Bioetanol de Cana-de-Açúcar Luís Augusto Barbosa Cortez (Coordenador) Lançamento 2010 ISBN: 9788521205319 Páginas: 992 Formato: 21x28 cm Peso: 2,400 kg
Sumário
Parte 1
ESTRATÉGIAS PARA POLÍTICAS PÚBLICAS EM ETANOL Luiz Augusto Barbosa Cortez (coordenador)
1
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................................................
3
Luís Augusto Barbosa Cortez 2
A ESTRATÉGIA BRASILEIRA PARA O ETANOL .........................................................................................................................
17
Rogério Cézar de Cerqueira Leite 3
A ESTRATÉGIA DE SÃO PAULO PARA O ETANOL ..................................................................................................................
19
José Goldemberg 4
DESAFIOS DA PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO EM BIOCOMBUSTÍVEIS NO BRASIL .....................
27
Lucia C. P. Melo e Marcelo K. Poppe 5
ESCALANDO O MONTE TERAWATT ..........................................................................................................................................
35
Cylon Gonçalves da Silva 6
QUESTÕES AMBIENTAIS (IMPACTOS LOCAIS E GLOBAIS) E ENERGÉTICOS: A EXPANSÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR E A OCUPAÇÃO DAS TERRAS NO ESTADO DE SÃO PAULO .....................
41
Evaristo Eduardo de Miranda 7
EVOLUÇÃO DO SETOR CANA NO ESTADO DE SÃO PAULO..............................................................................................
53
Luiz Carlos Corrêa de Carvalho 8
O PAPEL DOS CENTROS DE PESQUISAS ESTADUAIS DE SÃO PAULO NA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA EM BIOENERGIA..................................................................................................................
63
Orlando Melo de Carvalho 9
INSTRUMENTOS DE APOIO À P&D EM ETANOL ...................................................................................................................
73
João Furtado e Vanderléia Radaelli
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Bioetanol de Cana-de-Açúcar
XXXIV
10
MAPEAMENTO TECNOLÓGICO DA CADEIA PRODUTIVA DO ETANOL PROVENIENTE DA CANA-DE-AÇÚCAR SOB ENFOQUE DOS PEDIDOS DE PATENTES: CENÁRIO BRASILEIRO ............................................................................
87
Eduardo Winter, Araken Alves Lima e Cristina D’Urso de S. Mendes 11
ALIMENTOS VERSUS COMBUSTÍVEIS: PODEMOS EVITAR O CONFLITO? ......................................................................
101
Francisco Rosillo-Calle 12
INTEGRANDO COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS PARA A BIORREFINARIA SUCROALCOOLQUÍMICA ........................
115
Vadson Bastos do Carmo e Katia Tannous 13
ÁLCOOL COMBUSTÍVEL: CONSOLIDAÇÃO DO MERCADO INTERNO E ESTRATÉGIA PARA CRIAR O MERCADO EXTERNO ...............................................................................................................
125
Julio Maria M. Borges 14
ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR E A INTEGRAÇÃO ENERGÉTICA LATINO-AMERICANA .........................................
133
Luiz Augusto Horta Nogueira 15
SISTEMAS AGRÍCOLAS SUSTENTÁVEIS E BIODIVERSIDADE FAUNÍSTICA: O CASO DA CANA-DE-AÇÚCAR EM MANEJO ORGÂNICO E AGROECOLÓGICO .......................................................
141
José Roberto Miranda 16
A NECESSIDADE DE PESQUISA BÁSICA PARA CANA E ETANOL .....................................................................................
151
Marco Aurélio Pinheiro Lima e Alexandra P. P. Natalense 17
A IMPORTÂNCIA DO DIREITO E DAS DISCUSSÕES JURÍDICAS NAS QUESTÕES DE BIOENERGIA ......................
157
Renata Marchetti
Parte 2
SUSTENTABILIDADE DA PRODUÇÃO E DO CONSUMO DE BIOCOMBUSTÍVEL Arnaldo César da Silva e Manoel Regis Lima Verde Leal (coordenadores)
1
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................................................
173
Arnaldo Walter e Manoel Regis Lima Verde Leal 2
O IMPACTO DO USO DO ETANOL NA QUALIDADE DO AR DAS GRANDES CIDADES .............................................
185
Alfred Szwarc 3
AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A CANA-DE-AÇÚCAR NO ESTADO DE SÃO PAULO ................................................
195
Jurandir Zullo Júnior, Hilton Silveira Pinto, Eduardo Delgado Assad, Fábio Ricardo Marine e Giampaolo Queiroz Pellegrino 4
ESTOQUES DE CARBONO NO SOLO E FLUXO DE GASES DO EFEITO ESTUFA NO ................................................... AGROSSISTEMA CANA-DE-AÇÚCAR
203
Carlos C. Cerri, Brigitte J. Feigl, Marcelo V. Galdos, Martial Bernoux e Carlos E. P. Cerri
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Sumário 5
XXXV
GOVERNANÇA DO ETANOL BRASILEIRO: IMPLICAÇÕES PARA A SUSTENTABILIDADE ..........................................
217
Thomaz Fronzaglia e Renata Martins 6
ASPECTOS AMBIENTAIS DA CADEIA DO ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR NO ESTADO DE SÃO PAULO ..........
241
Suani Teixeira Coelho, Beatriz Acquaro Lora e Patrícia Maria Guardabassi 7
O EMPREGO E A RENDA NO SETOR SUCROALCOOLEIRO NO ESTADO DE SÃO PAULO .........................................
255
Rodolfo Hoffman e Fabíola Cristina Ribeiro de Oliveira 8
USO DA ÁGUA NA PRODUÇÃO DE ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR ............................................................................
271
Gilberto de Martino Jannuzzi 9
IMPACTOS DA EVOLUÇÃO DO SETOR SUCROALCOOLEIRO: SUMÁRIO DAS QUESTÕES QUE BALIZARÃO UMA EVOLUÇÃO SUSTENTÁVEL ...............................................................................................................................................
279
Alceu de Arruda Veiga Filho, Tomás Szmrecsányi e Pedro Ramos 10
EMISSÕES DE GASES DE EFEITO ESTUFA RELACIONADAS AO ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR .........................
291
Joaquim E. A. Seabra, Isaías Carvalho Macedo e Manoel Regis Lima Verde Leal 11
NECESSIDADE DE TERRAS PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL NO BRASIL ....................................................................
311
Luís Augusto Barbosa Cortez, Manoel Regis Lima Verde Leal, André Meloni Nassar, Marcelo Ramalho Moreira, Sabrina Feldman, Miguel Taube e Andrés da Silva
Parte 3
NOVO MODELO AGRÍCOLA PARA CANA-DE-AÇÚCAR Paulo Sérgio Graciano Magalhães e Oscar A. Braunbeck (coordenadores)
1
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................................................
319
Paulo S. Graziano Magalhães e Oscar A. Braunbeck 2
GENÔMICA E BIOTECNOLOGIA DA CANA-DE-AÇÚCAR: ESTADO DA ARTE, DESAFIOS E AÇÕES ......................
325
Glaucia Mendes Souza e Marie-Anne Van Sluys 3
MELHORAMENTO GENÉTICO E MAPEAMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR .....................................................................
333
Anete Pereira de Souza, Antonio Augusto Franco Garcia e Karine Miranda Oliveira 4
A ESTRATÉGIA DE SELEÇÃO REGIONAL NO DESENVOLVIMENTO DE CULTIVARES DE CANA-DE-AÇÚCAR PARA BIOENERGIA ..........................................................................................................................................................................
345
Marcos Guimarães de Andrade Landell, Silvana Creste, Luciana Rossini Pinto, Mauro Alexandre Xavier e José Antonio Bressiani 5
IMPORTÂNCIA DO GERMOPLASMA NO DESENVOLVIMENTO DE CULTIVARES DE CANA-DE-AÇÚCAR COM PERFIL AGROENERGÉTICO ................................................................................................................................................
353
Silvana Creste, Luciana Rossini Pinto, Mauro Alexandre Xavier e Marcos Guimarães de Andrade Landell
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Bioetanol de Cana-de-Açúcar
XXXVI
6
A FOTOSSÍNTESE EM CANA-DE-AÇÚCAR E SUA IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA PARA ENFRENTAR AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS GLOBAIS...........................................................................................................
359
Amanda P. de Souza e Marcos S. Buckeridge 7
AS ROTAS PARA O ETANOL CELULÓSICO NO BRASIL.........................................................................................................
365
Marcos S. Buckeridge, Wanderley D. dos Santos e Amanda P. de Souza 8
MANUTENÇÃO DA FERTILIDADE E RECUPERAÇÃO DOS SOLOS NA CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR..........
381
Raffaella Rossetto, Fábio Luis Ferreira Dias, André César Vitti e Heitor Cantarella 9
FERTILIZANTES PARA A CANA-DE-AÇÚCAR ..........................................................................................................................
405
Heitor Cantarella e Raffaella Rossetto 10
UTILIZAÇÃO AGRÍCOLA DA VINHAÇA .....................................................................................................................................
423
Miguel Angelo Mutton, Raffaella Rossetto e Márcia Justino Rossini Mutton 11
CONTROLE BIOLÓGICO DE PRAGAS COMO UM COMPONENTE-CHAVE PARA A PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL DA CANA-DE-AÇÚCAR ...........................................................................................................
441
José Roberto Postali Parra, Paulo Sérgio Machado Botelho e Alexandre de Sene Pinto 12
AVALIAÇÃO TECNOLÓGICA DA MECANIZAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR ...................................................................
451
Oscar A. Braunbeck e Paulo S. Graziano Magalhães 13
COLHEITA DE CANA-DE-AÇÚCAR E PALHA PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL ...........................................................
465
Paulo S. Graziano Magalhães e Oscar A. Braunbeck 14
INSTRUMENTAÇÃO E AUTOMAÇÃO NA CADEIA CANA-ETANOL: ALGUMAS OPORTUNIDADES NO MANEJO AGRÍCOLA................................................................................................................................................................
477
Ricardo Yassushi Inamasu e Ladislau Martin-Neto 15
LOGÍSTICA DO TRANSPORTE DE MATÉRIA-PRIMA E RESÍDUO DA CANA-DE-AÇÚCAR .........................................
487
Oscar A. Braunbeck e Efraim Albrecht Neto 16
GERENCIAMENTO AGRÍCOLA NO SETOR SUCROALCOOLEIRO ......................................................................................
505
Nilson M.Arraes, Paulo S. Graziano Magalhães e Jorge Luis Donzelli 17
OUTRAS MATÉRIAS-PRIMAS PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL .......................................................................................
519
Manoel Regis Lima Verde Leal, Teresa Losada Valle, José Carlos Feltan e Cássia Regina Limonta Carvalho
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Sumário
XXXVII
Parte 4
NOVO MODELO INDUSTRIAL E USOS FINAIS DO ETANOL Antônio Bonomi (coordenador)
1
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................................................
541
Antonio Bonomi e Mara das Graças de Almeida Felipe 2
PRODUÇÃO DE ETANOL: ASPECTOS A SEREM CONSIDERADOS....................................................................................
547
Maria das Graças de Almeida Felipe 3
QUALIDADE DA MATÉRIA-PRIMA NA PRODUÇÃO DE ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR ........................................
553
Maria das Graças de Almeida Felipe 4
EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DO PROCESSAMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR PARA ETANOL E ENERGIA ELÉTRICA .........................................................................................................................................................................
561
Manoel Regis Lima Verde Leal 5
WORKSHOP POTENCIAL DE GERAÇÃO DE ELETRICIDADE A PARTIR DA BIOMASSA RESIDUAL DA CANA: OPORTUNIDADES, DESAFIOS E AÇÕES NECESSÁRIAS – RELATÓRIO FINAL ...............................................
577
Arnaldo Walter 6
AUMENTO DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA EM PLANTAS PRODUTORAS DE AÇÚCAR, ETANOL E ENERGIA ELÉTRICA .........................................................................................................................................................................
583
Adriano V. Ensinas, Juan Harold Sosa Arnao e Silvia A. Nebra 7
INSTRUMENTAÇÃO E AUTOMAÇÃO NA AGROINDÚSTRIA DA CADEIA CANA-ETANOL ........................................
601
Cristiane Sanchez Farinas, Ladislau Martin Neto e Roberto Campos Giordano 8
NECESSIDADES DE P&D NA ÁREA INDUSTRIAL EM VINHAÇA ........................................................................................
619
Luís Augusto Barbosa Cortez, Carlos Vaz Rossell, Rodrigo Aparecido Jordan, Manoel Regis Lima Verde Leal e Electo Eduardo Silva Lora 9
A PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR COMO MATÉRIA-PRIMA PARA PROCESSOS DE SEGUNDA GERAÇÃO ..........
637
Edgardo Olivares Gómez, Renata Torres Gomes de Souza, George Jackson de Moraes Rocha, Eduardo de Almeida e Luís Augusto Barbosa Cortez 10
PRODUÇÃO INTEGRADA DE BIODIESEL NA USINA BARRALCOOL................................................................................
661
José Luiz Olivério, Sérgio Iamassia Barreira e Sílvio Cezar Pereira Rangel 11
WORKSHOP HIDRÓLISE DE MATERIAL LIGNOCELULÓSICO ............................................................................................
679
Antonio Bonomi 12
PRODUÇÃO DE ETANOL A PARTIR DE MATERIAIS LIGNOCELULÓSICOS .....................................................................
697
Mats Galbe e Guido Zacchi 13
HIDRÓLISE DA BIOMASSA LIGNOCELULÓSICA....................................................................................................................
717
Rodolfo Quintero-Ramirez
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Bioetanol de Cana-de-Açúcar
XXXVIII
14
A PIRÓLISE RÁPIDA COMO PRECURSORA DE BTL ...............................................................................................................
733
Juan Miguel Mesa Pérez, José Délcio Rocha e Luís Augusto Barbosa Cortez 15
TECNOLOGIAS BTL .........................................................................................................................................................................
741
Ademar Hakuo Ushima 16
CANA ENERGIA ................................................................................................................................................................................
751
Manoel Regis Lima Verde Leal 17
NOVAS POSSIBILIDADES DE NEGÓCIOS DO SETOR SUCROALCOOLEIRO: ALCOOLQUÍMICA E BIORREFINARIA ........................................................................................................................................
761
Telma Teixeira Franco e Camilo Sixto López Garzón 18
OPÇÕES TECNOLÓGICAS PARA AS FUTURAS BIORREFINARIAS DE CANA .................................................................
773
Joaquim E. A. Seabra e Isaias C. Macedo 19
LOGÍSTICA PARA ESCOAMENTO DE ETANOL ........................................................................................................................
785
Mirna Ivonne Gaya Scandiffio 20
PROJETO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ETANOL: QUALIDADE E NORMALIZAÇÃO DO ETANOL ................
801
Antonio Bonomi 21
QUALIDADE DO ETANOL COMBUSTÍVEL: MATERIAIS DE REFERÊNCIA E MÉTODOS DE ANÁLISE......................
813
Nelson Ramos Stradiotto, Maria Valnice Boldrin Zanoni, Isabel Cristina Serta Fraga e Paulo Paschoal Borges 22
QUESTÕES RELATIVAS AO USO FINAL DO ETANOL (COMBUSTÍVEL E QUÍMICA): O MOTOR A ÁLCOOL – PASSADO, PRESENTE E FUTURO ................................................................................................................................................
829
Henry Joseph Jr. 23
USO DO EETANOL EM MOTORES CICLO DIESEL ..................................................................................................................
841
Jose Roberto Moreira, Silvia Velázquez e Euler Hoffman Melo 24
QUESTÕES RELATIVAS AO BIODIESEL E AO ETANOL: USO DO ETANOL NA TRANSESTERIFICAÇÃO .................
853
Leticia Ledo Marciniuk, Camila Martins Garcia e Ulf Schuchardt
Parte 5
ROADMAPPING TECNOLÓGICO PARA O ETANOL André Tosi Furtado e Rodrigo Lima Verde Leal (coordenadores)
1
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................................................
829
André Tosi Furtado e Rodrigo Lima Verde Leal
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Sumário 2
XXXIX
ROADMAPPING TECNOLÓGICO PARA O ETANOL ...............................................................................................................
831
Rodrigo Lima Verde Leal, Luís Augusto Barbosa Cortez, Maria das Graças de Almeida Felipe, Carlos Vaz Rossell, Antonio Bonomi e Paulo S. Graziano Magalhães 3
DIRETRIZES DE POLÍTICA PÚBLICA PARA A INDÚSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SÃO PAULO...................
851
Marco G. A. Landell, Luciana Rossini Pinto, Silvana Creste, Sabrina Moutinho Chabregas e William Lee Burnquist 4
ROADMAP TECNOLÓGICO PARA O ETANOL: COMPONENTE MANEJO AGRÍCOLA..................................................
865
Paulo S. Graziano Magalhães 5
ROADMAP TECNOLÓGICO PARA O ETANOL: COMPONENTE HIDRÓLISE ...................................................................
877
Maria das Graças de Almeida Felipe e Carlos Vaz Rossell 6
PROGRAMA DE PESQUISA EM POLÍTICA PÚBLICA (PPPP) ROADMAP TECOLÓGICO DA TERMOCONVERSÃO DE BIOMASSA PARA A TECNOLOGIA BTL (BIOMASS TO LIQUID) .........................................
887
Luís Augusto Barbosa Cortez, Rodrigo A. Jordan, Juan M. Mesa.Pérez e José D. Rocha 7
DIRETRIZES PARA UMA POLÍTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO DO ETANOL ............................................................................................................................................................
905
André Furtado, Luís Augusto Barbosa Cortez, Maria da Graça de Almeida Felipe, Raffaella Rossetto, Paulo Graziano Magalhães, Manoel Regis Lima Verde Leal
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Parte 1 ESTRATÉGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ETANOL Luís Augusto Barbosa Cortez (organizador)
1 INTRODUÇÃO Luís Augusto Barbosa Cortez
A partir da crise energética da década de 1970 e das principais conferências sobre o meio ambiente, as questões sobre a eficiência da geração e do uso da energia foram intensificadas e ampliadas, considerando, principalmente, os seus impactos ambientais, buscando cada vez mais o uso de fontes renováveis de energia, que possam contribuir para reduzir as emissões de CO2. A Agenda 21 e o Protocolo de Quioto sugerem a capacitação, educação e difusão do conhecimento técnico e científico, além da retomada da sustentabilidade, substituindo os combustíveis fósseis por fontes renováveis de energia. Também, vários países, entre eles os EUA, que consomem cerca de 40% da gasolina do mundo (cerca de 560 bilhões de litros em 2008), estão adotando políticas que os conduzam num médio prazo a reduzir significativamente a dependência externa de energia. Portanto, seja pela questão ambiental global (redução de emissões de gases do efeito estufa), seja pela importância em reduzir a dependência externa de energia, o etanol brasileiro, que já apresenta indicadores ambientais muito positivos quando comparado a outras opções, representa para o Brasil, hoje e nas décadas vindouras, uma grande oportunidade.
ETANOL: UM PRODUTO ESTRATÉGICO PARA O BRASIL O Brasil é líder mundial na produção de cana, etanol e açúcar com 572,7 milhões de toneladas, 27,7 bilhões de litros e 31,3 milhões de toneladas, respectivamente, na safra 2008/2009 (MAPA, 2009). A cana-de-açúcar é produzida em mais de 101 paí-
ses no mundo, porém, os 8 maiores produtores já representam cerca de 3/4 da produção mundial (FAOSTAT, 2008); segundo essa mesma fonte, o Brasil representou, em 2007, 33% dessa produção. A liderança do Brasil no setor foi conseguida graças às significativas reduções nos custos de produção, principalmente após o lançamento do Proálcool, resultantes dos ganhos de produtividade e eficiências agrícolas e industriais (Figura 1). Por exemplo, os açúcares totais recuperáveis – ATR passaram de cerca de 109 kg/ton cana na safra 1974/1975 para 144 kg/ton cana na safra de 2004/2005. Em termos de Centro-Sul, e particularmente de São Paulo, os ganhos ainda são mais expressivos; para São Paulo, entre 1975 e 2000, a produtividade da cana cresceu 33%, o teor de sacarose aumentou 8% e a fermentação teve ganho de 14% na eficiência e 130% na produtividade. Essas melhorias se traduziram na região Centro-Sul em uma produtividade do álcool de 5.900 litros/ha, contra 2.000 litros/ha em 1975, e um custo de produção em torno de US$ 0,20/litro. O Estado de São Paulo, graças à sua competitividade, responde por cerca de 60% da produção nacional de cana-deaçúcar e álcool. Essa liderança e competitividade mundial não estão garantidas no médio e longo prazos, pois países como a Austrália e Tailândia têm custos de produção de açúcar não muito maiores que os nossos e esse último país pode aumentar ainda mais sua produção total. No caso do álcool, os países desenvolvidos investem pesadamente na produção de etanol a partir de materiais lignocelulósicos, tanto por hidrólise, como pelas rotas de gaseificação (FischerTropsch e outras), com a expectativa de atingirem
2 A ESTRATÉGIA BRASILEIRA PARA O ETANOL Rogério Cezar de Cerqueira Leite
A primeira intervenção do Estado, na produção de etanol no Brasil, ocorreu já no início do século XX, com a previsão de adição de 2% de álcool à gasolina. Durante essas primeiras décadas, entretanto, não havia nenhuma preocupação, fosse com impactos ao meio ambiente, inclusive o efeito estufa, fosse com a autonomia nacional em relação a combustíveis, que até então eram importados. A razão para essa iniciativa foi simplesmente a de criar um pulmão para o setor açucareiro, que absorveria excedentes de produção de açúcar ao convertê-lo em álcool. Embora esse percentual tivesse crescido lentamente, mesmo antes do advento do Programa Nacional do Álcool – Proálcool, uma razão de ordem estratégica mais clara só veio a interferir, então. Com o aumento exorbitante dos preços internacionais do petróleo, a dependência do Brasil, que era à época de mais de 80%, tornou-se um peso econômico excessivo. Concomitantemente com a reversão da política nacional para o petróleo, que até então pretendia resguardar as nossas reservas de óleo cru para o futuro e que passou a buscar intensamente o aumento da produção nacional, foi então implantado o Programa Nacional do Álcool. Com isso, aumentou-se para 10% a participação do álcool na gasolina e incentivou-se o carro de passeio com motor a álcool. Todavia, nessa época a única preocupação de ordem estratégica era a redução da dependência nacional em relação ao petróleo. Embora alguns cientistas conhecessem o efeito estufa desde o século XIX, mesmo no mundo acadêmico, não havia percepção da importância da emissão de CO2 para o clima. Também não se levava em
consideração qualquer outra consequência de natureza ecológica do uso de combustíveis fósseis ou biológicos. Mais recentemente algumas medidas tomadas pelo Governo durante as administrações Fernando Henrique Cardoso e Luiz Ignácio Lula da Silva podem ser consideradas como embriões de uma estratégia futura; de início, algumas iniciativas referentes à redução progressiva da queima da cana e inícios de financiamento preferencial de sistemas produtivos eficientes, principalmente no que se refere à cogeração e melhor aproveitamento do bagaço. O Brasil também procura promover a produção de álcool em outros países com a finalidade de reduzir a aversão à dependência do álcool brasileiro, mostrada prematuramente por importadores eventuais futuros. Embora de maneira bastante tímida, o Ministério de Ciência e Tecnologia tem apoiado estudos e planejamento integrado de aumento da produção de álcool combustível. Também têm sido apoiados estudos relativos ao aproveitamento integral da cana, incluindo-se a criação de um centro de pesquisas de bioetanol. Simultaneamente, vários aspectos relativos à sustentabilidade também têm sido apoiados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Embora a atitude do Governo tenha sido, no que diz respeito à produção de etanol, fundamentalmente uma de laissez-faire, os estudos efetuados pelo MCT têm tido consequências no setor privado e uma delas é a percepção de que a logística é essencial para uma produção, não apenas econômica e energeticamente eficiente, mas também social e ecologicamente positivas. O conceito de clusters veio a ser fundamental para essa perspectiva.
3 A ESTRATÉGIA DE SÃO PAULO PARA O ETANOL José Goldemberg
A estratégia do Estado de São Paulo para a expansão da produção do etanol é basicamente que ela ocorra de forma pouco impactante, tanto do ponto de vista ambiental como social. As principais componentes dessa estratégia são: 1. Melhorar a eficiência das tecnologias de primeira geração nas quais se baseia o atual sistema; estima-se que a produtividade média nos próximos 10 anos aumente cerca de 30%. 2. Aumentar a cogeração de eletricidade com o uso do bagaço de cana de açúcar. 3. Eliminar gradativamente a colheita manual de cana-de-açúcar e acelerar a mecanização nas áreas com declividade menor do que 12%. 4. Orientar a expansão da área de cultivo da cana-de-açúcar – que é hoje de 4,34 milhões de hectares – sobre pastos degradados dos quais existem cerca de 10 milhões de hectares no Estado. 5. Viabilizar a construção de alcooldutos para reduzir os custos do transporte do etanol das regiões produtoras aos grandes centros consumidores, ou aos portos para exportação. 6. Zoneamento ecológico-econômico e criação de novas unidades de conservação. 7. Introdução de tecnologias de segunda geração para a produção de etanol. 8. Estímulo à alcoolquímica. Discutimos, a seguir, com algum detalhe, as medidas propostas, algumas das quais em implementação.
MELHORAR A EFICIÊNCIA DAS TECNOLOGIAS DE PRIMEIRA GERAÇÃO Atualmente, a produção de etanol da cana-deaçúcar no Brasil se baseia exclusivamente em “tecnologias de primeira geração”, em que a sucrose da cana é fermentada. Essa sucrose, contudo, representa apenas 1/3 do conteúdo energético da canade-açúcar, como se vê na Figura 1. O bagaço é utilizado para produzir o calor e a eletricidade necessários ao processo de produção de etanol, gerando excedentes adicionais de eletricidade vendidos à rede. O uso de bagaço, para essa dupla finalidade, é a razão pela qual o balanço energético na produção de etanol da cana é altamente positivo, uma vez que não são usados combustíveis fósseis na sua preparação, exceto os que estão embutidos na preparação de fertilizantes e pesticidas, além do óleo diesel usado nos equipamentos agrícolas e no transporte da cana para a destilaria. O balanço energético na produção do etanol, isto é, a razão da energia contida num dado volume de álcool para a energia fóssil usada na sua preparação é de 8 a 10:1. Nos Estados Unidos, o balanço energético para a produção de etanol de milho é de apenas 1,3:1. A produtividade na produção de etanol no País cresceu extraordinariamente nos últimos 29 anos, a uma taxa média de 3,77% ao ano (Figura 2). Isso se deve a melhorias na fase agrícola por meio da seleção de melhores cepas, bem como outros ganhos nas outras etapas do processo: • aumento do açúcar recuperável: 1,45% ao ano; • extração do açúcar: 0,3% ao ano;
4 DESAFIOS DA PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO EM BIOCOMBUSTÍVEIS NO BRASIL Lucia C. P. de Melo Marcelo K. Poppe
Três quartos do consumo energético mundial proveem de combustíveis fósseis. Eles são responsáveis por grande parte da poluição local e pela maior parte das emissões de gases de efeito estufa do planeta. A escala em que eles vêm sendo utilizados vai rapidamente conduzir à sua rarefação, ainda mais se for considerado que o consumo energético global deve crescer, como resultado do progresso de diversas regiões em desenvolvimento. Os países industrializados não tiveram sucesso em reduzir o uso da energia sem comprometer a qualidade de vida, apesar de ser sabido que isso pode e deve ser feito. O desafio atual é de promover o uso de fontes renováveis de energia e de aumentar a eficiência na produção e uso da energia numa escala sem precedentes. O bioetanol de canade-açúcar e outros biocombustíveis, que puderem ser desenvolvidos de modo sustentável, contribuirão significativamente nesse sentido. Mas, para que isso ocorra, é necessário um esforço global de pesquisa sem precedentes. No Brasil, a agroindústria da cana-de-açúcar se transforma em uma agroindústria de energia, substituindo combustíveis fósseis e podendo ser, no futuro próximo, uma importante fornecedora de materiais renováveis (plásticos e produtos químicos). Sua participação na matriz energética nacional é crescente e já atinge 15% da energia consumida no País, compreendendo tanto o bioetanol para o transporte quanto o bagaço para geração de energia elétrica, térmica e mecânica. O melhor aproveitamento dos resíduos da cana e a cogeração eficiente podem ampliar significantemente a produção de energia elétrica, e o desenvolvimento de novos processos
para a obtenção de bioetanol, a partir do bagaço e da palha, pode elevar a produção de energia em até 40%, usando a mesma quantidade de cana. A experiência brasileira demonstra, que o bioetanol de cana representa uma possibilidade real para suprir, de maneira confiável, parte do mercado mundial de combustível. Avanços significativos na capacidade nacional e internacional de pesquisa, desenvolvimento e inovação determinarão o sucesso de tal empreendimento. No entanto, é preciso considerar que a inovação é um processo complexo e não se limita exclusivamente à dimensão da pesquisa e desenvolvimento. Esse ponto é muito relevante para as discussões em termos de perspectivas nacionais ou globais em relação à expansão dos biocombustíveis, uma vez que, os processos de inovação pressupõem interação entre os vários atores e segmentos da sociedade que compõem aquilo que se costuma chamar de ambiente de inovação. Isso engloba as universidades e centros de pesquisa e inclui forte e determinantemente as empresas; mas abrange também outros aspectos como marcos regulatórios e regras nacionais e internacionais. Trata-se de um processo de natureza socio-técnico e que precisa ser considerado em suas diversas dimensões para que se desenvolva na intensidade necessária. Historicamente, as conquistas do Brasil em relação à pesquisa em biocombustíveis são evidentes: os ganhos de produtividade em todas as fases de produção, seja agrícola ou industrial, ou em relação a controles ambientais são visíveis. Os custos de produção e distribuição de bioetanol e de bioeletricidade foram reduzidos por avanços tecnológicos e
5 ESCALANDO O MONTE TERAWATT Cylon Gonçalves da Silva
INTRODUÇÃO Neste livro, o leitor encontrará a mais extensa e completa exposição atual sobre os desafios do bioetanol de cana-de-açúcar brasileiro, preparada por especialistas no assunto. Este capítulo é dirigido àqueles leitores que ainda possam estar se perguntando: mas, por que bioetanol de cana-de-açúcar? Primeiro, um esclarecimento sobre o que é o monte Terawatt. Não adianta procurar no Atlas escolar que sobrou em casa dos tempos do segundo grau ou no site Google Earth. O monte Terawatt (conhecido também como TW) não corresponde a nenhum acidente geográfico ou geológico na superfície do nosso planeta. Poderá ser o nome escolhido para batizar alguma montanha em um novo planeta, desses que estão sendo descobertos todos os dias, e para o qual uma pequena parte da Humanidade se transferirá em um futuro ainda indefinido, para reconstruir uma civilização inviabilizada aqui nesta velha rocha. O monte Terawatt consiste, simplesmente, de um trilhão de watts, uma unidade de potência adequada para quantificar o uso humano de energia primária a cada segundo. A humanidade usa, hoje em dia, algo em torno de 15 TW, o que, com 6,6 bilhões de seres humanos, dá um uso médio, per capita de potência, de 2.300 watts ou 2,3 kW – um chuveiro elétrico por ser humano. Nada mais ilusório do que uma média, quando estamos falando de uma distribuição extremamente desigual. O norte-americano, de classe média (igualmente a uma ficção), usa cerca de 10 kW, enquanto que um africano pobre usa algumas dezenas de watts. A importância do monte Terawatt, na civi-
lização contemporânea, decorre de sua altura – a escala de potência de 1 TW escapa a nossa compreensão intuitiva por seu gigantismo – e dos meios empregados para escalá-lo – os combustíveis fósseis, como sabemos, respondem por 80% da geração de potência da humanidade. Não é fácil gerar 1 TW de potência de eletricidade ou de combustível líquido. Um TW de eletricidade equivale a mil centrais eletronucleares convencionais. Portanto, se tomarmos a decisão de, até 2050, substituirmos “apenas” 1 TW de eletricidade produzida pela queima de combustíveis fósseis por eletricidade produzida por centrais nucleares, a fim de reduzir as emissões de CO2, teremos de inaugurar uma nova central termonuclear a cada duas semanas durante 40 anos! Isso, só para descobrir, ao final, que não há combustível suficiente para mantê-las operando! Mais próximo de nós, 1 TW significa 70 usinas de Itaipu. Com o mesmo objetivo de geração para 2050, teríamos de colocar em operação o equivalente a uma nova Itaipu a cada seis meses. Um TW de etanol corresponde a um consumo de 1,4 trilhões de litros por ano (um cubo de 11,2 km de aresta, para quem gosta de pensar em 3D), equivalente a cerca de 65 vezes a produção brasileira em 2008. Para gerar 1 TW de bioetanol em 2050, a produção brasileira teria de crescer a uma taxa média de 11% ao ano, durante 40 anos, isto é, dobrar a cada seis anos e meio. Esse não é um objetivo impossível de atingir, como este livro mostra. Mas, é um enorme desafio. Escalar o monte Terawatt não é fácil. A corrida para consegui-lo, com fontes de energia e potência que sejam neutras ou até negativas em termos de emissões de gases de efeito estufa, como o CO2, está em curso. Muitos acreditam, como
6 QUESTÕES AMBIENTAIS (IMPACTOS LOCAIS E GLOBAIS) E ENERGÉTICOS: A EXPANSÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR E A OCUPAÇÃO DAS TERRAS NO ESTADO DE SÃO PAULO
Evaristo Eduardo de Miranda
INTRODUÇÃO A gestão territorial do agronegócio está na ordem do dia. Os temas científicos, sociais, econômicos e ambientais ligados à expansão da produção do etanol no Estado de São Paulo tocam em questões territoriais. Para a sociedade brasileira e no exterior, essas questões, vinculadas ao uso agrícola das terras, dominam o debate da expansão da agroenergia e da produção de biocombustíveis. Os conhecimentos científicos ainda são insuficientes devido à grande dinâmica espaçotemporal da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo e à diversidade de situações agroecológicas existentes. Entre as questões ligadas à expansão territorial da cana-de-açúcar estão as seguintes: • Quais são os reflexos da dinâmica espaçotemporal da cana-de-açúcar sobre a produção agrícola, em geral, do Estado de São Paulo? • A expansão da cana-de-açúcar induz a uma redução das áreas de produção de alimentos (grãos ou carne), em particular? • Quais os impactos dessa dinâmica da canade-açúcar sobre as áreas com vegetação natural? Favorece ou leva a uma redução? • A mudança do perfil tecnológico dos sistemas de produção da cana-de-açúcar (eliminação das queimadas, gestão inovadora dos resíduos, cogeração de energia elétrica etc.) pode levar à retração das áreas de cana-de-açúcar em determinadas circunstâncias territoriais? Os resultados de algumas pesquisas sobre a dinâmica espaço-temporal do uso e ocupação das ter-
ras no estado de São Paulo têm trazido informações relevantes, mas ainda são insuficientes para abordar todo o alcance temático desse processo e dos impactos decorrentes. Entretanto, não basta focar as pesquisas apenas no monitoramento territorial das áreas de cana-de-açúcar. Os estudos deveriam abordar todos os tipos e categorias de uso e ocupação das terras. Para monitorar o conjunto do uso e ocupação das terras e a sua dinâmica espaço-temporal, com ênfase na cana de açúcar, as pesquisas necessitam empregar e desenvolver ferramentas metodológicas baseadas em sistemas de informações geográficas, sensoriamento remoto e modelagem. Este capítulo, baseado em pesquisas sobre a expansão das áreas de cana-de-açúcar na região nordeste do Estado de São Paulo, fornece indicações sobre os temas, métodos e procedimentos científicos a serem desenvolvidos prioritariamente para atender às demandas de conhecimentos sobre a dinâmica desse processo, capazes de apoiar a gestão territorial da agricultura e dos investimentos em infraestrutura. O texto também aponta para os resultados de pesquisa mais urgentes, que os formuladores de políticas públicas ou privadas necessitam para dar maior sustentabilidade ao ordenamento territorial do Estado de São Paulo devido à expansão da agroenergia.
UM RESUMO HISTÓRICO DA CANA E DO USO DAS TERRAS A cana-de-açúcar ocupando terras agrícolas no Estado de São Paulo não é novidade. O cultivo foi a base do povoamento do Estado e do País pelos portugueses. Em 1532, Martin Afonso de Souza
7 EVOLUÇÃO DO SETOR CANA NO ESTADO DE SÃO PAULO Luiz Carlos Corrêa de Carvalho
INTRODUÇÃO A evolução do canavial paulista nos anos 2000 apresenta um crescimento anual de oferta de produtos nesses oito últimos anos de 10,3%, o que mostra um apreciável investimento setorial. Com relação aos produtos, o açúcar mostrou crescimento anual de 10,3%, o mesmo índice observado para o etanol!! Não se trata de mera coincidência, como se verá nesta análise. Entre os produtos etanol, o anidro (que é aditivo da gasolina) cresceu 4,2% ao ano e o hidratado (combustível de carros) cresceu 16% ao ano. Essa diferença de crescimento está diretamente relacionada à ruptura causada com o lançamento dos carros flexíveis a combustível (etanol/gasolina), em face da fantástica aceitação desse produto no mercado brasileiro. Entre 2005 e 2008 foram 40 novas unidades industriais instaladas no Estado de São Paulo, com foco na produção de etanol hidratado. O mix dos produtos derivados da cana no Estado mostrou variação no período, girando em torno de 50%, com exceção dos anos de 2007 (47%) e 2008 (42%). Os números indicam uma tendência de aumento do mix para etanol, mas algo a ser observado nas próximas safras no Estado de São Paulo, com um potencial período (próximos dois anos) de preços melhores para o açúcar e, muito possivelmente, nova inversão para o etanol, até o mesmo momento em que a sua transformação em commodity global modifique esses ciclos etanol-açúcar. Essa realidade abre importante perspectiva para análises e P&D a serem feitas nos campos sócioeconômicos e agroindustrial, sempre com a ótica da sustentabilidade e da agregação de valor. A expansão em greenfields vem mostrando taxas inter-
nas de retorno desses projetos em São Paulo, entre 13% e 15%, dependendo da competitividade interna dos projetos (produtividade/custos), da tecnologia, manejo e logística. O efeito na cadeia produtiva completa setorial mostra investimentos e expansões antes da produção agroindustrial, na distribuição dos combustíveis, na cogeração de energia elétrica e na cadeia automobilística.
O CANAVIAL PAULISTA Responsável por 69% da moagem de canas da região Centro-Sul, o Estado de São Paulo, para fins da presente análise, foi dividido em seis grandes regiões, como mostra a Figura 1. Para mostrar a evolução do canavial paulista, procurou-se utilizar o índice ATR – Açúcares Totais Recuperáveis, que já representa os produtos finais colocados nos mercados interno e externo, como na Tabela 1. As duas colunas da Tabela 1 indicam o fantástico crescimento do canavial e seus produtos na nova região de expansão da cana-de-açúcar no oeste de São Paulo (Araçatuba), que no prazo de sete anos ampliou o seu peso em São Paulo em 6 pontos percentuais. Por outro lado, as regiões tradicionais de Piracicaba, Ribeirão Preto e Jaú perderam seu peso relativo, Assis se manteve, e apenas Catanduva cresceu de uma forma extraordinária. A cada nova safra, desde 2000, pode-se ter o crescimento efetivo de cada uma das regiões caracterizadas, como no Gráfico 1. É interessante observar a lógica do crescimento dos produtos derivados da cana-de-açúcar no Esta-
8 O PAPEL DOS CENTROS DE PESQUISAS ESTADUAIS DE SÃO PAULO NA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA EM BIOENERGIA Orlando Melo de Castro
INTRODUÇÃO A geração e transferência de conhecimento científico e tecnológico são elementos estratégicos para o desenvolvimento sustentável do agronegócio paulista. O Governo de São Paulo investe, por meio da Apta – Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio, nesse importante instrumento para ampliar a liderança competitiva paulista. São Paulo é líder na produção de bioenergia no Brasil e conta com a maior parte das indústrias de bens de capital para a produção de bioenergia (GOLDEMBERG, 2008). Produz mais de 60% do etanol brasileiro e a bioenergia representa cerca de 30% da matriz energética do Estado. Além disso, • O Estado de São Paulo é responsável por 1/3 do agronegócio brasileiro e por quase 30% das exportações. As vendas externas dos produtos do agronegócio totalizaram US$ 14,47 bilhões em 2008 (Diário Oficial, 2008). • A produção agropecuária do Estado de São Paulo em 2008 esteve próxima de R$ 37,7 bilhões, o que corresponde ao aumento de 11,6% na comparação com 2007, descontado a inflação (IEA, 2009). • A agricultura paulista detém os maiores índices de produtividade: 2,3 vezes maior do que a média nacional. • A maior parte do desenvolvimento tecnológico na área de bioenergia ocorre nas instituições públicas e privadas do Estado. • O treinamento formal em cursos de graduação e pós-graduação em Ciências Agrárias atinge os maiores índices brasileiros, neste Estado.
• Cada R$ 1,00 investido em pesquisa agropecuária pública retornou entre R$ 10,00 e R$ 15,00 em valor da produção agrícola, entre 1960 e 2000. • A bioenergia contribui para a melhoria do ambiente de São Paulo. A legislação ambiental estadual pertinente ao assunto bioenergia é a mais moderna e eficaz entre os estados brasileiros. O agronegócio e a agricultura familiar, em suas dimensões econômica, social e ambiental, caminham juntos em São Paulo, gerando renda e empregos e promovendo o desenvolvimento regional. As políticas públicas paulistas visam atender, por meio da difusão e popularização da ciência, a inclusão das populações carentes e também o aumento da produtividade agropecuária, mantendo a primazia do Estado nas principais cadeias produtivas do agronegócio. A política de ciência, tecnologia e inovação adotadas pela Apta são consonantes com as políticas públicas da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. O desenvolvimento regional é contemplado como determinante para a ampliação da economia paulista. Nesse sentido, a Apta é partícipe da importância que a ciência e a tecnologia representam no processo de desenvolvimento regional. A ciência e a geração de tecnologia são vistas pela Apta como fatores de inclusão social e, consequentemente, as atividades de extensão dos conhecimentos e difusão das tecnologias são consideradas também prioritárias. A capacitação é outra prioridade da Apta. Pretende-se, com a capacitação de agentes, colaborar
9 INSTRUMENTOS DE APOIO À P&D EM ETANOL João Furtado Vanderléia Radaelli
INTRODUÇÃO O álcool brasileiro, recém-convertido a etanol, constitui um desenvolvimento tipicamente brasileiro, mas dificilmente reconhecível nessa condição. Na visão que nós brasileiros temos de nós mesmos, consideramo-nos erráticos, propensos a descontinuidades frequentes, incapazes de perseverar com relação a metas de longo prazo. O etanol, ao lado de casos tão diversos como o café e os aviões, mostra-nos exatamente o contrário. Concebido como um dos vetores da resposta nacional à crise dos preços do petróleo dos anos 1970 (ao lado do programa nuclear e do deslocamento da estratégia de exploração de petróleo pela Petrobras para uma nova condição), o programa persistiu, mesmo que aos trancos e barrancos, por mais de três décadas; e resistiu mesmo quando o preço do petróleo indicava, de forma mais imediata, a sua interrupção. A razão fundamental do sucesso brasileiro na produção de etanol está relacionada precisamente com essa persistência. A trajetória do etanol brasileiro dificilmente poderá ser atribuída a qualquer evento discreto, capaz de determinar o sucesso que hoje se mostra notório. Ela prende-se, essencialmente, ao acúmulo de múltiplas vantagens pontuais, normalmente incrementais, de caráter cumulativo, obtidas em cada uma das etapas, durante três decênios, consecutivamente1. O fato mais marcante 1
Sobre esse ponto, ver o trabalho: Comissão especial de bioenergia do Estado de São Paulo, coordenado por José Goldenberg, sobre o Desenvolvimento da cadeia produtiva industrial para biocombustíveis.
dessa trajetória vitoriosa consiste precisamente na inexistência de nenhum fato marcante. A trajetória expansiva recente parece dar continuidade a essa lógica que foi, até aqui, tão bemsucedida. Mas será ela adequada ao estágio atual? Vitoriosa na constituição de uma capacidade de produção suficiente para o mercado brasileiro, em bases eficientes, serão a indústria e a cadeia como um todo capazes de ingressar de maneira eficaz e segura no estágio que se avizinha, de criação de um mercado internacional com oferta assegurada e padrões de produção consistentes com as práticas requeridas pelos principais países com demanda potencial? Este capítulo relaciona e analisa os principais instrumentos de fomento ao desenvolvimento científico e tecnológico do complexo sucroalcooleiro brasileiro. A perspectiva adotada nesta análise tem exatamente o pano de fundo indicado anteriormente: os instrumentos de política destinados ao fomento científico e tecnológico desta atividade podem ser consistentes para uma trajetória expansiva de natureza incremental, tal como o setor conheceu ao longo dos últimos 30 anos; mas será que eles podem ser considerados adequados às ambições que o Brasil parece ostentar no cenário internacional das energias renováveis, ligadas à produção de biomassa?
INSTRUMENTOS DE INCENTIVO À PESQUISA E DESENVOLVIMENTO Há, hoje, um bem estabelecido consenso com relação à existência, no Brasil, de um conjunto numeroso, diversificado e rico de instrumentos e um
10 MAPEAMENTO TECNOLÓGICO DA CADEIA PRODUTIVA DO ETANOL PROVENIENTE DA CANA-DE-AÇÚCAR SOB ENFOQUE DOS PEDIDOS DE PATENTES: CENÁRIO BRASILEIRO
Eduardo Winter Araken Alves Lima Cristina D´Urso de S. Mendes
INTRODUÇÃO Atualmente, vivencia-se um boom no interesse por biocombustíveis e fontes alternativas de energia, tais como etanol, biodiesel e hidrogênio. A necessidade energética elevou-se consideravelmente em função da crescente demanda por bens de consumo e de transportes, acarretando crescente aumento do uso de fontes fósseis de combustíveis. As grandes potências, hoje, se encontram com grandes dificuldades para suprir suas demandas energéticas, o que tem repercutido numa maior participação dos combustíveis fósseis na matriz energética mundial, cujas consequências têm sido as intempéries ambientais tão intensamente presentes em nossos dias. As preocupações ambientais estão causando grandes transformações em todo o mundo. Empresários e autoridades políticas estão reconhecendo a importância de políticas de sustentabilidade ambiental, o que, em parte, encontra eco nos anseios da sociedade, que vem exigindo políticas e produtos ambientalmente limpos. Em contraposição a essa preocupação, o desenvolvimento sustentável das nações, requer, cada vez mais, formas complementares e/ou alternativas de energia. Tais mudanças criaram um mercado novo e crescente conhecido como mercado de créditos de carbono. Essa tem sido a saída que países industrialmente desenvolvidos encontraram para manter suas atividades produtivas operando sem grandes mudanças. Nesse mercado, as nações negociam com outras menos desenvolvidas cotas de carbono lançadas na atmosfera pela intensa atividade indus-
trial. Essa atividade se desenvolveu de tal modo que hoje é negociada em bolsa de mercadorias e futuros (SCHLITTLER, 2006). A negociação de créditos de carbono já beneficia uma série de empresas no Brasil. São empresas de diversos setores como siderurgia, papel e celulose, saneamento e recursos renováveis, entre outras. Essas empresas estão acessando um mercado que, segundo especialistas, devem movimentar US$ 10 bilhões ao ano, e o Brasil será responsável por 10% dessa quantia (MIGUEZ, 2004). Alguns países, como o Brasil, estão tomando medidas mitigadoras com relação à questão da poluição atmosférica, a exemplo do decreto do Estado de São Paulo que visa acabar, até 2012, com as queimadas nas plantações de cana-de-açúcar (SCHLITTLER, 2006), o que vai exigir o desenvolvimento de tecnologias desde o plantio e colheita da cana para se adequar às novas políticas de cultivo. Na cadeia produtiva do etanol combustível (álcool hidratado), identificam-se como principais etapas o plantio, a colheita e o transporte da cana-deaçúcar, a preparação da cana-de-açúcar, a obtenção do substrato para fermentação, a fermentação e a destilação. Dentro de cada uma, há etapas menores como: melhoramento de plantas, desenvolvimento de praguicidas específicos para a cultura, desenvolvimento de novos micro-organismos e enzimas para os processos de fermentação etc. Dada a importância que o etanol combustível de cana-de-açúcar vem apresentando no atual contexto da discussão energética mundial, realizou-se esse estudo com o propósito de mapear, no Brasil,
11 ALIMENTOS VERSUS COMBUSTÍVEIS: PODEMOS EVITAR O CONFLITO?
Francisco Rosillo-Calle
INTRODUÇÃO Os objetivos deste capítulo são: i) apresentar os principais argumentos e dilemas morais/éticos do presente debate alimentos versus combustíveis; ii) avaliar o papel do setor agrícola e a competição pelo uso da terra; iii) examinar os impactos sobre os preços dos alimentos, subsídios, Gases do Efeitos Estufa – GEEs e balanço energético; iv) delinear as potenciais implicações dos biocombustíveis de segunda geração; v) discutir as questões ligadas à sustentabilidade; e vi) identificar os desafios de Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração – PD&D. Presentemente está ocorrendo um debate sobre os biocombustíveis que tem focado os benefícios socioambientais e competição pelo uso da terra. O debate alimentos versus combustíveis não é, entretanto, novo (ver ROSILLO-CALLE & HALL, 1987), mas tem-se intensificado significativamente em 2007 e 2008, parcialmente devido ao rápido aumento no preço dos alimentos, o qual tem, em grande medida, sido atribuído aos biocombustíveis. Também, existem novas evidências, emersas recentemente, sobre os benefícios globais dos biocombustíveis na redução de GEEs, sobre o qual ainda existe pouco consenso. Além disso, existem visões amplamente diferentes sobre a sustentabilidade presente e futura dos biocombustíveis. Essas incertezas são parcialmente consequência da falta de dados, os quais somente podem ser tratados estudando os desafios de P&D envolvendo todas as implicações dos biocombustíveis. Infelizmente, a mídia tem coberto principalmente os potenciais efeitos negativos, ignorando os
aspectos fundamentais dos biocombustíveis. Uma característica comum desses estudos é de que eles não têm dados científicos de longo prazo que amparem suas teses. A produção de biocombustíveis é complexa devido ao papel-chave da agricultura, os potenciais impactos sobre as mudanças climáticas, aumento da demanda por alimentos, energia, e outros produtos de base biológica, e outras considerações ambientais (ver ROSILLO-CALLE & JOHNSON, 2009). Enquanto os biocombustíveis são amplamente acusados de responsáveis pela elevação dos preços dos alimentos até 2008, a realidade é que existem razões complexas que frequentemente pouco tem a ver com os biocombustíveis. Podemos citar como exemplos: a falta de investimentos na agricultura; objetivos de curto prazos; especulação; injustiça social e pobreza, para mencionar apenas algumas. A competição direta por terra é um mito, ao invés de ser realidade, considerando que mero 1% da área global de terras em uso agrícola no mundo é presentemente dedicado aos biocombustíveis. Há mais de 2 Gha de terras subexploradas, mais de 700 Mha de outro tipo de terras que poderiam ser usadas para finalidades não alimentares sem afetar a produção de alimentos. Como HAZEL & WOOD (2007) colocam “..., mais alimentos são produzidos do que o necessário para alimentar a população do mundo todo e a preços que nunca estiveram tão baixos. O problema fundamental da fome no mundo está relacionado com a distribuição da renda e não com a falta de alimentos”. Por décadas, agricultores têm visto sua renda declinar à medida que os preços das commodities
12 INTEGRANDO COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS PARA A BIORREFINARIA SUCROALCOOLQUÍMICA Vadson Bastos do Carmo Katia Tannous
INTRODUÇÃO A busca de alternativas de matérias-primas de fontes renováveis para substituição do petróleo tem sido uma preocupação mundial. Entre as alternativas conhecidas, o etanol produzido no Brasil a partir da cana-de-açúcar, é a que apresenta a maior competitividade mundial. O setor sucroalcooleiro tem apresentado aumentos sucessivos de demanda e produção devidos, principalmente, a três fatores simultâneos, sendo estes: o aumento do consumo de etanol no mercado interno provocado pela crescente venda de veículos “flex-fuel”; o potencial aumento do mercado externo, devido às preocupações com o aquecimento global levando à utilização de energias renováveis; e o aumento do consumo de açúcar pelo mercado externo, devido à redução de subsídios na União Européia e outros países (CARMO e TANNOUS, 2007). É neste contexto que o Brasil tem liderado a produção de etanol a partir da cana-de-açúcar. A safra de 2008/2009 obteve a produção de 572.738.489 toneladas de cana-de-açúcar (MAPA (a), 2010), gerando 27.681.239 m3 de etanol (18.050.758 m3 de etanol hidratado e 9.630.481 m3 de etanol anidro) (MAPA (b), 2010) e 31.297.612 toneladas de açúcar (MAPA (c), 2010), o que coloca o Brasil nos primeiros lugares do ranking de produção mundial. O etanol de cana-de-açúcar produzido no Brasil apresenta liderança mundial nos custos de produção proporcionando competitividade em relação à gasolina obtida a partir do petróleo. Esta liderança foi alcançada devido às inovações tecnológicas ocorridas na parte agrícola e industrial.
Na parte industrial podemos destacar os avanços incrementais com a otimização dos processos de produção e à integração energética com a co-geração de vapor e energia elétrica, produzidos pelo bagaço da cana–de-açúcar, para o fornecimento aos processos de produção de etanol e açúcar. Além disso, gerar energia excedente para o fornecimento à rede. Pode-se, também, destacar as melhorias na gestão da cadeia produtiva. Porém, estes ganhos estão chegando ao limite, considerando os atuais processos de produção, sendo necessárias inovações de ruptura, que proporcionem um novo patamar tecnológico. A tecnologia de segunda geração tem como propósito a utilização de outras matérias-primas, com custos de produção inferiores. Exemplos destas matérias-primas são: resíduos agrícolas, bagaço de cana-de-açúcar, madeiras e outras fontes de materiais celulósicos. Por isso, deverá ocorrer uma convergência e sinergia entre os processos de produção da refinaria petroquímica convencional e os processos de produção da nova biorrefinaria para obtenção de diversos produtos similares daqueles obtidos através da cadeia petroquímica. Para atender a demanda crescente do mercado, serão necessários novos investimentos no setor, tanto no que se refere ao estímulo a criação de novas tecnologias quanto na criação de novos empreendimentos. Neste sentido, a criação de mecanismos de incentivos e financiamentos aos produtores, fornecedores de equipamentos e processos, novos investidores e instituições de pesquisas, poderá ser um diferencial competitivo para que o país permaneça na liderança desta importante cadeia produtiva.
13 ÁLCOOL COMBUSTÍVEL: CONSOLIDAÇÃO DO MERCADO INTERNO E ESTRATÉGIA PARA CRIAR O MERCADO EXTERNO
Julio Maria M. Borges
INTRODUÇÃO O tema de nosso artigo é relativamente novo, pois só agora, temos razões para discutir mercados globais de álcool em bases rigoramente econômicas e longe de uma proteção ineficaz do Estado. Boa parte de nossas considerações serão baseadas na experiência brasileira recente de produção e uso de álcool combustível, a qual foi iniciada em meados dos anos 1970. Além disso, estamos levando em conta o conhecimento desenvolvido em instituições de pesquisa como o Centro de Tecnologia Copersucar (hoje Centro de Tecnologia Canavieira), Planalsucar (hoje Ridesa – Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro), CTA – Centro Técnico Aeroespacial, IEA – Instituto de Economia Agrícola, Unicamp, USP, Universidade de São Carlos, UFRJ, para citar algumas sem a pretensão de ser abrangente. Finalmente, estaremos nos baseando também em nossa experiência profissional na Job Economia, particularmente no tocante a mercados externos como consultor do BID e Unido.
OS FUNDAMENTOS ECONÔMICOS Todo movimento favorável ao álcool combustível deve-se ao petróleo relativamente caro, atualmente ao redor de US$ 100,00 por barril. Essa condição ocorre a partir de 2004, conforme podemos notar no gráfico seguinte, que se refere a preços semanais do petróleo leve WTI expressos em US$/barril. As quotações referem-se ao primeiro vencimento do mercado de futuros de Nova York.
Quando se considera que: • Brasil, Rússia, Índia e China devam manter um ritmo forte de crescimento econômico e de demanda de energia. • A Opep está disposta a fornecer petróleo a um preço (US$ 100 por barril) que viabiliza novas descobertas de custo relativamente alto, pois sozinha não se candidata a suprir toda a demanda adicional do produto. Podemos esperar uma situação de oferta e demanda global de petróleo e derivados de equilíbrio bem ajustados e portanto preços relativamente altos. Tudo indica que petróleo barato, como aquele dos anos 1980 e 1990, deixará de existir. O Departamento de Energia dos EUA – Energy Information Administration, Annual Energy Outlook – 2007, Washington, DC – que tem-se mostrado conservador em suas previsões de preços, admitia prováveis, em 2007, três cenários para petróleo no período 2005-2030: • preços em queda em relação à situação de 2005 e alcançando US$ 40 por barril nas próximas duas décadas; • um cenário de referência com preços também em queda em relação à 2005 e variando de 50 a 60 US$/barril nas próximas duas décadas; • preços em elevação a partir de 2005, alcançando 100 US$/barril no final do período analisado. O estudo considerou o valor do dólar americano de 2005. Lembrando que o dólar médio de 2005
14 ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR E A INTEGRAÇÃO ENERGÉTICA LATINO-AMERICANA Luiz Augusto Horta Nogueira
INTRODUÇÃO Com a sustentabilidade do bioetanol de canade-açúcar bem caracterizada por seus diferenciais ambientais e sua competitividade econômica, chama a atenção que países da América Latina e do Caribe, salvo exceções, ainda não tenham implementado programas para introdução desse biocombustível em suas matrizes energéticas. Em sua maior parte, esses países são totalmente dependentes de combustíveis importados, cujo suprimento nos últimos anos tem consumido um nível elevado de divisas, como seu pesado custo para toda a sociedade; entretanto, também em sua maior parte, dispõem de uma agroindústria canavieira secular, com bons indicadores de desempenho e perfeitamente em condições de oferecer um combustível nacional, renovável e capaz de compor-se sinergicamente com outros relevantes objetivos, como geração de empregos e dinamização das atividades produtivas. Como um exemplo desses efeitos associados, a geração de bioeletricidade pode ser efetuada em níveis importantes e em muitos casos, reduzindo o uso de combustível empregado em centrais termelétricas. Com efeito, a produção e a utilização de biocombustíveis mostram um grande potencial tanto na América Latina como no Caribe, com possibilidades de atender a múltiplos objetivos, não apenas energéticos. Esse potencial é apresentado em diversos estudos, confirmam que as regiões são uma das mais bem favorecidas para promover essa tecnologia energética. Entre os trabalhos que demonstram tal potencial podem ser citados diversos estudos da Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe – CEPAL, especialmente
no âmbito centro-americano (CEPAL, 2004a; CEPAL, 2004b e CEPAL, 2006). Com um caráter mais abrangente, as revisões dos avanços e as perspectivas para o bioetanol como vetor energético no contexto latino-americano foram apresentadas por Horta Nogueira (2007), pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA (2007) e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID (2007). Nessas notas, se apresenta uma breve revisão dos dois programas de bioetanol efetivamente em implementação na América Latina, além do Brasil, e se estima o potencial de produção por país, a partir da capacidade instalada na agroindústria canavieira e se indica a evolução observada na produção de bioetanol nos últimos anos. São ainda apresentadas e comentadas, as barreiras a considerar para a efetiva implementação desses programas de modo mais amplo, que passa pela cooperação e integração energética na região.
A EXPERIÊNCIA DA COLÔMBIA E COSTA RICA Com o propósito de implementar programas para produção e uso de bioetanol, muitos países da América Latina estão atualmente se movendo para introduzir misturas de bioetanol geralmente de 5% a 10% em volume na gasolina, estabelecendo a base legal e o marco regulatório, sem, entretanto, se observarem alterações muito consistentes no quadro vigente do mercado de combustíveis. Entre as várias iniciativas em curso, dois países podem ser destacados por seus avanços: Colômbia e Costa Rica (HORTA NOGUEIRA, 2007).
15 SISTEMAS AGRÍCOLAS SUSTENTÁVEIS E BIODIVERSIDADE FAUNÍSTICA: O CASO DA CANA-DE-AÇÚCAR EM MANEJO ORGÂNICO E AGROECOLÓGICO
José Roberto Miranda
INTRODUÇÃO A presença da fauna selvagem em áreas agrícolas é um fato ainda pouco estudado. Na busca da conservação de espécies selvagens, a prioridade é dirigida aos estudos da biodiversidade de remanescentes e ecossistemas naturais (florestas, cerrados, matas de galeria etc.), ou mesmo em pesquisas voltadas para a restauração. Pouca atenção tem sido conferida ao efetivo papel dos agroecossistemas na manutenção da biodiversidade animal (GLIESSMAN, 2001). O tipo de manejo empregado nesses sistemas deverá propiciar uma discriminação sobre o povoamento faunístico e provavelmente os que praticam cultivo orgânico associado ao manejo agroecológico devem ter uma biodiversidade ampliada (BEECHER et al., 2002). As populações de espécies vegetais e animais nos agroecossistemas tropicais variam em função do uso e da ocupação das terras, da estabilidade temporal e espacial dos sistemas de produção, da natureza e da repartição espacial dos remanescentes de vegetação natural e da disponibilidade de recursos hídricos (SUÁREZ-SEOANE; OSBORNE; BAUDRY, 2002). A evolução da biodiversidade em áreas agrícolas tropicais brasileiras tem uma dimensão histórica relativamente recente e bem diferente das terras cultivadas em regiões temperadas (MALCOLM, 1997), os conhecimentos científicos sobre as resultantes dos processos de uso e ocupação das terras na riqueza faunística ainda são muito incipientes em nosso País. O Brasil é um dos países com grande potencial de intensificação da agricultura, pois dispõe de muita energia solar, água e culturas capazes de gerar
grandes quantidades de alimentos e combustíveis “limpos”, tais como o biodiesel, o etanol, o carvão vegetal etc. A cana-de-açúcar retira da atmosfera mais de 50 toneladas de carbono por hectare em sua biomassa, produzindo etanol, combustível renovável, que substitui a gasolina e reduz a emissão de carbono na atmosfera. Vários sistemas de produção podem ser adotados no cultivo da cana-de-açúcar com impactos diferenciados sobre o meio físico e biótico (KAHINDI, 1997). O método mais convencional utiliza a queima na pré-colheita, mas cresce o emprego de colheitadeiras mecânicas em cana-deaçúcar crua ou verde. Há sistemas de cultivo orgânico e associados ao manejo agroecológico da propriedade (BACCARO, 1999). Cada um desses sistemas oferece condições ambientais distintas e diferentes possibilidades de colonização e implantação para os povoamentos de fauna selvagem. Por outro lado, o emprego de defensivos químicos pode significar realidades preocupantes em termos de contaminação das cadeias tróficas (ALTIERI, 2002). Pesquisas sobre essa gama de oportunidades e limitações para os animais selvagens podem orientar iniciativas de conservação da biodiversidade. Visando conhecer um pouco desse contexto, a equipe da Embrapa Monitoramento por Satélite monitorou durante vários anos (de 2001 a 2008) a evolução da biodiversidade faunística e os sistemas de produção orgânico em uma propriedade rural com cerca de 7.868 hectares, dos quais aproximadamente 82% são cultivados com cana-de-açúcar na região de Ribeirão Preto, Estado de São Paulo. O mapeamento do uso e ocupação das terras foi realizado em 2003, com base em imagens de satélite, e, após serem analisados, foram arranjados como habitats
16 A NECESSIDADE DE PESQUISA BÁSICA PARA CANA E ETANOL Marco Aurélio Pinheiro Lima Alexandra P. P. Natalense
O Brasil é um país que não tem por tradição criar sua própria agenda tecnológica. Com algumas exceções, entre as quais se pode citar a tecnologia de prospecção de petróleo em águas profundas desenvolvida pela Petrobrás1 e a Missão Espacial Completa Brasileira2, nosso desenvolvimento científico está direcionado a atender às demandas tecnológicas impostas por outros países, em geral, os mais desenvolvidos. Porém, identificar uma meta clara e bem definida a ser alcançada se mostra uma estratégia interessante no que diz respeito ao desenvolvimento científico e tecnológico necessário para alcançar tal missão. De fato, esse desenvolvimento produz inúmeros efeitos em áreas que, à primeira vista, podem parecer totalmente diversas da meta original. Entre inúmeros exemplos, podemos citar o desenvolvimento do termômetro auricular infravermelho, células solares, o aperfeiçoamento de pneus radiais, o desenvolvimento de sensores de incêndio etc. como consequências do programa espacial desenvolvido pela agência espacial americana, a Nasa3. Atualmente, a crescente necessidade de se reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa, como o CO2, tornou-se um desafio mundial. Uma das muitas formas de contribuir para essa tarefa é reduzir a utilização de combustíveis fósseis, substituindo-os por biocombustíveis obtidos de fontes renováveis. Nesse sentido, o Brasil foi o país pioneiro na utilização do etanol como combustível para carros leves com o lançamento do Programa Nacional do Álcool – Proálcool em 1975, e ocupa um lugar de destaque no cenário mundial com o recente desenvolvimento dos motores flex.
O Brasil e os Estados Unidos são hoje os maiores produtores de etanol no mundo, sendo que o etanol brasileiro, produzido hoje a partir do caldo da cana-de-açúcar, possui um balanço energético de 1 para 8, enquanto que, para o etanol americano, retirado do amido do milho, esse balanço equivale a 1 para 1,34. A principal razão para essa vantagem está na matéria-prima: o caldo da cana já contém 20% de açúcar, enquanto o amido de milho passa primeiramente por uma etapa de hidrólise para que o açúcar possa ser produzido e posteriormente fermentado4. Os países produtores de cana-de-açúcar encontram-se entre as latitudes 36,7o norte e 31,0o sul da linha do Equador5. Entre eles, o Brasil é o maior produtor, com 30,2% da área total dedicada ao cultivo da cana no mundo, seguido pela Índia com 20,6% e pela China com 6,0%6. Esses dados, entre outros, mostram que o Brasil tem todas as condições favoráveis para abraçar o ciclo cana-de-açúcar/etanol como uma agenda tecnológica brasileira. Em 2005, o Relatório do Projeto Etanol7, gerado por meio do convênio Nipe – Unicamp/CGEE – MCT, mostrou que o Brasil poderia produzir etanol suficiente para substituir 10% de toda a gasolina consumida no mundo em 2025. Para tanto, seria necessária uma produção de 205 bilhões de litros de etanol por ano. De acordo com o Balanço Energético Nacional – BEN preliminar de 2008 – ano-base 2007, a produção no Brasil foi de cerca de 22,6 bilhões de litros de etanol no ano de 2007. Para que um aumento desse porte na produção de etanol possa ser atingido é preciso investir em ciência e tecnologia em todo o ciclo cana-de-açúcar/etanol, desde a es-
17 A IMPORTÂNCIA DO DIREITO E DAS DISCUSSÕES JURÍDICAS NAS QUESTÕES DE BIOENERGIA Renata Marchetti
A Sociedade e o Direito, este enquanto regra instituída por autoridade competente, sendo lei ou qualquer outra acepção de norma emanada do Estado Democrático de Direito, coercitiva, tutelada, sistematizada em um ordenamento capaz de reger a vida social de um povo, se influenciam mutuamente de forma contínua. A Sociedade é constantemente transformada pelo Direito e, ao mesmo tempo, o Direito é transformado pela Sociedade. Havendo relações entre pessoas e em decorrência, justamente, dessas relações, surge o evento jurídico como norma jurídica, que em última instância poderíamos considerar uma norma social qualificada. Nesse sentido, o Direito é um conjunto de disciplinas ou sistema de normas que exigem e impõem determinadas formas de conduta. São diretrizes, condicionantes do comportamento social, nascidas desse próprio comportamento social. Condicionar aqui significa interferir, influir, fazer com que a ação se dê de uma determinada maneira. Toda vez que se institucionaliza um conjunto de normas ou se faz vigente alguma lei, essa lei ou esse conjunto de normas visa orquestrar a vida em sociedade, interferindo no comportamento das pessoas daquela sociedade. Essa é a realidade em qualquer sociedade organizada, ou dita civilizada, em que temos oportunidade de verificar essa visão concretizada cotidianamente. Exemplos do Direito influenciando a vida social, interferindo e influindo no comportamento das pessoas físicas e jurídicas em sociedade, são ilimitados. Na área da Bionergia tais exemplos são mais raros, mas podemos citar a aprovação das diretrizes finais para o Leilão para a Contratação de Energia de Reserva, específico para Pequenas Centrais Hi-
drelétricas (PCH) e empreendimentos de geração a partir de biomassa e de fonte eólica, aprovadas pelo Ministério de Minas e Energia (MME). A Portaria n. 407, publicada no Diário Oficial da União em 5 de abril de 2010, considerou as Diretrizes dos Leilões de Reserva realizados em 2008 e 2009, aperfaeiçoando-as, para que atendessem ao disposto no artigo 2º da Portaria MME n. 55/2010. No Leilão, serão negociados Contratos de Energia de Reserva (CER) relativos ao produto gerado de fonte eólica e o produto de PCH, com início de suprimento para 1º de setembro de 2013, além de contratos CER para três produtos gerados a partir da biomassa, com início de suprimento nos anos de 2011, 2012 e 2013, no mês de início da entrega de energia elétrica declarado pelo empreendedor na Habilitação Técnica da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), pois considera as especificidades desse tipo de geração energética, por exemplo, o período de safra. Tais diretrizes trazem uma série de outros “comandos” que “orquestrarão” a produção de energia a partir dessas fontes, para os próximos anos. A referida portaria, por exemplo, prorroga o prazo para cadastro e habilitação de projetos para o Leilão para Contratação de Energia de Reserva de 2010, define sua forma e procedimentos, estendem, aos empreendimentos de geração a partir de biomassa e às PCHs, instrumento similar ao facultado aos empreendimentos de fonte eólica. Em 04 de fevereiro, o MME já havia publicado uma outra portaria, que estabelecia a realização de dois leilões de compra de energia elétrica de novos empreendimentos, os chamados de “Leilões A-5 de Energia Nova”.
Parte 2 SUSTENTABILIDADE DA PRODUÇÃO E DO CONSUMO DE BIOCOMBUSTÍVEIS Arnaldo Walter Manoel Regis Lima Verde Leal (organizadores)
1 INTRODUÇÃO Arnaldo Walter Manoel Regis Lima Verde Leal
A sustentabilidade dos biocombustíveis1 tem sido o ponto focal da discussão mais recente sobre sua viabilidade enquanto substitutos dos combustíveis fósseis. Entre as principais justificativas para o emprego dos biocombustíveis em larga escala estão a potencial redução das emissões de gases de efeito estufa – GEE e os também potenciais benefícios socioeconômicos para a população rural2, em que são considerados aspectos como geração de empregos, aumento ou manutenção de sua renda e, em alguns casos, acesso a serviços energéticos3. As polêmicas sobre a produção e o uso de biocombustíveis têm derivado do questionamento sobre sua real contribuição para com a redução das emissões de GEE, dos impactos associados à eventual mudança do uso da terra4, e o mesmo sobre a oferta de alimentos. Esses são os aspectos mais destacados em âmbito internacional. Embora seja impossível qualquer conclusão a respeito, é bastan-
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Considerado todo o seu ciclo de vida, ou seja, desde o início do processo produtivo até seu uso final, nos veículos. 2 Outra importante justificativa é o aumento da segurança de suprimento energético que, para alguns, é a principal razão para o fomento aos biocombustíveis. 3 Em regiões menos desenvolvidas, a produção de biocombustíveis poderia permitir a geração de eletricidade, bombeio d’água, a produção de combustíveis para mecanização agrícola e a movimentação de veículos, por exemplo. 4 Tal questão será analisada em detalhes mais a frente. Os impactos podem ser diretos ou indiretos, e podem ocorrer no balanço de emissões de GEE, sobre a oferta de alimentos, e sobre a biodiversidade.
te provável que tais questionamentos derivem, ao mesmo tempo, de sinceras preocupações, do estágio ainda preliminar do conhecimento, de má informação e, também, de interesses escusos5. Há de se observar, entretanto, dois aspectos. Primeiro, as condições de produção dos biocombustíveis são muito heterogêneas, considerados tantos os diferentes insumos (com distintas produtividades agrícolas, áreas necessárias e usos alternativos) quanto a produção em si (por exemplo, desde a adequação climática em diferentes regiões até a postura e o comprometimento dos produtores). Assim, qualquer generalização é temerária, uma vez que bons e maus exemplos podem ser facilmente identificados. Segundo, há muita expectativa em função das razões apresentadas para a produção e a utilização dos biocombustíveis em larga escala. Consequentemente, para que os biocombustíveis possam ser aceitos como solução adequada, as três condições apresentadas a seguir precisam ser simultaneamente satisfeitas: 1) Que propiciem real contribuição para a redução das emissões de gases de efeito estufa, a custos relativamente baixos. 2) Que não haja danos ambientais significativos, de impacto local ou regional6.
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Por exemplo, da indústria de petróleo e da indústria de alimentos que não têm interesse em enfrentar concorrência e questionamentos em relação a seus produtos e com a matéria-prima utilizada, respectivamente. 6 Ou seja, onde a produção e o consumo ocorrem, ou em regiões próximas.
2 O IMPACTO DO USO DO ETANOL NA QUALIDADE DO AR DAS GRANDES CIDADES Alfred Szwarc
INTRODUÇÃO Há várias décadas, a poluição do ar tem sido um problema sério para os países industrializados, atingindo, mais recentemente, inúmeros países em desenvolvimento. Os efeitos danosos da poluição atmosférica à saúde humana, aos ecossistemas e à economia são bastante conhecidos e estão descritos em centenas de trabalhos científicos. Embora haja diversas fontes importantes de poluentes atmosféricos1, atualmente a principal causa da poluição do ar, em grande parte das aglomerações urbanas, é o consumo intenso de combustíveis fósseis no transporte de passageiros e de cargas. Frotas crescentes de automóveis, picapes, vans, caminhões, ônibus e motociclos são, normalmente, as principais fontes de emissão de poluentes nessas regiões. Uma associação complexa de fatores relacionados aos veículos (idade do veículo e estado de manutenção; características do motor; qualidade e características dos combustíveis etc.) e ao seu uso (perfil, intensidade e fluidez do tráfego; característica das vias; quilômetros rodados etc.) são fatores determinantes na emissão de poluentes e, consequentemente, na qualidade do ar. É comum a ocorrência de altas concentrações de poluentes gerados pelo uso de veículos em áreas urbanas, especialmente em zonas centrais e nas vizinhanças de vias de tráfego intenso; como, em geral, trata-se de localidades com alta densidade demográfica, a população fica exposta aos riscos e 1
Indústria, geração de energia, comércio, construção civil, serviços, transporte aéreo e por embarcações, queima de resíduos, transporte de poluentes de outras regiões etc.
impactos negativos dessa poluição. Esse quadro, por si preocupante, é frequentemente agravado por condições desfavoráveis de dispersão dos poluentes, causadas por efeitos meteorológicos e topográficos e pela influência das edificações urbanas na ventilação local. Monóxido de carbono (CO), compostos orgânicos voláteis (COV)2, óxidos de nitrogênio (NOx), óxidos de enxofre (SOx), material particulado (MP), ozônio troposférico (O3 – oriundo de reações na atmosfera que envolvem, principalmente, COV e NOx em presença de energia solar)3 e metais pesados – como chumbo, níquel, cádmio e manganês – são poluentes frequentemente associados à atividade de transporte. Embora, a intensificação do efeito estufa não seja considerada um problema urbano, a frota de veículos que circula nas regiões urbanas contribui de forma significativa para a ocorrência desse fenômeno. Os principais gases de efeito estufa – GEE emitidos pelos veículos são o dióxido de carbono (CO2)4, o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O), o CO e o O3. Com base em diversas avaliações existentes (AGÊNCIA INTERNACIONAL DE ENERGIA, 2005, e outras), pode-se afirmar que a contribuição do 2
Os COV são também frequentemente denominados hidrocarbonetos (HC). 3 Também conhecidas como reações fotoquímicas. Além do ozônio troposférico (que é gerado na baixa atmosfera, diferentemente da “camada de ozônio”, que ocorre naturalmente na alta atmosfera e atua como escudo da radiação ultravioleta), geram também outros poluentes como aldeídos, ácidos orgânicos etc. 4 O CO2 é considerado o principal GEE.
3 AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A CANA-DE-AÇÚCAR NO ESTADO DE SÃO PAULO Jurandir Zullo Junior Hilton Silveira Pinto Eduardo Delgado Assad Fábio Ricardo Marine Giampaolo Queiroz Pellegrino
O agronegócio foi responsável, em 2007, por 23% do Produto Interno Bruto brasileiro – PIB, sendo que a balança comercial do setor teve um saldo positivo da ordem de 49,7 bilhões de dólares. Os empregos ligados ao agronegócio representaram, aproximadamente, 37% do total de postos de trabalho nacionais. O Brasil é o primeiro produtor mundial de açúcar, álcool, café e suco de laranja; o segundo de soja, carne bovina e frango; o terceiro em frutas e milho; e o quarto em carne suína. É o primeiro exportador de açúcar, álcool, café e soja. Assumiu a liderança mundial de carne bovina e frango em 2003. Vende 82% do suco de laranja, 29% do açúcar, 28% do café em grão, 44% do café solúvel, 38% da soja e 23% do tabaco consumido no planeta. Ocupa o primeiro lugar no mercado mundial de couro curtido e calçados de couro. Pode-se afirmar, a partir desses dados, que o agronegócio brasileiro é fundamental para o País e para várias regiões do mundo devido ao alcance de sua produção. O clima é, sem dúvida, um dos principais fatores determinantes da produção agrícola, devido à variabilidade natural dos vários regimes predominantes no País, ao conhecimento nem sempre suficiente sobre seu comportamento e à dificuldade de previsão. A estiagem que afetou o Rio Grande do Sul em janeiro e fevereiro de 2005, por exemplo, provocou um impacto negativo em toda a economia do Estado e não apenas no setor agrícola. O governo gaúcho estimou uma perda total de R$ 300
milhões no ICMS do ano. De acordo com o IBGE, o Rio Grande do Sul foi o único Estado que acumulou queda na produção industrial do primeiro bimestre de 2005, com retração de 1,6% diante de um aumento de 5,2% na média nacional (BUENO, 2005). A geada severíssima de 18 de julho de 1975 reduziu em 20% o orçamento do Estado do Paraná, com perdas estimadas de 1 bilhão de dólares e 500 milhões de pés de café. Até o início da década de 1990, a agricultura brasileira registrava altas taxas de perdas que limitavam drasticamente o seu desenvolvimento, pois estavam tornando a atividade agrícola economicamente inviável. Segundo GÖEPEFERT et al. (1993), as perdas na safra 1992-1993 foram na ordem de 30% para o arroz e 21% para o feijão, em São Paulo; 37% para o milho e 29% para a soja, na Bahia; 81% para o algodão herbáceo e 32% para a soja irrigada, no Nordeste. Segundo ROSSETI (2001), aproximadamente 90% das perdas na agricultura brasileira registradas até o início da década de 1990 estavam diretamente relacionadas com dois fatores climáticos principais: falta de chuvas na fase crítica das culturas (em 60% das situações) e excesso de chuvas na colheita (em 30% dos casos). Considerando, que grande parte da produção nacional é obtida a partir de plantios conduzidos, principalmente durante os meses de primavera e verão, isto é, de outubro a março, essas perdas estavam diretamente relacionadas ao desconhecimento da distribuição das chuvas pelos
4 ESTOQUES DE CARBONO NO SOLO E FLUXO DE GASES DO EFEITO ESTUFA NO AGROSSISTEMA CANA-DE-AÇÚCAR Carlos C. Cerri Brigitte J. Feigl Marcelo V. Galdos Martial Bernoux Carlos E. P. Cerri
INTRODUÇÃO O Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar do mundo (FAOSTAT, 2007), com uma área aproximada de 7 milhões de hectares e uma produção de 550 milhões de toneladas (safra 2006/2007), que representa um acréscimo de 13% da área cultivada e 16% na produção em relação à safra anterior (UNICA, 2008). Desses 7 milhões de hectares, 3,7 estão localizados no Estado de São Paulo representando 52,8% da área do País e 58% da produção nacional (CONAB, 2008). Estimativas do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA, 2007) indicam aumento significativo na área plantada nos próximos 10 anos, que passará a cobrir uma área de 10,3 milhões de hectares em decorrência da potencialidade de diversos países em utilizarem o etanol como biocombustível, visando adesão às propostas do Protocolo de Quioto, principalmente quanto às questões geopolíticas e ambientais (MACEDO et al., 2008). No sistema de produção da cana-de-açúcar, a queima da biomassa foliar antes da colheita tem sido uma prática comum, que visa facilitar as operações de corte, carregamento e transporte dos colmos. O processo da queima resulta na emissão de gases como CO2, CH4 e N2O, principais responsáveis pelo efeito estufa. Essa prática também libera fuligem, que causa incômodos e possíveis danos à saúde das populações circunvizinhas da lavoura
(CANÇADO et al., 2006). A política pública de proibição da queima e o desenvolvimento de máquinas colhedoras mais eficientes têm proporcionado o crescimento da cana colhida “crua”, ou seja, sem queima, com manutenção da palhada no solo. No Estado de São Paulo, responsável por mais da metade da colheita brasileira de cana-de-açúcar, as usinas e destilarias são obrigadas por lei (Decreto n. 10.547, de 2 de maio de 2000, complementado pelo Decreto n. 11.241, de 19 de setembro de 2002) a abolir progressivamente a queima da cana. Existem projeções de que 80% da área plantada na região centro-sul do Brasil – onde está a maior parte da produção – seja colhida sem queima em 2014 (MACEDO, 2004). O País vem acumulando conhecimento no manejo da cultura da cana-deaçúcar que adota a queima de palhada, porém, por ser relativamente recente, há pouca informação sobre o efeito do manejo sem queima da palhada sobre as características do solo e os demais impactos ambientais (GALDOS, 2007). Estudos recentes têm sinalizado que a manutenção da palhada no solo altera as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo. Diversos autores têm estudado o efeito da palhada na dinâmica do nitrogênio no agrossistema cana-de-açúcar, enfocando aspectos como imobilização do nitrogênio do solo pela microbiota após a adição de resíduos com alta relação C:N, e a disponibilização do nitrogênio contido na palhada para absorção pela plan-
5 GOVERNANÇA DO ETANOL BRASILEIRO: 1
IMPLICAÇÕES PARA A SUSTENTABILIDADE
Thomaz Fronzaglia Renata Martins
INTRODUÇÃO A partir da década de 1990, com a redefinição do papel do Estado e a extinção do Instituto de Açúcar e do Álcool, uma nova dinâmica é estabelecida no sistema de inovação do setor sucroalcooleiro. Recentemente, orientado por uma política pública mais calcada no poder aglutinador do Estado para maior eficiência na alocação de recursos, foram estabelecidas redes de cooperação entre as instituições de pesquisa públicas e empresas privadas, na busca por competitividade e sustentabilidade. A intensificação da discussão sobre a sustentabilidade do etanol é reflexo da expansão recente do setor canavieiro como resposta à introdução dos motores flex que impulsionam a demanda no mercado nacional, além dos cenários promissores para produção de etanol e açúcar, visando ao mercado externo (VEIGA FILHO, et al. 2008). Esse contexto torna premente o monitoramento das tendências e identificação de incertezas críticas, que constituem os elementos essenciais daqueles cenários, para com isso definir as prioridades estratégicas setoriais
e identificar as fraquezas organizacionais e institucionais, que são entraves ao desenvolvimento sustentável do setor, em que as soluções são alcançadas por meio da pesquisa científica e tecnológica. Nesse sentido, a pesquisa em economia aplicada às organizações e às instituições tem papel relevante, uma vez que a discussão sobre a sustentabilidade do etanol permeia diversas dimensões de análise sobre o complexo sucroalcooleiro desde a produção até o consumo, as externalidades, o papel das instituições, dos sistemas de governança e coordenação das transações. Dessa forma, a questão da sustentabilidade justifica a discussão das variáveis ao longo de toda a cadeia de produção do etanol. Os resultados dessa análise devem ser foco na política de investimento em pesquisa para promover a inovação institucional e organizacional do setor2. Este capítulo trata das demandas por pesquisas em ciências sociais aplicadas à sustentabilidade do etanol, portanto, foca-se nas relações entre os agentes da indústria alcooleira e a regulação sobre os efeitos de sua atividade produtiva na sociedade. Apresenta-se uma compilação dos resultados do Workshop sobre Sustentabilidade do Etanol, um
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Os autores agradecem a todos os participantes e colaboradores do Projeto Diretrizes de Políticas Públicas para a Indústria Canavieira do Estado de São Paulo e aos participantes do Workshop sobre Sustentabilidade do Etanol realizado no IEA/Apta em junho de 2007. O conteúdo deste Capítulo é a compilação das diversas contribuições ocorridas no evento, consolidadas por meio da interpretação exclusiva dos autores. Portanto, quaisquer erros de interpretação são de responsabilidade dos autores, não refletindo a opinião das instituições às quais os autores estão vinculados.
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O estudo realizado por meio do foresight de um tema tão amplo não poderia definir problemas para projetos de pesquisa, mas salientar questões dentro de temas importantes sobre a sustentabilidade do etanol, os quais devem ser alvos de política pública, o que inclui a pesquisa e o desenvolvimento. Definir problemas de pesquisa é papel dos pesquisadores na elaboração e submissão de projetos de pesquisa aos editais que deverão ser formulados com base nos temas principais consolidados por meio de exercícios de foresight.
6 ASPECTOS AMBIENTAIS DA CADEIA DO ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR NO ESTADO DE SÃO PAULO Suani Teixeira Coelho Beatriz Acquaro Lora Patrícia Maria Guardabassi
INTRODUÇÃO A necessidade de redução das emissões globais de carbono e redução do uso dos combustíveis fósseis fez os biocombustíveis ganharem destaque no cenário internacional. Em especial, ganha destaque o etanol brasileiro para uso veicular, que possui balanço energético extremamente favorável. A produção de etanol cresceu de 0,6 milhões de metros cúbicos em 1975, no início do Programa Proálcool, para quase 18 milhões de metros cúbicos na safra 2006/2007, com aumento na produtividade agrícola e industrial (GOLDEMBERG et al. 2008). De acordo com COELHO et al. (2005), os subsídios aplicados ao programa brasileiro Proálcool no passado permitiram a expansão do setor e a modernização das tecnologias de produção, tornando a produção economicamente competitiva com custos de produção relativamente baixos. O etanol brasileiro tornou-se competitivo em relação à gasolina nos mercados nacional e internacional. Hoje, o Brasil é o líder mundial na produção de cana-de-açúcar e de seus principais produtos, açúcar e álcool, e experimenta uma nova fase de expansão em função do aumento das demandas interna e externa por álcool combustível, tanto para mistura à gasolina como etanol anidro e utilização nos veículos flexíveis, como etanol hidratado (LORA, 2008). Tal expansão do setor sucroalcooleiro levanta discussões referentes à sustentabilidade ambiental da produção brasileira de cana-de-açúcar e seus produtos. As excessivas exigências ambientais aca-
bam por prejudicar a penetração do álcool brasileiro em novos mercados, o que deve levar os empresários do setor à tomada de medidas de controle mais rigorosas contra os impactos ambientais de suas atividades. Na verdade, o Brasil, produtor eficiente de alimentos e energia de origem vegetal, consegue compatibilizar os dois produtos (energia e alimentos) sem causar impactos ambientais e destruição de biomas, em particular a Amazônia e o Cerrado. Assim, a nova configuração internacional do setor sucroalcooleiro obriga que o País melhore cada vez mais as práticas ambientais em regiões de cultivo tradicionais e que as novas áreas de cultivo sejam adequadas ambientalmente. Neste documento, será discutida a situação atual do Estado de São Paulo quanto à mitigação dos impactos ambientais no setor sucroalcooleiro, uma vez que este Estado é o que apresenta legislação e fiscalização adequadas, mesmo em relação aos padrões internacionais.
ASPECTOS AMBIENTAIS Os impactos ambientais da indústria sucroalcooleira consideram aspectos da cultura da cana, do processamento industrial e do uso final. Incluem os efeitos na qualidade do ar e no clima global, no uso do solo e biodiversidade, na conservação do solo, nos recursos hídricos e o uso de defensivos e fertilizantes. Esses impactos podem ser positivos ou negativos; em alguns casos, a indústria da cana tem
7 O EMPREGO E A RENDA NO SETOR SUCROALCOOLEIRO NO ESTADO DE SÃO PAULO Rodolfo Hoffmann Fabíola Cristina Ribeiro de Oliveira
INTRODUÇÃO Neste capítulo serão analisados o emprego e a distribuição de renda no “setor sucroalcooleiro” ou “agroindústria canavieira”. Para isso, serão utilizados dados estatísticos referentes às pessoas ocupadas na lavoura da cana-de-açúcar, na indústria do açúcar e na indústria do álcool. É óbvio que isso não abrange todos os empregos e rendas afetados pela expansão do setor. Um aspecto importante, por exemplo, é a produção de máquinas agrícolas (especialmente as colheitadeiras de cana) e de equipamento para as usinas de açúcar e a indústria do álcool. Ao analisar a expansão do “setor” delimitado anteriormente, é necessário lembrar que há os “efeitos multiplicadores” associados às mudanças que devem ocorrer tanto a jusante como a montante do setor.
NÚMERO DE PESSOAS OCUPADAS E SEU RENDIMENTO Dados sobre o número, a remuneração e outras características das pessoas ocupadas na lavoura da cana-de-açúcar e nas indústrias de açúcar e álcool podem ser obtidos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Pnad, da Relação Anual de Informações Sociais – Rais do Ministério do Trabalho e Emprego e dos Censos Demográficos. Na Pnad e nos Censos Demográficos trata-se de informação obtida por meio de questionário respondido por pessoas dos domicílios da amostra, ao passo que a Rais é um censo do mercado formal de trabalho baseado em informações fornecidas pelos empregadores.
Com base na Rais de 2005, MORAES (2007a) verifica que o número de empregados, em milhares, é igual a 415 na lavoura de cana-de-açúcar, 440 na indústria do açúcar e 128 na indústria do álcool, totalizando 983 no setor sucroalcooleiro do País, como mostra a Tabela 1. A Tabela 2, mostra o número de pessoas empregadas no setor, de acordo com dados da Pnad de 2005. Há discrepâncias entre as duas fontes de dados, sendo necessários mais estudos para saber qual dessas fontes reflete melhor a realidade. Como as usinas frequentemente produzem açúcar e álcool, a distinção entre empregados na indústria do açúcar e na indústria do álcool é um tanto arbitrária. Mas mesmo que sejam agregados os dados dessas duas indústrias, as diferenças entre as duas fontes (Pnad e Rais) continuam substanciais. Conforme a Rais (Tabela 1), 42% dos empregados do setor no Brasil estão ocupados na lavoura de cana-de-açúcar, ao passo que na Pnad (Tabela 2) essa proporção é 72%. Isso pode estar relacionado com a existência de maior proporção de empregados na lavoura no Nordeste que não são registrados, não sendo captados na Rais. Também há diferenças substanciais entre as duas fontes no que se refere à remuneração média, embora os dados sempre indiquem que a remuneração média na lavoura é mais baixa do que na indústria. De acordo com a Pnad de 2007, o número de empregados no setor sucroalcooleiro no Estado de São Paulo passa a ser 355.042, sendo 194.923 na lavoura de cana, 82.347 na indústria do açúcar e 77.772 na indústria do álcool. A Pnad também registra pessoas ocupadas que não são empregados
8 USO DA ÁGUA NA PRODUÇÃO DE ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR Gilberto de Martino Jannuzzi
INTRODUÇÃO A produção de etanol de cana-de-açúcar no Brasil, tem evoluído nos últimos anos e as expectativas indicam forte tendência de sua expansão nos próximos anos. Isso se explica, em parte, pela observação da volatilidade dos preços do petróleo e também pela necessidade de se estabelecer um mercado, agora internacional, para um combustível líquido renovável para o setor automotivo, e atendimento a metas do Protocolo de Quioto pelos países industrializados. Além da cultura da cana-de-açúcar ser um potencial gerador de energia renovável, contribuindo para a substituição de combustíveis fósseis e desenvolvendo um cenário agroenergético promissor, essa atividade é reconhecida por também ser uma grande transformadora das regiões onde atua. Uma expansão da produção de etanol na escala pretendida pelo Brasil, durante as próximas décadas, deverá ocasionar diversos tipos de impactos, sejam eles diretos ou indiretos. Seus efeitos cumulativos ao longo do tempo, incluindo mais povoamento, introdução de serviços de infraestrutura, comércio e atividades industriais irão conjuntamente exercer pressão sobre recursos locais, entre eles, os recursos hídricos. Esses efeitos devem ser considerados em uma avaliação de sustentabilidade, uma vez que são decorrentes da principal atividade que se está delineando: a produção de etanol. A cana-de-açúcar no Brasil, é principalmente irrigada pela chuva. Dessa maneira, há o menor uso da água para irrigação. Entretanto, o uso da irrigação está aumentando com a crescente demanda pela incorporação de novas áreas de cana no centro-sul
do Brasil. Além da fase de produção agrícola, o processamento industrial é um grande demandante de recursos hídricos. O objetivo do presente capítulo é discutir a atual situação de utilização de água na produção de etanol, os principais desafios atuais e as perspectivas futuras para garantir o menor impacto possível da produção do etanol sobre os recursos hídricos existentes. O capítulo foi organizado em seções baseadas nas apresentações do seminário Uso da água na produção de etanol de cana-de-açúcar1 e que trataram dos seguintes temas: • A sustentabilidade e o uso de água. • A capacidade de suporte, o consórcio de bacias e o licenciamento de novas usinas no Estado de São Paulo. • Novas tecnologias mitigadoras no uso de água na produção de etanol: fase industrial. • Novas tecnologias mitigadoras no uso de água na produção de etanol: a incorporação da palha para redução do estresse hídrico.
A SUSTENTABILIDADE E O USO DE ÁGUA De uma maneira geral, a agricultura é responsável por grande parte da demanda de água doce no mundo, conforme pode ser observado na Tabela 1. Embora a demanda industrial não seja a principal, existe uma tendência recente de seu crescimento nos anos recentes e, consequentemente, mais preocu1
Realizado dia 24 de novembro de 2008, na Faculdade de Engenharia Mecânica, Unicamp. Disponível em: <http:// www.apta.sp.gov.br/cana/>.
9 IMPACTOS DA EVOLUÇÃO DO SETOR SUCROALCOOLEIRO: SUMÁRIO DAS QUESTÕES QUE BALIZARÃO UMA EVOLUÇÃO SUSTENTÁVEL
Alceu de Arruda Veiga Filho Tamás Szmrecsányi Pedro Ramos
INTRODUÇÃO Levantando as questões prementes da evolução do setor sucroalcooleiro O desenvolvimento econômico e social de um país ou de uma região não se processa nem é avaliado apenas em termos quantitativos, mas também e, principalmente, no âmbito qualitativo. Dentro desta última perspectiva, inexiste qualquer razão objetiva para o Estado de São Paulo concentrar mais da metade dos canaviais do País e para as lavouras canavieiras serem as que ocupam, proporcionalmente, o primeiro lugar no total das áreas cultivadas paulistas. Antes, pelo contrário, tudo indica que se trata de distorções e irracionalidades a serem combatidas em nome do progresso técnico, da harmonia e equilíbrio do meio ambiente, de uma desejável desconcentração fundiária, do incremento de uma produção estadual diversificada. Contextualizando, vivemos uma fase de ampliação dos mercados de álcool, interno e externo, a qual levou o Estado de São Paulo a ocupar, conforme dados da safra 2006/2007, 4,8 milhões de ha com a cana-de-açúcar, o que representa ser responsável, em média, por 60% da produção nacional de cana, açúcar e de etanol. Quais são os impactos desse crescimento? Selecionamos as questões referentes à concentração de terras e de renda, à geração de impactos ambientais, às relações de trabalho e relacionados à competição
por outros fatores de produção, e podem gerar impactos, inflacionários ou não, no sistema de preços. Esses problemas não serão resolvidos por meio do livre jogo das forças de mercado, e tampouco são equacionáveis no plano local ou microrregional, exigindo uma intervenção ativa por parte do Governo Estadual e de diversos órgãos do Governo Federal. Iniciando pela questão fundiária, sabemos que a característica principal de instalação de usinas ocorre por meio da incorporação de terras próprias ou arrendadas, para garantir o abastecimento da matéria-prima. No Estado de São Paulo, a área agrícola média de usinas na década de 1970 era de 8 mil ha e, atualmente, está em torno de 12 mil ha, sendo que as áreas dos fornecedores independentes mantêm-se praticamente as mesmas, ao longo desses últimos 30 anos, entre 12 a 45 ha, nas regiões tradicionais de Jaú, Piracicaba e Ribeirão Preto. Ao estudar-se a distribuição das áreas cultivadas próprias de usinas por estrato de tamanho, entre os períodos de 1995/1996 e 2002/2003, verificou-se que a área média própria foi de 31 mil ha em 2002/2003, 9% superior à área de 28,5 mil ha de 1995/1996. Constatou-se, também, redução de 21% nos estratos abaixo de 1.000 ha, com área média caindo de 476 ha para 376 ha (VEIGA FILHO, 2006)1. Essa forma de concentração está ocorrendo nas novas áreas de expansão, na região oeste do Estado, sob a forma de arrendamento e compras de terras. Uma consequência é o rompimento do tecido social e produtivo, com as atividades de menor
10 EMISSÕES DE GASES DE EFEITO ESTUFA RELACIONADAS AO ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR Joaquim E. A. Seabra Isaías C. Macedo Manoel Regis Lima Verde Leal
INTRODUÇÃO Um dos principais objetivos do uso de biocombustíveis é a substituição de combustíveis fósseis, permitindo a diminuição da dependência por recursos não renováveis e a mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEEs). Mas a extensão dessa substituição depende da maneira pela qual o biocombustível é produzido. Como todas as tecnologias de produção envolvem (direta ou indiretamente) o uso de recursos fósseis, o benefício do uso do biocombustível é função de quanta economia de energia não renovável ele proporciona quando comparado ao equivalente fóssil, levando-se ainda em conta as emissões de GEEs associadas ao seu ciclo de vida. No caso do etanol de cana no Brasil, as vantagens ambientais, considerando a substituição de gasolina e a mitigação das emissões de GEEs, já são conhecidas há bastante tempo, desde a divulgação dos primeiros trabalhos amplos sobre o tema (SILVA et al., 1978, MACEDO e NOGUEIRA, 1985; MACEDO, 1992). Desde então, estudos de atualização são publicados (MACEDO, 1998; MACEDO et al., 2004), acompanhando as evoluções do setor e o avanço do conhecimento sobre os aspectos ambientais. O rápido crescimento do setor canavieiro no Brasil na última década, associado às restrições legais e ao desenvolvimento tecnológico vêm alterando parâmetros importantes nesta avaliação. As novas variedades e produtividades de cana, restrições à prática de queima e o aumento da colheita
mecanizada influenciam os balanços de energia e emissões de GEEs de diferentes formas. Adicionalmente, as usinas começaram uma forte ação no sentido de vender eletricidade excedente para a rede pública, e o uso de parte da palha como combustível suplementar ao bagaço deverá ser utilizado nos próximos anos. Por fim, o uso final do etanol tem sido alterado, com o crescimento da frota de carros multicombustíveis. Nas últimas avaliações publicadas (MACEDO et al., 2008, MACEDO e SEABRA, 2008), foram analisados os balanços de energia e emissões de GEEs para a situação atual e as expectativas para 2020, considerando-se os efeitos da adoção de diferentes tecnologias. Os principais resultados destas análises são apresentados neste capítulo, seguidas de um resumo das principais iniciativas internacionais visando à importação do etanol brasileiro. Por fim, uma breve discussão será feita sobre o potencial de mitigação de emissões do etanol no Brasil.
BALANÇO DE ENERGIA E EMISSÕES NO CICLO DE VIDA DO ETANOL Uma análise recente (MACEDO e SEABRA, 2008) apresentou a avaliação do balanço de energia e emissões de GEEs para o setor no cenário atual (2006) e as mudanças esperadas na expansão até 2020, considerando os efeitos da adoção de diferentes tecnologias. Dois cenários foram analisados para o caso futuro: um com base na máxima produção de energia elétrica através de ciclos a vapor
11 NECESSIDADE DE TERRAS PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL NO BRASIL Luís Augusto Barbosa Cortez Manoel Regis Lima Verde Leal André Meloni Nassar Marcelo Ramalho Moreira Sabrina Feldman Miguel Taube Andrés da Silva
INTRODUÇÃO A produção de biocombustíveis depende essencialmente de: energia solar, terra fértil, água, atmosfera (com oxigênio e gás carbônico) além de capital humano e financeiro nas formas de infraestrutura e investimento. De todos os fatores o uso da terra talvez seja o que resume a escassez física mais limitante no planeta. Em recente estudo de Doornbosch and Steenblik (2007) sobre a disponibilidade de terras para bioenergia no mundo (tabela abaixo), fica evidenciado que a disponibilidade de terras aptas para produzir bioenergia estão concentradas em dois continentes, América do Sul e África. Nas terras indicadas como disponíveis estão descontadas as áreas necessárias para futura expansão da agricultura de alimentos, urbanização e infraestrutura, além das áreas com potencial para aproveitamento para agricultura, mas que estão ocupadas por florestas, e uma reserva para pastagens. Os 440 milhões de hectares totais é uma quantidade de terra razoável para atender as demandas futuras de biocombustíveis, desde que sejam selecionadas alternativas de matérias primas de alta produtividade como cana-de-açúcar, dendê e beterraba, como mostrados na Tabela 2 e no texto a seguir. É importante notar que deste total 250 Mha estão loca-
lizados nas Américas do Sul e Central e 180 Mha África, perfazendo 90% do total. Apesar de ter uma grande disponibilidade de terras para a produção de bioenergia a África apresenta problemas sérios de deficiência de infraestrutura, falta de tecnologia e mão de obra qualificada, instabilidade política e social que dificultarão a produção em larga escala de bioenergia no curto e médio prazo. Em outro estudo realizado por Leite et al.(2009) conclui-se que para substituir o equivalente a 10% de toda gasolina a ser consumida no mundo em 2025, estimada em 1,7 trilhões de litros/ano, seriam necessários cerca de 204 bilhões de litros de etanol/ano. Para se produzir esse volume a partir de cana-de-açúcar no Brasil, seriam necessários cerca de 34 milhões de ha, considerando uma produtividade agroindustrial atual de 6 mil litros de litros de etanol/ha. No mesmo estudo foram mapeadas as regiões brasileiras aptas para o cultivo de cana-deaçúcar segundo diferentes níveis de produtividade devido a solo e clima (Figuras 1 e 2). Mesmo excluídas a Amazônia, Pantanal e as áreas com alta declividade, segundo o estudo, existem áreas que podem apresentar: alta produtividade (81,4 t/ha) 7,9 Mha; média produtividade (71,3 t/ha) 113,9 Mha; baixa produtividade (64,8 t/ha) 149,2 Mha, num total de 271,0 Mha. Essa área poderia produzir cerca de 18,6
Parte 3 NOVO MODELO AGRÍCOLA PARA CANA-DE-AÇÚCAR Paulo S. Graziano Magalhães Oscar A. Braunbeck (organizadores)
1 INTRODUÇÃO Paulo S. Graziano Magalhães Oscar A. Braunbeck
A perspectiva de aumento significativo da demanda de etanol combustível requer, sem dúvida, o incremento da produção de matéria-prima em quantidade e qualidade, de forma sustentável. Para atender essa demanda, especialistas têm apresentado a necessidade de expansão da área cultivada de cana-de-açúcar de 7,29 milhões de hectares em 2008, para cerca de 14 milhões de hectares em 2030; essa expansão irá requerer alterações expressivas em todo o sistema produtivo. Dessa forma, a tecnologia de produção agrícola de cana-de-açúcar deve ser aprimorada com enfoque não só no aumento da produtividade, mas principalmente na redução de seus impactos ambientais. Considerando os gargalos atuais da produção agrícola e as metas a serem atingidas, ao longo de 2007 e 2008, foi discutido durante os workshops realizados dentro do projeto Diretrizes de Políticas Públicas para a Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo com o apoio da Fapesp, quais são as expectativas do segmento técnico-científico em termos de P&D&I para construir o novo modelo da produção do ponto de vista agrícola. É esse novo modelo que é apresentado e discutido nesta parte do livro. A parte inicia-se com a discussão apresentada por SOUZA e VAN SLUYS sobre os desafios da genômica e da biotecnologia da cana-de-açúcar. As autoras ressaltam que um dos desafios está na obtenção e liberação de variedades produtivas e adaptadas aos diversos ambientes existentes no Brasil. O melhoramento genético está limitado por barreiras biológicas, que podem ser vencidas com as técnicas de “transgenia”, ou estratégias de melhoramen-
to vegetal, ampliando o potencial dos cultivares já existentes, assim como o desenvolvimento de novos cultivares pela “seleção genômica assistida”. O capítulo apresenta de forma clara, quais são as ações que estão sendo tomadas nesse campo da ciência, os grupos que estão envolvidos e o que está faltando para podermos garantir a pesquisa de ponta em biotecnologia de cana-de-açúcar e capacitar geneticistas e melhoristas do Brasil. No segundo capítulo, SOUZA et al. discutem de forma específica o que foi realizado em termos de melhoramento genético e os avanços obtidos no mapeamento da cana-de-açúcar. Os autores descrevem como ocorrem o melhoramento, suas etapas, a seleção do material, avaliação e ensaios. Explicam o que é o mapeamento genético e quais as estratégias utilizadas para se realizar a construção de mapas genéticos da cana-de-açúcar. A importância dos marcadores moleculares e as limitações existentes no caso da cana são discutidas, e os benefícios de sua utilização no melhoramento genético apontados. O mapeamento de QTLs – Quantitative Trait Loci, que tem sido utilizado para nomear as regiões cromossômicas que contêm genes (ou locos) que controlam os caracteres poligênicos, e os resultados obtidos para a cana-de-açúcar também são apresentados. Nesse novo modelo, uma importante e interessante abordagem é apresentada por LEAL no Capítulo 16 da Parte 4 sobre uma nova cana que passará a ser conhecida como “cana-energia” substituindo parcialmente a cana-de-açúcar. Essa transformação está associada ao fato de que a energia elétrica gerada, a partir da cana passa a ter um papel mais re-
2 GENÔMICA E BIOTECNOLOGIA DA CANA-DE-AÇÚCAR: ESTADO DA ARTE, DESAFIOS E AÇÕES
Glaucia Mendes Souza Marie-Anne Van Sluys
A cana-de-açúcar pertence ao grupo botânico conhecido como complexo Saccharum, foi domesticada pelo homem desde 7.000 a.C. O processo de domesticação foi iniciado na Nova Guiné, e toletes foram levados à Ásia continental. Tanto na China quanto na Índia, eventos independentes de melhoramento ocorreram, o que permite hoje o reconhecimento de duas espécies distintas, S. sinense e S. barberi, respectivamente. Mais recentemente, há um século, as variedades nobres resultantes desse processo de melhoramento foram denominadas de Saccharum officinarum, também conhecidas como Nobel Clones. Há aproximadamente 100 anos, essas variedades foram substituídas progressivamente pelas variedades modernas resultantes de cruzamentos entre espécies do complexo S. officinarum e S. robustum. As variedades modernas ocupam mundialmente as regiões produtoras de cana. Por se tratar de uma planta híbrida (mistura entre espécies), a identificação de marcas genéticas de interesse é muito laboriosa e demorada. São necessários em torno de 15 anos para a obtenção e liberação de uma variedade comercial, sendo que a sobrevida da mesma variedade no campo, produzindo, é de aproximadamente um período equivalente (~15 anos). Esses números permitem constatar a grande limitação imposta ao manejo de cana-deaçúcar pelo tempo de seleção e posterior uso de uma variedade. Em função da necessidade iminente de aumentar a produção de cana-de-açúcar, um novo desafio se apresenta aos programas de melhoramento, que é a obtenção e liberação de variedades produtivas e adaptadas a ambientes brasileiros diversos. Cal-
cula-se, que para suprir a demanda interna e externa, o Brasil deverá dobrar a sua produção nos próximos cinco a sete anos, com um aumento nos investimentos em novas usinas, expansão da área cultivada, melhora no manejo e aumento da produtividade por meio da obtenção de novos cultivares. A expansão da área cultivada deve também considerar a preservação de biomas e da biodiversidade. Em São Paulo, o maior estado produtor do Brasil, o aumento de produtividade poderá ser atingido, por exemplo, pelo uso de cultivares mais ricos em sacarose, não havendo terras livres para a expansão da cultura no Estado. A área de expansão de cultivo iminente é o Planalto Central, com terras sujeitas a estresse hídrico pronunciado. A disponibilidade de cultivares resistentes à seca será necessária para a expansão da cultura de cana-de-açúcar nessa região, viabilizando a utilização de pastagens e diminuindo a pressão da expansão sobre áreas de cerrado e florestas. Produtores do Nordeste também se beneficiariam de cultivares resistentes à seca, que poderiam aumentar significativamente a produtividade da região. O melhoramento genético está limitado por duas barreiras biológicas: a reprodução sexuada, no caso das plantas, a floração e o equilíbrio celular que garantem a sinalização correta entre as partes do organismo e seu funcionamento como um todo. No primeiro caso, as técnicas de transgenia podem ser uma alternativa viável em curto prazo, mas é necessário saber qual gene se pretende que seja modificado ou introduzido. Entre outras estratégias de melhoramento vegetal, vislumbra-se, atualmente, que o entendimento das redes biológicas possa de
3 MELHORAMENTO GENÉTICO E MAPEAMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR Anete Pereira de Souza Antonio Augusto Franco Garcia Karine Miranda Oliveira
INTRODUÇÃO A cana-de-açúcar é uma espécie vegetal de grande importância para a agricultura brasileira e mundial, sendo cultivada principalmente em regiões de clima tropical e subtropical. Seus principais produtos são açúcar e etanol, em que o último apresenta elevado interesse econômico-ambiental, pois trata-se de uma fonte renovável de energia competitiva em relação aos derivados do petróleo (GOLDEMBERG, 2007; FAO, 2008). Segundo DANIELS e ROACH (1987), a cana-deaçúcar é considerada uma espécie alógama, da família Poaceae (Gramíneae), gênero Saccharum, na qual há seis espécies: S. officinarum L. (2n = 80), S. robustum Brandes e Jeswiet ex Grassl (2n = 60-205), S. barberi Jeswiet (2n = 81-124), S. sinense Roxb. (2n = 111-120), S. spontaneum L. (2n = 40-128) e S. edule Hassk. (2n = 60-80). A espécie S. officinarum L. destaca-se das demais devido suas boas propriedades de industrialização e altos teores de sacarose, sendo denominada como ‘cana nobre’ (MATSUOKA et al., 1999a; LANDELL e BRESSIANI, 2008). Contudo, as variedades modernas correspondem a híbridos interespecíficos, de elevada complexidade genética, pois apresentam elevados níveis de ploidia e também aneuploidia (HEINZ e TEW, 1987; MATSUOKA et al., 1999a; LANDELL e BRESSIANI, 2008). Acredita-se, que dentre os genótipos cultivados haja contribuição em proporções variáveis do genoma dessas espécies (MATSUOKA
et al., 1999b). Nesse contexto, considera-se que a cana-de-açúcar é a espécie cultivada de maior complexidade genética (MANNERS et al., 2004). Diversos autores descrevem o melhoramento genético da cana-de-açúcar: (STEVENSON, 1965; BLACKBURN, 1983; BERDING e ROACH, 1987; BERDING e SKINNER, 1987; BREAUX, 1987; HEINZ e TEW, 1987; HOGARTH, 1987; TEW, 1987; MACHADO Jr. et al., 1987; MATSUOKA e ARIZONO, 1987; PEIXOTO, 1986; MATSUOKA, 1988; BRESSIANI, 1993, 2001; ARIZONO, 1994, 1999; PIRES, 1993; LANDELL e ALVAREZ, 1993; MACHADO Jr., 1993; MATSUOKA et al., 1999a, 1999b; CRESTE et al., 2008; LANDELL e BRESSIANI, 2008). O objetivo do presente capítulo é apresentar brevemente as principais etapas de um programa de melhoramento para esta espécie, assim como conceitos de mapeamento genético, isto é, construção de mapas genéticos e mapeamento de QTL’s para cana-deaçúcar, uma vez que esses estudos permitem uma melhor compreensão da arquitetura genética dos caracteres quantitativos, cuja informação poderá ser considerada futuramente aos programas de melhoramento visando torná-los ainda mais eficientes através da seleção assistida por marcadores, ou MAS (MOHAN et al., 1997; MORGANTE e SALAMINI, 2003; CHARCOSSET e MOREAU, 2004; TAKEDA e MATSUOKA, 2008). Maiores detalhes podem ser obtidos na bibliografia citada.
4 A ESTRATÉGIA DE SELEÇÃO REGIONAL NO DESENVOLVIMENTO DE CULTIVARES DE CANA-DE-AÇÚCAR PARA BIOENERGIA Marcos Guimarães de Andrade Landell Silvana Creste Luciana Rossini Pinto Mauro Alexandre Xavier José Antonio Bressiani
A cana-de-açúcar ocupa vasta região no território brasileiro, sendo cultivada entre as latitudes 31o e 5o do hemisfério sul. Essa faixa climática tropical apresenta uma estação hibernal acentuada, com dias mais curtos e mais frios, característica acentuada próximo ao Trópico de Capricórnio, que compreende a região mais tradicional de cana do centro-sul do Brasil. Em grande parte, a região tropical caracteriza-se por verão chuvoso e inverno seco. As áreas mais próximas de latitudes menores são aquelas onde o deficit hídrico é bastante pronunciado, devido à distribuição de chuvas mais concentrada ao longo do ciclo e também pelas temperaturas máximas mais elevadas, que concorrem para uma maior evapotranspiração, afetando o acúmulo de biomassa da cana-de-açúcar. Os principais componentes climáticos que controlam o crescimento, a produção e qualidade da cana são temperatura, luz e umidade disponível (CAMARGO, 2005). No Brasil, a cana-de-açúcar é plantada em solos bastante diversificados, tais como os Latossolos, Argissolos, Nitossolos, Cambissolos, Neossolos, Vertissolos, Plintossolos, Chernossolos etc. Dentro de cada uma dessas classes, há também uma grande variabilidade na potencialidade química, conferindo aos mesmos os caracteres eutróficos, mesotróficos, distróficos, ácricos, mesoálicos e álicos a este universo (PRADO, 2008). As regiões de expansão da canavicultura brasileira são caracterizadas como regiões de cer-
rado, como o oeste e noroeste do Estado de São Paulo, o triângulo mineiro, o leste do Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins, Maranhão e oeste da Bahia. Embora em latitudes diferentes, essas regiões apresentam algumas peculiaridades quando comparadas às regiões tradicionalmente ocupadas pela cultura da cana-de-açúcar, como deficiência hídrica bastante acentuada, e diferenças notáveis quanto ao crescimento vegetativo, florescimento, acúmulo de sacarose e reação a pragas e doenças. Nesse contexto, os programas de melhoramento genéticos de cana-de-açúcar têm adotado estratégias específicas para a obtenção de variedades adaptadas a esses novos ambientes de produção, reorientando os processos de hibridação e seleção e implantando estações experimentais regionais de seleção (LANDELL, 2008). O processo de hibridação (reprodução sexuada) é a principal ferramenta para gerar variabilidade genética em cana-de-açúcar, visando a seleção de indivíduos superiores. Uma população de seedlings de cana-de-açúcar detém essa condição que será tanto maior quanto maior a variabilidade dos genitores envolvidos no processo de hibridação. A caracterização criteriosa do ambiente de produção onde as populações de seedlings são introduzidas permite isolar fatores ambientais importantes, como também possibilitar que genótipos de adaptação regional se destaquem de forma clara. Assim, o mapeamento ambiental das regiões representativas para a cultura da cana
5 IMPORTÂNCIA DO GERMOPLASMA NO DESENVOLVIMENTO DE CULTIVARES DE CANA-DE-AÇÚCAR COM PERFIL AGROENERGÉTICO Silvana Creste, Luciana Rossini Pinto, Mauro Alexandre Xavier Marcos Guimarães de Andrade Landell
INTRODUÇÃO Os programas de melhoramento de cana-deaçúcar possuem um papel fundamental na indústria sucroalcooleira, visto que são responsáveis pelo desenvolvimento de variedades, principal insumo tecnológico para a produção de açúcar e etanol. Nas últimas três décadas, ganhos importantes foram obtidos na agroindústria, decorrentes, principalmente, dos avanços conseguidos no melhoramento genético. Entre seus objetivos, o aumento na concentração de açúcar nos colmos sempre foi um dos principais alvos, visto que a melhoria dessa característica reflete um interesse econômico, uma vez que os custos para colheita, transporte e moagem são mantidos praticamente constantes. No entanto, um novo paradigma para a produção de energia está surgindo, fundamentado na produção de biomassa, visando o uso integral da planta e dissociado da produção de açúcar. A biomassa, definida como toda matéria vegetal produzida biologicamente, representa um importante reservatório de carbono que vem sendo explorado para a produção de energia, principalmente dentro do contexto da sustentabilidade e da utilização de novas fontes de energia renováveis. O conceito de cana-energia proposto por ALBERT-THENET (2003) destaca a diferenciação de variedades de cana-de-açúcar com altos teores de fibras, daquelas produzidas anteriormente para a produção de açúcar e bagaço, conduzindo ao desen-
volvimento de variedades com características favoráveis para a produção de energia. Esse tipo particular de cana-de-açúcar prevê um alto conteúdo de fibra (25%), produtividade de 100 toneladas por hectare por ano, 25% de palha/cana, 12% Pol%Cana, o que proporcionaria algo em torno de 50 toneladas de fibra por hectare/ano. Um aspecto importante no desenvolvimento de variedades de cana-de-açúcar com alta produção de biomassa diz respeito à utilização da energia como função primária para a otimização e seleção de clones e/ou variedades. Nesse contexto, os clones podem ser selecionados em termos de energia primária – EP, isto é, Megajoule por tonelada de cana-de-açúcar (MJ/tc). Esse conceito considera a energia total da cana-de-açúcar, incluindo a fibra, sacarose e açúcares redutores – AR, e é dado pela expressão: MJ/tc = 18 x kg fibra (matéria seca) + 16 x kg sacarose + 15,6 x kg açúcares redutores. Essa expressão pode ser utilizada para otimizar as cultivares de cana-de-açúcar para a máxima produção de energia, ou seja, na seleção da chamada canaenergia (energy cane), uma vez que a cana combustível deve apresentar energia primária de 1.100 MJ/toneladas de cana por ano (REGIS, 2008.). Dentro desse novo conceito, os programas de melhoramento deverão ser redirecionados para concentrar esforços no desenvolvimento de cultivares que atendam a esse novo perfil varietal. Particularmente no Brasil, a demanda crescente por etanol combustível, bem como a necessidade
6 A FOTOSSÍNTESE EM CANA-DE-AÇÚCAR E SUA IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA PARA ENFRENTAR AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS GLOBAIS Amanda P. de Souza Marcos S. Buckeridge
O processo fotossintético consiste em duas etapas acopladas. A primeira etapa, chamada de fase fotoquímica, compreende a captação de luz, transporte de elétrons e formação de NADPH e ATP. Na segunda etapa (fase bioquímica), o gás carbônico atmosférico (CO2) é captado e transformado em compostos que encadeiam átomos de carbono e retém a energia absorvida a partir da luz (BUCKERIDGE et al., 2008). Na fase fotoquímica, a luz incidente nas folhas é capaz de excitar as moléculas de clorofila presentes nos cloroplastos, e estas, por sua vez, transferem a energia absorvida ao longo de uma cadeia transportadora de elétrons, formada de proteínas altamente especializadas. No final desse
processo, são produzidas uma molécula de NADPH e outra de ATP. Essas moléculas, carregadas de energia, são utilizadas na fase bioquímica da fotossíntese. Durante a fase bioquímica, o CO2 que entra nas células do mesofilo da folha, através dos estômatos (Figura 1), é fixado por uma enzima chamada Rubisco (Ribulose 1,5 bisfosfato carboxilase/oxigenase). O processo de fixação do carbono tem início quando o carbono do CO2 é incorporado à molécula de ribulose 1,5 bisfosfato (RuBP), que dá início ao Ciclo de Calvin, formando compostos de 3 carbonos, chamados de ácido 3-fosfoglicérico (3-PGA). A cada dois ácidos 3-fosfoglicéricos formados, uma molécula de açúcar de seis carbonos é sintetizada. Os açú-
Fonte: Débora C. C. Leite.
FIGURA 1
Corte histológico de folha de cana-de-açúcar mostrando a localização dos estômatos, bainha do feixe vascular e do mesofilo.
7 AS ROTAS PARA O ETANOL CELULÓSICO NO BRASIL Marcos S. Buckeridge Wanderley D. dos Santos Amanda P. de Souza
INTRODUÇÃO As mudanças climáticas e a elevação nos custos do petróleo aliadas às necessidades estratégicas de produção de energia têm motivado uma corrida sem precedentes à produção de combustíveis alternativos, preferencialmente de fontes renováveis. Nesse cenário, o Brasil desponta como o país com as tecnologias e políticas mais avançadas do mundo devido à pioneira utilização do etanol obtido a partir da cana-de-açúcar como combustível, desde a década de 1970. Hoje, o Estado de São Paulo é o maior produtor de etanol no Brasil sendo, portanto, o segundo maior produtor depois dos EUA com 1/4 da produção mundial de etanol. Além da tradição, variedades altamente selecionadas, processos industriais sofisticados, clima e disponibilidade de terras agricultáveis garantem ao Brasil uma liderança confortável na tecnologia da produção de etanol. Entretanto, para preservar essa posição num cenário competitivo, o Brasil precisa manter investimentos compatíveis na geração de novas tecnologias e formação de competências. Atualmente, a conversão de material lignocelulósico ou biomassa em açúcares fermentáveis para a produção de etanol vem sendo considerada como uma alternativa promissora para aumentar a produção necessária para atender à demanda mundial. A celulose, principal componente da biomassa, é o polímero mais abundante da Terra. Ela é formada por uma cadeia linear de moléculas de glicose ligadas entre si na posição beta (β) –1,4. Tais ligações
guardam energia livre e podem ser quebradas para liberar açúcares fermentáveis. Entretanto, a celulose é muito bem protegida pelas plantas, a fim de que não sejam facilmente utilizadas por predadores. Por esse motivo, o rendimento líquido da conversão da celulose em glicose livre e, a seguir, em etanol é desfavorável, com as tecnologias disponíveis. Tornar os rendimentos favoráveis possibilitará o melhor aproveitamento dessa rica matéria-prima natural encontrada não só no bagaço da cana, mas em quaisquer outras fontes de biomassa vegetal (madeira, serragem, palhada, cascas etc.), atualmente desperdiçadas ou utilizadas de formas menos nobres. O desenvolvimento de tecnologias capazes de desmontar a parede celular vegetal requer o aprofundamento do nosso conhecimento sobre a fisiologia e estrutura da parede celular, tanto da própria cana-de-açúcar como de outros sistemas. Além disso, o estudo de processos enzimáticos de micro-organismos que naturalmente já se alimentam da parede celular e, portanto, já possuem enzimas específicas para tal finalidade, pode nos auxiliar na utilização da energia disponível nesses polissacarídeos.
PERSPECTIVAS NA PRODUÇÃO DE ETANOL CELULÓSICO A produção de etanol, a partir da cana-de-açúcar ocorre, atualmente, pela fermentação alcoólica da sacarose. Diante das perspectivas de se obter o etanol celulósico, o etanol obtido da sacarose, assim como o obtido a partir do amido de milho, nos EUA,
8 MANUTENÇÃO DA FERTILIDADE E RECUPERAÇÃO DOS SOLOS NA CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR Raffaella Rossetto Fábio Luis Ferreira Dias André César Vitti Heitor Cantarella
INTRODUÇÃO A busca pela qualidade de vida das gerações atuais e das futuras é o ponto central que sustenta as atividades humanas. A agricultura do século XXI, não pode mais estar dissociada dos princípios da sustentabilidade, em que o desenvolvimento econômico necessariamente deve estar aliado ao desenvolvimento social e à conservação do ambiente. A atividade canavieira, reconhecida como degradadora e poluidora do ambiente no passado, após sensíveis mudanças, caminha rumo à sustentabilidade. O solo é considerado patrimônio de uma nação. É um recurso limitado e está em constante modificação. Nesse sentido, é preponderante que seja entendido como algo a ser preservado para as futuras gerações. Existem diversas definições de “solo”. O Sistema Brasileiro de Classificação de Solos/Embrapa conceitua o solo como: “uma coleção de corpos naturais, constituídos por partes sólidas, líquidas e gasosas, tridimensionais, dinâmicos, formados por materiais minerais e orgânicos que ocupam a maior parte do manto superficial das extensões continentais do nosso planeta, contém matéria viva e podem ser vegetados na natureza onde ocorrem e, eventualmente, terem sido modificados por interferências antrópicas”. Verificam-se importantes conceitos nessa definição: a existência da matéria viva como componente do solo; a tridimensionalidade, ou seja, o solo não é apenas a superfície terrestre que se visualiza, mas tem dimensões em profundidade; e o
fato de que o solo pode ter sofrido interferências antrópicas, ou seja, pode ter sido alterado pela agricultura ou outra atividade humana.
IMPACTOS DA ATIVIDADE CANAVIEIRA SOBRE O SOLO Operações agrícolas tradicionais e consequências Desde as antigas civilizações até os dias de hoje, a agricultura se inicia, a partir das operações para o preparo do solo, onde as camadas são revolvidas para o controle de plantas daninhas e a quebra da compactação, melhorando as condições físicas para o crescimento das raízes e o armazenamento da água. O preparo do solo também visa incorporar corretivos como calcário ou gesso ou fertilizantes orgânicos e, assim, preparar a base para a boa produtividade das culturas. Ocorre que as operações de aração e gradagem do solo envolvem a oxigenação e, com isso, o incentivo ao desenvolvimento de muitas comunidades microbianas e de pequenos animais que participam da degradação da matéria orgânica presente no solo. Os organismos utilizam a matéria orgânica como fonte de C e de outros nutrientes, decompondo-a, e como parte de seu metabolismo de respiração, eliminando CO2 para a atmosfera. Por essa razão, a conversão de uma área de mata natural para uma área agrícola, seja ela de que
9 FERTILIZANTES PARA A CANA-DE-AÇÚCAR* Heitor Cantarella Raffaella Rossetto
INTRODUÇÃO A cana-de-açúcar é uma cultura com alta produção vegetal e, portanto, com grande demanda por nutrientes, uma vez que os nutrientes minerais constituem cerca de 3% a 5% da matéria seca dos vegetais. Em lavouras representativas das condições médias do Brasil, a cana-de-açúcar produz de 25 a 40 t ha-1 de matéria seca, dos quais entre 60% e 70% são removidos do campo na forma de colmo. Assim, a adubação dessa cultura deve levar em conta que grandes quantidades de nutrientes são exportadas com as partes colhidas. Informações compiladas por vários autores indicam que a parte aérea da cana-de-açúcar contém as seguintes quantidades de nutrientes para cada 100 t de colmos produzidos: N, 100 a 154 kg, P2O5, 15 a 25 kg, K2O, 77 a 232 kg e S, 14 a 49 kg (RAIJ et al., 1997; FRANCO et al., 2008a; MOURA FILHO et al., 2008; ROSSETTO et al., 2008a). A cana-de-açúcar é a terceira cultura maior consumidora de fertilizantes no Brasil, depois da soja e do milho. Em 2007/2008, para o cultivo de aproximadamente 8,3 x 106 hectares de cana-de-açúcar foram utilizados cerca de 3,4 x 106 t de adubo NPK, o que representa 13,8% do consumo brasileiro (ANDA, 2007). Porém, considerando-se a quantidade de material vegetal produzido (produtividade média de 81 t ha-1 de colmos) e o longo ciclo de crescimento, a cana-de-açúcar recebe quantidades relativamente pequenas de fertilizantes – em média 408 kg ha-1 de NPK (ANDA, 2007). As doses de nutrientes recomendadas para a cana-de-açúcar no Brasil, especialmente as de nitrogênio, são, em geral, inferiores às utilizadas em vários outros países produtores com
produtividades semelhantes (HARTEMINK, 2008). A contribuição da fixação biológica de N (FBN) é, uma das possíveis razões, para o uso de menores quantidades de N em cana-de-açúcar no Brasil. Importante também para o uso racional de fertilizantes é a reciclagem de nutrientes, comum na agroindústria canavieira, por meio do retorno aos campos de resíduos sólidos e líquidos, tais como torta de filtro, cinzas, palha e, especialmente, vinhaça. Há uma vasta experiência acumulada em adubação e nutrição da cana-de-açúcar para as condições de solo das tradicionais áreas produtoras no Brasil, resultantes de estudos realizados por vários centros de pesquisa. Revisões recentes sobre o assunto incluem os trabalhos de CANTARELLA et al. (2007), KORNDÖRFER (2008), MELLIS et al. (2008), QUAGGIO (2008), ROSSETTO et al. (2008a, b, c, d) e VITTI et al. (2008a, b). O presente texto tem o objetivo de destacar alguns aspectos relacionados à adubação da cana-de-açúcar, em que pesquisas adicionais são necessárias para enfrentar os desafios de aumentar a competitividade da indústria canavieira para a produção de biocombustíveis.
CALAGEM E GESSAGEM Os solos brasileiros são, em geral, ácidos, condição essa desfavorável ao crescimento das raízes por aumentar a disponibilidade de alumínio e reduzir a de vários nutrientes. O calcário é utilizado na agricultura para corrigir a acidez do solo e fornecer cálcio e magnésio, essenciais para os vegetais. As recomendações * Coletânea do Projeto PPP Etanol.
10 UTILIZAÇÃO AGRÍCOLA DA VINHAÇA Miguel Angelo Mutton Raffaella Rossetto Márcia Justino Rossini Mutton
INTRODUÇÃO A vinhaça, vinhoto, restilo ou garapão é um resíduo líquido proveniente da destilação do vinho, produto da fermentação alcoólica do caldo de cana, do melaço ou da mistura de caldo e melaço, para a obtenção do álcool. Caracteriza-se por alta demanda bioquímica de oxigênio (DBO), apresenta em sua constituição vários elementos químicos que foram absorvidos pela cana, provenientes do solo. Entre eles, a vinhaça é rica em potássio e enxofre e apresenta quantidades consideráveis de fósforo, nitrogênio, cálcio, magnésio, além dos micronutrientes. Para cada litro de álcool produzido são gerados entre 10 e 15 litros de vinhaça. Devido ao seu alto poder poluidor, sua eliminação era um problema para as indústrias. A preocupação quanto aos impactos provocados no ambiente é antiga. Existem relatos da grande mortandade de peixes quando a vinhaça era descartada diretamente nos rios, nos anos 1950. Pela natureza orgânica e pela ausência de contaminantes, metais ou outros compostos indesejáveis, surgiu a ideia de aplicá-la no solo, mas, por apresentar pH muito ácido, sugeria cautela. Os primeiros estudos para a aplicação da vinhaça nos solos foram realizados pela equipe do Professor Jaime Rocha de Almeida, na década de 1950, na Esalq/USP, em Piracicaba – SP. Mas, a preocupação quanto aos impactos ambientais e a contínua morte de peixes, como consequência da disposição da vinhaça nos rios, resultou no DecretoLei n. 303, de 28 de fevereiro de 1967, que proibiu
definitivamente a liberação desse resíduo nos rios, lagos e cursos de água. Com a publicação desse Decreto, a primeira solução encontrada foi a aplicação da vinhaça nas chamadas áreas de sacrifício, áreas muito próximas às destilarias que sofriam a deposição de grandes quantidades desse resíduo, ano após ano. Essas áreas ficavam praticamente inutilizadas para a agricultura, principalmente pelo efeito de salinidade do solo, tornando-o improdutivo e de difícil remediação. Com o advento do Proalcool, e consequente expansão da indústria alcooleira do País, ocorreu aumento significativo da produção de álcool, e também da geração de vinhaça, o que na safra de 2008/2009 atingiu cerca de 350 bilhões de litros de vinhaça. A Figura 1 apresenta a evolução da produção de etanol e da geração da vinhaça ao longo dos anos. Atualmente, a aplicação da vinhaça no canavial, como a fertirrigação, é prática muito difundida entre as usinas e destilarias brasileiras. Entretanto, a tecnologia de uso agrícola da vinhaça no cultivo da cana, como fonte fertilizante, foi praticamente desenvolvida no Brasil, por não existir outro país com geração tão grande desse tipo de resíduo. De modo geral, o uso da vinhaça promove melhorias na produtividade agrícola da cana, benefícios químicos, biológicos e físicos ao solo, além de gerar economia com a aquisição de fertilizantes. Entretanto, se aplicada em excesso, pode causar sérias alterações na qualidade da matéria-prima para a indústria, como a diminuição da qualidade tecnológica do caldo.
11 CONTROLE BIOLÓGICO DE PRAGAS COMO UM COMPONENTE-CHAVE PARA A PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL DA CANA-DE-AÇÚCAR José Roberto Postali Parra Paulo Sérgio Machado Botelho Alexandre de Sene Pinto
INTRODUÇÃO A despeito do Brasil ocupar a liderança mundial na produção de açúcar e álcool, com uma produção em 2008/2009 de 31,3 milhões de toneladas de açúcar e 27,7 milhões de metros cúbicos de etanol (MAPA, 2009), esses valores poderiam ser ainda maiores se não fossem os insetos-praga a atacarem as diferentes estruturas da cana-de-açúcar, incluindo toletes, raízes, colo, colmo e folhas, causando significativas reduções na produtividade. São diversas as pragas da referida cultura descritas em livros-textos (GUAGLIUMI, 1972/1973; MENDONÇA, 1996), sendo que em GALLO et al. (2002) são referidas 24 espécies como as mais importantes no Brasil. É interessante salientar que, embora existam peculiaridades regionais, as principais pragas da cultura são controladas com alternativas biológicas, por meio de insetos ou patógenos (ALVES, 2008; PARRA et al., 2002). Portanto, é a cana-de-açúcar umas das poucas culturas no Brasil em que, desde a década de 1970, pensa-se na sua sustentabilidade (GALLO, 1980). Dessa forma, utiliza-se intensamente o controle biológico (CB) para controlar as pragas principais, ou seja, a broca-da-cana, Diatraea saccharalis, principalmente no sudeste do País e a cigarrinhadas-folhas, Mahanarva posticata, na região nordeste do Brasil. No caso da broca-da-cana, utiliza-se Cotesia flavipes, um parasitoide importado e que
hoje é liberado em cerca de 1.700.000 ha., num programa de CB difícil de ser superado em todo o mundo, pela sua eficiência e pela extensão coberta (PARRA, 2008) em relação a outros países (POTTING, 1996). De forma semelhante, o controle biológico vem sendo utilizado para o controle das cigarrinhas da cana-de-açúcar há muito tempo para M. posticata, a cigarrinha-das-folhas, no nordeste do País; e, hoje, em cerca de um milhão de hectares, aplica-se Metarhizium anisopliae, o fungo verde, utilizado para o controle da cigarrinha-das-raízes, M. fimbriolata, problema recente para a cana-de-açúcar na região Sudeste (ALVES, 2008). Assim, com as perspectivas de duplicação da área da cana-de-açúcar, num curto espaço de tempo, existe uma preocupação de que, com a abertura de novas áreas, não se respeite a produção sustentável da cultura e que sejam aplicados indiscriminadamente produtos químicos (especialmente em pulverizações na parte aérea), que poderão provocar desequilíbrios desastrosos, aparecendo, então, “novas” pragas e dificultando a manutenção das medidas adotadas há quase meio século. Assim, o objetivo do presente texto é mostrar as perspectivas de utilização de CB na cultura para o combate das principais pragas em direção a uma agricultura moderna; e o que deve ser feito, em termos de pesquisa, para que as medidas alternativas de controle sejam realmente um componente-chave para a produção sustentável da cana-de-açúcar.
12 AVALIAÇÃO TECNOLÓGICA DA MECANIZAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR Oscar A. Braunbeck Paulo S. Graziano Magalhães
As expectativas da expansão da área cultivada de cana-de-açúcar, de 7,2 milhões de hectares em 2008 para cerca de 14 milhões de hectares em 2030, irá requerer alterações significativas em todo o sistema de mecanização atualmente empregado para colocar a atividade em níveis menos vulneráveis de sustentabilidade. A cana-de-açúcar é uma cultura semiperene cujo processo de produção prevê uma colheita ao ano, produzindo em média 81 ton.ha-1-ano (CONAB, 2008). Desse total, aproximadamente 1,4 milhões de hectares são replantados a cada ano, sendo que em apenas 30% deles é utilizado o plantio mecanizado, e no restante da área é utilizado o plantio semimecanizado. O método totalmente manual está restrito a áreas pouco significativas de alta declividade, existentes predominantemente na região Nordeste. A cana-de-açúcar é plantada geralmente no período de chuvas, entre novembro e março, para ser colhida apenas na safra seguinte, ocasionando ao sistema produtivo déficit de um ano. Durante o período entre a colheita do último ciclo e o plantio da nova cana, muitas usinas executam rotação de culturas com leguminosas. A colheita de cana-deaçúcar foi tradicionalmente feita manualmente, mas sofreu rápida mudança para colheita mecânica na última década, principalmente em função da legislação que restringe o uso da queima. O aumento da produção de etanol certamente passa por dois processos: o agrícola e o industrial, de modo a viabilizar o aproveitamento integral da cana-de-açúcar. Segundo DOURADO NETO (2007) o modelo atual de produção precisa ser reformulado para que a produtividade aumente, de forma sustentável do ponto de vista econômico, social e
ambiental, sendo necessário definir estratégias de manejo para um melhor aproveitamento dos recursos. Dessa forma, a tecnologia de produção agrícola deve ser aprimorada com enfoque não só no aumento da produtividade e da redução na demanda de áreas, mas principalmente na redução de seus impactos ambientais para a qual a mecanização tem contribuição significativa a fazer.
MECANIZAÇÃO Considerando a mecanização como um equipamento ou conjunto deles, que substitui ou auxilia o trabalho manual e animal, pode-se dizer que ela é necessária na maioria das fases do ciclo de produção da cana-de-açúcar, desde a radicação da cultura até a entrega da matéria-prima na balança da indústria. A mecanização auxilia na geração das condições que a planta demanda para se desenvolver de forma competitiva e sustentável, desde o condicionamento físico do solo, sua fertilidade, o controle de sua umidade, a movimentação e aplicação de mudas, adubos e agroquímicos, assim como para o controle de pragas e o controle da maturação na colheita. A mecanização é particularmente importante nas operações de colheita e transporte da produção do campo até a unidade industrial, como consequência da elevada quantidade de massa a ser manuseada. A mecanização predominante atualmente corresponde à agricultura de cereais. Os cereais dominam o mercado de equipamentos em função de sua área de produção ser muito superior à da canade-açúcar. O modelo de mecanização dos cereais, com mais de um século de evolução, foi estendido
13 COLHEITA DE CANA-DE-AÇÚCAR E PALHA PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL Paulo S. Graziano Magalhães Oscar A. Braunbeck
INTRODUÇÃO Hoje, o Brasil se defronta com a perspectiva de aumento significativo da demanda de álcool combustível. Essa previsão se sustenta em três realidades de mercado: aumento interno do consumo de álcool hidratado pelo sucesso da introdução da alternativa flexfuel no mercado de veículos automotivos leves; expansão das exportações brasileiras de álcool em função do crescente interesse mundial pela mistura do álcool à gasolina, tendo em vista os altos preços que ocorrem também em função da alta demanda em relação à oferta; e opção brasileira pela produção do biodiesel, utilizando etanol na transesterificação dos óleos vegetais. Uma visão realista projeta a necessidade de dobrar a produção de álcool brasileiro nos próximos 5 a 10 anos. Esse importante salto de produção que começa a se tornar realidade por meio da implantação de novas usinas, abrindo novas fronteiras para a cana-de-açúcar, exigirá, paralelamente, um esforço concentrado na busca de aumento significativo na produtividade alcançada em litros de álcool produzidos por hectare-ano de cana-de-açúcar plantada. Esse aumento poderá ser alcançado por meio de duas rotas tecnológicas. A primeira rota tem seu foco voltado para a área agrícola e buscará, por meio da ampliação do atual programa de introdução de novas variedades de cana-de-açúcar e, futuramente, pelo emprego da cana-de-açúcar transgênica, estender e, se possível, potencializar o atual nível de aumento de produtividade em toneladas de cana/hectareano, que gira em torno de 2,5% ao ano. A segunda rota, focada no setor industrial, buscará desenvolver
tecnologias que permitam o aproveitamento integral da cana-de-açúcar na produção de etanol ou outros combustíveis renováveis ou mesmo, por meio do conceito de biorrefinaria, agregar valor à cadeia da cana, pela produção de novos produtos. No novo paradigma da “cana-energia”, coletar-se-ia a cana-de-açúcar integral (otimização do processo de colheita), além de se otimizar o balanço energético da usina, de forma a aumentar a quantidade de biomassa excedente. Nesse contexto, a tecnologia de colheita de cana-de-açúcar picada, atualmente disponível, não utiliza o palhiço, que é queimado ou deixado no solo, dependendo do sistema de colheita empregado (crua ou queimada). Um dos principais desafios para viabilizar a utilização desse material é o desenvolvimento de um sistema mecanizado de colheita que contemple a recuperação do palhiço, pelo menos parcialmente, com custo e qualidade que viabilizem seu aproveitamento energético. Os processos testados atualmente para a recuperação do palhiço envolvem a secagem natural ao sol seguida de “rastelamento” ou “enleiramento” e enfardamento ou picagem. O processo de “enleiramento” é responsável pelo elevado teor de terra do palhiço recuperado, o qual varia entre 5% e 10%. O custo da recuperação do palhiço supera os 20 R$/ton. Além disso, o sistema de colheita mecanizado atualmente disponível no mercado mundial não contempla a colheita em áreas com declividades superiores a 12%, não é viável de ser utilizado em pequenas glebas e não se justifica economicamente para agricultores que produzem menos de 100 mil toneladas/ano.
14 INSTRUMENTAÇÃO E AUTOMAÇÃO NA CADEIA CANA-ETANOL: ALGUMAS OPORTUNIDADES NO MANEJO AGRÍCOLA
Ricardo Yassushi Inamasu Ladislau Martin-Neto
AGRICULTURA DE PRECISÃO Aspectos gerais A agricultura é um sistema produtivo muito complexo quando se inclui produção de sistema vivo em um meio vivo, interagindo com o ambiente e a sociedade. É fundamental, que exista capacidade e tecnologia para um planejamento eficaz, gestão e funcionamento de todos os aspectos da agricultura. A viabilidade e a sustentabilidade da cadeia dependem da eficiência de todo o sistema. A mecanização tem participado como ferramenta essencial no processo de expansão e produção de maior escala. Na cultura canavieira, devido às características próprias e também à inexistência de soluções a serem importadas, observa-se um empenho excepcional do setor no País para adaptar e implementar inovações às operações por meio de máquinas, tanto para o plantio como para a colheita. A Agricultura de Precisão – AP foi considerada um passo à frente e até um refinamento do processo convencional. A primeira fase da AP trouxe foco em máquinas dotadas de receptores GPS – Global Positioning System e mapas de produtividade. Atualmente, o mundo avançou no tema para além da cultura de grão. O conceito pode ser aplicado em culturas nas quais a variabilidade espacial esteja presente. Gerenciar a variabilidade espacial e maximizar retorno econômico minimizando efeito ao meio ambiente é o objetivo da AP; portanto, pode ser considerada como uma estratégia de gestão que utiliza as tecnologias da informação para trazer os
dados de múltiplas fontes e apoiar as decisões relacionadas com a produção vegetal. A aplicação da Agricultura de Precisão é fundamentada em três passos: leitura, interpretação e atuação, fechando-se em ciclo. A leitura caracteriza-se pela indexação do parâmetro de interesse numa posição geográfica, ou seja, os dados possuem parâmetros adicionais, como coordenada geográfica (latitude e longitude), além de outras informações como histórico (tempo). Os dados, tendo indexação geográfica, permitem que sejam interpretados e analisados por meio de mapas e apoiados por ferramentas geoestatísticas. O estudo da dependência espacial das informações e correlações com outros parâmetros requerem mapas temáticos e uma quantidade massiva de dados fazendo ferramentas de Sistema de Informação Geográfica – SIG serem compostos ao arsenal integrado à Tecnologia de Informação – TI. Os primeiros dados que impressionaram a todos foram os mapas de produtividade. O dado instantâneo de produtividade armazenado com a respectiva coordenada geográfica (latitude e longitude) possibilitou a montagem do mapa de produção. A interpretação inicial pôde ser realizada intuitivamente. Áreas de baixa produtividade foram facilmente reconhecidas e delimitadas. O impacto nos resultados da propriedade seria imediato se a causa da baixa produtividade fosse de fácil intervenção. As máquinas inicialmente disponíveis com monitor de colheita foram as de grão, favorecendo avanços da AP nas culturas de milho, soja e trigo. Para outras
15 LOGÍSTICA DO TRANSPORTE DE MATÉRIA-PRIMA E RESÍDUOS DA CANA-DE-AÇÚCAR Oscar A. Braunbeck Efraim Albrecht Neto
COLMOS O transporte da cana-de-açúcar envolve a condução dos colmos do campo até a planta industrial onde serão processados. No Brasil, o transporte é predominantemente feito com a utilização do modal rodoviário. Os caminhões carregam cana inteira ou picada, dependendo do sistema de colheita utilizado. Para SILVA (2008) o transporte se integra com as operações de corte/colheita e carregamento/ transbordo para formar o sistema de corte, carregamento e transporte (CCT), responsável pela continuidade da taxa de moagem.
Logística da operação Considera-se como logística do CCT a gestão dos equipamentos, recursos humanos e informações necessárias para disponibilizar no pátio da indústria a matéria-prima produzida no campo, com vazão mássica uniforme, utilizando a frota de transporte disponível, operando o mais próximo possível de sua capacidade, sendo que a produtividade e as distâncias de transporte variam ao longo da área de produção. De acordo com CHIARINELLI (2008) o desafio da logística do CCT é manter a indústria em constante operação, em condição que pode ser considerada just in time, em que se trabalha com baixíssima ociosidade, o estoque é próximo de zero e cada operação depende totalmente das atividades anterior e posterior. É comum que em algumas usinas que exista descompasso entre a chegada de cana do campo e sua moagem ao longo do dia, resul-
tando na formação de filas de veículos nos pátios de descarga, com excesso de estoque de matéria-prima e subutilização dos veículos. A logística do transporte envolve variáveis das áreas agrícola e industrial da empresa, além daquelas inerentes ao transporte propriamente dito. O planejamento agrícola do corte, o processo de colheita adotado e o sistema de recepção da matériaprima na indústria participam da dinâmica da gestão do transporte.
Área agrícola Durante o período de safra, as usinas sucroalcooleiras operam em processo contínuo quando a matéria-prima utilizada é fornecida por módulos operacionais autônomos conhecidos como “frentes de colheita.” Independentemente do sistema de colheita utilizado, manual ou mecanizado, os módulos são responsáveis pela colheita e carregamento dos colmos nos caminhões e reboques.
Colheita manual Para realizar a colheita manual, os cortadores geralmente selecionam e agarram 4 ou 5 colmos da touceira de cana e cortam os mesmos na base, com um ou mais golpes de facão. Em seguida, os colmos são depositados em montes posicionados perpendicularmente às fileiras de plantio, sendo que os mesmos ficam ordenadamente empilhados de forma aproximadamente paralela. Essa fase da colheita está relacionada ao desempenho da frota de trans-
16 GERENCIAMENTO AGRÍCOLA NO SETOR SUCROALCOOLEIRO Nilson M. Arraes Paulo S. Graziano Magalhães Jorge Luis Donzelli
Por gerenciamento agrícola entende-se o exercício das funções administrativas (organizar, planejar, dirigir e controlar) por uma equipe administrativa, sob a direção de uma pessoa, frequentemente designada nas usinas pelo cargo de Gerente Agrícola, com a finalidade de produzir e transportar cana para usinas. A gerência agrícola pode constar no organograma da fazenda produtora de cana, usina ou destilaria ou em um grupo de usinas. Em qualquer das três empresas, as gerências agrícolas, devido às suas especificidades funcionais1 ligadas à produção e ao transporte, localizam-se no nível tático-operacional, entre os níveis hierárquicos das empresas. Por tecnologias de gestão (no caso de gerenciamento agrícola) entendem-se as tecnologias da informação ou telemática (computação – hardware e software – e telecomunicações) aplicadas à gestão – inovações tecnológicas. Todavia, devido à forte correlação entre as inovações tecnológicas e as inovações organizacionais na gestão (RAUPP, 2001), também se considerarão como tecnologias de gestão os procedimentos práticos organizacio1
Além das análises funcionais – produção e comercialização, recursos humanos, finanças –, as análises de gestão podem ser estratégicas, abarcando a empresa e seu ambiente, e setoriais, incluindo os atores da cadeia sucroalcooleira (indústria de máquinas e insumos, fornecedores, destilarias e usinas, distribuidores e consumidores intermediários) e estes e suas associações (Orplana, Unica,...) com o Estado, o mercado e a sociedade.
nais. Esses procedimentos, vistos articuladamente, decorrem de teorias ou modelos de gestão, os quais podem ser divididos em: funcionais e por processos (ou da qualidade). Este texto tem o objetivo de realizar uma síntese entre o Termo de Referência, elaborado para o Workshop Gerenciamento Agrícola no setor sucroalcooleiro2, e o Relatório decorrente do evento. Este texto é composto por seis partes. Na primeira, busca-se caracterizar a diversidade de situações em que ocorre a gerência agrícola do setor. Partindo das situações em que os modelos e as tecnologias de gestão estão mais desenvolvidas, outras quatro partes aprofundaram-se nas inovações organizacionais – gestão por processos e ERP – e nas inovações tecnológicas – aplicativos de gerenciamento agrícola, aplicações em geotecnologias e aplicações em telecomunicações. Por último, nas considerações finais, baseando-se nos resultados do Workshop, buscam-se apontar caminhos, que promovam o avanço tecnológico no gerenciamento agrícola do setor sucroalcooleiro. O conhecimento sobre as práticas organizacionais e as tecnologias de gestão no setor sucroalcooleiro estão distribuídos em diversas instituições. Dentre elas destacam-se as instituições de pesquisa 2
Esse Workshop integrou o projeto de pesquisa Diretrizes de Políticas Públicas para a Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo, financiado pelo Programa de Pesquisa em Políticas Públicas da Fapesp. Mais informações sobre o projeto podem ser obtidas em: <www.apta.sp.gov.br/cana>.
17 OUTRAS MATÉRIAS-PRIMAS PARA A PRODUÇÃO DE ETANOL Manoel Regis Lima Verde Leal Teresa Losada Valle José Carlos Feltan Cássia Regina Limonta Carvalho
INTRODUÇÃO O etanol pode ser produzido, a partir de uma grande variedade de matérias-primas, tanto renováveis como fósseis. As fontes fósseis de etanol em uso comercial, atualmente, são o gás natural, o petróleo e o carvão, que não serão tratadas aqui. A maior parte do etanol é produzida a partir de matérias-primas renováveis, que são essencialmente fontes de carboidratos na forma de açúcares (canade-açúcar, beterraba, sorgo-sacarino, tupinambur, frutas), amidos (milho, trigo, mandioca, batatadoce) e materiais lignocelulósicos. As tecnologias de produção de etanol de materiais ricos em açúcares ou amidos (estes são polímeros de açúcares) são chamadas de primeira geração, ao passo que os processos de produção de etanol e outros biocombustíveis, a partir de materiais lignocelulósicos, passaram a ser chamados de segunda geração. Enquanto as tecnologias de primeira geração estão em um avançado grau de maturidade comercial, as de segunda geração ainda vão precisar de vários anos, ou talvez décadas, para se tornarem competitivas, porém a expectativa é que quando isso acontecer, elas suplantarão e substituirão os processos de primeira geração, por utilizarem matérias-primas abundantes, variadas e mais baratas que as utilizadas atualmente. É importante, que se diga que essa expectativa não é uma certeza e há a possibilidade de as duas tecnologias conviverem
e se associarem, tornando a produção de etanol renovável ainda mais competitiva em relação aos combustíveis derivados do petróleo. Apesar da grande variedade de matérias-primas possível para produção de etanol de primeira geração, mais de 90% da produção mundial atual é a partir de milho e de cana-de-açúcar. O interesse pela mandioca (Tailândia, Colômbia, países africanos) e beterraba (Europa, Egito, Paquistão, Colômbia) é crescente e indica que essas matérias-primas ocuparão área significativa no futuro, merecendo mais atenção. A batata-doce, apesar do grande potencial, carece de mais desenvolvimento tecnológico na parte agrícola, e falta de variedades desenvolvidas para maximizar o teor de material fermentescível e, por isso, enfrenta, atualmente, problemas de custos de produção elevados. Outros produtos menos conhecidos, mas com um razoável potencial em termos de produtividade e custos de produção, são o sorgo-sacarino e o tupinambur. Essas serão as matérias-primas abordadas neste capítulo. A abordagem feita considera dois grupos, um formado por culturas com tecnologia de produção agrícola já bastante desenvolvida, ou seja, possibilidade de cultivo em escalas consideráveis, como o milho, sorgo, mandioca e batata-doce; e outro, formado por espécies, que mostraram alto potencial biológico de produção em nível experimental, mas carecem de tecnologia de produção agrícola adequada às condições brasileiras.
Parte 4 NOVO MODELO INDUSTRIAL E USOS FINAIS DO ETANOL Antonio Bonomi (organizador)
1 INTRODUÇÃO Antonio Bonomi Maria das Graças de Almeida Felipe
Hoje, o Brasil se defronta com a perspectiva de um aumento significativo da demanda de álcool combustível. Essa previsão se sustenta em três realidades de mercado: aumento interno do consumo de álcool hidratado pelo sucesso da introdução da alternativa flex-fuel no mercado de veículos automotivos leves; expansão das exportações brasileiras de álcool, em função do crescente interesse mundial pela mistura do álcool à gasolina, como forma de enfrentar o aquecimento global; opção brasileira pela produção do biodiesel, utilizando etanol na transesterificação dos óleos vegetais. Uma visão realista projeta a necessidade de aumentar significativamente a produção de álcool brasileiro nos próximos 5 a 10 anos. Esse importante salto na produção, que começa a se tornar realidade por meio da implantação de novas usinas, abrindo novas fronteiras agrícolas para a cana-de-açúcar, exigirá, paralelamente, um esforço concentrado na busca de um aumento significativo na produtividade alcançada em litros de álcool produzidos por hectare-ano de cana plantada. Esse aumento poderá ser alcançado por meio de duas rotas tecnológicas. A primeira rota tem seu foco voltado para a área agrícola e buscará, por meio da ampliação do atual programa de introdução de novas variedades de cana e, futuramente, pelo emprego da cana transgênica, estender e, se possível, potencializar o atual nível de aumento de produtividade em toneladas de cana/hectare-ano. A segunda rota, focada no setor industrial, buscará desenvolver tecnologias que permitam o aproveitamento integral da cana-de-açúcar na produção de etanol ou outros combustíveis reno-
váveis ou mesmo, por meio do conceito de biorrefinaria, agregar valor à cadeia da cana, pela produção de novos produtos. Paralelamente à concentração de esforços no aprimoramento da tecnologia, hoje, disponível e no desenvolvimento de novas rotas tecnológicas para alavancar a produção de etanol, será necessário introduzir novas alternativas para seu consumo. O projeto “Diretrizes de Políticas Públicas para a Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo” buscou estabelecer, por meio da realização de workshops organizados por diversas Instituições, complementados por trabalhos encomendados a especialistas, as bases necessárias para o estabelecimento do Road map tecnológico da produção e uso do bioetanol no Brasil, em geral, e no Estado de São Paulo, em particular. Essa parte do projeto que trata da produção e uso do bioetanol foi subdividida em 4 grandes áreas: 1. estado da arte da produção de etanol; 2. avanços tecnológicos no contexto atual da produção de etanol; 3. tecnologias de 2ª geração para produção de etanol e outros biocombustíveis e o conceito de biorrefinaria; e 4. uso do etanol. Para estabelecer o estado da arte da produção de etanol, buscando estabelecer, principalmente, os gargalos tecnológicos existentes, foram organizados, pela Escola de Engenharia de Lorena – EEL-USP, dois workshops que contaram com a participação selecionada de pesquisadores atuantes na área de
2 PRODUÇÃO DE ETANOL: ASPECTOS A SEREM CONSIDERADOS Maria das Graças de Almeida Felipe
A iminente escassez de petróleo, principal fonte energética global, juntamente com as justas preocupações da sociedade com os níveis de degradação ambiental criou espaço para o retorno à utilização do etanol combustível. Produto da biomassa vegetal, matéria-prima renovável, este biocombustível é hoje economicamente atrativo. Se for observado que o setor de transporte é um dos que sofrem um dos maiores crescimentos na matriz energética consumida no mundo percebe-se seu impacto na economia mundial. Além de seu uso como combustível único em motores híbridos, o álcool tem sido cada vez mais utilizado no Brasil como aditivo à gasolina (20-25%) sendo também exportado para ser utilizado em outros países com a finalidade de reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Esses, dentre outros assuntos atinentes ao tema, foram alguns dos ingredientes que provocaram a realização do projeto Fapesp “Diretrizes de Políticas Públicas para a Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo”, iniciado em 2006. Este projeto foi desenvolvido a partir da realização de uma série de “Workshops” nos quais foram discutidos temas que buscaram abordar toda a cadeia produtiva desde a matéria-prima cana de açúcar ao produto final etanol combustível. Os principais pontos discutidos durante a realização do primeiro evento ocorrido em novembro de 2006 “Produção de Etanol” estão apresentados neste artigo. O processo de fermentação em uso no Brasil atende a diversos requisitos importantes para a produção de etanol em larga escala, para emprego como combustível. Trata-se de um processo robusto, sem interrupções, capaz de suportar alterações bruscas na matéria-prima e operar em condições de
baixo nível de assepsia. Embora a fermentação alcoólica no seu estágio atual atenda às necessidades de produção de etanol existe ampla margem para otimização dos processos de fermentação em uso. É neste contexto que este evento trouxe para uma primeira discussão os temas centrais: Qualidade da Matéria-Prima, Fisiologia e Ecologia Microbiana, Processo Fermentativo e Destilação. O objetivo principal era o de trazer à discussão as possibilidades de melhoria do processo fermentativo, assim como achar soluções para as deficiências que este apresenta e reduzir ainda mais o seu custo, a fim de atender a grande expansão da produção de etanol e a transformação das usinas e destilarias em grandes produtores de biocombustíveis. As discussões resultantes deste primeiro evento aqui apresentadas neste artigo podem ser traduzidas em tópicos, muitos deles constituídos, mais por questionamentos e provocações do que de fato em respostas definitivas.
QUALIDADE DA MATÉRIA-PRIMA O propósito neste tema é discutir os pré-requisitos que devem atender as matérias-primas envolvidas na fermentação alcoólica para garantir a eficiência deste processo nas condições atuais e nos cenários projetados. A qualidade da cana-de-açúcar (matéria-prima básica) deve ser considerada como o principal fator a ser levado em conta para melhorar o desempenho da fermentação alcoólica. Atualmente no processo comercial de produção de etanol são aproveitados um terço desta biomassa correspondente exclusivamente aos açúcares extraíveis do colmo representados pelo caldo (sacarose).
3 A QUALIDADE DA MATÉRIA-PRIMA NA PRODUÇÃO DE ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR Maria das Graças de Almeida Felipe
Faz-se urgente avançar nas discussões sobre as diretrizes que o Brasil deverá adotar rumo à diversificação de fontes energéticas com o objetivo de reduzir a dependência e promover a substituição dos combustíveis fósseis. Esta é uma das principais formas de reduzir o já deletério impacto negativo que as atividades humanas vêm causando ao ambiente. Nesta pauta está o desenvolvimento de tecnologias para a expansão da produção do bioetanol e sua transformação em “commodity” internacional, única forma de assegurar a liderança do país no mercado mundial. Afinal, o etanol obtido de cana de açúcar, é até o momento, o único combustível com capacidade de atender à crescente demanda por energia renovável de baixo custo e de baixo poder poluente. Deve-se considerar que as reduções das emissões gasosas com a queima do etanol são da ordem de 60% menores se comparadas às emissões da queima da gasolina. Atualmente no Brasil a produção de etanol ocorre a partir da cana-de-açúcar pela fermentação do caldo que é a matéria-prima básica. A inclusão da qualidade da matéria-prima como pré-requisito para o bom desempenho da fermentação alcoólica se deve às características da cana entre as quais se incluem a elevada atividade de água, porcentagem elevada de açúcares, presença de aminoácidos e proteínas as quais contribuem para sua fácil deterioração. Assim, a alteração do sistema de colheita, já se prevendo o fim da queimada e a mecanização total para áreas adequadas para as colheitadeiras mecânicas, induz à introdução de inovações tecnológicas com sua crescente otimização. Acrescente-se a este quadro, o fato de que o processo produtivo do etanol ampliará da matériaprima utilizada atualmente, caldo de cana, para in-
cluir também o bagaço e a palha. O processo tecnológico atual de produção encontra na matéria-prima um de seus gargalos para obter aumentos de produtividade, já que esta representa a parte mais onerosa do processo alcançando próximo a 60% do custo final do etanol brasileiro. Este foi o cenário que norteou as discussões que se promoveram entre os vários especialistas da área, durante o “Workshop Produção de Etanol: Qualidade da Matéria-Prima”, ocorrido na Escola de Engenharia de Lorena – EEL-USP em 30 de maio de 2008. Evento que integrou uma série de outros ocorridos como atividades do desenvolvimento do projeto “Diretrizes de Políticas Públicas para Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo” financiado pela Fapesp. Os temas que pautaram a discussão, cujos principais pontos estão apresentados neste artigo, são: a qualidade da matéria-prima entregue nas usinas; reflexos da qualidade da matéria-prima sobre o processo fermentativo; ffeito de fatores inibidores na fermentação alcoólica e fracionamento de bagaço e palha de cana visando aos novos desafios para obtenção de etanol.
QUALIDADE DA MATÉRIA-PRIMA ENTREGUE NAS USINAS A cana-de-açúcar empregada como matériaprima para produção de etanol é constituída não apenas do colmo (81,2%) no qual se encontram os açúcares, mas, também de palmito (6,1%), folhas verdes (5,6%) e secas (7,1%). De um total da energia contida na cana, aproximadamente 1/3 está no caldo e o restante dividido em partes iguais entre o bagaço e a palha.
4 EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DO PROCESSAMENTO DA CANA-DE-AÇÚCAR PARA ETANOL E ENERGIA ELÉTRICA Manoel Regis Lima Verde Leal
INTRODUÇÃO O Brasil tem tradição secular de cultivo e processamento de cana-de-açúcar para a produção de açúcar e, já no início do século XX, começou a ensaiar sua trajetória, hoje vitoriosa, na produção de etanol. A produção de energia elétrica a partir do bagaço caminhou mais lentamente, inicialmente visando a autossuficiência energética, e só nos últimos 10 anos, a geração de energia excedente para a venda passou a se tornar uma tendência irreversível. Porém, nem sempre o Brasil foi uma referência em termos de tecnologia e competitividade. Olhando apenas do início do século passado até os dias de hoje, é possível visualizarem-se as dificuldades e conjunturas adversas atravessadas pelo setor sucroalcooleiro e também os impactos do Programa Nacional do Álcool – Proálcool, lançado em novembro de 1975. Antes do Proálcool, a produção de etanol visava prioritariamente reduzir a oferta de açúcar por meio do desvio de parte da cana cultivada para esse produto, que era adicionado à gasolina conforme disponibilidade, mas em uma proporção em torno de 5%. Além do excesso de produção, o setor padecia de falta de competitividade, tanto na área agrícola como na industrial, principalmente pela falta de uma referência tecnológica, já que o governo, em várias ocasiões, havia disponibilizado recursos a juros diferenciados para modernização das usinas. A criação da Copersucar – Cooperativa de Produtores de Cana, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo Ltda., no final da década de 1950, ofereceu a oportunidade de se pensar em melhorias tecnológicas pela necessidade de se conseguir competitividade,
indispensável à sobrevivência e expansão da cooperativa e pela massa crítica de usuários para uso das tecnologias e recursos para desenvolvê-las. Assim, no início dos anos 1970, surgiram o programa de melhoramento varietal, o laboratório de análise para controle de qualidade e um departamento técnico de apoio às usinas cooperadas. Em 1972, o Governo Federal criou também o Planalsucar com a finalidade de proporcionar o desenvolvimento tecnológico do setor sucroalcooleiro, com maior foco no melhoramento genético da cana-de-açúcar. Na área industrial, o desenvolvimento tecnológico foi puxado pelo advento do Proálcool, com focos diferentes nas suas várias fases. Na fase inicial, de 1975 a 1979, a necessidade de aumentar a produção rapidamente para atingir as metas estabelecidas pelo governo, 3 bilhões de litros de etanol em 1980 e 10,7 bilhões de litros em 1985, partindo de uma produção um pouco abaixo de 600 milhões de litros em 1975. Nesse período, o crescimento de produção se deu pela anexação de destilarias às usinas de açúcar existentes, mas desviando do padrão tradicional de se produzir o etanol a partir apenas do mel esgotado da fábrica de açúcar; caldo de cana passou a ser misturado ao mel final e este passou a ser menos esgotado. Assim, a maior pressão ocorreu nas áreas comuns à fabrica de açúcar e à destilaria, ou seja, a extração do caldo e a produção de vapor e energia. Esse crescimento se deu sem grandes preocupações com a eficiência ou mesmo com a vida útil de alguns equipamentos mais forçados. Com o segundo choque do petróleo, o governo percebeu que precisava acelerar ainda mais a produção e que o modelo de se misturar etanol à gasolina teria de ser complementado com a produção
5 WORKSHOP POTENCIAL DE GERAÇÃO DE ELETRICIDADE A PARTIR DA BIOMASSA RESIDUAL DA CANA: OPORTUNIDADES, DESAFIOS E AÇÕES NECESSÁRIAS – RELATÓRIO FINAL
Arnaldo Walter
INTRODUÇÃO A cogeração nas usinas de açúcar e álcool, com emprego da biomassa residual da cana-de-açúcar (fundamentalmente do bagaço de cana), é prática corrente em todo o mundo. Durante o período de safra, as usinas brasileiras de açúcar e álcool são autossuficientes do ponto de vista do abastecimento elétrico, isto é, são capazes de gerar toda a eletricidade que consomem. A partir da segunda metade da década de 1980, algumas usinas (em processo lento, embora consistente) têm feito investimentos para gerar e comercializar excedentes de energia elétrica. Estima-se que cerca de 20% das usinas brasileiras, a maioria delas no Estado de São Paulo, estejam produzindo e comercializando energia elétrica excedente. Entretanto, a capacidade de geração instalada está significativamente abaixo do potencial associado à produção de cana. Segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, a capacidade instalada de geração elétrica a partir de bagaço de cana somou 3,1 GW em meados de 2008, em 248 empreendimentos (usinas). Considerando que no Brasil existem hoje ao menos 350 usinas em operação, a capacidade instalada supera 3,5 GW, ou seja, ao menos 3,5% da capacidade instalada de geração elétrica. O potencial de geração elétrica depende de certo número de fatores, que incluem a tecnologia do sistema de cogeração (p. ex., pressão e temperatura do vapor gerado, geração elétrica com turbinas de contrapressão ou de extração-condensação), a disponibilidade de biomassa (p. ex., o potencial é maior com recuperação da palha) e do regime de operação do sistema (isto é, apenas na safra ou ge-
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ração todo o ano). Como exemplo, se considerarmos a operação dos sistemas de cogeração com geração de vapor a 82 bar, 480 °C1, sem redução da demanda de vapor de processo, sem uso da palha e geração elétrica apenas durante a safra, o potencial chegaria a, pelo menos, 6 GW, considerando o nível de moagem de cana em 2006 (425 milhões de toneladas de cana). Para o mesmo nível de moagem e os mesmos parâmetros de geração de vapor, mas com aproveitamento de 40% da palha e com redução da demanda de vapor de processo, o potencial seria da ordem de 9 GW, considerando apenas a operação dos sistemas durante a safra. Portanto, conservadoramente, pode-se estimar que o potencial de geração é duas a três vezes maior do que a capacidade ora instalada. Por outro lado, considerando que a produção de cana deve chegar a 730 milhões de toneladas de cana em 2012, e que pode superar 1 bilhão de toneladas em 10 anos, o potencial de produção de energia elétrica a partir da biomassa residual da cana poderia ser outras duas a três vezes superior ao acima indicado. É evidente que se trata de um potencial bastante significativo, tendo em vista a necessidade de expansão da capacidade de geração elétrica no Brasil nos próximos 10 a 20 anos. À cogeração, a partir da biomassa residual da cana, são atribuídas várias vantagens, há muito tempo conhecidas. Tais vantagens incluem: (i) A possibilidade de geração de montantes expressivos de energia elétrica sem a queima adicional de combustíveis, uma vez, que a biomassa residual da cana já é 1
Que, inclusive, não é a melhor tecnologia comercialmente disponível no Brasil.
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6 AUMENTO DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA EM PLANTAS PRODUTORAS DE AÇÚCAR, ETANOL E ENERGIA ELÉTRICA Adriano V. Ensinas Juan Harold Sosa Arnao Silvia A. Nebra
A indústria sucroalcooleira brasileira tem se tornado uma das atividades mais importantes da economia nacional, produzindo açúcar e etanol para os mercados interno e externo. Esta indústria se caracterizou historicamente por sua baixa eficiência energética, consumindo grande parte do bagaço produzido como combustível nos seus sistemas de cogeração, para atender às necessidades de energia do processo. Um novo cenário, com a possibilidade de venda de excedentes de eletricidade à rede, ou também, a utilização do bagaço como matéria-prima para outros processos, motivou muitas plantas a investirem em sistemas de cogeração mais eficientes, assim como numa maior integração energética dos processos. Este capítulo discute a melhoria dos sistemas de cogeração das usinas sucroalcooleiras por meio do aumento da eficiência das caldeiras com a utilização de secadores de bagaço, bem como, por meio de outras propostas de projeto destes sistemas. A integração energética dos processos é também apresentada, mostrando que o aproveitamento da energia térmica disponível pode levar a importantes reduções no consumo de vapor na planta, melhorando, assim, a eficiência energética do processo produtivo.
INTRODUÇÃO Ao longo da história da indústria sucroalcooleira brasileira podem ser identificados esforços para o aumento da eficiência energética das
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usinas, sendo esses decorrentes da necessidade de solução para problemas concretos que surgiram com o passar do tempo. Assim, um dos primeiros objetivos alcançados foi a liberação da indústria de qualquer combustível auxiliar, utilizando o bagaço, rejeito do próprio processo, como única fonte térmica. O passo seguinte ocorreu com a autoprodução de toda a energia necessária, tanto térmica quanto elétrica, por meio do desenvolvimento de sistemas de cogeração adequados às necessidades das fábricas, e que utilizavam somente bagaço como combustível. Paralelamente, a energia térmica consumida no processo começou a ser melhor utilizada, introduzindo-se o aproveitamento de vapor vegetal proveniente dos evaporadores. Um terceiro desafio surgiu com a liberação do setor elétrico e o advento da possibilidade da venda de energia elétrica à rede a preços competitivos. Ainda dentro da proposta de utilização de ciclos Rankine, o setor passou a inserir novos sistemas de cogeração, com caldeiras e turbinas que trabalham com mais pressão e temperatura. No entanto, novos desafios virão pela frente com a possibilidade de introdução de ciclos BIGCC, como está planejado na Índia, para diferentes tipos de biomassa (notícia veiculada por RENEWABLE ENERGY FOCUS, 2009a), e também com o advento dos combustíveis das agora chamadas refinarias de terceira geração (RENEWABLE ENERGY FOCUS, 2009b), caso no qual o bagaço passa de rejeito combustível a matéria-prima.
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7 INSTRUMENTAÇÃO E AUTOMAÇÃO NA AGROINDÚSTRIA DA CADEIA CANA-ETANOL Cristiane Sanchez Farinas Ladislau Martin Neto Roberto Campos Giordano
Os avanços tecnológicos necessários para o aumento de eficiência na cadeia cana-etanol, tanto em relação à cadeia produtiva quanto à cadeia industrial, estão de forma direta ou indireta relacionados à pesquisa e desenvolvimento em instrumentação e automação. Neste capítulo, é apresentado o papel fundamental que a instrumentação e automação desempenham na otimização dos atuais processos de produção de etanol de cana-de-açúcar, as oportunidades tecnológicas já disponíveis no mercado, os desafios para a implementação industrial da produção do etanol celulósico de forma integrada e sustentável e, finalmente, é apresentada uma visão sobre as tendências para a consolidação das biorrefinarias.
INSTRUMENTAÇÃO E AUTOMAÇÃO VISANDO À OTIMIZAÇÃO DO PROCESSO DE PRODUÇÃO DE ETANOL DE CANA-DE-AÇÚCAR Apesar dos avanços tecnológicos da indústria sucroalcooleira nas últimas décadas, ainda existem diversas oportunidades para a otimização do processo e consequente aumento da produtividade nas usinas de produção de etanol. Isso se deve ao fato de que as indústrias produtoras de álcool combustível no Brasil não são caracterizadas por grandes investimentos em automação e controle. Essa discrepância pode estar relacionada tanto à desaceleração do incentivo à produção do etanol, ocorrida no final
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da década de 1990, como também pelo próprio desconhecimento dos reais benefícios da implementação de novas tecnologias no processo produtivo (ATALA, 2004). Com as perspectivas atuais de ampliação do mercado externo, da aplicação de etanol em motores do tipo flex fuel, no processamento do biodiesel, células de hidrogênio e outras fontes alternativas de energia, é esperado um maior investimento das usinas tanto na pesquisa como na implementação de novas tecnologias, aliadas com a automação e controle do processo produtivo (ATALA, 2004). A implementação de controle no processo tem como vantagens a possibilidade de gerar um aumento de eficiência, produtividade e reprodutibilidade, redução de custos, melhor controle da qualidade e redução de impactos ambientais. Uma das razões disso é que a peça-chave nos processos fermentativos de produção de etanol, os micro-organismos, são muito sensíveis a pequenas variações ambientais. Qualquer pequena variação na qualidade da matéria-prima, composição do meio, pH, e temperatura podem afetar significativamente o metabolismo e alterar a eficiência e a produtividade do processo. O controle do bioprocesso visa manter o ambiente no qual as células são cultivadas em condições ótimas para o crescimento, biossíntese e processamento final. O controle do processo de produção de etanol segue os mesmos princípios de uma planta industrial, tendo como objetivo manter certas variáveis entre os limites operacionais desejáveis. Para
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8 NECESSIDADES DE P&D NA ÁREA INDUSTRIAL EM VINHAÇA Luís Augusto Barbosa Cortez Carlos Eduardo Vaz Rossell Rodrigo Aparecido Jordan Manoel Regis Lima Verde Leal Electo Eduardo Silva Lora
INTRODUÇÃO Neste capítulo, serão abordados os aspectos relativos à necessidade do desenvolvimento de pesquisas na área de vinhaça que visem ao aprimoramento de técnicas ou à implantação de novos processos que possibilitem a redução do volume produzido desse efluente e/ou seu poder de poluição. A vinhaça de cana-de-açúcar é um resíduo agroindustrial com um elevado poder de poluição gerado em grande volume. A baixa tolerância ao álcool pela levedura Sacharomyces Cerevisiae, utilizada na fermentação alcoólica, obriga a uma alta taxa de diluição do mosto para que o teor alcoólico do vinho não seja elevado, resultando, após a destilação, na geração de um grande volume de vinhaça por litro de álcool (cerca de 7 a 14 vezes). Temperaturas mais elevadas no processo de fermentação reduzem ainda mais a tolerância da levedura ao etanol. A solução técnica encontrada no Brasil para a disposição desse efluente é a fertirrigação, já tratada neste livro. No entanto, como há restrições de dosagens e a legislação de outros países proíbe essa prática, é muito importante que se busque a redução de volume e mesmo a eliminação in situ da vinhaça. Já existem algumas opções para reduzir o volume produzido de vinhaça. Algumas correntes defendem o melhoramento genético para aumentar a
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resistência das leveduras utilizadas na fermentação outras defendem mudanças no processo, como o uso de vácuo, ou de membranas para extração contínua do álcool produzido ou o emprego da refrigeração para redução e controle de temperatura durante a fermentação, o que permitiria elevar o teor alcoólico do vinho. Outra possibilidade é concentrar a vinhaça, seja por meio da evaporação, ou com o emprego da osmose reversa. Todas essas tecnologias encontram-se em diferentes estágios, carecendo ainda de mais desenvolvimento e pesquisa. Em termos somente de redução do poder de poluição, a biodigestão se mostra como uma alternativa para o tratamento da vinhaça, além da possibilidade de geração de energia a partir do biogás produzido. Porém, não resolve a questão do volume gerado. No entanto, tratando-se da vinhaça, duas questões ainda precisam de respostas. A primeira diz respeito à quantidade ótima, que poderia ser gerada (volume de vinhaça por volume de etanol produzido). A segunda questão envolve a vinhaça do álcool de segunda geração, de como serão suas características, qual o volume e o seu tratamento.
VINHAÇA DE CANA-DE-AÇÚCAR No Brasil, a maior parte da vinhaça é produzida da fermentação do caldo misturado, em diferentes proporções, ao melaço obtido na centrifugação
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9 A PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR COMO MATÉRIA-PRIMA PARA PROCESSOS DE SEGUNDA GERAÇÃO Edgardo Olivares Gómez Renata Torres Gomes de Souza George Jackson de Moraes Rocha Eduardo de Almeida Luís Augusto Barbosa Cortez
INTRODUÇÃO O crescente desenvolvimento alcançado pela indústria da cana-de-açúcar no Brasil, principalmente com foco na produção de etanol combustível, tem gerado um atraente incentivo no aproveitamento dos excedentes de bagaço produzidos, devido à inserção de novas e mais avançadas tecnologias agrícolas e industriais, e na recuperação integral ou parcial dos resíduos agrícolas da cana – RAC, basicamente na forma de palhiço ou palhada, ou de algumas das suas frações (folhas e palha). Essa visão de desenvolvimento agroindustrial é conceitualmente inovadora na implementação, podendo trazer grandes ganhos pelo aumento significativo na produção de energia, seja ela com base na plataforma termoquímica a partir da cogeração na forma de energia elétrica, ou com base na plataforma bioquímica (plataforma de açúcares) na forma de etanol combustível, além de outros coprodutos e/ou subprodutos diretos e indiretos do processo, sem exigir aumentos proporcionais nas áreas de plantio de cana. Esse novo conceito de aproveitamento da cana é conhecido como “aproveitamento integral”, e, sem dúvida, permitirá melhorar os atuais índices de produtividade em etanol por hectare de cana colhida, a geração relativa de energia renovável na produção de etanol e os impactos ambientais na produção e uso do etanol.
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As matérias-primas de caráter lignocelulósico obtidas como resultado da colheita e o processamento industrial da cana-de-açúcar durante a produção de açúcar e etanol (isso é basicamente o bagaço e os resíduos agrícolas da cana – RAC) mostram elevado potencial de utilização na produção de energia, a qual, na sua forma direta ou indireta (energia térmica e biocombustíveis), pode ser obtida por meio de tecnologias de conversão baseadas em rotas bioquímicas (hidrólise) e termoquímicas (combustão, pirólise e gaseificação). Até o ano de 2031, toda a palha de cana-deaçúcar gerada durante a colheita no Brasil poderá estar disponível para recuperação e posterior utilização. Métodos de colheita de cana e palha deverão ser implementados ao longo desses anos, baseados em princípios e conceitos compatíveis com as necessidades e economia dos processos. Da mesma forma, sistemas de limpeza da cana por meio de estações de limpeza com recuperação da palha deverão fazer parte do pacote industrial da usina sucroalcooleira. A palha de cana deverá ocupar um lugar de destaque, junto ao bagaço de cana, como matéria-prima, para a produção de combustíveis ou produtos químicos. Este capítulo pretende contribuir com a recente retomada da discussão sobre o aproveitamento energético dos resíduos agrícolas da cana – RAC, com base na expectativa de geração de grandes
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10 PRODUÇÃO INTEGRADA DE BIODIESEL NA USINA BARRALCOOL José Luis Olivério Sérgio Tamassia Barreira Silvio Cezar Pereira Rangel
Trinta anos após ter sido lançado o Proálcool – Programa Nacional do Álcool, o Brasil deu início ao Programa Nacional de Biodiesel. Examinando-se o biodiesel e o bioetanol, observam-se sinergias significativas nos processos de produção destes biocombustíveis e, por esta razão, a Dedini introduziu no mercado o conceito de “Integração BiodieselBioetanol” em novembro de 2004. A instalação de biodiesel é anexa e integrada às usinas de açúcar e álcool, com inúmeras vantagens, entre essas, redução de custos e menores investimentos. No setor agrícola, destaca-se o conceito já existente de produção de oleaginosas em rotação com a cana-de-açúcar, das quais se extrai o óleo vegetal, principal matéria-prima para a produção de biodiesel. A segunda fonte é o bioetanol produzido em usinas e destilarias, e a integração permite otimização das instalações, utilidades e recursos humanos existentes. A energia é produzida a partir do bagaço da cana-de-açúcar. Parte do biodiesel produzido pode ser usada na frota de caminhões, tratores e colheitadeiras da própria usina. Em suma, há sinergia na lavoura da cana-deaçúcar e na indústria, e a integração bioetanol-biodiesel traz benefícios econômicos, energéticos e de processos de produção. Considerando essa atratividade, a Usina Barralcool instalou uma planta de biodiesel integrada à usina de açúcar e álcool, fornecida pela Dedini, que teve seu início de operação em novembro de 2006, com os seguintes destaques: • primeira usina de açúcar e álcool do mundo com produção integrada de biodiesel;
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• flexibilidade no uso de várias matérias-primas: óleos vegetais e gordura animal (sebo bovino); • primeira instalação do mundo com processo contínuo de produção usando a rota etílica, flexível à rota metílica; 50.000 t/ano de capacidade. A Usina Barralcool tornou-se então a primeira usina do mundo a produzir os 3 BIOs: bioetanol, biodiesel e bioeletricidade (energia produzida a partir do bagaço para consumo próprio e de venda do excedente à rede de distribuição). Este trabalho apresenta o caso da Usina Barralcool: produção de biodiesel pela rota etílica, integração à usina e benefícios decorrentes.
INTRODUÇÃO Em 1975, teve início no Brasil o Programa Nacional do Álcool – Proálcool – representando o começo de um novo conceito no setor canavieiro: a produção de energia renovável a partir da cana-de-açúcar. A produção de álcool possibilitou um grande crescimento do setor, ao mesmo tempo em que as usinas tiveram importante evolução na capacidade, nos rendimentos globais e no maior aproveitamento da energia e dos produtos e subprodutos da canade-açúcar (OLIVÉRIO, 2002). Ao final do Programa, alguns empresários do setor ampliaram a visão de seu negócio, entendendo que a usina, na sua integração agrícola (+) industrial,
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11 WORKSHOP HIDRÓLISE DE MATERIAL LIGNOCELULÓSICO Antonio Bonomi
Hoje, o mundo discute a possibilidade da produção do bioetanol de segunda geração. Para viabilizar essa nova alternativa para produção desse combustível renovável, novas tecnologias estão sendo desenvolvidas, visando aproveitar a componente lignocelulósica da biomassa. Essas novas tecnologias concentram-se em duas linhas principais: a hidrólise do material lignocelulósico para produção de açúcares fermentescíveis (rota química e biológica) e a gaseificação desse material seguida pela síntese de combustíveis líquidos (rota térmica). No novo paradigma da “cana-de-energia”, coletar-se-ia a cana integral (aprimoramento e mecanização do processo de colheita), além de se otimizar o balanço energético da usina, de forma a aumentar a quantidade de biomassa excedente. As tecnologias de hidrólise e de gaseificação da biomassa residual, uma vez desenvolvidas, serão capazes de transformar fibras em etanol ou outros combustíveis, a partir da fermentação do açúcar gerado (hidrólise) ou da síntese de compostos a partir do gás gerado (gaseificação). Com esse novo paradigma, pode-se aumentar significativamente a produção de etanol por hectare-ano, passando dos atuais 6.000 litros para cerca de 12.000 litros (patamar projetado). A utilização de biomassa para a produção de álcool combustível pela rota química e biológica envolve, basicamente, dois processos: hidrólise dos polissacarídeos contidos nos materiais lignocelulósicos em açúcares e a fermentação destes em etanol ou outros combustíveis. Esse tema foi discutido em detalhe em dois eventos realizados, no âmbito do projeto Diretrizes de Políticas Públicas para a Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo – Programa de Pesquisa
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em Políticas Públicas – Etanol – PPPP. O primeiro evento foi o III Workshop Tecnológico sobre Hidrólise, realizado no IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A., em 14.12.2006; e o segundo evento foi a reunião com o Prof. Guido Zacchi do Departamento de Engenharia Química da Lund University da Suécia, realizada em 01.02.2007, quando da sua visita à Unicamp.
III WORKSHOP TECNOLÓGICO SOBRE HIDRÓLISE O workshop tratou o assunto hidrólise, focando quatro temas básicos. Esses temas, incluindo as perguntas-chave para cada uma das áreas de desenvolvimento, e que serviram de ponto de partida para as palestras e debates, estão listados a seguir. 1. Caracterização do material lignocelulósico: • Existem vantagens significativas entre as características da palha e do bagaço, com vistas ao seu processamento para produção de etanol? • Existem interferentes importantes, na composição do bagaço e da palha da cana, para o processo de hidrólise? 2. Pré-tratamento e hidrólise do material lignocelulósico: • Como definir quando termina a etapa de pré-tratamento e começa a etapa de hidrólise? • Como separar a lignina do material pré-hidrolisado? • A rota enzimática de hidrólise é melhor que as rotas químicas?
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12 PRODUÇÃO DE ETANOL A PARTIR DE MATERIAIS LIGNOCELULÓSICOS Mats Galbe Guido Zacchi
INTRODUÇÃO O bioetanol foi introduzido em larga escala no Brasil, nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, projetando-se como um dos biocombustíveis renováveis dominantes no setor de transporte nos próximos 20 anos. Até o momento, o bioetanol é praticamente produzido apenas a partir de matérias-primas sacarinas ou amiláceas (por exemplo, cana-de-açúcar, milho, trigo e outros) comumente chamado bioetanol de primeira geração (1G). Entretanto, é opinião geral que a futura expansão deverá ser baseada no bioetanol de segunda geração (2G), isto é, produzido a partir de materiais lignocelulósicos, caso dos resíduos agrícolas (por exemplo, palha de trigo, bagaço de cana-de-açúcar e resíduo de milho) e resíduos florestais (por exemplo, pó e restos de serraria), assim como de culturas dedicadas (salgueiro e capim-elefante). Essas matérias-primas são suficientemente abundantes e disponíveis ao redor do mundo. Elas geram emissões líquidas – de gases efeito estufa muito baixas, reduzindo, dessa forma, os impactos ambientais. Para obter sistemas que sejam economicamente viáveis e sustentáveis é necessário utilizar eficientemente todas as frações das matérias-primas, especialmente a celulose, a hemicelulose e a lignina. Isso requer um elevado rendimento global de etanol produzido a partir da hidrólise e fermentação da fração de carboidrato (hemicelulose e celulose), assim como um elevado rendimento do principal coproduto (lignina). Outra opção é a utilização da hemicelulose para outros fins, como é o caso da produção de biogás. Entretanto, produzir açúcares monoméricos com
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elevados rendimentos a partir de celulose e hemicelulose é muito mais difícil do que obter açúcares a partir de culturas sacarinas ou amiláceas, caso da cana-de-açúcar ou do milho. Portanto, o processo de conversão de materiais lignocelulósicos é mais complexo do que os outros dois processos. A produção de etanol a partir de lignocelulose compreende as seguintes etapas principais: hidrólise da hemicelulose, hidrólise da celulose, fermentação, separação da lignina, recuperação e concentração do etanol e tratamento da água residual (ver Figura 1). Um processo baseado na hidrólise enzimática e na fermentação é considerado hoje como a opção mais promissora para a conversão dos carboidratos de materiais lignocelulósicos em etanol, de uma forma energeticamente eficiente, resultando em elevados rendimentos e baixos custos de produção1,2. A hidrólise enzimática e a fermentação podem ser operadas separadamente (SHF) ou combinadas em uma sacarificação e fermentação simultânea (SSF). A segunda opção tem demonstrado resultar em rendimentos maiores de etanol, quando comparada com a SHF. Alguns dos principais fatores que reduzem os custos de produção são: utilização eficiente da matéria-prima por meio de elevados rendimentos em etanol, elevada produtividade, elevada concentração de etanol na alimentação da destilação e integração do processo de forma a reduzir o investimento e a demanda de energia. As etapas-chave para o sucesso são as etapas de conversão, isto é, o pré-tratamento, a hidrólise enzimática e a fermentação (ou a SSF) de todos os açúcares. É também essencial desenvolver um processo altamente integrado, trabalhando com
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13 HIDRÓLISE DA BIOMASSA LIGNOCELULÓSICA Rodolfo Quintero-Ramirez
INTRODUÇÃO A produção de biocombustíveis líquidos a partir da biomassa lignocelulósica pode reduzir de forma significativa a dependência mundial do petróleo, tornando-se, portanto, uma área de investigação científica de grande interesse a vários governos, grupos acadêmicos e empresas. Hoje, em função dos avanços na agricultura e na biotecnologia, é possível propor a produção de biocombustíveis de forma não dispendiosa, especialmente bioetanol baseado na biomassa lignocelulósica, como também em outras matérias-primas biomássicas. Até agora, Brasil2 e Estados Unidos4 têm proporcionado avanços significativos na produção e uso de bioetanol, sendo que o primeiro é derivado da cana-de-açúcar (atualmente 15 bilhões de litros de etanol são produzidos) e o segundo usa milho (para 2017 é esperado que seja atingida a produção de 132 bilhões de litros). Essa situação tem causado uma competição entre alimento e energia quanto ao uso do solo, água e outros recursos. Por essa razão, em muitas partes do mundo, em universidades e empresas, há programas de pesquisa científica tentando entender a melhor maneira de se usar materiais lignocelulósicos para a produção de bioetanol e outros biocombustíveis. A biomassa abundante e não dispendiosa não compete com a produção de alimentos. Economicamente, a lignocelulose tem uma vantagem sobre outras importantes matérias-primas agrícolas para biocombustíveis, tais como amido de milho, soja e cana-de-açúcar, devido ao fato de ser produzida rapidamente e a um custo significativamente menor que
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os alimentos. Biomassa lignocelulósica é também um importante componente das culturas mais abundantes já mencionadas; é a porção não comestível da planta, que é normalmente subaproveitada mas pode ser utilizada para a produção de biocombustíveis. A disponibilidade de biomassa lignocelulósica não é geralmente uma limitação na maioria dos lugares do mundo. Por exemplo, os Estados Unidos têm uma enorme quantidade de biomassa subutilizada (Tabela 1). Na verdade, a biomassa não alimentícia, incluindo árvores, gramíneas e resíduos agrícolas, constitui mais de 80% da biomassa; em 2005 foi estimado que 1,3 bilhões de toneladas (base seca) dessa biomassa não alimentícia poderiam ser disponibilizadas para indústrias de larga escala de bioenergia e biorrefinarias até a metade do século XXI. Essa biomassa em abundância tem o conteúdo energético equivalente a 3,8 bilhões de barris de petróleo, uma quantia equivalente a aproximadamente metade do petróleo consumido nos Estados Unidos em 2006. As matérias-primas de biomassa lignocelulósica para biocombustíveis podem ser proveniente tanto de recursos florestais como agrícolas. Recursos florestais incluem resíduos como as cascas de árvores, pedaços usados e descartados e resíduos de madeira usada na construção civil, principalmente as existentes no lixo urbano. Fontes agrícolas são constituídas principalmente de resíduos de colheitas, que são, na maior parte folhas e talos (a forragem de milho – corn stover – enquadra-se aqui), advindos de espécies cultivadas para alimento e fibras, tais como cana-de-açúcar, soja, milho e trigo. Além disso, mais recentemente, muitos pesquisadores têm proposto gramíneas (como o capim-chicote switchgrass) e árvores de cresci-
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14 A PIRÓLISE RÁPIDA COMO PRECURSORA DE BTL J. M. Mesa Pérez J. D. Rocha L. A. B. Cortez
A DEFINIÇÃO DO PROCESSO DE PIRÓLISE RÁPIDA
OS PRODUTOS PRIMÁRIOS DA PIRÓLISE RÁPIDA DE BIOMASSA
É um processo de conversão termoquímica de biomassa. Caracteriza-se pela degradação térmica do combustível sólido em ausência de oxigênio em um curto tempo de reação, da ordem de poucos segundos.
O produto principal é o bio-óleo, mas também, tem-se a produção de carvão vegetal em pó, extrato ácido e gases. A Figura 1 ilustra a aparência física dos produtos da pirólise da palha de cana-de-açúcar processa-
FIGURA 1
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A planta demonstrativa, a matéria-prima e os produtos.
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15 TECNOLOGIAS BTL Ademar Hakuo Ushima
INTRODUÇÃO O aproveitamento energético dos principais resíduos gerados no setor sucroalcooleiro, palha, bagaço e vinhaça, atualmente desperdiçados ou utilizados de forma pouco eficiente, apresenta um enorme potencial econômico no Brasil para a produção de combustíveis e produtos químicos de maior valor agregado a partir da tecnologia BTL – Biomass to Liquid podendo contribuir, simultaneamente, na resolução de graves problemas ambientais do setor, como os causados pelas queimadas de palha no campo e contaminação do lençol freático pela dispersão de vinhaça no solo. Além disso, o emprego dessa biomassa como fonte de energia não compete com a produção de alimentos como as tecnologias de primeira geração, baseadas na produção de etanol ou biodiesel a partir de sacarose, amido e óleos vegetais, e não estimula a expansão da área agrícola no País.
DESCRIÇÃO DA TECNOLOGIA BTL A tecnologia BTL consiste resumidamente na conversão de biomassa em gás de síntese (gás com elevada concentração de CO e H2), seguida da conversão desse gás em combustíveis ou produtos químicos líquidos via reatores catalíticos. Ela é uma das principais rotas tecnológicas atualmente em desenvolvimento para o aproveitamento da energia solar acumulada nas biomassas, denominadas tecnologias de segunda geração, capaz de converter as atuais usinas de açúcar e álcool em unidades equivalentes às refinarias de petróleo, também conhecidas como biorrefinarias.
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Em relação à tecnologia de hidrólise enzimática, a tecnologia BTL apresenta a vantagem de poder aproveitar toda a biomassa, e não somente uma fração dela, como é o caso da rota enzimática que aproveita somente a celulose para a geração de combustíveis líquidos. Ela também pode ser complementar à rota enzimática, convertendo as frações de lignina e hemicelulose, não conversíveis em carboidratos fermentecíveis, em combustíveis líquidos, gasosos, energia elétrica ou hidrogênio. A tecnologia CTL – Coal to Liquid, equivalente ao BTL no setor carboquímico, e que utiliza o carvão mineral ou resíduos petroquímicos de origem fóssil para a geração do gás de síntese, já se encontra em fase comercial, com várias unidades em operação ou em construção no mundo, principalmente na África do Sul, China, Europa e EUA. O consumo de carvão mineral nos EUA, em 2007, somente para a produção de produtos químicos via gaseificação atingiu 30,8 milhões t (DOE/EIA-0121 – 2008/01Q). No Brasil, uma unidade da Fosfértil (450 MWth), localizada em Araucária, Paraná, vem produzindo amônia a partir da gaseificação de resíduo asfáltico (Rasf) com oxigênio desde 1983. O consumo de Rasf nessa unidade é de 1.000 t/d e a produção de amônia de 1.300 t/d. Um quadro dos produtos que podem ser obtidos por meio da tecnologia BTL é apresentado na Figura 1. Como se pode observar a lista de produtos é muito extensa, extrapolando a produção de combustíveis líquidos e gasosos. Entre os combustíveis que podem ser gerados a partir da tecnologia BTL, podem-se destacar o metanol, etanol, gasolina, óleo diesel, éter metílico (DME), hidrogênio etc., a maioria deles, com exce-
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16 CANA ENERGIA Manoel Regis Lima Vede Leal
INTRODUÇÃO A cana-de-açúcar tem sido desenvolvida e cultivada em diferentes partes do mundo, através de séculos, sempre como uma fonte de alimentos, com o açúcar evoluindo de uma especiaria cara para se tornar a mais barata fonte de caloria alimentar. Os seus componentes básicos, açúcares e fibras, são tratados de forma bem diferente nos programas de melhoramento genético existentes no mundo: os açúcares são os componentes valorizados nas seleções de cultivares enquanto as fibras do colmo são limitadas, pelo fato de afetarem negativamente o desempenho das moendas e difusores e de arrastarem açúcares no bagaço; as fibras da palha (folhas e ponteiros) não chegam nem a ser avaliadas. No processamento da cana-de-açúcar, o açúcar é o produto principal e o etanol e a energia elétrica excedente são considerados subprodutos. No Brasil, esse conceito de indústria de alimentos para a cana-de-açúcar tem evoluído lentamente, impulsionado pela importância comercial crescente do etanol e, mais recentemente, da energia elétrica. O etanol vem sendo produzido de forma consistente nas usinas brasileiras há mais de um século, quando começou a fazer parte das opções de combustível para o recém-introduzido automóvel, utilizando motores a ciclo Otto. Já na década de 1920, o Instituto Nacional de Tecnologia – INT trabalhou de forma sistemática no desenvolvimento da tecnologia de motores a ciclo Otto operando com etanol; o interesse do Governo Brasileiro nessa época era achar uma alternativa para o excesso de produção de cana que constantemente deprimia os preços do açúcar. Assim, em 1931 foi instituída a obrigatoriedade de
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se misturar 5% de etanol em toda gasolina importada consumida no País. Essa obrigatoriedade foi estendida para toda gasolina consumida no Brasil a partir de 1938. Todavia, foi somente após o lançamento do Programa Nacional do Álcool – Proálcool, em novembro de 1975, que o etanol atingiu o status de produto principal das usinas, com o açúcar. Começou a surgir aí o modelo brasileiro de usina com a produção simultânea, e cada vez mais integrada, de açúcar e etanol; este deixou de ser o álcool residual, produzido a partir do melaço esgotado (mel final), e passou a utilizar a mistura de mel final parcialmente esgotado e caldo de cana. Com a aceleração da produção a partir de 1979, começaram a surgir as destilarias autônomas que produziam apenas etanol; a maioria dessas destilarias autônomas foi convertida em usinas de açúcar com destilaria anexa na década de 1990. Na área de energia térmica e elétrica, as usinas evoluíram da situação de consumidores de energia externa, na forma de energia elétrica comprada das concessionárias e de lenha combustível, para se tornarem totalmente autossuficientes, tendo o bagaço como única forma de energia primária para a indústria, nos meados da década de 1990. Com as mudanças institucionais e do marco regulatório do setor elétrico do Brasil, tornou-se viável para as usinas gerarem energia elétrica excedente para injeção na rede interligada e venda para terceiros; hoje, as novas usinas sendo construídas estão cada vez mais equipadas para gerar excedentes de energia elétrica e aproveitamento total do bagaço para esse fim. Com o aumento da colheita de cana sem queimar a palha, surge como uma nova fonte de fibra para energia, que começa, timidamente, a ser utilizada
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17 NOVAS POSSIBILIDADES DE NEGÓCIOS DO SETOR SUCROALCOOLEIRO: ALCOOLQUÍMICA E BIORREFINARIA Telma Teixeira Franco Camilo Sixto López Garzón
BIORREFINARIAS: DESCRIÇÃO E PRINCÍPIOS A biorrefinaria é um processo integrado no qual a biomassa é convertida em produtos de maior valor agregado com emissões de CO2 nulas ou próximas a zero. O conceito de biorrefinaria está baseado naqueles similares aos de tecnologias empregadas na refinaria petroquímica, porém nas mais complexas, oferecendo maior potencial devido à enorme variedade e quantidade de biomassa renovável. Além disso, a biorrefinaria oferece possibilidade de serem às indústrias a não poluidoras, sustentáveis e de baixo impacto no ambiente. Historicamente, sabe-se que diversos processos, hoje incluídos na área de biorrefino, já eram conhecidos desde o século XIX, tais como: a sacarificação da madeira, solubilização da celulose, a refinaria de açúcar industrial, produção de amido, refinação de plantas oleaginosas, extração de clorofila, obtenção de furfural por destilação de fibra de trigo, isolamento da vanilina de lignina (1874), obtenção de ácido lático (KAMM et al., 2006). Diferentes biomassas estão sendo utilizadas para a produção de moléculas, para posterior utilização em processos industriais, podendo levar à substituição gradativa da plataforma petroquímica. Blocos construtores são moléculas com múltiplos grupos funcionais, os quais podem ser transformados em outros grupos moleculares (Figura 1). A utilização dos blocos construtores envolve basicamente dois processos anteriores: a) hidrólise dos polissacarídeos originários dos materiais lignocelulósicos e liberação dos açúcares e b) fermen-
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tação desses em produtos de interesse. Reações enzimáticas ou químicas podem fazer parte da sequência de etapas para obtenção de blocos construtores. Assim, diversos conceitos de biorrefinaria trazem a ideia das instalações industriais onde a biomassa é convertida, de forma econômica e sustentável, em produtos químicos, materiais, combustíveis e energia (KAMM et al., 2006); outro conceito de biorrefino é a maximização do valor econômico da biomassa, melhorando o modelo de negócios e da corporação (STUART, 2006) (Figura 2). Visando atingir o amplo e eficiente potencial da biorrefinaria, será necessário integrar tecnologias para a concepção (via engenharia metabólica), exploração da matéria-prima biológica (biomassa) e produção de compostos químicos industriais intermediários e finais (processos industriais) (Figura 3). As biorrefinarias devem ser projetadas para processar os precursores contidos na biomassa (principalmente carboidratos, no caso da lignocelulose) e, para isso, numa primeira etapa, os mesmos devem ser separados/fracionados por processos físicos. A seguir, os produtos e subprodutos já separados devem ser processados química/microbiologicamente. Uma vez purificados, os novos produtos e subprodutos podem ser comercializados ou alimentados às indústrias convencionais. Essa abordagem de produção pode ser resumida num único objetivo, correspondente à seguinte expressão (KAMM, 2004): Matéria-prima integral (não fracionada) + Combinação de processos Diversos produtos Assim, o desenvolvimento e futuro estabelecimento desses complexos de produção serão a chave para o acesso a uma produção integrada de alimen-
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18 OPÇÕES TECNOLÓGICAS PARA AS FUTURAS BIORREFINARIAS DE CANA Joaquim E. A. Seabra Isaias C. Macedo
INTRODUÇÃO Uma biorrefinaria poderia ser definida como um complexo integrado capaz de produzir diferentes produtos (combustíveis, químicos, energia elétrica ou vapor) a partir de diferentes biomassas (ONDREY, 2006), permitindo alcançar mais eficiências, tanto do ponto de vista termodinâmico como econômico e ambiental. RAGAUSKAS et al. (2006) fazem uma ampla discussão sobre o conceito e as possibilidades envolvendo as biorrefinarias, visando opções otimizadas para o uso da biomassa na produção sustentável de energia, combustíveis e materiais tanto no curto quanto no longo prazo. Com esse objetivo, grandes investimentos em desenvolvimento (governos e setor privado) têm sido feitos nos últimos anos (GENENCOR, 2003; OILS AND FATS INTERNATIONAL, 2005; ONDREY, 2006), fazendo a expectativa por plantas comerciais competitivas não envolver prazos muitos longos. Algumas análises de “biorrefinarias” hipotéticas têm sido apresentadas, considerando o uso de tecnologias esperadas como “maduras” no futuro. LYND et al. (2005), baseados em materiais lignocelulósicos, consideraram a produção futura autossuficiente de energia elétrica, combustíveis Fischer-Tropsch e hidrogênio, assim como cenários de coprodução envolvendo etanol-potência, etanolpotência-combustíveis FT, etanol-hidrogênio, ou outras combinações de produtos com a produção de proteína. Para essa análise, alguns cenários mostraram eficiência energética global maior que 70%, e competitividade econômica com processos con-
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vencionais já baseados em preços de combustíveis fósseis dos últimos anos. As tecnologias-chaves são a gasificação, para a produção do gás de síntese, e a conversão de lignocelulósicos em açúcares (WERPY et al., 2005). No caso da gasificação, existe enorme potencial relacionado com essa tecnologia, com as possibilidades de produção de energia e diferentes combustíveis. Já para ilustrar o potencial da hidrólise, basta ter em mente que, quando a tecnologia se tornar comercial e competitiva, todos os processos bioquímicos a partir do açúcar para a produção de plásticos, ácidos orgânicos, solventes, entre outros, não ficarão mais restritos à indústria de açúcar convencional. Apesar dessas opções não serem comerciais (no mundo) para biomassa, hoje podemos dizer que as atuais usinas de cana-de-açúcar no Brasil já representam importantes precursoras das futuras biorrefinarias, utilizando a biomassa da cana para a produção de diferentes produtos, porém ainda aproveitando de forma pouco eficiente o material lignocelulósico. No futuro próximo, com a eliminação da queima da cana na pré-colheita, ainda deverão ser disponibilizados grandes volumes de palha, e seu uso como energético com o bagaço deverá se tornar uma boa oportunidade de negócio para as usinas (na verdade, essa opção já começa a ser explorada no Centro-Sul). Uma investigação sobre as futuras opções tecnológicas que permitiriam o melhor aproveitamento desses materiais e suas possíveis implicações no contexto das usinas foi realizada recentemente (SEABRA, 2008). Além das possibilidades envolven-
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19 LOGÍSTICA PARA ESCOAMENTO DO ETANOL Mirna Ivonne Gaya Scandiffio
INTRODUÇÃO O Brasil apresenta um diferencial competitivo no que diz respeito ao custo de produção de etanol devido a fatores edafoclimáticos e aos avanços tecnológicos, fruto de mais de 30 anos de experiência com o Programa Nacional de Álcool – Proálcool. Essa competitividade, no entanto, depara-se com uma ameaça crescente quando o aspecto analisado é o custo da logística de transporte de etanol devido, principalmente, ao deficit de investimentos em infraestrutura, prejudicando o escoamento de etanol no País, fato que ganha mais proporções quando se trata de exportar o combustível renovável. Recentemente, a produção de etanol ou álcool combustível a partir da cana-de-açúcar voltou a ganhar atenções por parte de investidores nacionais e estrangeiros por dois motivos principais: o preço competitivo do etanol perante a evolução – e principalmente as incertezas – do preço do petróleo e a crescente percepção dos benefícios ambientais. Ainda, a crescente demanda de álcool hidratado após a introdução, em 2003, dos veículos flex fuel no Brasil, alcançando atualmente volumes de comercialização similares aos da gasolina, e os avanços nas pesquisas sobre o etanol de segunda geração são fatores relevantes para a retomada de investimentos na expansão da produção de etanol a partir da cana-de-açúcar. E a decisão por investimentos para aumentar a oferta de etanol passa, necessariamente, por outros aspectos importantes que não somente uma análise criteriosa sobre a demanda e oferta do combustível renovável. A construção de novas unidades certamente irá considerar a proximidade ou facilidade de
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acesso aos centros de consumo, ou seja, a infraestrutura existente que permita o melhor uso entre os diferentes modais de transporte para o escoamento de etanol: dutovias, hidrovias, ferrovias e rodovias. A proximidade de subestações de energia elétrica torna-se uma variável cada vez mais relevante devido ao potencial existente na usina ou destilaria de comercializar energia elétrica, além de açúcar e etanol, excedente do processo de fabricação com o melhor aproveitamento do bagaço e da palha. Um dos cenários avaliados recentemente em estudo realizado pelo Nipe1 considerou a possibilidade de substituição de 10% da demanda mundial de gasolina por etanol de cana-de-açúcar produzido no Brasil; apontou para a necessidade de o País ter uma capacidade exportadora de 205 milhões de metros cúbicos de etanol. Essa expansão aconteceria em áreas mais distantes aos centros consumidores, aumentando a necessidade de infraestrutura logística para garantir o escoamento até as bases de distribuição e portos de exportação. Para definir as melhores alternativas e uso mais eficiente dos modais de transporte para o etanol, priorizando as dutovias e hidrovias e ferrovias, estudos devem ser conduzidos com a ajuda de ferramentas computacionais, com a finalidade de fornecer dados quantitativos ao processo de tomada de decisões. Para tal, modelos matemáticos são desenvolvidos para analisar o comportamento das diversas variáveis presentes na logística de trans-
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Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético – Nipe. Estudo realizado por solicitação do Centro de Gestão de Estudos Estratégico – CGEE.
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20 PROJETO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ETANOL QUALIDADE E NORMALIZAÇÃO DO ETANOL Antonio Bonomi
INTRODUÇÃO Historicamente, uma nova configuração do sistema agroindustrial (SAG) canavieiro, o que suporta o mais importante entre os tipos de biocombustíveis – o álcool combustível – surge a partir da desregulamentação do setor, da abertura comercial da economia brasileira e da perspectiva de crescimento da demanda internacional por álcool. O processo de desregulamentação do complexo sucroalcooleiro na década de 1990 ocorreu sob a perspectiva da saída do Estado do SAG, em decorrência da estagnação setorial vigente naquele momento. Entretanto, a saída foi parcial, dada a importância do ambiente institucional na dinâmica do SAG. Para manter a posição de destaque na produção e comercialização de biocombustíveis, é de grande importância que o setor de biocombustíveis brasileiro possua apoio institucional. A Lei n. 11.097, de 13 de janeiro de 2005, introduziu formalmente os biocombustíveis na matriz energética brasileira, cabendo à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP a regulação do setor. Nesse quadro, existe um arcabouço regulatório que, apesar das imperfeições e falhas estruturais existentes, garante a possibilidade da construção de um marco regulatório e metrológico que dê sustentação ao papel de destaque que o País assume na área dos biocombustíveis. Nesse trabalho, serão detalhados os aspectos fundamentais para garantir a qualidade do etanol, atendendo às características especificadas para seu consumo no mercado interno e facilitando sua comercialização no mercado internacional. Além da
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discussão das diversas especificações existentes hoje no mundo, para o etanol combustível, serão avaliados estratégias e mecanismos que, uma vez implementados numa política de bioenergia, servirão para garantir sua qualidade. Será discutida a necessidade da harmonização da especificação brasileira para o etanol combustível com as existentes internacionalmente, uma vez que esse produto será comercializado num mercado fortemente globalizado e competitivo, em que a qualidade do produto e o preço são o principal diferencial. Além da discussão da especificação do etanol, o presente trabalho abordará os principais aspectos relacionados com o controle e a garantia da sua qualidade, destacando sempre as atribuições e as sugestões de mecanismos que podem ser implementados pelo Estado de São Paulo.
O ARCABOUÇO REGULATÓRIO O arcabouço regulatório existente hoje no Brasil dá sustentação à produção e à comercialização do etanol, visto como uma commodity, num mercado globalizado como o dos combustíveis. Três entidades federais constituem o alicerce desse arcabouço regulatório. São elas: • ANP – Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, implantada há 10 anos pelo Decreto n. 2.455, de 14 de janeiro de 1998. É o órgão regulador das atividades que integram a indústria do petróleo e gás natural e a dos biocombustíveis no Brasil (ANP, 2008a), sendo, dessa forma, responsável pela definição das especificações dos biocombustíveis, no caso o etanol, e pelo con-
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21 QUALIDADE DO ETANOL COMBUSTÍVEL: MATERIAIS DE REFERÊNCIA E MÉTODOS DE ANÁLISE Nelson Ramos Stradiotto, Maria Valnice Boldrin Zanoni, Isabel Cristina Serta Fraga Paulo Paschoal Borges
INTRODUÇÃO Os biocombustíveis constituem uma alternativa viável aos combustíveis derivados de petróleo, podendo participar de maneira significativa no suprimento de energia no futuro. A participação dos biocombustíveis na matriz energética depende de um complexo arranjo de fatores envolvendo os aspectos da produção (matéria-prima e tecnologia) e da sustentabilidade (social, econômica e ambiental) dessa fonte de energia. A qualidade do etanol está diretamente relacionada com a sustentabilidade econômica e ambiental desse biocombustível. Desde o início do Proálcool, a qualidade do etanol sempre esteve ligada ao desempenho dos motores movidos com álcool hidratado, tendo assegurado um lugar de destaque para a sustentabilidade econômica desse biocombustível. Posteriormente, a qualidade do etanol passou a ser um fator preponderante para a sustentabilidade ambiental, principalmente em decorrência da comparação entre veículos movidos com esse combustível em relação aos combustíveis tradicionais. Mais recentemente, a qualidade do etanol tem desempenhado um papel decisivo na possibilidade de conversão do etanol em commodities no mercado internacional. A aferição da qualidade dos biocombustíveis depende substancialmente de três fatores básicos: as especificações normatizadas, os métodos oficiais
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de análise e os materiais de referência certificados. As especificações normatizadas são um conjunto de características necessárias para assegurar que o biocombustível cumpra a sua finalidade. Os métodos oficiais de análise são os instrumentos necessários para avaliação das especificações normatizadas do biocombustível. Os materiais de referências credenciados são dispositivos utilizados na validação e controle dos métodos oficiais de análise de biocombutíveis. Considerando que as especificações do etanol são normatizadas por organismos nacionais (ANP e ABNT) e internacionais (ASTM e CEN), este trabalho tem por objetivo contribuir para uma análise crítica do estado da arte (pesquisa e desenvolvimento), usando os principais métodos de análise e uma compilação das normas sobre materiais de referência certificados para etanol.
MÉTODOS DE ANÁLISE Os métodos de análise utilizados para avaliar a qualidade do etanol combustível podem ser classificados em dois grupos: oficiais e alternativos. Em ambos os grupos, existe uma predominância dos métodos instrumentais sobre os métodos clássicos (gravimétricos e volumétricos). Entre os métodos instrumentais de análise de etanol predominam três classes de métodos: cromatográficos, espectroscópicos e eletroquímicos.
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22 QUESTÕES RELATIVAS AO USO FINAL DO ETANOL (COMBUSTÍVEL E QUÍMICA) O MOTOR A ÁLCOOL: PASSADO, PRESENTE E FUTURO Henry Joseph Jr.
A edição de 13 de junho de 1979 da revista Veja trouxe a seguinte notícia: “Desta vez ganhamos: o CDE bateu o martelo e o Proálcool agora se tornou irreversível”, confidenciou a um amigo o Ministro da Indústria e do Comércio, João Camilo Penna, eufórico, à saída do encontro. De fato, o CDE1 decidiu aplicar 5 bilhões de dólares no Proálcool2 até o final do governo Figueiredo, para obter em troca um número não menos grandioso: 10 bilhões de litros de álcool por ano. Com esse volume, o governo espera atender à demanda adicional de gasolina no futuro, bem como abastecer integralmente 475.000 veículos com motores adaptados e 1,225 milhão de outros com motor a álcool original, nos próximos seis anos. Essa euforia do Ministro, naquele momento, explicava-se pelo fato de que o Proálcool, mesmo tendo sido criado já há quatro anos, pelo governo anterior do General Ernesto Geisel, por meio do Decreto Federal n. 76.593 de 1975, ainda não havia, segundo palavras da própria revista, “abandonado o caminho da vaga promessa, distante do caminho efetivo para livrar o Brasil do pesadelo petrolífero”. Entre os diversos problemas que aquele programa de substituição da gasolina pelo álcool etílico3 enfrentava, talvez o mais significativo fosse a dificuldade em conseguir adaptar os motores dos veículos para o novo combustível, com um grau de qualidade mínimo que pudesse garantir durabilidade e desempenho similares aos dos motores 1
CDE – Conselho de Desenvolvimento Econômico. Proálcool – Programa Nacional do Álcool. 3 Álcool etílico ou etanol são sinônimos; é um álcool com dois átomos de carbono na molécula. 2
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convencionais a gasolina. Corrosão, alto consumo, perda de dirigibilidade e dificuldades na partida a frio eram alguns dos fatores que faziam mecânicos olharem com desconfiança o uso do álcool nos veículos “convertidos”. Até então, somente frotas governamentais, de empresas estatais ou de táxis estavam autorizadas a converter os motores de seus veículos para o uso do combustível álcool, e nem sempre os resultados eram satisfatórios. A maior frota a álcool então existente, pertencente a uma única empresa, era a da companhia telefônica estadual de São Paulo (Telesp), que tinha 400 veículos Volkswagen Sedan 1300 convertidos por uma empresa retificadora de motores chamada Motorit. Esses veículos vinham apresentando problemas funcionais e de durabilidade e, somente com intensa manutenção, continuavam teimosamente sendo operados. Algumas outras frotas também estavam sendo transformadas, mas, a maior quantidade de veículos convertidos para o álcool eram táxis, que se beneficiavam da permissão concedida para comprar combustível por um preço 65% inferior ao da gasolina, nos chamados “postos autorizados”. O próprio combustível álcool era, até aquele momento, do ponto de vista de suas especificações técnicas, um ilustre desconhecido. Produzido por diferentes processos, em destilarias anexas (ligadas a usinas produtoras de açúcar) ou independentes (não anexas), com composição química bastante variável, continha diversos contaminantes provenientes do processo industrial, tancagem ou transporte e um teor de água absurdamente variável, que podia ir de 5% a 12% em volume, mesmo só considerando o chamado álcool etílico hidratado carburante. Dis-
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23 USO DO ETANOL EM MOTORES CICLO DIESEL Jose R. Moreira Silvia Velázquez Euler H. Melo
INTRODUÇÃO A opção mundial de combustível para o transporte público urbano é o óleo diesel, um combustível fóssil, não renovável, produzido a partir da destilação fracionada do petróleo. O óleo diesel é o combustível de mais importância na matriz energética veicular no Brasil, correspondendo a 51,2% do total do volume de combustível consumido no País, como mostra o Gráfico 1.
Os outros combustíveis, tais como gasolina e etanol, não têm sido utilizados comumente no transporte público urbano. Porém, providências vêm sendo tomadas no sentido de buscar tecnologias de menor impacto ambiental. Uma das iniciativas para diversificar a matriz energética e substituir parcialmente o diesel foi a produção de biodiesel (B100). Entretanto, essa alternativa ainda não pode atender à demanda de combustível no curto prazo. Por outro lado, o etanol carburante,
1o semestre – Veicular 60 51,2%
50 40 30
26.1%
20 11,5%
10
6,0%
4,1% 1,0%
0 Álcool anidro
Álcool hidratado
GNV
Diesel
B100
Gasolina A
Álcool total: 17,5%
Fonte: ANP (2008).
GRÁFICO 1
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Matriz energética veicular.
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24 QUESTÕES RELATIVAS AO BIODIESEL E AO ETANOL USO DO ETANOL NA TRANSESTERIFICAÇÃO Leticia Ledo Marciniuk Camila Martins Garcia Ulf Schuchardt.
Em decorrência do consumo desenfreado de energia associado à crescente preocupação ambiental, a pesquisa, em suas mais diversas áreas, vem sendo estimulada na busca por recursos alternativos, até pouco tempo atrás desprezados, de fontes energéticas renováveis, como a dos ventos, marés e biomassa. Entre as fontes, a biomassa tem recebido especial atenção devido à grande quantidade de insumos que podem ser obtidos a partir da mesma, como é o caso dos combustíveis renováveis, etanol e biodiesel, de grande interesse à economia mundial. Ela pode ser utilizada diretamente, por meio de sua queima, ou indiretamente, por meio de processos químicos, termoquímicos ou biológicos. Entre eles, destacam-se a transesterificação de óleos vegetais, esterificação de ácidos graxos, pirólise, gaseificação, extrações com fluido supercrítico, digestão anaeróbica, fermentação, entre outros. Nesses processos, podem ser utilizados diversos resíduos agrícolas, causadores de graves problemas ambientais em relação à estocagem, como é o caso do bagaço da cana (MARCINIUK, 2007). Além de renovável, a biomassa reduz a poluição, pois seus principais componentes são formados a partir de gás carbônico e água, usando a luz solar como fonte de energia (PETRUS et al., 2006). Esse aspecto a posiciona como uma fonte estratégica para a solução de problemas relacionados ao aquecimento global. Se considerarmos que, durante a queima de combustíveis derivados da biomassa, o gás carbônico emitido para a atmosfera seja absorvido por fotossíntese para o
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crescimento de outras fontes da mesma, o balanço de massa de CO2 é mais favorável a ser nulo. No entanto, para isso ser real, é necessário que haja um consumo sustentável de biomassa, sem que seu estoque diminua ao decorrer do tempo, como vem acontecendo na maioria dos países em desenvolvimento (GARCIA, 2006). Como fontes prontamente disponíveis, os óleos vegetais vêm ganhando destaque cada vez maior nos programas energéticos atuais. Eles proporcionam uma geração descentralizada de energia, fazendo locais mais afastados e regiões menos abastadas poderem ser beneficiadas. Sua produção significa também um apoio à agricultura familiar e valorização das potencialidades regionais (RAMOS, 2003). Diversos pesquisadores defendem o uso direto de óleos vegetais como combustíveis alternativos aos derivados de fontes não renováveis, como é o caso do óleo diesel de petróleo. No entanto, mesmo sendo energeticamente favorável devido ao grande poder calorífico dos óleos vegetais, seu uso direto pode comprometer o funcionamento e a durabilidade dos motores do ciclo diesel, aumentando os custos de manutenção (MACEDO, 2004). Isso pode ser justificado devido à alta viscosidade desses óleos, aproximadamente 11 a 17 vezes maior que a do óleo diesel, baixa volatilidade e alta massa molar devido às grandes cadeias dos triacilglicerídeos. Esses fatores podem impedir sua combustão completa, levando à formação de depósitos de carbono no interior do motor e obstrução nos filtros de óleo e sistemas de injeção. Além disso, a decomposição térmica do glicerol presente nos
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Parte 5 ROADMAPPING TENCOLÓGICO PARA O ETANOL André Tosi Furtado Rodrigo Lima Verde Leal (organizadores)
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1 INTRODUÇÃO André Tosi Furtado Rodrigo Lima Verde Leal
O etanol produzido a partir da cana-de-açúcar se coloca como umas das energias alternativas mais competitivas diante dos combustíveis líquidos obtidos a partir das energias fósseis. Os derivados médios e leves do petróleo são os derivados mais dificilmente substituíveis. Seus usos são específicos, principalmente no setor de transporte. Nesse nicho específico, os biocombustíveis se colocam como as únicas opções de energias renováveis atualmente viáveis, sem que sejam necessários o sucateamento e a substituição da infraestrutura de distribuição de combustíveis e dos equipamentos existentes de transporte. Dentre os biocombustíveis, o etanol obtido a partir da cana-de-açúcar é incontestavelmente a alternativa mais atrativa do ponto de vista econômico e energético, assim como de maior sustentabilidade ambiental entendida, sobretudo, como balanço energético e emissão de gases de efeito estufa. O etanol de cana permite que os custos energéticos da etapa industrial de produção sejam todos assumidos pelos subprodutos da cana (principalmente o bagaço). Essa singularidade constitui o traço mais importante da atratividade dessa cultura em relação a quase todas as demais culturas agroenergéticas. A vantagem central da cana-de-açúcar centrase, de um lado, na elevada produtividade energética dessa cultura e na importante proporção de açucares diretamente fermentescíveis a etanol (1/3 do conteúdo energético). A elevada proporção de açúcares garante a diminuição de custos energéticos e econômicos no processo de obtenção do etanol em relação às culturas cerealíferas ricas em amido, o que
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é decisivo para garantir a competitividade1. A outra vantagem decisiva da cana consiste na utilização do bagaço no processo industrial e na reciclagem de vinhaça, torta de filtro e cinzas, todos muito comuns nas usinas brasileiras. Esses resíduos se tornam importantes insumos do processo de produção que contribuem para a maior competitividade da cana. As tecnologias, no entanto, em uso na agroindústria brasileira, ainda se apoiam, em grande medida, em inovações incrementais realizadas sobre tecnologias adquiridas externamente. Existe um enorme potencial de avanço na produtividade energética da cana que ainda precisa ser aproveitado. A agroindústria brasileira da cana-de-açúcar tem larga história no País e se caracteriza por um desenvolvimento de tecnologias de aplicação imediata ou de maturação no curto prazo. Porém, desde o Proálcool, esse complexo produtivo iniciou uma rota virtuosa de expansão, apoiada, em grande parte, na capacidade de incorporar novos conhecimentos tecnológicos e de traduzi-los em avanços produtivos. Uma das explicações para que a agroindústria da cana tenha sobrevivido ao longo período de baixos preços do petróleo e do etanol, que se seguiu ao contrachoque do petróleo, foi a sua diversificação para o mercado internacional do açúcar, que se 1
Por outro lado, vale ressaltar uma cultura cerealífera: o milho. Este possui 70% de amido, o qual é hidrolisado para glicose, oferecendo valores superiores aos açúcares na cana. Um problema do milho – e de outros cereais – reside no fato de que eles não têm bagaço, uma vez que os resíduos são todos deixados no campo.
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2 CONTEXTUALIZAÇÃO Rodrigo Lima Verde Leal Luís Augusto Barbosa Cortez Maria das Graças de Almeida Felipe Carlos Eduardo Vaz Rossell Antonio Bonomi Paulo Sérgio Graziano Magalhães
CONTEXTO Visão Por um novo modelo da indústria canavieira A capacidade que a agroindústria canavieira tem para ampliar sua produção, por meio do aumento da produtividade – agrícola e industrial – ou da expansão de área, é considerável. Essa pujança poderia atender às necessidades do mercado interno e de exportação de etanol, e ainda à demanda de açúcar para os mercados internos e externos. Estudos anteriores conduzidos pelos integrantes desse Projeto demonstram que o Brasil teria terras suficientes para atender às necessidades de expansão de área em dois cenários em que o Brasil produzisse 5% ou 10% da demanda mundial de gasolina em 2025 (UNICAMP, 2005). Essas perspectivas muito otimistas para a cana colocam a necessidade de se repensar o paradigma de produção, até então vigente, de exploração conjunta dos dois principais mercados: açúcar e etanol. Nesse contexto, a valoração energética da cana esteve atrelada praticamente ao aumento de teor de sacarose e ao melhor aproveitamento desta no processo industrial. As mudanças que estão ocorrendo no cenário energético internacional, com a subida praticamente constante do preço do petróleo desde o início da
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década, impõem a necessidade de se pensar em um novo modelo para o desenvolvimento tecnológico da cana. Essas mudanças dizem respeito ao comportamento da fronteira tecnológica internacional no campo dos biocombustíveis e aos potenciais de produção e de desenvolvimento tecnológico do Brasil. Os países desenvolvidos estão investindo fortemente nas tecnologias de produção de matériasprimas e de conversão para biocombustíveis. Como as culturas existentes não são suficientemente atrativas como matéria-prima para biocombustíveis, do ponto de vista econômico, energético ou ambiental, esses países estão se concentrando nas tecnologias de segunda geração para a produção de biocombustíveis. A produção de celulose, hemicelulose e lignina será fundamental para a geração de bioenergia no futuro próximo, em especial na produção de biocombustíveis. Como a produção de celulose é muito mais elevada por unidade de área e as oportunidades de usos dos resíduos vegetais ricos em celulose são muito maiores, o potencial de produção dos países desenvolvidos seria, consequentemente, ampliado. Os investimentos feitos em tecnologias de conversão de celulose em etanol são muito superiores aos que existiam na década anterior. Muito provavelmente teremos um deslocamento da fronteira de tecnologias de conversão, e o Brasil precisa estar convenientemente preparado para o novo ambiente competitivo.
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3 DIRETRIZES DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A INDÚSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SÃO PAULO Marcos G. A. Landell Luciana Rossini Pinto Silvana Creste Sabrina Moutinho Chabregas William Lee Burnquist
PROGRAMA DE PESQUISA EM POLÍTICAS PÚBLICAS (PPPP) FAPESP ROADMAP TECNOLÓGICO PARA O ETANOL: COMPONENTE MELHORAMENTO GENÉTICO E BIOTECNOLOGIA INTRODUÇÃO O Brasil se destaca como o principal país produtor de cana-de-açúcar do mundo, com safra prevista em 2009 em aproximadamente 498,1 milhões de toneladas de cana-de-açúcar (disponível em: <http:// www.agrosoft.org.br>). Tal posição é atribuída à incorporação de tecnologias de manejo e, principalmente, pela utilização de variedades desenvolvidas pelos programas de melhoramento genético. A demanda crescente pelo etanol combustível como fonte de energia renovável e a necessidade de assegurar a competitividade do Brasil, principalmente na produção de etanol diante do mercado internacional e, consequentemente, sua liderança em bioenergia, traz uma série de novos desafios, principalmente, aos programas de melhoramento genético. Nesse sentido, será necessário, além do aumento da produtividade, o desenvolvimento de novas variedades de cana-de-açúcar, com um novo perfil energético para produção de biomassa, como para a produção de etanol celulósico.
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O desenvolvimento de novas variedades de cana-de-açúcar leva em torno de 10 a 15 anos. Nesse sentido, os cruzamentos que estão sendo realizados hoje irão fornecer as variedades que atenderão às necessidades projetadas para o setor sucroalcooleiro daqui a pelo menos 10 anos. Assim, conforme o cenário almejado, é de fundamental importância que os genitores a serem utilizados nos cruzamentos contenham os genes de interesse do melhorista, de forma que possam ser incorporados nas novas variedades. Dessa forma, o melhoramento, visando a variedades para biomassa, irá demandar germoplasma apropriado como fonte de genes que conferem características que contribuam para o aumento de biomassa e conteúdo de fibra, como outras características agronômicas importantes, tais como: resistência às principais pragas, doenças e aos estresses abióticos. Nesse contexto, tecnologias moleculares, como: a prospecção de genes de interesse agronômico, a transformação genética, os marcadores moleculares, entre outras, serão de grande auxílio aos programas de melhoramento genético da cana-de-açúcar.
NECESSIDADES E CAPACIDADES TECNOLÓGICAS Nessa parte, pretende-se apresentar as necessidades e capacidades tecnológicas referentes ao componente melhoramento genético e biotecnologia
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4 ROADMAP TECNOLÓGICO PARA O ETANOL: COMPONENTE MANEJO AGRÍCOLA Paulo S. Graziano Magalhães
INTRODUÇÃO O Manejo Agrícola engloba o plantio, a mecanização alternativa do plantio e da colheita, a recuperação da palha, e o gerenciamento agrícola. Com a perspectiva de aumento de área plantada de cana, muitas alterações devem ocorrer no setor agrícola. A expectativa é que grande parte da cana deixe de ser queimada e passe a ser colhida crua, ao menos nas áreas passíveis de mecanização no primeiro estágio (2015) e posteriormente em toda a área (2025), o que irá obrigar a mecanização completa do cultivo da cana. Novos equipamentos destinados à colheita estão em desenvolvimento hoje, e a perspectiva é que, em 2015, estejam em uso em áreas experimentais, alterando alguns paradigmas da colheita, carregamento e transporte. Espera-se que, para 2025, grande parte da área plantada com cana utilize esse novo conceito de mecanização que reduz drasticamente os impactos negativos sobre o solo, atualmente causados pelo sistema convencional de cultivo.
NECESSIDADES E CAPACIDADES TECNOLÓGICAS
sistema de informação está muito mais atrelado à cultura empresarial que à disponibilidade de tecnologia, e, por isso, não é apresentado aqui como sendo uma demanda tecnológica.
Plantio de cana-de-açúcar O processo de mecanização da cana-de-açúcar inicia-se pelo plantio, hoje, realizado de forma tradicional, envolvendo três etapas: colheita das mudas, em local distinto da área de plantio; a sulcabilidade da área de plantio e distribuição das mudas e adubo; e, por último, a cobertura das mesmas. Conforme destacado nos capítulos anteriores, esse processo é altamente trabalhoso e custoso. Para melhorar a sustentabilidade do sistema, garantindo o aumento da produtividade, sem alterar o custo de produção e reduzindo os impactos ambientais negativos causados pela produção de cana-de-açúcar ,o sistema de plantio deve ser modificado, e, para isso, será necessário investir em pesquisa básica e tecnológica. Duas alternativas tecnológicas não concorrentes que podem contribuir para que possamos atingir os benefícios esperados são apresentadas, a seguir.
Produtos ou tecnologias almejadas Para melhor compreensão do texto, este foi dividido em três partes, Plantio, Colheita e Recuperação da Palha, e sua análise é apresentada, a seguir. O Gerenciamento da parte agrícola, conforme apresentado por ARRAES et al., no Capítulo 15 da parte 3, mostra a produção tecnológica suficiente, carecendo de condições de acesso, principalmente às usinas de menor poder econômico. O uso de um
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Plantio direto Largamente empregado na produção de cereais trazendo benefícios econômicos e principalmente ambientais, essa técnica de cultivo é pouco explorada na produção de cana-de-açúcar. Nesse sistema, o condicionamento físico do solo, por meio de sua movimentação intensa e profunda para receber as mudas da cana-de-açúcar, é
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5 ROADMAP TECNOLÓGICO PARA O ETANOL: COMPONENTE HIDRÓLISE Maria das Graças de Almeida Felipe Carlos Vaz Rossell
1 – INTRODUÇÃO O Brasil tem o maior e mais bem sucedido programa mundial de substituição de combustíveis fósseis representado pela produção de etanol que teve grande avanço nos últimos 30 anos. A expansão de fontes renováveis a partir de matérias-primas alternativas e de processos de produção ecologicamente corretos é exigência da crescente demanda pelo etanol como combustível visando à redução das emissões poluentes. O novo cenário mundial conduz ao avanço da tecnologia de produção de biocombustíveis a partir de um programa de produção de etanol utilizando a biomassa agrícola. Neste contexto, transformar o bagaço e a palha de cana, de subprodutos do processamento, em matéria-prima do setor sucroalcooleiro é uma das rotas tecnológicas alternativas para significativos ganhos de produtividade no setor de etanol combustível. Desnecessário dizer que a matriz de transporte mundial, com base em combustíveis fósseis, é hoje um dos principais elementos degradantes do equilíbrio ambiental. Assim, a mudança nesta matriz com a adoção global de biocombustíveis é, no momento, o principal caminho para reduzir o impacto ambiental das emissões gasosas poluentes. Para tanto, a expansão desse setor no Brasil deverá ocorrer não só pela tecnologia convencional de utilização do caldo de cana (sacarose), como também pelo aproveitamento total dos açúcares (C6 e C5) da biomassa lignocelulósica (do bagaço e da palha). O desafio principal é desenvolver processos capazes de desconstruir esta biomassa a partir da separação de suas principais frações a celulose,
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hemicelulose e lignina, para o aproveitamento dos principais açúcares constituintes das frações celulósica e hemicelulósica representados pela glicose (C6) e xilose (C5) respectivamente. A utilização da palha, além do bagaço de cana, para fins de produção de etanol permitirá o aproveitamento dos 2/3 da energia potencial desta biomassa que é atualmente subaproveitada. Ou seja, o caldo de cana, matériaprima principal nos processos atuais, representa apenas 1/3 do potencial energético da planta. Quanto à lignina, esta poderá ser aproveitada para fins de produção de energia elétrica ou outros compostos como tensoativos, adesivos, etc. É importante considerar ainda neste contexto a alternativa de produção de outros compostos a partir da celulose como butanol, 1-3 propanodiol, bioplástico, ácidos como o acético, láctico e succínico e também da hemicelulose como açúcar especial, o xilitol. Atualmente, o principal problema para a obtenção de etanol a partir de matérias-primas lignocelulósicas é a falta de tecnologia para a conversão eficiente desta biomassa em combustíveis líquidos. O processo exige várias etapas, basicamente prétratamento, hidrólise (celulose e hemicelulose), fermentação dos açúcares C6 e C5 e destilação. Nesse contexto a etapa de hidrólise se apresenta como um fator crítico por ser dependente do tipo de matéria-prima como a natureza do material vegetal e seu processamento e, ao mesmo tempo, interferir diretamente na etapa seguinte de fermentação. É bem conhecido que os produtos da hidrólise podem não ser apenas os açúcares, mas também compostos inibitórios das atividades enzimáticas, cujos tipos e concentrações dependem não somente
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6 PROGRAMA DE PESQUISA EM POLÍTICAS PÚBLICAS (PPPP) Roadmap tecnológico da termoconversão de biomassa para a tecnologia BTL (Biomass to Liquid) Luís Augusto Barbosa Cortez Rodrigo Aparecido Jordan Juan Miguel Mesa Pérez José Dílcio Rocha
INTRODUÇÃO Entre as biomassas vegetais com finalidade energética, a cana-de-açúcar ocupa uma posição de destaque no Brasil. Trata-se de uma cultura já consolidada, com uma logística bastante desenvolvida, em termos de colheita e transporte, conferindo-lhe uma enorme competitividade diante das outras culturas energéticas. Mas, mesmo com o nível excepcional atingido pela indústria sucroalcooleira, o aproveitamento energético, tal como o processo produtivo tem sido conduzido atualmente, ainda é baixo. Isso, porque o modelo de produção de etanol utilizado até então contempla apenas o uso da sacarose, que contém entre 32% e 35% da energia primária da cana-deaçúcar, estando a maior parte (entre 65% e 68%) concentrada na fração lignocelulósica composta pelas folhas e o bagaço. A produção de etanol, por meio do processo de fermentação da sacarose, situa-se em torno de 86 litros por tonelada de cana, representando aproximadamente 26% da energia primária da cana integral. Segundo o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos – CGEE (2004), para cada tonelada de cana limpa (colmos), são produzidas as seguintes quantidades de matéria seca: 140 kg de palha, 140 kg de bagaço e 150 kg de açúcares. De acordo com LEAL (2007), para essas quantidades, a energia primária está distribuída da seguinte forma: palha (2500 MJ), bagaço (2500 MJ) e açúcares (2400 MJ).
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A rota termoquímica apresenta-se como uma opção para a conversão do material lignocelulósico da cana em biocombustíveis, passando pela obtenção de gás de síntese, seguido da síntese catalítica, o que torna possível a obtenção de hidrocarbonetos, alcoóis, hidrogênio, amônia, gás natural sintético etc. Os processos da rota termoquímica são conhecidos como BTL, biomassa para produção de combustíveis líquidos (do inglês Biomass to liquid). A gaseificação é uma rota utilizada para transformar os componentes da biomassa em gás de síntese (CO e H2), utilizado na síntese catalítica para a produção de combustíveis líquidos. A tecnologia de gaseificação encontra-se em estado avançado de desenvolvimento. Porém, problemas com a alimentação de biomassa em reatores pressurizados, limpeza dos gases e a necessidade de larga escala de produção, para alcançar a viabilidade econômica, são fatores que têm barrado a sua exploração comercial. A síntese de biocombustíveis mostra bons indicadores de viabilidade econômica apenas quando utilizada em larga escala. Alguns estudos indicam valores superiores a 1.700 MW térmicos de energia da biomassa, outros se referem a 5 milhões toneladas de biomassa por ano como o mínimo econômico (LORA, 2008). Isso faz os gaseificadores de leito fixo ou borbulhante, típicos de capacidades térmicas pequenas, não serem perspectivos para projetos industriais de produção de gás de síntese para biocombustíveis. Além disso, as plantas de produção
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7 DIRETRIZES PARA UMA POLÍTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO DO ETANOL André Furtado Luís Cortez Maria da Graça Felipe Raffaella Rossetto Paulo Graziano Magalhães Manoel Regis Lima Verde Leal
1. A PROMESSA DO BIOETANOL BRASILEIRO O Brasil é um país em desenvolvimento que se alçou como grande produtor e exportador de produtos agrícolas e agro-industriais nos últimos decênios. Entre os produtos que mais se afirmaram estão os relacionados com a cana-de-açúcar. No decênio passado, o Brasil tornou-se o principal exportador mundial de açúcar, sendo responsável por 30% das exportações mundiais do produto. Esse feito foi logrado a despeito de todas as barreiras erguidas ao comércio desse produto agroindustrial, e se apoiou na indiscutível competitividade do açúcar brasileiro no mercado internacional. Nenhum outro país tem custos tão baixos e uma oferta tão elástica quanto o Brasil. A mesma competitividade se repete no caso do bioetanol fabricado a partir da cana-de-açúcar. Nenhum outro país oferece, na atualidade, condições tão favoráveis em termos de custos e de expansão da oferta quanto o Brasil. A perda do primeiro lugar na produção de bioetanol para os Estados Unidos, nos últimos anos, só se justifica pelas elevadas barreiras alfandegárias que protegem o mercado doméstico americano e pelos elevados subsídios que o Governo Federal concede aos produtores agrícolas desse país. O etanol brasileiro, elaborado a partir da cana-de-açúcar, é ao mesmo tempo mais econômico
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e muito mais eficiente no balanço de gás carbônico, do que o bioetanol americano produzido a partir do milho. Tal aspecto se reflete no fato do país se responsabilizar por metade das exportações mundiais do produto. O atual quadro internacional está marcado por sérias preocupações em relação aos seguintes desafios: – aquecimento global causado em grande medida pela queima de combustíveis fósseis; – políticas nacionais visando diminuir a dependência energética em relação a combustíveis fósseis. O Brasil, nesse contexto, posiciona-se muito favoravelmente, proporcionando ao mundo uma alternativa energética, o bioetanol, com grande capacidade para mitigar as emissões de CO2 e de diminuir as importações de petróleo. A produção de etanol não é a única oportunidade de desenvolvimento da cultura de cana-de-açúcar. Essa cultura também pode ajudar a responder a outros importantes desafios como o da geração de energia elétrica, a partir de uma fonte renovável, e o da elaboração de produtos químicos com base em matérias-primas biológicas. Longe de se constituírem em objetivos antagônicos, essas indústrias e
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INOVAÇÃO E EXCELÊNCIA EM
MEIO AMBIENTE