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apresentação
Carles Feixa e Mònica Figueras-Maz
Este livro reúne dez textos sobre os jovens escritos por Jesús Martín-Barbero ao longo das duas últimas décadas, textos que até agora estavam dispersos em diversas publicações (revistas, capítulos de livros ou atas de congressos), algumas de difícil acesso, além de alguns inéditos. A maior parte deles gira em torno de dois conceitos centrais que o autor utiliza de maneira metafórica e que estão presentes no título: palimpsesto e hipertexto. O primeiro faz referência aos antigos pergaminhos reaproveitados mediante novas escritas que não apagam completamente as anteriores, remetendo à constante reescrita e reciclagem que as culturas juvenis fazem do passado. O segundo faz referência às técnicas de escrita multidimensional (e multimídia) que surgem com as modernas ciberculturas, remetendo às novas formas de comunicação digital por meio das quais os jovens imaginam o futuro. O uso criativo que o autor faz desses dois conceitos teve um grande impacto nos estudos culturais e nos estudos sobre a juventude no âmbito ibero-americano, razão pela qual pedimos a duas referências na área, além de amigos do autor, que escrevessem, um o prefácio — Néstor García Canclini —, e outra, o epílogo — Rossana Reguillo —, justamente sobre as contribuições de Martín-Barbero para ambos os campos de estudo, que neste livro se hibridam por meio da comunicação. A maioria dos textos foram originalmente conferências proferidas em diversas cidades e universidades ibero-americanas. Embora depois tenham se transformado em artigos de revista ou de coletâneas, conservam o tom oral original, inconfundível para nós que tivemos o privilégio de escutar o próprio autor, que lhes dá força e vigor. Optamos por organizá-los em ordem cronológica de publicação para destacar a evolução do pensamento de Martín-Barbero (a referência original é fornecida em nota de rodapé no início de cada capítulo). Não por acaso foram em sua maior parte publicados entre o final da década de 1990 e o início dos anos 2000, coincidindo com a expansão da cultura digital e a emergência da geração da rede, que constituem o marco de análise temporal dos textos. Depois da nossa apresentação e do instigante prólogo de Néstor García Canclini, o livro se abre com uma introdução inédita de Jesús Martín-Bar-
bero — seu escrito mais recente —, na qual ele explica o contexto em que esses textos foram pensados, ditos ou escritos. Seguem-se os dois capítulos centrais, que desenvolvem as ideias do palimpsesto e do hipertexto: uma conferência de 1996 (reproduzida no capítulo 1) e o ensaio seminal publicado em 1998 na coletânea “Viviendo a toda”. Jóvenes, territorios culturales y nuevas sensibilidades (reproduzido no capítulo 2). Os sete capítulos seguintes constituem aplicações desses conceitos para compreender os diferentes mundos de vida juvenis — a cultura, a comunicação, a educação, o trabalho, a leitura, a memória, a tecnologia; baseiam-se em encontros e publicações da primeira década dos anos 2000. O último capítulo é uma conferência realizada em 2015 em Medellín, que volta ao passado para reconstruir a memória da guerra e da paz na Colômbia e para refletir sobre o papel da juventude na construção da cidadania. O livro se completa com um artigo das comunicólogas brasileiras Nilda Jacks e Daniela Schmitz, com uma análise muito completa das contribuições do autor para os estudos sobre juventude e que dialoga com os outros capítulos do volume; com um texto do seu discípulo e colaborador, o comunicólogo colombiano Omar Rincón, centrado nas contribuições do autor para os estudos sobre juventude e comunicação; e, finalmente, com o epílogo de uma de suas almas gêmeas, a antropóloga mexicana Rossana Reguillo. A tarefa de edição dos textos é fruto de um trabalho colaborativo de Carles Feixa e Mònica Figueras-Maz, na interface entre a antropologia e a comunicação, mirando a cultura juvenil. No total, selecionamos dez textos que, embora não sejam os únicos em que o autor falou — pois a maior parte deles foi inicialmente uma conferência — e escreveu sobre a juventude, a nosso ver são os mais significativos. Como critério geral, tentou-se respeitar em sua integridade a primeira versão dos textos incluídos no volume, para mostrar a formulação original e sua evolução no pensamento do autor. Por exemplo, o capítulo 1 foi mantido integralmente, apesar da sua redação esquemática, porque se trata da primeira formulação dos dois conceitos centrais do livro: palimpsesto e hipertexto; o capítulo 2 também foi mantido integralmente, por ser um dos mais conhecidos e citados do autor, apesar de suas ideias terem sido reformuladas e reaproveitadas em textos posteriores. Nos capítulos seguintes, quando há passagens reiterativas, optamos por suprimi-las, incluindo uma Nota dos Organizadores [N.O.] ao pé da página, indicando em que parte do livro podem ser encontradas. Na verdade, esses textos podem ser lidos como se fossem hipertextos, pois, por meio dessas passagens, as ideias centrais remetem umas às outras, provocando diálogos intertextuais.
Os textos, em sua maioria, provêm das versões em formato Word cedidas pelo autor, e em alguns casos foram editados a partir de publicações escaneadas ou da transcrição de conferências, por isso continham erros. Optamos por adaptar a redação para torná-la compreensível ao leitor internacional, mantendo, porém, expressões do castelhano da América Latina e gírias dos dois países onde o autor residiu — Colômbia e México; também foram respeitados alguns modismos, como por exemplo o uso de hífen em alguns prefixos (“des-territorializado”); muitas palavras em itálico, entre aspas ou até em maiúsculas também foram mantidas como no original. Quanto à bibliografia, uniformizou-se o sistema, e as referências foram reunidas ao final de cada capítulo1. As notas de rodapé incluem não apenas as referências bibliográficas, mas também comentários, referências laterais ou as já mencionadas Notas dos Organizadores. Em alguns capítulos, falta a página das citações literais, que não foi possível localizar, mas foram mantidas as aspas para deixar claro que se trata de referências textuais; em outros, os editores acrescentaram as obras referenciadas, o que pode fazer com que, em alguns casos, não seja a correta. Acreditamos que o livro está sendo publicado numa conjuntura muito oportuna. Num momento em que os Millennials são retratados com base em estereótipos e generalizações, caricaturando de forma idealizada ou alarmista o uso e abuso que fazem das TIC, resgatar o pensamento precursor de Martín-Barbero, construído nos primórdios da emergência da cultura digital, pode ser um antídoto crítico contra toda forma de pensamento único ou de pensamento fraco. É uma honra reunir aqui os textos desse autor fundamental, os quais esperamos que tenham um longo percurso.
Barcelona — Buenos Aires, julho de 2017
1 Para a edição brasileira, optou-se por colocar as referências em notas de rodapé e reunidas no final de cada texto. [N. E.]