A prisao mal-assombrada - Primeiro capítulo

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Tradução Ana Resende Ilustração Scott M. Fischer

Rio de Janeiro | 2014


C1c

Um Novo Emprego

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-Pelo amor de Deus, acorde, rapaz. Quer perder o emprego logo no primeiro dia? Olhei ao redor, confuso, limpando a baba do queixo. Que horas eram? Parecia que eu tinha acabado de me deitar para dormir. — Vamos, Billy — disse a sra. Hendle, de forma mais gentil dessa vez. — Eles mandaram você chegar lá uma hora depois do pôr do sol, e você já está atrasado. — Ela me entregou o casaco que eu havia pendurado na cadeira, e eu me levantei da cama ainda cansado.


Joseph Delaney Alguns rapazes entraram correndo pelo quarto, rindo e fazendo brincadeiras, mas logo ela mandou que se calassem. Mesmo assim, eu ainda podia ouvi-los dando risadinhas. — Está com medo de ir lá para cima, Billy? Não quer ir?! — Vão embora! — gritei, abrindo caminho até a porta e dispersando-os em todas as direções. Pirralhos malditos. Mas eles tinham razão. Eu estava morrendo de medo. Não era o tipo de trabalho que eu queria. “Moleques não têm muita opção”, costumava dizer minha velha mãezinha, que Deus a tenha. E ela estava certa. Não há muito trabalho para rapazes de orfanatos. Tive sorte de arranjar este. Mais algumas semanas de treinamento, e eu terei dinheiro suficiente para arrumar um quarto em outro lugar; ir para bem longe deste ridículo Lar para Meninos Desafortunados. Valerá a pena, no fim das contas. 12




A PrisĂŁo Mal-Assombrada Carregando minha lanterna, desci apressado os degraus e saĂ­ para a rua, deixando a aldeia para trĂĄs. Enquanto corria pelas estradas de terra batida, vi o castelo Ă minha frente e me dirigi a ele, tentando ser corajoso.


Afinal, eu não ficaria preso lá. Apenas trabalharia nele, vigiando os prisioneiros. Os outros rapazes estavam sendo tolos. Sentiam inveja de mim. Era apenas um trabalho, e eu não iria desistir. Mas eu sabia por que eles achavam que eu deveria estar com medo; porque eu estava mesmo apavorado. O problema era quem eu teria que vigiar: assassinos, criminosos e feiticeiras condenadas. Era esse o meu trabalho. Ou, pelo menos, seria quando eu terminasse o treinamento. Vi a lua, fina e minguante, que logo foi encoberta por nuvens escuras soprando do oeste. Estremeci, mas não só de frio. Eu ouvira histórias sobre o que acontecia no castelo após o anoitecer, sobre criaturas há muito tempo mortas, que caminhavam por seus corredores úmidos. E não havia uma única pessoa 16


na aldeia que não tivesse ouvido os gritos vindos de lá: resmungos baixos e agonizantes, gargalhadas histéricas e selvagens, soluços arrependidos e miseráveis – todos nós já ouvíramos aquilo. O castelo era uma construção grande e impo­ nente, situado numa montanha alta a aproximadamente três quilô­ metros da cidade mais

próxima,

cercado por uma densa floresta de sicômoros e freixos.


Joseph Delaney Fora construído a partir de pedras escuras e úmidas, com torres, ameias e um fosso fedorento que, dizia-se, continha os esqueletos de todos que haviam tentado fugir. Eu não quis pegar o turno da noite. Mas meus desejos não tinham importância. Ordens eram ordens e, após apenas duas semanas de treinamento preliminar, pediram-me que aparecesse uma hora depois do pôr do sol. Como eu não estava acostumado a dormir à tarde e tivera dificuldade para pegar no sono com os outros rapazes andando para cima e para baixo, acabei dormindo demais. Eu já estava mais de meia hora atrasado, e guardas da prisão deviam ser pontuais. Quando cheguei ao castelo e olhei para cima, em direção às paredes ameaçadoras, ouvi um som metálico de algo se arrastando, e então a porta levadiça começou a subir. Eles sabiam que eu estava ali. 18



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