2ª edição, 1ª impressão
Coordenação Editorial: Elaine Maritza da Silveira
Ilustrações: Laura Michell
Design: Laura Guidali Amaral
Revisão: Renato Deitos
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Martins, Georgina
O menino que não queria ser príncipe e outras histórias encantadas / Georgina Martins ; ilustrações, Laura Michell. – 2. ed. – Porto Alegre, RS : Edelbra, 2021.
ISBN 978-65-5750-038-5 (aluno)
ISBN 978-65-5750-039-2 (professor)
1. Contos de fadas - Literatura infantojuvenil I. Michell, Laura. II. Título.
21-90084
CDD-028.55
2021
Edelbra
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Georgina Martins
O Menino que não queria ser príncipe e
outras histórias encantadas
À Cleide Magesk, por levar a fantasia e à Elaine Maritza, pelo raro poder de
Sumário
Os presentes da princesa p. 7
O silêncio da princesa p. 23
O menino que não queria ser príncipe p. 49
Hámuito tempo, quando você não havia nascido ainda, nem a sua avó, muito menos a sua mãe, aposto, até, que nem o seu tataravô, num país muito distante, existia um rei.
Veja só, eu também não era nascida, nem fui eu quem inventou esta história, só a conheço porque um monte de gente já contou, no entanto, ninguém sabe quem a inventou. É uma história do tempo do Onça, como dizia meu pai; só que eu não consegui até hoje descobrir que tempo é esse.
Pode ser até que você já tenha ouvido esta história, mas não tem problema, porque, como já deve ter ouvido dizer, “Quem conta um conto aumenta um ponto”, e eu, por minha conta e risco, sigo aumentando ou diminuindo pontos neste conto.
Onde eu estava mesmo? Ah, sim: existia um rei, e esse rei, como quase todos das histórias de reis, tinha uma filha, e essa filha, como quase todas as filhas de rei, era muito bonita e precisava se casar.
É claro que todos os rapazes do reino queriam se casar com ela. Bastava ser filha de rei pra todo mundo querer se casar, não é mesmo? Ainda mais quando se tratava de uma princesa tão linda. A tal princesa era da cor da noite, sua pele era macia e brilhante como os pelos de uma pantera, e seus cabelos eram mais enroladinhos do que as lãs das ovelhinhas que pastavam nos arredores do palácio. A princesa tinha tantos pretendentes que o rei, seu pai, não sabia para quem dar a mão dela em casamento; e, além do mais, ele não queria que ela se casasse com qualquer um.
Um dia, quando o rei estava se preparando para receber os pretendentes da princesa, que faziam fila nos portões do palácio, apresentaram-se três rapazes. A princesa imediatamente correu até a janela do seu quarto para poder saber como eles eram, e os achou muito bonitos. O primeiro que se apresentou tinha os cabelos da cor do sol, o segundo tinha os cabelos da cor da noite, e o terceiro, da cor da madrugada.
Você sabe qual é a cor da madrugada? Pois é, acho que nem a princesa sabia. Mas, se um tinha
o cabelo da cor da noite, o outro, da cor do dia, só restava para o último a cor da madrugada, você não acha?
Os três rapazes foram conduzidos até a presença do rei, que lhes falou: – Soube que vocês desejam a mão de minha filha, e é claro que vocês sabem que estou procurando, há muito tempo, um marido para ela, no entanto, não pode ser qualquer um, tem que ser alguém muito especial. Alguém que seja, principalmente, corajoso, inteligente, carinhoso e honesto.
Pensando bem, até que aquele rei era um pouco legal, ele não estava interessado somente em arranjar um marido rico para a filha dele; se fosse rico, era bom, mas ele fazia questão de que fosse inteligente, carinhoso, honesto e corajoso.
Bem, mas, como todos os pretendentes, eles juraram de pés juntos que eram corajosos, honestos, inteligentes e carinhosos. Por causa disso, o rei nunca sabia qual deles escolher. Já cansado de tanto tentar, decidiu propor aos três um desafio:
Meus jovens, vocês têm seis meses para provar que são inteligentes, corajosos, honestos e carinhosos. E, para ter certeza disso, eu vou desafiá-los.
A princesa, que estava bem escondidinha ouvindo tudo, até que gostou da proposta do pai, porque, diante da beleza dos três rapazes, ela também havia ficado indecisa.
E então o rei disse:
– Aquele que conseguir voltar, ao final do prazo estipulado, com um presente diferente de todos os que a princesa tem recebido até agora, e que seja capaz de provar, através desse presente, todo o amor que dedicará à minha filha, terá a mão dela em casamento. Agora, partam imediatamente!
Como os três estavam muito interessados na mão da princesa, aceitaram o desafio. Reuniram-se na entrada do castelo e combinaram de se encontrar ao final de seis meses, na mesma encruzilhada em que se conheceram. Cada um trazendo um presente para a filha do rei.
O rapaz que tinha os cabelos da cor do sol resolveu que tomaria o caminho da esquerda, e partiu.
O que tinha os cabelos da cor da noite tomou o caminho da direita, e também partiu. E como só restava o caminho do meio, o rapaz dos cabelos da cor da madrugada teve que seguir por aquele caminho mesmo.
Depois de muito andar, o moço dos cabelos da cor do sol encontrou-se com um homem que vendia espelhos mágicos. O homem dizia que quem possuísse um espelho daqueles poderia ver tudo o que acontecia no mundo: no presente, no passado e no futuro. O moço achou aquele espelho muito interessante e o comprou.
O rapaz dos cabelos da cor da noite, depois de muito viajar, encontrou um homem que vendia botas mágicas. Ele dizia que quem possuísse aquelas botas poderia ser transportado para onde desejasse. Eram como as botas de sete léguas (iguaizinhas às do ogro da história do Pequeno Polegar). Então, o rapaz achou aquelas botas interessantes e resolveu comprá-las.
O último deles, aquele dos cabelos da cor da madrugada, depois de muito caminhar, encontrou
um homem que vendia rosas mágicas. Dizia o homem que quem possuísse uma rosa daquelas teria o poder de ressuscitar as pessoas. O rapaz ficou tão maravilhado com a rosa que desejou possuí-la imediatamente. Então, comprou uma e partiu. Depois disso, os três moços chegaram à conclusão de que já tinham encontrado os presentes que ofereceriam à princesa, e resolveram seguir até o local do encontro para combinar como seria a ida até o castelo. Acontece que, no momento em que se encontraram e decidiram seguir para o palácio, que ficava um pouco longe dali, tiveram uma sensação estranha, como se algo de muito ruim estivesse acontecendo. Então, o rapaz que comprou o espelho mágico retirou-o da bolsa e disse:
– Vejam só, este espelho vai nos mostrar tudo o que está acontecendo.
Aí, os três olharam para o espelho e se depararam com uma cena desoladora: a princesa estava no leito, mortinha, mortinha, e todo o reino chorava ao seu redor. O rei estava desconsolado.
Os três rapazes ficaram apavorados e decidiram partir em direção ao palácio o mais rápido possível. Mas como chegariam lá em tão pouco tempo?
Pensaram e, então, o rapaz que havia comprado as botas disse:
– Essas botas nos levarão até o palácio num passe de mágica. Vamos, agarrem-se em mim que vou voar pelos ares.
E assim rumaram para o palácio, e em poucos segundos chegaram ao leito da princesa. O rei chorava muito, todo o reino estava de luto. A princesa fora vítima de uma doença muito grave e os melhores médicos do reino foram chamados, mas nada puderam fazer.
O rapaz dos cabelos da cor da madrugada, que até então estava calado, disse:
– Majestade, eu tenho aqui um remédio que fará a princesa voltar à vida.
Todos ficaram abismados, o rei nem acreditou no que ouviu.
No mesmo instante, o rapaz retirou da bolsa a rosa mágica e bastou que tocasse a face da princesa com ela para que a moça acordasse ainda mais bela do que nunca.
O rei ficou muito feliz, e todo o reino voltou a sorrir. A princesa estava mais feliz ainda, pois nunca pensara em acordar tendo diante de si tão lindos rapazes. Então, o rei chamou os três rapazes e disse-lhes:
– Meus filhos, eu disse que daria a mão de minha filha àquele que trouxesse o presente mais interessante de todo o reino, e acho que quanto a isso não há dúvidas, pelo que acabei de presenciar: entendo que a mão da princesa é devida ao dono dessa magnífica rosa.
Na mesma hora, os outros dois, sentindo-se injustiçados, começaram a retrucar:
– Alto lá, Majestade – disse o rapaz dos cabelos da cor do sol –, fui eu o responsável por salvar a vida de sua filha. Se não fosse o meu espelho
mágico, que tudo vê, estes dois não saberiam que a princesa estava morta, e nós não teríamos chegado aqui tão rápido.
Ouvindo este argumento, o rapaz dos cabelos da cor da noite foi logo dizendo:
Bem, já que falamos em velocidade, quero dizer que, se não fossem as minhas botas mágicas, de nada adiantariam espelhos ou rosas, pois não teríamos chegado a tempo de ressuscitar a jovem. Provavelmente, quando chegássemos, ela já estaria enterrada, e nada mais poderíamos fazer. Portanto, é a mim que Vossa Majestade deverá conceder a mão da princesa!
O rei, coitado, que até então havia se decidido pelo rapaz da rosa, diante daqueles argumentos ficou sem saber o que fazer. Pensou, pensou, pensou e pensou de novo, e até chamou a princesa para que ela ajudasse na decisão, mas nada, ninguém sabia o que fazer.
O rei chamou todos os seus empregados, e cada um tinha uma opinião diferente:
– Na minha opinião, Majestade, quem merece a mão da princesa é o dono do espelho – disse o camareiro real.
– Não, Majestade, quem merece é o dono das botas mágicas! – falou o cozinheiro real.
– Majestade, não é possível, esses dois não conseguem perceber que é o dono da rosa mágica quem deve casar-se com a princesa? – disse o jardineiro real.
E, a cada opinião, o rei confundia-se ainda mais: pensava, pensava, pensava e nada, não conseguia decidir. Muito tempo se passou e nada de o rei decidir. Dizem por aí que ele está pensando nisso até hoje e nem consegue dormir direito.
A princesa ainda continua solteira, e o pior de tudo é ter que aturar o rei falando sozinho pelos imensos corredores do palácio:
– Mas, se não fosse a rosa, a minha filha estaria enterrada... Mas como foi que eles descobriram? Com o espelho, é claro. Mas, e para chegar tão rápido? Só mesmo com botas mágicas... Ai, meu Deus!
Coitado, ele repete isso várias vezes ao dia, chega a acordar no meio da noite. A sorte é que príncipes e princesas das histórias não ficam velhos nunca, porque senão não adiantaria mais nada o rei decidir-se, porque todos já estariam tão velhinhos que nem aguentariam a festa do casamento.
Bem, se eu fosse o rei, eu saberia a quem dar a mão de minha filha, mas não vou contar pra você qual dos três eu escolhi, porque eu acho que têm certas horas na vida em que devemos tomar nossas próprias decisões.
Bem, enquanto o rei não se decide, que tal você imaginar um final pra essa história? Aposto que, se você criar um final bem legal, pode ser até convidado para a festa do casamento. Agora, se isso acontecer, não se esqueça de me convidar também, viu?
Esta
é uma outra história de príncipes e de princesas; não fui eu quem a inventou, mas a conheço muito bem. No entanto, para você entendê-la direitinho, é preciso que já tenha lido a outra.
Por quê? Agora não posso explicar, você vai saber logo, logo:
Num reino muito distante daqui, havia um príncipe muito mal-educado e prepotente. Pensava que era o dono do mundo. Não respeitava ninguém, e por isso não tinha amigos. Um dia, quando ele estava brincando com sua bola de ouro, apareceu uma velhinha para pegar água na fonte que ficava no jardim do palácio, e ele, de pura maldade, jogou a bola na direção do jarro que a senhora trazia e o quebrou. A velhinha não falou nada, retirou-se, e voltou com outro jarro, ainda maior que o primeiro. Novamente, o príncipe jogou sua bola e quebrou o outro vaso. Ainda sem dizer nada, ela voltou com um outro jarro, e o príncipe, divertindo-se muito
com a maldade, jogou a bola de ouro e quebrou o terceiro jarro da pobre mulher.
Dessa vez, a velhinha olhou bem firme nos olhos do príncipe e falou:
– Por castigo, você se apaixonará pela princesa silenciosa.
O príncipe ficou sem entender o que a mulher queria dizer, mas ela desapareceu sem nada explicar, deixando-o muito desconfiado. Com o passar dos dias, o príncipe foi perdendo as forças, sentindo-se cada vez mais fraco: não conseguia comer, falar, andar, tampouco dormir. Permanecia todo o tempo deitado em seu quarto. O rei, seu pai, preocupado com o estado do filho, chamou os melhores médicos do reino, mas nenhum conseguia descobrir a doença do príncipe. Já sem muitas esperanças, o rei resolveu mandar chamar uma feiticeira que vivia em outro reino, muito famosa por suas profecias, mas, quando ela chegou ao castelo e viu o príncipe, descobriu que não podia fazer nada por ele. Nenhuma poção seria capaz de
curá-lo, já que ele havia sido vítima da maldição da velha Sibila.
– Majestade, seu filho está sob o efeito da maldição de Sibila, e contra isso nada posso fazer. Somente o próprio príncipe poderá se curar, mas para isso terá que conseguir o amor da princesa silenciosa. Tarefa praticamente impossível para um mortal.
O rei já tinha ouvido falar na tal princesa, muito temida no reino, pois habitava um castelo todo ornamentado com os ossos e as peles dos que tentavam fazê-la falar. Nessa hora, o rei perdeu todas as suas esperanças, sabia que o filho não teria forças nem sabedoria para conseguir superar tamanho desafio. O príncipe, que até aquele momento se mantinha prostrado, ao ouvir falar da princesa silenciosa, como num passe de mágica, sentiu que suas forças voltavam. Levantou-se da cama e dirigiu-se ao rei: – Meu pai, irei imediatamente em busca da princesa silenciosa, pois o meu amor por ela é a causa de todo esse sofrimento. Sinto que, se não conseguir conquistá-la, minha vida terá fim em muito breve tempo.