Novas Aventuras de Pedro Malasartes

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NOVAS AVENTURAS de

é um herói popular que aparece em histórias pelo mundo todo. Jovem aventureiro, inteligente e esperto, está sempre pronto a envolver-se em confusões.

No entanto, tem um bom coração, nunca se recusando a ajudar os injustiçados.

Pedro Malasartes NOVA S AVENTURASDEPEDRO

Nestas novas aventuras, Pedro resolve voltar para casa. Ele encontra sempre um jeito de se livrar dos apuros em que se mete, usando sua esperteza e seus métodos nem sempre bem-comportados.

Hernâni Donato

Ilustrações Edith Derdik

MALASARTES

Hernâni Donato

NOVAS AVENTURAS de Hernâni Donato

Edith Derdyk ilustrações

Quem é Pedro Malasartes

Pedro empregado numa fazenda

O Barão Rói-Unhas e o velho criado

Pedro Belasartes

Com a morte num saco

Como um sopro de vento

Na cidade dos sabichões

A matemática salva Pedro de um naufrágio

O tesouro de Furafura

Sal no café? Vinagre no leite? Pimenta na manteiga?

Quando as aves no Paraíso punham ovos

Um atalho que alonga o caminho

O autor

Há quem diga ser um desmiolado, um moleque sempre disposto a pregar as piores peças às mais inocentes pessoas. Usaria da sua viva inteligência, da agilidade de espírito e, também, do físico que Deus lhe deu apenas para salvar-se dos apuros em que se envolve a cada passo.

Outros, porém, pensam que, de certo modo, Pedro representa o que restou daqueles corajosos cavaleiros andantes da Idade Média, que saíam pelo mundo a corrigir injustiças e a socorrer os necessitados, não dispensando a força do braço, o fio da espada e os artifícios da inteligência.

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Como quer que seja, não há quem desconheça Pedro Malasartes. É popular em todo o mundo, embora com diferentes nomes, pois é filho da imaginação do povo, que cria heróis para significar a vitória dos fracos sobre os fortes, dos desprotegidos sobre os poderosos.

Se Pedro Malasartes aparecesse nas histórias dos vários países com o mesmo nome, iriam dizer que se tratava de cópia, imitação. Mas ele vive, na narrativa dos meninos de toda parte, as mesmas aventuras e o mesmo espírito, com nomes e roupas diferentes, conforme o povo e a terra. No Camboja, Ásia, é conhecido pelo nome de Kuong-Alev. Entre os meninos bengalis, chama-se Paumohan Chattergi e, quase sempre, disfarça-se numa raposa que se finge de mestre-escola. Na África, entre as tribos gurmatié, passa a ser conhecido como Foumtinndouha. Na Europa do norte, do centro e do leste, as crianças o chamam Eulenspiegel. Na Itália, Bertoldinho. Na Espanha e na América espanhola, seu nome é Pedro Urdemales. Pedro é inteligente, vivo, sempre pronto a meter-se em aventuras extraordinárias. Por vezes pratica atos não recomendáveis, mas, nesses casos, é movido por boas intenções. Idealista, representa as coisas boas que o povo não pode alcançar. Quando Pedro não tem problema pessoal a resolver, põe-se a serviço dos fracos, dos pequenos, dos que não possuem nada, dos que necessitam justiça. No fundo, ele é bom. Pena é que, até agora, somente tenham procurado contar o que Pedro fez de menos elogiável. Estas aventuras mostram um Malasartes sob novo aspecto, em que ele erra por vezes, mas sempre procurando acertar.

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É preciso apreciar o que existe de bom em Pedro. Ele também pode ser apontado como exemplo a ser imitado. Corajoso e persistente, jamais desespera. Exemplo de como a perseverança pode vencer as dificuldades e de como não existe má sorte para os que confiam e insistem em alcançar seu ideal.

De corpo e de rosto, Pedro não difere de qualquer menino. Podia até ser assim como... como você, leitor!

As muitas aventuras em que Pedro Malasartes tomou parte desde o dia em que, depois de repartir a pequena economia deixada pelo pai, se separou de seu irmão, levaram-no longe, muito longe de casa. Tão longe que uma viagem de volta exigiria meses e meses de caminhada.

Pois essa viagem é que Pedro estava fazendo quando esta narrativa começa. Foi assim: como acontece com toda gente, lá um dia acordou com saudades do lugar onde tinha nascido. Estava cansado de correr mundo.

“Acho que estou querendo voltar para casa”, pensou. Uma vez resolvido, depressa se pôs a caminho, disposto não só a chegar quanto antes, como também a fazer o maior bem possível durante a viagem. Reconhecia que, muitas vezes, agira mal no passado. Recordava-se, por exemplo, com uma pontinha de remorso, de que vendera os porcos de um fazendeiro, enfiando depois o rabinho dos bichos num atoleiro, para fazer crer ao dono que eles se haviam enterrado ali, ao beber água no rio. E lembrava-se de outro caso, em que fizera certo comerciante acreditar nas vozes de um urubu, como se a ave fosse mágica...

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Agora Pedro voltava para casa com a intenção de passar o resto de sua vida cultivando o sítio deixado pelo pai e cuidando de sua velha mãezinha. Mas, na pressa de partir, não pensou em preparar grande bagagem. E isso deu motivo a que se visse envolvido em muitas dificuldades. É o que desejo contar a vocês.

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O tempo das chuvas encontrou Pedro em viagem. E não levava consigo grande coisa. Por isso, como as estradas estivessem ruins e tudo se fosse tornando difícil para os viajantes desprevenidos, decidiu que o melhor seria procurar ocupação, durante um ou dois meses. Esperaria pelo bom tempo e teria dinheiro para comprar o que necessitasse na viagem.

Aproximou-se de uma fazenda e pediu trabalho. – Você é moço demais para tratar do gado ou para trabalhar na terra – respondeu o fazendeiro. – Mas estou mesmo precisando de alguém para um serviço muito importante. Acontece que de há algum tempo para cá os trabalhadores não se levantam mais à hora do costume. Seu trabalho será o de acordar os traba-

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lhadores, todas as manhãs, ao nascer do sol. Só isso. Mas será preciso que você não falhe! – Acordar os homens! – disse Pedro. – Só isso?! Pode ficar sossegado. A partir de amanhã, antes do último canto do galo, farei a chamada.

Pela madrugada levantou-se, foi à janela e gritou:

– Manuel!... Joaquim!... João!... Benedito!... Antônio!...

E foi deitar-se, certo de que havia cumprido o prometido.

Já com o Sol alto, o fazendeiro percebeu que nenhum dos colonos estava trabalhando. Reclamou:

E então? Você não disse que antes de o galo cantar chamaria a todos?!

Calmamente, Pedro respondeu:

Ah! Se ninguém se levantou, a culpa não foi minha! Que eu chamei, isso chamei! Que culpa tenho se são grandes dorminhocos?!

Mas é claro que não podiam ouvir seus gritos! Você terá de usar o sino, e não a garganta, para chamá-los. Está ouvindo? Lembre-se bem: o sino!

Pedro afirmou que sim, que havia entendido. Mas também no dia seguinte os colonos não foram para o trabalho à hora marcada. O patrão tornou a reclamar:

Por que não tocou o sino?

Porque o sino não tem corda. Onde já se viu sino tocar sem corda?...

O fazendeiro mandou trazer uma corda. Mas, no outro dia, já o sol esquentava e os trabalhadores dormiam a muito bom dormir. Vendo isso, armou-se de um forte cassetete e correu para a casa do sineiro improvisado, disposto a aplicar-lhe uma lição de mestre.

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Pedro, que gostava bastante da cama macia, explicou com a maior inocência: – Primeiro, o senhor disse que era para chamar. Chamei e ninguém ouviu. Depois que era para bater no sino. Dei-lhe muitos pontapés, e ele não fez senão uma machucadura no meu pé... Veio a corda e, esta manhã, puxei pela corda de um lado e de outro e nada. Quer ver?

– Oh! seu desavergonhado! – rugiu o fazendeiro.

Você é um grande malandro, isso sim! Pois, então, não sabe que a corda deve ser amarrada ao sino, e o sino colocado no alto de um poste?! Se amanhã não fizer direito esse serviço, verá o que lhe acontece!

De madrugada, armado com o cassetete, o fazendeiro foi postar-se próximo à casa de Pedro. Como pensava, do sino não se ouviu som algum. Curioso, desejou saber o motivo daquele silêncio. Subiu ao poste e qual não foi o seu assombro quando notou que o sino ali estava, mas... sem o badalo! Claro que nesse estado o sino não poderia soar, chamando a gente para o trabalho.

Como é isso? Explique-se! – ordenou, furioso.

– Bem – respondeu Pedro, ainda se espreguiçando da gostosa soneca. – Aí está o poste, o sino e a corda. Puxei a corda mas o tal sino não tocou. O senhor desculpe, mas não me disse que era preciso o badalo. Disse apenas que era preciso o sino, a corda e o poste...

O fazendeiro não quis mais conversa. Desandou a correr com o cassetete atrás de Pedro, pronto para dar-lhe uma boa surra.

Mas vê lá se Pedro esperou por isso! Partiu numa disparada louca e, na corrida, apanhou uma pedra e de

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passagem atirou-a contra a casa do cão de guarda. O animal, saindo para ver do que se tratava, viu o homem correndo atrás de Pedro e partiu atrás dos dois.

Pouco adiante Pedro atropelou um bezerro, que ruminava calmamente. Percebendo esse fato, a vaca saiu do estábulo e viu o cão correndo atrás do fazendeiro e o fazendeiro atrás de Pedro. Não teve dúvidas, saiu atrás do cão.

Entre o campo e a mata, numa árvore havia uma enorme casa de marimbondos. Pedro apanhou uma varinha e, parando por um segundo, esperou que o fazendeiro estivesse mesmo por debaixo dos marimbondos para atirar a varinha contra os insetos. Estes não perguntaram quem era o culpado. Caíram sobre o pobre homem que foi de fazer dó.

O cão, que chegava, levou também ferroadas a valer. Para defender-se, mordia e unhava o que pudesse, enquanto o homem, cego pela dor e pela cólera, distribuía cacetada a torto e a direito. O barulho era grande, e a vaca, julgando que ainda caçoavam dela e do seu bezerro, veio numa corrida doida e entrou no grupo, distribuindo valentes chifradas!

Cada qual fazia o melhor possível: os marimbondos ferroavam, o homem batia com o cassetete, o cão mordia, e a vaca chifrava! Nem queiram saber como ficaram todos eles! Os gemidos, os latidos e os mugidos foram tais que não se perdeu a hora do trabalho na fazenda por toda uma semana.

O único e grande culpado pelo acontecido é que não se incomodou. Assobiando uma alegre melodia, apreciando a manhã cheia de sol que anunciava o fim

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da estação chuvosa, Pedro Malasartes tomou a estrada e seguiu caminho, disposto a não deixar fugir oportunidade alguma capaz de apressar o regresso ao lar e tornar a viagem mais agradável.

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