Eucaristia Coração da Vida

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Francesco Peyron Paolo Angheben

Eucaristia coração da vida

Edições Salesianas 3


Título original: Eucarestia cuore della vita Tradução: Manuel Mesquita © 1996. Effata © 2004. Edições Salesianas Rua Dr. Alves da Veiga, 124 4000-071 PORTO Tel. 225365750 Fax. 225365800 edisal@edisal.salesianos.pt www.edisal.salesianos.pt ISBN: 972-690-460-9 DL: 214430/04 Impressão: Edições Salesianas Capa: Terra das ideias 4 Acabamento: Humbertipo/Porto


PREMISSA

Eucaristia coração da vida é um texto rico de meditações, referências à Palavra, aprofundamentos teológicos e apresenta, no fim de cada capítulo, uma série de perguntas que ajudam o leitor a assimilar melhor as catequeses e a testar a sua caminhada espiritual. e são os dois símbolos que recordam ao leitor que é altura de parar, pegar em papel e caneta e fazer o ponto da situação. Eles indicam dois tipos diferentes de perguntas: mais ligadas ao concreto da vida, as primeiras; de mais aprofundamento espiritual, as segundas. Os autores – missionários da Consolata e animadores dum importante centro de espiritualidade – debruçaram-se sobre cada um dos momentos da Missa, focando-o de vários pontos de vista: histórico, teológico, bíblico, espiritual, existencial. As catequeses aqui compiladas provêm das suas intervenções durante uma escola de oração dirigida aos jovens que teve lugar num período de 1995-96. Preferimos deixar, sempre que foi possível, as expressões próprias da linguagem oral, com a certeza de que o leitor se sentirá mais envolvido e interpelado na primeira pessoa. Estamos certos de que este pequeno livro sobre a Missa conseguirá ajudar muitos corações que se tinham resfriado perante gestos que pareciam vazios e de palavras que pareciam apagadas. 5


O que se segue são páginas que convidam a uma relação mais profunda com Deus, exigem uma maior tomada de consciência da parte de muitos cristãos demasiado mornos, fazem despertar o desejo de participar na Eucaristia. Esperamos, assim como esperam o padre Paolo Angheben e o padre Francesco Peyron, que, seguindo o rasto e o estilo desta escola de oração, muitas outras experiências espirituais possam florir nas paróquias, nos grupos, entre todos aqueles que desejam entrar no mistério de amor da Eucaristia. Os editores

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Introdução

A Eucaristia é a fonte da caridade pastoral salesiana, a experiência da união com Deus, comunhão viva com a Igreja, a confirmação do dom peculiar da predilecção salesiana pelos jovens, a energia do Sistema Preventivo, da bondade, do optimismo, da alegria da dedicação apostólica, o centro propulsor do “espírito salesiano”. Jesus-Eucaristia envolve a vida espiritual de S. João Bosco e do ambiente educativo-pastoral onde exerce o seu ministério de sacerdote educador. É a Ele que contempla, adora e recorre, com grande confiança, em momentos de dificuldade, convidando os seus jovens a fazê-lo com ele. Jesus-Eucaristia é uma das colunas do seu sistema pedagógico, juntamente com o sacramento da Reconciliação. S. João Bosco foi, no seu tempo, um dos promotores da comunhão frequente, como força e sustento dos adolescentes e jovens no caminho da santidade: “A comunhão é para quem quer fazer-se santo, não para os santos; os remédios dão-se aos doentes, o alimento dá-se aos débeis”. Ele concebe a Eucaristia como o sacramento de comunhão íntima com Cristo, fonte de alegria, de compromisso no cumprimento do dever e de missão apostólica entre os companheiros. A Eucaristia levava à missão, à preocupação pelo bem, pela salvação dos outros. A santidade do adolescente


S. Domingos Sávio é fruto de uma forte espiritualidade eucarística que se vivia no ambiente educativo salesiano do tempo. Na escola de S. João Bosco, os jovens cresciam numa fé límpida e forte e, através da Eucaristia, escalavam a montanha da santidade. O livro “Eucaristia, coração da vida” está em perfeita sintonia com esta tradição eucarística salesiana. Para os salesianos a Eucaristia é o “acto central diário”, “vivido como festa numa liturgia viva”, em que a “comunidade celebra o mistério pascal e comunga o corpo de Cristo imolado, recebendo-o para se construir n’Ele como comunhão fraterna e renovar o compromisso apostólico”. A participação sacramental no sacrifício de Cristo leva o salesiano a identificarse com Ele nos seus sentimentos apostólicos e na sua entrega generosa pelas exigências do Reino. A práxis educativo-pastoral salesiana, que brota desta experiência, tem como objectivo fundamental conduzir os jovens à descoberta e ao encontro com Cristo, mediante a catequese e a prática sacramental. Procura-se, como S. João Bosco, com uma pedagogia adequada, levar os jovens ao conhecimento e amizade com o Senhor, ao empenhamento quotidiano de crescimento pessoal, de alegria e de serviço e doação, fazendo deles “missionários” entre os seus companheiros. Aos destinatários e leitores deste livro, os mais sinceros votos de que ele possa contribuir para uma descoberta e experiência cada vez mais rica e profunda do grande dom que Jesus nos deixou: a Eucaristia. Que ela possa estar efectivamente no centro da nossa vida e da nossa acção educativo-pastoral P. Joaquim Mendes, Provincial SDB


Francesco Peyron Paolo Angheben

Eucaristia Coração da vida

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MISTÉRIO DA FÉ

Quanto mais profundamente penetramos na Eucaristia e conseguimos perceber algo da sua grandeza, fazendo com que entre no tecido ordinário da nossa vida como presença signiA Palavra ficativa que pode agir em nós, tanto mais nos embreEu fui constituído ministro tamnhamos num caminho bém da Igreja em virtude da missão grandioso porque entramos que Deus me confiou em vosso benefínum dos aspectos e dos cio. Fui encarregado de anunciar a padons mais ricos que Deus lavra de Deus, mistério este que foi esnos dá em Jesus, como condido aos séculos e às gerações pasS. Paulo escreve na carta sadas, mas que, agora, foi manifestado aos Coríntios: «Fostes resaos seus santos. A estes quis Deus dar a conhecer as riquezas da glória deste gatados por grande preço» mistério entre os gentios: Cristo está (1Cor 7,23). em vós e, por isso, também vós participareis na sua glória. Aproximar-nos do dom A Ele é que anunciamos, admoesque nos dá um coração tando todos os homens e instruindo-os em toda a sabedoria, a fim de os novo apresentar a todos perfeitos em CrisA Missa, para muitas to. (Col. 1, 25-28) pessoas, não tem qualquer significado, não é frequen11


tada a não ser em algumas raras ocasiões: casamentos, funerais e noutras conveniências sociais. A Missa é morta. Uma outra faixa alargada de pessoas vive a Eucaristia como um hábito um pouco suportado, ou até como um peso ou uma obrigação. Para uma faixa restrita, a Eucaristia tem o sentido de um encontro, é um mistério de amor, é acolher a presença de Deus que salva e ligá-la à própria história quotidiana, feita de tantas pequenas coisas. A Eucaristia torna-se, como a define o Concílio Vaticano II, «fonte e topo da vida espiritual» (Sacrosanctum Concilium, § 10). O mistério escondido há séculos A vida espiritual não pode considerar-se uma etapa ou algo reservado para quem faz opções particulares, mas o caminho de cada cristão que está imerso na santa Trindade. A vida espiritual é um mistério da fé: é possível entrar nele somente com humildade, aceitando compreender alguns dos seus aspectos – a luz, o amor, a coragem, a verdade, a alegria – mas sem poder possuí-lo totalmente. Do mesmo modo, também a Eucaristia é um mistério da fé. Isso não representa, porém, uma porta blindada, fechada, mas uma porta aberta para uma infinidade de compartimentos e corredores, de que se pode perceber a beleza, a grandeza, a composição, mas que não é possível abranger simultaneamente na totalidade. O apóstolo Paulo, nas suas cartas, fala de mistério (ou projecto secreto) pelo menos vinte vezes: temos um exemplo no excerto da Carta aos Colossenses, transcrito no início. O que é que se entende na Bíblia por mistério? A profundidade do projecto de Deus acerca do homem. Deus-pessoa, luz inacessível, a certa altura, cria por amor. Sabemos que todo o cosmo, as estrelas, o céu, tudo o que nos rodeia foi criado por amor. Também o homem, imagem e semelhança de Deus (cf Gén 1,26-31) foi criado por amor, para dialogar com Deus, para viver com Ele num clima de amizade e de lazer. Mas o homem, ferido de orgulho, quer ser como Deus: afasta-se d’Ele, cai e é expulso do paraíso terrestre. Todavia, Deus não desiste 12


do seu projecto de amor em relação ao homem e procura formá-lo novamente à sua imagem e semelhança, fazendo aliança, primeiro, com Abraão e, depois, com Moisés, conduzindo o seu povo através da libertação, da purificação no deserto, para fazer entrar na cabeça dura dos israelitas o seu amor. Com a entrada na terra prometida, caberá aos profetas anunciar a plenitude do dia do Senhor, o dia em que Deus restabelecerá a aliança inicial na alegria, na comunhão, na frescura da sua relação com o homem. A vinda de Jesus, por fim, torna visível e concreta esta aliança entre Deus e o homem: Deus desposa a humanidade em Jesus e instaura não uma amizade simplesmente mas uma ligação nupcial. A Igreja, que nasce do coração de Cristo aberto na cruz, repleta pelo Espírito Santo, pela ressurreição de Jesus torna-se o povo da nova aliança com o qual Deus continua o seu diálogo. O Senhor disse: «Eu estarei sempre convosco, todos os dias, até ao fim do mundo» (Mt 28,20). Hoje, temos necessidade de ver sinais eficazes e tangíveis da renovação desta aliança e da presença de Deus em nós: eis, então, o dom de Jesus à Igreja, o mistério de amor que se chama Eucaristia. A Missa, sinal e mistério da aliança com Deus, conduz-nos à Missa sem fim, à parusia, à vinda do Senhor que nos fará entrar na Jerusalém celeste e participar nas núpcias do cordeiro na felicidade eterna. Então compreenderemos em plenitude que aquilo em que acreditámos era verdadeiro. Hoje é mistério da fé, mistério conhecido, aliança e amizade com Deus, vivida e visivelmente experimentada na Eucaristia. Vida que entra na vida A Eucaristia não é uma devoção, mas faz parte dum projecto: Deus tinha no coração a Eucaristia quando criou o homem! René Laurentin, grande teólogo e mariólogo francês, escreveu num livro com o título O que é a Eucaristia?: «A Eucaristia é o centro da Igreja. É Jesus Cristo presente. É uma energia espiritual, uma energia divina: a energia do próprio Cristo, a energia do Espírito Santo que realiza e interioriza este dom. A Eucaristia é o contrário da degradação da energia que é a lei do mundo material. É o contrário da entropia que arrasta consigo a extinção e

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a morte. É o processo de regenerar que derrota o de degenerar; é a assunção vitoriosa da corrupção; a comunhão que derrota a dispersão; a partilha que derrota o egoísmo. É a juventude do Espírito Santo que desafia a senilidade. É o princípio dinâmico da vida da Igreja».

A Eucaristia cria a vida da Igreja e a Igreja somos nós; portanto, dá a vida a cada um de nós. Aquilo que cada um vive na escola, no trabalho, com a esposa, com a namorada, pensando nas próprias opções, no íntimo da mente e do coração, ganha sentido, é iluminado pela Eucaristia, Vida que entra na vida. Descobrindo a Eucaristia como mistério, descobrimos quem é Deus, quem somos nós criaturas, que nos tornámos filhos e amados, num sinal de comunhão com Ele. Deixemos de nos sentir sós, imersos numa vida sem sentido, como uma bola lançada na roleta. A Eucaristia restitui-nos o sentido da fraternidade, da oferta, do encontro com Deus, do agradecimento. A Eucaristia lança-nos numa dinâmica nova. Um mistério para aprofundar São muitos os vocábulos usados para indicar a celebração eucarística: O mais comum é «Missa», do latim missio que quer dizer «enviado». «Ite missa est», dizia-se no fim da celebração: «A Missa terminou, ide». Este termo tem um valor próprio, mas não ajuda a compreender o mistério porque se refere somente à parte final da celebração; o termo «Eucaristia», bastante mais significativo, deriva do grego e significa «agradecimento». É Jesus o agradecimento perfeito ao Pai, que Paulo define como «O sim ao Pai» (cf 2 Cor 1,19), o ámen eficaz. Eucaristia quer dizer dar graças porque somos filhos, somos criaturas, somos vida, porque Deus está connosco, ama-nos, vem a nós, tem um projecto para nós. No culto da Sinagoga havia um rito muito semelhante à Eucaristia, denominado berakà, a ceia hebraica. Constava das orações de 14


acção de graças a Deus, da reevocação da libertação do Egipto, da passagem do mar Vermelho, do maná. Benefícios que são sinais de graças muito maiores: o maná, sinal da Eucaristia; a passagem do mar Vermelho, sinal do baptismo; a libertação do Egipto, sinal da libertação de Satanás e da escravidão do pecado. Dar graças nasce duma tomada de consciência: agradecemos quando nos consciencializamos de que recebemos um presente; outra expressão é a «Ceia do Senhor». É usado, por exemplo, por S. Paulo (cf 1 Cor 11,20.33). Nos Actos dos Apóstolos (cf Act 2,42), fala-se de união fraterna e «Fracção do pão»: é o reencontrar-se juntos para as primeiras celebrações eucarísticas, o dar graças através do pão partido que se torna Cristo. A Missa é um banquete. Sobre o altar, não há porventura toalhas? Não há copos e pratos, pão e vinho? É a ceia do Senhor, ceia sacrificial: corpo entregue por nós, o sangue derramado por nós. A aliança de Deus com o homem, na Eucaristia, não tem um valor jurídico ou político (como a NATO, o SME, a UE ...) mas é uma aliança nupcial. Como, através do «sim» que trocam no matrimónio, o homem e a mulher se tornam «um», assim Deus, através da Eucaristia, quer tornar-se um connosco. O banquete sacrificial é um banquete nupcial porque nele se dá uma comunhão entre Deus e a sua criatura. Ontem, hoje e sempre S. Justino, um século depois da morte de Jesus, em 150 d.C., descreve assim uma Missa: «No dia chamado do sol, juntam-se todos no mesmo lugar, seja os que habitam na cidade seja os que moram no campo. E, enquanto o tempo o permite, lêem as memórias dos apóstolos e os escritos dos profetas. Quando o leitor termina, aquele que preside faz um discurso, para relembrar e exortar à imitação destes bons exemplos. Depois, todos juntos, pomo-nos de pé e fazemos orações em voz alta, por nós, pelos novos baptizados e por todos os cristãos que se encontram espalhados pelo mundo. Terminadas as orações, abraçamo-nos e beijamo-nos reciprocamente. A seguir é levado, pelos irmãos, àquele que preside, o pão, um cálice de água e um cálice de vinho. Ele recebe-os e dá louvor e glória ao Pai de todos, no nome do Filho e do Espírito Santo. Depois, faz um prolongado agradecimento, com todas as suas

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forças, por nos ter tornado dignos destes seus dons. Concluídas as orações e o agradecimento, todo o povo presente aclama dizendo: «Ámen». Ámen, na língua hebraica, significa «assim seja». Nós acreditamos que aquele alimento, consagrado com a oração de agradecimento, constituída pelas palavras de Cristo, é corpo e sangue daquele Jesus incarnado do qual o nosso sangue e as nossas carnes se alimentam por assimilação».

Aqui encontramos os mesmos elementos que caracterizam as nossas Missas: a leitura da Palavra, a homilia, o ofertório, a consagração, o sinal da paz, a comunhão. A última frase deve ser aprofundada: «... é corpo e sangue daquele Jesus incarnado do qual o nosso sangue e as nossas carnes se alimentam por assimilação». Somos nós que assimilamos Cristo na comunhão ou é Cristo que nos assimila a si, que nos transforma n’Ele na comunhão? Somos nós que que transformamos Cristo em nós, ou é Ele que nos transforma n’Ele? É Ele que nos transforma n’Ele. Acontece na comunhão algo de grandioso. Demasiadas vezes nos aproximamos distraídos, com as mãos no bolso e a pastilha elástica na boca. Na Didaché, que é um dos primeiros textos apostólicos, que remonta a 90 d.C., quando ainda, talvez, estivesse vivo o apóstolo João, encontramos esta oração eucarística: «Damos-te graças, ó Pai nosso, pela vida e conhecimento que nos revelaste por meio de Jesus teu Filho. Glória a ti nos séculos!» O mesmo mistério, vivido então, hoje e amanhã, é referido por S. Paulo na exortação a Timóteo: «Guarda com cuidado tudo o que te foi confiado» (1 Tim 6, 20). S. Paulo refere-se a Cristo, à revelação, à verdade: realidades imutáveis ao longo dos séculos, que se renovam para serem vivas e actuais para os homens de hoje. Chegou até nós, na Eucaristia, esse depósito da fé que encontramos na Didaché e nos Evangelhos: o corpo entregue por nós, o sangue derramado por nós. Um mistério que requer receptividade O que é que devemos fazer perante a Eucaristia? Uma coisa só: colher e entrar no dom, no mistério, na aliança, na oferta, deixar16


-se assimilar por Cristo, para nos tornarmos quem verdadeiramente somos: filhos amados, com um projecto. Mas pode acontecer que alguém vá à Missa por obrigação, que a viva com fastio, desinteresse, como um peso, com o pensamento noutras coisas... Isto não é ir à Missa, mas envenenar-se, porque é sinal de recusa da aliança com Deus. Do mesmo modo se pode ir à Eucaristia com superficialidade, sem saber sequer o porquê, sem participar, permanecendo estranhos, dormindo. Por que é que, depois de tantas Missas, mudámos tão pouco, somos sempre os mesmos e a Vida não entrou na nossa vida? Por que é que a Missa não é bem celebrada, por que é que aquele padre fala demasiado depressa ...? Temos de cortar com a rotina das Missas suportadas, mal vividas. É necessário preparar-se, pensar que vamos para um encontro com um amigo, o Deus vivo. Façamos a experiência de «descalçar as sandálias», como Moisés, e dizer com toda a nossa vontade: «Eis-me, Senhor, aqui estou, adoro-te, encontro-te, Deus vivo». Entremos na igreja com esta atitude e não fiquemos no último banco ou encostados à coluna da água benta. Avancemos para estar mais próximos mesmo fisicamente. Procuremos chegar a horas e dispunhamo-nos para escutar. Quando Jesus apareceu a Santa Ângela de Foligno, coroado de espinhos e todo ensanguentado, disse-lhe: «Não te amei por brincadeira». Na Missa, vamos encontrar Aquele que nos ama, o Abba, o Senhor Jesus. Ao longo do percurso que nos separa da igreja, recordemos estes pensamentos e preparemo-nos com a oração, por exemplo com as palavras do Salmo 131. Então, estaremos dispostos a entender que Deus está verdadeiramente vivo. Ele iluminar-nos-á sobre o mistério da fé, sobre a Eucaristia, sobre a acção de graças. Somente com a oração podemos abrir o nosso coração à luz. Se conseguirmos, leiamos antecipadamente a Palavra de Deus desse dia para poder, depois, escutá-la com um ouvido mais atento, com um coração que já rezou e contemplou a Palavra. Depois, durante a celebração, participemos activamente e, se formos convi17


dados, colaboremos naqueles momentos litúrgicos em que podemos ajudar também os outros a viver o mistério do Senhor. Lentamente, a Missa assumirá, para nós, um significado novo. Quando vamos à Missa, levemos alguma oferta, não somente o dinheiro que metemos no bolso, mas nós mesmos: levemos o perdão aos irmãos, a reconciliação com alguma pessoa, a generosidade numa situação difícil, a oração por quem está doente. Quando o pão e o vinho são oferecidos, representam «o fruto da terra e do trabalho do homem», mas representam também a nós mesmos oferecidos como dom: «A água juntada ao vinho seja sinal da nossa humanidade unida à divindade de Cristo», diz o sacerdote enquanto deita a água no vinho, tempera o vinho, como dizia Justino. Viver a alegria de entrar no mistério Na Eucaristia, Jesus oferece-se. Ofereçamo-nos a Ele e estejamos prontos a fazê-lo nos momentos de dor. Na Eucaristia, Jesus dá-se com o seu corpo e o seu sangue: e nós, damo-nos aos outros? Na Eucaristia, Jesus agradece ao Pai: e nós, descobrimos o agradecimento na nossa vida? Jesus instituiu a Eucaristia enquanto estava na ceia com os seus discípulos: e nós, já descobrimos a comunidade, o ser Igreja, a comunhão na Igreja? João Paulo II disse aos jovens, durante um encontro, a 2 de Junho de 1981, que a coisa mais importante para ele não era o ser papa e nem sequer bispo, mas ser padre e celebrar cada dia a Eucaristia. O fundador dos Missionários da Consolata, beato José Allamano, fazia da Eucaristia o coração e o centro do seu dia. Alegrava-se quando os padres lhe enviavam cartas do Quénia, das primeiras missões, escrevendo: «Temos uma nova capela: nela está Jesus sacramentado». Ler estas cartas era a sua maior alegria: eis que Jesus chegou também àquelas terras! 18


Uma pessoa contemplativa, a quem escrevi a pedir-lhe que rezasse por esta escola de oração, respondeu-me com algumas linhas: «Na escola de oração que vais iniciar, sublinha de forma muito forte que Jesus, em cada Missa, morre por nós e pelos nossos pecados; que nesta incrível oferta de amor há verdadeira salvação; que a Missa é uma oferta de sangue, uma oferta de amor de Jesus; e que devemos vivê-la com gratidão, comunhão, humildade e devoção. Fala sem cessar do sacramento de amor, do coração de Jesus, de quanto sofreu e sofre Jesus por cada um de nós. Explica bem que o Senhor Jesus comprou com o seu sangue as almas e que, ao participar neste sacrifício, devemos participar nele intimamente; que cada cristão deve sentir, por amor, o desejo profundo de oferecer-se com o Senhor por outras almas e louvar e agradecer a Deus Pai o dom imenso que nos fez e continua a fazer. Quebra a indiferença, a tibieza, a superficialidade, a frieza».

Ir à Missa é visto por mim como um dever? É um rito a cumprir ou, tudo somado, um enfado? Preparo-me para a Eucaristia? Vou com alegria e participo nela activamente? Quais são os obstáculos maiores que me impedem de viver a Missa, de participar, de ver os seus frutos ao longo do dia, durante a semana? Já descobri que a Missa é um mistério vivo de amor? Que Jesus está presente e me ama seriamente? Consegue a Missa, mistério de amor, sacudir a minha fé, a indiferença, a tibieza, a superficialidade, a frieza?

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INDICE

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INTRODUÇÃO

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MISTÉRIO DA FÉ

21

REUNIR-SE

29

KYRIE ELEISON PARTIR DO CORAÇÃO

37

EM NOME DO PAI E DO FILHO E DO ESPÍRITO SANTO

45

É PALAVRA DE DEUS

53

A MESA DA PALAVRA

61

PÃO E VINHO DOM DE DEUS E TRABALHO DO HOMEM

69

A PREPARAÇÃO DOS DONS

77

«EM MEMÓRIA DE MIM»

83

VIVER RECORDANDO

89

SHALOM CRISTO NOSSA PAZ

97

NA UNIDADE DO ESPÍRITO SANTO

105

É O CORPO DE CRISTO

113

PARTIR O PÃO

121

A ADORAÇÃO

129

TRANSFORMAMO-NOS NAQUILO QUE RECEBEMOS

135

ITE MISSA EST A MISSA FAZ-SE MISSÃO

141

DEUS TODO EM TODOS 147



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