa parte do que aprendemos acontece na interação com os outros. “O sujeito humano é constituído por aquilo que é herdado fisicamente e pela existência individual, mas sua vida, seu trabalho, seu comportamento também se baseiam claramente na experiência dos outros e nas conquistas acumuladas pelas gerações que os precederam. Além disso, o homem é o único animal que utiliza a experiência duplicada, isto é, vivida mentalmente antes de ser vivida concretamente, o que lhe permite uma adaptação ativa ao meio, inexistente nas outras espécies.”

Você já parou para pensar quanto trabalho e conhecimento acumulado ao longo de gerações estão impregnados nos objetos do nosso dia a dia, como um carro, um celular ou mesmo uma refeição?

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AULA 6 - VYGOTSKY E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA MENTE

INTERNALIZAÇÃO Uma das principais características do desenvolvimento do indivíduo é o processo de internalização, por meio do qual o sujeito reconstrói internamente uma operação externa utilizando signos internos “[...] representações mentais que substituem os objetos do mundo real” (OLIVEIRA, 2010). Quando pensamos em “casa”, por exemplo, temos uma ideia mental de “casa”, com alguns atributos peculiares (telhado, porta, janela etc.), mas não necessariamente a imagem de uma determinada casa. Contudo, o signo “casa” e seu significado são compartilhados por todos nós, falantes da língua portuguesa, permitindo-nos contar histórias, imaginar ações descritas ou pensar sobre ela. Portanto, é essa ideia de “casa” que faz a mediação entre a casa real e a atividade mental do sujeito. O fato de termos essas representações internalizadas nos permite lidar com objetos e ideias afastadas da realidade, no tempo e no espaço, imaginar EVENTOS futuros, planejar, comparar ou lembrar. Como se vê, esse processo de internalização, um dos fundamentos do funcionamento psicológico, é enraizado na cultura e, portanto, histórico. Vygotsky (2007) nos dá um exemplo do processo de internalização do gesto de apontar, que inicialmente é apenas uma tentativa sem sucesso de alcançar um objeto. No entanto, quando alguém ajuda a criança a alcançar o objeto, “[...] a tentativa malsucedida da criança engendra uma reação, não do objeto que ela procura, mas de uma outra pessoa”. Esse gesto ganha então um novo significado dado pelo outro: o movimento de pegar se transforma em ato de apontar, tornando-se ainda um meio de estabelecer relações. Esse processo de internalização acontece, pois em uma série de transformações: a) “[...] uma operação que inicialmente representa uma atividade externa é reconstruída e começa a ocorrer internamente” (VYGOTSKY, 2007). O gesto passa a representar uma intenção; b) “[...] um processo interpessoal é transformado em um processo intrapessoal” (idem), portanto, as funções do desenvolvimento ocorrem antes no nível das relações sociais e depois no nível interno (intrapsicológico); c) “[...] a transformação de um processo interpessoal num processo intrapessoal é o resultado de uma longa série de eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento” (idem). Ou seja, esse é um processo duradouro e demorado, com características específicas para as diversas funções (por exemplo, o gesto de apontar ou a fala).

Assista agora à Parte 2 do vídeo a respeito de Vygotsky, narrado por Marta Kohl de Oliveira. Disponível em: <http://www. youtube.com/ watch?v=TpFLOsoyKTA>. Acesso em: jan. 2012. Veja que no vídeo a narradora dá uma explicação mais detalhada sobre a importância da microgênese, que tratamos há pouco e aborda a questão da mediação simbólica e da representação.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Para sistematizar o que tratamos nesta unidade, leia agora o Capítulo 2 – A mediação simbólica do livro Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico, de Marta Kohl de Oliveira. Ao final desta leitura, você deve ter compreendido os seguintes conceitos: » » instrumento; » » signo; » » mediação; » » internalização; » » representação; » » papel da cultura na construção das representações e dos signos. Dica: Escreva em seu caderno o que você aprendeu sobre cada um deles e depois confira suas anotações com o texto.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Tradução: José Cipolla Neto; Luís Barreto e Solange C. Afeche. São Paulo: Martins Fontes, 2007. MARTINS, J. C. Vygotsky e o papel das interações sociais na sala de aula: reconhecer e desvendar o mundo. Série Ideias n. 28. São Paulo: FDE, 1997. Disponível em: <http://www.crmariocovas.sp.gov. br/ dea_l.php?t=001>. Acesso em: dez. 2011.

REFERÊNCIAS MARX, K. O capital: crítica da economia política. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. OLIVEIRA, M. K. de. História, consciência e educação. Memória da pedagogia: Vygotsky. São Paulo: Segmento Duetto, 2005. ______. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione. 2010. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Tradução: José Cipolla Neto; Luís Barreto e Solange C. Afeche. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

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AULA 7 Vygotsky: desenvolvimento e aprendizagem Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

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esta unidade, vamos dar continuidade ao estudo do pensamento de Vygotsky, abordando alguns temas centrais da sua teoria: a relação entre linguagem e pensamento e entre desenvolvimento e aprendizagem.

OBJETIVOS

» » Entender a relação entre linguagem e pensamento, como proposta por Vygotsky. » » Conhecer as relações entre desenvolvimento e aprendizagem como postulados por Vygotsky. » » Entender o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. » » Refletir a respeito do papel da escola no processo de desenvolvimento para esse autor.


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Atenção Para esta unidade, você precisará ter em mãos o livro: OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 2010. Você vai ler para esta unidade os capítulos 3 e 4 do livro. Observação: indicação de vídeos e leitura foi feita em uma ordem que vai facilitará a compreensão. Procure manter essa ordem.

AVALIAÇÃO Ao final desta unidade, você deverá: » » responder às questões objetivas.

LINGUAGEM E PENSAMENTO: UMA RELAÇÃO INDISSOCIÁVEL Como vimos na unidade anterior, a mediação simbólica é fundamental para o desenvolvimento do indivíduo, pois insere-o na cultura e na história e é o cerne dos processos mentais superiores, tipicamente humanos. A linguagem tem papel central nesse processo, pois constitui um sistema simbólico socialmente compartilhado. Para Vygotsky, a unidade dialética da inteligência prática (uso dos instrumentos) e do uso de signos constitui o cerne do comportamento humano complexo, embora sejam são inicialmente independentes. A criança muito pequena, em uma fase pré-verbal, demonstra sua inteligência prática na capacidade de lidar de algum modo com os objetos e resolver problemas que lhes são apresentados. Porém, isso ocorre de forma ainda bastante incipiente: um bebê de nove meses é capaz, por exemplo, de puxar a toalha para que um objeto que está em cima dela possa ser alcançado. Ele também é capaz de algum tipo de comunicação com as pessoas que o cercam, por meio de gestos, do choro ou do riso. No entanto, é só quando a inteligência prática e a fala se desenvolvem e ambos convergem que o uso de signos é incorporado à ação. Assim, a criança consegue organizar seu comportamento e torná-lo mais complexo: “A atividade simbólica tem uma função organizadora específica que invade o processo do uso de instrumentos e produz formas fundamentalmente novas de comportamento” (VYGOTSKY, 2007). A fala na criança não apenas acompanha a atividade prática, mas tem papel específico em sua realização. Observe o que acontece quando uma criança de 3 ou 4 anos está brincando: ela fala consigo mesma o tempo todo – é a chamada “fala egocêntrica”, também observada por Piaget, que não atribui tanta importância a ela como elemento organizador da ação ou de comunicação. Para Vygotsky, a criança fala enquanto está resolvendo um problema e essa fala organiza sua ação, estruturando uma função psicológica complexa. E quanto mais complexo o problema, mais a criança fala consigo mesma e mais importante é a fala para a solução do problema. “As crianças resolvem suas tarefas práticas com ajuda da fala, assim como das mãos e dos olhos” (VYGOTSKY, 2005, p). Experimente você: proponha um problema a uma criança de 4 anos e observe como ela o resolve.

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AULA 7 - VYGOTSKY: DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM

Com ajuda da fala, as crianças criam maiores possibilidades de solução de um problema, pois se tornam capazes de planejar a sua ação e dividir suas atividades: “vou subir na cadeira, depois pegar o brinquedo no armário”. Desse modo, a criança adquire uma capacidade exclusivamente humana: a de ser ao mesmo tempo sujeito e objeto do seu comportamento. A fala egocêntrica deve ser vista como uma forma de transição entre a fala exterior, de comunicação com as pessoas, e a fala interior, do pensamento verbal (na maior parte do tempo pensamos em palavras, não é?), em um processo de fora para dentro, ou seja, de internalização: “Quando os processos de desenvolvimento do pensamento e da linguagem se unem, surgindo, então, o pensamento verbal e a linguagem racional, o ser humano passa a ter a possibilidade de um modo de funcionamento psicológico mais sofisticado, mediado pelo sistema simbólico da linguagem.” (OLIVEIRA, 2010)

O sistema simbólico de língua é profundamente enraizado na cultura e na história do grupo social. Pense em quanto ela incorpora a cultura e a história: teoricamente falamos a mesma língua que em Portugal e outras regiões do Brasil, mas nem sempre é fácil entender as expressões e as referências, não é mesmo? Até conversas entre pessoas de gerações diferentes por vezes revelam uma enorme distância no compartilhamento de signos! Esse sistema é um dos principais meios de nos inserimos no grupo social ao qual pertencemos, levando nossos caminhos a estarem sempre imbricados com as outras pessoas.

Assista à 3ª e a 4ª partes do documentário a respeito de Vygotsky, narrado por Marta Kohl de Oliveira. 3ª parte: atente para a noção de pensamento generalizante. <http:// www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=003>. 4ª parte: atenção à noção de inteligência prática. <http://www.youtube.com/watch?v=QS OBXfcHbHI&feature=related>. Acessos em: jan. 2012.

Leia agora o Capítulo 3: Pensamento e linguagem, do livro Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico, de Marta Kohl de Oliveira. Atente para: » » a importância evolutiva tanto para o indivíduo como para a espécie do desenvolvimento do pensamento verbal; » » as diferenças entre Piaget e Vygotsky no que se refere à “fala egocêntrica”.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

DESENVOLVIMENTO E APRENDIZADO No processo de desenvolvimento, duas linhas se cruzam: os processos elementares, que são de origem biológica, e as funções psicológicas superiores, de origem sociocultural e que surgem a partir do uso dos instrumentos e da fala. “A história do comportamento da criança nasce do entrelaçamento dessas duas linhas” (VYGOTSKY, 2007). O aprendizado, da fala (e de outros inúmeros comportamentos), por exemplo, só acontece no interior de um grupo humano, no momento em que a criança tem maturidade biológica suficiente para isso (nenhuma criança fala ao nascer, por exemplo). Para Vygotsky, o aprendizado possibilita o desenvolvimento de processos mentais complexos e se dá por meio das trocas e das relações da criança com os outros indivíduos que a cercam. Um bom exemplo do que aconteceria com uma criança que crescesse fora do convívio humano é o personagem Kaspar do filme O Enigma de Kaspar Hauser (1975), de Werner Herzog. Na história (supostamente verdadeira), o rapaz foi mantido preso em um porão sem contato com ninguém a não ser um homem misterioso que lhe traz comida. Esse homem abandona Kaspar, já um jovem adulto, em uma praça de uma pequena vila na Alemanha do século XIX. A princípio ele não fala, nem entende coisas aparentemente muito simples para um adulto, como você pode ver no trecho do filme disponível em: <http://www. youtube.com/watch?v=3wcQAo5kKFg>. Acesso em: jan. 2012. Não deixe de assistir a esse filme, uma obra consagrada do diretor alemão e certamente da história do cinema!

ZONA DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL (ZDP) Para compreender melhor essa relação entre desenvolvimento e aprendizado, Vygotsky estudou não apenas quando a criança realiza determinada tarefa, mas o intervalo entre o momento em que a criança faz uma determinada tarefa com ajuda de um adulto e o momento em que ela a desempenha de maneira autônoma. Para isso, postulou o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, que compreende dois níveis de desenvolvimento. A criança que domina um determinado comportamento, por exemplo, comer sozinha com a colher, estaria no nível de desenvolvimento real: ela realiza “[...] funções mentais que se estabeleceram como resultado de ciclos de desenvolvimento já completados” (VYGOTSKY, 2007).

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AULA 7 - VYGOTSKY: DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM

No entanto, ela não é capaz ainda de cortar os alimentos que estão no seu prato: para isso, precisa de ajuda de um adulto, de um companheiro mais experiente, que demostre ou dê instruções de como ela pode realizar essa tarefa. Esse seria, nesse caso, seu nível de desenvolvimento potencial, ou seja, ainda não é capaz de realizar a tarefa sozinha, mas com ajuda, obtém sucesso. A distância entre a o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial é a chamada Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP). Ela “define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação” (idem). Nem todas as funções, claro, são passíveis de serem desenvolvidas, em certo momento da vida da criança, mesmo que com ajuda. Uma criança de 5 anos, por exemplo, não vai aprender a fazer cálculos de derivadas, por mais que alguém a ajude. É preciso lembrar sempre que o processo de desenvolvimento tem uma de suas linhas apoiadas na maturação. Nesse sentido, o desenvolvimento da criança só pode ser determinado estudando-se os dois níveis, o real e o potencial: “Usando esse método podemos dar conta não somente dos ciclos e processos de maturação que já foram completados, como também daqueles processos que estão em estado de formação, ou seja, que estão apenas começando a amadurecer e a se desenvolver. Assim, a zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear o futuro imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando acesso não somente ao que já foi atingido através do desenvolvimento, como também àquilo que está em processo de maturação. ” (VYGOTSKY, 2007)

O aprendizado, por meio da relação com os demais, cria ZDPs, despertando processos internos de desenvolvimento, que vão sendo internalizados, tornando-se parte dos processos mentais independentes da criança e elevando-os a níveis cada vez mais complexos. Assista à 5ª parte do documentário a respeito de Vygotsky, narrado por Marta Kohl de Oliveira. Disponível em: <http:// www.youtube.com/wa tch?v=mj2XBkwTVDw&feature=relat ed>. Acesso em: dez. 2011. Atente especialmente para: » » as diferenças que a narradora aponta entre Piaget e Vygotsky; » » a brincadeira, ou jogo simbólico, como “lugar de desenvolvimento”, em função da relação entre desenvolvimento e aprendizagem como proposto por Vygotsky. Assista também à parte 6 desse mesmo documentário. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=EapR3rNTkAs>. Acesso em: jan. 2012. Destaque: » » onde acontecerão as ações pedagógicas, em função do caráter prospectivo do desenvolvimento em Vygotsky; » » a criação das ZDPs.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

ESCOLA E DESENVOLVIMENTO A essa altura você já deve estar vislumbrando a importância que Vygotsky coloca na educação e na escola principalmente. Poderíamos pensar em pelo menos dois aspectos centrais dessa função: o primeiro se liga à função da escola no desenvolvimento do indivíduo. Uma vez que o processo de desenvolvimento vem após a aprendizagem, a escola pode (e deve) ser um espaço organizado de troca com pessoas mais experientes que impulsionam o avanço cognitivo nas Zonas de Desenvolvimento Proximal. O professor, ao propor atividades nessa Zona e ao organizar as trocas entre colegas, induz o desenvolvimento dos processos mentais mais avançados. Outro aspecto central da escola é seu papel na apropriação da experiência culturalmente acumulada, uma vez que ela oferece à criança e ao jovem um saber construído histórica e socialmente e formas de operar intelectualmente segundo padrões pertinentes à cultura e à sociedade. Perceba que a organização das ações pedagógicas deve sempre se adiantar ao desenvolvimento, pois o aprendizado orientado para níveis de desenvolvimento já atingidos é ineficaz. “Aprendizado não é desenvolvimento, mas quando adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer.” (VYGOTSKY, 2007)

Daí a importância dada por esse autor à sequenciação do aprendizado, que deve sempre resultar nas ZDPs, pois cada assunto ou operação que a criança domina, não é um processo que termina, mas a base de um processo que está apenas começando. Leia agora o Capítulo 4: Pensamento e linguagem, do livro Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico, de Marta Kohl de Oliveira. Atenção especial para: » » a maneira de Vygotsky trabalhar o processo de desenvolvimento, como uma forma de abordagem genética; » » a explicação que a autora dá a respeito da escolha entre a palavra aprendizado e aprendizagem; » » a ZDP como processo de entendimento da relação entre desenvolvimento e aprendizado; » » papel da imitação no desenvolvimento e na aprendizagem.

OLIVEIRA, Z. M. R. L.S. Vygotsky: algumas ideias sobre desenvolvimento e jogo infantil. Série Ideias n. 28. São Paulo: FDE, 1997. Disponível em: <http://www.crmariocovas.sp.gov. br/dea_a.php?t=003>. Acesso em: dez. 2011.

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AULA 7 - VYGOTSKY: DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM

REFERÊNCIAS LIVEIRA, M. K. de. História, consciência e educação. Memória da pedagogia: Vygotsky. São Paulo: Segmento Duetto, 2005. ______. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. São Paulo: Scpione. 2010. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Tradução: José Cipolla Neto; Luís Barreto e Solange C. Afeche. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

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AULA 8 Ausubel e a teoria cognitivista Profª Dra. Claudia Kober

INTRODUÇÃO

C

omo você bem se lembra, foram percorridas nesta disciplina algumas das principais teorias da Psicologia da Aprendizagem, formuladas por Skinner, Piaget e Vygotsky. Não poderíamos, no entanto, deixar de tratar de um dos exponentes da teoria cognitivista, que tem ganhado força nos últimos tempos: David Ausubel (1918-2008), psicólogo americano. Embora poucos de seus trabalhos tenham sido traduzidos para o português, alguns dos conceitos desenvolvidos por ele, tais como aprendizagem significativa e conhecimentos prévios, fazem parte do campo da educação no Brasil.

OBJETIVOS » » Compreender o espectro mais amplo das teorias cognitivistas. » » Conhecer os principais conceitos relativos à teoria de David Ausubel. » » Entender as implicações dessa teoria para as relações de ensino-aprendizagem estabelecidas na escola.


PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

TEORIAS COGNITIVISTAS: MÚLTIPLAS E DIVERSIFICADAS O campo das teorias cognitivistas é bastante amplo e pode abranger autores muito diferentes. Nas palavras de Bock (2006), esse grupo de teorias poderia compreender aqueles que consideram a “[...] aprendizagem como processo de relação do sujeito com o mundo externo e que tem consequências no plano da organização interna do conhecimento”. Veja em “glossário” o significado da palavra cognição. Considerando essa definição, você não diria que Piaget e Vygotsky poderiam ser considerados cognitivistas? Em um sentido mais amplo, pode-se dizer que sim, e muitos pesquisadores os colocam nesse espectro da psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. No entanto, como o próprio Piaget chamou sua teoria de construtivista, a maioria dos autores referese a ele desse modo. Já Vygotsky, por enfocar o papel da sociedade na formação do sujeito, recebe a alcunha de sociointeracionista ou sócio-histórico. Os pesquisadores ligados às teorias cognitivistas têm se preocupado em estudar as formas de pensamento e processamento da informação, e os modos de interação com o meio que permitem que o indivíduo aprenda mais e melhor. Nesse sentido, estudam os processos de memória de longo e curto prazo, de motivação, de atenção, bem como as formas de apresentação das informações que facilitam a aprendizagem, utilizando tanto dados comportamentais como subjetivos. Contudo, suas pesquisas não se limitam apenas à aquisição de conhecimentos, mas também às percepções e crenças. Veja a seguir alguns dos campos de pesquisa cognitivista: 1) Atenção: somos capazes de concentrar nossa atenção em apenas uma coisa por vez ou várias coisas ao mesmo tempo? 2) Modelos de reconhecimento: que informações devem estar presentes no mundo para permitir que nosso sistema sensorial e cognitivo detecte e categorize? Que tipos de programas cognitivos existem em nossa mente que permitem a detecção e categorização de informações do mundo? Como interpretamos corretamente o input sensório ambíguo? 3) Memória: os psicólogos cognitivistas estão interessados na natureza da organização do conhecimento em nossa memória. Os dois conhecimentos, procedural e declarativo, organizamse da mesma forma em nossa memória? 4) Organização do conhecimento: de que forma o material é organizado? Os psicólogos cognitivistas têm várias teorias de como o conhecimento declarativo é armazenado, usando as abordagens conexionistas e de processamento da informação, mas não têm o mesmo para o conhecimento procedural. 5) Linguagem: os pesquisadores estudam o desenvolvimento da linguagem, o curso normal e anormal, o papel da experiência na aquisição da linguagem e trabalham com a linguística. 6) Raciocínio: estudam o tipo de raciocínio das pessoas – lógico ou intuitivo. 7) Resolução de problemas: como podemos descrever o conhecimento que nos permite gerar, criar um plano de ação? Que estratégias nós usamos para gerar planos e táticas para solucionar problemas que nunca havíamos encontrado antes? Fonte: <http://homes.dcc.ufba.br/~frieda/mat061/cognitiv.htm>

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AULA 8 - AUSUBEL E A TEORIA COGNITIVISTA

Recentemente, muitas pesquisas a respeito desses temas têm sido publicadas e você pode entrever que algumas delas têm ligação direta com a escola e as formas como se pode organizar o ensino na sala de aula de modo a que os alunos aprendam mais e melhor.

AUSUBEL E OS TIPOS DE APRENDIZAGEM “Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um princípio, seria: o fator isolado que mais influencia a aprendizagem é o que o aprendiz já sabe. Determine isso e ensine de acordo.” (AUSUBEL, 1968)

Influenciado por Piaget, Ausubel ocupou-se dos processos de aprendizagem/ensino de conceitos crescentemente complexos, a partir dos conhecimentos prévios do indivíduo. Ele acredita que o conhecimento é organizado em estruturas cognitivas e que a reorganização dessas estruturas acontece quando elas interagem com novas informações dadas pelo ambiente. Para que isso ocorra, o melhor é a instrução formalmente programada, desenvolvida especialmente pela escola. Ou seja, assim como para Vygotsky, informações transmitidas pela escola são fundamentais para desequilibrar as estruturas presentes e provocar sua reorganização. Ausubel distingue dois tipos de aprendizagem: a mnemônica (relativa à memória) ou mecânica e a significativa. A primeira refere-se àqueles conteúdos que se aprendem, mas que não se relacionam com nenhuma experiência que o indivíduo já tenha tido, ou fato que já soubesse. Exemplos desse tipo de aprendizagem podem ser: decorar um número de telefone, uma fórmula matemática ou mesmo a tabuada. Já a aprendizagem significativa refere-se a novos conteúdos relacionados a conceitos já assimilados (a coincidência da palavra com o conceito de assimilação de Piaget não é arbitrária) anteriormente às estruturas cognitivas. Isso leva a uma aprendizagem relacionada com experiências já vividas ou fatos que o indivíduo já conhecia, acarretando na construção de um novo sentido. Por exemplo, a criança pequena muitas vezes aprende a chamar tudo o que tem quatro patas de “au au”. Mais tarde, começa a separar gatos e cachorros; ainda mais para frente, consegue separar e identificar a raça de um cachorro. Cada um desses passos é feito assimilando novos conceitos às estruturas anteriores que a criança já tinha. Interessante notar que, para Ausubel, essa assimilação de novos conceitos às estruturas já existentes provoca uma mudança nessas estruturas cognitivas antigas. Os conceitos preexistentes aos quais um novo conceito se relaciona, são chamados de subsunçores ou ideias-âncora. São eles que permitem que o novo conceito se relacione com os demais, que formam as estruturas já adquiridas. Como mostra a figura a seguir, adaptada de Paulo Ricardo da Silva Rosa.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

O novo conceito (verde) que se conecta aos subsunçores, liga--se também indiretamente aos demais elementos da estrutura cognitiva, representada na figura pelos demais conceitos (C) interligados, levando a uma aprendizagem significativa. Já aquele novo conceito (em azul) que não se conecta com nenhum subsunçor fica isolado, representando a aprendizagem mnemônica. Veja, no entanto, que esse mesmo conceito, incialmente apenas “decorado”, pode se tornar mais tarde, por força de novas conexões, parte da estrutura cognitiva. Aprendizagem mnemônica e significativa não são excludentes. Pelo contrário, elas formam um contínuo. A aprendizagem mnemônica pode ser muitas vezes auxiliar no processo de aprendizagem significativa. Por exemplo, quando uma criança utiliza a tabuada para a resolução de um problema matemático mais complexo.

Esses dois modos complementares de aprender têm suas raízes na evolução filogenética: a aprendizagem mnemônica é mais ligada à aprendizagem associativa, que compartilhamos também com os animais.

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Já a aprendizagem significativa, mais recente filogeneticamente, que se constrói sobre a primeira, refere-se à aprendizagem construtiva e por reestruturação. Embora educadores, hoje em dia, tendam a valorizar – com razão – mais a aprendizagem significativa, a aprendizagem mnemônica é necessária em alguns momentos. Ela terá sua importância reduzida conforme se adquire mais conhecimentos, pois o indivíduo mais velho possui mais estruturas às quais os novos conhecimentos podem ser incorporados. Por exemplo, a aprendizagem de uma língua estrangeira fica bem mais fácil quando dominamos a gramática e o vocabulário da nossa própria língua.

Pense em como você aprende hoje: não é mais fácil relacionar os novos conceitos àqueles que você já sabe, opondo-os, comparando-os, descobrindo o que têm de semelhante ou diferente? Mais fácil do que decorar uma infinidade de conceitos desconexos, não é?

LEITURA: TIPOS DE APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA Leia agora o texto de Paulo Ricardo da Silva Rosa até a página 11, com atenção especial para a Teoria de Assimilação de Ausubel e aos tipos de aprendizagem significativa: subordinada, superordenada e combinatória.

Veja que nesta classificação de tipos de aprendizagem, Ausubel trata mais dos processos de aprendizagem de indivíduos que já têm estruturas cognitivas mais complexas, mais próximas à idade escolar. Já em função da natureza do conhecimento adquirido, Ausubel, Novak e Hanesian (1978, apud POZO, 1998) diferenciam três tipos de aprendizagem significativa: a de representações, de conceitos e de proposições, em uma escala de complexidade crescente. A primeira seria mais próxima da aprendizagem mnemônica e refere-se à aquisição daquele vocabulário relativo à representação de fatos ou objetos. Mais tarde, a própria aquisição de vocabulário se complexifica, envolvendo conceitos. Já as proposições, são estruturas ainda mais complexas por se tratar da relação entre diferentes conceitos.

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

ENSINO E APRENDIZAGEM Ausubel foi um pensador muito preocupado em entender as relações entre ensino e aprendizagem com vistas a incrementar as possibilidades de aprendizagem. Para ele, aprendizagem e ensino são relativamente independentes: “[...] determinadas formas de ensino não conduzem forçosamente a um determinado tipo de aprendizagem” (POZO, 1998). Essa relação entre ensino e aprendizagem pode ser representada pelo esquema montado na página a seguir (idem):

No eixo vertical temos um contínuo entre a aprendizagem mnemônica ou por repetição e a aprendizagem significativa e no eixo horizontal processos de aprendizagem, mais centrados nas estratégias de “[...] instrução planejada para estimular essa aprendizagem, que iria do ensino puramente receptivo [...] ao ensino baseado exclusivamente no descobrimento espontâneo por parte do aluno” (POZO, 1998). No cruzamento desses dois eixos, encontramos alguns exemplos de atividades escolares e os processos de aprendizagem envolvidos. Pode-se atingir a aprendizagem significativa por meio de uma aprendizagem de recepção, como ouvir uma explicação ou assistir a uma conferência, ou acontecer uma aprendizagem mnemônica, por repetição, de modo autônomo. Deste modo, Ausubel questiona a ideia de que para que ocorra uma aprendizagem significativa, e a consequente modificação das estruturas cognitivas, seja necessária a atividade autônoma do sujeito, como muitas dos educadores puramente piagetianos propõem.

ORGANIZADORES PRÉVIOS Especialmente na escola, nem sempre os alunos têm os conceitos que possam funcionar como subsunçores ou âncoras para a introdução de novos conceitos.

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Em função dessa constatação, Ausubel trata da construção de organizadores prévios, que seriam as informações e os conceitos necessários para fazer essa ponte entre o que o aluno já sabe e o que ele deverá saber para que essa aprendizagem se torne significativa, favorecendo desse modo o processo de ensino-aprendizagem. Os organizadores prévios podem ser trabalhados de forma a ativar conceitos que aparentemente não se relacionam com os que vão ser introduzidos, trazendo-os à memória presente, tornandoos relevantes. Trata-se, nesse caso, de organizadores comparativos. Por exemplo, ao introduzir os eventos relativos ao golpe militar de 1964 o professor pode ativar os conhecimentos anteriores relativos à proclamação da República, introduzindo um conceito mais amplo sobre o papel dos militares na história política brasileira. Já os organizadores expositivos tratam de introduzir novas informações necessárias para a compreensão de um novo conceito. Nesse sentido, trata-se de um conceito-ponte, que se relaciona com o que o aluno já sabe, para, por sua vez, servir de subsunçor ao novo conceito.

AS CONDIÇÕES DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA A aprendizagem significativa acontece, para Ausubel, quando tanto o material utilizado para ensina, quanto o sujeito que aprende encontram determinadas condições: » » o material deve ter significado e organização lógicos, de modo que as diferentes partes dele tenham uma relação significativa e não apenas sobrepostas ou encadeadas a esmo; » » a organização do material e a apresentação devem conter ideias “inclusivas”, organizadores prévios; » » os conhecimentos prévios dos alunos devem ser considerados e ativamente buscados, para que possam servir de subsunçores ou âncoras para os novos conhecimentos; » » é necessária uma predisposição para a aprendizagem (motivo para que o esforço ocorra): MOTIVAÇÃO. Que pode ser buscada por meio da construção de significados e sentidos do que se aprende. Veja no quadro seguinte um resumo dessas condições, adaptado de Pozo (2002):

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PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM

Para aprofundamento do que vimos até aqui, leia agora o texto de João Félix Praia, Aprendizagem Significativa em D. Ausubel: Contributos para uma adequada visão da sua teoria e incidências no ensino. O texto, que vai da página 121 a 134, faz parte de uma publicação do III Encontro Internacional sobre Aprendizagem Significativa, realizado em Peniche, Portugal, em 2000. Os demais textos são também muito interessantes! » » Atente para as relações entre a teoria de Ausubel e o ensino escolar, no que se refere à organização do material a ser utilizado em sala de aula, aos conteúdos curriculares e às aplicações dessa teoria.

MAPAS CONCEITUAIS Desenvolvido por um dos pesquisadores que trabalham com a teoria de Ausubel – J. D. Novak –, os mapas conceituais são uma poderosa ferramenta de aprendizagem. Eles têm o objetivo de representar e organizar de forma visual os conhecimentos adquiridos em determinado processo, “reproduzindo” as estruturas cognitivas envolvidas. Construir mapas conceituais para estudar é uma excelente forma de pensar a respeito de um conteúdo aprendido, relacionar os conceitos com o que já se sabe e tornar a aprendizagem significativa. Eles podem ser utilizados para qualquer conteúdo disciplinar.

Leia agora o conteúdo desde a página 11 até o final do texto de Paulo Ricardo da Silva Rosa (Teoria cognitivista de David Ausubel), com atenção especial à construção de Mapas conceituais.

Pratique Siga as instruções do texto e tente montar um mapa conceitual com o que você aprendeu sobre Ausubel. Dicas: » » utilize post-its e uma cartolina grande para construir seu mapa, pois eles permitem que você possa mudar de lugar e reorganizar os conceitos e as relações entre eles. » » faça mapas conceituais dos conteúdos que você estudou quando estiver se preparando para fazer a prova final dessa disciplina. Eles ajudam não só a organizar conceitos e a aprofundar sua compreensão, mas ativam a memória visual.

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Para um aprofundar-se sobre a teoria de Ausubel: MOREIRA, M. A., MASINI, E. F. S. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Moraes, 1982. MOREIRA, Marco Antônio. Aprendizagem significativa: da visão clássica à visão crítica. No que se refere à atenção e às transformações que as novas tecnologias estão provocando na nossa maneira de pensar, leia: CARR, N. A geração superficial: o que a internet está fazen-do com os nossos cérebros. São Paulo: Agir, 2011. Sobre as relações entre memória e esquecimento, leia esse artigo do famoso neurocientista Iván Izquierdo e colegas: IZQUIERDO, I.; BEVILAQUA, L. R. M.; CAMMAROTA, M. A arte de esquecer. Estud. av., São Paulo, v. 20, n. 58, dez. 2006.

Glossário Cognição: 1) processo ou faculdade de adquirir um conhecimento; 2) conjunto de unidades de saber da consciência que se baseiam em experiências sensoriais, representações, pensamentos e lembranças; 3) série de características funcionais e estruturais da representação ligadas a um saber referente a um dado objeto / um dos três tipos de função mental (As funções mentais se dividem em afeto, cognição e volição [capacidade de escolha consciente]). Fonte: Dicionário Houaiss.

REFERÊNCIAS AUSUBEL, D.P. Educational Psychology: a cognitive view. New York: Holt, Rinehart & Winston, 1968. BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 2006. NOVAK, J. D. et al. Teoria da aprendizagem significativa: contributos do III Encontro Internacional sobre aprendizagem significativa. Peniche, 2000. Disponível em: <http://repositorioaberto.univ-ab. pt/handle/10400.2/1320>. Acesso em: dez. 2011. POZO, J.I. Teorias cognitivas da aprendizagem. Tradução: Juan Acuña Llorens. Porto Alegre: Artmed, 1998. ______. Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendizagem. Tradução: Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2002. ROSA, P. R. S. A teoria cognitivista de David Ausubel. Disponível em: <http://www.dfi.ufms.br/ prrosa/instrumentacao/Capitulo_4.pdf>. Aces-so em: dez. 2011.

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